A Arte de Amar o Bem ISBN 978-85-7931-041-6
Versão Eletrônica ©2012 - Todos os direitos reservados à EDITORA E LIVRARIA SÊFER LTDA. Produção: LCT Informática Editorial
Versão Impressa Esta obra está baseada no AHAVAT CHÉSSED ©2005 - Todos os direitos reservados à EDITORA E LIVRARIA SÊFER LTDA. Alamed Ala meda a Barros, 735 CEP 01232-001 — São Paulo - SP — Brasil Tel. 11 3826-1366 Fax 11 3826-4508
[email protected] Livraria Liv raria Virtual: www.sefer.com.br Em parceria com OR ISRAEL COLLEGE R. Gal. Fernando Albuquerque, 1011 – Cotia – Tel.: 4612-2450 Tradução Paulo Rogério Rosenbaum Edição Final Daniel Presman
A Arte de Amar o Bem ISBN 978-85-7931-041-6
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Revisão Técnica Rabino Chaim Vital Passy Editoração Eletrônica Editora Sêfer Projeto Gráfico e Capa Dagui Design
Nota: Nesta obra, as citações da Torá foram extraídas do livro TORÁ – A LEI MOISÉS, do Rabino Meir Matzliah Melamed (2001); dos Salmos, do livro Salmos – com tradução e transliteração, de David Gorodovits, Vitor Fridlin e Jairo Fridlin (1999), ambos da Editora Sêfer. Proibida a reprodução total ou parcial desta obra, por qualquer meio, sem a autorização expressa da Editora e Livraria Sêfer Ltda.
Dedicamos com amor este livro, em memória de nosso querido pai e avô
ABHOU BEN MAZALZ”L lembrando seu exemplo de integridade e o carinho que sempre dedicou a todos nós. Que o estudo destes capítulos sirva de inspiração para todos e traga elevação para sua alma.
TEHE NISHMATO TSERURÁ BITS’ROR HACHAYIM. Oferecido por seus filhos e netos: Sr. e Sra. Salim e Rita Dayan, David e Daniella Dayan, Eby e Carla Dayan, Ezra e Dálya Harari, e Roberto Dayan
Introdução à Edição Brasileira
Por volta do ano 5646 (1876), o Gaon rabino Israel Meir Hacohen Kagan – mais conhecido como Chafets Chaim – começou a compilar esta incrível obra: o Sêfer Ahavat Chéssed . Este livro, que trata do tema Chéssed (bondade) é, na realidade, um volume associado ao Sêfer Chafets Chaim, sobre assuntos ligados a proibição de Lashon hará (maledicência), pois ambos estão baseados no mesmo trecho: “Quem é o homem que deseja a vida (chafets chaim) e que ama os dias para ver o bem? É aquele que protege a sua língua do mal e que não permite que seus lábios profiram mentiras; que se afasta do mal e faz o bem, procura a paz e luta por ela.” (Salmos 34:13-15) “A Arte de Amar o Bem” é, sem dúvida, uma obra que envolve o leitor e anula por completo todas as desculpas e pretextos que somos capazes de encontrar para não ajudar o próximo ou praticar atos de caridade. 1 Vários acontecimentos atuais estão despertando o mundo para a prática da caridade. Países com sérios problemas de pobreza e fome, acometidos por tragédias e guerras, sendo ajudados por países mais desenvolvidos. Isso também foi profetizado pelo Chafets Chaim nesta obra, que prevê que, na era Messiânica, o que amenizará as dores da redenção serão os atos de bondade praticados no planeta. No entanto, está claro que não há por que esperar por estes acontecimentos para nos despertar e olharmos pelo próximo. No livro Daat Tevunot de autoria do rabino Moshe Chaim Luzzatto, encontramos a essência e o segredo para nos tornarmos pessoas mais sensíveis às causas humanas: devemos nos espelhar nas virtudes do Criador para alcançarmos o verdadeiro lapidar de nosso
caráter, como é dito aqui na obra do Chafets Chaim, 2 “da mesma forma que o Criador é piedoso, sejamos piedosos...”. Ele ainda acrescenta: “Coloque um espelho na sua frente e caminharás olhando para o outro como se fosse você mesmo”. Não olhe para o seu colega desamparado somente com um olhar de pesar e pena, mas encare como uma oportunidade de ajudá-lo e fomentar nem que seja apenas mais um sorriso nesse mundo desigual. O Chafets Chaim traz uma verdadeira e dura realidade: 3 Muitas pessoas costumam gastar, muitas vezes exageradamente, o seu dinheiro para comprar artigos religiosos como Chanukiót , copos de kidush, tefilin, etroguim, etc... e, em contra partida, quando devem praticar a mitsvá de tsedacá apresentam uma grande dificuldade para agir da mesma forma. O Maharshá (Sucá 49b) esclarece que a mitsvá de ajudar o próximo é a maior de todas as mitsvót . O Talmud Ierushalmi cita (Peá 1:1): “Tsedacá e Guemilut Chassadim equivalem a todas as mitsvót da Torá.” Caros leitores, saibam que este livro traz ainda uma valiosíssima informação: o Chafets Chaim revela abertamente o melhor investimento que existe no mercado financeiro. 4 Imagine uma oportunidade única onde com uma pequena soma de dinheiro você consegue um lucro imediato e ainda adquire créditos no banco mais seguro do mundo e, além disso, os lucros são acumulativos por vários e vários anos. Você não iria correndo aproveitar essa oportunidade? Isso acontece quando praticamos Chéssed , como é dito em (Peá 1:1) Elu devarim shehakeren... “Essas são as mitsvót que recebemos a sua recompensa nesse mundo e o saldo ainda fica acumulado para o mundo vindouro”. Uma delas é a mitsvá de Guemilút Chassadim. Assim relata também o livro Ialcut Shimoni 103: “A bondade praticada agora faz com que o homem colha seus frutos até o final de todas as gerações, como é dito nos Salmos
(103:17): “Mas por toda a eternidade é a benevolência do Eterno para com os que O temem.” Não pense que pelo fato de você não ser uma pessoa de vida pública, ou responsável por alguma instituição de caridade ou recolhedor de fundos para necessitados não há maneiras de praticar Chéssed e ser benevolente com o próximo. Neste livro encontraremos alguns caminhos que estão diante de nós e, às vezes, não nos damos conta de que são oportunidades únicas para ajudar alguém, seja emprestando dinheiro, alegrando os noivos no dia de seu casamento, visitando enfermos, consolando enlutados e etc... Mesmo assim, se você não puder por algum motivo vir a ter essas oportunidades, que pelo menos em suas preces lembre do necessitado, ou de alguém enfermo que precise de sua súplica. Ahavat Chéssed realmente nos inspira em diversos aspectos a chegar a uma simples conclusão: Praticar atos de bondade é a maior dádiva que o Criador nos legou. “Olam Chéssed yibanê”. O mundo será construído através dos atos de bondade. Com certeza estaremos aproximando a redenção tão esperada. Boa leitura!
Rabino Chaim Vital Passy – Or Israel College
Prefácio à edição brasileira
“Amar o bem” – e não somente fazer o bem. “Amar o bem” é procurar todas as oportunidades para ajudar o próximo e fazê-lo se sentir melhor. “Amar o bem” demonstra que a bondade já faz parte de seu caráter, que sua essência é voltada ao próximo, e não ao seu ego. O sábio Hilel, quando questionado por um gentio que queria se converter, para que lhe ensinasse toda a Torá “resumida numa frase”, respondeu: – “O que não queres que façam a ti, não faça aos outros – esta é toda a Torá. O resto, vá e estude!” Um sábio perguntou como as leis da Torá de Shabat, Tefilin, Casher etc. estariam englobadas nesta Mitsvá. A resposta é que quando alguém pára de ser egocêntrico e começa enxergar os outros, ele consegue chegar à verdadeira fé, se procurar a verdade. O egoísta tem seus próprios interesses como obstáculos para chegar à verdade. Ser altruísta é a base de toda a Torá. Existem gênios do pensamento, gênios do Talmud, gênios da Cabalá. Nosso livro nos ensina como podemos ser “gênios da bondade”, inspirados nos ensinamentos do Chafets Chaim – esse, sim, um verdadeiro gênio do caráter que iluminou as gerações que precedem a vinda do Mashíach com seus ensinamentos sobre as Mitsvót “entre o homem e seu próximo”. Iniciamos o livro com a parte 2, que trata da importância de Chéssed (benevolência) e Tsedacá (caridade), seguida da parte 3, que cuida de Mitsvót específicas: os capítulo 1 e 2 tratam da Mitsvá da hospitalidade, o capítulo 3 trata da Mitsvá de visitar os doentes, o
capítulo 5 trata da Mitsvá de consolar os enlutados e o capítulo 6 trata da Mitsvá de alegrar os noivos etc. No final trouxemos o capítulo 9 e 10 da parte 1, que tratam de leis referentes a pagamentos de empréstimos (os demais capítulos da parte 1 foram excluídos por serem menos práticos para a maioria da comunidade). Encerrando, imprimimos uma coletânea de ensinamentos do sábio rabino Iehonatan de Wolin, que costumava lê-la duas vezes ao dia e que foi impressa no fim das edições anteriores deste livro. Para facilitar seu estudo, dividimos o livro em 30 partes, para aqueles que quiserem estudá-lo de forma diária e sistemática. Esperamos que a leitura e o estudo desta grande obra faça com que cada um de nós aumente seus atos de benevolência e o amor entre todos, aproximando assim a Gueulá Shlemá, Amém.
Rabino Raphael Shammah
Breve biografia do Chafets Chaim
Israel Meir Hacohen Kagan nasceu em Zhetel, Polônia, no dia 11 de Shevat de 5598 (6/02/1838). Foi educado até os 10 anos por seus pais; transferiu-se para Vilna a fim de dar continuidade aos seus estudos judaicos e por fim estabeleceu-se na cidade de Radin. O rabino Israel Meir passava os dias estudando Torá e disseminando o seu conhecimento entre as pessoas simples. Com o crescimento da sua reputação, estudantes de toda a Europa vieram até Radin para estudar com ele. Em 1869 a sua casa ficou conhecida como a Yeshivá de Radin. Além da yeshivá, o rabino Israel Meir era muito ativo no que dizia respeito às causas judaicas. Viajava longas distâncias com o intuito de estimular o cumprimento das mitsvót entre os judeus. Entre 1870 e 1871 escreveu a sua primeira obra, o Sêfer Chafets Chaim, uma compilação de leis que tratam da maledicência e da difamação. A obra foi finalmente publicada em 1873 e obteve tanta repercussão que o rabino Israel Meir ficou conhecido como o “Chafets Chaim”. Gigantes espirituais da época, como o rabino Israel Lipkin (Salanter), perceberam que estavam diante de uma daquelas personalidades raras que deixariam a sua marca sobre todo o povo. O Chafets Chaim sentia que as leis práticas de bondade e caridade eram cada vez mais ignoradas. Assim como tratou da questão de lashon hará (maledicência) ao publicar Shemirát Halashón — que enfatizava a importância de vigiar a própria língua, citando os ensinamentos dos nossos Sábios — resolveu fazer o mesmo por guemilut chéssed em seu livro Ahavat Chéssed : classificou suas leis e realizou uma campanha para que os judeus se reunissem em grupos de estudos para estudá-las e aplicá-las. Em decorrência disso, surgiram centenas de sociedades que emprestavam dinheiro sem juros, abrigos para os sem-teto e sociedades de bicur cholim.
O Chafets Chaim estava preocupado com uma deficiência na literatura haláchica: não havia nenhum comentário moderno sobre o Orach Chaim (a seção do Shulchan Aruch que trata dos rituais cotidianos e das datas festivas) que resumisse séculos de comentários e responsa, a fim de oferecer decisões autorizadas em áreas de disputa no campo da Halachá. Em 1894 passou a escrever a sua obra-prima, a Mishná Berurá. Concluída somente em 1919, esta obra exerce grande influência até os dias atuais. A sua amplitude, concisão, clareza e genialidade falam por si, bem como a sua aceitação universal. Este é o atestado supremo que dá ao seu autor a estatura de um sábio. O Chafetz Chaim foi um dos primeiros a se dar conta de que o judaísmo da Torá precisava atualizar as suas táticas a fim de se opor à arremetida de seus adversários, os partidários da Hascalá (Iluminismo judaico) e da conduta não-religiosa. Ciente disso, em 1912 foi um dos fundadores da Agudát Israel , em Katowicz, que mais tarde tornou-se o principal braço organizacional internacional do judaísmo tradicional. Como sempre, ele via nisso mais do que uma questão estratégica, mas uma obrigação religiosa: “Em uma época em que nossos valores nunca estiveram tão ameaçados quanto agora, até mesmo pequenos atos em defesa da Torá são multiplicados muitas vezes, em escalas Divinas, em direção à derradeira recompensa”. O Chafetz Chaim era um homem tão religioso quanto pragmático. Homens como o rabino Chaim Ozer Grodzensky ZT”L, de Vilna, valorizavam enormemente seus sábios conselhos ao procurarem soluções práticas para os problemas mais complexos. Durante os anos de crise que se seguiram à Primeira Guerra Mundial (1914-1918), quando o rabino Chaim Ozer era o líder absoluto da comunidade judaica da Lituânia, este e o Chafetz Chaim eram constantemente consultados sobre todas as principais questões da vida judaica. Em 1923, o Chafetz Chaim sentiu que a comunidade deveria se organizar para prover refeições casher aos soldados judeus. Ele chamou o seu novo projeto de Kessel Cosher e, naturalmente, a sua primeira ação foi viajar até Vilna para obter o endosso e apoio do rabino Chaim Ozer; mas este respondeu que havia muitas restrições que tornavam uma campanha assim inoportuna naquele momento. O Chafetz Chaim encolheu os ombros e respondeu:
“O que eu posso fazer? As pessoas me consideram um judeu temente a Deus. Quando eu for chamado para o mundo vindouro, elas me perguntarão por que eu não fiz nada para prover comida casher para os soldados judeus. O que eu direi? Talvez eu lhes diga que não fui indiferente; fiz uma difícil viagem até Vilna, mesmo fraco e com mais de oitenta anos. Mas o rabino de Vilna era o gadol hador e me disse que eu estava errado. Quem melhor do que o gadol hador para saber o que é certo ou errado?” Ao perceber o seu equívoco, o rabino Chaim Ozer convocou uma reunião pública na sinagoga central a ser coordenada pelo Chafetz Chaim. Naquela reunião nasceu o Kessel Cosher . Ao longo de sua vida, o Chafetz Chaim publicou inúmeras obras, cartas públicas e artigos. Exemplo vivo do Salmo 34:13-14, “Quem é o homem que deseja a vida e e que ama os dias para ver o bem? É aquele que protege a sua língua do mal e que não permite que seus lábios profiram mentiras; que se afasta do mal e faz o bem, procura a paz e luta por ela”, o Chafets Chaim faleceu em 24 de Elul de 5693 (15/09/1933), aos 95 anos.
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Carta do maran Chafets Chaim muito pertinente à nossa época
DIA 1
Podemos ver que todos os sinais mostrados por nossos sábios, de abençoada memória, com relação aos momentos que antecedem a vinda do Mashiach (Messias) já foram consumados e que não há dia sem uma praga maior do que a anterior. O povo judeu sofre agruras intermináveis, que são, sem dúvida alguma, sinais claros da era pré-messiânica. Estas maldições foram chamadas pelos sábios do Talmud de Chevlê (dores que precedem a chegada do) Mashiach. Assim como uma parturiente, que antes do nascimento da criança sente dores insuportáveis, a chegada do Mashiach será sentida com grande angústia e sofrimento.
Um conselho para livrar-se de Chevlê Mashiach Apesar de não termos, aparentemente, remédio algum para nos livrarmos destas dores e que elas são inevitáveis, se observarmos com atenção as palavras de nossos sábios ( San ´hedrin 98b), encontraremos um conselho para minimizar este sofrimento: perguntaram aos discípulos de Rabi Eliezer, ‘o que um homem deve fazer para se livrar das dores que precedem a chegada do Mashiach?’ Sua resposta: ‘Que se ocupe com o estudo da Torá e com a prática de Chéssed !’ Estas duas atividades protegem o homem das dores que antecedem a vinda do Mashiach, desde que ele se ocupe delas constantemente e não as abandone. Por isto o texto talmúdico usa o termo ocupar-se. Assim como os homens procuram bons conselhos e soluções enquanto se ocupam dos seus negócios, não dando trégua aos problemas sem tentar solucioná-los, e não os abandonam até que lhes tragam lucro, eles devem se ocupar
destes dois assuntos: o estudo da Torá e a prática de boas ações, procurando todo tipo de conselho e soluções para que seus méritos cresçam e venham ao seu salvamento na hora da agonia.
Cada um deve estudar o que for capaz Assim como encontramos diferentes níveis nos negócios mundanos, alguns mais e outros menos lucrativos, alguns mais e outros menos seguros, uns grandes e outros menores, os negócios espirituais também apresentam níveis diferentes. Alguns homens foram agraciados por Deus com uma capacidade maior para compreender com clareza os textos da Torá e entender com profundidade as passagens do Talmud e da legislação rabínica; para destrinchar assuntos de Halachá e orientar o povo judeu nos caminhos Divinos. São os professores e sábios de cada geração. Alguns chefes de família são doutos em Guemará e outros em Mishná, alguns na literatura rabínica e outros são capazes de compreender somente Chumash com Rashi . Cada um, no seu nível de estudo, é muito querido pelo Altíssimo. Por isto, cada qual deve tentar estudar aquilo que pode, fixando um tempo determinado diariamente para o seu estudo e não deixando passar um dia sequer sem estudar . Então o estudo virá ao seu auxílio e o protegerá. Mas se o homem não se ocupar diariamente do estudo da Torá nos prazos que fixou e fizer do estudo algo aleatório, passando dias e dias sem estudar – um estudo como esse não o protegerá tanto. A que isto se assemelha? A um doente a quem foi prescrita uma receita. Se não a tomar na medida e horários corretos, ela não surtirá o efeito desejado. A chance de cura será tanto maior quanto o paciente se esforçar em tomar o remédio na dose e horários estipulados pelo médico.
É preciso se ocupar constantemente com Chéssed e não deixar passar um dia sem a prática de boas ações
Praticar boas ações também inclui diferentes níveis. São tantos que não poderíamos descrevê-los aqui como o fazemos nos capítulos do livro Ahavat Chéssed (“A Arte de Amar o Bem”). O principal é que o homem pratique tantas boas ações quanto puder, segundo suas posses materiais e condição física. Isto também deve ser feito diariamente, não deixando passar um dia sequer sem a prática de algum tipo de Chéssed, seja com o corpo ou com recursos materiais e conforme a oportunidade. Isto fará despertar a medida da Compaixão nos mundos superiores, como afirmaram nossos sábios: Assim disse o Altíssimo: “Os homens necessitam que seja feita bondade com eles próprios, e mesmo assim fazem bondade com os outros. E Eu, que Sou pleno de bondade, certamente preciso estendê-la às Minhas criaturas”. Vejam o que diz o Zôhar sagrado, na parashá Emor: Aprendemos que uma ação praticada no plano terreno desperta uma ação semelhante no mundo superior. Se uma pessoa faz algo neste mundo de modo condizente, esta ação desperta uma força concomitante no Céu. Se o homem pratica Chéssed neste mundo, ele desperta Chéssed nos mundos espirituais. Este Chéssed desce ao mundo e envolve todo o seu dia, pelo seu mérito. Se um homem age com misericórdia aqui na Terra, ele desperta misericórdia durante todo este dia e ela o envolve, pelo seu mérito. Este dia virá ao seu socorro num momento de necessidade, pois o modo como o homem age neste mundo faz o mundo espiritual agir de igual maneira consigo. Em nossos dias, principalmente, onde o atributo da severidade se incrementa cada vez mais, precisamos fortificar o espírito com atos de bondade sempre frequentes. Isto naturalmente despertará a mesma medida nos Céus e ela virá ao nosso auxílio quando mais precisarmos.
Capítulo 1
O que é “Ahavat Chéssed”?
DIA 2
Como é importante que o homem se apegue à virtude da bondade, como está escrito (Miqueias 6:8): “Ele te há declarado, ó homem, o que é bom, e o que o Eterno requer de ti, senão que pratiques a justiça e ames a beneficência ( Ahavat Chéssed )...” À primeira vista, seria suficiente que as Escrituras dissessem que devemos “praticar a ustiça e a bondade” ou que “amemos a justiça e a bondade”. Mas, quando a Torá proclama “Ele te há declarado”, significa que há algo nesta ideia que o homem não desvendaria por si, se isto não lhe fosse revelado. Todos sabem da importância de fazer justiça, pois esta verdade foi citada explicitamente na porção Mishpatim5 da Torá. A prática da bondade é igual e obviamente importante, como diversos versículos o ostentam. Entretanto, o verdadeiro significado da intenção das Escrituras fica evidente na seguinte afirmação de nossos Sábios ( San’hedrin 7a): “Se o casaco de uma pessoa foi confiscado por um veredicto judicial, ela deve cantar de alegria”. Podemos ilustrar esta afirmação com uma estória: Um bando de rebeldes vivia numa certa cidade. Muita gente havia se unido a eles. Para fortalecer ainda mais os laços entre os membros do grupo, decidiram confeccionar um uniforme para todos e tingi-los com a mesma cor. Deste modo eles se destacariam do resto da população e poderiam reconhecer uns aos outros mesmo à distância. Certo dia eles se reuniram na taverna local e beberam além da conta. Alguns se recusaram a pagar e por isto, o proprietário da taverna tomou-lhes os uniformes como penhor, até virem saldar suas dívidas. Os que perderam os uniformes foram embora, inconformados. Pouco depois, chegou aos ouvidos do rei que aquele grupo de rebeldes conspirava contra ele e sobre o modo como se vestiam. Suas atividades foram investigadas e todos os que estavam vestidos daquele modo foram capturados. Suas posses foram confiscadas e eles
pereceram. Os únicos que conseguiram escapar foram os que haviam sido obrigados a deixar seus uniformes ao taberneiro como penhor. Por isto não foram capturados e conseguiram se salvar. Disseram uns aos outros: “Pensávamos que o taberneiro nos causou prejuízo ao confiscar nossos uniformes. Na verdade ele nos fez um enorme favor e com isto salvou nossas vidas. Deveríamos ir agradecer-lhe por este ato. No futuro, devemos nos resguardar e não seguir os passos malignos de nossos amigos, assim não seremos apanhados como eles”. Do mesmo modo, cada um de nós deve saber que apropriar-se indevidamente do que pertence a outros pode lhe causar prejuízos e por a perder até mesmo os bens que adquiriu honestamente. Isto é ainda pior quando a aquisição de suas próprias roupas não está livre de desonestidade, como aprendemos com as palavras de Nossos Sábios (de acordo com San’hedrin 7a): Se um tribunal conclui que as roupas que a pessoa está vestindo foram adquiridas desonestamente e a obriga a restituí-las a seu legítimo dono, ela deve dar pulos de alegria, pois do contrário os Céus lhe confiscariam todas as posses e ela ficaria desprovida de tudo o que tem. Agora podemos compreender melhor o versículo acima, “Ele te há declarado...”. Se uma pessoa dedica toda sua energia para acumular fortuna e não se preocupa com a integridade da origem dos seus ganhos, que podem ter sido adquiridos por engodo, apropriação indébita e outros tipos de delito na área financeira, está enganando a si própria pensando que, no presente, ele terá proveito disto e que a prestação de contas final será feita somente quando chegar ao mundo superior. A isto deve-se o alerta do profeta, “Ele te há declarado...” acima citado. Sua intenção é nos transmitir uma mensagem contrária ao credo comum, segundo o qual acumular riqueza é o melhor que o homem pode fazer por si. Na verdade, a única vantagem que um homem pode tirar de sua fortuna é praticar atos de justiça e benevolência, além de inspecionar constantemente a idoneidade de seus negócios e se o modo como obtém lucros é conforme as diretrizes da Torá. Este é o caminho que o homem deve seguir para assegurar a perenidade de seus bens. É o que as Escrituras tencionam quando dizem “... senão que pratiques a justiça”. Mais adiante, o profeta acrescenta, “E ames a beneficência”. Aqui a intenção é transmitir a seguinte mensagem: as pessoas devem ponderar sobre a forma como obtém suas posses
– se estão isentas de atos desonestos –, acreditando que permanecerão suas pelo bem que praticaram e que tudo lhes será concedido a seu tempo. E que devem praticar o bem e serem caridosas de acordo com suas posses. Do contrário, Deus o livre, sua riqueza começará a minguar, como relata o Talmud (Ketubót 66b) no incidente de Nacdimon ben Gurion.6 Quanto à escolha dos termos “praticar a justiça e amar a beneficência”, ao invés de “agir com justiça e caridade”, o profeta chama nossa atenção para uma nova e importante lição, numa área onde a maior parte das pessoas descuida. Na verdade, todos nós praticamos atos de bondade. Principalmente quando nos sentimos pressionados. Se uma pessoa em estado de pobreza e desespero precisa do nosso auxílio e nos acorre uma ou mais vezes, é difícil evitá-la. Então decidimos auxiliar esta pessoa, mesmo se não o fazemos de coração pleno e alma pura. Por isto, o profeta exorta: “O que o Eterno quer de ti, senão que... ames a benevolência”. Não pense que já cumpriu seu dever apenas por haver praticado alguns atos de caridade. Pelo contrário, você deve nutrir verdadeiro amor por esta Mitsvá (preceito – plural: Mitsvót ). Obviamente, existe uma grande diferença entre a pessoa que faz o bem porque se sente pressionada e a que faz por amor genuíno. É possível ver isto em nossas próprias vidas, no modo como agimos em relação aos nossos filhos, nossa dedicação em conseguir alimentos e roupas, no casamento e tudo o que fazemos motivados por um amor despretensioso. Nestes casos, costumamos agir além da nossa obrigação. Todo pai procura o bem de seus filhos, mesmo quando não o pedem explicitamente. Ele o faz alegremente e de espírito grato. Do mesmo modo, a pessoa que ama a benevolência procura o melhor modo de fazer bem ao próximo e busca agir generosamente. Todos os aspectos desta virtude (conforme veremos mais adiante, se Deus quiser) também devem ser praticados por puro amor e não só pela obrigação de fazer o bem. Veja como esta virtude é importante. Na benção de agradecimento, no final da Tefilá (oração silenciosa), nós dizemos: “Abençoa a todos nós conjuntamente com Luz da Tua Presença; porque com o fulgor desta mesma Presença deste-nos, Eterno, Deus nosso, Torá (Lei) para a vida e amor pela beneficência”.
A “Luz da Sua Presença” foi revelada no Monte Sinai, como atestam as Escrituras: “Fizeram-te ver estas coisas para conheceres que Ele, o Eterno, é Deus” (Deuteronômio 4). Nossos Sábios afirmam que Deus, bendito seja, abriu as comportas dos Céus e dos mundos inferiores para revelar que Ele é o único Senhor e que reina sobre todos eles. Simultaneamente, foram reveladas diversas verdades fundamentais: que a Torá é a fonte da existência dos Céus e da Terra; que pelo seu mérito o mundo persiste e que sem o seu cumprimento ele deixará de existir, como disseram nossos Sábios ( Avodá Zará 3a): “Deus estipulou no ato da Criação que ‘Se o povo de Israel aceitar a Torá, muito bem, do contrário, farei o universo retornar ao caos’”. Portanto, se o mundo deixar de cumprir a Torá por um momento sequer, todo o universo ruirá, pois é a Torá quem assegura sua existência no plano superior, como citam os livros sagrados, com base no Zôhar . Durante aquela convocação no Sinai, o modo constante que o homem deve amar perseguir e praticar o bem ficou claro e patente a todos os que a presenciavam. Naquela oportunidade, dotados de elevado senso de profecia, eles puderam compreender como se mantém a continuidade da Criação, alcançando o entendimento de como a existência em sua totalidade, perpetuidade e sustentação, depende completamente da bondade de Deus, bendito seja, que preenche todo o universo, como declaram as Escrituras (Salmos 136:25): “é Ele quem fornece alimento a todos os seres vivos, porque Eterna é Sua misericórdia”, e noutro versículo: “A bondade de Deus preenche toda a terra” (ibid. 33:5). Outrossim, caso o Santíssimo, bendito seja, tratasse as Suas criaturas unicamente de acordo com a justiça pura, Deus nos livre, o mundo não existiria por um instante sequer, como dizem nossos Sábios no Midrash Tehilim, com referência ao Salmo 89:1-2: “Um Maskil , de Etan, o Ezrachita. Para sempre cantarei sobre a imensa bondade do Eterno...”. Perguntaram a Etan: O que sustem a Terra? Sua resposta: a Bondade, como está escrito: ‘O trono (celestial) deve suster-se pela Bondade’ (Isaías 16:5). Com que isto se assemelha? – com um banquinho. Uma de suas pernas ficou frouxa. Um seixo foi colocado sobre a perna frouxa para firmá-la. Por assim dizer, é o trono de Deus. Ele tornou-se frouxo. E como Deus o escorou? – com a bondade. Deste momento em diante Ele
declarou: ‘O universo será construído com a Bondade’ (Salmos 89:3). Por conseguinte, o homem ho mem deve deve buscar constan constantemen temente te esta vi virt rtu ude. Pelo seu mérito, ele sobrevi sobr eviverá verá tan t anto to neste mundo como no Mundo Vindouro, como explicaremos mais adiante por meio de passagens bíblicas e das palavras de nossos sábios.
Capítulo 2
Por que a Torá incentiva amar o Chéssed ?
DIA 3
Neste capítulo elucidaremos o motivo pelo qual, Deus – bendito seja! – exige tão firmemente do homem assimilar esta virtude, ao ponto de cada porção da Torá estar permeada por ela, como mencionamos na introdução. No primeiro capítulo explicamos por que o homem deve amar esta qualidade. Aqui, esclareceremos os diversos aspectos deste tema, com a ajuda de Deus. As Escrituras Escrituras registram que que “Deus “Deus criou o home homem m à Sua Sua imagem imagem”” (Gên (G ênesis esis 1:27). De acordo com os comentaristas, isto diz respeito aos atributos Divinos. Ele deu às Suas criaturas o poder de imitar Suas virtudes (Midót ( Midót ), ), de fazer o bem e agir bondosamente para com os demais, como está escrito: “Ele é bom para com todos e manifesta Sua bondade através de todos os Seus feitos” (Salmos 145:9) e também, “é Ele quem fornece alimentos a todos os seres vivos, porque Eterna é Sua misericórdia” (ibid. 136:25). Se examinarmos melhor este conceito, constataremos que a existência de toda a humanidade depende das virtudes da caridade e da bondade, pois não há quem não se confronte com circunstâncias variáveis durante a vida. Em todas as ocasiões precisamos da cooperação e assistência de outras pessoas para enfrentarmos estas situações. De que maneira? Às vezes precisamos da ajuda financeira de alguém, ou talvez de um empréstimo. Até mesmo uma pessoa rica pode ver-se numa situação como esta. Em outras ocasiões, precisamos de ajuda para encontrar emprego ou abrir um negócio rentável. Quase toda a humanidade é afetada por este tipo de necessidade. Na Torá, estas Mitsvót são são descritas como “Quando empobrecer teu irmão... deterás sua decaída... e viverá contigo” (Levítico 25:35). 25:35) . Às veze vezes, s, o ser human mano o precisa da simple simpless presença presença da pessoa querida, querida, como nas nas celebrações, cujo valor é exaltado pela presença dos convidados, que compartem a nossa
alegria (podemos citar, por exemplo, a Mitsvá Mitsvá de de alegrar os noivos durante sua boda). Pois o homem jamais pode ser feliz sozinho. Quando alguém está triste, se fortalece e se conforta na presença de outras pessoas (aqui temos a Mitsvá de confortar os enlutados e Mitsvá de outras do gênero, cujo objetivo é aliviar o fardo da pessoa que sofreu uma perda). Outras vezes, tudo o que alguém precisa é alguém para ajudá-lo a aliviar-se das preocupações, pois do contrário, adoecerá. Se alguém está longe de casa ou em viagem, precisa de ajuda para transportar seus pertences (a Mitsvá Mitsvá de de carregar e descarregar). Se o viajante precisa fazer uma pausa em sua viagem, deve contar com a hospitalidade alheia e ser tratado com dignidade, de modo a sentir-se querido (esta Mitsvá Mitsvá inclui inclui todos os tipos de viajantes – dos mais pobres aos mais abastados –, como elucidaremos no primeiro capítulo da próxima parte do livro). Se uma pessoa está doente, precisa de companhia e visitas que se interessem por sua condição, ajudando a acelerar seu processo de cura (a Mitsvá Mitsvá de de visitar os doentes). Quando cumprimos nosso tempo na terra e passamos para o plano superior, dependemos de outras pessoas para receber o único ato de caridade que não pode ser devolvido. A regra regra é: o mun mundo não não pode existir existir sem a virtud virtude e da bondade. bondade. Portanto, Portanto, a Torá especifica repetidamente que devemos nos empenhar em incorporar esta virtude à nossa personalidade. Podemos afirmar que nossos Sábios queriam nos transmitir este conceito quando disseram que “o mundo se mantém sobre três coisas: a Torá, o trabalho Divino e atos de bondade” (Pirkê ( Pirkê Avot 1:2). 1:2). Também podemos afirmar que o mais almejado de todos os objetivos humanos é merecer estar na presença de Deus e deleitar-se com o resplendor da Shechiná (Presença Divina). Shechiná (Presença Este é o prazer verdadeiro, e o maior entre todos os deleites que o homem pode encontrar. Porém, para isto, cabe ao homem apegar-se a Deus ainda durante seus dias e com todas as suas forças, como está escrito: “e apegar-se a Ele” (Deuteronômio 11:22), e isto significa “apegar-se” a suas virtudes, conforme explicaram nossos sábios. Ou seja, a pessoa deve compelir-se todos os seus dias para se apegar às virtudes do Eterno, bendito seja, que são permeadas exclusivamente de bondade e Chéssed , como está escrito “pois Ele deseja Chéssed ” (Miqueias 7:18). Então a pessoa terá o mérito de sentar-se eternamente diante de seu Criador e satisfazer a sede de sua alma. Mas,
quando, em sua vida suas virtudes não eram compatíveis com as do Eterno, e a pessoa não praticava bondade para com os demais, como ela pode apegar-se a Deus? E é a isto que alude o Talmud ( Eruvin 86a): “Ensinou Rava Bar Mari sobre o versículo (Salmos 61:8) “Que lhe seja permitido sentar sempre em seu trono em Tua presença” – Quando alguém pode sentar-se sempre na presença de Deus? Quando “bondade (Chéssed ) e fidelidade lhe sirvam de proteção ( man yintseruhu)” (ibid.). (Rashi comenta: Quando alguém se senta eternamente diante de Deus? Quando há ricos que praticam Chéssed , e preparam refeições para os pobres, e estes méritos os protegerão. Man – significa alimento). A palavra proteção é adequada, pois quem tem o mérito de estar em um lugar santo como este, na presença de Deus, Senhor dos Céus, precisa de uma proteção reforçada, já que lá estão presentes os anjos e os serafins, cujo hálito da boca de apenas um deles é capaz de queimar todo o mundo, conforme está escrito em Sifri Haazinu.7 E para isso é necessário um grande mérito, para evitar ser destruído pelos promotores da justiça. Portanto nos dizem as escrituras que aquele que possui a virtude da fidelidade (ou verdade – emêt ), que é a Torá, e também a virtude de bondade ( Chéssed ) estará protegido contra qualquer dano. Do mesmo modo, disseram nossos sábios (Talmud de Jerusalém, Taanit 84b): “E colocarei minhas palavras em sua boca” (Isaías 51:16) – estas são as palavras de Torá. “E com a sombra de minha mão te cobrirei” (ibid.) – estes são os atos de Chéssed . (Ou seja, através dos atos de bondade que o homem pratica, adquire o mérito de que Deus o proteja com a sombra de Sua mão.) Para que aprendas, que aquele que se ocupa da Torá e da prática de Chéssed é merecedor e se senta à sombra de Deus, bendito seja. E disto pode o homem concluir o quanto ele deve amar esta virtude. E quando ele tiver amor por esta virtude, toda vez que Deus lhe proporcionar a oportunidade de praticar algum ato de bondade, ele o encarará como um artigo muito valioso, e o cumprirá com plenitude, e amais envergonhará uma pessoa ao conceder-lhe um empréstimo, e, por estas ações, Deus irá abençoá-lo. E, além disso, quando ele amar esta virtude, irá também incentivar outros a que pratiquem Chéssed , como escreveu Rabi Ioná Gerundi 8 em sua Igueret Hateshuvá.
Capítulo 3
Por que se ocupar da bondade?
DIA 4
Creio ser necessário elucidar o comentário do Ialcút Tehilim sobre o versículo em Salmos 17:2: “‘De Ti emanará meu julgamento, de Ti que tudo vês com equidade’. Disse Rabi Levi: o Santíssimo, bendito seja, falou a David, ‘Estabelecestes um Sinédrio 9 sem propósito algum? Que eles te julguem!’ David respondeu ao Altíssimo: ‘Mestre do universo, Tu escreveste na Tua Torá (Êxodo 23:8), ‘E suborno não tomes’. Eles (o Sinédrio) temerão serem considerados culpados de se deixar subornar quando tentarem me julgar. Mas Tu te permites subornar, como está escrito em Provérbios 7:23, ‘Ele aceitará suborno do coração do ímpio’. E qual é a forma deste suborno? – Teshuvá – o arrependimento que o Santíssimo, bendito seja, aceita dos que pecaram neste mundo, assim como suas boas ações”. O Santíssimo, bendito seja, disse a Israel: Meus filhos! Arrependam-se enquanto as portas da Teshuvá ainda estão abertas, pois Eu aceitarei subornos oferecidos neste mundo, mas não os aceitarei quando Eu sentar no trono da justiça no Mundo Vindouro, como está escrito, ‘Ele não favorecerá quem Lhe oferecer suborno’ (Provérbios 6:35)”. À primeira vista, isto parece estranho. Que ligação poderia haver entre arrependimento e boas ações, por um lado e o suborno, de outro? Se o arrependimento pode não ser eficiente para impor-se ao atributo da justiça no Mundo Vindouro, o que teria a ver com suborno? O Eterno não é o Deus da verdade?! De fato, existem dois fatores pelos quais Deus controla o mundo: 1) a virtude da justiça (midat hadín) e 2) a virtude da bondade e compaixão. Sabemos que a recompensa ou a punição do homem no Mundo Vindouro serão determinadas pelo balanço entre as Mitsvót que cumpriu neste mundo e os pecados que cometeu, como disseram nossos Sábios: “Se
a maioria das ações do homem forem justas, ele será categorizado de justo ( Tsadic ); se forem iníquas, será categorizado como perverso (Rashá)”. O homem inteligente compreende que quando Deus senta-se no trono da Justiça, mesmo aquele que possui méritos excessivamente numerosos, poderá ser condenado pela corte Celestial (a menos que tenha se empenhado com todas as suas forças para cumprir todas as Mitsvót em todos os seus pormenores). Cada uma de suas Mitsvót será examinada minuciosamente com o intuito de revelar se foi feita com amor, reverência e alegria, bem como os demais fatores relacionados a cada Mitsvá, da maneira descrita no Sêfer Hacharedim. As Escrituras declaram (Eclesiastes 12:14): “Porque todos os fatos, mesmo os mais ocultos, quer sejam bons ou maus, finalmente por Deus serão julgados”. Certamente, Ele encontrará diversas falhas no cumprimento de muitas Mitsvót e elas serão excluídas do balanço final. Consequentemente, as faltas desta pessoa serão maiores que suas boas ações e os Céus a designarão como Rashá, Deus não o permita. Ainda que a pessoa tenha se arrependido de suas faltas, um exame minucioso da sua Teshuvá pode revelar que esta não foi feita de modo adequado. No entanto, se o Santíssimo, bendito seja, decide julgar o homem de acordo com Seu atributo de bondade e compaixão, isto certamente faz uma grande diferença, seja no caso de que todos os detalhes de um Mitsvá foram obedecidos, seja no caso de alguns deles serem negligenciados, pois algum mérito será seguramente encontrado – o que implica um aspecto de amortização da punição pelo não cumprimento ou cumprimento parcial desta Mitsvá, e assim os méritos desta pessoa não serão rejeitados. De certo modo, mesmo que seus pecados sejam maiores que suas boas ações, quando Deus exerce toda a Sua compaixão, a contagem dos pecados torna-se significativamente reduzida. pois muito serão considerados não intencionais ou atribuídos a alguma circunstância atenuante. Portanto, se forem subtraídos das iniquidades, os méritos da pessoa sobreporão suas faltas e o nome Tsadic lhe será imputado. Certamente, esta pessoa se arrependeu de suas muitas faltas e sua Teshuvá foi aceita, mesmo que esta tenha sido feita de maneira imperfeita. Obviamente, cada um de nós gostaria que Deus o tratasse segundo Suas virtudes da bondade e compaixão. Não obstante, estes atributos não são usados senão como um
complemento do julgamento e assim mesmo, de acordo à medida da justiça. Conforme a conduta do homem neste mundo tenha sido um exemplo destas características, ele atrairá para si, das fontes celestiais, os atributos correspondentes. Se a pessoa atua de acordo com a virtude da bondade em suas relações com o próximo, inspira o atributo Divino da misericórdia e Deus demonstra compaixão com o mundo, em seu benefício. A alma humana alimenta-se necessariamente desta conduta e por esta razão a pessoa merece que Deus estenda sobre si a mesma medida de consideração quando ela precisar ser tratada com compaixão. Nossos Sábios declararam (Shabat 151b): “Quem tem compaixão pelas demais criaturas merece ter compaixão dos Céus”. O Zôhar sagrado expressa este conceito na Sidrá Emor : “Cada ato realizado nos plano inferior gera uma reação correspondente no plano superior”. Quando uma pessoa pratica um ato meritório na terra, desperta o poder correspondente nos céus. Portanto, se o homem pratica um ato de bondade na terra, desperta a bondade celestial e coroa o restante de seu dia com esta virtude. Similarmente, se pratica um ato de misericórdia, coroa o dia com misericórdia e ela será sua protetora num momento de necessidade. Afortunado o homem que exibe uma conduta apropriada no plano terreno, pois dela depende o despertar da conduta correspondente no plano superior. Se durante a vida a pessoa jamais dedicou ou deu algo de si a outra ou não teve piedade das outras, reforçará o atributo da justiça celestial ( Midát Hadín). Logo, quando precisar de benefícios, será tratada de modo igual. Deus a tratará com a mesma atitude com que tratou os demais. Esta ideia é expressa em Isaías (3:10): “Diga aos justos que tudo será bom para eles, pois comerão o fruto de suas atitudes. Pobres dos malvados! Eles terão desgosto, pois serão tratados de acordo com a obra de suas mãos”. É a isto que nossos Sábios aludem quando ensinam que Deus, bendito seja, aceita nosso arrependimento e boas ações como suborno. “Boas ações” são os atos de bondade e caridade que praticamos neste mundo. Estes atos fazem com que o nosso arrependimento seja aceito nos céus, mesmo que sejam inadequados sob o puro ponto de vista da justiça. Os atos de cada pessoa fazem com que atraia para si os atributos Divinos da bondade da compaixão enquanto estiver viva. A própria virtude da justiça a tratará com bondade –
concedendo-lhe crédito no fim dos seus dias, por ter agido com bondade e arrependimento em todas as suas Mitsvót . Agora podemos podemos enten entender der o motivo motivo pelo qual, qual, através da Torá, Torá, Deus, Deus, bendito bendito seja, exige exige do homem incorporar este atributo, como bem o expressam as Escrituras (Miqueias 7:18): “Deus deseja a bondade”. O desejo do Eterno é que as pessoas de Seu povo sejam inocentadas no dia do julgamento de cada um e que, Deus não o permita, não sejam declaradas culpadas. Portanto Ele os comanda, insistentemente em toda a Torá, a seguir Seus caminhos de bondade e benevolência, para que Ele possa, no final, conduzir-se com relação a cada um de nós a partir desta mesma virtude.
Capítulo 4
A grandeza da bondade
DIA 5
Venha e constate você mesmo a grandeza desta Mitsvá Mitsvá.. Ela consta entre as Mitsvót “cujos “cujos frutos o homem consome neste mundo, enquanto seu estoque permanece reservado para o Mundo Vindouro”, como diz a Mishná Mishná ( (Peá Peá 1:1). 1:1). 10 Nossos Sábios (Talmud de Jerusalém, ibid.) acrescentam que a bondade perdura como crédito do homem até o fim de todas as gerações, como dizem as Escrituras (Salmos 103:17): “Mas por toda a eternidade é a benevolência (Chéssed ( Chéssed ) do Eterno, para os que O temem”. Por outro lado, o efeito da caridade (Tsedacá (Tsedacá)) dura somente três gerações, como está escrito (ibid.): “E Sua caridade para os filhos dos filhos”. Os atos de bondade são designados como “bondade Divina”, pois através deles fazemos com que Deus exerça este atributo Divi Di vino no neste mundo, como vimos no capítulo anterior. Os méritos também atuam em benefício do homem quando ele enfrenta dificuldades e salva-o dos problemas, como está escrito em Avod em Avodá á Zará (17b): Zará (17b): “N “Nossos ossos mestres ensinaram: Quando Rabi Elazar filho de Parta e Rabi Chanina, filho de Teradion, foram presos, Rabi Elazar disse a Rabi Chanina: Bem-afortunado sois! Pois foste preso por uma acusação! Pobre de mim que fui preso por cinco acusações! Rabi Chanina respondeu: Feliz és tu! Pois foste preso por cinco acusações, mas serás libertado. Pobre de mim! Fui preso por uma acusação, mas não serei libertado. Tu te ocupaste com o estudo da Torá e com atos de bondade, enquanto eu me ocupei somente com o estudo da Lei. Isto atesta as palavras de Rav Huna, que disse: Aquele que se ocupa somente com o estudo da Torá, é como se não tivesse Deus, pois está escrito (2 Crônicas 15:3): ‘Por muito tempo Israel esteve sem o verdadeiro Deus’”. O que significa estar ‘sem o verdadeiro Deus?’ – significa ocupar-se somente com o estudo da Torá como se Deus não estivesse para protegê-lo” (veja Rashi, ibid.) Veja também o
que diz o Talmud (ibid.) Rabi Chanina também praticou atos de bondade: foi tesoureiro de um fundo de caridade. Mas não fez tanto quanto poderia ter feito. O conteúdo desta passagem pode ser mais bem elucidado com um trecho do Midrash (Rute Rabá, Rabá, capítulo 5): “Veja e considere quão grande é o poder das pessoas que praticam atos de bondade, pois não se abrigam sob a sombra da manhã, nem sob a sombra do Sol, nem sob a sombra das asas dos Chaiót , Kerubim Kerubim e e dos Serafim Serafim,, mas sob as asas de Quem elas se abrigam? – sob a sombra Dele, com cujas palavras o mundo foi criado, como está escrito (Salmos 36:8): ‘Quão preciosa é a Tua bondade, ó Deus, à sombra das Tuas asas se refugiam os homens’”. Eis o que esta passagem nos quer transmitir: Quando a Corte Celestial conduz um ulgamento, muitos anjos de misericórdia sentam-se no Sinédrio celestial (na verdade formam a maioria do corpo jurídico Celestial, sentando-se à direita do trono Divino, com a finalidade de achar méritos na pessoa que está sendo julgada – por isto são chamados de Nedivim (generosos) de acordo com o Shaarê Orá 11). Contudo, estes anjos atuam de Nedivim (generosos) acordo com o atributo da justiça; mas quando o Santíssimo, bendito seja, senta-se Ele próprio para julgar o homem, apenas o atributo da misericórdia é aplicado, como dizem as Escrituras (Salmos 118:8): “Melhor é confiar no Eterno do que nos Nedivim Nedivim”. ”. Mas Deus conduz sozinho um julgamento somente quando a pessoa praticou atos de bondade e ela própria abriu as comportas das fontes celestiais da bondade para jorrarem sobre si. É somente neste caso que o homem ganha o mérito de ter o Altíssimo, bendito seja, como seu único juiz. Isto é o que o Midrash Midrash pretende pretende dizer (Rute ( Rute Rabá 5:4): Rabá 5:4): “Veja e considere quão grande é o poder dos que praticam atos de bondade... como está escrito: ‘Quão preciosa é a Tua bondade, ó Deus’ (Salmos 36:8). ‘Quão preciosa’, na verdade, é o despertar da Tua bondade pelos teus filhos, que deste modo se tornam merecedores da proteção ‘sob a sombra das Tuas asas’ e não de Suas criaturas”. A mesma mesma idei ideia a é expressa expressa no Salm Salmo o 17:2: “De “ De Ti Ti eman emanará ará meu ju julga lgamen mento, to, de Ti que que tudo vês com retidão”. Ou seja, da Tua única presença, sem a participação da Corte Celestial. Também está escrito (2 Crônicas 18:18): “Vislumbrei o Altíssimo sentado em Seu trono e
todas as Hostes Celestiais sentadas ao Seu lado direito e ao Seu lado esquerdo” – “ao lado direito para inocentar e ao lado esquerdo para condenar”, como explicam nossos Sábios. Esta distinção é expressa no versículo: “Que os Vossos olhos olhem para a direita” – significando que, quando Deus julga tanto os justos quanto os perversos, Seus olhos buscam méritos até mesmo nos atos dos perversos, levando em conta as circunstâncias que os provocaram. Isto não acontece quando a Corte Celestial senta-se para julgar. Neste caso quem está sendo julgado não deve esperar uma atitude semelhante do tribunal. Agora podemos compreender a passagem em questão. Se um homem se ocupa com o estudo da Torá e com atos de bondade, desperta o atributo Divino da misericórdia. Quando ele estiver em dificuldades, Deus não o permita, o Altíssimo, bendito seja, ouvirá seu caso, lhe estenderá Sua benevolência e esta será a sua salvação. Mas isto não ocorre com quem se dedica só ao estudo da Torá e não pratica atos de bondade. Neste caso a bondade Celestial não se desperta em seu favor. Se mais tarde esta pessoa passar por alguma angústia, Deus o livre, e ao mesmo tempo sofrer uma acusação Celestial, não poderá impedir que as forças da justiça exerçam sua ação sobre si. Eis como nossos Sábios afirmam esta ideia: “Aquele que se ocupa do estudo da Torá e não pratica atos de bondade, equivale a quem não tem Deus”. O sentido desta afirmação é que a pessoa não poderá contar com o atributo da bondade Divina como escudo protetor, como se não tivesse Deus a seu lado para protegê-la das forças da justiça e como afastasse a bondade para longe de si. Ideia similar é expressa no Talmud ( Baba Cama 17a), de acordo com uma das opiniões ali apresentadas: “Quem é diligente no estudo da Torá e age com bondade, subjuga seus inimigos, como está escrito com respeito a José (Iossef Hatsadic ): ‘Com eles escorneará (= derrotará) povos juntamente, até as extremidades da Terra’ e adquire percepção intuitiva, como os filhos de Issachar, de quem está escrito (1 Crônicas 12:32): ‘E os filhos de Issachar compreendem os tempos... ‘.” É possível adquirir compreensão pelo mérito do estudo da Torá, como os filhos Issachar, mas só é possível derrotar os inimigos pelo mérito da bondade, como ocorreu a José, que fez Chéssed em grande escala. José proveu alimentos a diversos países durante os anos de fome, especialmente à família de seu pai, Jacó. Além disso, cuidou dos detalhes do
funeral de seu pai e isto também é chamado de Chéssed pelas Escrituras (Gênesis 47:29): “E farás comigo caridade (Chéssed ) verdadeira”. Depois de tudo o que foi dito aqui é preciso apreciar verdadeiramente a virtude da bondade, apegando-se a ela e ser salvo por ela de todas as dificuldades neste mundo e no Mundo Vindouro.
Capítulo 5
Recompensa: outros aspectos
DIA 6
Devemos nos aproximar intensamente da virtude da bondade! Ela é eficaz para despertar a misericórdia Divina com Israel, mesmo depois de usufruir e esgotar todo o mérito acumulado pelos patriarcas. 12 Nossos Sábios disseram (Talmud de Jerusalém, San’hedrin 10:1): “Rabi Iehudá filho de Chana disse em nome de Rabi Berachia: Deus disse a Israel: Meus filhos, se virem o mérito dos patriarcas e das matriarcas de Israel enfrequecer, empenhem-se em atos de bondade. Qual a razão para isso? – ‘Pois os montes se retirarão de onde estão, e as colinas serão removidas’ (Isaías 54:10) – ‘os montes se retirarão’, refere-se aos patriarcas e ‘as colinas serão removidas’, às matriarcas. Deste ponto em diante, ‘Minha bondade não se apartará de ti... diz o Eterno que se compadece de ti’.” Esta passagem transmite a seguinte ideia: Nosso patriarca Abrahão praticou e espalhou bondade e caridade pelo mundo, como descreve a porção Vaierá. Encontramos um modo de conduta idêntico em todos os patriarcas (Gênesis 18:19): “Eu lhe tenho dado atenção especial, de modo que ele ordenará a seus filhos e à sua casa depois dele, e eles guardarão o caminho do Eterno, fazendo caridade e justiça”. Como consequência, fizeram a bondade Divina se manifestar sobre todas as Suas criaturas. Antes do advento dos patriarcas, a Shechiná (Presença Divina) esteve confinada no sétimo firmamento. Com suas boas ações, nossos patriarcas causaram a descida da glória de Deus a este mundo, onde ela ainda permanece por esse mérito. Assim diz o Midrash (Bamidbar Rabá 13:2): “Veio Abrahão e a fez descer até o sexto, Isaac até o quinto... até que, no momento da revelação no Monte Sinai, a Shechiná desceu à terra”. Visto que o homem encontra-se confinado pelas dimensões do tempo e do espaço, também suas ações não têm poder de penetração além de um certo limite – o ponto mais distante é onde seus méritos podem alcançar. Então as Escrituras alertam: se virmos
exaurir os méritos dos nossos patriarcas, nós mesmos devemos despertar o atributo Divino de benevolência e caridade para este mundo, abraçando suas virtudes com as nossas atitudes. Por conseguinte, Sua bondade nos envolverá e jamais nos deixará, medida por medida. 12a (A expressão Ló iamush, implica em “nunca deixar”, como no versículo em Êxodo 13:22, Ló iamish – “a coluna de nuvens nunca deixará Israel”). Esta Mitsvá também contribui para a libertação de Israel do jugo das nações gentias, como ensina o Talmud, Berachót 8a. Sua importância excede a dos sacrifícios, como expressa o Ialcút (Oseias 522) com referência ao versículo em Oseias (6:6): “‘Pois Eu desejo benevolência e não oferendas’– O Altíssimo, bendito seja, declarou: ‘A caridade que vós fazeis uns com os outros é mais preciosa para Mim do que todos os sacrifícios oferecidos pelo rei Salomão’” “Salomão trouxe mil oferendas “ (1 Reis 3:41) . Esta lição é ainda mais enfática no Talmud de Jerusalém ( Peá 3a), que afirma que caridade e a pratica de Chéssed equivalem em importância a todas as outras Mitsvót da Torá. Diz o Midrash (Rute Rabá 2:14): “Rabi Zeira disse: ‘O rolo (Meguilat Rut ) não adiciona coisa alguma sobre os rituais de pureza e impureza, proibição ou permissão. Por que então foi compilado? – Para ensinar quão grande é a recompensa dos que praticam a bondade”. Esta passagem refere-se a Boaz, que ganhou o mérito de ser progenitor de David e seus descendentes, para quem a realeza de Israel permanece reservada para sempre. As chuvas também são concedidas pelo mérito da bondade, como nota o Talmud de Jerusalém no tratado Taanit (14b). Se uma pessoa foi condenada à morte por decreto Divino, Deus não o permita, ela pode ser salva pelo mérito do Chéssed que praticou (Midrash Tanchuma, Kedoshim). O Chéssed também é eficaz em salvar o homem das garras de suas paixões, como encontramos no tratado Avodá Zará 5b: “Abençoados sejam os filhos de Israel. Quando eles se ocupam com Torá e atos de bondade ( Guemilút Chéssed ), sua má inclinação é dominada por eles e não eles por sua má inclinação, como disse o profeta (Isaías 32:20): ‘Abençoados sejais, que semeiam sob todas as águas’.” O significado desta passagem é que a má inclinação tenta dominar o homem de duas maneiras: primeiramente, tenta distrair sua atenção para assuntos levianos. Logo, habitua
os membros de seu corpo a todo tipo de atividade contrária à vontade de Deus, bendito seja. Entretanto, aquele que se ocupa com Torá e atos de bondade consegue subjugar suas inclinações e as conduz sob seu controle. Através da Torá absorvemos os ensinamentos do Deus vivo e santificamos os poderes da mente ao mesmo tempo em que nossos atos de bondade santificam os órgãos do corpo, pois os colocamos a serviço do Rei do Universo. Está escrito (Deuteronômio 10:12, 11:22): “... qual é a coisa que pede o Eterno, teu Deus, de ti? ... que andes em todos os Seus caminhos” e (Êxodo 18:20) “... e os farás saber o caminho por onde andarão”, referência aos caminhos da bondade do Altíssimo, bendito seja, como afirmam nossos Sábios. Deste modo, o homem adquire imunidade às investidas de sua má inclinação e passa agir da forma correta. A pessoa que é constante no cumprimento desta Mitsvá ganha o mérito de gerar filhos sábios, abastados e versados em Agadá13 nas palavras dos nossos Sábios: “Rabi Iehoshúa, filho de Levi, disse (Talmud, Baba Batra 9b): Aquele que pratica a caridade habitualmente, terá filhos sábios, abastados e versados em Agadá – ‘Sábio’ como está escrito (Provérbios 21:21): ‘Quem persegue a caridade encontra a vida’ (com relação à sabedoria, as Escrituras relatam (Provérbios 8:35): ‘Quem me encontra, encontra vida’ – Rashi); ‘abastados’ – como está escrito (ibid.): ‘E encontrará prosperidade’; versado em Agadá – como está escrito (Provérbios 3:35): ‘O sábio herdará honrarias’ (ou seja, a exposição homilética da Torá em público atrairá grandes plateias e lhe trará honras – Rashi). Aqui Rabi Iehoshúa fala sobre “caridade”, mas refere-se igualmente a todos os atos de bondade, pois o versículo diz: “Aquele que persegue caridade e atos de bondade”. A razão pela qual o sábio limitou-se a falar somente em “caridade” parece esclarecer que a recompensa de “vida, prosperidade e honra” seja concedida a cada virtude em separado, e não às duas conjuntamente. Todas as bênçãos da Torá possuem esta característica, como vemos no versículo (Deuteronômio 28:22): “E virão sobre ti todas as bênçãos e te alcançarão, pois obedecerás a voz do Eterno, teu Deus”. Tana Devei Eliahu (final do capítulo 26), comenta:
“Quando estas bênçãos chegarão a ti? – Se obedeceres ao Altíssimo, teu Deus e andares nos Seus caminhos, os caminhos dos Céus. E quais são os caminhos dos Céus? – Assim como Ele é misericordioso e tem compaixão até mesmo com os maus, recebendo-os e aceitando sua Teshuvá, assim como Ele alimenta e sustenta todas as criaturas – seja você também misericordioso com os outros, ampare o próximo e ajude teu semelhante. Outra explicação: Quais são os caminhos dos Céus? – Ele é benevolente e estende Sua bondade tanto aos que O conhecem quanto aos que não O conhecem – Ele dispensa bondade em abundância e pende Suas ações para a caridade; faz tu também como Ele e presta favor ao teu semelhante, pratica caridade para com o próximo e pende tuas ações para a bondade. De tudo o que dissemos aqui, é possível ter uma ideia da grandiosidade desta virtude – a bondade. Feliz da pessoa que se apega a ela com todo o coração, pois com isto adquire mérito para as gerações seguintes.
Capítulo 6
Uma explicação mais ampla sobre a recompensa
DIA 7
Veja como é grande a recompensa dada a quem é bondoso com seu semelhante! Até mesmo as consequências indiretas dos seus atos lhe são creditadas como se partissem de si. Isto ocorre de diversas formas, como explicaremos aqui, demonstrando assim, a importância deste assunto.
1 Como isto pode nos afetar na prática: vamos supor que alguém tenha ajudado financeiramente uma pessoa enferma e que este auxílio ajudou-a a restabelecer a saúde. Quando forem determinar a recompensa desta pessoa, além do dinheiro que gastou com o doente ser levado em conta, os Céus a considerarão como se tivesse salvado a própria vida de quem restaurou a saúde. A evidência desta conclusão está nas palavras dos nossos mestres (Midrash Tanchuma, Mishpatim 15): “Assim disse Rabi Tanchuma: ‘Aquele que favorece o pobre empresta ao Senhor, e suas boas ações Ele remunerará’ (Provérbios 19:17). Quem provê os pobres é como um credor de Deus e Ele retribuirá, recompensando seus atos de bondade. Rabi Pinchás, o sacerdote, filho de Chamá, disse em nome de Rabi Reuven: O que significa ‘Ele remunerará?’ – Alguém pode pensar que se eu der uma moeda a um pobre, Deus me dará uma moeda como pagamento. Ao invés disso, Deus declara: Aquele homem faminto estava à beira da morte. Você o nutriu e lhe deu vida! Em retribuição, dar-te-ei vida também. No futuro, teu filho ou filha poderão estar enfermos ou à beira da morte. Lembrarei o que fizeste por aquele pobre homem e os salvarei da morte em teu mérito. É isto o que significa ‘Ele a remunerará’. Deus paga vida com vida”. Este versículo ensina outra importante lição. Alguém pode estar precisando de um favor como cortesia. Deus lhe pagará de acordo com seus atos. Se for de sua natureza ter piedade e fazer o bem gratuitamente com os outros, eles também lhe prestarão favores e lhe serão bons. O contrário também é verdadeiro: se não praticar o bem com o próximo, Deus
também o abandonará. Por isto as Escrituras ensinam: “Quem dá aos pobres, empresta a Deus e Ele lhe retribuirá por isso”.
2 Todos os benefícios advindos das pessoas que ajudou lhe serão creditados. Suponhamos por exemplo que uma pessoa perdeu tudo o que tinha e que alguém lhe emprestou uma quantia em dinheiro. A pessoa empregou esta soma de modo lucrativo e com isto conseguiu manter a família e a si próprio. Além disso, ainda proveu sustento a seus empregados. Neste caso, aquele que emprestou será considerado como se tivesse ajudado todas estas pessoas, pois, graças ao seu empréstimo, a pessoa pôde investir em seu negócio e prosperar. O ato original causou uma corrente de benefícios. O Talmud (Baba Cama 9a) conta um incidente semelhante: “Rabi Iochanan disse: roubar de um colega, até mesmo um centavo, equivale roubar-lhe vida, como está escrito (Provérbios 1:19): ‘Assim são os caminhos de todos aqueles ávidos por ganho; isto tirará a vida de seu possuidor’. Poderíamos pensar que isto se refere somente a ele e não a seus filhos e filhas, mas as Escrituras dizem (Jeremias 5:17): ‘Tu comerás o pão da tua colheita, assim como os teus filhos e as tuas filhas’. Podemos também afirmar que isto só se aplica aos casos diretamente implicados na ação e não aos resultantes de más ações, como roubar. Vejam este exemplo (1 Samuel 21:1): ‘E disse o Eterno a Saul e sua sangrenta casa, por ter morto os Gibeonitas’. Por que o versículo diz que Saul matou os Gibenonitas? Provavelmente porque destruiu Nov, a cidade dos sacerdotes ( cohanim), que os provinham com alimento e água (como pagamento pela madeira que cortavam e a água que os Gibeonitas extraíam para o Altar). As Escrituras consideram como se Saul tivesse matado também os Gibeonitas’.” 14 Aqui temos um exemplo de como é administrada a justiça Divina. É realmente espantoso notar como as atitudes dos homens são levadas em consideração mesmo se causam perdas ou danos indiretos aos outros. Não é preciso ser a causa direta do dano. Basta impedir, mesmo que de forma indireta, que uma pessoa provenha a outra um meio de sustento. Se o fizer, os Céus considerarão como se lhe tivesse ceifado a vida e enorme castigo lhe será aplicado. Sabemos que a medida de misericórdia Divina excede Sua medida de justiça. Castigos são reservados até a terceira ou quarta geração, ao passo que as bondades Divinas perduram até mil gerações (Êxodo 21:6) como explicam nossos mestres ( Tosefta Sotá capítulo 4). Imagine quanto benefício está reservado para quem faz um favor a seu semelhante e às
outras pessoas ligadas a ele. Todos os resultados positivos destas ações lhe serão creditados para o dia que receber sua recompensa. Uma vez que reflita sobre isto, você tentará ajudar seu próximo de todas as formas possíveis. Considere isto também: como podemos erguer nossos olhares para o Santíssimo, bendito seja, e pedir na prece Amidá “Sim shalom... Estenda sobre nós paz, bem-estar e bênção, graça, bondade e misericórdia...” – se não alimentarmos o desejo de tratar os nossos companheiros com compaixão e bondade? Deus dificilmente aceita os pedidos de quem não pratica a bondade. Isto vale especialmente para nossas preces diárias onde pedimos sustento ao Eterno, bendito seja – “Aquele que concede vida com bondade” –, conscientes de que precisamos de Sua total benevolência. Não obstante, quem pratica constantes atos de bondade deve esperar que seus pedidos de sustento sejam aceitos de bom grado por Deus, bendito seja, como afirmam nossos Sábios (Midrash Shocher Tov , capítulo 65): “Quanto a Ben Azai e Rabi Akiva, um deles declarou: Quem concede bondade, receberá boas notícias, sua oração será aceita, como está escrito (Oseias 10:12): ‘Semeiem de acordo com a vossa justeza, colham de acordo com a vossa bondade’. O que está escrito a seguir? – ‘É tempo de buscar a Deus’. Ele reza a Deus e sua oração é aceita: então, recebe a alegre notícia que seus pedidos foram atendidos. E disse Rabi Chanina: não estou em desacordo com a afirmação de meu mestre, mas venho adicionar a ela: ‘Mas eu, por Tua imensa misericórdia, entrarei em Tua casa’ (Salmos 5:8). Logo após, está escrito: ‘Responde-me segundo a veracidade de Tua salvação’ (Salmos 69:14)”. Se isto é verdadeiro quanto à prática da bondade com todo e qualquer judeu; é mais verdadeiro ainda quando se trata de prestar auxílio a um estudioso, para que ele possa se sustentar sozinho. Neste caso, o mérito de quem ajuda é imenso. Pois desta forma este erudito poderá dedicar-se unicamente ao estudo da Torá e isto também será creditado em favor de quem o assistiu financeiramente, pois a pessoa que o assistiu sentar-se-á ao lado dos eruditos na “Academia Celestial”. Nossos Sábios expressam esta ideia nos seguintes termos (Pessachim 53b): “Rabi Iochanan disse: Quem põe mercadoria no bolso de um erudito terá o privilégio de sentar-se à “Academia Celestial”, como está escrito (Eclesiastes 7:12): ‘Quem se abriga sob a sabedoria terá também a cobertura do dinheiro’.” ‘Quem põe mercadoria’ – para que o erudito tenha com que comerciar. ‘Se
abriga sob a sabedoria’ – o doador entrará na área reservada a este erudito, pois ele o sustentou susten tou com suas posses pos ses Rashi Rashi.) .) Esta afirmação não se aplica somente a mercadorias, mas a qualquer forma por meio da qual um erudito possa se sustentar. Falamos de mercadorias, porque antigamente o costume era vender artigos variados aos eruditos a preço de custo, para que ele as vendesse e se sustentasse com os lucros. O Talmud (Ketubót ( Ketubót 112a) 112a) faz um comentário sobre o versículo (Deuteronômio 4:4): “E vós, que estais unidos ao Eterno, vosso Deus, estais todos vivos hoje”: É realmente possível unir-se à Shechiná Shechiná? ? Não está escrito mais adiante (versículo 24), que “O Eterno, teu Deus, é um fogo consumidor”? Eis o significado desta passagem: Quem casa sua filha com um erudito (T ( Talmi almid d Chacham Chacham)) e quem se associa nos negócios de um erudito (investindo de seus recursos para que ele obtenha rendimentos e possa ocupar-se livremente do estudo da Torá Rashi Rashi)) e quem os auxilia com suas posses, é visto pelas Escrituras como se “estivesse unido à Shechiná Shechiná”. ”. Veja o capítulo 21, onde citamos literatura rabínica referente à grandiosidade da recompensa reservada para quem age desta forma.
Capítulo 7
A dimensão do dano em negar caridade e Chéssed
DIA 8
Nos capítulos anteriores elucidamos a grandeza desta virtude sagrada. Agora exporemos a natureza maligna da pessoa que nega-se a prestar auxílio e que cerra os olhos para a caridade. Aprendemos no Talmud (Ketubót ( Ketubót 68a), 68a), que “Aquele que fecha os olhos para a caridade, é comparado a um idólatra, como está escrito (Deuteronômio 15:9): ‘Guarda-te que não haja uma coisa perversa no teu coração Belial ... ... de modo que o teu olho seja mau para com teu irmão’ e com referência a uma cidade onde as pessoas são culpadas de idolatria está escrito (ibid. 13:14): ‘Saíram homens ímpios Benê Belial do do meio de ti’.” (Esta inferência é feita por semelhança de leis – Guezerá Shavá15). O versículo em Deuteronômio 15:9 também alude a quem se recusa a emprestar dinheiro, como vemos nos tratados de Guitin Guitin 37a 37a e Sotá Sotá 47b. 47b. Se alguém te chamar de Belial (sem (sem coração ou malvado), isto seguramente te irritará, mesmo que você e ele estejam a portas fechadas e ninguém mais esteja presente. Imagine agora como você ficaria irritado se a Torá te chamasse por este nome! Que vergonha e que humilhação você passaria quando fosse chamado aos Céus! Precisamos nos preocupar com o fato da pessoa que deixamos esquecida voltar-se para Deus, chorando por não a termos auxiliado, como segue o versículo em Deuteronômio 15:9: “...e ele clame contra ti ao Eterno, e haja em ti pecado”. Veja que a situação desta pessoa poderia ter mudado completamente se lhe prestassem ajuda, como apontam nossos Sábios (Temurá (Temurá 16a): 16a): “Quando um homem pobre aborda um homem rico e implora, ‘Ajuda-me!’ (ou seja, impeça minha falência concedendo-me empréstimo ou presente, para que eu possa me sustentar Betsá Betsá 32a 32a), ), se o rico o ajuda, melhor para si, mas se não o fizer, saiba que ‘Rico que ‘Rico e pobre encontram-se juntos; o Senhor é o Criador de todos eles’
(Provérbios 22:2). Quem fez o rico prosperar o tornará pobre e Aquele que fez o pedinte empobrecer o tornará rico. A literatu literatura ra rabínica rabínica também evi eviden dencia cia que, que, se alguém alguém se nega nega a aux auxililiar iar um um irmão irmão judeu judeu,, suas posses passarão eventualmente para as mãos de outras pessoas, deixando-o com a roupa do corpo. O versículo (Deuteronômio 28:47) expressa esta ideia: “Em troca de não teres servido ao Eterno, teu Deus, com alegria e com bondade de coração, pela abundância de tudo, servirás ao teu inimigo, que o Eterno enviará contra ti, em fome, em sede, em nudez e em falta de tudo”. Tana Devei Eliahu comenta: Eliahu comenta: “Como será esta fome? – quan quando do o pobre abordar o rico implo imploran rando do por uma uma gota de bebida bebida e o rico lhe lhe recusar, recusar, chegarão idólatras e lhe exigirão o melhor de seus vinhos. ‘Em nudez e falta de tudo?’ – quando o pobre abordar o rico para pedir-lhe uma túnica de linho ou lã para vestir e o rico não as der, chegarão idólatras e lhe tomarão a melhor de suas sedas”. Esta regra também se aplica a Chéssed . Suponha que determinada pessoa não queira servir a Deus com alegria. Um irmão judeu lhe pediu ajuda e ele não dispôs seus meios e recursos para proporcionar-lhe sustento e cumprir a mitsvá da Torá de “Emprestarás dinheiro ao Meu mitsvá da povo, ao pobre que está contigo...” (Êxodo 22:24). Se tivesse acudido o pobre em seu momento de crise, todo o bem que fez a ele retornaria a si no futuro. Mas como não o acudiu, estranhos inevitavelmente tomarão suas posses e ele não terá como recobrá-las. Mesmo se praticou algum tipo de caridade, mas não fez o melhor que pode, correrá o risco de perder dinheiro como consequência disso. Outras pessoas, que eventualmente participem de seus negócios também perderão o que investiram. (Veja Ketubót 66b/67a 66b/67a com relação ao empobrecimento da filha de Nacdimon ben Gurion). Quem se nega a prestar auxílio ou a fazer caridade será condenado ao Guehinom Guehinom,, Deus não permita. O Talmud traz o seguinte exemplo ( Betsá Betsá 32b): 32b): “Rav disse: Os ricos da Babilônia Babilôn ia descerão descer ão ao Guehinom ”. Seu pecado é terem se recusado a praticar atos de Guehinom”. bondade e caridade. Em Levítico Rabá (34:12) Rabá (34:12) encontramos: “Rabi Iehudá e Rabi Shimon disseram em nome de Rabi Iehoshúa filho de Levi: Que a mitsvá mitsvá de de ajudar os pobres amais pareça trivial aos vossos olhos – pois o não cumprimento invoca 24 maldições, enquanto sua prática merece 24 bênçãos. De onde deduzimos as 24 maldições? – Do versículo (Salmos 109:6, onde encontramos 24 expressões de sofrimento): ‘Nomeia sobre eles um homem tão perverso quanto sua iniquidade...’, e por que isso? – Porque ele não
lembrou-se de fazer caridade. E a recompensa de 24 bênçãos? Porque está escrito (Isaías 58:7,11, onde encontramos 24 expressões de felicidade): ‘Acaso não consiste ele em repartir teu pão com o faminto... o Eterno te guiará continuamente, fartará a tua alma mesmo em lugares áridos’.” Quem se nega a praticar bons atos ou a prestar caridade faz Deus afastar Sua paz de Israel, como menciona o Talmud ( Baba Batra 10a) a esse respeito: “Assim disse Jeremias (16:5): ‘Disse O Eterno: Não entre na casa do enlutado não se lamente nem chore sobre ele, pois Eu retirei deste povo a Minha paz, disse Deus, até mesmo a bondade e a misericórdia’. ‘Bondade’ refere-se a Guemilút Chéssed , enquanto ‘misericórdia’ refere-se à caridade”, (que outrora praticavam, mas já não o fazem Rashi). O Midrash Vayicrá Rabá (34) comenta o versículo, “Porque eles (Amon e Moab) não vos receberam com pão e água...” (Deuteronômio 23:5): “Por acaso o povo de Israel precisou de seus favores? Não desceu Maná, não jorrou água, não revoavam codornizes, nuvens de glória não os envolveram e os pilares de fogo não lhes mostraram a direção durante os quarenta anos no deserto?! – na verdade, trata-se de um ato básico de cortesia: Se um peregrino pede passagem, precisa ser recebido com alimento e água. Como Deus lhes pagou pela negação? Proibindo aos Amonitas e Moabitas de entrarem para a Sua comunidade (ou seja, nenhum homem, descendente paternalmente de Amonitas ou Moabitas, pode casar-se com uma mulher judia). Aqui podemos fazer uma inferência de um caso menor para outro, mais grave (Cal Vachomer 16): se quem negou-se a prestar auxílio a pessoa que não precisava deste, foi castigado com tanta severidade, maior será o castigo de quem se nega a prestar caridade a quem realmente precisa dela! Considere o tamanho da vergonha de quem nossos Sábios suspeitavam ser um descendente da “grande mistura de gente Erev Rav que saiu do Egito junto ao povo judeu (Êxodo 12:38).” Shabetai filho de Merinus foi até a Babilônia e rogou-lhes um empréstimo comercial (sobre o qual “compartiria” os lucros). Além de não lhe concederem o empréstimo, também se recusaram a lhe dar alimento. Ele então lhes disse: Estes são descendentes da grande mistura, como está escrito (Deuteronômio 13:18): ‘Para que o Eterno... tenha piedade de ti’ (Betsá 32b). “Quem é piedoso com as criaturas, certamente
descende de Abrahão, nosso patriarca.” (ibid.) Nossos Sábios declararam ( Iebamót 79a): “O povo judeu caracteriza-se por estas três virtudes: São modestos ( baishanim), misericordiosos e benevolentes (Gomlê Chassadim)”. Quem não tem estas três características não merece fazer parte desta nação. De fato, diversas fontes bíblicas e rabínicas afirmam explicitamente esta regra. Contudo, para ser conciso, limitar-me-ei a uma única e conclusiva passagem. Vejam até onde nossos Sábios descrevem a pessoa malvada, que se recusa a praticar atos de bondade, dizendo (Cohélet Rabá 7:4): “Quem repudia a caridade está repudiando a própria doutrina (da existência de Deus) cofer baicar ”. Com esta definição quiseram assinalar que Deus, bendito seja, é a fonte de toda a bondade e caridade. Seu propósito, quando criou o universo, foi permitir a Suas criaturas que adquirissem méritos para que Ele pudesse recompensá-las mais adiante com sua bondade e caridade. A Torá foi revelada e seus mandamentos ordenados, para atender a esta finalidade. As Escrituras afirmam (Deuteronômio 6:24): “E ordenou-nos o Eterno observar todos estes estatutos, e que temêssemos ao Eterno, nosso Deus, para que seja bem para nós...”. Por conseguinte, quem se recusa a aceitar este ponto de vista, dizendo “Para que preciso deste princípio?”– rejeita fundamentalmente a própria existência Divina, os Céus não o permitam. Por isso é preciso afastar de ti completamente este tipo de ideia, e apegar-se aos caminhos de Deus, bendito seja, que estão sempre permeados de bondade e caridade, para receber bondade neste mundo e no Mundo Vindouro.
Capítulo 8
Por que as pessoas são negligentes em cumprir esta mitsvá?
DIA 9
Nos capítulos anteriores dissertamos sobre a grande recompensa reservada às pessoas que incorporam a virtude da bondade. Agora examinaremos as razões pelas quais as pessoas são negligentes com relação a esta Mitsvá. Demonstraremos também os pontos falhos em seus argumentos. Começaremos apontando os cinco principais motivos pelos quais alguém se nega a praticar um ato de bondade: medo, ignorância, ilusão de estar isento dele, avareza e preguiça. Discutiremos um a um, com a ajuda de Deus.
MEDO. Algumas pessoas temem que o devedor não lhes restitua o empréstimo, por isso ficam relutantes em aceitar garantias. É preciso refletir bem antes de eximir-se desta obrigação. Primeiramente, se a quantia for pequena é preferível dá-la de presente e assim cumprir o que está escrito (Levítico 25:35): “E quando empobrecer teu irmão e encostar sua mão sobre ti, deterás sua decaída”. Certamente, é compulsório emprestar dinheiro neste caso, mesmo se houver risco do necessitado não poder devolvê-lo, pelo motivo descrito anteriormente. Mesmo se não pudermos aplicar estes motivos num caso específico, onde o montante a ser emprestado excede a obrigação prescrita pela lei, ou quando a Mitsvá “deterás sua decaída” não estiver envolvida – uma vez que o devedor forneça garantias confiáveis, não podemos nos eximir de aceitar seu o penhor (a menos que devedor seja uma pessoa violenta, que possa forçar o credor a devolver o penhor antes da dívida ser paga). Outro argumento com base no medo: a pessoa abordada teme precisar deste dinheiro em curto prazo. Este argumento tem alguma validade. Se ela precisa do dinheiro para as despesas de seu lar, certamente ela terá prioridade, pois sua vida precede a vida do próximo. Isto também se justifica quando lhe apresentam um investimento imediato ou quando lhe pedirem um empréstimo sem juros por um período demorado, pois nestes
casos é normal que uma oportunidade financeira demore a dar frutos. Mesmo assim, não é razão suficiente para negar um empréstimo de dinheiro a curto prazo a uma pessoa necessitada, deixando este dinheiro ocioso, à espera de uma oportunidade de lucrar com alguma negociação repentina – a menos que a pessoa vislumbre participar de um investimento financeiro real a curto prazo e que não possa ser feito senão com o montante de que dispõe naquele instante. Mas isto se aplica somente às pessoas que não possuem dinheiro em abundância e contam com seus investimentos para alimentar seus lares. A pessoa muito rica, que tem dinheiro ocioso, tem certamente o dever de emprestar parte dele a quem o peça e possa oferecer garantias confiáveis, mesmo que a soma pudesse ser investida de outra maneira e lhe dar lucro. O mandamento positivo, “Quando emprestares dinheiro aos pobres” (Êxodo 22:24), é compulsório a todos os indivíduos, cada qual de acordo com suas posses (Sêfer Hachinuch, Mitsvá 66). Neste caso, os meios de um rico são certamente suficientes para o seu sustento e a ele não se aplica o princípio, segundo o qual sua vida precede a do próximo. O homem rico estaria usando este dinheiro somente para aumentar sua fortuna, enquanto o pobre o necessita para prover suas necessidades básicas. Se aceitássemos o argumento do rico que precisa de seu dinheiro para outro fim, não haveriam limites; ele pode sempre alegar que um negócio iminente está por lhe trazer lucro. Por conseguinte, argumentará que precisa de tudo o que tem e se eximirá constantemente da Mitsvá de emprestar aos pobres. Existe uma terceira razão, também motivada pelo medo, que faz com que a pessoa se negue a prestar auxílio aos outros. Trata-se do receio de que o público tome conhecimento de sua fortuna. Se o souberem, pressioná-lo-ão a doar mais para causas comunitárias. Esta preocupação é certamente infundada. Quem pode se eximir de cumprir um mandamento positivo da Torá alegando este tipo de receio? Isto não é menos legítimo que o argumento de quem não empresta porque receia perder seu dinheiro. Inúmeras passagens bíblicas e rabínicas indicam que este pecado é grave e que a punição é a perda das posses neste mundo, como está no Talmud ( Ketubót 66b). Tana Devei Eliahu Zuta (capítulo 4) afirma: “Se você deu dinheiro para caridade, adquirirá posses. Se adquiriu posses, doe-as para caridade enquanto estiverem em tuas mãos. Adquire este mundo com tuas posses e herdarás o Mundo Vindouro. Pois se não as usar
para caridade, te abandonarão, como está escrito (Provérbios 23:5): “Se você piscar os olhos para ela (a riqueza), já se foi”. É preciso confiar que ao cumprir a vontade de Deus com nosso dinheiro, nada de mal ocorrerá. Ao invés disso, nossas posses receberão uma bênção e aumentarão, como está escrito (Deuteronômio 15:10): “Portanto, faze todo esforço para dar-lhe e não te sintas mal em dar-lhe, uma vez que o Eterno, teu Deus, te abençoará em todos os teus empreendimentos”. O que vale para a caridade também vale para os atos de bondade, como estudamos nos capítulos anteriores. Portanto, mesmo que alguém tenha que aumentar suas doações para caridade, pois ganhou a reputação de ter acumulado fortuna, não deve se importar com isso, pois Deus seguramente lhe pagará pelo “prejuízo” que ele tem praticando esta Mitsvá. Considere esta situação: uma pessoa descobre um investimento que lhe fará lucrar milhares de dólares por ano. Como resultado, os outros saberão que enriqueceu e seus recursos aumentarão consideravelmente. Ela deixaria de aplicar seu dinheiro para evitar enriquecer e evitar que lhe peçam contribuições? Se agir assim, a considerarão uma pessoa tola. Um argumento similar pode ser aplicado ao nosso caso. Vale a pena desdenhar a vida eterna por causa de algumas moedas de prata? A vida eterna é adquirida ustamente com os empréstimos que fazemos a quem precisa, cumprindo um mandamento positivo da Torá. A recompensa pelas Mitsvót é infinita. Quem empresta dinheiro merece abrigo sob as “asas” do Altíssimo, bendito seja, no Mundo Vindouro, como ensinam nossos Sábios. Existe outra forma de enfrentar este argumento da má inclinação. A pessoa rica pode confiar suas somas destinadas a Guemilút Chassadím a agentes ou representantes de confiança, de modo a esconder sua identidade dos necessitados: o agente repartirá o dinheiro em seu mérito. Este assunto é de grande importância, como explicaremos, com a ajuda de Deus, no capítulo 14.
Capítulo 9
Refutação da ignorância
IGNORÂNCIA. Certas pessoas são negligentes com a prática da bondade por completa ignorância. Elas não têm consciência da importância e da obrigatoriedade desta Mitsvá e não fazem ideia da recompensa que ela traz. Consideram-na uma bonita virtude e conduta elogiável, mas não percebem que trata-se de um mandamento positivo da Torá, assim como Sucá, Lulav e Tefilin. Vejam, meus amigos, como somos desleixados com esta Mitsvá. Quanto esforço faz o judeu para construir sua Sucá, para comprar seu Lulav e Mitsvót afins! Ansioso por cumprir cada Mitsvá em todos os seus detalhes, jamais se arrepende de ter se empenhado tanto para cumprir um mandamento Divino, pelo contrário, alegra-se por Deus lhe ter dado a oportunidade de se engajar nestas Mitsvót e por ter sido capaz de cumpri-las à risca. (De fato, devemos nos alegrar ao refletirmos que o homem, afinal, é uma pequena criatura cujos dias na terra são contados e que está destinada a transformar-se em pó e cinzas; contudo e mesmo assim, a ela foi dado o mérito de servir ao Eterno, Deus dos Céus, assim como as hostes celestiais). Por outro lado, com que má vontade praticamos atos de bondade! O menor inconveniente é suficiente para nos afastar deles. Quando decidimos agir, o fazemos com relutância e tristeza, sem qualquer traço de prazer. Gostaria de descrever um caso particular, e as pessoas inteligentes saberão aplicá-lo a situações similares. Suponha que uma pessoa encontre outra na rua e lhe diga: “Irmão, pode me emprestar um pouco de dinheiro por algum tempo?” Mesmo se o interlocutor acreditar que o pedinte seja confiável para lhe devolver o empréstimo, encontrará inúmeras razões para não atender o pedido. Pode por exemplo alegar ser-lhe um grande esforço voltar para casa para pegar o dinheiro e por isto pedir-lhe que volte em outro momento e ainda, que venha até sua casa para lá receber o dinheiro. Pode também alegar que só tem uma nota de cem e que não deseja trocá-la ou mesmo pedir-lhe que aborde outra pessoa no momento. As desculpas são muitas. Se o pobre suplicar ajuda, o doador irá à sua casa onde guarda o dinheiro, mas o fará relutante e tristemente, sem demonstrar alegria por isto. Até mesmo sua expressão facial é capaz de piorar pelo incômodo que pensa lhe estarem impondo. Agora considere isto, meu amigo! Suponha que um homem de sua estrita confiança te aborde na rua e diga: “Rápido, irmão, vá para casa. Quero te contar a respeito de uma boa proposta de negócios. O investimento inicial é baixo... mas os lucros são altos. Após o
término da transação, você pode me dar uma soma modesta pela recomendação”. O que você responderia a esta pessoa? “Desculpe, mas estou muito cansado para ir a minha casa pegar o talão de cheques. Procure outra pessoa, ela fará o negócio”. Não! Você certamente correria para casa imediatamente e procuraria reservar o negócio para si. Logo ao constatar o sucesso do negócio, teria mais do que prazer em louvar quem te ofereceu tamanho bom negócio! Nosso caso é exatamente este. Quando alguém te procura pedindo um empréstimo sem uros, trata-se de uma transação de pequeno valor aos olhos do pedinte, que tomou o empréstimo. Pois ele ganhará não mais que uma pequena quantia com o pouco que você lhe emprestou. Por outro lado, você, o credor, que praticou o ato de boa vontade, foi abordado na rua para que pudesse realizar uma transação de grande valor e ganhar o mérito de cumprir um mandamento positivo da Torá, cuja recompensa é eterna. Alegra-te com isto! Recebe teu interlocutor com bom humor. E se Deus, bendito seja, te ajudou a ponto de você poder praticar este ato de bondade, você deve correr para cumprir esta Mitsvá, como está escrito (Provérbios 21:21): “Aquele que persegue justiça (caridade) e benevolência encontrará vida, caridade e honra”. (Nossos Sábios ressaltam que o receptor dá ao doador mais do que o doador dá ao receptor). É somente por conta dos muitos pecados que a má inclinação minimiza a importância desta Mitsvá aos nossos olhos – fazendo-nos enxergá-la apenas como uma prática louvável. O remédio adequado para corrigir esta atitude é estudar as passagens relevantes da lei judaica que esclarecem este tema. Recomenda-se em especial meditar sobre as parábolas dos nossos Sábios, que enfatizam em detalhes a recompensa que aguarda quem pratica a bondade. Deste modo, seremos capazes de subjugar o Iétser Hará (má inclinação). 17
A ILUSÃO DE ESTARMOS ISENTOS. Há pessoas que se consideram isentas de praticar caridade e argumentam para com sua consciência: “Por acaso sou o único em toda esta cidade? Que esta pessoa vá e peça aos outros. Eles tem mais dinheiro que eu”. Este argumento é enganoso. Primeiramente, quem garante que os outros ajudarão? O Radbaz 18 escreve em sua responsa que, mesmo se alguém possui parentes ricos na cidade, mas eles não o ajudam, os demais habitantes têm o dever de ajudar esta pessoa. Se os seus parentes se desviaram das leis de Deus, por isto ela deve morrer de fome? Além disso, se alguém nos aborda pedindo auxílio, isto não nos isenta de ajudá-la
simplesmente porque na cidade há gente com mais possibilidades de fazê-lo. O que escrevemos anteriormente a respeito também é prova irrefutável disto. Em certas ocasiões as pessoas eximem-se de ajudar alguém porque no passado emprestaram dinheiro a outra pessoa e ela ainda não os pagou. Este argumento também carece de lógica. Se o outro não teve moral, isto deve se aplicar a todo o povo judeu? Enquanto consideramos o próximo confiável para nos devolver um empréstimo, não podemos nos eximir de fazê-lo – principalmente se esta pessoa nos fornece avalistas ou penhores que garantem o valor emprestado. Quanto à pessoa que não devolveu o dinheiro, existem duas possibilidades: pode ser uma pessoa rica que arbitrariamente decidiu reter a soma emprestada. Neste caso não há obrigação de emprestar-lhe mais dinheiro mesmo que ela forneça garantias confiáveis, pois ainda há o perigo dela levar o credor a um tribunal sob falsas alegações (para recuperar o penhor sem ter de pagar a dívida). Por outro lado, se o devedor não pode pagar – por ter empobrecido, por exemplo –, ninguém pode isentar-se de emprestar-lhe dinheiro, se desta vez ele puder oferecer garantias ou penhores confiáveis.
Capítulo 10
O mal da avareza
DIA 10
AVAREZA. Algumas pessoas evitam a Mitsvá da caridade por mesquinhez (elas sofrem por outros usufruírem de seu dinheiro). Nossos Sábios declaram (Sotá 47b): “Quando a mesquinhez e os predadores 19 se multiplicaram, aumentou também o número de pessoas que endureceram seus corações e cerraram os punhos para não emprestar aos pobres, transgredindo desta forma o que está escrito na Torá (Deuteronômio 15:9): “Guarda-te que não haja uma coisa perversa em teu coração...”. Este é um traço de caráter extremamente nocivo, pois leva as pessoas a se esquivarem de praticar atos de bondade, oprimindo em seus corações sentimentos sagrados como a piedade e a compaixão – fazendo-as tapar seus ouvidos para não ouvirem o grito de clamor dos pobres. Uma conduta como esta pode chegar a causar derramamento de sangue, como encontramos no Talmud (Sotá 38b): “Rabi Iehoshúa, filho de Levi, disse: o novilho cujo pescoço teve de ser degolado 20 é apenas uma consequência da avareza, como está escrito (Deuteronômio 21:7): ‘Nossas mãos não derramaram este sangue’. Poderia passar por nossas mentes que os sábios de uma Corte de Justiça queiram derramar sangue? O significado desta passagem é que uma pessoa encontrada morta viera ao nosso socorro e nós não cumprimos com nosso dever e a deixamos ir; talvez não a tenhamos percebido ou, mesmo que a tenhamos percebido, a deixamos partir sem alimentá-la ou sem prestar-lhe auxílio (ou seja, ela precisou de alimento, mas não o encontrou e quando viu um transeunte carregar provisões atacou-o e ele retaliou, matando-a Rashi)”. Vemos, portanto, que se alguém aborda um colega em busca de auxílio e este último não lhe prestou a devida atenção e o necessitado morreu como resultado de sua avareza, a Torá chama o negligente de assassino.
Nossos Sábios denunciaram esta característica maligna e declararam(ibid.): “Quem aceita a hospitalidade de gente mesquinha viola uma proibição, como está escrito (Provérbios 23:6): ‘Não coma o pão de um homem de mau olhado (mesquinho) e não deseje suas delícias... coma e beba ele lhe diz, mas seu coração não está com você’.” De um modo geral, o avarento suprime seus sentimentos de compaixão devotando seus esforços para aumentar sua própria fortuna. Não empresta nada a ninguém, muito menos seu dinheiro, a menos que possa ganhar algo com isso. Às vezes, sua desenfreada mesquinhez e avidez por lucro o fazem desdenhar qualquer vantagem que lhe possa advir por emprestar dinheiro, mesmo que cobre juros (transgredindo a proibição da usura). As Escrituras alertam esta pessoa (Provérbios 28:22): “Um homem de olho mau se apressa pela riqueza e não sabe que a carência lhe virá”. O Midrash Tanchuma (Sidrá Behar ) também identifica a pessoa de “mau olho” que “se apressa pela riqueza” como um usurário, que tem pressa em tornar-se rico. Sua propriedade é amaldiçoada e as Escrituras adicionam: “E não sabe que a carência lhe virá”. O Sêfer Hachinuch estabelece que a avareza impõe uma barreira de ferro entre a pessoa e a bênção reservada a ela; este defeito de caráter também afasta a pessoa da compaixão Celestial, conforme nossos Sábios interpretam o versículo em Deuteronômio 13:18: “ ‘Para que o Eterno... tenha piedade de ti, se compadeça de ti e te multiplique’ – Quem é misericordioso com os outros, merece que os Céus tenham compaixão de si; mas quem não tem compaixão dos outros, não contará com a misericórdia dos Céus”. Nossos Sábios também declararam ( Arachin 16a) que “A praga da lepra abate o mundo por sete motivos e um deles é a avareza (a pessoa mesquinha não permite que os outros usem seus utensílios Rashi, como está escrito (Levítico 14:35), “E virá aquele de quem for a casa e denunciará ao sacerdote, dizendo: Parece-me que há chaga na minha casa”. A academia rabínica de Rabi Ishmael ensinava: (ele foi punido porque) reservou sua casa para uso exclusivamente pessoal (ou seja, não permitia que outros se beneficiassem dela Rashi). Como rezam as Escrituras (Levítico 14:45), esta casa precisa ser demolida: ‘E derrubará a casa, suas pedras, suas madeiras e todo o pó da casa’. Em nossos dias, no entanto, ainda que o Santíssimo, bendito seja, não deseje que pragas infectem as edificações, sabemos que maldições abatem as posses das pessoas, como diz o Midrash acima, medida por medida. Como esta pessoa foi mesquinha, recusando-se a ter piedade
ou compaixão de seu colega e por ter se recusado a permitir que usufrua de sua propriedade, ela privou-se da defesa que lhe proveria qualquer atitude de Chéssed , então a virtude da rigorosidade (Midát Hadin), chega e toma-lhe as posses. Inevitavelmente, sua casa é destruída e, pois como sabemos, o mundo não se mantém às custas da justiça pura e simples. A Pesikta ensina: “Havia uma pessoa com posses consideráveis. Mas tinha um caráter perverso e se negava a fazer caridade. Um dia, ela enlouqueceu, pegou uma tocha e ateou fogo às suas propriedades. Depois pegou todo o seu ouro e prata e os jogou ao mar. Então agarrou um machado e quebrou todos os seus barris de licor. O que causou este comportamento? Uma vez que ela não honrou a Deus quando possuía bens e fortuna, isso foi causado a este homem mesquinho que não quis fazer o bem e a caridade com suas posses”. O Ialcút (Reê) citado anteriormente declara: “Cuida não cessar tua compaixão, porque quem o faz identifica-se com idólatras e afasta-se do jugo Divino. A palavra usada nas Escrituras é Beliyal ” (Beli – sem; Ol – jugo). Esta passagem nos alerta para o fato de que os avarentos se apegam somente a seu dinheiro, e não a Deus. A Torá nos adverte por remez 21 no versículo em Êxodo 20:23: “Não fareis diante de Mim deuses de prata, nem deuses de ouro, para vós”. Não demonstrar compaixão e piedade pela pobreza alheia é, em si, um enorme pecado. Veja o que dizem explicitamente as Escrituras (2 Samuel, capítulo 12) com relação ao profeta Natan, que veio ao rei David e contou-lhe sobre o homem que possuía apenas um pequeno cordeiro: por causa de sua pobreza, o criou, alimentou com seu próprio pão e deu-lhe de beber de seu próprio copo. Veio então um homem rico, roubou o cordeiro e o abateu. Quando a sentença foi levada ao rei David, ele exclamou: “Deus vivo! O homem que fez isto merece morrer... porque não teve piedade alguma”. Um exame mais profundo desta passagem revela que a razão principal deste veredicto (de morte) foi a total falta de piedade com relação ao homem pobre (pois, pelo roubo e abate, o homem rico já havia sido multado em quatro cordeiros).
Devemos meditar profunda e constantemente sobre esta passagem. Infelizmente, devido a nossas muitas falhas, a falta de piedade ocorre com frequência, e está ligada a milhares de nossos atos, com enormes consequências. Ocasionalmente, além de negar ajuda aos necessitados, o avaro tenta influenciar seus colegas a agirem do mesmo modo com relação aos menos afortunados. Ora, ele não quer parecer o único malvado em cena. Então ultraja todos os que agem de forma diferente, incorporando a descrição dos nossos Sábios (Pirkê Avot 5:13): “Quem não faz caridade e não deseja que outros a façam, é uma pessoa perversa”. Às vezes, a natureza avarenta tem tamanho controle sobre esta pessoa, que nega a si mesmo o desfrute de suas posses. Com relação a ela, as Escrituras dizem (Eclesiastes 6:1): “Vi entre os homens um mal... alguém a quem foram concedidas pelo Eterno riqueza, prosperidade e honraria... e a quem, no entanto, foi negada a capacidade de aproveitar essas benesses...” As forças inferiores dominam esta pessoa, como mostra o Zôhar (Beshalach 65 a/b): “Rabi Aba comentou o versículo em Eclesiastes 5:12): ‘Um mal doentio tenho percebido sob o sol: riqueza guardada por seu possuidor, apenas para gerar seu próprio dano’. ‘Um mal doentio’ – por acaso existem dois tipos de mal, um doentio e outro, que não seja? Sim, existem. Há um tipo particular de mal, que sabemos por tradição ser proveniente do “Lado Esquerdo” e que emana emissários de punição. Quando estes querem sair, são levados à depressão do “grande mar” e depois saem, unem-se, cruzam os ares, pairam no mundo e se aproximam das pessoas. Cada um deles é chamado de ‘mal’ e é a eles que o salmista (91:10) se refere quando diz: “Nenhum desastre se abaterá sobre ti”. Quando algum destes desastres abate o homem, o fazem tornar-se avarento. Quando um coletor de caridade bate-lhe à porta, o mal convence-o a não fazer doações, pois isto o empobrecerá. Assim não lhe permite adquirir méritos por meio do seu dinheiro. Na verdade, a partir do momento que este ‘mal’ acomete uma pessoa, ela torna-se ‘doentio’, como um doente que não pode comer nem beber. O rei Salomão o proclamou com sua sabedoria (Eclesiastes 6:1-2): ‘Vi entre os homens um mal que prevalece sob o sol... existir alguém a quem foram concedidas pelo Eterno riqueza, prosperidade e honrarias, para que
nada falte dentro do que anseia sua alma, e a quem, no entanto, foi negada a capacidade de aproveitar essas regalias, que vão servir apenas a estranhos’... Se um homem confia em sua má inclinação e se alegra com ela, Deus não lhe dá poderes para dominá-la e por isto é ela quem o domina. (Quando o Iétser Hará o convence a não prestar auxílio a um colega, ele deixa-se convencer e assume esta atitude – então Deus não lhe dá poderes para dominá-lo.) Seus modos são como os de um homem enfermo que não pode comer nem beber e que guarda seu dinheiro, olhando para ele até deixar este mundo e outro homem tomar posse dele, tornando-se seu dono. Por isto o rei Salomão exclama: ‘Um mal doentio tenho percebido... riqueza guardada para o seu possuidor, apenas para gerar o seu próprio dano...’ Quem é o seu possuidor? Uma outra pessoa, que herdou seu dinheiro. Por que o primeiro não mereceu ser o possuidor de sua própria fortuna? Porque aceitou o mal, desejou-o e apegou-se a ele. Portanto, aquele que não apegou-se ao mal ganhou o mérito de apossar-se de sua riqueza. É a isto que o rei Salomão chamou se ‘riqueza guardada... para gerar seu próprio dano’.” Por conseguinte, é preciso que o homem afaste-se ao máximo da avareza e eduque-se para ser bondoso com os outros. Não deve deixar seu senso de piedade diminuir. Então, os outros também terão compaixão por ele, como está escrito: “Faze o bem, ó Eterno, aos ustos e aos retos de coração” (Salmos 125:4). O homem deve ter sempre em mente que o dinheiro que Deus, bendito seja, lhe confiou, não foi concedido somente para usufruto próprio, mas para ser estendido sob a forma de caridade e engajar-se em atos de bondade (Guemilút Chéssed ), como demonstraremos a partir de fontes bíblicas e literatura rabínica. Então esta pessoa estará bem neste mundo e no Mundo Vindouro.
Capítulo 11
Refutando a preguiça: a busca vigorosa do serviço divino
DIA 11
PREGUIÇA. Algumas pessoas deixam de praticar atos de bondade ( Guemilút Chéssed ), não porque temem deixar seu dinheiro ($50 ou $100) ocioso, mas porque tem preguiça de ir atrás dos devedores e cobrar o que lhes devem. Ao examinar este defeito, descobrimos que a indolência é um dos motivos mais frequentes que impedem os homens de servirem a Deus. A preguiça afasta os homens da Torá, das Mitsvót e da Teshuvá; pois é da natureza do indolente postergar tudo para amanhã e para depois de amanhã. O rei Salomão descreve este tipo de pessoa (Provérbios 24:31): “Eis que pragas tinham crescido por toda parte, ele estava coberto de urtigas e seu muro de pedra estava quebrado”. Nossos Sábios (Berachót 32b) afirmam que quatro assuntos demandam atenção especial: o estudo da Torá, boas ações, orações e boas maneiras. Ou seja, é necessário um constante esforço extra no campo das boas ações. Se o homem fraqueja, dizem os nossos Sábios em nome de Shmuel (Berachót 63a), não terá forças para postar-se diante das dificuldades (ou seja, quando prevaleça sobre ele a força do julgamento), como está escrito (Provérbios 24:10): “Se te mostrares fraco no dia da angústia, é que a tua força é pequena”. As Escrituras declaram também com relação à sabedoria e ao entendimento: “Se você o solicitar como prata, e procurar por ele como tesouros ocultos – então você compreenderá o temor do Senhor, e encontrará o conhecimento de D’us” (Provérbios 2:45). Temos de administrar nossos assuntos espirituais com o mesmo empenho que usamos para administrar nossos negócios mundanos. Suponhamos que uma pessoa tem um negócio. Ela não hesitaria em esperar por clientes atrás do balcão, mesmo num dia de frio. Pesaria a mercadoria para o primeiro cliente, depois para o segundo, para um terceiro e assim por diante... mesmo que seu lucro não fosse tão grande. Depois, sentar-se-ia
esperançosamente aguardando clientes, e quando aparecessem ficaria tão feliz que não sentiria frio algum. A razão para isto é que, para esta pessoa sua vida depende deste negócio. Se o faz mesmo sabendo que sua passagem pela terra é passageira, esta pessoa deveria despender igual esforço nos assuntos referentes a Torá e Mitsvót , perseguindo seu cumprimento e adquirindo conhecimento, como expressam as Escrituras (Oseias 6:3): “Saibam que é nosso dever buscar a Deus com veemência”. Este esforço não deve ser um fardo para nós. Mesmo que um devedor não pague sua dívida e para isto precise ser lembrado e relembrado, não é por isto que um credor deva esmorecer em seu dever de praticar Guemilút Chéssed , assim como aquele lojista não abandona seu negócio porque precisa de um esforço extra para cobrar seus devedores. Praticamente não existem negócios conduzidos sem linhas de crédito e sem esforços. Também não há negócios onde não haja perdas ocasionais. Onde está teu argumento, então? Que o lojista ganha no cômputo geral? E que este é seu meio de sustento neste mundo? Mas você, meu amigo, ganhará a vida eterna, assegurando que tua alma esteja ligada através do elo da vida com o Eterno, teu Deus. Quanto ao lojista, todo o esforço em cobrar o que lhe devem, não aumenta seu lucro nem um pouco. Em nosso caso, contudo, quanto maior o esforço em cumprir uma Mitsvá Divina, maior o valor da Mitsvá, como está escrito (Pirkê Avot 5:23): “A recompensa chega de acordo ao esforço”. Cobrar um dinheiro devido permite ao credor emprestá-lo novamente. A Torá indica isto, pois está escrito (Êxodo 22:25): “Se tomares em penhor...”, e logo após “Emprestarás dinheiro ao Meu povo...”. De acordo com a Mechilta (ibid.), a Torá nos ensina com isto bons modos (Derech Érets): em primeiro lugar é preciso conceder um empréstimo e só depois tomar algo como penhor. E o penhor em questão só pode ser tomado com a permissão de um Beit Din. O Talmud rege (Baba Metsia 113b) que tomar um penhor sem permissão de uma corte rabínica viola a proibição da Torá (Deuteronômio 24:10): “Quando emprestares alguma coisa ao teu próximo, não entrarás em sua casa para lhe tomar o seu penhor”. Também é proibido exigir em público o penhor de um devedor, como decreta o Choshen Mishpat , capítulo 97. Isto refuta a crença ilusória de que é preferível não cobrar um devedor, para não ter que emprestar-lhe novamente. A Torá ensina a conduta apropriada: é melhor clamar seguidamente a soma devida até recuperá-la, para poder emprestar este dinheiro novamente.
Neste capítulo descrevi alguns tipos de indolência à qual o Iétser Hará induz as pessoas. Na verdade, existem ainda mais instâncias onde a preguiça humana sucumbe à má inclinação e negligencia esta Mitsvá. Ao invés disto, devemos seguir o exemplo do lojista citado acima e perseguir os atos de Chéssed assim como conduzimos nossos negócios pessoais. Deste modo estaremos sempre nos ocupando com valores eternos. Uma vez que o homem se habitue com este comportamento, a promessa da Torá cumprir-se-á para ele (Provérbios 2:5): “então você compreenderá o temor do Senhor, e encontrará o conhecimento de Deus”.
Capítulo 12
Uma mitsvá para todos os dias
Nos capítulos anteriores explicamos a grande importância da virtude da bondade. Ela é eficaz em prolongar os dias do homem e expiar seus pecados. Ela o protege de todo o tipo de mal. Através de sua prática o homem abriga-se sob a “sombra” do próprio Deus, bendito seja e não sob asas de querubins. Usufrui os frutos de suas boas ações neste mundo enquanto o fundo permanece intacto para o Mundo Vindouro. Tem sucesso em criar filhos ricos e sábios. Torna-se merecedor de indulto no julgamento final e obtém outros benefícios exaltados. Por isso, o homem deve procurar incorporar esta sagrada virtude e amá-la intensamente, como dizem as Escrituras (Miqueias 6:1): “O que o Eterno requer de ti, senão que pratiques a justiça e ames a beneficência”, pois esta Mitsvá protege o homem até o fim das gerações, como explicamos no capítulo 4. É preciso ser especialmente cuidadoso para não negligenciar a prática da bondade, mesmo que por um só dia de nossas vidas, assim como fixamos um tempo certo para o estudo diário da Torá. Encontrei no Sêfer Shaar Hakedusha do rabino Chaim Vital, 22 que devemos lamentar todos os dias: “Pobre de mim! Passei mais um dia sem Torá e atos de bondade”. O teor desta afirmação é a declaração dos nossos Sábios, que o mundo se sustenta por três tipos de atividade sagrada: o estudo da Torá, os serviços do Templo e Guemilút Chéssed .23 Hoje em dia, estamos impedidos de exercer a segunda atividade, os serviços do Templo, desde o dia de sua destruição, como resultado dos nossos muitos pecados. Como só restam as outras duas atividades, devemos dar-lhes mais ênfase e reforço. Então nossas iniquidades serão perdoadas, como diz o versículo (Provérbios 16:6): “Por benevolência e verdade, a iniquidade é expiada”. Nossos Sábios ( Berachót 5b) explicam que a “benevolência” aqui se refere ao versículo em Provérbios 21:21: “Aquele que persegue ustiça (caridade) e benevolência, encontrará vida, caridade e honra”, enquanto “ verdade”
refere-se a Torá, como fica evidente no versículo (Provérbios 23:23): “Adquira verdade e não a venda...”. “Rabi Iochanan ben Zacai e Rabi Iehoshúa bar Chanania estavam aos pés do Templo Sagrado. Rabi Iehoshúa queixou-se: Pobres de nós! O lugar onde expiávamos nossas iniquidades agora está desolado. Mas Rabi Iochanan respondeu: Meu filho, não se lamente. Ainda temos um meio igualmente eficaz de expiação: os atos de benevolência, como está escrito (Oseias 6:6): ‘Pois Eu desejo Chéssed e não oferendas’.” Agora que não temos o Templo Chéssed também é eficaz em expiar os pecados como as oferendas. Devido aos inúmeros pecados, o altar não ficava um dia sem receber oferendas; por conseguinte, precisamos praticar atos de bondade todos os dias. É lamentável a constante lembrança de já não termos o Templo e as oferendas. Por causa dos nossos muitos pecados, nossa iniquidade prolifera a cada dia. Como resultado, o homem de hoje carece ainda mais de um meio para expiar seus pecados. Mesmo quando tínhamos o Templo, as pessoas daquela época precisavam aprimorar as virtudes da bondade e da caridade durante todos os dias de suas vidas, como diz explicitamente a Torá (Deuteronômio 11:22): “Se guardardes todo este mandamento... amando ao Eterno, vosso Deus, andando por todos os Seus caminhos e vos aproximando Dele...” E, conforme á explicamos, de acordo ao Sifrê, “andando por todos os Seus caminhos” refere-se a adquirir as características do Eterno, bendito seja, que são a benevolência e a caridade. A razão disto, diz o Zôhar , é que os dias do homem neste mundo tem continuidade, ou seja, a cada dia uma criação espiritual toma existência. No futuro, quando chegar a hora de cada um deixar este mundo, seus dias na Terra aparecerão diante do Criador para dar testemunho sobre esta pessoa. Por isto, o homem deve esforçar-se para manter todos os seus dias em completo estado de santidade. O estudo diário da Torá faz o homem alcançar o amor a Deus, como o comentário Sifrê explica o versículo “E amarás ao Eterno, teu Deus” (Deuteronômio 6:5). O mesmo se dá pela prática das Mitsvót , como mostram nossos Sábios (Kedoshim 40b): “Grande é o estudo que leva à ação”. É igualmente importante incorporar em nosso comportamento os atributos Divinos da bondade e da caridade pelo seu valor intrínseco. Deste modo, nos tornamos merecedores que Ele faça Sua luz resplandecer sobre nosso semblante, como prova o profeta (Isaías 58:10): “Se
abrires a tua mão ao aflito e satisfizeres a alma aflita, então nascerá a tua luz nas trevas... o Eterno... fartará a tua alma mesmo em lugares áridos”. É por isso que nossos Sábios afirmam inúmeras vezes “Aquele que se ocupa com o estudo da Torá e com Guemilút Chéssed ”. Note que os termos usados não são “Aquele que estuda Torá e pratica atos de bondade”. A intenção ao utilizar o termo “ocupar-se”, é colocar o homem sempre a postos para praticar esta atividade. Por conseguinte, os Sábios acrescentam (Baba Batra 10a): “Quem se habitua a praticar caridade...”, provandoo a partir do versículo (Provérbios 21:21) “Quem persegue a caridade e a benevolência...”, ou seja, que constantemente busca praticar esta virtude. Creio havermos discorrido longamente sobre este tópico, o suficiente para remover algumas ideias errôneas já entrincheiradas em certas mentes, como por exemplo, a ideia de que, se praticamos hoje uma boa ação para com outra pessoa, teremos cumprido nossa obrigação pelas próximas semanas, mesmo se, por acaso, outros atos de bondade estiverem ao nosso alcance. Pelo contrário. Enquanto estivermos vivos, neste mundo, temos o dever diário de cumprir esta importante Mitsvá, desde que tenhamos como fazê-lo e ainda que sejamos convocados inúmeras vezes num mesmo dia para isto. Ora, se nos pusermos a analisar todos os dias de nossas vidas sob esta ótica, perceberemos que a maioria estiveram vazios desta sagrada virtude e alguns vazios até mesmo de Torá e temor a Deus. Portanto precisamos tratar de santificar o restante dos dias de nossas vidas, para não deixar que passe um só dia sem nos ocuparmos com o estudo da Torá e a prática de boas ações. Não devemos nos perguntar como praticar atos de Chéssed no Shabat, pois Chéssed inclui uma variedade de atividades além de empréstimos sem juros. É possível perceber a grandeza destas duas atividades: o estudo da Torá e a prática de Chéssed . Deus nos ensina no próprio início do alfabeto hebraico, a suprema importância em prestar serviço a Ele. Nossos Sábios revelam (Shabat 104a): “As crianças tem acorrido às casas de estudo, dizendo coisas que não tem sido pronunciadas desde os dias de Josué. Alef Beit significa aprender o saber ( Alef aprender Bina sabedoria). Guimel Dalet significa fazer caridade com os pobres ( Guemol dar Dalim necessitados) (ou seja, agir benevolentemente com relação aos pobres.
Mesmo que atos de bondade também possam ser feitos para ricos Sucá 49, a Mitsvá é mais relevante quando ajudamos os pobres, como coloca o Talmud Baba Metsia 71a: “Um rico e um pobre – quem precede quem?”. Por que a base da letra Guimel tende para a letra Dalet? – porque é natural que a bondade se estenda para com os pobres. E por que o topo da letra Dalet estende-se em direção ao Guimel? Porque o pobre precisa estar disponível àquele que deseja praticar a benemerência. E por que a face do Dalet está na direção contrária ao Guimel? – porque deve dar-lhe em segredo para não envergonhá-lo. As letras Hê e Vav representam o Nome do Altíssimo, bendito seja. Parece-me que está ideia possa ser elucidada com a afirmação dos nossos Sábios ( Baba Batra 75b), com referência à passagem (Isaías 43:7): “Todo aquele que é chamado pelo Meu nome, e o que foi feito para a Minha glória...”: o significado de Alef Bina Guemol Dalim é que o estudo da Torá e Guemilút Chéssed , Hê Vav (o Nome de Deus) serão futuramente chamados em teu nome. (Pois o Próprio Deus estuda Torá diariamente, como diz o Talmud Avodá Zará 4b e Deus também alimenta e sustenta todos os habitantes do universo com Sua bondade e benevolência, como diz o Salmista 136:25: “é Ele quem fornece alimentos a todos os seres vivos, porque Eterna é Sua misericórdia”). Em Tana Devei Eliahu (capítulo 13), notamos que o Altíssimo, bendito seja, disse ao homem: “Meu filho, por que tu não aprendeste com teu Pai Celestial? Sentado em Seu trono, Ele estuda as Escrituras e o Talmud durante o primeiro terço do dia; Ele pronuncia Seus julgamentos durante o segundo terço e Ele dispensa caridade, alimenta e provém sustento a todos os habitantes e todos os frutos de Suas mãos, durante a terceira parte do dia. Se um homem declara perante Deus que estudou Torá desde os treze anos de idade, Deus lhe perguntará: ‘O que conseguiu por meio do teu estudo?’ (ou seja, ele terá que descrever o que aprendeu das Escrituras e do Talmud, como Tana Devei Eliahu afirma em outro contexto) e que traços de boa conduta adquiriu? Não te ocupastes com conversas tolas e comportamento indesejável? Como afirma o profeta (Amos 4:13): ‘Pois Aquele que formou as montanhas e criou os ventos, pode descrever ao homem tudo o que ele tenha conversado em vida’ “. Veja como é grande a recompensa por estudar Torá e praticar a bondade! O Talmud expõe o significado de todas as letras do alfabeto hebraico em sequência e continua com Zayin,
Chet , Tet , Iud , Caf , Lamed : “Se praticares a bondade, o Altíssimo, bendito seja, te sustentará (Zan) e te dará graça (Chen), te trará abundância (me-Tiv ), te deixará um legado (Ierushá) – como diz o Talmud Baba Cama 17a: “Aquele que se ocupa com o estudo da Torá e com a atos de bondade torna-se merecedor do legado da compreensão de Issachar 24 – e te colocará uma coroa (Keter ) no Mundo Vindouro ( Leolam Habá). Esta passagem significa que o homem não deve temer que ao estender sua mão para a prática da bondade e ao conceder empréstimos sem juros, seu capital e suas provisões diminuam, ou que, por ocupar-se com o estudo da Torá, tenha que se preocupar de onde virá seu pão. Esta passagem resolve a questão: “O Altíssimo, bendito seja, te proverá”. Contrariamente do que se possa pensar, a prática da caridade provoca o aumento de suas posses (como nossos Sábios declaram Sifrê, Deuteronômio 14:22: “Dê o dízimo Assêr para que te tornes próspero shetitashêr ” – o mesmo se aplica aos atos de bondade de um modo geral, como escrevemos no capítulo 6). Com relação à Torá, o homem que a estuda constantemente não sofre perdas financeiras como consequência de seu estudo, Deus o livre. Nossos Sábios (Midrash Tanchuma Beshalach 21) dizem que um jarro contendo maná foi guardado ‘diante do Eterno’ (Êxodo 16:33), como lição para as gerações futuras que os Céus proveem o estudo da Torá. O profeta Jeremias havia demonstrado ao povo de Israel que mesmo sem recorrer a causas naturais, o Todo-poderoso, bendito seja, seria capaz de prover o sustento de toda a população, como nos dias de então (veja Rashi sobre Jeremias 2:31). O Talmud (Shabat 104b) cita a expressão supracitada, “O Altíssimo, bendito seja, te proverá”, com o intuito de afirmar que o alimento de quem se ocupar com Torá e boas ações chegará por meios sobrenaturais. Também está escrito que “Ele colocará uma coroa por sobre ti, assim como um pai coroa seu amado filho”. Isto foi confirmado pelas Escrituras (1 Samuel 2:30): “Pois Eu honrarei aqueles que Me honram”. Ou seja, o próprio Deus os concederá honrarias de forma direta – e não por meio de agentes, “E aqueles que Me desprezam serão desprezados” (ibid.) (de forma indireta; Deus não os humilhará diretamente, mas esconderá Sua Presença, causando sua
vergonha durante o curso natural dos eventos). Pois a medida do bem excede a medida da punição.
Capítulo 13
Destinando parte dos ganhos para empréstimos
DIA 12
O capítulo anterior revelou importantes critérios sobre a grandeza da caridade e do dever de nos empenharmos em sua prática sempre que a oportunidade se nos apresente. Demonstramos também de modo convincente, como o Iétser Hará procura nos enganar com todo o tipo de argumentação, para que não sejamos benevolentes. Que meritório seria, portanto, se as pessoas a quem Deus abençoou com os meios adequados reservassem parte de seus recursos e os guardassem em casa (cada um de acordo com o que seus meios possibilitem), para um fundo permanente de Guemilút Chéssed (empréstimos e benevolência). Esta prática produz muitos benefícios. Primeiramente, o Iétser Hará, como sabemos, inventa todo o tipo de escusa e racionalização para nos dissuadir de praticar esta Mitsvá, como explicamos nos capítulos anteriores. É extremamente difícil resistir à sua persuasão durante todo o tempo e mesmo quando uma pessoa quer fazer caridade, nem sempre os membros de sua família lhe permitirão fazê-lo, levantando suspeitas sobre qualquer pessoa que se aproxime dela. Isto não aconteceria se tivessem separado um dinheiro para este fim, podendo, sem dificuldade alguma, cumprir todos os requisitos da lei referentes à caridade. Sei que o leitor pode estar pensando consigo mesmo: “Por que eu separaria este dinheiro como fazem os Fundos de Empréstimo comunitários, que emprestam somas pequenas? Melhor seria emprestar uma soma significativa uma única vez, a uma pessoa respeitável, pois apesar de tudo, Guemilút Chéssed pode se fazer tanto para com os pobres quanto com os ricos”.
É um engano pensar assim. Primeiramente, é uma Mitsvá maior emprestar para os pobres. Nossos Sábios explicaram que o versículo (Êxodo 22:24): “Emprestarás dinheiro a Meu povo, ao pobre que está contigo...” implica que se houverem duas pessoas necessitadas e uma delas for pobre, esta última tem precedência ( Baba Metsia 71a). Além disso, quem não puder dispor mais do que uma pequena soma de seus recursos para empréstimos sem juros e o destinar a uma pessoa rica, não terá como emprestar aos pobres. As Escrituras ensinam que (Provérbios 2:5): “Se você o solicitar como prata... então você compreenderá o temor do Senhor”. Nos negócios, se investimos pequenas somas numa série de pequenos investimentos, podemos esperar um lucro mais significativo do que se apostarmos todo o nosso capital numa simples transação. O mesmo se aplica neste contexto, quando uma pessoa doa para um número de fundos, sendo uma pequena quantia para cada um, como de uso, está praticando centenas de Mitsvót positivas da Torá no decurso de um ano. Isto não acontecerá se uma grande quantia for emprestada a um único indivíduo. Além disso, durante o período do empréstimo, esta pessoa pratica menos Mitsvót do que se tivesse destinado pequenas somas para diversos fundos. Similarmente, o Taná25 (Pirkê Avot 3:15) declarou, que o “O mundo é julgado com benevolência, e tudo depende da maioria das ações praticadas” (em outras palavras, o mundo é julgado de acordo com o número de ações praticadas: se forem boas, o veredicto será favorável e quem as praticou sairá vitorioso). Maimônides aponta para o fato da Mishná não se referir à “grandiosidade” das ações, mas à “maioria” delas, porque é preferível realizar um número maior de boas ações, ainda que seu teor ou resultado seja menos significativo do que uma simples, embora grandiosa, boa ação. Neste caso, suponhamos que um homem tenha dispensado pequenas somas para a caridade, mas que o tenha feito a um grande número de pessoas. Digamos que no total tenha doado $100. Outra pessoa deu uma nota de $100 a uma pessoa necessitada, membro de uma respeitável família. O segundo doador certamente cumpriu com a lei mosaica, pois ajudou seu colega de acordo com sua necessidade. Contudo, o mérito do primeiro doador o excede em muito. Ao cumprir em abundância os mandamentos ordenados por Deus, sua alma eleva-se cada vez mais por ter alcançado inúmeros méritos e adquire santidade, como está escrito (Números 15:40): “Para que vos lembreis e cumprais todos os Meus preceitos e sejais santos para com vosso Deus”. Além disso, o
primeiro doador habituou-se a praticar o bem por fazê-lo constantemente e por meio disto seu espírito incorporou esta virtude em maior grau com relação ao segundo doador, que precisou sobrepujar seu Iétser Hará uma única vez. Consequentemente, na contabilidade Celestial das Mitsvót , as ações deste último contarão apenas uma vez. Similarmente, se uma pessoa participa de vários fundos de empréstimos aos necessitados com pequenas somas, durante o curso de sua vida acumulará centenas de Mitsvót , o que não acontece com quem faz um único empréstimo, para uma única pessoa, mesmo que de um montante significativo. Há uma vantagem adicional nesta prática: uma vez que o dinheiro tenha sido separado para a caridade, outros membros da família também poderão participar desta Mitsvá se você estiver fora, a negócios, ou se estiver dormindo. Além disso, outras pessoas aprenderão do teu exemplo a procederem desta maneira e você será bem aceito por Deus por ter lhes servido de exemplo, como diz a Mishná (Pirkê Avot 4:13): “Rabi Simeão dizia: há três coroas: a coroa da Lei Divina, a coroa sacerdotal, e a coroa real; mas a coroa do bom nome excede a todas”. O bom nome que uma pessoa adquire pelas suas boas ações estimula outras a imitá-la. Como consequência, o Nome dos Céus é santificado. Parece-me ser a isto que nossos Sábios aludiram (Shabat 153a) quando perguntaram: “ ‘Quem é o homem que ganha o seu Mundo Vindouro? A resposta: ‘E seus ouvidos escutarão algo por trás de si dizendo, este é o caminho; andem nele’– (Isaías 30:21).” O Midrash Mishlê (capítulo 22) faz o seguinte comentário sobre o versículo, “Um nome é melhor escolha que grande riqueza” (Provérbios 22:1): “Veja como é importante ter bom nome; mesmo que um homem tenha mil dinares de ouro, se não tiver bom nome não terá adquirido nada”. A razão: se ele falhou em obter bom nome, provavelmente é porque não utilizou seu dinheiro para a caridade e para fundos de empréstimo sem juros. De que serviram então, todas as suas posses? – somente para prestar contas no futuro Àquele que depositou este dinheiro em suas mãos. De fato, tudo o que a pessoa possui além de suas necessidades é um fundo monetário que lhe confiou o Mestre do Universo, que lhe designou estes bens para administrá-los, ter piedade dos menos afortunados e fazer favores aos necessitados. O rabino Moshe Alshech faz este comentário sobre o versículo em Êxodo 22:24 – “Emprestarás dinheiro a Meu povo, ao pobre que está contigo”: Isto se compara a uma pessoa que deixou todo o seu dinheiro para um de seus filhos. A lei
presume que sua intenção era somente a de apontar seu filho como tutor da herança, pois é de se supor que este pai não deixaria os outros filhos desamparados. Por conseguinte, a parcela de cada um dos outros filhos ficou confiada a este único herdeiro. Quanto ao nosso caso: Deus fez certa pessoa enriquecer. É possível concebermos que Ele deixou todos os outros homens em estado de penúria? Eles porventura não são Seus filhos? Deus, portanto, designou este homem rico como um curador para dar auxílio aos pobres, sendo que a parte deles em sua fortuna excede sua própria porção”. É isto o que significa a passagem do versículo que diz “E ao pobre que está contigo”: Aquilo que estes pobres realmente necessitam, pertence a eles, mas foi depositado nas tuas mãos, em nome deles. Portanto você não tem direito de negá-los auxílio. Mesmo que a constante ocupação com esta Mitsvá possa ocasionalmente causar perda financeira a esta pessoa, ela não deve entristecer-se por isto, pois não há negócio no mundo, pequeno ou grande, onde existam somente ganhos e onde não existam perdas. São raros os empreendimentos livres de prejuízo. Não obstante, uma parcela razoável da humanidade embrenha-se dia e noite no mundo dos negócios e dos investimentos sem esperar obter lucro com uma única transação solitária e casual, mas com o montante de suas operações, que, no final das contas, determinarão se houveram lucros ou não. É recomendável que cada um separe uma pequena soma de dinheiro todos os anos para esta atividade (os mais ricos devem proceder de acordo com seus ganhos). Deste modo, mesmo que esta Mitsvá eventualmente ponha este dinheiro a perder, não haverá motivo para arrepender-se, pois o dinheiro já estava destinado para esta Mitsvá, do mesmo modo que ninguém se arrepende por exemplo de ter gasto dinheiro na aquisição de seus Tefilin. Esta asserção de nossos Sábios (Baba Batra 10a) também é bastante conhecida: “Assim como os ganhos do homem são determinados em Rosh Hashaná, suas perdas também são determinadas em Rosh Hashaná. Se encontrar graça aos olhos dos Céus, então (Isaías 58:7): ‘Estenderás tuas mãos aos pobres’, do contrário, Ele ‘trará pobres famigerados à tua casa’ (Rashi, em seu comentário Baba Batra 9a explica que estes ‘pobres famigerados’ são os romanos coletores de impostos). Um caso a destacar é o dos sobrinhos de Rabi Iochanan ben Zacai. Ele vira num sonho que estavam destinados a perder 700 dinares 26 naquele ano. De acordo a isto, os forçou a dar-lhe dinheiro para
caridade até sobrarem somente 17 dos 700 dinares. Às vésperas do Iom Kipur, o governo mandou prendê-los. Rabi Iochanan ben Zacai então lhes disse: Não temam. Vocês tinham que dar 17 dinares e é isto o que eles levarão. Disseram-lhe: Como o senhor sabia que isto iria acontecer? O Rabi respondeu: Vi isto num sonho. Então por que não nos contaste? – eles perguntaram. Porque – disse o Rabi – queria que vocês fizessem esta Mitsvá pelo seu próprio mérito”. Explicaremos agora o sentido de “suas perdas”, citado na passagem acima. É necessário que um homem tenha perdas? Ora, que Deus lhe dê menos benefícios ao invés de perdas. Eis o significado: Na verdade, não existem homens completamente justos neste mundo. Cada um de nós tem o dever de se purificar de seus pecados e, neste processo, sofremos dores. Mas Deus, em Sua misericórdia, troca o sofrimento corpóreo com as perdas financeiras. Tana Devei Eliahu o expressa deste modo: “Todos nós somos vendidos e redimidos todos os dias, como está escrito: ‘Em Tua mão confiei meu espírito e Tu me redimiste, ó Eterno, Deus da verdade’.” Esta citação implica que todos os dias, a alma de cada indivíduo sobe aos Céus e assina um registro de seus atos. Seus pecados o tornam sujeito às forças danosas. (O termo “vendido” usado aqui tem o sentido de “ser entregue”, como no versículo Juízes 4:9 “Porque o Eterno entregará (“venderá”) Sisserá nas mãos de uma mulher”.) Contudo, Deus, em Sua infinita misericórdia, resgata esta alma da extrema punição e comuta a sentença por alguma aflição ou dano financeiro. Se a pessoa tiver méritos, perderá suas posses no cumprimento de uma Mitsvá como caridade ou Guemilút Chéssed , o que de fato seria um ganho, por diversas razões. Primeiramente, por adquirir uma Mitsvá da Torá, trocando entulho por metais preciosos. Em segundo lugar, uma Mitsvá que custa dinheiro tem maior valor do que uma Mitsvá que nada custa, como explicado pelo Zôhar (Sidrá Terumá). Em terceiro lugar, a perda financeira será apenas temporária. O Todo-Poderoso, bendito seja, certamente o recompensará duplamente, como prometem as Escrituras (Deuteronômio 15:10): “Mesmo que seja muitas vezes, lhe darás, e que o teu coração não seja mau quando deres; pois por isto te abençoará o Eterno, teu Deus, em todas tuas obras e em tudo que possuir a tua mão”. Discorremos demoradamente sobre estes detalhes para que todos possamos saber com exatidão o que nos espera. Enfim, é inevitável que o homem sofra alguma perda e redução em suas posses como punição pelos seus pecados. Deste modo escapará de ser
condenado ao Guehinom e demais punições graves. Por que então cerrar seus punhos para não prestar caridade ou conceder empréstimos sem juros? Se o fizer, trará o “pobre famigerado” 26a para dentro de sua casa, ou quem sabe um médico para cuidar de alguém de sua família, como disseram nossos Sábios ( Shir Hashirim Rabá 6:17): “A casa que se fecha ao pobre abre-se ao médico”. Não seria preferível alertar-se – e abrir nossa casa aos pobres, além de separar dinheiro para a caridade e fundos de empréstimo sem juros? O sábio o fará e colherá todos os benefícios concomitantes de tal ação.
Capítulo 14
Guemilút chéssed – atos de benevolência
DIA 13
Retornemos ao tema de Guemilút Chéssed – os atos de benevolência. Sabemos que ainda não tivemos sucesso em remover todos os obstáculos do nosso caminho. O Iétser Hará pode aparecer de outra forma e tecer este argumento: “Por que ser mais justo e santo do que os outros? Eles são mais ricos que você e não estão nada preocupados em praticar atos de bondade! Todos se ocupam em acumular fortuna, que deixarão de herança a seus filhos. Seja como eles. Isto ainda te permitirá em dada ocasião fazer o bem aos outros”. Responderei a este argumento: suponha que duas pessoas te abordem oferecendo uma oportunidade para investir no mercado imobiliário. Ambas garantem que o valor das propriedades aumentará consideravelmente no decurso do tempo. Ambas gozam da melhor reputação possível como agentes imobiliários de primeira linha e os mais competentes neste ramo. Você mesmo confia na palavra deles e as tem como totalmente idôneas. Um outro investidor, tido como dos mais respeitados no ramo, também vê este negócio como uma oportunidade singular, das melhores no mercado. Você não correria para fechar este negócio o mais rápido possível, mesmo que para isto tivesse que despender um investimento considerável? Obviamente, você não deixaria este investimento para outros investidores, ainda que mais potentes e ricos – pois o sucesso não seria maior para eles do que para você, mesmo sendo um pequeno investidor. Na verdade se encheria de alegria por Deus ter lhe dado uma oportunidade de incrementar os ganhos, gozando da mesma reputação que os mais ricos. Meu amigo, quando se fala em buscar a virtude da benevolência com todas as nossas forças, duas das mais renomadas autoridades de todo mundo, além de serem dotados de inteligência excepcional – nosso patriarca Abrahão e o Rei Salomão – louvaram entusiasticamente esta prática, revelando-nos que o apogeu do sucesso se consegue por
meio desta atividade. Abrahão, nosso patriarca, de abençoada memória, foi o primeiro. Dedicou-se de corpo e alma a fazer caridade. Abrahão beneficiou as pessoas espiritualmente, ensinando-os a conhecer o Altíssimo, e materialmente, servindo-lhes alimento e bebida, trazendo-os para dentro de sua casa e tratando-os com respeito e deferência. Chegou a plantar uma árvore ( Eshel ) para o conforto de seus hóspedes. Todos estes atos emanavam de sua bondade e da bondade de seu caráter. Além disso, ensinou e estimulou os filhos a seguirem o mesmo caminho, assegurando-lhes que seu esforço será bem sucedido. Desta forma as bênçãos com as quais Deus o abençoou também se estenderiam a eles. O próprio Rei Salomão, de abençoada memória, afirmou que os que buscarem a caridade e a benevolência encontrarão vida, justeza e honras. (Se o requerimento para cumprir esta Mitsvá fosse apenas esporádico e não constante, a palavra “busca” seria inadequada). Além disso, o Altíssimo, bendito seja, deu Sua aprovação para esta atividade. Ele disse (Gênesis 18:17): “Esconderei de Abrahão o que irei fazer? Pois Abrahão virá a ser uma grande e poderosa nação, e serão abençoadas por meio dele todas as nações da terra. Porque o conheci e sei que ordenará a seus filhos e à casa depois dele, a fim de que guardem o caminho do Eterno, para fazer caridade e justiça, e realizar o Eterno sobre Abrahão, o que falou sobre ele”. Deste versículo, o Talmud (Iebamót 79a) deduz que os mesmos resultados serão conseguidos pela pessoa que se engajar em Guemilút Chéssed , visto que ambos – caridade e benevolência – têm um foco em comum: fazer bem aos outros. O que mais é preciso dizer a respeito? As Escrituras anunciam que a pessoa que se ocupa com esta atividade deixa um bom legado a seus descendentes, legado que perdura até a última das gerações, como encontramos no Salmo 103:17: “Mas por toda a eternidade é a benevolência do Eterno, para os que O temem”. Este versículo se refere à pessoa que se ocupa constantemente com atos de bondade, como explica o Talmud de Jerusalém ( Peá 3a). Isto em nada se assemelha à aquisição de um imóvel, que pode passar das mãos de seu dono a outro mesmo durante sua vida e certamente após ela.
Analisemos com atenção o que está escrito em Masséchet Calá (capítulo 1:2): “Dizem de Rabi Tarfon, que era extremamente rico. Contudo, não prestava caridade com os pobres (de modo condizente com sua fortuna). Certa vez ele encontrou Rabi Akiva, que lhe perguntou: Rabi, gostaria que eu adquirisse uma ou duas cidades para ti? Certamente que sim, respondeu e de imediato Rabi Tarfon confiou-lhe quatro mil dinares de ouro. Rabi Akiva tomou esta soma e distribuiu-a entre os pobres. Algum tempo depois, Rabi Tarfon encontrou-o e indagou: Onde estão as cidades que adquiriste com meu dinheiro? Rabi Akiva tomou-o pela mão e levou-o até o Bet Midrash, onde abriu um livro de Salmos diante dele. Começaram a ler até chegar no Salmo 112:9: ‘Ele ofereceu e distribuiu o que precisavam os necessitados; perene será sua benevolência’. Rabi Akiva então lhe disse: Esta é a cidade que adquiri para ti. Rabi Tarfon levantou-se e beijou-o. Meu mestre, meu guia – chamou-o – Meu mestre em sabedoria e meu guia de boa conduta. Rabi Tarfon providenciou então uma soma adicional e a distribuiu entre os pobres”. Rabi Akiva não havia mentido, Deus o livre, mesmo quando disse a Rabi Tarfon que lhe adquiriria uma cidade. O que ele tinha em mente eram os anjos e forças celestiais criadas por esta eterna e sagrada Mitsvá. Estes seres celestiais são denominados “cidade”, na linguagem do Midrash Vaicrá Rabá 31:5 em seu comentário sobre o versículo, “Um homem sábio escala a cidade dos poderosos...” (Provérbios 21:22), onde o termo “cidade” referese aos anjos e “homem sábio”, a Moisés). As honrarias que o homem recebe nesta cidade também são eternas, como ensina o versículo (Salmos 112:9): “Perene será sua benevolência, e com glória será exaltado”. Rabi Tarfon compreendeu isto e não guardou ressentimento contra Rabi Akiva, Deus o livre. Seu amor por Rabi Akiva tornou-se ainda maior; ele beijou sua testa por haver trocado em seu favor, propriedades efêmeras por palácios eternos. Quão apropriado é, portanto, que cada um de nós construa, enquanto estiver vivo, um lar que dure para sempre, um Hechál Chéssed , um Palácio de Benevolência para sua alma. Resta-nos somente o argumento do Iétser Hará, de que achamos necessário guardar nosso dinheiro – e não investi-lo em atos de bondade – para deixá-lo de herança para os nossos filhos e netos. Mas este argumento também é vão. Seríamos cruéis com nós mesmos somente porque amamos nossos filhos? Temos, portanto, o dever de sermos igualmente bondosos com nós mesmos. Considere este caso: suponha que alguém foi
acusado de traição. Sua sentença foi a seguinte: ser torturado com carvão em brasa ou pagar uma multa pesada. Alguém, em sã consciência, cogitaria ser melhor para si, por causa de sua preocupação em guardar dinheiro para os filhos, sofrer dores mortais ao invés de pagar a multa? Não está escrito em Jó (2:4): “Pele por pele, sim, tudo o que o tem o homem, ele o dará por sua vida?” Mesmo que a quantia exigida na multa valesse toda a sua fortuna e certamente fosse igual à metade ou um quarto do que tem, ele a aceitaria de bom grado, preferindo pagar a multa a sofrer qualquer tipo de tortura. Este homem não pensaria duas vezes em deixar menos dinheiro para seus filhos. Se o aconselhassem de outro modo, consideraria esta pessoa uma tola. Agora compreenda claramente o que tem à frente: você já sabe que o castigo do Guehinom é doloroso e amargo. Todos os que passam por ele, derramam tantas lágrimas quanto as existentes nas fontes de Shitim (corredeiras gigantes), como nossos Sábios descrevem (Eruvin 19a). As demais punições que esperam pelo homem após sua morte também são extremamente severas. Mas é possível redimir a alma e evitar todo este sofrimento, por meio do estímulo constante da inteligência de cada um durante a vida, desenvolvendo meios e caminhos para assistir aos pobres com caridade e benevolência. As Escrituras (Salmos 41:2) expressam esta ideia com as seguintes palavras: “Bemaventurado aquele que atenta para o debilitado, no dia do seu infortúnio, o Eterno o livrará”. O infortúnio ao que o versículo se refere não é senão o Guehinom, como está escrito (Provérbios 16:4): “E até o perverso, para os dias do mal”. Como pode uma pessoa não ter pena de si mesma? Como pode recusar escapar do Guehinom e de todas as outras terríveis punições? O versículo (Isaías 58:7): “Não esconda-se de tua própria carne”, é explicado por Tana Devei Eliahu do seguinte modo: não devemos temer praticar o bem e devemos ter piedade de nós mesmos. Isto confirma o ponto de vista que vimos explanando. Agora creio que refutamos todos os argumentos possíveis. Se Deus ajudou alguém a acumular fortuna e esta pessoa não dispõe de tempo para praticar atos de caridade, saiba que é melhor fazer esta Mitsvá por si mesma ao invés de utilizar um agente, como indica o Talmud (Kidushin 41a). Se não tiver tempo, deve proceder do mesmo modo que o faz em seus negócios: incumbir responsáveis de sua confiança para esta tarefa.
Em suma: esta atividade afeta a vida da pessoa para sempre. Por que deveria achá-la menos importante que seus interesses efêmeros e temporários? Se não puder indicar um agente para conduzir estas atividades em seu nome, deve procurar uma pessoa temente a Deus em sua comunidade e que esteja disposta a ocuparse desta Mitsvá, confiando a esta pessoa a soma que destinou para o cumprimento desta Mitsvá. O que dissemos até aqui não diz respeito somente aos mais abastados. Mesmo uma pessoa remediada deve separar uma pequena parcela de seus ganhos, como explicaremos mais adiante, e destinar, em seu próprio lar, um fundo permanente de Guemilút Chéssed 27 para efetuar pequenos empréstimos, de acordo com cada caso. Mesmo se emprestar uma pequena soma a uma pessoa, para suas compras de Shabat, estará cumprindo uma Mitsvá positiva da Torá, “Quando emprestares dinheiro ao Meu povo...” (Êxodo 22:24). Não faz diferença alguma se alguém dá mais ou menos, desde que suas intenções sejam puras. Como seria bom se este hábito fosse difundido entre o nosso povo, a nação santa – e se todos se ocupassem desta Mitsvá? O mundo estaria repleto com a virtude da bondade e todos os problemas e demais tribulações cessariam. Na minha opinião, é o que a passagem em Tana Devei Eliahu (23:9) quer nos transmitir: “Quando o povo de Israel se encontrava no Egito, todos estavam juntos... e fizeram um pacto conjunto para agir uns com os outros”. Este pacto indica que toda a população, dos mais ricos aos de meios mais modestos, fizeram o que puderam em prol uns dos outros. Esta é a virtude da bondade que resultou na redenção de Israel, como citamos acima em nome da Pessikta. Possa o Onipresente em Sua misericórdia nos fortalecer, para que adquiramos esta sagrada virtude, pela qual nos tornaremos merecedores de todo o bem, neste mundo e no Mundo Vindouro.
Capítulo 15
Empréstimos do tipo “heter iscá”
DIA 14
Graças a Deus, temos oferecido bons conselhos sobre como incrementar a prática da bondade no mundo. Contudo, pode parecer estranho ao leitor, que estejamos recomendando estabelecer um Fundo de Guemilút Chéssed na casa de cada pessoa, rica ou pobre. Aos que estiverem surpresos eu respondo: suponha meu amigo, que o Templo fosse restabelecido e o Altar reconstruído em nossos dias. Quanto esforço seria necessário para que cada um de nós peregrinasse a Israel ao menos uma vez na vida, para oferecer seu Corbán (sacrifício), dependendo de cada caso, para expiar seus pecados. Sua jornada, ida e volta, incorreria em despesas significativas. Contudo, os custos não lhe seriam pesados, nem para qualquer outra pessoa. Pelo contrário, esta pessoa se alegraria pelo mérito de poder oferecer um Corbán diante do Eterno, Rei do Universo, para redimir seus pecados. Na verdade, este é o verdadeiro propósito da vida do homem – cuidar de retificar suas iniquidades durante o curso de sua vida, para não se tornar repulsivo diante de Deus, para cujos olhos todo mal é repugnante. O mesmo raciocínio se aplica à prática de Guemilút Chéssed . Estamos certos que todos os que se empenharem nestas atividades terão assegurado a expiação para os seus pecados, de modo tão eficaz como se estivessem trazendo suas oferendas ao Templo e mais do que isso, como está escrito em Avot de Rabi Natan (capítulo 4:4): “Certa vez, Rabi Iochanan ben Zacai estava deixando Jerusalém. Rabi Iehoshúa o seguiu e avistou as ruínas do Templo. Rabi Iehoshúa disse: Pobres de nós por isto! O lugar onde o povo judeu expiava seus pecados agora jaz em ruínas. Rabi Iochanan respondeu: Meu filho, não fique triste. Pois temos outra forma de expiar nossos pecados, que se iguala e às oferendas. E que forma é esta? – Guemilút Chéssed , como disse o profeta Oseias (6:6): ‘Pois Eu desejo Chéssed e não oferendas’.”
Certamente, Deus nos dotou com alguma inteligência, para não deixar esta atividade em estado de negligência, e estabelecer um fundo para a caridade de acordo com as possibilidades de cada um. Deste modo, o indivíduo assegurará a expiação para os seus pecados, assim como fazíamos outrora no Altar. Analisamos largamente este tema com a finalidade de refutar de maneira total e resoluta os avanços do Iétser Hará sobre a vontade do homem – haja visto que eles tem se espalhado por diversas áreas, levando o homem a pecar e a praticar o inverso do que é desejável. Assim que a pessoa consegue economizar um pouco de dinheiro, o Iétser Hará a persuade a não emprestá-lo a ninguém, até mesmo à pessoa mais confiável. Ao invés disso, esta pessoa prefere confiá-lo a quem empresta dinheiro a juros, a fim de lucrar com isso. Isto resulta em muitos pecados e causa danos imensos, pois estas pessoas não estão cientes dos detalhes envolvidos na prática haláchica denominada Heter Iscá.* As pessoas levam seu dinheiro a um investidor e simplesmente lhe dizem, “Pegue este dinheiro e pague-nos juros por ele”, sem tomar precaução alguma para obter uma documento de Iscá, contentando-se somente com a documentação exigida pelo Estado. Como sabemos, a transgressão da proibição da Torá de cobrar juros afeta o próprio direito da pessoa à ressurreição – Techiát Hametim. * Heter Iscá é o modo segundo o qual a lei judaica permite empréstimos a juros. Isto inclui uma série de condições para tal permissão e uma consulta às autoridades rabínicas é imprecindível – N. do T. Em segundo lugar, mesmo se for redigido um documento válido de Iscá, seu uso diminui a prática de Chéssed no mundo. Nossos livros sagrados dizem que o motivo da Torá ter proibido emprestar a juros é incrementar a caridade no mundo, para que Deus, bendito seja, também trate o mundo com Chéssed . Antigamente, este mau hábito não era tão difundido. Somente quem acumulava muito dinheiro e o utilizava para obter o rendimento necessário para seu custeio pessoal, costumava fazê-lo. Certamente, não podemos exigir que alguém use todo o seu capital para empréstimos sem juros. (Neste caso também é preciso ser meticuloso com os requerimentos da lei judaica. Veja Chochmat Adam). Hoje este costume ganhou tamanha aceitação em certas áreas, que mesmo os que possuem somente alguns reais, onde o
lucro não pode ser muito grande, correm a investir seu pequeno capital, entregando-o em mãos de corretores. A virtude da caridade acaba passando desapercebida. É por isso que não se consegue dinheiro emprestado a não ser nas mãos dos agiotas. Meus amigos! Meus irmãos! Isto não é o caminho que Deus escolheu. Verdade seja dita; quando alguém empresta dinheiro por meio de uma transação Iscá, a proibição contra a usura não é transgredida, embora obviamente, se temos a possibilidade, temos também o dever de emprestar nosso dinheiro caritativamente a pessoais confiáveis ou a quem possa oferecer alguma garantia contra o seu não pagamento, conforme as “Leis sobre Empréstimos” (Choshen Mishpat ). É preciso confiar em Deus e acreditar que se estamos praticando a virtude da benevolência, Ele, em troca, nos tratará com Seu atributo de bondade e tudo o que está relacionado a isto. Os que se portam de modo contrário, não só diminuem a bondade no mundo, como, de um modo geral, colhem os frutos – neste mundo – de sua conduta, e muitos perdem o dinheiro investido, além de serem incapazes de recobrar o fundo no final. Para estas pessoas, vale a afirmativa dos nossos Sábios (Baba Metsia 71a): “A propriedade dos usurários fatalmente ruirá”. Os que emprestam dinheiro com base no Heter Iscá se parecem aos usurários num aspecto: eles aboliram a virtude da bondade. Com relação a isto, o Talmud (Ketubót 66b), cita o provérbio: “Quem quiser salgar (proteger) seu dinheiro, deve diminuílo (Chesser ); outros leem Chéssed – agir de forma benemerente com ele”. Esta máxima afirma que se reduzirmos nosso capital líquido, ou seja, se o usarmos para empréstimos sem juros ou para caridade, o dinheiro se manterá. Do contrário, ele se desfará, assim como a “carne que não é salgada”. (Aqui jaz uma das causas da pobreza entre os judeus em determinadas épocas, devido às nossas muitas falhas. Antigamente, todos os empréstimos eram feitos sob a forma de Guemilút Chéssed . Do mesmo modo, Deus nos governava com Chéssed , o que nos assegurava um ano de prosperidade nos negócios e inúmeras bênçãos. Este, infelizmente, não é o caso hoje em dia, por causa da abundância dos nossos pecados). Agora vejamos o caso dos agiotas que querem obter lucro. Primeiramente, quem empresta precisa estar seguro de seu Heter Iscá ser legal e válido. Nesta transação não pode haver possibilidade alguma de usura, como definido na lei judaica. Do contrário, quem empresta
perderá todas as suas posses, como declara o Talmud. Além disso, incorre em grave punição – a perda do direito à ressurreição (Nossos Sábios Ialcút Iechezkel 275 relatam que quando o profeta Ezequiel capítulo 37 reviveu os mortos no vale de Dura, todos se levantaram e postaram-se eretos, um grande número de pessoas, exceto por um indivíduo, que permaneceu deitado ao pó – por ter emprestado a juros durante a vida). Além disso, manter esta conduta avara é o mesmo que assinar de próprio punho a negação do Deus de Israel, como nossos Sábios asseveram (Baba Metsia 71a). Este não é o lugar para explicar quão ruinoso pode ser este tipo de comportamento. Devido a nossas inúmeras falhas, as pessoas passaram a considerar permissivas as atitudes proibidas, falhando em perceber que estão destruindo as próprias vidas. É, portanto, uma obrigação de todos os que estão envolvidos com empréstimos de dinheiro, estudar as halachót pertinentes em Iorê Deá ou Chochmat Adam. É preciso também que a pessoa saiba que não está isenta do mandamento positivo (Êxodo 22:24) “Quando emprestares dinheiro ao Meu povo...” (trata-se de um empréstimo sem juros). Estes empréstimos devem ser feitos de acordo com as possibilidades de cada um. Quem empresta de acordo com a lei não deve pensar que, se este é seu meio de vida, sua vida tem precedência sobre a de seus companheiros. Não queremos com isto dizer que esta pessoa deva ceder todo o seu capital a empréstimos sem juros, mas que pratique a Mitsvá de Guemilút Chéssed o quanto suas posses lhe permitam. Os lojistas também devem proceder deste modo, cada um de acordo com suas posses, mesmo que todo seu dinheiro esteja destinado à compra de mercadorias, deixando sua família completamente sem dinheiro. Não obstante, se puder guardar parte deste dinheiro para emprestar sem juros aos outros, tem o dever de fazê-lo, como explicam as “Leis sobre Empréstimos”. Obviamente a pessoa constantemente ocupada com empréstimos a juros ver-se-á numa constante dificuldade para subjugar seus instintos e destinar algumas somas para Guemilú Chéssed . Para esta pessoa, nosso melhor conselho é separar uma quantia específica de dinheiro, proporcional a seus meios, e destiná-la a fundos de empréstimos sem juros, como sugerimos anteriormente. Deste modo, não encontrará resistência, pois este dinheiro foi destinado para este fim e já não pode ser visto como seu. Feito isto, a pessoa deve seguir procedendo desta maneira, praticando Guemilút Chéssed constantemente, usando da mesma energia que destina para seus empréstimos monetários. Assim garantirá que a
medida da benevolência aumente no mundo, além de retificar os prejuízos causados à medida de Chéssed que fez diminuir no mundo por causa dos seus empréstimos a juros, como explicamos acima. Também deve devotar-se energicamente a praticar os outros tipos de Chéssed descritos neste livro.
Capítulo 16
Estabelecendo fundos de “guemach”
DIA 15
Devido à extrema importância da Mitsvá de Guemilút Chéssed ,dedicamos uma atenção especial à necessidade de cada um, de separar uma soma maior ou menor de dinheiro, guardando-a em casa num fundo permanente destinado a empréstimos sem juros. Obviamente, nem todos podem fazê-lo e outros não dispõem de tempo para dedicar-se a esta Mitsvá em todos os detalhes. Para estas pessoas, nosso melhor conselho é reunir-se a outras pessoas, para juntos formar um Fundo Comunitário de Empréstimos com a finalidade de emprestar dinheiro aos necessitados, na sua hora de apuro. Na verdade, as comunidades judaicas dispersas pelo mundo tem tido como hábito a organização de uma sociedade como esta em cada cidade. Avaliar a grandiosidade da prática desta Mitsvá pelos membros de uma comunidade é algo incalculável. Nossa introdução e muitos dos capítulos subsequentes apontam para a gravidade do pecado cometido por todo aquele que cerra seu punho para não emprestar dinheiro aos outros e a enorme recompensa ganha por quem cumpre esta Mitsvá. Naturalmente, portanto, ninguém em sã consciência dormirá tranquilo enquanto uma Sociedade para Empréstimos sem juros de ajuda aos necessitados não estiver funcionando em sua comunidade. Deste modo, seus compatriotas, além dele mesmo, evitarão cometer este gravíssimo pecado. Imagine que um pobre aborde vários membros de sua comunidade munido de uma garantia confiável, em busca de um empréstimo e que cada um deles ofereça uma desculpa diferente para recusá-lo. Este pobre homem voltará destroçado para casa, lamentando-se a Deus e protestando contra sua perversa sorte. Sabemos o que as Escrituras tem a dizer sobre isto (Deuteronômio 15:9): “Guarda-te que não haja uma coisa perversa no teu coração, nem digas: ‘Aproxima-se o sétimo ano, o ano sabático’, 28 de modo que o teu olho seja mau para com teu irmão... e ele clame contra ti ao Eterno, e haja em ti pecado”. A culpa recairá sobre os ombros de todos, pois, se estes casos forem frequentes nesta comunidade, todos os membros têm o dever de prevenir que ocorram incidentes deste tipo.
Tomo aqui a tarefa de demonstrar, para o benefício geral, quão eficazes são estes fundos com relação às iniciativas individuais de cumprir esta Mitsvá. São várias as razões para isto. Primeiramente, como disseram nossos Sábios (Torat Cohanim Bechucotai 12:10), é melhor que muitas pessoas estejam envolvidas com uma Mitsvá específica, do que uma única pessoa a cumpra sozinha. Ainda que cada um contribua com uma quantia modesta, no final das contas, o Altíssimo, bendito seja, irá considerar como se cada pessoa houvesse contribuído com o montante total do fundo, sem o qual o necessitado não poderia ter conseguido toda a quantia necessária. Além disso, esta Mitsvá custa dinheiro. Ela não é grátis. Mas sua recompensa também é maior. Assim o Zôhar ( Sidrá Terumá 124:1) explica o versículo em Êxodo 25:2, “E separem para Mim uma oferenda”: “Isto significa que aquele que aspira à piedade e à solidariedade com o Altíssimo, bendito seja, não deve relaxar ou ser remisso com seu dever, senão pronto e desejoso a trazer oferendas de acordo com suas forças, ‘como te houver abençoado o Eterno teu Deus’ (Deuteronômio 16:17)”. É certo que também está escrito (Isaías 55:1): “Ide, comprai e comei; ide, comprai sem dinheiro, sem preço, vinho e leite”. Isto se refere ao serviço em nome do Todo-Poderoso, bendito seja e sua Torá, que pode ser adquirida sem custos nem tarifas, mas a benevolência, esta deve ser feita pagando todo o preço possível; do contrário, quem a faz sem se esforçar devidamente não será capaz de atrair para si toda a emanação de santidade dos Céus. Além disso, esta Mitsvá pode agora ser praticada enquanto o doador estiver ocupado com seus negócios particulares e até mesmo enquanto está dormindo. Acrescente-se a isso o dito do Midrash (Cohélet Rabá 5:8 ): “Se uma pessoa almeja e faz com que outros pratiquem Mitsvót , mas não logrou cumprir uma Mitsvá que dure gerações, que benefício adquiriu?” No entanto, quem tem uma porção numa Mitsvá comunitária, como a que mencionamos aqui, ou que contribuiu para dar suporte às Ieshivót onde se estuda Torá, ainda que tenha direito ao Gan Éden, sua alma receberá deleite e iluminação adicionais, por causa das Mitsvót que estão sendo constantemente cumpridas com o dinheiro de suas contribuições. Todos os que se ocupam com esta atividade: os fiadores, os coletores que investigam os doadores – receberão uma enorme recompensa e serão todos incluídos entre aqueles designados como os que buscam a caridade e a bondade, ‘que encontrarão vida, justeza e
honrarias’ (Provérbios 21:21). Um curador de fundo de empréstimos sem juros é comumente chamados de ‘tesoureiro da caridade’ ( Gabai Tsedacá). Com referência a eles, diz o Midrash Tanchuma: “O que deve fazer um homem condenado por Deus para manterse vivo? – Se estiver acostumado a estudar um capítulo de Mishná, deve passar a estudar dois; e se não estiver habituado a estudar, deve tornar-se um tesoureiro de caridade e assim salvar sua vida, como está escrito (Provérbios 21:21): ‘Aquele que persegue justiça (caridade) e benevolência encontrará vida, caridade e honra’”. Empenhar-se na arrecadação de fundos faz com que os outros pratiquem uma Mitsvá. A afirmação dos nossos Sábios a esse respeito é bem conhecida (San’hedrin 99b): “Rabi Abahu disse: Quem encoraja ou faz com que seus companheiros cumpram uma Mitsvá é tido como se ele mesmo a houvesse realizado, como está escrito, ‘E o cajado com o qual golpeastes o Nilo’ (Êxodo 17:5). Pois foi Moisés quem golpeou o Nilo? Não havia sido Aarão? – Isto significa que se uma pessoa causa o cumprimento de uma Mitsvá a outra, é vista pelas Escrituras como se tivesse cumprindo ela mesma a Mitsvá”. Nos Céus, estas Mitsvót também lhe serão creditadas. Além disso, ele se torna um dos benemerentes públicos que faz o povo de Israel, cumprir centenas de Mitsvót todos os anos, pois “Todo aquele que conduzir o povo no bom caminho não terá pecados na sua mão ( Pirkê Avot 5:22)”. Nossos Sábios também disseram (Baba Batra 9a): “Rabi Eliezer disse: Quem faz uma pessoa agir beneficamente supera a grandeza do próprio ato, como disse o profeta Isaías (32:17): ‘O serviço da caridade ou seja, levar a que outros a pratiquem leva à paz, e a prática da caridade, à quietude e à segurança eterna’.” A caridade e a benevolência (Tsedacá e Chéssed ) assemelham-se, como sabemos, de modo que arrecadar dinheiro para fundos de empréstimos sem juros é o mesmo que solicitar dinheiro para a caridade, pois, em ambos os casos, a quantia não retorna ao doador. Na minha opinião, a razão pela qual a grandeza de quem arrecada é maior do que a de quem doa deve-se ao fato do último fazer caridade apenas com o seu dinheiro, enquanto o primeiro faz caridade com toda a sua pessoa: quem arrecada dinheiro precisa abordar várias pessoas e falar com cada uma delas. Portanto, o coletor de caridade faz cumprir a Mitsvá de estender a possibilidade de praticar um ato de bondade, cada vez que pede ajuda a alguém. Sua própria Mitsvá cresce proporcionalmente ao número de pessoas a quem solicita auxílio,
enquanto que os doadores cumprem a Mitsvá somente na oportunidade em que estão contribuindo com o fundo. Mesmo quando o coletor não contribui com o fundo e seu único feito é estimular os outros a contribuir, também receberá bênçãos Divinas por suas ações, como está escrito em Tossefta (Peá, capítulo 3): “Quem faz um voto de uma doação e cumpre sua palavra, será recompensado tanto pelo voto quanto por seu cumprimento. Se fez um voto de doação, mas algo o impediu de cumpri-lo, será recompensado pelo voto, como se o tivesse realizado. Quem não fez um voto de doação, mas fez outras pessoas doarem dinheiro será recompensado por isto, como está escrito (Deuteronômio 15:10): ‘...Pois por isto te abençoará o Eterno, teu Deus, em todas as tuas obras’.” Não obstante, sua recompensa será maior ainda se ele próprio também fizer uma contribuição, como diz a Mishná ( Avot 5:13): “Existem quatro tipos de pessoas que doam para a caridade... que doa e deseja que os outros doem é um Chassid (devoto)...” O Talmud acrescenta (Baba Batra 9a): “Rava disse aos habitantes de Mechuza: Forcem uns aos outros a praticar atos de bondade, pois assim estarão em paz com o governo”. O significado disto é que se cada um compelir seus colegas a cumprirem Mitsvót , ver-se-ão livres de outros encargos que lhes impõem as autoridades governamentais, pois Deus lhes concederá paz sob este governo, como está escrito (Isaías 32:17): “O serviço da caridade leva à paz”. Rabi Iochanan ben Zacai também compelia seus familiares a fazer caridade, e aquilo que não doaram foram forçados a entregar ao governo pagão, como explicamos no capítulo 13. Todo fundo de caridade requer grande esforço e não deve ser abandonado. “A recompensa é paga de acordo com o sofrimento” ( Pirkê Avot 5:26). Mesmo se algumas pessoas o desprezarem, um coletor de fundos não deve prestar atenção nelas. Pelo contrário, deve pensar que sua recompensa será ainda maior por ter sido exposto a humilhações no serviço de Deus. Pensamento similar é expresso em Iorê Deá (capítulo 257, parágrafo 7): “Os tesoureiros de Tsedacá não devem prestar atenção nas ofensas vindas dos pobres, pois seu mérito será ainda maior”. A mesma medida se aplica ao nosso caso. (Encontrei uma alusão ao mérito de fazer com que os outros pratiquem caridade, no versículo Deuteronômio 15:10-11: “Te abençoará o Eterno, teu Deus... em tudo que possuir a tua mão... portanto, eu te ordeno, dizendo: Abrirás tua mão para teu irmão” – é possível fazer caridade dizendo aos outros que contribuam). Dediquei considerável atenção a este
assunto para demonstrar, em benefício de todos, a grande importância de estimular nossos companheiros a cumprir Mitsvót . Não obstante, as pessoas costumam evitar a tarefa de encorajar outros a cumprir Mitsvót , mesmo quando a necessidade é extremamente urgente. Como resultado, a Mitsvá acabará não sendo cumprida. Uma conduta como esta certamente não é recomendada.
Capítulo 17
A importância da caridade
DIA 16
Estivemos explicando a grandeza da virtude da benevolência ( Chéssed ). Agora fixaremos nossa atenção no tema da caridade (Tsedacá). Nossos Sábios declararam (Sucá 49b): “Guemilút Chéssed supera a caridade (Tsedacá) em três aspectos, pois caridade é feita com dinheiro, enquanto Chéssed realiza-se com dinheiro e com a própria pessoa”. (“Com dinheiro” inclui emprestar dinheiro, artigos e posses. “ Guemilút Chéssed” , tanto com o dinheiro quanto com a própria pessoa, inclui fazer um discurso em homenagem ao falecido; carregar um caixão; alegrar os noivos no dia de sua boda; acompanhar um colega numa viagem – Rashi). A caridade é feita com pessoas pobres, enquanto Guemilút Chéssed é praticada tanto com pobres quanto com ricos; caridade é feita com os vivos, mas Chéssed pode ser feito com vivos e com mortos”. Contudo, a caridade supera Guemilút Chéssed em vários outros aspectos. A caridade é um presente sincero e franco, enquanto um empréstimo sem juros é concedido por um período limitado de tempo, após o qual o credor recobra seu dinheiro. É preciso um esforço maior para superar o Iétser Hará envolvido num ato de caridade, pois o total de dinheiro do qual a pessoa dispunha ficou reduzido (o que não acontece quando é feito um empréstimo sem juros) e a recompensa vem de acordo com o esforço. Quanto à declaração do Talmud ( Shabat 63a), de que a pessoa que empresta dinheiro supera a pessoa que o doa, isto diz respeito a um homem que perdeu suas posses e que precisa deste empréstimo para reerguer-se. Para este, um empréstimo é mais útil e valioso que uma doação, além de evitar que ele se envergonhe por receber doações. Por outro lado, quem vive em estado de penúria e já se acostumou a requisitar caridade, será mais bem servido por uma doação do que por um empréstimo. Compreendido sob este prisma, o versículo (Deuteronômio 30:15): “Vê que, hoje, pus diante de ti a vida e o bem, a morte e o mal”, da maneira como é explicado em Pirkê de
Rabi Eliezer (capítulo 16), torna-se claro: “O Altíssimo, bendito seja, disse: Eis que coloquei estes dois caminhos diante de Israel, um bom e outro mal. O caminho bom é a vida; o caminho mal é a morte. O caminho bom tem duas trilhas: uma delas é a caridade (Tsedacá), e a outra, Guemilút Chéssed . Elias, o profeta, que seja lembrado para o bem, se posta à beira destes dois caminhos. Quando um homem está por adentrar uma deles, Elias brada e proclama, com referência a esta pessoa: ‘Abram-se as portas para que a Nação Justa e cumpridora da Verdade possa entrar’ (Isaías 26:2). Chega então o profeta Samuel e coloca-se entre as duas trilhas, dizendo: Qual destes dois caminhos devo escolher? Se escolho a caridade, sei que o caminho de benevolência a supera; se escolho a benevolência, sei que a caridade a supera. Então rogo aos Céus e à Terra para que testemunhem que não declinarei de ambos os caminhos. Tomarei posse de ambas as trilhas. O Altíssimo, bendito seja, diz: Samuel, te postastes entre dois bons caminhos. Para tua vida, conceder-te-ei três presentes, para te ensinar que a pessoa herda três boas dádivas: “vida, justiça e honrarias”. Por isto, devemos todos nos empenhar também na prática da caridade com todas as nossas energias. Não teríamos espaço suficiente para citar todas as referências rabínicas à caridade; apresentarei apenas algumas delas. Em Tana Devei Eliahu Zuta (capítulo 1:8), declararam em nome da academia de Eliahu: “Grande é o poder da caridade, pois, desde o dia da Criação até hoje, o mundo sustenta-se pela caridade. Todo aquele que pratica muita caridade é louvado e salva-se do castigo do Guehinom, como está escrito (Eclesiastes 11:10): ‘Remove de teu coração a raiva e afasta de tua carne o mal’ e nos Salmos (41:1): ‘Bem-aventurado aquele que atenta para o debilitado, no dia do seu mal o Eterno o livrará’. Mal refere-se ao dia do julgamento, ao Guehinom, como está escrito: ‘E o perverso no dia do mal’ (Provérbios 16:4), e ‘Feliz daquele que pratica a justiça e que faz sempre caridade’ (Salmos 106:3). O que fez com que nossos patriarcas ganhassem o direito a este mundo, à Era Messiânica e ao Mundo Vindouro? – eles se habituaram a praticar caridade. Abraão, Isaac e Jacob, Moisés, Aarão, David e seu filho Salomão eram louvados por se habituarem a fazer caridade. Onde aprendemos que isto se refere a Abraão? – pois está escrito (Gênesis 18:19): ‘Porque o conheci, e sei que ordenará a seus filhos e à sua casa depois dele, a fim de que guardem o caminho do Eterno, para fazer caridade e justiça’. Isaac foi
louvado por sua caridade, como está escrito (Gênesis 26:12): ‘E semeou Isaac naquela terra...’, e semear indica caridade, como disse o profeta Oseias (10:12): ‘Semeai para vós em caridade’. (A similaridade consiste no fato de que todo homem anseia por semear seu campo, mesmo sabendo que, desta maneira, ele estará se desfazendo de parte de seus grãos usando como sementes – ele não obstante confia que centenas de caules brotarão mais tarde. Do mesmo modo, o homem deve ansiar por praticar caridade e quem o faz, deve saber que Deus lhe pagará muito mais que a pequena perda financeira que perdeu no presente, como diz a Torá Deuteronômio 15:10: ‘Mesmo que seja muitas vezes, lhe darás... pois por isto te abençoará o Eterno’.) Jacob declarou (Gênesis 32:10): ‘Sinto-me pequeno para todas as misericórdias, e toda a verdade’. ‘Pequeno’ significa pouco e refere-se à caridade, como está escrito (Provérbios 16:8): ‘Melhor um pouco com justiça, que grandes lucros com injustiça’. (Jacob declarou ser inadequado para receber toda a caridade que ‘Deus fazia com seu servo’, pela pouca caridade que havia feito). Com relação a Aarão e Moisés, ‘A Torá da verdade estava em sua boca’ (Malaquías 2:6). ‘Verdade’ refere-se à caridade, como disse o salmista (85:12): ‘Da terra brotará a verdade e, do céu, a justiça despontará’. Sobre David, como está escrito (2 Samuel 8:15): ‘E David fez justiça e caridade com todo o seu povo’. E sobre Salomão – (Salmos 72:1): ‘Concede, ó Deus, Tua equidade ao rei e Tua justiça ao filho do rei!’ Deus também é louvado por sua caridade, como está escrito (Isaías 5:16): ‘E Deus, Santíssimo, é santificado por meio da caridade’. Até mesmo o Trono da Glória – (Salmos 89:15), ‘Retidão ( tsédec ) e justiça são os alicerces de Teu trono’. Grande é a caridade, que salva o homem dos caminhos da morte, como dizem as Escrituras (Provérbios 10:2): ‘Mas a caridade salva da morte’. Veja como o homem recebe medida por medida. Se o homem presta caridade neste mundo e quer preservar a vida de um pobre, impedindo-o de morrer, o Todo-Poderoso, bendito seja, também deseja que o doador viva e não morra. Como sabemos que se alguém, que tem os meios, recusa-se a fazer caridade, tem a oportunidade de preservar uma vida e não o faz – está ceifando a própria vida? De Naval, 29 que respondeu (1 Samuel 25:11): ‘Deveria eu tomar meu pão e minha água... e dá-los a homens que não conheço?’ Logo após foi punido por ter tomado esta atitude: ‘E Deus castigou Naval e ele morreu’.
“Grande é caridade, que prolonga os dias e anos do homem”, como está escrito (Deuteronômio 30:20): ‘Pois isso é a tua vida e o prolongamento de teus dias’ e em Provérbios (3:18), ‘É uma árvore da vida para aqueles que agarram-se a ela’. Agora podemos concluir (Cal Vachômer ) que, se a Torá se compromete para a mais fácil e simples das Mitsvót Shilúach Hakên30 – ‘A fim de que te seja bem e prolongues os teus dias’ (Deuteronômio 22:7) –, isto é ainda mais relevante com relação à Mitsvá da caridade, uma das mais importantes e difíceis da Torá. Grande é a caridade, que conduz o homem ao Mundo Vindouro, como está escrito (Salmos 1:1): ‘( Ashrê) Bem-aventurado o homem que não segue o conselho dos ímpios...’ e também (Salmos 106:3) ‘( Ashrê) Bemaventurados os que cumprem a Sua lei e agem com justiça ( tsedacá) em todos os momentos’. O termo Ashrê (Bem-aventurados) é usado com referência à Torá, mas também à caridade. Assim como o Ashrê referente à Torá assegura a vida no Mundo Vindouro, Ashrê referente à caridade também o garante”. Grande é a caridade, que se iguala à Torá. Sobre a Torá está escrito (Levítico 26:3): ‘Se nos meus estatutos andardes’, e sobre a caridade (Provérbios 8:22) ‘O Senhor fez-me como o início de Seu caminho’. Com relação à Torá está escrito (Levítico 26:6): ‘E darei paz à terra, e vos deitareis e ninguém vos amedrontará; e farei cessar os animais nocivos da vossa terra e espada não passará pela vossa terra’. E sobre a caridade (Isaías 32:17): ‘O serviço da caridade leva à paz e a prática da caridade, à quietude e à segurança eterna. Meu povo permanecerá em paz, e habitará em harmonia e moradas seguras, em lugares de repouso’. Grande é a caridade, pois a Torá é comparada e igualada a ela, pois não há criação melhor no mundo que a Torá, como está escrito (Provérbios 4:8): ‘Aprecie-a, e ela o exaltará; ela lhe trará honra quando você a abraçar. Ela dará uma grinalda de resplendor para sua cabeça, uma coroa de glória ela lhe conferirá’. A Torá é comparada a nada menos do que a caridade, como dizem as Escrituras (Deuteronômio 6:25): ‘E mérito (tsedacá) teremos nós, se cuidarmos de cumprir todo este mandamento, diante do Eterno nosso Deus, como Ele nos ordenou’.
A caridade é realmente grande, pois apressa o advento da Era Messiânica e a derradeira redenção, como está escrito (Isaías 56:1): ‘Mantende o juízo e praticai a justiça; assim a Minha salvação estará prestes a vir. Grande é a caridade, pois exalta a alma e a situa sob o Trono da Glória, como está escrito (Isaías 33:15): Aquele que se conduz com a caridade e fala com honestidade... habitará as alturas, sua fortaleza será entre os rochedos, o pão lhe será concedido e sua sede será saciada. Seus olhos avistarão o Rei em Sua formosura’. O terceiro capítulo de Avot de Rabi Natan (Mishná 9) relata que, “Certa vez, havia um Chassid que costumava fazer muita caridade. Uma vez decidiu velejar e uma ventania afundou seu barco no mar. Rabi Akiva viu o acidente e correu a uma corte rabínica para testemunhar que o barco afundara, assim a mulher deste homem poderia casar-se novamente. Antes que pudesse fazê-lo, o homem emergiu do mar e parou-se diante dele. Foi você que afundou no mar? Perguntou Rabi Akiva. Sim, respondeu o homem. Quem te fez emergir do mar? – A caridade que prestei em minha vida, respondeu, foi ela que me salvou. Como sabe que foi por isto? – indagou Rabi Akiva. O homem respondeu: Enquanto afundava, ouvi o som do enorme ruído das ondas do mar; eram as ondas, dizendo uma à outra: Depressa, vamos tirar este homem do mar, pois ele deu dinheiro para caridade todos os seus dias. Rabi Akiva então declarou: Bendito seja o Eterno, Deus de Israel, que escolhe as palavras da Torá e as palavras dos Sábios, pois as palavras da Torá e as dos Sábios foram estabelecidas para todo o sempre. Pois está escrito (Eclesiastes 11:1): ‘Joga o teu pão sobre a superfície das águas, e após muitos dias volverás a achá-lo’ e também (Provérbios 10:2): ‘A caridade salva da morte’.” Pelo mérito da caridade, as bênçãos entram em nossas casas, como está escrito (Deuteronômio 15:10): “Mesmo que seja muitas vezes, lhe darás, e que o teu coração não seja mau quando lhe deres; pois por isto te abençoará o Eterno, teu Deus, em todas as tuas obras e em tudo que possuir a tua mão”. Portanto, temos todos o dever constante de nos empenharmos neste Mitsvá e com isto causar a entrada de suas bênçãos em nossos lares. Estas bênçãos são adicionais à recompensa eternamente duradoura reservada para quem faz caridade.
Capítulo 18
Dê o dízimo e você enriquecerá!
DIA 17
Neste capítulo explicaremos o que é exigido para cumprirmos todos os requisitos da Mitsvá de Chéssed constantemente. Nos capítulos anteriores, demonstramos a virtude que há em separar uma quantia em dinheiro com a finalidade de estar sempre a postos para praticar esta Mitsvá. Algumas pessoas podem achá-la especialmente difícil. Por isto é preciso treinar nosso caráter, separando um décimo dos rendimentos com os quais Deus nos agraciou. Deste total, devemos despender dois terços em presentes de caridade para os necessitados (pois sua demanda é maior) e um terço deve estar separado em casa ou no escritório, para empréstimos sem juros. Quando a quantia acumulada for suficiente para conceder um empréstimo substancial, todo o dízimo passará a ser destinado à Tsedacá (presentes caritativos). A prática do dízimo (Maassêr ) é especialmente significativa, como indica o Talmud ( Taanit 9a): “Dê o dízimo ( Assêr ) e você enriquecerá (shetitashêr )”. É proibido testar o Altíssimo, bendito seja, em qualquer aspecto da vida. Contudo, é permitido fazê-lo no tocante à caridade, pois as Escrituras declaram (Malaquías 3:10): “Trazei o dízimo todo à casa do tesouro, para que haja mantimento para a gente da Minha casa (sacerdotes e levitas), e provai-Me nisto, diz o Eterno dos exércitos, se Eu então não vos abrir as janelas do céu e não derramar sobre vós uma bênção até que não haja limite”. O Iorê Deá (capítulo 247:4) cita uma lei permitindo a possibilidade de testarmos o Todo-Poderoso, bendito seja, quando doamos o dízimo. Os requisitos para a doação do dízimo ( Maassêr ), devem ser cumpridos desta maneira: primeiramente, separamos um décimo do nosso capital. Depois, sempre que Deus nos conceder oportunidades de obter mais rendimentos, devemos separar um décimo dos nossos ganhos. Muitos separam o dízimo de seus ganhos, mas não do seu capital. Neste
caso, não estão cumprindo esta Mitsvá de acordo à orientação da lei da Torá. Primeiramente, a pessoa precisa deduzir um décimo do seu capital. Por causa dos nossos inúmeros pecados, o Iétser Hará controla as decisões do homem e não lhe permite deduzir o Maassêr de forma correta. É preciso saber que a regra primordial é separar um décimo do capital e colocá-lo à disposição de pobres que necessitem empréstimos sem juros. Podemos tomar emprestado dinheiro do próprio fundo caso seja necessário, na condição de fazer um empréstimo de igual valor de outro fundo a fim de assistir uma pessoa necessitada que porventura nos aborde, enquanto ainda não restituímos o empréstimo que havíamos tomado do nosso fundo particular. Deste modo, teremos cumprido o dever de deduzir o Maassêr , pois isto também é considerado um ato de Tsedacá, como explicamos acima. Contudo este método é válido somente de acordo à opinião de Maimônides e do Shulchán Aruch. Estas autoridades incluem os empréstimos aos pobres na categoria de Tsedacá. Nachmânides, por outro lado, em suas notas no Sêfer Hamitsvót , não classifica esta prática como Tsedacá, mas a considera uma Mitsvá separada. Sob seu ponto de vista, não há prova de que a Mitsvá do dízimo seja cumprida caso o dinheiro retorne ao seu dono ou aos seus herdeiros. Se, no entanto, quando a pessoa se compromete a observar esta Mitsvá, ela se compromete a remeter sua doação a um Fundo de Empréstimos sem juros irrevogável, a conduta supracitada certamente está permitida de acordo com as opiniões do Shulchán Aruch e de Maimônides, podendo aparentemente aplicar-se também segundo Nachmânides, pois aqui existe uma condição atenuante. Tudo o que dissemos aqui refere-se ao indivíduo que dedica seu dízimo a empréstimos e não a quem os distribui graciosamente aos pobres. Entretanto, se esta pessoa quiser, temporariamente, destinar o dinheiro que separou para Maassêr para um empréstimo a um homem rico, e certamente para alguém que esteja passando por dificuldades momentâneas ou para uma pessoa em caráter de pobreza permanente, mas está disposta a doar esta quantia – quando ela lhe for devolvida – a um pobre que a mereça quando a oportunidade se lhe apresentar, neste caso não há necessidade de aplicar o flanco rigoroso da lei mesmo de acordo com a opinião de Nachmânides, como explicamos em Iorê Deá (capítulo 258, parágrafo 1).
Subsequentemente, encontrei, com a ajuda de Deus, que o Midrash Eliahu Rabá (capítulo 156) também decretou explicitamente, que também é permitido conceder empréstimos sem juros do dízimo para uma pessoa remediada, desde que seja por um período limitado de tempo, enquanto não lhe apareça um pobre, cuja demanda tem preferência. Resumiremos nossa dissertação, explicando como devemos agir com relação ao dízimo. Para evitar ciladas, é preciso estipular o seguinte: (a) Quem se encarrega de cumprir esta Mitsvá, deve declarar não estar assumindo qualquer tipo de voto ( neder ). Isto o impedirá de vir a transgredir uma lei da Torá, Deus o livre. (b) Deve contabilizar os rendimentos e ganhos (deduzindo as despesas) que Deus lhe concedeu, fazendo um balanço de suas contas a cada semestre, ou ao menos anualmente. Se, durante este período, tiver algum prejuízo, que os Céus não o permitam, deve deduzir a perda de seus ganhos e o restante formará a base para o cálculo do Maassêr . (c) Durante todo este período, deve calcular tudo o que destinou à caridade, incluindo o que deram as pessoas do seu lar aos pobres, mesmo que tenham sido apenas alguns centavos. A soma computada deve ser deduzida do Maassêr . (d) Se, após contabilizar suas contas, for constatado que o Maassêr excede as quantias destinadas, a diferença deve ser separada e distribuída para caridade. Se os pobres para quem pretende dar este dinheiro não estiverem acessíveis, pode reter o balanço do Maassêr até que eles apareçam. Entrementes, poderá usar este dinheiro para objetivos próprios. Porém, quando for abordado por estes próprios e lhe pedirem empréstimos ou caridade, deve dar-lhes esta quantia de imediato. (e) Se descobrir que a soma que destinou para caridade excede a quantia que contabilizou para Maassêr , algumas autoridades rabínicas são da opinião que ela poderá ser guardada para o ano seguinte. Outras são mais estritas. Consequentemente, é aconselhável seguir o seguinte procedimento: ao engajar-se no cumprimento desta Mitsvá, a pessoa deve estipular expressamente que, sempre que doa uma quantia para caridade, o faz na condição de que possa retirar esta quantia de seu Maassêr quando e se lhe parecer apropriado (permitindo, assim, que o excedente seja computado no Maassêr do ano seguinte). Este tipo de procedimento é possível no caso de pessoas que ganham uma montante de dinheiro em períodos determinados. É quase impossível que um comerciante, por exemplo, mantenha o registro do lucro exato que obteve a cada transação. Para ele, o mais indicado é fazer uma avaliação geral dos ganhos, relacionamento estoque e vendas. Deste modo,
poderá calcular seu lucro líquido. Deverá então fazer uma estimativa geral dos gastos com as despesas com alimentação e vestuário de sua família durante o período em questão. A estes dois itens, deve adicionar toda as doações para caridade que ele e sua família fizeram durante o mesmo período, além de estipular, quando começou a cumprir esta Mitsvá, que poderia confiar em sua própria estimativa e que não será necessário fazer este cálculo com precisão. Quem recebe uma herança também deve separar um décimo para ser distribuído como caridade (Eliahu Rabá, capítulo 156).
Capítulo 19
O que é certo fazer com o dízimo?
DIA 18
Neste capítulo abordaremos o modo como o dinheiro do Maassêr deve ser distribuído. Basicamente, é óbvio, o dinheiro deve ser dado aos pobres. Parentes pobres têm precedência sobre estranhos (Mais sobre as regras de prioridade em Iorê Deá, capítulo 251, parágrafo 3). É permitido até mesmo distribuir deste dinheiro para os filhos maiores, que já não temos a obrigação de sustentar. Como eles ainda não tem meios, tudo o que se dá a eles engloba-se na categoria de presentes de caridade, mesmo que o pai tenha como provê-los de outras fontes. Se um homem é pobre, pode prover seu pai e sua mãe com dinheiro destes fundos. Se, no entanto, um filho é capaz de sustentar seus pais a partir de outras fontes, vale aqui a declaração dos nossos Sábios (Talmud de Jerusalém, Peá 27a): “Que a maldição recaia sobre quem sustenta seus pais com dinheiro de fundos de caridade, quando pode sustentá-los por fonte própria e não o faz”. ( Iorê Deá, capítulos 240 e 249. Shach, ibid.). Caso seus parentes não estejam passando necessidade 31 e o dinheiro do fundo for doado a estranhos (pobres), as pessoas que “labutam em Torá” tem precedência, para que se fortaleçam na Torá de Deus, pois o Midrash Tanchuma (Reê) indica que este tipo de Maassêr foi primordialmente instituído para prover aqueles que se preocupam com o estudo da Torá. Eis a passagem concomitante: “Dê o dízimo ( Assêr ), e você enriquecerá (shetitashêr )”. Deduza o dízimo para que não sofras perdas. Isto é uma intimação a pessoas que ‘saem aos mares’ (se engajam nos negócios), para que separem um décimo de seus ganhos em favor dos que labutam em Torá. As Escrituras prometem que o lar da pessoa que separa o dízimo será abençoado (Malaquías 3:10): “Trazei o dízimo todo à casa do tesouro, para que haja mantimento para a gente de Minha casa (sacerdotes e levitas), e provai-Me nisto, diz o Eterno dos exércitos”. A intenção da Torá é prover aos sacerdotes e levitas alimento na “Casa de Deus”, para que possam dedicar-se de
completo ao estudo da Torá de Deus, de modo que “Eu então vos abrirei as janelas do céu e derramarei sobre vós uma bênção até que não haja limite”. Pois “as bênção são concedidas por causa dos Talmidê Chachamim (eruditos em Torá), como disseram nossos Sábios (Berachót 42a). Similarmente, eles declaram no tratado Chulin (130b): “Não se concede porções a Sacerdotes leigos, como está escrito 2 Crônicas 31:4: ‘Deem porções aos Sacerdotes e Levitas, para que possam dedicar-se à Torá de Deus’.” Se não podemos dar a maior parte da nossa contribuição aos estudantes de Torá, ao menos devemos darlhes a porção maior, ou no mínimo metade. Encontrei esta regra no livro Knesset Haguedolá (Iorê Deá, capítulo 249:1). A mesma ideia é evidente nas notas de Harav Hameili ( Shitá Mecubétset , Ketubót 50a), para quem o Maassêr que damos hoje tem origem nos dízimos doados aos Sacerdotes e Levitas, para que pudessem dedicar-se à Torá de Deus. Note que as autoridades posteriores ( Acharonim) decretaram que podemos usar o Maassêr para ajudar noivo e noiva a se casarem, se não o puderem de outra maneira. Isto também se aplica a organizar um Berit Milá (circuncisão) ou adquirir livros sobre judaísmo para que outras pessoas possam tomá-los emprestado. Podemos usar estes livros em proveito próprio, desde que escrevamos neles que foram adquiridos com dinheiro do Maassêr . Do contrário, seus filhos tomarão posse deles após sua morte. Algumas autoridades duvidam da legalidade de práticas como esta. O Pitchê Teshuvá (citando o Chatam Sofer , Ioré Deá, capítulo 249) afirma que o Maharil e o Remá permitiam o uso do Maassêr somente para ser dado aos pobres e não para serem usados em benefício de outras Mitsvót . Se, no entanto, for evidente que a participação nas despesas de um Berit Milá beneficiam o pai da criança, que por ser pobre não dispõe de recursos para arcar com esta despesa, assim como beneficiam noivos e aqueles para quem foram adquiridos livros sagrados, todos pessoas pobres, não há razão para seguirmos a opinião estrita nestes casos, pois contribuições como estas são realmente presentes de caridade. Quanto a adquirir o direito de receber uma Aliá à Torá, também neste caso se o dinheiro for usado em benefício dos pobres, não há motivo para proibir a prática de acordo com todas as autoridades. Todas as opiniões legais, contudo, proíbem o uso destes fundos para pagar uma anuidade de estudos de Torá aos próprios filhos, pois a pessoa tem ela mesma o dever de educá-los, podendo alternativamente contratar um professor particular. Também é
proibido saldar dívidas com dinheiro de Maassêr . Custear os estudos dos filhos de outras pessoas é certamente permitido, além de ser uma grande Mitsvá. Saiba também, que separar um décimo para a caridade é a medida das pessoas medianas. Quem deseja realmente atuar caritativamente, deve separar um quinto de tudo o que possui. Nossos Sábios dão fundamento a esta ideia com base no versículo em Gênesis 28:22: “E de tudo quanto me deres, certamente dar-Te-ei o décimo Aasser Aasrenu Lach”. A redundância do termo ligado ao Maassêr indica, segundo nossos Sábios, que o ideal é doar dois décimos para caridade, ou seja, um quinto. Aqui também, acredito, devemos doar um quinto dos nosso lucro líquido e de todos os rendimentos subsequentes. Ao distribuir estes fundos, divida-os em duas partes: um décimo deve ser doado a estudantes de Torá (correspondente ao primeiro dízimo doado aos Sacerdotes e Levitas que devotam-se ao estudo da Torá, como relatam as Escrituras) e o segundo dízimo para as outras Mitsvót . Aprendi isto do Shitá Mecubétset (Ketubót 50a) onde ele cita Harav Hameili. Explicaremos agora um detalhe que afeta especificamente as doações para caridade. Algumas autoridades declaram que nossos Sábios consideram a doação de um quinto dos rendimentos como um ato de caridade, somente no caso da comunidade onde não existem pessoas pobres, ou que estejam desprovidas de alimento e vestimenta. Contudo, se houverem viúvas, órfãos e oprimidos, incapacitados de proverem a si mesmos, o que antes era um ato de caridade passa a ser um dever legal , uma obrigação de separar um quinto das posses para auxiliar estas pessoas. Esta é a opinião do Gaón de Vilna. 32 Esta obrigação surge somente quando o doador é capaz de contribuir com um quinto de suas posses. Como mencionamos anteriormente, ninguém é obrigado a passar necessidade para doar um quinto do que tem, mesmo se for uma Mitsvá fazê-lo (elaboramos nossa visão à respeito numa nota da edição em hebraico).
Capítulo 20
... mas também não se pode exagerar
De acordo com o Talmud (Ketubót 50a), os Sábios em Usha instituíram que um não se deve distribuir mais do que um quinto de seus rendimentos, do contrário corre o risco de no futuro tornar-se dependente do suporte público. De acordo com as autoridades, esta admoestação não se refere às pessoas extremamente ricas, que estão expressamente excluídas deste regulamento. (Veja: Baba Cama 9a, Tossafót e também Chochmat Adam, Leis sobre Caridade). Isto também não inclui enfermos em estado crítico que distribuem seus bens imediatamente antes de passar deste mundo. A ressalva de que uma pessoa neste estado poderia tornar-se dependente de auxílio público não se aplica a este caso, podendo esta pessoa doar uma grande quantia. Em sua nota em Iorê Deá, capítulo 249, parágrafo 1, o Remá decreta que uma pessoa nesta condição poderá doar o quanto desejar. Algumas autoridades ditam que mesmo nesta situação a pessoa pode doar somente um terço e no máximo metade de sua riqueza, mas não mais que isso. O Talmud relata sobre Mar Ukva ( Ketubót 67b), que após revisar quanto havia doado para caridade durante a vida, fez este comentário, “A viagem é longa e as provisões são escassas”. Decidiu então doar seus bens para caridade. Algumas autoridades declaram que a regra, “O benevolente não deve doar mais do que um quinto do que tem”, aplica-se somente às pessoas que procuram por pessoas necessitadas para poder ajudar-lhes, mas isto não se aplica a pessoas em estado de petição de miséria que porventura batam-lhe à porta pedindo por um prato de comida ou roupa para vestir. Neste caso, é um dever da Torá ajudar esta pessoa até que suas necessidades sejam suficientemente preenchidas (Deuteronômio 15:8). Também somos obrigados a resgatar cativos, sobre os quais existe ordem Divina de redimi-los e é permitido despender mais do que um quinto de nossas posses para este fim. Além de um dever bíblico, redimir um cativo é um ato revestido de especial santidade (Maimônides: comentários sobre a Mishná, Peá 1:1). Aparentemente esta limitação não se aplica
quando existe perigo de vida. Portanto, se o cativo corre perigo de vida ou um faminto estiver à beira da morte, o limite de um quinto torna-se ineficaz. O Talmud ( Baba Metsia 62a) diz que nossa própria vida tem precedência sobre a vida alheia, mas não há evidência nas fontes rabínicas que nossas posses tenham precedência sobre a vida do próximo. Saiba também que o limite de separar até um quinto para caridade aplica-se somente no caso da pessoa que costuma esbanjar o que tem. Nossos Sábios indicam isto por meio do termo Mebazbez . Uma pessoa de posição financeira segura ou que possua um negócio de onde pode retirar seu sustento semanalmente e mais um pouco, pode despender seu excedente praticando caridade, mesmo que este valor seja proporcionalmente maior do que um quinto de suas posses. Precisamos lembrar que estas leis dizem respeito apenas à caridade de um modo geral. Quanto ao sustento do estudo da Torá, o Shitá Mecubétset (Ketubót 50a) é da opinião de que este não está incluso nesta restrição, o que procede, uma vez que o doador também é recompensado pelo estudo da Torá, como no caso do acordo entre as tribos de Issachar e Zebulun. A tribo de Zebulun sustentava a tribo de Issachar, que tomava para si a tarefa de estudar Torá e isto recompensava ambas as tribos. O Midrash afirma (Bamidbar Rabá, Nassó 13:17): “Por que Zebulun recebeu o privilégio de oferecer seu sacrifício em terceiro lugar na ordem dos príncipes das tribos de Israel? Porque amava a Torá e doava generosamente dos seus recursos financeiros a Issachar, libertando-o com isto do fardo de ocupar-se com o comércio. Por conseguinte, Issachar não precisava interromper sua ocupação com a Torá. Isto deu a Zebulun o mérito de tornar-se parceiro de Issachar e associado em sua Torá... Outra interpretação: A ‘baixela de prata’ 33 correspondia ao pão com o qual Zebulun alimentava Issachar; a ‘bacia’, correspondia ao vinho que lhe dava para beber; e por que estes artigos eram confeccionados em prata? – para indicar que Zebulun dava do seu dinheiro34 a Issachar para que ele pudesse cobrir suas despesas. ‘Ambos eram preenchidos com a melhor farinha’, nos ensina que ambos receberam recompensa pelo estudo da Torá e sustento em conjunto... pois assim como Zebulun tinha parte na recompensa pela Torá de Issachar, este tinha participação nos ganhos materiais de Zebulun”. Esta passagem torna evidente que o auxílio prestado a Issachar excedia em muito a fração de um quinto dos ganhos de Zebulun. Nossos Sábios citaram o exemplo destas tribos inúmeras vezes, como exemplo a ser seguido pelas gerações seguintes.
Como podemos afirmar então que isto é impossível de ser levado a cabo em nossa geração? Obviamente, os casos onde se trata de sustentar o estudo da Torá não se enquadram nesta limitação. Visto que a recompensa é compartilhada, que valor teria qualquer limitação? Neste caso, quanto maior o auxílio, maior a recompensa. (Nota: A pessoa temente a Deus aplica sua inteligência para descobrir como deve conduzir-se nesta empresa conjunta. Quando um erudito em Torá a procura, ele deve ser recebido cordialmente, como se fosse um parceiro nos negócios, cuja associação renderá grandes lucros. Receber com alegria um estudioso de Torá e render-lhe auxílio abonar-lhe-á no Mundo Vindouro a recompensa destinada aos que suportam a Torá. Alguns indivíduos rudes, para aumentar nossas falhas, comportam-se de maneira inversa, contribuindo de modo mesquinho, rancoroso e aviltante. Mas os Céus pagam aos homens, por sua conduta, medida por medida, portanto, aquele que compreende deve cuidar-se, pois “O homem sábio possui olhos em sua cabeça”. Em sua exposição sobre o versículo em Eclesiastes 2:18, “Odiei toda a minha labuta”, o Midrash (Cohélet Rabá, ibid.) relata: “Rabi Meir era um hábil escriba e costumava ganhar três Selas por semana. Gastava um Sela35 com alimentação e bebida, outro Sela com vestimenta e doava o terceiro Sela a estudiosos de Torá. Seus discípulos o indagaram: O que deixarás para teus filhos? Sua resposta: Se forem justos, lhes acontecerá o que prenunciou o rei David (Salmos 37:25): ‘Nunca vi o justo em abandono, nem a sua descendência implorar por pão’. Mas se não forem justos, por que deveria eu deixar de minhas posses a inimigos do Onipresente?” Mais adiante, o Midrash observa (Cohélet Rabá 7:103): “Rav Acha disse em nome de Rabi Tanchum: Suponhamos que alguém tenha estudado, ensinado, cumprido e observado a Torá. E que podia ter sustentado outros (estudiosos de Torá), mas não o fez. Ele será incluído na categoria em (Deuteronômio 27:26) ‘Maldito aquele que não confirmar as palavras desta Lei para cumpri-las’. Suponhamos também, que alguém não tenha estudado nem ensinado, observado ou cumprido a Torá (a intenção aqui é que sua devoção à Torá tenha sido prejudicada por sua pobreza e necessidades, que a pressionavam a ganhar arduamente o seu pão de cada dia). Mesmo sem poder fazê-lo, ainda assim ajudava os outros. Desta pessoa dir-se-á, ‘Bendito aquele que confirma as palavras desta Lei para cumpri-las’.”
De tudo o que foi dito até aqui, é evidente a importância de auxiliar no sustento dos estudiosos de Torá mesmo que nossos ganhos sejam minguados. Quem o faz será abençoado por seus atos. Portanto, quanto precisará empenhar-se nesta Mitsvá, quem tiver meios para isto. Isto nos devolve à nossa reflexão inicial. A limitação imposta pelos nossos Sábios mostra quão cuidadosos temos que ser para não esbanjarmos dinheiro em assuntos vãos. Obviamente, a caridade e as outras Mitsvót constituem as atividades mais importantes e supremas deste mundo. Os gastos com estes assuntos salvam a pessoa de todo o tipo de sofrimento, tanto neste mundo quanto no Mundo Vindouro. Contudo, nossos Sábios nos advertem para cuidarmos do nosso dinheiro e não esbanjá-lo, mesmo nestas atividades, para que não venhamos a empobrecer, ainda que Deus nos proveja miraculosamente se chegarmos a uma situação como esta. Quanto então precisamos cuidar para não desperdiçar nosso dinheiro com tolices como honrarias ilusórias, roupas extravagantes, mansões luxuosas, serviçais e utensílios demasiadamente caros. Despesas como estas esgotam a riqueza do homem em pouco tempo, conduzindo-o à pobreza. Ele então busca seu sustento empregando expedientes desonestos e desrespeitando a propriedade alheia, para tentar safar-se do seu apuro. Conheço bem os argumentos do Iétser Hará, de que viver com opulência aumenta a capacidade de gerar lucros, pois nos tomarão por ricos e isto aumentará nosso crédito. Isto também é absurdo. Qualquer um pode reconhecer uma farsa como esta. Seus negócios são investigados antes que lhe concedam crédito e a verdade revelada. Todos os seus gastos terão sido necessariamente em vão. Além disso, seus filhos e filhas, ao perceberem seu estilo de vida extravagante, acreditarão realmente que o pai seja extremamente rico. Então desperdiçarão seu dinheiro indiferentemente, com todo o tipo de tolice. Finalmente, ele se verá reduzido à penúria. Sua queda será totalmente exposta. Seus credores o perseguirão e o atormentarão. A dor e vergonha resultantes desta situação ameaçarão sua vida e de seus dependentes. Ao invés da alegria efêmera e imaginária que os deleitava a princípio, esta família agora sofre longa degradação e dores de cabeça. O homem sábio sabe cercar-se de cuidados para não dissipar o que tem, gastando suas posses com assuntos inúteis e gasta apenas o suficiente para cobrir suas necessidades, fazer caridade e Guemilút Chéssed . Tudo então correrá bem para si.
Gostaria de levantar mais um ponto. Aqueles que adotam o hábito de separar um décimo ou um quinto de seus ganhos, realizam um ato maior do que os indivíduos que fazem doações sem assumi-las como um dever, mesmo que as quantias doadas sejam iguais. Enquanto este último faz não mais que um ato de caridade, o primeiro torna-se parceiro dos Céus, o que lhe dá a vantagem de tornar sua atividade comercial uma Mitsvá. Isto se aplica em especial se, no momento em que assumir o dever de separar o Maassêr ou um quinto, a pessoa tem em mente que Deus compartilha todos os seus empreendimentos. Quão feliz é esta pessoa e quão bela é a sua parte.
Capítulo 21
Provendo suporte para prevenir colapsos
DIA 19
Até aqui vimos lidando com medidas simples de Guemilút Chéssed , cuja finalidade principal é beneficiar o próximo, seja ele pobre ou rico. Agora discutiremos uma subdivisão desta classe. Trata-se de um indivíduo cuja condição financeira deteriorou-se. Então, se lhe for concedido um empréstimo, ele poderá manter-se, salvar-se do colapso financeiro e da dependência do suporte alheio. Este tipo de auxílio excede o Guemilút Chéssed ordinário, pois também estamos praticando o comando das Escrituras (Levítico 25:35): “E quando empobrecer teu irmão e encostar sua mão sobre ti, deterás sua decaída, mesmo se ele é peregrino ou estrangeiro, morador da terra, e viverá contigo”. (Quando à expressão bíblica “contigo”, podemos explicá-la com referência ao versículo em Provérbios 22:2, “Rico e pobre encontram-se juntos; Deus é o Criador de todos eles”, como explicam nossos Sábios (Vaicrá Rabá 34:4): “Quando um pobre aborda um rico e lhe roga, ‘Auxilia-me’; se este rico decidir ajudá-lo, muito bem, do contrário, ‘Deus é o Criador de todos eles’, – Ele o fez rico, mas pode torná-lo pobre...” Portanto, se um pobre te abordar solicitando ajuda, pense que na verdade é você quem está na corda bamba, pois se negar-se a ajudá-lo, poderá se tornar o próximo a pedir auxílio, Deus o livre. Se, no entanto, você o ajudar a estabilizar sua posição, ambos viverão com segurança e estabilidade. É isto o que significa “e viverá contigo”). Se o Altíssimo conceder algum lucro ao beneficiado como resultado deste empréstimo e com isto ele puder sustentar sua família e a si mesmo, então o credor será visto por Deus como quem preservou a vida de quem tomou o empréstimo e de sua família, como havíamos explicado anteriormente, com base no Midrash.36
Se o benemerente der um emprego a esta pessoa ou associá-la aos seus negócios, isto também se inclui na categoria de Mitsvá, como encontramos no Código de Maimônides (Matnot Aniim 10:7). A regra geral é que devemos nos esforçar ao máximo para estender a esta pessoa um auxílio tal, que a salve do colapso financeiro. Fazer o máximo também implica estimular outros a ajudarem esta pessoa em tudo o que ela venha a precisar. Também vi pessoas tementes a Deus emprestarem dinheiro a alguém sem juros, permitindo que saldem a dívida semanalmente, ao invés de cobrar-lhes tudo de uma vez. Agir desta forma é prestar um grande favor a estes desafortunados, pois isto lhes permite saldar suas dívidas enquanto mantém a independência econômica. Seria diferente se o devedor tivesse que saldar toda a dívida de uma vez, pois isto poderia fazê-lo retornar à condição anterior de pobreza. Encontramos uma discussão deste tópico no Talmud ( Avodá Zará 4a): “Aquele que empresta mil Zuz ao seu colega deve, se o estima, permitir-lhe que salde a dívida aos poucos”. Sigamos o exemplo do habitual no mundo dos negócios. Os credores permitem esta cortesia aos seus devedores a fim de preservar seu dinheiro e aumentar seus lucros. É assim que devem proceder com estas almas aflitas, concedendo-lhes e empréstimos sem juros, cumprindo desta forma com a vontade de Deus. O bom nome, com o qual o Altíssimo coroará o doador no Mundo Vindouro por conta de sua atitude, conceder-lhe-á honrarias infinitamente maiores que os lucros insignificantes que por hora poderia obter em suas transações financeiras. (Assim diz o Talmud, no Tratado Shabat 104a: “Aprende o saber; mostra bondade com o pobre... e põe uma coroa sobre ti no Mundo Vindouro”. Aparentemente, é este o significado da Mishná em Pirkê Avot 4:3: “E a coroa do bom nome excede todas as outras”). Quem age deste modo cumpre as palavras do versículo (Salmos 41:2): “Bem-aventurado aquele que atenta para o debilitado; no dia do seu infortúnio, o Eterno o livrará”. O versículo louva a consideração deste homem pelas circunstâncias de degradação em que se encontra o pobre e o seu esforço para também, de alguma maneira, livrá-lo de seu estado de penúria e carência. Este versículo tem outras ramificações que, se Deus quiser, explicaremos mais tarde; mas o que dissemos aqui também se enquadra neste âmbito.
Uma conduta louvada como esta não se aplica somente à ação de indivíduos, mas também a atividades públicas de Guemilút Chéssed . Tenho tomado conhecimento de diversas comunidades onde associações sagradas como estas foram estabelecidas recentemente. Estas organizações receberam o nome de Somech Noflim, pois se ocupam de auxiliar os pobres e impedir seu colapso Deus não o permita. Eis como procedem: elas emprestam uma quantia de dinheiro especificada em seus estatutos por um determinado período de tempo. O fardo da dívida é aliviado através de uma amortização semanal com uma quantia modesta de dinheiro. Os curadores do fundo nomeiam um responsável honorário ou remunerado, que visita periodicamente os devedores para coletar seus pagamentos e, deste modo, as contas do fundo raramente entram em déficit. Este procedimento oferece uma vantagem adicional. No momento em que o empréstimo é concedido é cumprida a Mitsvá “deterás sua decaída”. Esta é a virtude primordial da Mitsvá da Tsedacá, como explicam o Código de Maimônides ( Matnot Aniim 10:7) e o Shulchán Aruch (Iorê Deá, capitulo 249). Além disso, a cada momento em que a dívida é saldada manifesta-se um ato de bondade, pois o devedor é tratado com amabilidade. O comentário dos nossos Sábios a respeito é bem conhecido (Sucá 49b): “Disse Rabi Elazar: a caridade é recompensada de acordo com a bondade que ela contém”. Saiba também, que o tratado Iorê Deá (capítulo 249:6) regulamenta que dar um presente que estabilize a condição financeira de uma pessoa à beira da falência também cumpre com os requisitos desta Mitsvá. Portanto, quando o infortúnio acomete alguém (por exemplo, quando o animal que usa para semear morre ou perdas similares) e esta pessoa não tem condições para repor a perda – ou quando uma mulher enviúva e não tem de onde prover seu sustento, é preciso conceder-lhes uma soma de dinheiro que lhes permita engajar-se em algum tipo de ocupação – é preciso fazer de tudo para ajudá-los. Todos os atos deste tipo constituem uma grande Mitsvá. Uma vida longa é a recompensa, como explica o Midrash com base no versículo (Provérbios 19:17): “Aquele que favorece o pobre empresta ao Senhor, e suas boas ações Ele remunerará”. Caso similar encontramos no Talmud (Baba Batra 11a), no incidente envolvendo Benjamim, o Justo. 37 Saiba ainda, que prover um emprego rendoso ou auxílio similar a um pobre, cumpre o preceito “Deterás sua caída”, de acordo com as autoridades rabínicas. Cabe aqui uma reprimenda aberta àquelas pessoas em particular que não oferecem emprego a um judeu
quando necessitam mão de obra não qualificada. Estes certamente não são pessoas ricas, são quase indigentes. O versículo (Levítico 25:35): “E quando empobrecer teu irmão e encostar sua mão sobre ti, deterás sua decaída”, certamente descreve as circunstâncias em que se encontram. Além disso, mesmo que este homem seja reconhecidamente rico e que este versículo não se refira a ele, devemos dar-lhe prioridade em relação um não udeu, assim como comprar e vender dele etc., como encontramos em Sifra. Acrescentese a isto que, segundo o Remá, em sua responsa (capítulo 6), negociar com um irmão udeu tem precedência mesmo que exista uma pequena diferença nos preços. Isto diz respeito a qualquer judeu e certamente a um judeu pobre, sobre quem se aplica o preceito bíblico “Deterás sua caída”. É o que parece decretar a lei judaica, como explicamos acima. Toda pessoa deve depositar sua fé em Deus. Deve acreditar que ao exercer o grau mais elevado de caridade, “Deterás sua caída”, Deus o fará prosperar no lar que está construindo ou na jornada em que está se empenhando, além de reservar a recompensa que o espera no Mundo Vindouro. Descrevemos neste capítulo algumas maneiras como o versículo acima pode ser aplicado. A pessoa sábia saberá proceder de acordo com cada situação. Saiba também que esta Mitsvá não é cumprida de uma só vez ou com um ato isolado. Todas as vezes que uma pessoa estiver próxima do colapso financeiro devemos nos engajar em auxiliá-la, como explica o Midrash (Sifra, Behar ): “Mesmo se ajudou esta pessoa quatro ou cinco vezes, ajude-a novamente, pois as Escrituras declaram: ‘Deterás sua caída’.” (O Midrash faz uma dedução similar Sifri , Deuteronômio 15:8: “ ‘Certamente abrirás tua mão’ – mesmo que diversas vezes”).
Capítulo 22
Emprestando bens pessoais
DIA 20
Nos capítulos anteriores expusemos as leis referentes a empréstimos de dinheiro. Agora trataremos dos bens pessoais. Esta atividade também origina-se da compaixão e constitui uma Mitsvá, como apontam nossos Sábios (Sucá 49b): “Caridade se faz com dinheiro, mas Chéssed fazemos com todo o nosso ser”. Rashi inclui todo o tipo de empréstimo nesta Mitsvá: dinheiro, bens móveis, animais etc. A Mitsvá é tanto maior se quem toma emprestado um artigo ou animal puder fazer disto seu meio de vida. Certamente, esta é a melhor das boas ações, pois cumpre o que está escrito (Levítico 25:35): “E quanto empobrecer teu irmão e encostar sua mão sobre ti... deterás sua caída”. Cada um de nós é capaz de cumprir este tipo de caridade, pois ele inclui os objetos mais simples, como emprestar utensílios domésticos ou até um pente. Nossos Sábios disseram ( Menachót 43b) que a punição pelo descuido em usar fios brancos corretos nas franjas ( Tsitsít ) é mais severa do que o descuido em usar um fio celeste ( Techélet ), pois este último é mais caro e difícil de conseguir, e nem todos podem ter. A mesma comparação se aplica no nosso caso. Nos céus, não reclamarão com uma pessoa em dificuldades financeiras por não ter ajudado um amigo em dificuldades, emprestando-lhe uma soma substancial para que pudesse se sustentar, pois o indivíduo precisava deste dinheiro para sustento próprio. Mas lhe perguntarão porque não emprestou ao seu colega aquele pequeno artigo de que necessitava e que estava ao seu alcance – mas que não o fez por preguiça. O mesmo se aplica ao nosso caso. Todos têm a condição de permitir a seus companheiros que se beneficiem dos pequenos objetos que têm à sua disposição. Mesmo que a pessoa que o peça tenha posses, temos o dever de estender-lhe esta cortesia. Quanto mais em se tratando de um pobre, pois o mesmo é capaz de não poder adquirir até mesmo este pequeno item.
Contudo, existem pessoas que se negam a emprestar estes artigos por pura mesquinharia. Simplesmente porque não admitem que seus pertences beneficiem outros. Que indigno agir desta forma. No capítulo onze explicamos como isto é deplorável e que tipo de punição aguarda esta atitude. Mesmo aqueles que não são mesquinhos por natureza, não raro falham nesta Mitsvá por preguiça de, por exemplo, buscar o objeto que está em outro quarto e qualquer outra razão trivial. Mesmo que isto não se inclua na primeira categoria de não praticar a caridade, ao agir deste modo, a pessoa privou-se de ver sua alma iluminada pelo brilho do Chéssed . Ela nem mesmo percebe o significado disto. Mas quando o perceber, não admitirá que nada interfira no exercício desta virtude em todos os seus negócios, e alegrar-se-á com todas as oportunidades que lhe conceder o Todo-Poderoso para atuar de maneira generosa e misericordiosa com o próximo. Até aqui dirigimos nossa atenção ao empréstimo de utensílios e outros artigos para que outras pessoas possam derivar algum benefício temporário deles. Imagine então que ato de benevolência fazemos quando emprestamos livros judaicos para que nossos amigos possam estudar neles. O bem que fazemos ao agir deste modo é perpétuo. Seu próprio mérito e justeza perdura para sempre, como disseram nossos Sábios (Ketubót 50a): “‘Fartura e riqueza haverá em tua casa, e sua generosidade durará para sempre’ (Salmos 112:3) – trata-se de quem empresta livros sagrados aos outros”. Este ato também faz parte da Mitsvá “dar suporte à Torá”, pela qual o benevolente recebe bênçãos de Deus, bendito seja, de acordo com nossos Sábios. Alguns deixam de emprestar seus pertences por possuirem algum tipo de antipatia pela pessoa que lhes aborda pedindo o empréstimo. Este é o pior de todos os vícios mencionados acima e transgride a proibição de (Levítico 19:18): “Não te vingarás e nem guardarás rancor contra os filhos de teu povo”. O melhor seria que cada um refletisse sobre quantas vezes já provocou o Altíssimo, bendito seja, tanto com palavras quanto com atos. No entanto, o Todo-Poderoso, bendito seja, não se vinga nem guarda rancor contra esta pessoa. Portanto, devemos agir de modo igual com nosso semelhante. Podemos afirmar que esta é a intenção do versículo (Levítico 19:18): “”Não te vingarás e nem guardarás rancor... e amarás o teu próximo com o a ti mesmo; Eu sou o Eterno”. Ou seja, você deve estender ao próximo as mesmas virtudes que Deus estende a ti e ao universo
como um todo, pois Deus não tolera nenhum tipo de ódio, como está escrito (Jeremias 3:12): “Pois Eu sou misericordioso, disse o Eterno, e Eu não guardo rancor jamais”. Até aqui o nosso parecer com respeito a quem empresta; agora discutiremos os aspectos de quem toma emprestado. Em primeiro lugar, é preciso que ele não quebre os termos estipulados pelo credor. Se o fizer, é considerado Gazlan (ladrão). O objeto emprestado não deve ser utilizado para qualquer outro propósito nem ser retido por um período maior que o estipulado por quem emprestou. Similarmente, quem toma um objeto sem o consentimento do dono é considerado ladrão, como rege o Choshen Mishpat (capítulos 341 e 359). Também é proibido emprestar este objeto a outras pessoas, mesmo durante o período do empréstimo, e certamente depois de expirar o prazo para devolvê-lo. Quem toma emprestado algo tem a obrigação de devolver o artigo quando o período estipulado finda. Muitos, devido à nossa lastimável situação espiritual, não são cuidadosos com isto; sua preguiça os impede de restituir o artigo emprestado a tempo. Enquanto isto, seu dono esquece-se a quem o emprestou e vai atrás da identidade deste último, tentando encontrálo. Frequentemente, também, o objeto em questão se rompe ou se estraga por negligência de quem o tomou emprestado. Mesmo se pagá-lo, ainda assim cometeu um ato injusto, pois o objeto não lhe foi confiado com este propósito. Se falhar em indenizar o dono do objeto, incorre em roubo total, como diz o Talmud ( Baba Metsia 81a): “Quem toma um artigo emprestado é responsável por ele mesmo após o término do período estipulado e enquanto este objeto estiver sob seu domínio”. Certamente, sua responsabilidade é maior durante o período especificado, mesmo que o objeto venha a quebrar acidentalmente. Além disso, quem se preocupa consigo mesmo, agirá deste modo quando tomar um objeto emprestado para algum uso em particular, devolvendo-o assim que o prazo do empréstimo termina e não o reterá um momento mais. (Veja também Shitá Mecubétset, Baba Metsia 81a. O Ritva decreta que é legalmente preciso devolver o objeto assim que o prazo do empréstimo expira).
Capítulo 23
Como proceder ao conceder um empréstimo
Nos capítulos anteriores, explicamos em detalhes a obrigação de emprestar aos outros. Agora demonstraremos como se cumpre esta Mitsvá. É preciso agir do mesmo modo que agimos quando prestamos caridade, emprestando o objeto solicitado de bom grado e alegremente, como encontramos em Avot de Rabi Natan (capítulo 13): “E recebe todas as pessoas com semblante alegre”. A que isto se refere? Se alguém der todos os presentes deste mundo a alguém, mas o fizer de má vontade, não terá dado coisa alguma de acordo com as Escrituras”. Assim rege o Iorê Deá (capítulo 249, parágrafo 3). O mesmo se aplica aos empréstimos. Devemos cuidar não tratar quem nos pede algo emprestado de modo indigno, Deus nos livre, mas fazê-lo de modo polido e alegre. (Veja capítulo 9, onde explicamos este tópico com mais profundidade). É preciso enxergar a si mesmo na mesma situação de quem pede emprestado. Se fossemos nós quem necessitássemos deste objeto, não gostaríamos que nos fosse emprestado com amabilidade? Portanto, devemos agir do mesmo modo com os outros. Assim Rashi comenta o versículo em Êxodo 22:24, “Emprestarás dinheiro ao Meu povo, ao pobre que está contigo, e não serás para ele como credor”: não serás para ele como credor, porque é “Meu povo” e o “pobre que está contigo” – enxergue a si mesmo como se você fosse este pobre. É preciso ser especialmente afável com quem empobreceu, e o teu empréstimo lhe permitirá engajar-se em alguma atividade lucrativa, livrando-o da penúria e da dependência do favor alheio, pois de acordo a Maimônides e ao Shulchán Aruch (Iorê Deá, capítulo 249), este ato inclui-se na Mitsvá de Tsedacá, portanto é preciso comportar-se de modo similar a quem presta caridade, como foi demonstrado em capítulos anteriores. Consequentemente, se por alguma razão a pessoa abordada em busca de auxílio não puder responder positivamente, você deve atuar como no caso da prestação de caridade, sem repreender o suplicante nem levantar a voz contra ele, como faz o avaro, que não só nega-se a atender os pobres que batem à sua porta, como os trata de modo indigno. É
preciso falar gentilmente com estas pessoas, mostrando-lhes que você realmente deseja emprestar-lhe o que pediu, mas que foi tomado por circunstâncias adversas que o impedem de fazê-lo no momento. A regra é: deve tratar quem lhe pede algo do mesmo modo que gostaria de ser tratado, como diz Rashi na passagem acima mencionada. Avot de Rabi Natan diz ainda: “Quem recebe seu semelhante com semblante alegre (mesmo que não lhe tenha dado nada) é visto pelas Escrituras como se lhe tivesse dado todos os bons presentes do mundo”. Agora explicaremos como esta Mitsvá deve ser praticada com pureza e em seu próprio mérito (Lishmá), livre de outros motivos ou interesses. Nossos Sábios disseram (Pessachim 8a): “Se alguém diz: Darei um Sela de caridade para que eu viva mais ou herde o Mundo Vindouro – é completamente justo em seus atos” (“neste assunto” – acrescenta Rashi). O mesmo se aplica para quem espera, também, derivar algum benefício. A razão para isto é que esta pessoa obedeceu a vontade de Deus quando disse que daria aquela moeda para a caridade. Mesmo que o tenha feito com o desejo de derivar algum benefício, isto não anula sua Mitsvá. Obviamente, o mesmo princípio se aplica a atos de Guemilút Chéssed . Se uma pessoa separa uma soma de dinheiro para um fundo de Guemilút Chéssed ou faz diretamente um empréstimo a outra, desejando com isto que seus filhos sejam abençoados com vida, que ele prospere nos negócios ou que por isto ganhe seu quinhão no Mundo Vindouro, sua Mitsvá será considerada completa, pois sua intenção foi cumprir uma Mitsvá ordenada pela Torá, embora deseje, ao mesmo tempo, que Deus, bendito seja, lhe conceda um favor em troca. (Isto não contradiz a regra aceita pelo Orach Chaim (capítulo 60), de que as Mitsvót requerem intenção para serem cumpridas – ou seja, que é preciso ter em mente a intenção de estar cumprindo uma Mitsvá. O doador só deseja, adicionalmente, que Deus lhe conceda um obséquio pelo seu ato. Portanto, sua Mitsvá é completa). O melhor seria cumprir esta Mitsvá somente pelo fato de Deus tê-la ordenado em Sua Torá. Então, o poder sagrado desta Mitsvá terá sido potencializado da maneira mais perfeita possível, atraindo fortemente o atributo celestial da bondade (Chéssed ), que se estenderá sobre toda a existência da Criação. Contudo, é possível que esta pessoa não se veja capaz de cumprir esta Mitsvá pela Mitsvá em si (Lishmá). Sua intenção é a de sempre beneficiar a si mesma, ter sucesso nos negócios, ser bem vista pela comunidade como um grande doador de caridade e
benfeitor. Apesar disto, não deve deixar de cumprir esta Mitsvá, mesmo que seja por estes objetivos. O Talmud (Pessachim 50b) declara: “Deixem os homens se engajarem no estudo da Torá e no cumprimento das Mitsvót , mesmo que movidos por outros motivos e interesses, pois se o fizerem imbuídos por estas razões, no fim cumprirão Mitsvót por seu próprio mérito, com pureza de pensamento”. (Veja Rashi e Tossafót, Berachót 17a). Estes atos também invocam a graça Divina sobre a Criação, ainda que não seja sobre sua totalidade, mas chegam somente até os céus, como ressalta o Talmud ( Pessachim 50b): “Um versículo diz (Salmos 57:11): ‘Pois Tua benevolência até os céus e Tua fidelidade alcança as grandes alturas’. Outro versículo diz (Salmos 108:5): ‘Porque acima dos céus alcança Tua benevolência’. Não há contradição entre os dois. Um deles refere-se a quem faz caridade pelo próprio mérito e outro a quem a pratica por motivos outros”. O Talmud (Baba Batra 9a) que diz, “Contudo, isto é considerado Tsedacá”, prova que, independentemente da forma como esta ação é realizada, as Escrituras a veem como Tsedacá, e o mesmo se aplica aos atos de bondade. Nossos Sábios disseram ( Sifre, Ki Tetsê): “Mesmo se alguém perdeu um Sela e um pobre achou esta moeda, o Onipresente credita o mérito de haver dado Tsedacá a quem a havia perdido”. O Midrash Tadshê (capítulo 12) explica: “Há três tipos de sacrifícios: de elevação ( Olá – queimado totalmente no altar), de paz ( Shelamim) e de expiação (Chatat ). Da mesma forma, há três tipos de justos que servem a Deus de diferentes maneiras: por amor, súplica ou medo. A oferenda de queima corresponde ao amor: a de paz corresponde às súplicas e a de expiação ao medo. A oferenda de queima é feita unicamente em honra à Glória Divina, mas as demais são oferecidas para nosso mérito. O amor é a mais preciosa virtude. Existem pessoas justas, que servem a Deus com amor, dando honra e glória ao Seu reino. Pois somente Ele sustenta tudo o que existe; Ele, em Sua grande bondade, criou o mundo com Sua palavra, sem esforço algum. Ele é Deus, é Pai, é Rei, é Poderoso, Sábio, Bom, o Misericordioso, Quem tudo possui e Quem preenche todas as coisas, dos mundos superiores aos inferiores. É Ele quem sustenta Suas criaturas, que conhece todos os segredos do universo, que faz o bem ao justo e ao ímpio, permitindo que este último perdure para arrepender-se e viver. Por todo este bem, o justo ama o Onipresente e Lhe dá graças e louvores por todos os Seus grandiosos atos. É por isto também que as oferendas de queima são sacrificadas”.
“O que vem a ser as súplicas?” – Existem aqueles que servem a Deus, despejando súplicas e pedidos diante Dele. Eles pedem todo o tipo de benefício e vantagens para si mesmos, tais como sabedoria e discernimento, conhecimento, longa vida, saúde, uma esposa inteligente, filhos com bom caráter, sucesso, fortuna, honrarias, prosperidade etc. É a isto que chamamos de “súplicas”. Para este tipo de serviço, são levadas ao altar as oferendas de paz. Eis o exercício da fé pelo medo: existem os que servem a Deus com grande temor e trepidação. Rezam para serem redimidos, tanto neste mundo quanto no Mundo Vindouro, das maldições anunciadas nas Escrituras contra os que traem as Mitsvót e transgridem os mandamentos do Onipresente. Pleiteiam serem salvos tanto neste mundo quanto no Mundo Vindouro da doença, da dor e do sofrimento, para não se tornarem dependentes dos outros, para que estranhos não os subjuguem, para que não vejam seus filhos morrerem ou sofrerem danos e para que suas vidas sejam repletas de bonança e bênçãos; para que sejam poupados (no Mundo Vindouro) da punição e da destruição, e do fogo ardente do Guehinom, destinado a cauterizar e consumir os malvados, no dia do grande julgamento. Este é um serviço movido pelo medo, no qual eram levadas ao altar as oferendas de expiação. Contudo, estas três oferendas, de queima, de paz e de expiação, eram levadas ao mesmo Templo, por um só sacerdote, a Um só Deus e todas elas têm igual importância. Por isso, os justos, que servem a Deus por amor, por desejarem algo ou por medo, são igualmente bem quistos sob as sombras do Altíssimo, bendito seja. Quem O serve por amor, expressa seu amor por Ele. Quem o serve por motivo de súplicas, implora por Ele; quem O serve por medo, O teme. Mesmo que cada um destes três tipos represente um nível diferente de serviço Divino e que o atributo do amor seja o mais precioso de todos, não obstante, as demais oferendas também são queridas por Deus, bendito seja, pois também produzem “um odor querido pelo Eterno”. (Levítico 3:16 e 4:31) Agora podemos argumentar em favor do nosso caso. A caridade e a bondade, em todas as formas que são praticadas, são preciosas para Deus, bendito seja. Precisamos, no entanto, evitar praticá-los buscando a própria glória em detrimento de outras pessoas, pois
isto pode provocar a destruição desta Mitsvá. Cada um de nós deve ter em mente que tudo o que temos em mãos nos foi dado pelo Altíssimo, bendito seja, como está escrito (1 Crônicas 29:14): “Pois todas as coisas provém de Ti e tudo o que damos a Ti, a Ti pertence”.
Capítulo 24
A importância de saldar dívidas
DIA 21
Todo o tempo estivemos descrevendo a grandeza da Mitsvá de conceder empréstimos sem juros. Agora explicaremos a importância do devedor restituir seu empréstimo. Nossos Sábios declararam (Ketubót 86a): “É Mitsvá pagar um credor”. Isto não é menos importante que cumprir Mitsvót como Sucá, Shofar e Tefilin. Além disso, o Talmud afirma (Baba Metsia 113b): Quando uma corte rabínica dá ao credor poderes para embargar as posses do devedor, o credor não pode embargar a comida necessária ao devedor para um período de trinta dias, roupas para doze meses, bem como os utensílios que o devedor necessita para seu ofício – isto está imune à penhora. Todo o resto de seus bens móveis e imóveis, livros, etc. são vendidos para saldar a dívida contraída. Nem mesmo o suficiente para alimentar sua esposa e filhos lhe é concedido, pois todas as suas posses devem ser utilizadas para saldar a dívida. Quanto à pessoa que se recusa a pagar o que deve (ou seja, ela tem os meios, mas resiste em pagar), ela transgride um mandamento explícito da Torá (Levítico 19:13): “Não sonegarás (o salário) do teu próximo” e o decreto do Shulchán Aruch (Choshen Mishpat , capítulo 359, parágrafo 8): “O que constitui uma sonegação? – Alguém se apossa do dinheiro de um colega com o consentimento dele e, chegada a hora do pagamento, esta pessoa retém o dinheiro da dívida ou se recusa a saldá-la. Por exemplo: chegou o momento de cobrar uma dívida ou o seu ordenado. O credor então exige o que lhe devem mas não consegue arrecadar o pagamento porque seu devedor retém-lhe o dinheiro à força”. Nossos Sábios também designaram quatro tipos de pessoas que são chamadas de perversas (Bamidbar Rabá 18:10), e uma delas é quem empresta e não paga, como está escrito (Salmos 37:21): “Pede emprestado o ímpio, e não paga”. Que vergonha deve ter uma pessoa que pode saldar uma dívida, mas não o faz, agregando o adjetivo Rashá (ímpio) à sua pessoa. Se o seu colega chamá-lo de Rashá, mesmo em privado, onde ele não pode sentir vergonha, ainda assim se sentirá insultado. Que vergonha ele sentirá
então, quando seu caso for exposto diante de milhares e milhares de criaturas celestiais. Assim dizem nossos livros sagrados; que todos os atos do homem são expostos publicamente na presença de todos, quando sua alma chega aos Céus. Ela pode até impressionar seus contemporâneos, agindo como se fosse inocente, mas a Deus, a grandeza de seu crime será revelada. Isto é o que nossos Sábios tinham em mente ao dizer ( Pirkê Avot 2:13): “Não te consideres ímpio ante ti próprio” (Se for erudito em Torá, seu pecado é excessivamente grave, pois além de pecar, profana o nome do Eterno, como está escrito Levítico 22:32: “E não profanareis o nome de Minha santidade”. Nossos Sábios deram uma ênfase ainda maior a este tema Iomá 87: “De que modo o Seu nome é profanado? – Se um sábio compra, mas não paga no momento da compra”. Maior ainda é a transgressão de quem compra e nunca paga). O Choshen Mishpat (capítulo 97, parágrafo 4) rege que é proibido tomar dinheiro emprestado e esbanjá-lo com tolices, a ponto do credor não encontrar nada que possa usar para resgatar a dívida. Quem age deste modo é chamado Rashá. Mais ainda se tiver como pagar a dívida e recusar-se a fazê-lo. Como é grande sua iniquidade É preciso saber que o dinheiro retido indevidamente em nossas mãos não gerará lucros, como dizem as Escrituras (Jeremias 17:11): “Assim é o que ajunta riquezas, mas não com ustiça, no meio dos seus dias a deixará”. ( Iaazvenu – a deixará –, pode ser interpretado de modo direto ou inverso, ou seja, a riqueza deixará seu dono, ou o dono deixará sua riqueza). Seus atos maus farão com que perca tudo o que tinha antes disto também, como está escrito em Dérech Érets Zutá (capítulo 3): “Se te apropriaste do que não é teu, o que te pertence também será tomado de ti”. As Escrituras nos admoestam no sentido de não tomarmos posse do que pertence aos outros (Miqueias 6:8): “Ele te há declarado, ó homem, o que é bom e o que o Eterno requer de ti, senão que pratiques a justiça...” Tudo isto está inserido nas leis sobre a ustiça – que temos a obrigação de cuidar não causar danos aos outros. (Veja o primeiro capítulo, onde nos alongamos sobre este tema). Quem cuida em se comportar com lisura, apressa a redenção Divina para Israel, como está escrito (Isaías 56:1): “Mantende o juízo e praticai a justiça; assim a Minha salvação
está prestes a vir, e a Minha justiça prestes a se manifestar”. (Veja o que escrevemos na brochura Sefat Tamim, capítulos 3,4 e 5).
Capítulo 1
A arte da hospitalidade
DIA 22
Nossos Sábios disseram (Sucá 49b): “Guemilút Chéssed excede a caridade (Tsedacá) em três aspectos:
1 Caridade se faz com dinheiro, enquanto Guemilút Chéssed se faz com dinheiro e com o próprio corpo.
2 Caridade se faz apenas com os pobres, mas Guemilút Chéssed pode ser feita com pobres e ricos.
3 Caridade se faz apenas com os vivos enquanto Guemilút Chéssed se faz com os vivos e com os mortos”. Na primeira parte deste livro limitamos nossa discussão à bondade feita com o dinheiro: as doações aos pobres e os empréstimos sem juros feitos tanto aos ricos quanto aos pobres. Agora discutiremos os aspectos da bondade feita através da nossa própria pessoa, que assim nos permita Deus. Saiba que o conceito de praticar atos de bondade com nosso “próprio corpo” inclui todas as formas de afabilidade com o próximo e de empenhar-se em prol do nosso semelhante. Isto significa ser hospitaleiro com nossos convidados (aqui a Mitsvá se caracteriza no esforço em recebê-los graciosamente – mesmo se eles não precisam dos nossos favores), visitar doentes, alegrar os noivos em sua boda, acompanhar funerais, enterrar os mortos, fazer um discurso fúnebre, carregar o ataúde e muitos outros atos que, se Deus quiser, enumeraremos adiante. Primeiramente, proclamaremos a grandeza da Mitsvá de sermos hospitaleiros com nossos visitantes (hachnassát orchim) e a grande recompensa que a acompanha; a seguir
descreveremos como cumprir esta Mitsvá. Como é preciosa esta Mitsvá aos olhos de Deus, bendito seja! Toda uma seção da Torá é dedicada a ela. Isto deve servir de indicador para que nos dediquemos a ela durante toda a vida. Logo após a visita dos anjos, as Escrituras louvam Abrahão que ordena seus filhos a se esmerarem nesta conduta, sinal característico dos justos. O Talmud ressalta (Shabat 127a): “Rabi Iochanan disse: Receber visitas com hospitalidade é tão grande quanto atender com frequência os estudos no Bêt Midrash e Rabi Dimi de Nehardea disse: É até mesmo maior...” 38 Mais adiante, o Talmud afirma que a hospitalidade supera em importância receber a Presença Divina, como está escrito (Gênesis 18:3): “Meu Senhor, se tenho achado graça em Teus olhos, rogo-te que não passes de Teu servo”. (Abrahão desculpou-se, pedindo à Shechiná que esperasse e não o deixasse até ele retornar. Logo, dirigiu-se a atender seus visitantes). A hospitalidade conta entre os feitos cujos frutos são desfrutados neste mundo, ao mesmo tempo em que o fundo permanece reservado para o Mundo Vindouro. Portanto, o restante dos benefícios que o homem recebe pelo exercício da bondade, lhe são concedidos por esta Mitsvá, pois ela também está incluída na categoria de Chéssed , como aponta o Talmud. O Altíssimo, cujos conselhos são grandiosos e os atos majestosos, arranjou que o encontro entre Isaac e Rebeca resultasse dela atender a um viajante, como está escrito (Gênesis 24:14): “E à moça a quem direi: Abaixa, rogo-te, teu cântaro, e beberei, e ela disse: Bebe e também darei de beber a teus camelos, é ela a quem destinaste para teu servo Isaac”. E Rashi comenta: “Ela é merecedora dele, pois atua caridosamente”. Podemos concluir deste incidente, que nível uma pessoa pode alcançar cumprindo esta Mitsvá apropriadamente, com todo o coração, como Rebeca, que, em muitos aspectos, fez mais do que o servo de Abrahão requisitou. Quem cumpre esta Mitsvá continuamente, é abençoado com filhos. Assim diz o Midrash (Tanchuma, Ki Tetsê) e as Escrituras confirmam, com relação ao episódio envolvendo Abrahão. Após a refeição, o anjo anunciou (Gênesis 18:10): “Certamente retornarei a você nesta estação, quando então, tua mulher Sara dará luz a um filho”.
Saiba também que esta Mitsvá inclui sermos hospitaleiros com os ricos, como indica o Sêfer Iesh Nochalin, citando o Maharil . Mesmo que este rico não precise de favores, o esforço em servi-lo e honrá-lo de modo condizente à sua posição constitui uma Mitsvá. Tanto mais se o visitante for uma pessoa pobre! Aqui a Mitsvá é também um ato de caridade que está sendo prestado, como mostra a obra aqui mencionada. Contudo, nossos pecados fizeram esta situação se inverter: quando um amigo rico vem visitar, o anfitrião é todo sorrisos, proporcionando uma visita prazerosa; mas, quando uma pessoa triste e alquebrada bate à sua porta, o que consistiria no cumprimento do preceito (Isaías 58:10): “Se abrires a tua alma ao faminto e fartares a alma aflita, então nascerá a tua luz nas trevas...”, o anfitrião não se alegra com isso, e até mesmo sente embaraço. Segundo o o Shach (Iorê Deá, capítulo 256), baseado no Mordechi , os membros de uma comunidade podem compelir uns aos outros a abrigar viajantes e serem caridosos com eles. A Guemará (Chaguigá 27a) equipara uma refeição servida a um pobre à nossa mesa às oferendas queimadas no altar: “Rabi Iochanan e Resh Lakish disseram: Quando o Templo existia, oferendas expiavam os pecados do indivíduo. Agora quem o faz é sua mesa”. De acordo com Masséchet Derech Érets Rabá (capítulo 2), as pessoas misericordiosas, que alimentam os famintos, dão de beber aos sedentos, vestem os despidos e distribuem caridade, são aludidas no versículo (Isaías 3:10): “Dizei do justo que lhe será bem, pois comerá do fruto de suas ações”. A recompensa é tanto maior se o convidado for um Talmid Chacham (erudito em Torá). O Talmud (Berachót 10b) ensina esta lição: “Rabi Iosse bar Chanina, em nome de Rabi Eliezer ben Iaacov: “Aquele que hospeda um Talmid Chacham, o alimenta, dá-lhe de beber e permite que usufrua de suas posses, é visto pelas Escrituras como se tivesse sacrificado a oferenda queimada diariamente (Tamid ).” A palavra “Tamid” também aparece nesta passagem (com referência à Shunamita que ofereceu hospitalidade a Elisha): (2 Reis 4:9) “Ele sempre (Tamid) passa por nós”. A inferência é feita por equivalência no significado das passagens – Guezerá Shavá. Quem nega o usufruto de seus bens a um Talmid Chacham, é passível, Deus o livre, de severa punição. Assim diz o Talmud (San’hedrin 92a): “Rabi Eleazar disse: Quem recusa o uso de seus bens a eruditos em Torá não será abençoado com sucesso.”
Nossos Sábios afirmam (San’hedrin 103b): “Grande é o alimento dado aos viajantes e famintos, que afasta o próximo e aproxima o afastado, remove o julgamento severo do perverso e faz a Shechiná repousar sobre os profetas do Baal. Mesmo transgredi-la não intencionalmente é visto como um pecado deliberado. ‘Afasta o próximo’, refere-se a Amon e Moab. (Por serem descendentes de Lot, sobrinho de Abrahão, estavam próximos de Israel. O Onipresente os afastou, proibindo-os de juntarem-se à comunidade judaica (ou seja, os homens que descendem paternalmente de um prosélito amonita ou moabita, não pode contrair núpcias com uma israelita de berço), pois os homens destes povos se negaram a receber os Filhos de Israel com pão e água, como relatam as Escrituras (Deuteronômio 23:4). ‘E aproxima os afastados’, refere-se a Itró. Como afirmou Rabi Iochanan: Como recompensa por dizer, (Êxodo 2:20) ‘Chama-o, para que venha comer pão’, seus descendentes (de Itró) tiveram o mérito de sentar-se em Lishcat Hagazit (o assento do San’hedrin)... ‘Protege o perverso do julgamento’ – sua conduta não é examinada em busca de causa para punição. Deduzimos isto de Michá, que fabricou ídolos (Juízes 17:3). Como disse Raba bar Mari: Ouvi dizer porque Michá não conta entre os quatro ímpios que não tem um quinhão no Mundo Vindouro. A razão disto é que deixava seu pão disponível aos viajantes. ‘Faz com que a Shechiná repouse sobre os profetas do Baal’ – como está escrito (1 Reis 13:20): ‘Eis que eles se sentaram à mesa’. (Ido, o profeta, predisse que o altar em Bêt El seria destruído, pois Jeroboão ofereceu bezerros aos ídolos ali. Um falso profeta o enganou e dissuadiu a voltar para Bêt El, fazendo-o transgredir o comando Divino de ‘Não retornar a Bêt El’. Este falso profeta o alimentou e por este ato a Shechiná pousou sobre ele e ele profetizou, como está escrito (ibid.): ‘E a palavra de Deus veio ao profeta que o fez retornar’). Rabi Iehudá disse em nome de Rav: ‘Mesmo o transgredir não intencional desta Mitsvá é um pecado; se Jonatan desse dois filões de pão a David (e este último não tivesse que pedir por pão aos sacerdotes de Nov, Doeg não os teria traído, entregando-os a Saul), os sacerdotes de Nov não teriam sido aniquilados, Doeg não teria perdido seu quinhão no Mundo Vindouro e Saul e seus três filhos não teriam sido mortos”. Tudo o que escrevemos aqui prova a importância de não fechar os olhos para a Mitsvá de Hachnassát Orchim – ser hospitaleiro com os viandantes. Como recompensa, o Altíssimo, bendito seja, salvará o benfeitor e seus filhos de todos os problemas deste mundo.
Capítulo 2
Como tratar os hóspedes
DIA 23
Até o momento, vimos que a Torá demora-se consideravelmente na descrição da hospitalidade de Abrahão para com os que lhe batiam à porta, tratamento não dispensado às suas demais virtudes. Em outras instâncias, a Torá faz apenas um comentário sobre Abrahão ter cumprido toda a Lei (Gênesis 26:5): “Porque escutou Abrahão Minha voz, e guardou Minha sentença, Meus mandamentos, Meus estatutos e Minhas leis”. No entanto, a mitsvá de Hachnassát Orchim, que está inclusa no preceito geral (Deuteronômio 28:9) “E andarás nos Meus caminhos” (fazer o bem e prestar caridade), é amplamente comentada pela Torá, para nos ensinar e dar exemplo da importância da hospitalidade. Podemos concluir que a Torá quer que aprendamos de nosso patriarca como se portar com os hóspedes. Seria apropriado, portanto, selecionar alguns detalhes desta porção da Torá, relevantes ao nosso estudo. Primeiramente, a Torá relata que Abrahão ainda estava convalescendo e sofrendo os efeitos do cumprimento da Mitsvá da circuncisão, que operou em si próprio. Entretanto, ele sentou-se à entrada de sua tenda no calor do dia, esperando e observando, caso algum viajante pudesse ser percebido à distância, para então convidá-lo à sua casa. (Mesmo que não estejamos acostumados a agir deste modo, podemos ao menos aprender deste episódio que devemos procurar por hóspedes e tratá-los cordialmente, como se uma pessoa rica e poderosa nos estivesse fazendo esta visita). A seguir, a Torá relata como Abrahão ordenou que trouxessem água para que aqueles viajantes lavassem os pés, pelo simples motivo da viagem deixar os pés sujos de lama e pó. Ele então providenciou meios para que seus hóspedes se higienizassem (e assim nós devemos proceder, além de prover ao visitante água e alimento). Abrahão convidou então suas visitas a descansar após sua fatigante viagem sob a sombra refrescante de uma árvore, enquanto lhes preparava algo para comer. (Aqui aprendemos, que antes de
preparar comida para nossos hóspedes, devemos cuidar que se higienizem e descansem de sua fadiga). Abrahão notou também que eles desejavam abreviar sua visita, para não lhe dar trabalho, então disse (Gênesis 18:5): “Mandarei trazer um pouco de pão... então podereis ir”. Abrahão insistiu que ao menos aplacassem a fome, para então seguir viagem. Terminou por preparar uma refeição esmerada para seus hóspedes. É assim que agem os ustos: falam pouco e fazem muito. Abrahão preparou-lhes a melhor refeição que pôde e com o máximo de rapidez. O que já estava pronto era servido primeiro. Ele próprio serviuos durante a refeição. Ao término da refeição, acompanhou-os em direção à sua jornada. Devemos aprender todos estes hábitos de Abrahão, nosso patriarca. Se não podemos cumprir esta Mitsvá com todos os requisitos, devemos tentar cumprir ao menos alguns deles. É nosso dever também educar nossos filhos nesta Mitsvá, como está escrito (Gênesis 18:7): “E deu-o ao moço” – referência a Ismael, seu filho, para treiná-lo no cumprimento das Mitsvót (Rashi). Os livros sagrados alertam para a necessidade de receber cordialmente nossos hóspedes. Ao chegarem, de imediato devemos colocar à mesa algo para comerem, pois podem estar famintos e ter vergonha de pedir. Ao servi-los é preciso fazê-lo graciosamente e não de modo irritadiço. O anfitrião não deve permitir que um hóspede conheça suas preocupações (mesmo se as tiver). Deve aparentar ter meios de sustento mesmo que seja pobre. As conversas com os hóspedes devem servir para confortá-los e reanimá-los. O anfitrião não deve despejar seus problemas sobre as visitas para não lhes ferir o espírito, pois poderão pensar que ele os está contando por sua causa. O anfitrião pode perder seu mérito por esta Mitsvá comportando-se deste modo. Enquanto comem, o anfitrião deve mostrar tristeza por não poder oferecer-lhes mais e melhor, como está escrito (Isaías 58:10): “Se abrires a tua alma Nefesh ao aflito” – teu desejo por fazer o bem – ao pobre, Nefesh denotando desejo (Veja Gênesis 23:8). O Zôhar (Vaiac’hel ) faz um comentário sobre o versículo, “Acaso não consiste em repartirdes o teu pão com o faminto, e recolherdes em casa os pobres desamparados?” (Isaías 58:7): o anfitrião deve cortar o pão para seu hóspede, assim ele não se sentirá embaraçado, e não deve observá-lo enquanto come, para não humilhá-lo. Se o hóspede ficar para dormir, o anfitrião deve proporcionar-lhe a cama mais confortável da casa, para que descanse da melhor maneira possível. Às vezes, dar um bom lugar para o repouso de
um hóspede é mais importante que dar-lhe de comer ou beber. O anfitrião deve pensar consigo mesmo: “Fosse eu o hóspede, certamente gostaria que me tratassem com consideração – dando-me de comer e beber, assim como alojamento”, como observou Rabi Chia a sua esposa (Shabat 151b): “Há uma roda giratória neste mundo”. Às vezes alguém pode não querer convidar outras pessoas à sua casa por temer não ter o suficiente para lhes oferecer. Este argumento é válido somente no caso de outro lar poder acomodá-los condignamente. Se não houver quem acolha estas pessoas, é preferível convidá-las à nossa casa e oferecer o que for possível, a deixá-las sem ter com que se alimentar. Finda a refeição do nosso hóspede, é um dever acompanhá-lo à saída. Nossos Sábios atribuíram grande valor a esta Mitsvá, afirmando (Sotá 46b) que sua recompensa é ilimitada. Também explicaram o versículo com relação à Eglá Arufá (Deuteronômio 21:7), “Nossas mãos não derramaram este sangue e nossos olhos não viram”, deste modo: “Nossas mentes podem conceber que o Bêt Din tenha derramado sangue? – Na verdade, a intenção do versículo é esta, ‘Não reparamos nos pobres e os deixamos ir sem comer e também não os acompanhamos até o início de sua jornada’”. Nossos Sábios asseguram que se acompanharmos um hóspede ao menos quatro cúbitos (aproximadamente 2 metros) quando ele deixa nossa casa, nada de mal lhe acontecerá. Portanto, quem não o faz é como se estivesse lhe derramando o sangue. Assim como compele seus indivíduos a prestar caridade, a comunidade pode compeli-los a acompanhar as visitas quando prosseguem viagem. Isto é de especial relevância quando nosso hóspede não conhece o caminho, com todas as ruelas e encruzilhadas à frente. É, portanto, uma grande Mitsvá acompanhá-lo e mostrar o caminho, oferecendo-lhe ao menos um mínimo de indicações para que não se perca. O mérito de quem acompanha uma visita e a ajuda a não se perder no caminho é extremamente grande, pois este é o comportamento ideal quando se trata de cumprir com esmero a Mitsvá de receber hóspedes. O Talmud (Sotá 46b) demonstra o valor desta Mitsvá citando um incidente (Juízes 1:24): “E os sentinelas viram um homem saindo da cidade, e o indagaram: ‘Mostre-nos, rogamos, a entrada para a cidade e faremos bondade convosco’. Ele os mostrou a entrada para a cidade e eles a passaram pelo fio de suas
espadas; mas deixaram aquele homem e sua família partir em liberdade”. As Escrituras prosseguem: “Este homem partiu para a terra dos Hititas e lá construiu uma cidade que chamou de Luz”. Segundo o Talmud (ibid.): “Esta é a cidade contra a qual Sancheriv 39 marchou, mas não erradicou, contra a qual Nabucodonozor 40 marchou mas não destruiu, na qual o anjo da morte não tem permissão para entrar, mas seus habitantes idosos, quando estafam-se da vida, vão para fora dos limites de seus muros e então morrem. Daqui deduzimos uma premissa (Cal Vachomer ): Se aquele canaanita não disse uma só palavra e nem deu um passo sequer (apenas apontou o dedo para a entrada da cidade), e por meio deste gesto garantiu segurança para si e seus descendentes até a última das gerações, tanto maior será a recompensa de quem acompanha uma visita até seu caminho”. As Escrituras (Gênesis 21:33) relatam que Abrahão “plantou uma árvore frutífera ( Eshel ) em Beershéva”. O Pirkê Avot de Rabi Natan (capítulo 7) acrescenta que ele construiu inúmeras tendas pelo caminho e deixou nelas provisões para os viajantes (veja Sotá 10a). Como é valioso aprendermos uma lição como esta de Abrahão, nosso patriarca! Todos devemos ter um aposento para hóspedes em nossas casas. Naturalmente, pela manhã, não devemos esquecer a Mitsvá de acompanhá-lo ao início de sua jornada. As letras da palavra Eshel , são também as iniciais hebraicas Alef , de Achilá (comida); Shin, de Shtiá (bebida) e Lamed , de Levaiá (acompanhamento). Outros afirmam que o Lamed em questão é a inicial de Liná (alojamento). Nossos Sábios indagam: “Quem não tem posses para dar de comer e beber a um visitante, pode privar-se de alojá-lo e de acompanhá-lo pela manhã?” Que cada pessoa o verifique a si mesma. Há gente que constrói edículas em seus quintais. Não o fazem para acomodar hóspedes, mas para outros fins, convencendo-se da necessidade de havê-las construído para este ou aquele objetivo. Por que então se recusam a construir um aposento para as necessidades dos outros espíritos? No caso dos indivíduos de uma comunidade não poderem arcar com despesas com esta, a comunidade deve construir albergues para os visitantes, onde poderão saciar sua fome, sede, descansar com dignidade e não deve deixa-los partir, Deus o livre, sem provisões para a viagem. Nossos Sábios (Sotá 46b) fizeram o seguinte comentário sobre o versículo
(Deuteronômio 21:7) “Nossas mãos não derramaram este sangue”: “Eles não vieram até nossas mãos e os deixamos partir sem alimento”. Nossos Sábios ( San’hedrin 104a) também citam a passagem “Houvesse Jonatan dado a David dois filões de pão”, como tendo o mesmo significado, como explicamos no capítulo anterior. Hoje é uma prática comum no mundo judaico, encontrar uma sociedade que garante a hospedagem de viajantes (Hachnassat Orchim), que devota-se a cumprir esta Mitsvá. Bem-aventurados aqueles que o fazem!
Capítulo 3
Visitando os doentes
DIA 24
Agora passaremos à explicação da Mitsvá conhecida como Bicúr Cholim (visitar os doentes), outro aspecto de Guemilút Chéssed . O homem desfruta de seus benefícios neste mundo, enquanto o fundo permanece reservado para ele no Mundo Vindouro ( Shabat 127a). Nossos Sábios enfatizam com veemência o cumprimento desta Mitsvá. O Talmud (Sotá 14a) faz uma pergunta com referência ao versículo (Deuteronômio 13:5), “Após o Eterno, vosso Deus, andareis”: Como pode um ser humano andar após a Presença Divina? Não está escrito um pouco antes (ibid. 4:24) que “Deus é um fogo consumidor?” Qual é, então, o sentido do primeiro versículo? Seu significado é que o homem deve buscar imitar os Atributos do Altíssimo, bendito seja. Assim como Deus veste o despido, tu também deves fazê-lo, como está escrito (Gênesis 3:21): “E fez o Eterno Deus para o homem e para sua mulher, túnicas de pele e os fez vestir”. Assim como o Altíssimo, bendito seja, visita os doentes, tu também deves fazê-lo, como está escrito com relação a Abrahão (ibid. 18:1): “E apareceu-lhe o Eterno, junto a Eloné Mamré”. Assim como o Altíssimo, bendito seja, conforta os enlutados, tu também deves proceder do mesmo modo, como está escrito (Gênesis 25:11): “E foi depois da morte de Abrahão, e Deus abençoou a Isaac, seu filho”. E assim como Deus se encarrega de sepultar os mortos, tu também deves fazê-lo, como está escrito (Deuteronômio 34:6): “E sepultou-o (a Moisés) no vale”. Nossos Sábios ( Baba Metsia 30b) explicam deste modo o versículo (Êxodo 18:20): “E fá-los-ás saber o caminho por onde andarão e a obra que farão”: “O caminho” aponta para Guemilút Chéssed . (Isto inclui todos os atos de bondade através dos quais uma pessoa beneficia outras, seja por meio de sua pessoa ou de suas posses – ou seja, empréstimos de utensílios e outros. Pois empréstimos em espécie se enquadram em outro preceito, como está escrito: “Emprestarás dinheiro a Meu povo” e, portanto, não são aludidos neste versículo). “Andarão” – implica em visitar os doentes. “Por onde” – a Mitsvá de sepultar os mortos. A
Guemará então pergunta: “A Mitsvá de Bicur Cholim não estaria inclusa em Guemilút Chéssed ?” (Se o for, por que as Escrituras precisam dedicar uma descrição especial a ela?) A resposta é que esta descrição especial (para a Mitsvá de visitar os doentes) refere-se ao caso do visitante ter nascido na mesma época que o paciente, pois disseram: “Aquele que tem a mesma idade do enfermo leva consigo um sessenta avos da enfermidade do visitado”. (mesmo neste caso ele tem o dever de fazer esta visita). A Mitsvá de visitar um doente não tem medida nem limites. Os mais distintos têm o dever de visitar as pessoas comuns. Esta Mitsvá pode ser cumprida diversas vezes ao dia, a menos que isto se torne um fardo para o paciente ( Iorê Deá, capítulo 335). Parentes e amigos próximos devem visitá-lo imediatamente após a manifestação da enfermidade; visitantes ocasionais devem esperar até o terceiro dia, para não incomodá-lo e diminuir suas chances de recuperação. Se o paciente estiver seriamente doente, todos temos o dever de visitá-lo e para isso não é preciso esperar (ibid.). Se o paciente estiver deitado no chão, o visitante não pode sentar-se em um assento mais elevado que o enfermo, pois a Presença Divina pousa sobre sua cabeça (do enfermo). No caso do enferno estar deitado numa cama, será permitido sentar-se. O Shulchán Aruch reza que não devemos visitar uma pessoa com problemas intestinais, para não embaraçá-la, nem as com dores de cabeça ou nos olhos, pois a conversa as perturba. O mesmo se aplica em todos os casos similares. Por esta razão, o visitante, nestes casos, não deve entrar diretamente no quarto do paciente, mas esperar no corredor e perguntar a ele se precisa de algo e, ao mesmo tempo, dizer que sente compaixão por ele e que roga ao Eterno que o cure de pronto. Não devemos deixar de invocar a compaixão Divina por cada doente que visitamos. Se visitamos um paciente e nos esquecemos de rezar pela compaixão Divina, não teremos cumprido esta Mitsvá completamente. O doente não deve ser visitado durante as três primeiras horas do dia, pois sua condição goza em geral de uma sensível melhora nestas horas e o visitante não sentirá urgência em rezar pelo seu restabelecimento. A visita também não deve ser feita durante as três últimas horas, pois sua condição em geral piora e o visitante pode perder a esperança de rezar por sua cura. Se, no entanto, o visitante precisar seguir viagem, deve fazer a visita mesmo nas horas menos apropriadas, pois disto certamente resultará algum benefício para o paciente, pois o visitante poderá ajudá-lo de alguma forma, arrumando-lhe o quarto, etc. como relata o Talmud num caso envolvendo Rabi Akiva, conforme veremos mais adiante.
É possível rezar por um doente em qualquer idioma, pois ao fazê-lo estamos nos dirigindo diretamente à Presença Divina que pousa ao lado do enfermo. Contudo, se não estamos na presença do paciente, devemos usar somente o idioma sagrado (Hebraico), pois os anjos devem elevar nossas preces às alturas e eles não compreendem outros idiomas. Nossa petição deve incluir o paciente, a quem desejamos cura, com todos os doentes do povo judeu. Assim será melhor aceita nos Céus. Eis como ela deve ser dita: “Que o Onipresente tenha compaixão de ti junto aos demais enfermos de Israel”. Para o Shabat, a fórmula é: “O Shabat dispensa toda oração pois ele é a própria cura que está próxima a vir e Sua compaixão é imensa. Tenha um Shabat com paz”. 41 O Talmud (Nedarim 40a) assegura que “aquele que visita um doente livra-se dos castigos do Guehinom”, como está escrito (Salmos 41:2): “Bem-aventurado aquele que atenta para o debilitado, no dia do seu infortúnio, o Eterno o livrará”. O termo hebraico Dal , pobre, aplica-se também à pessoa doente, como está escrito (2 Samuel 13:4): “Por que te encontras tão adoecido (Dal )?”. O termo infortúnio (Raá), indica o Guehinom, como dizem as Escrituras (Provérbios 16:4): “O Senhor fez tudo para Seu propósito, e até o perverso para os dias do mal” (Guehinom). Aquele que pratica este ato recebe sua recompensa também neste mundo, como diz o versículo (ibid. 41:3): “Ele o guardará e o fará viver, será feliz na terra e não será entregue nas mãos dos seus inimigos”. “Seus inimigos” – referência ao Iétser Hará; “O fará viver” – livrando-o do sofrimento físico; “Será feliz na terra” – todos o respeitarão. Por outro lado, grande é o pecado dos que relaxam no cumprimento desta Mitsvá, como encontramos no Talmud (ibid.): “Um discípulo de Rabi Akiva adoecera e os Sábios não foram visitá-lo. Rabi Akiva entrou, ele mesmo, na casa deste doente, limpou o quarto e varreu o chão. O enfermo mostrou melhoras. ‘Meu mestre’, disse o aluno enfermo, ‘tu me deste vida’. Rabi Akiva saiu e proclamou: ‘Aquele que não visita um doente é como se houvesse lhe derramado o sangue’.” (Pois quem visita um doente atende suas necessidades imediatas, além de potencialmente conhecer algum remédio ou atenção médica que possa apressar seu restabelecimento).
Hoje em dia, devido às nossas muitas falhas, somos relapsos em observar esta Mitsvá, especialmente quando o doente é pobre. Não sei que justificativa estas pessoas podem ter. A obrigação existe quando o paciente é rico – e tanto mais, em se tratando de uma pessoa sem recursos. Se o pobre não for visitado, sua própria vida será posta em perigo. Em geral, esta pessoa mal pode conseguir a alimentação necessária para a sua cura e nem tem com quem se consultar sobre sua situação. Não raro, um pobre não tem como pagar um médico e nem comprar os remédios necessários. Seu sofrimento agrava-se ainda mais durante o inverno, quando o frio lhe gela o cansado espírito. Suas preocupações aumentam quando lembra que terá de permanecer acamado dias a fio, sem que ninguém lhe bata à porta oferecendo-lhe cuidados ou ajudando-o a recobrar a saúde. Todos estes fatores enfraquecem sua resistência e reforçam seu estado doentio, podendo levá-lo à morte. Como se pode avaliar uma situação como esta? As pessoas precisam confessar-se e dizer: “Nossas mãos não derramaram este sangue”. Nossos Sábios interpretaram este versículo do seguinte modo, “Como o deixamos ir sem comida” – isto é o mesmo que derramar-lhe o sangue, posto que possivelmente contribuirá para apressarlhe a morte. Em nosso caso, isto se aplica de modo mais direto ainda! A pessoa em questão já está doente; ninguém lhe está dando atenção e por isto seu estado de saúde vai de mal a pior. Isto certamente seria um pecado muito grave para carregar sobre os ombros. Neste contexto, podemos citar uma passagem relevante no Talmud ( Ketubót 68a): “Quem cerra os olhos para a caridade equipara-se aos idólatras”. O Iétser Hará tenta distrair nossa atenção para não vermos os enfermos – fazendo-nos evitar ir à sua casa e não o tendo em nossa mente. Se uma pessoa saudável for visitar um doente, inevitavelmente terá que tratar dele. Contudo, é preciso lembrar que a vida de uma pessoa está em jogo se não o fizermos. Como é grande a recompensa concedida por D–us, bendito seja, a quem visita os doentes, aconselhando-os como agir, e que os encoraja para não perderem as esperanças. Vejam que nossos Sábios descrevem a grandeza da recompensa por esta Mitsvá – tão somente pelo ato da visita – quanto mais se durante a mesma pudermos cumprir a Mitsvá da Tsedacá e de salvar uma vida, além de infundir confiança e estimulo no paciente durante nossa conversa com ele. Quem o faz será abençoado pelo Altíssimo, bendito seja, em
muitos aspectos, como nossos Sábios aclararam (Baba Batra 10a): “Quem infunde confiança numa pessoa pobre é merecedor de onze bênçãos”. De fato, muitas comunidades formaram sociedades (Chevrot Bikur Cholim pl.) com vistas a visitar os doentes, cuidando de suas necessidades físicas e emocionais durante seu estado de doença, certificando-se de estarem recebendo atenção médica apropriada, além de alimento e todas as outras necessidades. Seria tão louvável se esta prática se difundisse mais, e instituições deste tipo fossem estabelecidas em todas as cidades, pois, em alguns casos chega a tratar-se de salvar vidas. Quem fecha os olhos para esta obrigação transgride o que diz o versículo (Levítico 19:16): “Não sejas indiferente quando está em perigo o teu próximo”. Bem aventurado quem se preocupa de coração e espírito com esta gente desafortunada. Sobre este, diz o salmista (41:1): “Bem aventurado aquele que atenta para o debilitado, no dia do seu infortúnio, o Eterno o livrará”. O debilitado é a pessoa doente – como explicam nossos Sábios ( Nedarim 40a). Esta referência é ainda mais apropriada em se tratando de um enfermo sem recursos materiais e, por este motivo, duplamente debilitado. O Shulchán Aruch (Iorê Deá 335:7) requer ainda que o visitante pergunte ao paciente se é preciso cuidar de seus afazeres, como por exemplo, se ele deve dinheiro a alguém ou outros devem-lhe dinheiro, se artigos seus encontram-se com outras pessoas e vice-versa, ou se tem contas a pagar. O paciente não deve temer que, em vista disso, sua vida esteja por um fio. Estas medidas devem ser tomadas apenas a partir do terceiro dia de sua doença, ao menos que a pessoa já esteja extremamente enferma. O Chochmat Adam menciona também ser costumeiro em algumas comunidades, especialmente em Berlim antes da Segunda Guerra Mundial – N. do T., que, no terceiro dia da enfermidade de uma pessoa, os encarregados da sociedade Bikur Cholim e outras pessoas, viessem visitá-lo, dizendo: “Como você sabe, este é um procedimento rotineiro, por isto não se preocupe”, e também lhe pediam para confessar seus pecados, pois quem o faz, os tem perdoados e aproxima a cura. Este costume era praxe nestas comunidades, de modo que o doente não se sentia tenso por lhe estarem cuidando destes assuntos. Isto deveria ser praticado em todas as
comunidades. Onde não existe este hábito, não se deve tratar diretamente desses assuntos com o doente, pois este temerá estar chegando a seus últimos dias. A maioria das pessoas entra em pânico quando pedem para que confessem seus pecados. De qualquer modo, se as visitas temem que esta pessoa já esteja em condições precárias de vida, dirigem a conversa no sentido de encorajá-la a confessar os pecados, mas que não tema por fazê-lo. “Muita gente confessou os pecados e recobrou a saúde”, devem dizer, “enquanto outros não confessaram e morreram. É bem possível que a recuperação deu-se ustamente por os terem confessado. Quem confessa suas faltas ganha sua porção no Mundo Vindouro”. Se o enfermo não tiver condições de pronunciar as palavras apropriadas, deve dizê-las mentalmente. Se não souber o que dizer, devem pedir que repita estas palavras: “Que minha morte sirva para expiar meus pecados”. Estes assuntos não devem ser mencionados se estiverem presentes pessoas ignorantes, mulheres ou crianças, porque podem começar a chorar e farão quebrar mais ainda o espírito do doente (deve-se pedir a estes que se retirem). Deve-se pedir a ele também que peça perdão de todas as pessoas contra quem haja pecado, seja em assuntos financeiros, seja com palavras. O motivo para isto é que a morte não expia este tipo de pecado e sua alma pode precisar retornar a este mundo para restituir a propriedade a seu dono legítimo, como aponta o Gaón de Vilna em seu comentário sobre o versículo (Provérbios 14:25): “Uma testemunha fiel salva vidas”. Em suas notas, a obra Iesh Nochalin cita as palavras do Zôhar (Pecudê): “Quem cuida de um doente e o faz arrepender-se de suas faltas, é um anjo bom. Pois faz com que esta pessoa seja redimida do atributo da justiça, salvando-a da morte, resgatando-a da sepultura e preservando sua vida. Desta pessoa se diz (Salmos 41:2): ‘Bem aventurado quem leva os pobres em consideração’.” O homem de palavras justas sabe infundir confiança num paciente, como encorajá-lo, confortá-lo e fazer sossegar seu estado emocional. O visitante deve dizer: “Pelo mérito do teu arrependimento e da tua confissão, você viverá; e se tiver que morrer, será limpo de todos os teus pecados e purificado diante do Eterno, receberá tua parte no Mundo Vindouro e terá o mérito de tomar o teu lugar no Gan Éden junto aos Tsadikim”. Este tipo de Chéssed também deve ser praticado pelo visitante, pois ao encorajar o enfermo a fazer Teshuvá, terá sua recompensa multiplicada.
Assim diz o Zôhar Chadash (Lech Lechá): “R. Abahu disse: Venha e veja como é grande a recompensa de quem faz com que os outros se arrependam...” Se o paciente tem meios, mas não praticou Chéssed e caridade suficientes durante a vida, deve fazê-lo, ou, ao menos, decidir, sem que faça disto um voto, que passará a atender estes deveres assim que recobrar a saúde. As palavras dos nossos Sábios trazem diversos relatos afirmando que a caridade salva da morte e também do Guehinom.
Capítulo 4
Não deixe tudo para a última hora
DIA 25
As Escrituras nos admoestam (Eclesiastes 9:9): “Desfruta com a esposa que amas, todos os dias desta vida passageira, repleta de labuta, que o Eterno te concedeu sob o sol, pois esta é a porção que te cabe”. Logo após, as Escrituras acrescentam (ibid. 10): “O que és capaz de realizar com tua força, faze-o, pois no túmulo para onde te diriges não há feitos nem registros (Cheshbon), sabedoria (Dáat ) ou conhecimento (Chochmá)”. Explicaremos esta sequência com uma estória. Era uma vez uma pessoa rica e sábia em todas as disciplinas. Um dia ela tornou-se pobre. Sua condição piorava cada vez mais, até ela não poder arcar com suas despesas alimentares diárias. Ela então pensou consigo mesma: “Partirei para outras terras. Talvez, entre pessoas ricas, encontrarei uma posição compatível com minha capacidade e conhecimento. Certamente ganharei o suficiente para manter meu padrão de vida”. Mas, ao chegar a outras localidades e indagar se havia uma posição para uma pessoa de seu calibre, foi recusada repetidamente. Esta situação continuou por vários dias. Enquanto isso, havia gastado todo o dinheiro que trouxe consigo e viu que não poderia mais prosseguir, por isto decidiu deixar de procurar uma carreira promissora, uma vez que suas necessidades imediatas eram tão urgentes. Procurou por uma posição mais baixa e achou um emprego. O salário não era alto, mas ela ficou muito feliz por encontrar um meio de sobrevivência. Certo dia, um de seus antigos amigos encontrou-a e perguntou como estava e com que se ocupava. Ela contou ao amigo como encontrou aquele emprego e ele lhe disse: “Com tuas habilidades, deverias ocupar um cargo mais elevado”. Ela respondeu: “Eu bem que gostaria, mas busquei por muitos dias e para mim já era questão de vida ou morte. Sei qual seria minha situação se voltasse hoje para casa. Não ganharia sequer o pouco que recebo agora. Por isto, mesmo este cargo humilde que Deus me concedeu é suficientemente bom para mim. Ao menos tenho do que viver”. Nosso caso é semelhante. Todos nós temos como missão atender três importantes tarefas enquanto ainda estamos neste mundo. Em ordem decrescente de importância:
Primeiramente, o estudo da Torá – a mais importante de todas. Sua recompensa é maior do que qualquer outra Mitsvá e a punição por não fazê-lo é maior que todas as outras transgressões. A segunda tarefa é a Teshuvá, especialmente querida pelo Altíssimo. Em terceiro lugar devemos sempre praticar e perseguir as Mitsvót e demais atos de bondade. Esta última é de extrema importância, como está escrito (Provérbios 21:21): “Aquele que persegue justiça (caridade) e benevolência encontrará vida, caridade e honra”. É preciso fazer mais uma observação. Saiba que a sabedoria e o conhecimento aos que se referem as Escrituras, são atribuídos ao mais sagrado dos livros, a Torá, fonte de toda a sabedoria e de todo o conhecimento. Os registros ( Cheshbon), referem-se à Teshuvá. Assim indicam nossos Sábios Baba Batra 78b, com relação ao versículo Números 21:27: “Vinde a Cheshbon”. Agora as frases daquela passagem seguem uma à outra como pérolas num colar de contas. Primeiramente, as Escrituras ordenam (Eclesiastes 9:9): “Desfruta com a esposa que amas”. A esposa neste caso é a Torá, simbolizada pela figura de uma “esposa”, na descrição do Talmud (Kedoshim 30b). “Que amas”, ensina que cada indivíduo deve estudar a parte da Torá com a qual sente maior afinidade ( Avodá Zará 19a). “Todos os dias desta vida passageira” – nos alerta para não deixarmos passar um dia sequer sem estudar Torá, pois isto é supremamente importante. Quem estuda Torá diligentemente chega automaticamente à Teshuvá e boas ações. Nossas preces também são construídas desta forma: a bênção pela Teshuvá (na oração da Amidá) começa com uma petição pela Torá. Somente depois rogamos ao Eterno, “Retoma-nos ao Teu serviço, ó nosso Rei”. 42 Quem negligencia o estudo da Torá, remove-se do serviço Divino. Logo, o rei Salomão nos alerta: “Tudo o que tuas mãos possam obter e que o permitam tuas forças – realize!”. Isto leva em conta o fato que as pessoas às vezes se preocupam em demasia e são completamente incapazes de concentrar-se no estudo da Torá ou de engajar-se na introspecção requerida para a Teshuvá. O indivíduo pode concluir que não há porque continuar a cumprir Mitsvót , por não haver adquirido ainda os aspectos principais, que são Torá e a Teshuvá, respectivamente. Esta é a razão desta admoestação, o indivíduo deve sempre fazer tudo aquilo que estiver ao seu alcance, pois não encontrará nada no lugar onde está destinada a ir, sua sepultura – nem
sabedoria e nem conhecimento (Torá), nem registros ( Teshuvá – retribuição de acordo com seus atos), nem ações (Mitsvót ). Consequentemente, é preciso agarrar o que pudermos enquanto ainda estamos neste mundo. Agora elucidaremos a intenção da Escrituras ao afirmar “O que permitam tuas forças”. À primeira vista, estas palavras parecem supérfluas. Mas elas nos transmitem um importante conceito – que cada um de nós deve cumprir seu dever de estudar Torá e praticar boas ações com todas as suas próprias forças e meios. Ninguém pode esperar que seus filhos cumpram o restante de suas obrigações durante suas vidas para fazer subir seu nível, pois seus filhos certamente estarão preocupados com os próprios assuntos. E, caso seus filhos se ocupem de seus assuntos inacabados, não terão tempo para cuidar de seus próprios interesses, tendo de deixá-los ao encargo de seus filhos. Portanto, suas esperanças estarão eternamente incompletas. Quem, nas gerações anteriores, foi maior que Hilel? Seus filhos foram certamente pessoas de caráter superior, pios, santos. Contudo, ele nos alertou Pirkê Avot 1:13: “Se eu não for por mim, quem será por mim?” Então o que nós, seres insignificantes, podemos dizer? Vemos com nossos próprios olhos as gerações subsequentes se deteriorarem. Quem poderá afirmar se a próxima geração será sábia ou tola? Por isto o rei Salomão aconselha, “O que permitam tuas forças” – que devemos completar nossa tarefa nós mesmos, enquanto ainda estamos de posse de nossa força e vigor. O rei Salomão quis também transmitir uma ideia de grande valor. Às vezes as pessoas são auto confiantes e pensam que no final de suas vidas poderão deixar em testamento uma orientação para que seus filhos doem grandes somas de dinheiro em prol do estudo da Torá e outras causas de valor semelhante. Este plano tem muitas falhas. Primeiramente, quem garante que até lá a sua mente estará em pleno vigor de suas faculdades? Para isto também é necessário que a pessoa tenha méritos, para poder transmitir seus desejos aos seus filhos, pois as pessoas morrem, Deus não o permita, repentinamente e de causas surpreendentes. Além disso, quem garante que os filhos cumprirão sua vontade? Pode acontecer, Deus o livre, que o gosto pelo luxo distraia a mente dos filhos da vontade de Deus e do testamento do pai. O rei Salomão nos alerta no sentido de arranjarmos todos os nossos assuntos enquanto ainda somos cientes disto, direcionando uma parte para a alma
enquanto temos pleno domínio de nossas faculdades, quando ainda somos sábios o suficiente para impedir que nossa vontade seja frustrada. O mais indicado é transferir este fundos ainda em vida, investindo-os onde possam garantir o estudo da Torá ou Guemilút Chéssed . Então esta pessoa terá o mérito de atrair para si a bênção dada por nossos Sábios ( Berachót 17a) a quem amavam: “Que possais ver a vossa vontade realizada durante os vossos dias”. É preciso para isto empossar amigos de confiança com poderes para executar suas instruções. Tudo o que escrevemos aqui está descrito de modo conciso no Sêfer Chassidim (capítulo 716): “Ouça o que te aconselham enquanto ainda vives. Aceite a admoestação de outros. Vi gente dando orientações à família enquanto estavam doentes e suas diretrizes jamais foram cumpridas. Por isto está escrito (Provérbios 19:20): “Ouça o conselho, e aceite disciplina moral, para que você seja sábio em seus últimos anos”. Se alguém não logrou fazer um testamento quando estava em pleno vigor de todas as suas forças, mas está apto a transmitir sua vontade em seu leito de morte, deve ao menos cuidar que ela seja proferida diante de testemunhas e não confiar nem mesmo em seu pai, para não dizer sua mulher e filhos”. Os filhos podem argumentar: como o pai já está morto, ele não precisa do que tinha em vida. Este argumento é falso. Agora ele precisa mais de seus bens do que eles: o uso apropriado de suas posses pode certamente salvá-lo da medida da justiça severa Divina. O Midrash ilustra esta situação apropriadamente com uma parábola: um homem tinha três amigos. Amava muito o primeiro e um pouco menos o segundo. O terceiro ele não amava nem estimava. Uma vez o rei intimou-o a comparecer em sua presença e ditou aos funcionários reais que o trouxessem ao palácio. O homem estava bastante temeroso. Suspeitava terem armado um golpe contra ele que o faria ser condenado à morte, embora fosse inocente. A única saída que lhe ocorreu foi chamar seu amado amigo de confiança e pedir-lhe que testemunhasse sobre sua inocência perante o rei. Acorreu a este amigo e contou-lhe o acontecido, mas o amigo não lhe deu atenção, recusando-se a acompanhá-lo. Foi ter com o segundo amigo, que concordou em escoltá-lo durante o caminho para protegê-lo dos perigos, mas não apareceria diante do rei; assim que chegassem ao palácio, daria meia volta e retornaria à sua casa. O homem foi então ao terceiro amigo, o
qual não estimava e pediu que fosse com ele até a presença do rei. O amigo respondeu: ‘Não tema, irei com você. Me apresentarei diante do rei, darei testemunho sobre tua inocência e você será salvo’. Assim foi; o terceiro amigo foi com ele até o rei, testemunhou sobre seu caráter e salvou sua vida. O primeiro, mais amado de todos os amigos, é o dinheiro do homem, que o abandona logo que parte do mundo, não lhe deixando nada, como está escrito (Salmos 49:18): ‘Nem nada mais levará consigo’. O segundo amigo representa os parentes e amigos, que o acompanham até o túmulo, despedem-se dele e voltam cada um para seus afazeres. O terceiro amigo, que testemunha em sua defesa, é sua Teshuvá e boas ações. Elas acompanham o homem e fiam seu bom caráter, como está escrito (Isaías 58:8): ‘Tua usteza irá diante de ti’. O rei que intima a comparecer diante de si é o Rei dos reis, o Altíssimo, bendito seja, de cuja Sentença homem algum escapa, exceto pela sua Torá e Maassim Tovim (boas ações). A própria Torá expõe esta ideia na porção Nassó (Números 5:10): “E as santidades de todo homem, dele serão: o que der todo homem ao sacerdote, para este será”. Este versículo propõe que ao fim nada restará das realizações do homem, exceto pelos seus atos de bondade, feitos pessoalmente durante seus anos de vida, como Tefilin, Tsitsít e outras Mitsvót . A cada Mitsvá cumprida o homem cria um anjo defensor que sempre o acompanhará. O que não é o caso do Iétser Hará e das entidades físicas que o homem almeja e que o acompanham apenas temporariamente; quando ele se encontra em apuros, elas o abandonam. Além disso, na verdade elas detestam o homem, subindo aos céus e testemunhando contra ele, buscando sabotar sua vida. Mesmo os membros de sua própria família, que realmente o amam, não poderão estar ao seu lado para sempre. Cada um deve retornar à sua própria casa, após tê-lo acompanhado ao cemitério. Ele não os verá novamente até o momento da ressurreição dos mortos. O que lhe resta então? – seus atos sagrados. Eles o acompanham; são seus verdadeiros amigos e conselheiros, defendendoo diante do Senhor de todos os seres. Esta é a mensagem do versículo “E as oferendas de todo o homem, dele serão”. Por isto, o homem deve tratar de adquirir tantos destes amigos quanto puder durante o curso de sua vida, pois eles estarão sempre ao seu lado e existirão com ele para sempre.
O versículo conclui: “o que der todo homem ao sacerdote, para este será”. Aqui também há uma lição de moral. De todo o dinheiro que acumulou em vida, nada restará após sua ornada na terra. A única soma à sua disposição serão as quantias de dedicou à caridade e Chéssed . Nossos Sábios dizem portanto (Baba Batra 11a): “Meus ancestrais depositaram seus tesouros embaixo; mas eu deposito meus tesouros em cima”. Este é o sentido da passagem, “o que der todo homem ao sacerdote, para este será”. Uma doação pertence realmente a quem a doa. As Escrituras usam o termo “sacerdote” porque os Cohanim e os Levitas eram os principais recipientes da caridade nos tempos antigos. Assim dizem as Escrituras (Deuteronômio 12:19): “Guarda-te de abandonar o Levita por todos os dias que viveres na tua terra”. Suas necessidades davam-se pelo fato de serem os únicos israelitas que não possuíam terras em Israel.
Capítulo 5
A bondade verdadeira (consolando os enlutados)
DIA 26
Sepultar os mortos, além de ser uma Mitsvá da Torá, como está escrito: “Porém, certamente o enterrarás” (Deuteronômio 21:23), também pertence à categoria de Guemilút Chéssed . Mais do que isso, nossos Sábios chamam esta Mitsvá de Chéssed Shel Emêt (bondade verdadeira, autêntica), pois não há possibilidade alguma de recipr ocidade. Encarregar-se dos detalhes de um funeral, acompanhar o cortejo, carregar a urna, fazer um discurso no momento do enterro e tudo o que deve ser feito pelo morto, envolve atos de Guemilút Chéssed . A Torá explica estes tópicos nas porções Chaiê Sara e Vaichí .43 Veja a importância desta Mitsvá. Nossos Sábios decretaram (Moêd Catan 27b): “Quando alguém dentro da cidade morre, ninguém pode seguir com seus assuntos mundanos do dia-a-dia”. Mesmo que o falecido tenha parentes, (e estes são os primeiros que devem ocupar-se dos detalhes de seu funeral), toda a população da cidade tem o dever de comparecer ao enterro e realizar esta Mitsvá. Consequentemente, ninguém pode prosseguir em seus afazeres e todos devem ocupar-se deste assunto. (Se a comunidade dispõe de grupos organizados para este fim, cada um escalado para um dia determinado, os demais ficam desobrigados de ocupar-se com este funeral e podem prosseguir com suas obrigações. Se os membros da Chevrá Cadishá não foram escalados para atender às necessidades de um funeral num dia determinado, a sociedade como um todo fica obrigada a fazê-lo e não podem se ocupar cada qual de seus assuntos pessoais até que todos os detalhes do funeral tenham sido cumpridos e o caixão entregue às pessoas que o carregam até o local de sepultamento). Esta regra se aplica mesmo quando o falecido não tenha estudado Tanach ou Mishná: todo o trabalho dos membros de sua cidade devem cessar até que ele tenha os detalhes de seu funeral atendidos por completo. Somente o
estudo da Torá não é interrompido, conquanto a procissão do funeral não tenha iniciado e mesmo que o falecido tenha sido versado em Tanach ou Mishná. Não obstante, uma vez que o cortejo fúnebre tenha se iniciado, o estudo da Torá deve ser interrompido se o falecido era estudioso, a menos que o número de participantes da procissão exceda 600 mil pessoas. Tomar de volta a Torá (a morte de um Talmid Chacham equivale à Torá partir deste mundo), requer o mesmo cuidado dispensado à entrega da Torá. que ocorreu na presença de 600 mil pessoas. Mesmo os mais eruditos da geração não estão isentos desta obrigação. O Talmud (Ketubót 17a) relata que Rabi Iehudá bar Ilai interrompia seus estudos para ir ao enterro de um falecido que houvesse lido as Escrituras e estudado Torá durante seu período de vida, especialmente quem se dedicasse a ensinar os outros. Contudo, não temos o dever de interromper nosso estudo para acompanhar o funeral de um iletrado, desde que haja um mínimo de dez pessoas para recitar o Cadish e as bênçãos dos enlutados (Shulchán Aruch, Iorê Deá, capítulo 361). Fico chocado com a negligência de algumas comunidades a este respeito. Assim que estas pessoas acompanham o cortejo por alguns metros, cumprindo sua Mitsvá, retornam de imediato às suas casas e o morto fica abandonado. Poucos o acompanham até o cemitério. Não recitam um Cadish nem as bênçãos dos enlutados. É imprescindível que todos os habitantes constatem que haja um Minian presente até final do enterro, mesmo que isto exija um esforço maior dos membros da comunidade, como estar presente a um enterro nos dias mais frios do inverno ou ir a um cemitério longe dos limites da cidade. Nestes casos deve ser feito um sorteio para determinar quem deve comparecer ao enterro. Tudo isto se aplica mesmo a quem não teve estudo algum das Escrituras durante a vida e mais ainda nos dias de hoje, quando não há praticamente judeu algum que não tenha conhecimentos de Tanach ou Mishná (como explicado no Shulchán Aruch). Obviamente, portanto, é preciso dedicar nossa máxima atenção a este dever da Torá. A Chevrá Cadishá deve fazer todos os esforços possíveis (uma vez que as autoridades governamentais o tenham permitido), para não incorrer na proibição do corpo pernoitar sem ter sido enterrado. O Zôhar explica que grande sofrimento é causado ao falecido se o seu corpo pernoita sem ser enterrado. A Torá proíbe esta prática sem que haja motivo para isto, exceto nos casos previstos pela Lei judaica (vide Shulchán Aruch). Muitas vezes,
no entanto, por alguma razão trivial ou outra, ou por puro desleixo ou desatenção, temos visto as pessoas postergarem um funeral para o dia seguinte. Práticas como esta devem ser categoricamente evitadas. O Hespêd (elogio ou discurso fúnebre) também pertence à categoria de Chéssed estendido ao falecido. Como disseram nossos Sábios ( Baba Batra 100b): “o Hespêd honra o falecido”. (Rashi faz um comentário similar – Tratado Sucá 49b). É uma grande Mitsvá elogiar os mortos de modo condizente, com a voz postada, sensibilizando os presentes para que lamentem a partida de pessoa com estes méritos. Nossos Sábios comentam ainda (Moêd Catan 25a): “Quem derrama lágrimas por uma pessoa meritória obtém perdão pelos seus pecados”. Comentário semelhante é feito no Tratado Shabat (105b): “Se alguém despeja lágrimas por uma pessoa justa, o Altíssimo, bendito seja, as conta e guarda em Seu próprio tesouro”. Esta atitude demonstra que o enlutado lamenta realmente que o serviço a Deus tenha diminuído no mundo como resultado do falecimento desta pessoa. Cada lágrima, portanto, é importante aos olhos de Deus. Quem é displicente, Deus o livre, em chorar a morte de um Talmid Chacham é severamente punido. Nossos Sábios declaram que seus dias não serão prolongados; esta pessoa merece ser sepultada antes de sua hora. É preciso, portanto, cuidados especiais com esta Mitsvá. Devotemos um pouco de atenção ao assunto de consolar os enlutados. Isto também pertence à categoria de Chéssed , como rege Maimônides (Leis sobre luto, capítulo 14). Subsequentemente, encontrei na obra Pirkê de Rabi Eliezer (capítulo 16) uma menção explícita ao ato de consolar os enlutados como uma forma de Chéssed . As Escrituras também indicam (Deuteronômio 13:5): “Após o Eterno, vosso Deus, andareis” (o trecho completo foi citado no capítulo 3). Além disso, esta virtude foi exemplificada inúmeras vezes nas Escrituras com relação a Jacob e David, tanto na Torá quanto nos livros proféticos. Também encontra-se inclusa na exclamação “Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Levítico 19:18). O que gostarias que fizessem por ti (ajudando-te em tudo o que mais precisas para concluir teus afazeres com êxito ou aliviando o fardo de teus problemas quanto teu espírito se sente sobrecarregado), você deve tratar de fazer por teu semelhante. É preciso, portanto, que todos saibamos como agir num lugar onde haja um enlutado, que Deus nos proteja. (Infelizmente, devido aos nossos inúmeros pecados, não são poucos os que negligenciam esta Mitsvá ou a tratam com descaso, especialmente
quando se trata de confortar os menos afortunados. Deveria ser o contrário: são ustamente os mais pobres e desafortunados que sentem um peso maior quando se lhes partem os entes queridos, pois eles nada tem para lhes dar gosto na vida a não ser os próprios filhos. Esta linha de raciocínio aparece no Talmud (veja Moêd Catan 24b, com respeito aos discursos fúnebres). Tenho notado que isto se deve ao fato da pessoa carente não ter muitos amigos ou meios neste mundo. as Escrituras afirmam (Provérbios 19:4): “A riqueza traz muitos amigos, mas um homem pobre é separado de seu amigo”. Seu amigo pode ter se separado dele, mas, de Deus, ele está mais próximo que os demais. Assim dizem as Escrituras (Salmos 34:19): “O Eterno apoia os alquebrados de coração e salva os de espírito contrito”. Como é grande a recompensa dos que os confortam e que os encorajam neste momento. A intenção básica de Nichúm Avelím é confortar e consolar os enlutados. É possível cumprir esta Mitsvá tão somente recitando o trecho “Que o Onipresente vos conforte junto aos enlutados de Tsión e Jerusalém”. 44 Não obstante, é preferível conversar com os enlutados de modo a encorajar-lhes o espírito com comentários apropriados, pois é esta a essência do Nichúm (ato de consolar). Veja o que escrevemos, adicionalmente, no capítulo 7 com respeito a um tópico similar.
Capítulo 6
Alegrando os noivos
DIA 27
Alegrar um noivo e sua noiva é também um importante dever, como indicam nossos Sábios em muitas ocasiões. É igualmente uma das formas de Guemilút Chéssed , como registra Pirkê de Rabi Eliezer (capítulo 16). Aprendemos isso também do episódio que envolve a perversa Jezebel Izével, esposa de Achav. Foi ela que o incitou ao culto idólatra e mandou matar Navot. De acordo com as Escrituras (2 Reis 9:35), sua punição foi ter a própria carne devorada por cães. Quando seus restos foram recolhidos para serem sepultados, somente seu crânio, pés e palmas das mãos foram encontrados. Nossos Sábios ( Pirkê de Rabi Eliezer 17) explicam que estes membros permaneceram intactos porque seus pés dançavam e sua cabeça meneava enquanto ela honrava noivos e noivas. Por isto, estes membros foram poupados pelos cães. Fatos como este demonstram a grandeza desta Mitsvá. Contudo, é imperativo não causar mais dano que bem ao cumprir esta Mitsvá. Em alguns lugares, por exemplo, rapazes sem moral e boas maneiras saem a dançar com as moças, uma ofensa à moral judaica. Muitas proibições são transgredidas com estes atos. Ou então, por causa dos nossos inúmeros pecados, outras variedades de falta de decoro ocorrem por causa deste tipo de comportamento, nos casamentos que não são conduzidos segundo o espírito da Torá. Devemos fugir de lugares como estes, onde reina a tentação. Não há Mitsvá em alegrar pessoas que flagrantemente desrespeitam a palavra de Deus. Se o noivo e a noiva se opuserem a este comportamento, ele certamente não terá lugar em sua boda. Quem permanece nestes lugares está causando um mal a si mesmo. Por outro lado, se a pessoa acredita que, estando presente, os convidados ouvirão sua admoestação e deixarão de conduzir-se de modo indecente, certamente é uma grande Mitsvá atender a este evento de modo a tentar prevenir estas transgressões. O mérito de fazer as pessoas atuarem com justeza lhe será atribuído.
A Mitsvá de alegrar os noivos atinge o pico quando não há muitos convidados, quando o casal é pobre ou seus pais perderam tudo o que tinham. Poucas pessoas preocupam-se em alegrar estes casamentos. Durante estes casamentos não há meio da palavra de Deus ser transgredida. Se alguém se portar de modo indevido e precisar ser admoestado, todos ouvirão. É uma grande Mitsvá participar destes casamentos e causar alegria aos noivos. Nossos Sábios disseram (Berachót 6b): “Quem alegra os noivos tem o privilégio de adquirir Torá; considera-se como se ele tivesse oferecido um sacrifício no Templo Sagrado ou reconstruído uma das ruínas de Jerusalém”. O Talmud descreve muitos exemplos acerca de como nossos Sábios se comportam nestas ocasiões (veja Ketubót 17a). Tudo isto com relação a esta Mitsvá, quando cumprida por apenas um indivíduo – causando alegria aos noivos. Dissertaremos agora sobre os aspectos caritativos desta Mitsvá, que dizem respeito às contribuições em dinheiro para este evento. Isto se aplica, por exemplo, quando a família dos noivos ou os próprios não podem arcar com as despesas do casamento ou de outras necessidades afins. Se contribui com o próprio dinheiro ou faz um empréstimo para este intento – ou, se não pode contribuir diretamente, pede a outros que contribuam – como é grande sua recompensa! Veja o que rege o Shulchán Aruch a respeito (Iorê Deá, capítulo 356, parágrafo 15): “Os tesoureiros de fundos de caridade devem propiciar o que tiverem em caixa para dar de dote às noivas, pois não há gesto de caridade maior que este”. O Chochmat Adam escreve, também, (capítulo 145) que prover fundos para que moças pobres possam casar-se, especialmente as órfãs, é melhor que doar para fundos de caridade ordinários. (Primeiramente, a Mitsvá da caridade já é cumprida deste modo; em segundo lugar, elimina-se a vergonha da mulher, pois a vergonha delas é maior Ketubót 67b. Ora, o mundo não foi criado para permanecer no caos, mas para ser habitado. Além disso, a mulher pode ser magoada, Deus o livre). Muitas comunidades adotaram o costume de organizar uma Sociedade para Hachnassát Calá, com o intuito de ajudar os órfãos, ou mesmo aqueles cujos pais são pobres, a contraírem matrimônio. Além desta atividade proporcionar um bem enorme a estas moças, possibilitando que se casem e livrem-se do pecado, grande Chéssed é feito a seus pais, que lamentam-se dia e noite ao ver suas filhas atingirem a idade de contrair núpcias, sem ter a possibilidade de ajudá-las. Deus, a Quem pertencem todas as recompensas,
certamente recompensará todo o bem que emana destes atos, como explicamos anteriormente, (no capítulo 6).
Capítulo 7
“Bem-aventurado o que atenta para o debilitado...”
Esta obra tem como objetivo especificar os modos como a bondade pode ser praticada. Este tópico é lembrado nas Escrituras (Salmos 41:2): “Bem-aventurado o que atenta para o debilitado (Dal )...” Consequentemente, decidi explicar esta passagem da melhor maneira e como Deus me agraciar. O Salmo nos ensina: “Bem aventurado aquele que atenta para o debilitado; O Eterno o livrará no dia do infortúnio”. O termo “atentar” traz consigo muitas possibilidades, assim como o termo “debilitado”, com suas muitas ramificações: uma delas é a pessoa a quem lhe faltam meios, recursos, dinheiro. Quem não tem dinheiro algum carece do mais básico para sua subsistência: alimento, vestuário e habitação. É preciso considerar estes três aspectos quando nos referimos a uma pessoa pobre – que não lhe falte alimento, como disse o profeta (Isaías 58:10): “Se abrires tua mão ao aflito”; para dar-lhe roupas, como está escrito: “E cobrires aquele que está despido quando o vires” (ibid. 7) para lhe alugar uma casa (Shulchán Aruch, Iorê Deá, Leis sobre Caridade). Em se tratando de um viajante, de arranjar-lhe pousada, como as Escrituras ordenam (Jó 31:32): “O estrangeiro não deve habitar nas ruas”. O Talmud acrescenta (Shabat 118a): “Se ele ficar para dormir, deve receber abrigo... uma cama e um travesseiro”. Estas são as três necessidades básicas que devem ser providenciadas aos necessitados É preciso um sentido aguçado para estender auxílio a uma pessoa pobre de modo a proporcionar-lhe o maior benefício possível com um mínimo de esforço. Suponhamos por exemplo que alguém doou uma soma em dinheiro a um pobre. A doação deve ser feita de preferência quando os preços dos produtos estão em baixa, de modo a oferecer maior vantagem a quem precisa do dinheiro. Um presente deve ser dado a um pobre de modo a permitir que o receptor o usufrua sem qualquer demora (evitando que o pobre tenha ainda
que sair para comprar suas necessidades). Por exemplo: roupas doadas devem estar prontas para serem usadas. Quem doa uma refeição deve prepará-la e levá-la à casa do necessitado. Nossas conclusões derivam do dito talmúdico (Sucót 49b): “A recompensa da caridade é comensurável ao Chéssed despendido, como está escrito (Oseias 10:12): ‘Plante de acordo com a caridade, mas colha de acordo com o Chéssed’ .” Rashi elucida: “Caridade é presente, mas o esforço despendido para fazê-la é Chéssed . O doador esforça-se em praticar caridade de modo tal a proporcionar o maior benefício possível ao receptor e para que a soma doada não seja posta a perder. Ele dá quando os grãos são abundantes; e dá-se ao trabalho der ir até a residência do pobre para dar-lhe alimento pronto para ser consumido e roupas prontas para serem vestidas”. Se o doador for sagaz o suficiente para encobrir sua identidade do receptor, como no caso de Mar Ukva (citado no capítulo 20), feliz o seu destino. No mínimo, devemos nos esforçar para que não saibam que fizemos esta doação, assim o pobre não se sentirá envergonhado. Doar com inteligência envolve, acima de tudo, observar a melhor maneira de beneficiar o receptor, ajudando-lhe de modo a extraí-lo da pobreza, oferecendo-lhe um presente ou empréstimo, ajudando-o a achar emprego e proporcionando-lhe meios ou recursos que o tornem financeiramente independente. O doador cumpre então a Mitsvá (Levítico 25:35): “E quando empobrecer teu irmão e encostar sua mão sobre ti, deterás sua caída”. O Sêfer Chassidim expressa a mesma ideia: “Há uma forma de doar que não aparenta caridade. Contudo, ela sempre aparentou ser exaltada aos olhos de Deus. Suponhamos que um pobre esteja vendendo algum produto ou um livro que ninguém queira comprar, e esta pessoa comprou-lhe do artigo que está vendendo. Ou que o pobre esteja procurando emprego e ninguém o quisesse empregar – mas o doador deu-lhe um emprego. Não há melhor forma de Tsedacá como essa”. Conheço pessoas ricas e respeitadas deste tipo, que se engajaram em algumas atividades financeiras com o propósito específico de prover emprego aos judeus pobres em busca de sustento. Tudo isto e o que se assemelha a isto é Tsedacá, se não algo maior. Bem aventuradas as pessoas que agem deste modo. Dissertamos sobre a Mitsvá “deterás sua caída” mais demoradamente no capítulo 21 acima.
Encontramos que o termo Dal (pobre), refere-se também ao debilitado fisicamente – o enfermo. Assim ele é descrito nas Escrituras (2 Samuel 13:4): “Por quê, ó filho do rei, estás mais enfermo (Dal ) a cada dia?” Tratar inteligentemente os doentes requer, como nossos Sábios ensinam, visitá-lo e procurar meios de apressar seu restabelecimento. Isto á foi explicado nos capítulos 3 e 4. Isto também deve ser levado em consideração com relação à pessoa que sofre algum tipo de aflição. É preciso tramar algum tipo de plano para livrá-lo de sua angústia. Existe outro tipo de Dal – o pobre em inteligência – e sua sorte é a pior de todas. Nossos Sábios declararam (Nedarim 41a): “Não há maior pobreza que a pobreza em sabedoria”. Aqui existem várias classificações. Certa pessoa tem ideias tolas, desviou-se do caminho da verdade e tornou-se má. Neste caso, é preciso pensar em expedientes que o façam arrepender-se e o reconduzam ao caminho correto. O mérito por agir assim é enorme. O Zôhar Chadash o expressa nestas palavras (Lech Lechá): ‘Rabi Eleazar disse: Como é grande a recompensa de quem faz os outros se arrependerem”. Outras pessoas carecem de senso prático. Isto arruína seus negócios. Não raro uma pessoa como estas é exposta ao ridículo por sua insensatez. Também aqui, é uma Mitsvá abrir-lhe os olhos – ensinando-a de modo a evitar que se arruíne ou sofra humilhações no futuro. Suponha que seu filho foi para outra cidade. Como você gostaria que indivíduos íntegros ensinassem o seu filho a ter sucesso em tudo o que fizesse! Pois é assim que você deve agir com teu próximo. Tudo o que se relaciona com este comportamento pertence à Mitsvá “Amarás ao próximo como a ti mesmo”. Assim rege Maimônides em seu Código (Leis sobre disposições Morais, capítulo 10, par. 3), onde elucida esta Mitsvá. É preciso cuidar do dinheiro alheio como se fosse o nosso. Assim como desejar que um colega seja respeitado, como desejamos que os outros nos respeitem. Temos também o pobre em inteligência no sentido mais simples – a pessoa que não teve educação em Torá. Os mais afortunados devem pensar em como atrair esta pessoa para o estudo da Torá. Isto é certamente de extrema importância. Como diz o Talmud ( Baba Metsia 85a): “Rabi Shmuel bar Nachmani disse em nome de Rabi Ionatan: quem ensina Torá ao filho de um amigo tem o mérito de sentar-se à Academia Celestial”. Nossos Sábios disseram também (San’hedrin 99b): “Resh Lakish disse: quem ensina Torá ao filho de um
amigo é considerado como se o tivesse criado...” Sobre o dito da Mishná (Pirkê Avot 1:12): “Ama as criaturas e aproxima-as da Torá”, Avót de Rabi Natan diz o seguinte (capítulo 12): “É preciso tratar e cuidar das criaturas para poder trazê-las sob as asas da Shechiná, assim como fez Abrahão, nosso patriarca, que submetia as criaturas a um cuidado especial para depois aproximá-las à Shechiná... como está escrito (Gênesis 12:5): ‘E as almas que ele fez em Haran’.” É preciso despertar o mesmo grau de compaixão por estas pessoas, que temos quando vemos alguém sem nada para vestir. De fato, como esta pessoa vestirá sua alma nos mundos superiores, se estiver tão despido de Torá e Mitsvót ? Como sabemos, a Torá que estudamos cria ornamentos para seu espírito e a faz merecer sentar-se à presença de Deus em Sua habitação sagrada. Assim está escrito sobre Iehoshúa, filho de Iehotsadac, o Sumo-sacerdote (Zacarias 3:4): “Tire dele as roupas fétidas... e eu o vestirei... e eles o vestiram com peças de roupa”. Tana Devei Eliahu Rabá também o registra (capítulo 27): “Quando vires o despido e o cobrires (Isaías 58:7) – Como isto se dará? Se vires uma pessoa despida de Torá e ensiná-la um versículo das Escrituras ou uma simples Halachá a cada dia. Estimule-a a cumprir Mitsvót . Não há ninguém mais despido em Israel do que uma pessoa sem Torá ou Mitsvót . É como se estivesse nua”. O mandamento “Amarás ao Eterno, teu Deus” (Deuteronômio 6:5) também implica em fazer o Altíssimo ser amado pelas criaturas, como ensinam nossos Sábios. Existe mais um caso, extremamente importante, onde devemos mostrar nossa consideração com os pobres. Isto ocorre quando uma pessoa não tem meios para prover seus filhos com uma educação de Torá e não tem como ensiná-las pessoalmente. Seus filhos degenerar-se-ão. Permanecerão totalmente ignorantes. Alguns poderão enveredar por caminhos tortuosos. Por conseguinte, é uma grande Mitsvá agir sabiamente com relação a estas pessoas e prover-lhes educação religiosa. Às vezes estas mesmas crianças obtém grande sucesso no estudo da Torá, em honra de seus oprimidos pais, como alertaram nossos Sábios (Nedarim 81a): “Prestem atenção aos filhos dos pobres, pois deles emanará a Torá”. O mérito da pessoa que se ocupa com isto é imenso, como aponta o Talmud (Baba Metsia 85a): “Se uma pessoa ensina Torá ao filho de um iletrado, mesmo que tenha emitido um decreto negativo, o Altíssimo, bendito seja, o rescinde pelo mérito desta pessoa”.
Existem muitas situações similares, onde devemos ter consciência da situação de um pobre. Decidi, no entanto, ser breve, pois a pessoa inteligente será capaz de aplicar o que ensinamos aqui em outras circunstâncias. Pelo mérito de atos como estes, Deus, bendito seja, redimirá esta pessoa no dia de seu infortúnio, como prometeram as Escrituras.
Capítulo 8
Fazendo chéssed com palavras
DIA 28
Nossos Sábios destacam (Sucá 49b) que podemos praticar atos de bondade tanto com nosso corpo quanto com nosso dinheiro. A bondade feita por uma pessoa com seu próprio corpo divide-se em três tipos: feitos, palavras e pensamentos. Até aqui temos tratado dos aspectos de Chéssed ligados a atos e pensamentos – ou seja, ajudar o próximo por meio de algum esforço pessoal ou mostra de consideração, à procura de modos que possibilitem melhorar a condição alheia, para que nosso colega não venha, Deus o livre, cair em ruína. Tudo isto está contido na admoestação do salmista: “Bem-aventurado aquele que atenta para o debilitado” (Salmos 41:2). Vejamos agora como um homem pode praticar bondade por meio da fala. As pessoas devem esforçar-se para incorporar a virtude da bondade a tudo o que falam. Primeiramente, com respeito à Torá, ensinar os demais é também um ato de Chéssed , enquanto que estudar sozinho não se enquadra nesta categoria. Como declara o Talmud (Sucá 49b): “O que significa a expressão (Provérbios 31:26): ‘Ela abre sua boca com sabedoria; e a instrução (Torá) de benevolência ( Chéssed ) está em sua língua’ – existe uma Torá de benevolência e outra que não seja? A Torá estudada para fins educacionais (para ser ensinada) é Chéssed ; a Torá que não é estudada com fins educacionais (só para si) não é Chéssed ”. Suponha que uma pessoa esteja visitando outra e que esteja com fome. Se alguém o disser ao anfitrião e como consequência o visitante receber um prato de comida, estará fazendo um ato de bondade com o simples interceder em prol da pessoa faminta. A Torá conta sobre José (Gênesis 40:14): “Se me recordares quando estiveres bem, usa, rogo, de bondade comigo, e faze-me lembrado ao Faraó, e tira-me desta casa”. Além disso, se alguém pode, usando de sua fala, impedir que outra pessoa seja lesada, também estará praticando um ato de Chéssed . Se alguém passou por um grupo de ladrões e os ouviu
discutindo a respeito da fortuna de Fulano. É sua obrigação fingir que ficou sabendo que a futura vítima empobreceu e contar isto aos ladrões, desencorajando-os, para que não a roubem. Mesmo sabendo que isto não é verdade, praticou um ato de bondade. Assim disse Abrahão a Sara (Gênesis 20:13): “Esta será a tua bondade que fará comigo; a todo lugar onde chegarmos, diz por mim: ‘Meu irmão é ele’.” Melhor seria se aquela pessoa pudesse avisar a vítima do mal que lhe estão por fazer, para que possa defender-se de seus desígnios nefastos. É um dever fazê-lo de acordo à Lei da Torá (final de Choshen Hamishpat ). Se alguém pode interceder em favor de um colega contando sobre suas necessidades a outra pessoa, também está praticando um ato de Chéssed e receberá bênçãos de Deus, como diz a Tosseftá (Peá, capítulo 3) – a simples menção de que determinada pessoa ou causa precisa de ajuda, pertence à categoria de Chéssed , como dizem as Escrituras (Deuteronômio 15:10): “Pois por isto ( Davar – objeto, do mesmo radical que Dibur , fala), te abençoará o Eterno, teu Deus...”. A recompensa por fazer os outros praticarem atos de bondade por meio da fala é enorme. Em terceiro lugar, nossa fala permite dar bons conselhos aos outros com relação a conduzirem seus negócios, como registra o Choshen Mishpat (capítulo 97) e isto se aplica tanto aos ricos quanto aos pobres. Em quarto lugar, quem vê um amigo em estado de depressão causado por sua condição financeira ou qualquer outro problema e naquele momento, Deus não o permita, não se encontra em condições de ajudá-lo, ainda assim, é uma Mitsvá falar-lhe de modo compreensivo, a fim de diminuir sua angústia. Todos estes atos se incluem na categoria de Chéssed . O rabino Ioná Gerundi registra em sua obra Iguéret Hateshuvá, que mesmo um pobre, que não se encontre em condições de empenhar-se em atos concretos de Guemilút Chéssed , pode exercer esta prática sem custo algum. Eis como este tipo de Chéssed deve ser feito: é preciso conversar de modo complacente com a pessoa pobre, de modo a proporcionarlhe um sentimento de satisfação com nossas palavras, confortando-o pelas vicissitudes que passa no trabalho e mostrando respeito pelos seus esforços. Nossos Sábios ( Baba Batra 9b) disseram que se alguém dá uma moeda a um pobre, ganha seis bênçãos, mas quem lhe restabelece a confiança com palavras ganha onze, como está escrito (Isaías 58:10):
“Se abrires tua alma ao faminto e fartares a alma aflita; então nascerá a tua luz nas trevas, e tua escuridão tornar-se-á como o meio dia. O Eterno te guiará continuamente, fartará tua alma, mesmo em lugares áridos”. Aqui, esta virtude é praticada de modo a aliviar o sofrimento alheio por meio de palavras sinceras e suaves. Examine as Escrituras e constate você mesmo como está explícita esta Mitsvá e que a recompensa por este ato é bem maior que a concedida pela prática da caridade. Como é grande esta Mitsvá! Por conta dela, ganha-se a vida no Mundo Vindouro, como vemos (Taanit 3) no incidente envolvendo Rabi Beroca. Rabenu Ioná acrescenta que as pessoas devem fazer sugestões às suas comunidades no intuito de incrementar as ações de Tsedacá e Chéssed . Quem incentiva práticas comunitárias de Chéssed recebe uma recompensa especial, como recompensa pelas almas que ajudou a preservar. Ele próprio constatará a recompensa pela caridade que prestou, como dizem as Escrituras (Isaías 32:8): “O generoso cria novas maneiras de praticar a generosidade”. Nossos Sábios disseram também (Baba Batra 10a): “Grande é a pessoa que faz agirem as demais, do que aquela que age sozinha”. Esta é a verdadeira Ahavát Chéssed . Existem muitos outros tipos de Chéssed praticados com a fala, como, por exemplo, rogar a Deus que cure determinada pessoa. Isto está incluso na Mitsvá de visitar o doente (Bikur Cholim), que também é uma forma de Chéssed , como encontramos no Talmud e no Shulchán Aruch (Iorê Deá, capítulo 335). Já o havíamos citado no capítulo 3. O mesmo se aplica a qualquer tipo de dano que ameace a integridade do próximo, mesmo que ele não o saiba. Sabemos que Abrahão intercedeu em prol da população de Sodoma, embora eles não tivessem conhecimento disto. Abrahão rezou para que fossem poupados. Tanto mais quando se trata de um colega judeu! Quem estudar estes capítulos, constatará que a Mitsvá de Chéssed envolve todo o bem que existe neste mundo. Toda e qualquer pessoa pode praticá-la e em todos os seus afazeres, não raro com ações meramente simples, beneficiando o recipiente ao mesmo tempo em que o doador nada perde. Não obstante, há pessoas que deixam oportunidades de Chéssed passar batido, por causa dos nossos inúmeros pecados. Acredito, portanto, que o Midrash citado pelo livro Lev David , seja bastante apropriado para nossa dissertação: “O profeta Elias Eliáhu Hanavi, de abençoada memória, caminhava com Rabi
Iehoshúa ben Levi. Enquanto caminhavam, Elias apontou para uma larga praça, onde uma multidão de pessoas agrupava-se num dos estabelecimentos onde barganhavam, acotovelando-se e empurrando umas as outras. Eliáhu Hanavi e Rabi Iehoshúa aproximaram-se do estabelecimento e descobriram, em meio aos empurrões, que ali vendiam carne pútrida de cachorro a um Dinar por Litra.45 Não obstante, os compradores continuavam se empurrando, cada um tentando ser atendido antes dos outros. Os dois prosseguiram em seu caminho e chegaram a outra praça. Ela estava vazia. Havia apenas um estabelecimento, vendendo vitela de primeira por uma Perutá por Litra. Contudo, não haviam consumidores. Rabi Iehoshúa ficou aturdido. ‘Não se deixe surpreender por estas preferências’, disse-lhe Elias. ‘O estabelecimento que vende carne pútrida ilustra as massas que gastam tudo o que tem e esbanjam todo seu dinheiro para comprar pecados, que se equiparam à carne de cachorro em estado de deterioração. Por outro lado, Torá e Mitsvót , que são comparadas à vitela de primeira, são de fácil acesso e aquisição. Mas não há compradores’”. É o que vimos dizendo até aqui. Às vezes é fácil gastar milhares de dólares com futilidades que a má inclinação nos convence a perseguir, com vistas a adquirir glórias e cantar vitória sobre os demais. Há pessoas que chegam a gastar fortunas com artigos que não lhes trazem benefício algum, nem neste mundo nem no Mundo Vindouro. Atividades que não são melhores do que carcaça de cachorro. Quanto ao Chéssed , a boa inclinação nos aborda como agentes, anunciando serem mercadoria legítima e que o próprio Deus a comercia (como está escrito Miqueias 7:18: “Ele... tem prazer na misericórdia”). E a bondade traz alegria ao homem neste mundo e no Mundo Vindouro, e é adquirida com custo baixo e pouco esforço. Contudo, devido à nossa lastimável condição espiritual, ninguém dá a atenção merecida a este lucrativo negócio. A razão para esta negligência é o Iétser Hará, que não dá descanso ao homem e que não o permite enxergar a grandeza e benefícios da Mitsvá de Chéssed . O melhor conselho a seguir é ponderar constantemente sobre os versículos das Escrituras e da literatura rabínica, que acumulam louvores sobre esta sagrada virtude. Então, ganharemos a convicção clara de que esta é a verdadeira vontade de Deus: que devemos nos educar para comportar-nos com bondade e misericórdia com relação aos outros, ou nas palavras das Escrituras: “Andar nos Seus caminhos”. O Sifri declara (Deuteronômio
10:12): “Estes são os caminhos de Deus: ‘Eterno, Eterno, Deus misericordioso e piedoso, tardio em irar-se, abundante em bondade...’ (Êxodo 34:6)” Seguindo esta linha de conduta, adquirimos amor pela virtude da generosidade, como está escrito (Miqueias 6:8): Ahavát Chéssed (amar a bondade). Pelo mérito deste tipo de comportamento, Deus estenderá Sua bondade a esta pessoa em tudo o que ela fizer, tanto neste mundo quanto no Mundo Vindouro. Apesar disto, ninguém deve se iludir, acreditando ser suficiente incorporar esta virtude, ao mesmo tempo em que negligencia o temor aos Céus, Deus o livre. Isto é falso. É preciso seguir e obedecer a Torá, aceitar o jugo dos Céus e também perseguir todas as formas de Chéssed incansavelmente. O Sifrê explica o versículo (Deuteronômio 32:29): “Se... tivessem sido sábios... as entenderiam”: Se Israel estudasse as palavras da Torá, mal algum teria poder sobre eles. O que eu disse a eles? – Aceitem o jugo do Rei dos Céus, persuadam uns aos outros a temerem os Céus e a portar-se uns com os outros com Chéssed” . Então alcançarão a paz e a felicidade.
Capítulo 9
DIA 29 excerto da parte 1
Leis referentes ao pagamento de salários
1 Está escrito na Torá (Levítico 19:13): “Não pernoitará a paga de um diarista contigo até pela manhã”, e mais adiante (Deuteronômio 24:15): “No seu dia lhe pagarás a sua diária, e isto o fará antes do pôr do sol”. Nossos sábios interpretaram (Baba Metsiá 110b) as palavras “não pernoitará” como implicando que o diarista trabalhou durante o dia e que o prazo fixado para seu pagamento é toda a noite subsequente. Se não for pago durante este período, o empregador está transgredindo este mandamento “não pernoitará a paga”. No caso de jornada noturna, o período para o pagamento é todo o dia subsequente, no máximo até o pôr do sol. Se o pagamento for feito após o pôr do sol, o empregador está transgredindo tanto o mandamento passivo de não deixar o sol passar pelo pagamento, quanto o mandamento ativo de pagar o empregado logo após sua jornada de trabalho. É importante cuidar de fazer o pagamento antes do pôr do sol, pois neste caso ele seguramente não está transgredindo qualquer um dos mandamentos acima. Após o pôr do sol, enquanto não houver anoitecido e se o pagamento ainda não foi realizado, o empregador deve cuidar fazê-lo antes de aparecerem as estrelas, do contrário, está transgredindo abertamente estes dois mandamentos.
2 A que nos referimos aqui? A alguém que trabalhou a noite toda, ou seja, até a aurora. Mas se trabalhou apenas algumas horas durante a noite e terminou a tarefa antes da aurora, o prazo de pagamento dura apenas até o amanhecer. O mesmo com relação a quem trabalhou durante o dia; se não trabalhou todas as horas do dia, mas apenas algumas delas, concluindo a tarefa antes do pôr do sol, o prazo para pagar seu soldo termina com o próprio pôr do sol, como indica o parágrafo 1. Em vista disso, em nossos
dias, quando os operários costumam concluir a jornada de trabalho com o pôr do sol, é preciso cuidar de pagá-los antes de aparecerem as estrelas, pois eles também são considerados diaristas (veja mais em Netiv Hachéssed ). Se um operário trabalhar até saírem as estrelas, mesmo que não esteja obrigado a isto, seu patrão deve pagá-lo até o raiar do dia. Na véspera do Shabat, quando é costume parar de trabalhar alguns momentos antes de anoitecer, é preciso apressar-se para pagar os empregados antes do pôr do sol se o empregado vier solicitar seu soldo e o patrão dispuser da soma para pagálo, cumprindo assim o mandamento “No mesmo dia pagará seu salário”.
3 Saiba que isto não diz respeito somente a quem trabalha horas inteiras, pois mesmo quem faz um trabalho leve, que vale apenas centavos, também é considerado diarista e sobre ele incorrem todas as leis descritas acima. Há quem diga que mesmo se for realizado um trabalho que vale menos que um centavo, o patrão não pode deixar de pagar no prazo certo. Infelizmente, muita gente falha neste mandamento.
4 A lei é a mesma para quem trabalha por semana, por mês, por ano ou por sete anos. Se concluir o trabalho durante o dia – o patrão deve pagá-lo até o pôr do sol; se concluir o trabalho durante a noite – seu pagamento deve ser-lhe entregue antes do amanhecer.
5 Estas leis dizem respeito tanto a seres humanos quanto ao aluguel de animais e utensílios, como está escrito: “Não pernoitará a paga contigo” – de tudo aquilo que estiver te servindo. Quanto ao arrendamento de terrenos, as opiniões variam: veja a explicação do Gaon de Vilna (Choshen Mishpat, 339:1), que defende a necessidade de agir com rigor neste caso. De fato, está escrito (Torat Cohanim, Sifra, porção Kedoshim 2:9), que todas estas leis dizem igual respeito ao arrendamento de terras. Encontrei este assunto especificado também no livro Shaar Hamishpat (339:1). Por conseguinte, é preciso ser igualmente meticuloso com relação a aluguéis de casas (veja em Netiv Hachéssed ). Estas leis também valem quando se emprega um menor de idade.
6 Se um empregado morre, seu filho não herda o direito de receber o pagamento de imediato, em relação à proibição de “não pernoitará”.
7 O patrão não transgride a lei de “não pernoitará” a menos que disponha da quantia para pagar o salário, como está escrito: “não pernoitará a paga do empregado contigo” – ou
seja, que o dinheiro do pagamento esteja com você. O mesmo se aplica se o dinheiro estiver penhorado ou emprestado a outro na hora de pagar o salário, pois ele pode ser resgatado. O Shitá Mecubétsét afirma em nome do Ritva, que se o patrão tiver alimentos que podem ser vendidos, eles também estarão incluídos nesta categoria, pois o patrão pode vendê-los para pagar o salário do empregado. Esta lei também se encontra no Sêfer Hachinuch, Mitsvá 588. Aparentemente, se o patrão puder tomar dinheiro emprestado para pagar um salário, é indicado fazê-lo, para deste modo cumprir a Mitsvá “no mesmo dia pagarás o seu salário”. Principalmente se o empregado for uma pessoa pobre. Se lhe pagar em dia impedirá que ele se torne dependente do auxílio alheio, obviamente isto deve ser feito. Veja o primeiro capítulo de Netiv Hachéssed, parágrafo 20.
8 Se alguém empregou dois servidores, mas dispõe de dinheiro para pagar apenas um deles, me parece correto dividir a soma entre os dois, para não transgredir o mandamento que proíbe reter o dinheiro dos salários, pois deste modo não o terá mais. Mesmo se um deles exige o pagamento antes do segundo, o patrão deve deixar metade da soma para pagar o outro, que logo virá pedir o seu soldo, como está escrito (Shevuot 45b): “É sabido que um empregado não deixa de cobrar o seu salário”. Se o patrão tem conhecimento que o segundo empregado não se incomoda com o pagamento do primeiro, neste caso poderá pagar apenas o primeiro, somente se os dois diaristas forem pobres ou ricos; mas se um deles for pobre e o outro rico, veja o que se deve fazer, no capítulo 10 (oitavo item).
9 Ao término do serviço, o patrão deve cuidar não gastar seu dinheiro com mercadorias se souber que não disporá do suficiente para pagar seu empregado, mesmo que ele ainda não lhe tenha exigido o salário. Mais ainda se planeja adquirir mercadorias após o empregado lhe pedir que o pague. Se o fizer, está infringindo a lei “no mesmo dia lhe pagarás a sua diária”. A pessoa consciente deve cuidar deste assunto, mesmo antes do fim da jornada de trabalho.
10 É preciso pagar ao empregado tudo o que lhe é de direito, se dispuser do dinheiro. Se não pagar ao diarista todo o seu salário está transgredindo a lei de não deixar o pagamento pernoitar, mesmo se faltar uma pequena parcela para completar-lhe o salário.
No caso do patrão não dispor de toda a soma para pagar empregado deve dar-lhe o que tiver em mãos, para não transgredir a lei “não pernoitará”.
11 Saiba que tudo o que escrevemos neste capítulo com relação ao patrão transgredir a lei “não pernoitará a paga do teu empregado contigo”, diz respeito somente ao caso do diarista que cobrou seu ordenado e o patrão se recusa a pagá-lo. Contudo, se o diarista não exige o salário, o patrão não está transgredindo a lei mesmo que tenha dinheiro, pois há um consentimento calado do empregado. Há quem diga que mesmo se o empregado ainda não cobrou pelo serviço, o patrão deve procurar pagá-lo em dia, embora se não o fizer não transgride a lei (Shaar Hamishpat 339:2. Veja também em Chevel Iossef Ulam Hamishpat ). Se um empregado cobra o salário e o patrão não dispõe da soma naquele memo momento, mas a obteve antes de findo o prazo para o pagamento, ele deve encaminhar o dinheiro ao empregado ou informá-lo que a soma estará à sua disposição, assim não transgride o mandamento “não pernoitará”. Similarmente, quem aluga animais ou utensílios, findo o seu uso deve procurar pagar a tempo a quem os alugou, mesmo que o dono ainda não tenha requisitado a devolução do animal ou de seus utensílios, pois não se pode dizer que o fato dele não pedir os utensílios de volta implica no consentimento da continuação do uso após o prazo estipulado, pois ele não tem como saber quando seu animal ou utensílio terminou de ser utilizado para poder cobrar pelo aluguel.
12 Após o prazo de pagamento do diarista, o patrão não incorre na violação de “não pernoitará”. Mesmo assim, deve pagar o empregado de imediato e cada momento que demorar em pagá-lo estará transgredindo uma proibição dos nossos sábios, como está escrito (Provérbios 3:28): “Não diga ao seu próximo: ‘Vá embora e volte, e amanhã te darei’, quando você o tem”.
13 Um empregado conhece seu patrão e sabe que ele não costuma dispor de dinheiro antes de um dia de feira. Neste caso o empregador não transgride a lei “não pernoitará” mesmo que tenha fundos e mesmo que o empregado o cobre logo no início da jornada, pois ao ser admitido para o trabalho sabe que seu patrão não o pagará até o dia da feira. A partir do dia da feira, se o patrão não o pagar está transgredindo o dito “não diga ao seu próximo etc.”.
O mesmo se aplica àqueles que não pagam seus empregados até sentarem com eles para calcular seu soldo; neste caso, eles não estão transgredindo a lei até calcularem o salário junto aos empregados, posto que eles concordaram em trabalhar nestas condições.
Capítulo 10
Leis referentes ao pagamento de empréstimos
1 Se uma pessoa deu uma peça de roupa para consertar e o pagamento será feito somente após a conclusão do trabalho, enquanto a peça estiver em poder do artesão – ele não está violando proibição alguma. Se o artesão devolve a peça consertada antes do pôr do sol, em pleno dia, se anoitecer sem que o artesão tenha recebido pelo serviço, o cliente está transgredindo o preceito “no seu dia lhe pagarás a sua diária, e isto o fará antes do pôr do sol” (Deuteronômio 24:15). Similarmente, se o artesão devolveu a peça consertada à noite, ele deve receber seu pagamento antes do amanhecer, do contrário o cliente estará transgredindo o preceito “não pernoitará” (Levítico 19:13) logo que amanhecer, pois a contratação de um serviço implica em pagamento após o seu término, no mesmo período.
2 Quem instrui um agente para que saia e contrate diaristas e ele os contrata, dizendo: o patrão lhes pagará pela jornada – nenhum dos dois estará transgredindo a lei “não pernoitará”, pois não foi o patrão quem os contratou e o agente não é responsável pelo seu trabalho por haver-lhes dito que o patrão os pagará. Isto, mesmo que não o tenha dito explicitamente, pois os diaristas sabem que o agente não é responsável pela jornada de trabalho. No entanto, o patrão estará violando o preceito (Provérbios 3:28) “não diga ao seu próximo, vá embora e volte etc.”, tentando evitá-los. Mas se estiver ocupado e não puder atender os empregados para pagá-los, ele não está violando a lei.
3 Se disser aos diaristas: “eu sou responsável pelo vosso salário”, mesmo que os avise ser um agente e que o trabalho não é responsabilidade sua, será seu dever pagar seu salário e ele violará a proibição de “não pernoitará”, se não os pagar no prazo apropriado. Mas se ele não disser que o salário é sua responsabilidade nem disser que é responsabilidade do patrão, neste caso: se os diaristas sabem que o trabalho não é
responsabilidade sua, o agente não está violando a lei; contudo, se os diaristas não o souberem, ele tem o dever de pagá-los para não transgredir a lei “não pernoitará”.
4 De que estamos falando? De um agente qualquer. Mas em se tratando de um tutor dos negócios e da propriedade alheia, mesmo que os diaristas saibam que ele não é o responsável pela tarefa e que fez somente contratá-los, será considerado como se o agente tivesse dito que é responsável pelo seu pagamento. Neste caso, ele estará incluso na lei “não pernoitará”. Uma mulher tem um esposo, mas gere seu próprio negócio em casa: se contratar diaristas, mesmo sem assumir compromisso explícito de pagamento, ela deve pagar-lhes para não infringir o preceito “não pernoitará”.
5 Se o patrão deu a um banco uma ordem para pagar seus empregados dizendo, por exemplo: pague ao meu diarista um dinar em espécie que eu lhes restituirei e o banco se comprometeu a realizar o pagamento, estando os diaristas de acordo – o empregador não estará transgredindo a proibição de “não pernoitará”, mesmo se não houver feito o depósito no banco e por este motivo o banco não honrar os pagamentos dos operários, pois está escrito: “não pernoitará... contigo” (Levítico 19:13), e neste caso o salário não está com o empregador, mas contratualmente com o banco.
6 Tudo isto diz respeito somente à proibição de “não pernoitará”. Mas o empregado pode voltar atrás e exigir receber seu pagamento diretamente do empregador, ao invés de recebê-lo do banco. Ele também tem o direito de mudar de opinião e exigir o pagamento diretamente do patrão se o banco não lhe pagar, podendo exigi-lo do empregador a qualquer momento, argumentando não estar de acordo com o arranjo original. Mesmo no caso do banco não ter voltado atrás em seu comprimisso e decidir pagá-lo, ainda assim o empregado tem direito de retroceder do acordo original e exigir seu salário do empregador.
7 A lei acima se aplica somente no caso do diarista não haver desobrigado explicitamente o empregador do dever de pagá-lo, mesmo quando o banco falhou em executar a ordem de pagamento, ou quando o diarista não se sujeitou a este compromisso por meio de um Kinian (ato simbólico de aceitação). Se há um Kinian, o diarista não tem o que exigir do patrão.
8 Se o patrão empregou dois diaristas e um deles é pobre, mas ele só tem como pagar a um deles no prazo determinado, o pobre tem preferência, como está escrito (Deuteronômio 24:16): “pois ele é pobre etc.” Nossos sábios ensinam (Baba Metsiá 111b) que a intenção do versículo é dizer que o pobre tem preferência sobre o rico. Se dos dois diaristas um for pobre e o outro miserável: o miserável, Evion, sofre mais do que o pobre, mas está mais acostumado ao embaraço. Por isto é chamado de miserável – Evion – porque deseja – Ovê – e não consegue obter o que quer. Neste caso o pobre terá preferência ao miserável. Mas se um deles for miserável e o outro rico – o miserável antecede o rico.
9 Se os dois forem pobres ou miseráveis e um deles for parente do patrão, o familiar não tem o privilégio de anteceder o outro com relação ao pagamento do soldo.
10 Saiba que o pobre tem precedência mesmo no caso do rico haver demandado seu pagamento antes dele, pois no final o pobre também virá exigir seu pagamento dentro do prazo, como está escrito: “É fato consumado que um diarista não deixa que atrasem pagamento” (veja capítulo 9, item 8).
11 Se os dois empregados forem ricos ou os dois forem pobres, sendo que um deles foi diarista no dia anterior e o empregador já incorreu na infração “não pernoitará” com relação ao seu ordenado, e o outro trabalhou somente durante este dia, o segundo precede o primeiro na hora do pagamento, para que seu prazo não vença. Somente quando o segundo empregado receber seu dinheiro, o primeiro poderá ser pago logo que o patrão tenha como pagá-lo. Neste caso é possível que um rico tenha preferência ante um pobre.
12 É proibido contratar um diarista sabendo de antemão que não terá como pagá-lo a tempo, pois o empregado espera ser pago logo após o serviço (Deuteronômio 24:15): “Porque é pobre e por ela arrisca a sua alma”. Do contrário, o empregado deve ser avisado de antemão e concordar com os termos do patrão, a menos que seja costume daquela localidade pagar os empregados somente em dias de comércio e mercado, quando o patrão tem dinheiro disponível (como registramos no capítulo 9). Por esta razão, se o patrão quiser viajar mas teme que o prazo de pagamento vingará antes do seu
retorno, deve providenciar antes da viagem que seus empregados recebam seus salários no prazo certo.
13 Tudo o que escrevemos nestes dois capítulos diz respeito apenas às situações onde o empregado não é pago no prazo correto. Caso o patrão, contudo, se recuse a pagar um empregado ou lhe pague menos do que o devido, que seja um só centavo, estará transgredindo o que diz a Torá em Levítico (19:13): “Não sonegarás (o salário de) teu próximo, e não extorquirás”. Deixar de pagá-lo implica também em roubo, como afirma a Guemará (Baba Metsiá 111a) e quem o faz deve ser desqualificado para prestar testemunho diante de um tribunal. Nossos sábios também disseram: “Quem se nega a pagar um empregado, é como se houvesse lhe tirado a alma; e transgride seis mandamentos da Torá, cinco passivos e um ativo: “não sonegarás”, “não extorquirás” e “não pernoitará a paga contigo”, descritos em Levítico (19:13); “não defraudarás o empregado pobre e necessitado”, “no seu dia lhe pagarás a sua diária” (mandamento ativo) e “não passará por ele o sol”, descritos em Deuteronômio (24:15), na porção Ki Tetsê”. Veja na Guemará, Tratado Baba Metsiá (111a) e também no Zôhar sagrado, porção Kedoshim, que explica este tópico detalhadamente. Por conseguinte, todo aquele que se dedicar a cumprir estes preceitos e cuidar não transgredir as leis pertinentes a este assunto, será largamente recompensado.
Epílogo
DIA 30
Sei que muita gente pode pensar que, hoje em dia e nesta época, a prática da caridade já é suficientemente difundida e que não há nada mais a dizer. A este tipo de argumento eu respondo: a caridade, como é conhecida de um modo geral, mede-se com relação ao doador e ao receptor – com relação ao receptor, de acordo com suas necessidades, como nos ordenou a Torá (Deuteronômio 15:8): “Certamente abrirás a tua mão a ele e emprestarás o suficiente para o seu sustento”. Antigamente, as necessidades de um pobre podiam ser suficientemente satisfeitas por meio de um pequeno presente. Hoje, vestuário, calçados e habitação, assim como as demais necessidades básicas do homem, custam significativamente mais. Olhe para si mesmo, veja quanto gasta com suas próprias necessidades e constate que o preço das coisas é duas e até quatro vezes mais o que elas custavam antes. Consequentemente, a obrigação de atender as necessidades de um pobre requer somas maiores. O mesmo se aplica ao Chéssed que devemos fazer com os pobres na forma de empréstimos, como ordena a Torá (Êxodo 22:24), “Emprestarás dinheiro ao Meu povo, ao pobre que está contigo”. Também está escrito (Levítico 25:35): “E quando empobrecer teu irmão e encostar sua mão sobre ti, deterás sua decaída”. Este tópico também está incluso nesta categoria, como explicamos anteriormente. De modo similar, antigamente as pessoas precisavam de menos para subsistir; emprestar-lhes uma pequena soma era suficiente para que pudessem abrir um negócio e dele pudessem sustentar-se e aos seus. O credor podia então cumprir a determinação da Torá ao amparar um pobre. Hoje isto já não é possível, pois as necessidades cresceram. A margem de lucro nas transações financeiras diminuiu. Por conseguinte, cada homem precisa de mais para viver. Doar também diz respeito ao doador, pois a obrigação de doar para caridade depende das circunstâncias em que cada um se encontra. O dever de uma pessoa de boas condições é maior que o dever de um pobre (ainda que este também deva contribuir para a caridade –
veja Guitin 7a). A obrigação do rico é ainda maior que a da pessoa de boas condições. E a de uma pessoa extremamente rica, maior que a dos demais. Contudo, duas pessoas podem estar praticando o mesmo ato, mas um é louvado e recompensado por isto, ao passo que o outro é condenado e perde seu dinheiro. O motivo é que este último fez uma doação por demais trivial se comparada às bênçãos que o Altíssimo, bendito seja, despejou sobre si. Um caso como este aconteceu a Nacdimon ben Gurion ( Ketubót 67b), figura proeminente de sua época, uma das três figuras cujo mérito podia adiantar o Sol, como relata o Talmud (Taanit 20a). Nacdimon estendeu caridade a todo Israel (ibid.). Contudo, por não contribuir de acordo com suas posses, foi condenado a perder sua fortuna. Obviamente, não podemos avaliar esta obrigação em nossos dias, segundo os critérios daquela época. Naquele tempo, o mundo havia acumulado menos riqueza. Hoje em dia há mais gente rica e muito mais rica do que antigamente. (Hoje, todos podem constatar isto em suas próprias comunidades. Um rico de antigamente pode ser considerado pobre em nossos dias, em termos relativos. O rico de antigamente mal se compara ao remediado “classe média” de hoje. Mas em comparação com os tempos antigos, hoje temos mais pobres, portanto, o dever dos mais ricos de ajudá-los em tempos de privação também cresceu. Então, como ver estas obrigações do mesmo modo como as víamos antigamente?). Naquele tempo, o padrão de vida das pessoas era mais modesto. Quando havia uma emergência, era possível cumprir o dever de prestar caridade com uma soma modesta de dinheiro, que as pessoas tinham em casa, já separadas para atos de Tsedacá ou Chéssed . Mas as circunstâncias mudaram. Hoje as pessoas gastam seu dinheiro com luxos e prazeres, roupas e casas caras, empregados e etc. O padrão de medida dos atos de Tsedacá e Chéssed , que envolvem a própria alma de cada um, sua redenção neste mundo e no Mundo Vindouro, não devem incluir somas menores que as despendidas com estes luxos. Nossos Sábios provam o que estamos afirmando aqui: “No futuro, Deus repreenderá cada um de acordo com o que ele foi”. Se perguntarmos a uma pessoa que conduz as despesas de sua casa comportando-se como um rico e gastando mais do que pode, sua resposta será que ela considera impossível reduzir estes gastos e economizar. Mas quando se trata de Tsedacá, seu coração endurece e sua mão se fecha, dando a impressão de ser pobre e sem recursos. Sobre estes tópicos, as Escrituras dizem (Provérbios 13:7): “Há aquele que se julga rico (em seus próprios negócios) e, no entanto,
nada tem; e aquele que se julga pobre (em dar Tsedacá e fazer Chéssed ) e, no entanto, tem grande riqueza”. Como sabemos, Tsedacá e Chéssed sobrepujam o atributo da Justiça Divina. Assim nossos Sábios (Shabat 151b) comentam o versículo (Deuteronômio 13:18): “Para que o Eterno Se aparte do furor da Sua ira, tenha piedade de ti, Se compadeça de ti”: “Quem tem piedade sobre os homens merece piedade dos Céus”. Hoje vemos o atributo da justiça estrita (Midát Hadin) crescer cada vez mais no mundo, dia após dia. As mortes por calamidades e causas não naturais abundam. Falta influência Divina no mundo e um dia traz mais maldições que o dia anterior. Por isto, urge incrementarmos nossos atos de Tsedacá e Chéssed. Talvez deste modo logremos reverter a severidade das sentenças e o mundo encha-se de misericórdia (como explicamos no parte 2, capítulo 3).
Coletânea de conselhos preciosos baseados em Marganita Tava* Redigido pelo famoso Gaón e Tsadic da geração anterior, conhecido entre os s ábios de Israel para mérito e glória da nossa nação e que santificou o Nome de Deus com estudo constante e atitudes louváveis, nosso mestre, o rabino e Gaon Iehonatan zt”l da cidade de Lubesht – mais conhecido como rabino Iehonatan Woliner.
* Encontrei este manuscrito com seu discípulo, meu companheiro, o rabino Gaon HaChov, da cidade de Palungian, que contou-me que seu pai, o santo referido rabino, tinha o costume de lê-lo e relê-lo diversas vezes ao dia. Devido à sua grande utilidade, vi por bem publicá-lo com o intuito de beneficiar o público. Não é bom conversar muito com as pessoas nem mencionar seus nomes, senão o mínimo necessário ou com o intuito de lembrar uma Halachá em seu nome. E também, devemos nos afastar de todo o tipo de mexerico, sombra de mexerico (Avác Lashon Hará) e não fazer comentários negativos sobre criatura alguma neste mundo, como disseram nossos Sábios (Pirkê Avot 4:3): “Não desdenhes a ninguém, e não desprezes coisa alguma”.
*** Não conversar na sinagoga e na casa de estudos sobre assuntos mundanos a não ser o estritamente necessário e mesmo assim que seja com a finalidade de cumprir uma Mitsvá. Mesmo assim, é preciso falar pouco, para que do permitido não incorramos no proibido; melhor falar no idioma santo (Hebraico).
*** Não conversar durante os estudos sob hipótese alguma, a menos que seja para uma Mitsvá passageira. É melhor não fazer pausas mesmo entre uma lição e outra, a menos que estritamente necessário.
*** Não conversar durante os estudos quando estiver estudando com os colegas, senão o que for pertinente a uma Mitsvá passageira que envolve a todos. Se precisar ocupar-se sozinho desta Mitsvá deve tentar não desperdiçar o tempo dos demais.
*** Não falar asperamente com quem lhe faça indagações sobre a Torá, mesmo que ele esteja equivocado, respondendo com brandura, para que ele não tema voltar a perguntar; mais ainda se não estiver claro que ele equivocou-se e não insistir em seu ponto de vista, como comentaremos mais adiante. Até com os mais jovens não devemos insistir em nossos pontos de vista e ser constritos.
*** Não dar ouvidos a conversas fúteis, tanto pior a conversas proibidas. É preciso afastar-se e não dar ouvidos a este tipo de confabulação, como está escrito no Tratado Shabat, que conversas vãs diferem de conversas proibidas. Devemos evitar dar ouvidos a conversas desnecessárias dentro da sinagoga ou durante os estudos, pois quem ouve é como quem responde, por isto é preciso evitá-lo. Conversas como estas impurificam o pensamento, por isto precisamos cuidar até do que pensamos e dos pensamentos estranhos, principalmente durante o estudo e as orações.
*** Ser prudente em não envergonhar os outros em público, conscientes da gravidade deste pecado. Mesmo quando se repreende alguém, é preciso fazê-lo paulatina e prudentemente, como explica o comentário sobre a porção Kedoshim.
*** Julgar favoravelmente a todos pois, segundo o Semag, isso faz parte do conjunto das Mitsvót . Devemos julgar favoravelmente o povo judeu em seu relacionamento com seu
Criador, entre outros, com relação aos costumes que o público assimilou como parte de seu rito, impossíveis de serem consertados; mas os que puderem ser consertados – devem sê-lo e não é preciso ajustar-se a eles.
*** É preciso falar com suavidade às pessoas e cuidar para não zangar-se, mesmo com relação a uma Mitsvá. Mesmo quando a repreensão faz-se necessária, é preciso falar com brandura e serenidade; como se estivéssemos repreendendo nosso próprio mestre, pois a verdade sobre o que faz cada um nos é oculta, e pode acontecer de nosso interlocutor nos superar em boas ações, quanto mais em se tratando de um Talmid Chacham (sábio).
*** Ter em mente que um dia partiremos deste mundo, como disseram nossos Sábios (Pirkê Avot 2:15): “Faz Teshuvá um dia antes de tua morte”, cumprindo todos os dias nossas Mitsvót com total presteza e agilidade, como se tivéssemos somente este dia para servir nosso Criador.
*** O homem deve imaginar que nasceu hoje e que ainda não teve a oportunidade de servir a Deus, como dizemos na recitação do Shemá, (neste versículo, a palavra “hoje”, Hayom, alude a esta ideia na opinião dos homens de Jericó, por isto nossos Sábios não protestaram nem levantaram dúvidas, por causa do significado desta passagem, cuja mensagem é a de cumprir esta Mitsvá “hoje” e não amanhã, com nosso coração. Veja Talmud (Pessachim 56b). Esta é uma regra de ouro da Torá e das Mitsvót .
*** Anotar todos os atos de Teshuvá e transgressões dos quais nos recordamos, assim com as boas atitudes que nos comprometemos a cumprir, cuidando para ser meticulosos e constantes no seu cumprimento, pois foram os Céus que despertaram nossa consciência a elas, e ter em mente que os Céus o fizeram por ser isto o que precisamos para servir o
Criador. É preciso cuidar disto como se fosse um juramento, como está escrito (Salmos 119:106): “Jurei, e hei de cumprir”. De qualquer forma, é preciso cuidar deste compromisso como se fora uma promessa de certo, mesmo com relação a uma Mitsvá. Para nosso infortúnio, o Iétser Hará aumenta a cada geração fazendo as pessoas desprezarem suas promessas, o que incrementa cada vez mais a influência do Iétser Hará, os Céus não o permitam. Por isto, é preciso lembrarmos de cumprir tudo o que prometemos, mesmo que seja uma Mitsvá. Eram bons os dias de antigamente, quando as pessoas cuidavam não transgredir o pecado de jurar em falso; mas nós, por causa dos nossos pecados, não vemos nada de mal nisto. Afastemo-nos pois das promessas e das juras, mesmo que seu objetivo seja uma Mitsvá. Se não cumpri-las, Deus o livre, o indivíduo é chamado “que não mantém a palavra”, o que é proibido até mesmo às pessoas comuns.
*** Repreenda as pessoas que aceitarem tua admoestação ou que talvez o aceitem, mesmo que certamente não aceitem o que está escrito explicitamente na Torá. Cuide bem de fazêlo, pois é grande a punição de quem impede a repreensão. É certo pedir auxílio a Deus para que as pessoas aceitem de bom grado o que lhes queremos provar.
*** Incremente o estudo da Torá tanto quanto possas e não o abandone por um momento sequer. Tenha em mente que terás que prestar contas sobre cada momento e cada segundo que desperdiçastes. Por isto, esforça-te de corpo e alma para não desperdiçar um momento sequer do teu estudo.
*** Procure o bem do teu semelhante, persiga a paz e cuide não transgredir a proibição “Não terás ódio” (Levítico 19:17). Na opinião do Maharam de Lublin é proibido até odiar um perverso, enquanto não o tenhas repreendido e nesta geração não há quem saiba repreender, pois se os houvessem, os malvados aceitariam sua repreensão. Pois foi sua natureza má que o fez pecar, como disseram nossos Sábios (Pirkê Avot 2:5): “Não julgues o teu próximo até chegares ao seu lugar”. Quanto mais prejudicá-lo, mais deve pedir
misericórdia por ele e que Deus o ajude a fazer Teshuvá completa. Não dê apelidos aos outros e não os chames pelos apelidos que os outros os chamam.
*** Estude em voz alta, pois esta é a parte principal do estudo. Tenha a intenção de temer e de amar a Deus cada vez que pronuncia Seu nome.
*** Diga antes de estudar Torá e antes de cumprir uma Mitsvá – faço-o por mandamento Divino. Peça a Deus que te ajude no seu cumprimento e na tua preparação por meio do estudo, com integridade.
*** Tenha sempre em mente a Mitsvá da fé na Providência Divina, o amor e o temor a Deus, expressando-o com veemência: aceito sobre mim a Mitsvá de reconhecer a Providência Divina, o temor e o amor a Deus. Pense constantemente estar santificando teu corpo segundo as Dez Sefirót e no Nome do Eterno com as vogais Camats, Patach, Tserê, Segol, Shevá, Cholam e Chiric, que indicam temor e amor.
*** Reflita com os livros de Mussár três momentos por dia: ao levantar-se, ao meio-dia e à noite, e nas palavras desta obra sempre que possível. Pondere bem sobre tuas ações e peça a Deus que te ajude a trilhar verdadeiramente o caminho da Teshuvá.
*** Antes de recitar cada uma das bênçãos da oração, pense no conteúdo desta bênção e em seus segredos ocultos. Que tua intenção no momento da oração seja a glória dos Céus e não teu interesse pessoal. Durante a repetição do Shaliach Tsibur , tenha intenção em cada
uma de suas bênçãos, respondendo Amén. Cuide responder à Kedushá, pois é um preceito positivo da Torá, como explicam o Raiá Mehemna Cadisha e o Zôhar sagrado.
*** Cuide recitar as bênçãos de agradecimento e que tua boca não se deleite com alimento algum antes de recitares a bênção apropriada; cuida também recitar as bênçãos das Mitsvót . Estuda com afinco tudo o que é pertinente a elas, para que não venhas a pronunciar uma bênção incorretamente, Deus o livre.
*** Não olhe para fora durante o estudo para não perder a atenção e não mire nada além do próprio objeto do estudo. O mesmo vale para as orações. Feche os olhos durante a Amidá. Isto vale para as orações do ano todo.
*** Não coma demais; afasta-te dos prazeres deste mundo, em especial do luxo e do sono em demasia, como está escrito (Eclesiastes 2:8): “Capazes de deliciar qualquer filho dos homens”. Cuida de tudo o que traz em si a dúvida da proibição e tenta cumprir as Mitsvót de acordo à opinião da maioria das autoridades rabínicas.
*** Procure não conversar sobre assuntos gerais e filosofias e não os tenha em mente, pois podem causar-te o esquecimento do que aprendeu em Torá, Deus o livre.
*** Não cause danos a criatura alguma neste mundo e não cause sofrimentos a ninguém. Não xingue as pessoas e não levante a mão contra ninguém, nem que seja para repreender um malvado, pois pode não ser justo merecê-lo, como explica o Zôhar sagrado, porção Sheminí.
*** Ter em mente a santidade do Shabat durante todo este dia e não esquecer-se disto, como está escrito: “Estejas lembrado etc.” O mesmo com relação aos Iamim Tovim (dias santos), lembrando-se constantemente de manter o coração alegre nestes dias pois o Shabat e os dias santos constituem sinais do pacto entre o povo judeu e Deus, portanto devemos ter em mente sua santidade durante todo o Shabat e o Iom Tov. É este o motivo do Kidush, a primeira bênção sobre a santidade do dia. Também é bom lembrar da santidade de cada Rosh Chodesh, pois são dias santos segundo a Torá (Deoraita) e talvez sejam dignos da mesma alegria que dispensamos aos dias santos, como explica o Talmud.
*** Passar por uma porta que tenha Mezuzá com reverência e amor, recitando o que escrevi anteriormente. Cuide em especial de colocar Tefilin, pois constituem um sinal entre o povo udeu e Deus e não desvie tua atenção deles, mantendo sempre a intenção apropriada, como ensina o Arizal.
*** Pense antes de falar, pois talvez haja algo proibido no que está prestes a dizer, e também como o dirá, que seja da forma mais resumida possível, assim como a utilidade que isto terá para uma Mitsvá.
*** Pense antes de comer, se está observando o caminho da Torá e do serviço Divino, que é o alimento espiritual, e depois coma para satisfazer o corpo, como está escrito (Provérbios 31:27): “Ela abre sua boca com sabedoria”. Estude estas palavras. Se transgrediu alguma delas, arrepende-te e confessa, para ganhar conhecimento e proteger-se. Se nada transgrediu, confessa o que fez no passado e peça pelo futuro. Peça também pelo preparo da tua comida, que seja impecavelmente casher, como explica o sagrado Zôhar. Roga a Deus que te ajude a pronunciar as bênçãos corretas e do modo correto, assim como salvar-te da gula.
*** Cuide em especial de honrar teu pai e tua mãe, teu rabino, sábios e anciãos e de honrar a Torá. Do respeito aos sábios deduzimos o respeito que devemos prestar aos escritores de livros sagrados, pois nos orientam e nos ensinam com seus santos escritos. Se constatar a necessidade de contestar suas palavras, faça-o com grande respeito, como se o estivesse fazendo com teu próprio mestre.
*** Seja solidário com o sofrimento da Shechiná.
*** Repita sempre tudo o que escrevemos aqui, para não transgredir nada do que dissemos, pois um pecado leva ao outro; seja sagaz com o Iétser Hará e lograrás sobrepujá-lo.
*** Agradeça a Deus por todo o bem e o mal, e não tente contestar ou investigar Seus motivos. Lembra-te do versículo (Deuteronômio 8:5): “E saberás em teu coração que, como o homem castiga seu filho, assim te castiga o Eterno, teu Deus”. O Semag o considera um mandamento positivo da Torá, pois tudo tem influência positiva sobre a Torá e as Mitsvót . Peça a Deus que te ajude a não caminhar de cabeça erguida, mas sim adotando as demais condutas adequadas – pois isto é um mandamento Divino, assim como saber que a glória de Deus preenche toda a Terra – e isto diz respeito ao comportamento do judeu na Terra.
*** Não seja arrogante, ao mesmo tempo em que te preocupas em adquirir a virtude da humildade. Comporte-se com os homens que vêm de longe para um lugar onde habitam pessoas sábias e importantes. Quando descobrires em ti uma boa virtude, agradece a Deus por tê-lo auxiliado a adquiri-la com Sua benevolência. E não creias que te devem algo
por isto. Se descobrires em ti um defeito, Deus o livre, culpe somente a ti mesmo. Com relação aos estudos, seja humilde perante os demais, pois todos podem se equivocar, quanto mais o menor entre os menores. Se constatares que sabes algo de Torá, agradeça a Deus por isto, pois Ele te está ajudando. Peça a Ele em tuas preces que te ajude a adquirir as qualidades da submissão e da humildade, para que tenha sucesso tua Torá.
*** Estuda algo durante cada refeição antes de recitar a bênção sobre os alimentos, pois é um grande dever, como explica o sagrado Zôhar na porção Terumá. Cuide dedicar um tempo determinado para este estudo, para que não venha a alongar-se demais e acabe esquecendo da bênção sobre os alimentos ou excedendo o tempo estipulado para recitála. Não te envolva em divagações quando deste estudo, para que não interfiram em tua mente quando estiver recitando a bênção sobre os alimentos.
*** Quando estiver comendo uma refeição festiva, tenha em mente que está cumprindo uma Mitsvá e qual a Mitsvá em questão. Alegra-te em especial nas refeições do Shabat e dias santos, pois estás comendo à mesa do Rei dos reis. Coma com total reverência e amor a Deus, e não desvie o pensamento disso. Estude sobre a mesa algo relacionado com a santidade do dia – Torá oculta e revelada.
*** Cuida-te para não te envolveres em controvérsias e não te apegues a elas, Deus não o permita, pois incorrerá numa transgressão (Números 7:5): “E não sejas como Côrach etc.” E o Semag o considera um mandamento da Torá; ainda mais quando se trata de controvérsia pública. Subjuga-te frente a teus oponentes, ofereça-lhes a paz e não os odeies, saiba que tudo isto é castigo Divino pelos teus pecados e que eles originaram as Clipót que te perseguem. Examina cautelosamente tuas ações, pois se as retificares, não terás oponentes. Não peça aos Céus que julgue teus inimigos mesmo que entre eles existam os que não tenham Torá e Mitsvót , Deus não o permita, mas afasta-te deles e não os amaldiçoe nem rogue para que sejam julgados. Cuida não odiá-los nem em teu coração.
Não fales mal deles e não lhes provoque mal algum; pelo contrário, faça-lhes o bem tanto quanto possas e peça a Deus que lhes tenha compaixão e os beneficie e Ele ouvirá tuas preces. Até aqui as palavras do rabino Iehonatan Woliner
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Notas
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1 Veja parte 2, capítulos 9 e 10. 2 Parte 2, capítulo 2. 3 Veja parte 2, capítulo 9. 4 Parte 2, capítulo 6. 5 Trata-se do trecho da Torá em Êxodo, do capítulo 21 ao capítulo 24. Segundo o Sêfer Hachinuch, esta porção contém 53 mitsvót, muitas das quais são relativas ao f uncionamento dos tribunais e da justiça, em seus diversos aspectos. (N.R.) 6 O Talmud (Ketubót 66b) conta que Rabi Iochanan ben Zacai saía de Jerusalém montado em seu burro, quando encontrou uma moça que catava grãos de cevada no excremento de um rebanho de beduínos. Ao vê-lo, ela disse: “Rabi, alimenta-me!”. Ele perguntou de quem ela era filha e ela respondeu que seu pai era Nacdimon ben Gurion. Rabi se espantou, pois tratava-se de um homem muito conhecido e muito rico. A Guemará relata que Nacdimon era um homem que fazia caridade (Ele era uma das três pessoas, juntamente com Moisés e Josué, cujo mérito podia adiantar o sol [Taanit 20a]), mas não doava de acordo com suas posses. (N ( N.R.) 7 O Midrash Sifri sobre a porção Haazinu traz o seguinte relato: “‘Goteje a minha doutrina como a chuva’ (Deuteronômio 32:2) – Disseram os sábios: Disse Moisés ao povo de Israel: Se vocês soubessem quanto sofrimento aguentei pela Torá! E quanto trabalho dediquei a ela, e quanto esforço desprendi por ela, como está escrito (Êxodo 34:28): ‘E esteve (Moisés) ali com o Eterno, quarenta dias e quarenta noites’. E ingressei entre as criaturas
celestiais e adentrei entre os serafins, e apenas um deles é capaz de queimar o mundo inteiro. Minha alma dei por ela, meu sangue dei por ela. Assim como eu a estudei com todas as dificuldades (sofrimento), vocês também deverão estudá-la com sofrimento...”
8 Rabi Ioná ben Avraham (c. 1220-1280), mais conhecido como Rabênu Ioná, nasceu em Gerona (Gerundi), na Espanha. Escreveu comentários sobre alguns tratados do Talmud, além de ser autor de importantes livros de Mussar (ética), entre eles Shaarê Teshuvá e Sefer Hair’á. (N.R.) 9 O Sinédrio (ou San’hedrin) era uma assembleia formada por 71 membros, e constituía a instância judicial máxima do povo de Israel. (N.R.) 10 O Talmud (Shabat 126a) reforça a ideia da Mishná citada. Ambos os trechos foram incorporados ao Sidur (livro de rezas), sendo recitados após a benção sobre o estudo da Torá. (N.R.) 11 Uma das obras mais conhecidas do grande cabalista espanhol Rabi Iossef Gikatalia (1248-1310). Entre suas obras estão também Shaarê Tsédec e Shaar Hanicud. (N.R.) 12 Nossos Sábios entendem que, a partir de uma certa geração, o mérito de nossos patriarcas se esgotou e não mais protegeu o povo de Israel, restando a ele somente o pacto de Deus com Abrahão, Isaac e Jacob. (N.R.) 12a A expressão “medida por medida” é a tradução literal do conceito Midá kenégued Midá. Este consiste na ideia de que o homem recebe e é tratado de acordo com suas ações, conforme vimos no capítulo 3: “Quem tem compaixão pelas demais criaturas merece a compaixão dos céus” (Shabat 151b). (N.R.) 13 Agadá abrange ensinamentos de fé, sabedoria e ética, além de contos e analogias, isentas de normas haláchicas. (Enciclopédia Talmúdica) (N.R.) 14 Os Gibeonitas, ou Guivonim, figuram no livro de Josué (Iehoshúa). Eles habitavam na terra de Israel quando Josué liderou sua conquista. Após ouvirem as proezas que Deus realizara para o povo de Israel, os Guivonim, assustados, utilizaram um método ardiloso para não serem derrotados pelo exército de Josué. Eles vestiram roupas velhas e levaram
consigo pães secos. Procuraram Josué e disseram ser viajantes de uma terra distante, apenas de passagem pela terra de Canaã. Eles alegaram que não habitavam naquela terra e, portanto, não haveria necessidade de uma guerra contra eles. Josué e os líderes de Israel fizeram então um pacto de paz com este povo. Ao descobrir que fora enganado, o povo de Israel não agrediu os Guivonim, uma vez que o pacto já havia sido selado, mas, por haver sido enganado, exigiu que estes se tornassem rachadores de lenha e tiradores de água para os israelitas (vide Josué, capítulo 9). (N.R.)
15 Guezerá Shavá é uma das treze regras hermenêuticas de dedução da Torá. (veja Baraita de Rabi Ishmael, no inicio da Sifra, que foi incorporado à reza matinal [veja “Sidur Completo”, Editora Sêfer, pág. 39]). Consiste na comparação entre dois casos com um elo em comum, a partir do qual se deduz que um veredicto que se aplica ao primeiro aplica-se também ao segundo. Em geral, este tipo de inferência é apoiado na tradição, ou seja, estes elos são ensinados de mestre para aluno, através das gerações (veja Rashi sobre Pessachim 66a – final da página). (N.R.) 16 Esta é a primeira das treze regras hermenêuticas para fazer inferências (vide nota anterior). Concluímos que, se um veredicto se aplica em um caso leve, no mínimo, se aplicará a um caso mais grave. (N.R.) 17 O Iétser Hará, para evitar que a pessoa estude e aprenda o caminho correto, argumenta: “De que adianta estudar e conhecer as numerosas obrigações da Mitsvá de Chéssed para depois transgredi-las? É melhor não estudar e não saber, pois assim as transgressões serão feitas sem conhecimento e, portanto, não serás motivo de humilhação.” Este argumento é falso e absurdo, e podemos perceber isto através de uma analogia: “Uma pessoa foi aconselhada a não seguir por um determinado caminho, pois este tinha muitos buracos e outros obstáculos perigosos. Ela então respondeu àqueles que a aconselharam: ‘Tenho uma ideia melhor, me deem um pano’. Seus amigos responderam: ‘E o que farás com o pano? Acaso poderás com ele cobrir os buracos?’ Ela então disse: ‘Não, eu pretendo cobrir meus olhos com uma venda. Deste modo, caso tropece num buraco, não serei motivo de escárnio e não poderão culpar-me, pois meus olhos estavam cobertos, de modo que não poderia saber onde estavam os obstáculos.’ Seus amigos então o repreenderam: ‘Não existe motivo de escárnio maior que este! Você é um ser
humano, deveria usar sua inteligência e saber que, ao cobrir os olhos, certamente cairias.’” (N.A.)
18 O Radbaz (Rabino David ben Zimra) nasceu na Espanha em 1480 e faleceu em Safed (Israel) em 1579. Foi um dos mestres do grande cabalista Isaac Luria (conhecido como Arizal ou Ari Hacadosh). (N.R.) 19 Os predadores são Gazlanim, aqueles que se apoderam indevidamente dos bens dos demais (Rashi). (N.R.) 20 Trata-se de Eglá Arufá, um novilho que é abatido quando um indivíduo é encontrado morto no campo e não se sabe o que lhe acometeu. Neste caso, os anciãos da cidade mais próxima matam o novilho e dizem: “Nossas mãos não derramaram este sangue.” (veja Deuteronômio 21:1-9). (N.R.) 21 Remez é a alusão de um texto a outro assunto, que não está revelado no significado explícito do versículo. (N.R.) 22 O rabino Chaim Vital (1543-1620) foi aluno do rabino Moshe Alshech e do rabino Moshe Cordovero. Mais tarde, tornou-se importante discípulo do Ari Hacadosh. (N.R.) 23 Veja Ética dos Pais 1:2. (N.R.) 24 A tribo de Zebulun sustentava a tribo de Issachar, que tomava para si a tarefa de estudar Torá e isto recompensava ambas as tribos, conforme será explicado no capítulo 20. (N.R.) 25 Tanaíta, denominação dos sábios da Mishná. (N.R.) 26 O Dinar era uma moeda da época que equivalia ao Zuz. Seus valor era igual a ¼ de Sela ou 192 Perutas. Um Dinar de ouro, por sua vez, habitualmente tinha o valor de 25 Dinares comuns (de prata). (N.R.) 26a Conforme é explicado no Talmud, isto é uma referência aos romanos, que sempre buscavam cobrar mais e mais importos. (N.R.)
27 Estes fundos são conhecidos pelo acróstico Guemach (Guemilút Chéssed). (N.R.) 28 De acordo com a Torá (Levítico 25), no ano sabático, todas as dívidas são perdoadas e todas as posses retornam aos donos anteriores. Por este motivo, as terras vendidas pouco tempo antes do sétimo ano têm seu valor depreciado. Do mesmo modo, as pessoas tendem a ficar mais receosas para emprestar dinheiro, pois, caso o devedor não pague e comece o ano sabático, a dívida será automaticamente perdoada. É por este motivo que esta admoestação faz menção ao ano sábatico. Por isto também, nossos sábios estipularam o Prozbul, uma forma de manter as dívidas após o sétimo ano. Este artifício foi criado com o intuito de beneficiar os pobres que teriam dificuldade para conseguir empréstimos nos últimos anos ou meses antes do sétimo ano. (N.R.) 29 Após a morte de Samuel, David viajou para o deserto de Parán. Naquela região, entre Maón e Carmel, Naval era um homem de muitas posses e, ainda assim, recusou-se a receber David com hospitalidade. (N.R.) 30 A mistvá de Shilúach Hakên consiste em afastar a mãe e deixá-la ir livremente quando alguém deseja tomar para si os ovos ou passarinhos de um ninho (vide Deuteronômio 22:67). Esta Mitsvá é mencionada aqui como a mais fácil e simples, pois assim ela é descrita por nossos sábios no Midrash (Midrash Tanchuma Ekev 2). (N.R.) 31 Os pobres têm preferência até mesmo aos que se ocupam da Torá (vide Shach 251:17). (N.A.) 32 O Rabino Eliahu ben Shelomo Zalman (conhecido como Gaón de Vilna ou Hagrá [17201797]) foi um dos grandes líderes de seu tempo. Entre suas obras, encontram-se comentários sobre as escrituras, sobre o Talmud, sobre a Halachá e sobre livros de Cabalá. (N.R.) 33 A baixela de prata e a bacia foram utilizadas nas oferendas de todos os príncipes de Israel (Números 7). (N.R.) 34 Em hebraico, o termo késsef se refere tanto a prata como a dinheiro. (N.R.)
35 Sela era uma moeda de prata da época, cujo valor era quatro vezes maior que o Dinar (vide nota 22). (N.R.) 36 Aparentemente, o texto se refere ao Midrash Tanchuma, Mishpatim 15, citado no capítulo 6. (N.R.) 37 O Talmud conta que Benjamin, o Justo, era o responsável por um fundo de caridade. Certa vez, em um período de escassez de alimento, uma senhora o procurou e pediu por sustento. Não havia, no entanto, dinheiro no fundo para ajuda-la. Ele então lhe disse: ‘Se o senhor não me der sustento, uma mulher e seus sete filhos perecerão’. Ele então a sustentou com seu próprio dinheiro. Algum tempo depois, ele adoeceu e estava por morrer, quando os anjos interviram diante de Deus, dizendo: ‘Você disse que salvar uma vida de alguém de Israel equivale a salvar todo um mundo, e Benjamin, o justo, que salvou uma mulher e seus sete filhos morrerá tão cedo?’ Imediatamente, Deus anulou o decreto e concedeu ao justo mais 22 anos de vida. (N.R.) 38 Portanto, se uma pessoa se levanta pela manhã para ir à casa de estudos (Bêt Midrash), e lhe aparecessem visitas, é preferível que ele se ocupe desta Mitsvá e receba seus hóspedes. Isto se aplica quando não há outra pessoa em sua casa que possa receber os convidados (ou quando se trata de pessoas importantes que o indivíduo deseja receber pessoalmente). Se outra pessoa pode receber as visitas em seu lugar, fica estabelecido o que aprendemos (Iorê Deá 146): ‘quando surge diante do homem uma Mitsvá enquanto este se ocupa do estudo da Torá, e esta Mitsvá pode ser realizada por terceiros, ele não deve deixar seu estudo’. (N.A.) 39 Sancheriv (Senaqueribe), rei da Assíria, atacou o reinado de Judá no início do século 8 a.e.c., conquistando suas cidades, e sitiou Jerusalém, capital do reinado, onde se encontrava o rei Ezequias (Chizkiáhu). No entanto, Deus salvou Jerusalém, abatendo 185 mil soldados do exército assírio durante a noite, e San’heribe retornou derrotado para Ninive. (veja 2 Reis 18-19). (N.R.) 40 Nabucodonosor (Nevuchadnetsar), rei da Babilônia, foi responsável pela destruição do Templo em Jerusalém e pelo exílio na Babilônia, entre os anos 586-516 a.e.c. (veja 2 Reis 25). Porém, de acordo com nossos sábios, ele não o fez pessoalmente, pois temia uma