JOSÉ ROBERTO DO AMARAL LAPA
A B A H IA EA CARREIRA DA ÍNDIA edição fac-similada
E D I T O R A H U C I T EC EC E D I T O R A D A U N IC IC A M P São Paulo, 2000
3 Estaleiro colonial
Por ordem de Tomé de Sousa e em cumprimento ao que disciplinava o seu Regimento, instala-se em Salvador, oficial mente, à volta de 1550, a emprêsa de consêrto e fabricação de embarcações. E m inúmeros momentos anteriores, entretanto, praticou-se na mesma Bahia a assistência aos navios em trânsito, quando necessitados de reparos. Acreditamos pois, na existência em épocas mais antigas de um serviço, ainda que precário e desordenado, não só de restauração dos navios da Carreira, como de construção de embarcações de menor porte, onde, naturalmente, devia entrai a contribuição indígena. Aliás, não era unicamente na Bahia, que tal se praticava. Em outros pontos do litoral, onde havia incipientes núcleos de população, improvisados estaleiros atendiam as escalas de embarcações portuguêsas, como ocorria, por exemplo em Per nambuco, Rio e São Vicente. Também, quanto à construção naval propriamente dita, pre p recc e d e n tes te s houve com tolerância e até estímulo da autoridade régia. Aos particulares que aqui construíssem naus de 130 tonéis para cima seria seria facu ltada um a série série de liberdade s. Na pr p r i m e i r a metade do século xvi foi sobretudo para as pequenas mbarcações que se voltou volt ou a atenção atenç ão da autoridad e. O desen volvimento d a navegação de cabotagem e guarda-costas levou r®1 a recomendar a construção de “navios” de remos, conn» ? • P riviléSios riviléSios aq ueles qu e os fize fizess ssem em “de qu inz e bancos, u . para para cima, e que t e n h a m d e b a n c o a b a n c o t r ê s p a lm»s de goa’’(i). (•) Céd. 1 _ i 9> 7 g BN Rio
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Esboçava-se assim, sob estímulo oficial, uma manufatura rudimentar, das primeiras que a Colônia possuiu, a qual, pra ticamente sem solução de continuidade, estendeu-se em franco desenvolvimento pelos séculos seguintes, perdendo em prima zia talvez, apenas para a extração do pau-brasil, coexistindo com a indústria do açúcar e com outras várias atividades eco nômicas. Estabelecido em 1549, o govêrno-geral, um ano depois, em 1550, já foram lançados ao mar a caravela R a i n h a e o bergan tim S. Tomé (2). (2). Mas, muito embora se tenha conhecimento da intensa atividade que, desde logo, o estaleiro baiano passou a desen volver, atendendo em ritmo crescente, e sempre com curtos pra p razz o s d e a c a b a m e n t o , t a n t o as n a u s d a C a r r e i r a d a í n d i a , como as frotas de outras “Carreiras”, as armadas guarda-costas, as embarcações de cabotagem e as próprias naus estrangeiras, quando arribavam em casos de comprovada necessidade, sabese que no tocante à construção naval em estaleiros brasileiros houve extensa e intensa polêmica, que acabou envolvendo o assunto com interêsses de outras colônias ultramarinas e com relação à concorrência metropolitana. Assim, não foi ponto pacífico a idéia de fundação dessa emprêsa no Brasil, não só pela sua relevância, que envolvia considerável despesa para a real Fazenda, como, também, pela pe p e r s p e c t iv a d e a f e t a r a p r o d u ç ã o d o s e s t a le iro ir o s d o R e i n o e das colônias do Oriente, que se achavam então em pleno fun cionamento. Foi levando em em conta problemas como co mo o da m a téria-prima, mão-de-obra, instalações e gastos, que se discutiu a conveniência ou não da construção naval no Brasil, em co tejo com o que se praticava tanto no Reino quanto no ultramar po p o r tu g u ê s . Argumentavam a favor e contra o incremento dos esta leiros brasileiros, particularmente o da Bahia, os cronistas, memorialistas e “entendidos”. N o i n í c i o p e s o u n a d e c isã is ã o r e a l u m c e r to c e tic ti c ism is m o n o êxito da operação feita no Brasil, como foi ela retardada, além disso, pela declarada pressão dos senhores de engenho, ciosos de suas reservas florestais. Com o em ou tros setore setoress da atividad e co lonial (legi (legisl slaç ação ão das sesmarias, lavoura de subsistência, viação e transportes, etc.), a classe latifundiária deve ter pressionado os prestigiosos (2) F. Borges de
Ba
r r o s
,
à margem da história da Bahia,
pág. 161.
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Arrãos da política administrativa, que eram as Câmaras Muicipais, a darem o seu voto contrário ao estabelecimento que então se pre tend ia desenvolver. Pelo menos é o qu e se de preende de um a das C artas do Senado d a C âm ara d o Salv a dor, da tad a de 2 de ju lh o de 1685. N ela aleg avam os seus membros que, em resposta à Carta Régia na qual eram con sultados sôbre a possibilidade de fabricar-se galeões naquela capitania, tinham a dizer que possuindo a capitania mais de 2 000 “lavradores de cana e len h a” , mais de 100 enge nho s à beira-m ar, con tand o com frotas de 2.000 carros e 300 em b arca ções, necessitava que êsses veículos essenciais ao transporte da cana, fôssem anualmente ( s i c ! ) refeitos ou novamente fabri cados com m ad eira cham ada “sic up ira”. O ra, tal situação, segundo os edis, não permitia que as reservas florestais fôssem ainda mais devastadas pelos estaleiros. Assim, “c om o a C on servarão dafabrica dos Engenhos,] e Lavoura se deve ante por] ato da ao u tra C onveniência| em enos im p o rtân cia aobem | comum e serviço deVossa Ma|gestade” convinha que se fabri cassem os galeões pretendidos em capitanias vizinhas, como Ilhéus e Pô rto Seguro, on de não ha via eng enh os (3). Essa representação demoveu el-rei dos seus propósitos, pro vocando perm is são apenas p a ra fabrico de em barcações m e nores (4). Entretanto, a situação não deve ter durado muito, mesmo porq ue as remessas de m adeiras, destinadas ao A rsenal de Lisboa, co ntin ua va m a ser feitas. Aliás, a ca rta dos oficiais da Câmara baiana serve para mostrar que as embarcações de grande porte eram habitualmente feitas no estaleiro do Sal vador, onde, estava sendo construído um galeão naquele mo mento (5). Mais uma vez, a influência dos senhores de engenho, em prejuízo do esta le iro não deixou de fazer-se sen tir, in clu sive, junto a órgãos adm inistrativos m etro po litano s. Datam aparentemente do século xvii as previsões orça mentárias atendendo a pedidos das autoridades, para constru ção de galeões e nau s no Brasil. Em 1609, o go ve rna do r D. Diogo de Meseses solicitava a um ex-mestre-carpinteiro da ri beira lisbonense, que lhe apresentasse o rçam ento p ara um a nau de quatrocen tas toneladas, a ser co ns truída na B ahia (6). (!) Cartas do Senado, vol. Ill, págs. 4-5 í4) Thales A z e v e d o , P ovo am en to da cidade do Sa lvad or, pág. 456. (!) Cartas do Senado, vol. 111, págs. 4-5. ' 1 Civro que dd razão do Estado do Brasil, págs. 156 e segs.
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Tratava-se, como se vê pelo porte, de embarcação para travessia oceânica. O custo a qu e se chegou com o galeão E sp irito Sa nto , anteriormente consertado na mesma Bahia, ser viu de base para o cálculo, que compreendeu serviços como a “aposturagem" e confecção de tôdas as partes do navio, além do fornecimento do material mais diverso: peças, partes inte grantes e suplementares como “carlingas”, “garlindéus", “cadastes”, “bali/as”, “cintas”, “latas”, “pés-de-carneiro”, “curvas”, “entreinechas”. "bequc”, “trincanizes”, “gurupés”, “traquete”, “mezenas”, “mastaréus”, “vérgas”, “leme”, “gáves”, “batéis”, “bombas”, “cabestante”, “abita”, "serviolas”, “pregadura”, “botocaduras”, "âncoras”, "cabres”, “amarras", “poleame”, “en xárcias”, etc. (T). Im po rto u tud o em 4:443$000 réis. Aliás, nesse total estava inserta a remuneração de 10 oficiais por oito meses de trabalho, à razão d e 400 réis p o r dia (8). Vê-se, portanto, que a construção a êsse tempo devia levar normalmente oito meses ou mais, o que nos permite avaliai a atividade que se seguiu à ordenação de 1651, na qual el-rei mandou que se fabricasse cada ano um galeão no pôrto mais conveniente do Estado do Brasil, o que deveria ocupar per manentemente o estaleiro do Salvador, como o “pôrto mais conveniente”, muito embora acreditemos que tal ordem não (7) Ib id em , págs. 156 e segs. As palavras de qu e aind a nã o demos a signifi cação em notas anteriores, são: “Aposturagem” deve ser aposturar, pregar “apostura s” (p ar te supe rior das balizas); “carlinga ”, tem vários significados. É a peça de madeira, com uma abertura quadrada fixa na sobrequilha para receber a mecha do pé do mastro; “garlindéu deve ser “garlindréu”, peça circular de metal que abraça o mastro na bancada ou na meia coxia, m antendo-o vertical. Te m também outros significados; “cadaste”, entre suas várias significações, indica a peça colo cada no alto, quase vertical, na e xtrem idade de ré da qu ilha; fechando a ossada na sua pa rte posterior, é a rabad a do navio; “ baliza” tem inúmerossignificados, entre êles o de indicar a peça curva de madeira, de dois ramos simétricos e iguais, disposta transversalmente à mediania, da quilha à borda; “cinta” é a tira de metal aplicada sôbre uma junta de duas peças metálicas coladas a tôpo e cravada para cada um a delas com um a, du as ou três orde ns de rebites; “la ta s” são vigas, entre os vaus, para servir de apoio aos pavimentos; “entremecha” ou “entremicha” é o vão entre o canto alto do dormente e o baixo do “trincaniz”; “beque” é a parte sa lien te da roda de pro a, destinado à segurança do guru pés; “ trinca niz” é a peça de madeira que preenche o ângulo que faz o convés com a amurada: “traq uete ” é o mastro real arvorado e afastado da roda de proa. É menor que o ma stro grande. T em outros significados; “ mczena” tem várias significações, entre elas a de indicar a carangueja que trabalha 110 mastro da mezena; “abita”, cada ura dos pares de colunas de ferro ou madeira, aos dois bordos, no castelo, usado* para re ceber as voltas de capelo do fiador da am arr a; “ boto ca dura s” devem ser “abatocaduras” ou “abotocaduras”, conjunto de fuzis, batoques e contrabatoques que seguram a mesa das enxárcias reais para o costado do navio; “cabre” ou “calabre” é a amarra de cabos. do Br asil, pág. ( 8 ) Liv ro q u e dá razS o do Estad o 157.
55 Estaleiro colonial — tivesse sido, por motivos facilmente compreensíveis, cumprida
eín tôda a sua extensão. Na mesm a fonte que nos dá essa inform ação lê-se que em I isar de estôpa em pregar-se-ia a em bir a pa ra calafetação, o ® ficaria mais em conta. O breu e o alcatrão seriam imn o r t a d o s , o que parece indicar ainda não serem conhecidos n e s s a altura vários sucedâneos brasileiros para a matéria-prima estrangeira.
Sabemos qu e na ín d ia, em 16 H, se po dia c on struir um a nau, completamente aparelhada, por 15 mil cruzados, ao passo que em P ortug al im po rtaria em 50 m il cruzados (®). N o O riente, destacava-se o arsenal de Goa, on de serv iam mestres italianos, e que construiu famosos navios para as tra vessias oceânicas, sempre sob o estímulo da Coroa, principal mente sob os governos dos vice-reis Pedro da Silva e D. Filipe Mascarenhas. Êsse estab elecim ento asiático, ao co n trár io do estaleiro baiano, não fôra criado pelos portugueses, mas to mado aos mou ros. Assim, concentrou-se em Goa bom nú m ero de profissionais portuguêses atraindo, também, como era na tural, os seus fam iliares p ara o O rie n te ('"). Entretanto, a essa altura, não se extinguira a discussão sôbre a conveniência ou não da fabricação naval no Brasil. Entre as opiniões desfavoráveis, está a exarada pelo pe. Fernão Cardim, em 1618, quando afirma que seria melhor construir galeões "ou no Pôrto ou em Biscaia ou na Alemanha. O galeão que lá custa, v. g. vinte mil cruzados custará cá (no Brasil) sôbre qu are nta m il e dá van tagem ” (n ). Cumpre ressaltar que, como o assunto era da órbita gover namental, e a estrutura econômico-social do Brasil não oferecia oportunidade a que problemas como êsse tivessem receptivi dade ampla, a polêmica ficou como sempre mais circunscrita a uma cúpula administrativo-social sem a fôrça de opinião que poderia nascer, caso fôsse possível, de um a reivin dicação popular e nativista. A polêmica ainda continuaria durante êsse período de domínio da Casa d’Áustria que não permaneceu indiferente ao problema, como se pode verificar através de um documento anonimo, em espanhol, que parece ter sido redigido entre 1607 Í9) Irancisco Mendes da Luz, O Consellto da índia, pág. 572. (10) Alberto I r i a , Da na veg ação p o rtu g u esa ..., págs. 49-50, 69-70. pág. 10 j A pn d Serafim Lrrrr, H is tó ria da C om panhia de Je su s no Brasil, vol. 4.",
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e 1633, datas da balizagem dos demais documentos em que se insere (12). Trata-se de informações prestadas por missivista, possivel mente o governador-geral do Estado do Brasil, atendendo a uma solicitação de el-rei dirigida à Junta do Padre Confessor. Coincide essa consulta com o surto de construções navais portuguêsas da primeira metade do século x v i i (1620-1630), década na qual se construíam navios numa extensa rêde de arsenais, como os de Viana, Vila do Conde e Azurara, Pôrto, Aveiro, Peniche, Lisboa, Setúbal, Lins e Algarve, além dos estaleiros do império ultramarino: Terceira, Santiago, São Tomé, Per nambuco, Rio, Bahia, Luanda, Goa, Cochim, Damão Moçam bique, O rm uz e M ala ca, sendo que êstes q u atro últim os ser viam mais para a construção de navios ligeiros. A resposta, esclarece-nos o missivista, era dada tendo em vista a possibilidade de fabricação, no Brasil, de “Nauios para las Armadas j navegasion de la Jndia”, indicação que parece referir-se ao O rien te. Mas aind a qu e se tratasse das índias Ocidentais, o porte das embarcações de cuja fabricação então se cogitava permitia a navegação oceânica, que é o que nos interessa a esta altura. N o tocante à C arreira da ín d ia, pro priam en te d ita, sabe mos que especificamente para ela, o estaleiro do Salvador cons truiu várias embarcações, de que se darão notícias mais por m enorizadas em o u tro local dêste estud o (ls). (12) Papel que remctio a La Junta dei padre Confesor sobre la fabrica dc los nauios dei brasil, in L iv ro pri m eir o do gov êr no do Bra sil, pág. 44 e segs. (13) Exemplo típico é o da nau No ssa Se nh ora da Ca rid ade, São Francisco de Pa ula e Sa nt o A ntô nio , cu ja construção na Bah ia demorou de 1755 a 1757. Graças à farta documentação que recentemente foi encontrada sôbre êsse navio da Carreira da índia, tornou-se possível conhecer sua história (cf. José Roberto do Amaral L a p a , "Memória sôbre a nau Nossa Senhora da Caridade”, in revista Estudos Histó rico s, n.° 2 (julho-d ezembro, 1963). Outro não deve ter sido o caso da nau Nossa Se nh or a do M onte do Ca rm o, cuja construção ali mesmo foi iniciada cm 1758, em seguida ao lançamento ao mar da nau Caridade, a fim de que se apro veitasse o materia l qu e sobro u desta. Lançada ao m ar em 2 de fevereiro de 1760, a nau M onte do Carmo exigiu para sua construção a despesa total de 9L049J875 réis, enquanto os gastos com o pessoal (jornais) ascenderam a 21:364$670 réis (sôbre a nau N . S. do M onte do C arm o: Ms. 3.734 a 3.737; 3.844 a 3.846; 4.005 a 4.007; 4.104 a 4.111; 4.551 a 4.556; 4.726 a 4.727 e 4.921 a 4.924, 4.982 a 4.984, Bahia, P.a.c., AH U). Dos 30 navios para travessia oceânica que a rrolamos cons truídos nos estaleiros baianos, no período compreendido entre 1666 a 1823, pelo menos de quatorze déles tivemos prova documental de que serviram np roteiro do Oriente. Q uan to aos dem ais ainda qu e não tivessem navegado para a índia, com tôda a certeza serviram à Carreira, quer recebendo em transferência, cargas das naus da índia, quer comboiando naus do Oriente, quer prestando em diferentes oportun idade s colaboração àqueles navios. O utra em barcação, cuja história at certo ponto foi possível reconstituir é o galeão No ssa Se nh or a do Pôpu lo , conforme Luís Monteiro da C o s t a , Construções navais da Bahia no século XV • Centro de Estudos Bahianos, Publicação 17, Salvador, Bahia, 15/12/1952-
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V o l t e m o s , porém ,
ao texto espanhol. Após re ferir-se à exis• jj, madeira para todo gênero de embarcações e em tôdas aDitanias, alude à possibilidade de aproveitamento do ferro, * embira p ara enxárcia, cala fetação, etc., se bem q u e, para última finalidade aconselhe também entremeterem-se enárcias de cânhamo, e outros materiais, concluindo pela falta jg breu e tecido p ara as velas. P or sua vez, era de boa lembrança que se levasse cânhamo da Espanha, para ser semeado nas capitanias, principalmente na de São Paulo, onde se plantava e colhia qu an tid ad e de trigo e cevada. N ão se esauece ainda, o missivista, do breu, alvitrando a possibilidade de trazê-lo das Canárias, onde podia ser obtido tão barato, quanto na Espanha. Outro documento expressivo da mesma época é a “Me mória de como se pueden fabricar en el Brasil 68 galleones de mil toneladas cada uno”, datada de Madri, em 15 de abril de 1630 (“ ). Como o título anterior a que aludimos, êsse também mos tra o interêsse que o Brasil despertou no tempo dos Filipes no tocante à po ssibilidade d e fabricação nav al. E isto, justa mente num momento em que a Espanha lutava com a falta de boas m adeiras p ara a co nstru çã o na va l (15). O memorialista em questão afirmava que se podiam fa bricar nos porto s brasileiros 68 galeões de 1.000 toneladas cada um, ficando êles à razão de 400 reais por tonelada, sem contar artilharia, pólvora e apetrechos. Faze ndo o cálculo do escudo a 10 reais, dá o total de 2.720.000 escudos pelas 68.000 tone ladas, a 400 reais cada. As m oedas e valores c itados são os da época (1630). N o caso, o a u to r deve estar-se re fe rin d o a moedas espanholas: escudo e real. ^ O êxito da em prêsa, a seu ver, seria a ssegu rado pe la e x celência das madeiras brasileiras e pela matéria-prima que aqui podia ser obtida, o que levaria o estale iro a d epen der apenas, em matéria de importação, de ferro, alcatrão e anilhos, que podiam vir da E spanha, e em p a rtic u lar de Biscaia, onde, mda, a pessoa que se encarregasse da construção naval deveria, Pessoalmente, com pra r pregos, ânco ras, breu e alcatrã o. N a sáriop»)13 C ^ anc^res’ com pletar-se-ia o m ate rial a in d a necesn
a
(151
s
*s' 154-155 v*> H*b. Ainda.
0 interèa rte f -OI^ eS ^OL*s ' A rm adas da Ca rreira da ín d ia de 1560 a 1590, pág. verificaSe ^*no tam bém se dirigiu para o estaleiro de Goa, confonne se (16^ ju, rr?m Alber(o Iria, Da naveea çã o p o rtu e u ês a . . . , pág. 61. 1 ’ M ‘ 51-v-28, n,. 154-155 v., Bib. Ajuda. *
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Providenciar-se-ia então, o envio ao Brasil de profissionais destinados a ensinar os moradores a tecer e confeccionar en xárcias, lonas, etc., visto que o linho e o cânhamo davam muito bem aqui. Quanto à jtessoa a ser encarregada de tão importante incumbência, isto é, da compra de material na Europa e di reção do estaleiro no Brasil, às expensas da real Fazenda, re conhece o memorialista que ela deveria ser “confidente, zelosa e rica em experiência”, para que mediante honras e mercês aceitasse a cmprêsa (1T). Permitir-se-ia, também, a ela a escala na Tlha da Madeira para com pra de vin ho. Como em 1629, muitos criminosos portuguêses haviam feito uma súplica a el-rei pedindo “perdão geral”, por êsse motivo o autor do documento em aprêço, lembrava que os gastos com a construção naval no Brasil podiam ser atendidos, pelo m enos em parte, através de contribu ição pecu niá ria dos criminosos que desejassem, dessa maneira, obter o perdão dos seus crimes, observando-se, no caso, a natureza do delito come tido. Êsse pag am en to seria arrecadado em Portuga l. Além disso, recorrer-se-ia a outras formas de arrecadação: como, por exemplo, aquelas que condicionavam a concessão de graças, mercês de fidalg uias, há bito s e orde ns m ilitare s (1S). Tais concessões podiam ser estendidas, também, aos mo radores do Brasil. Aliás, dad a a urgência qu e se req ue ria para a instalação dessa emprêsa, dever-se-ia lançar mão dos recursos que estivessem mais a propósito. Destaca ainda várias outras vantagens resultantes dessa fá bric a de navio s n o Brasil. Em o u tro texto caste lhano, tam bém anônimo, datado de Madri, em 30 de setembro de 1629, afir mava o autor, ao descrever a Bahia, que sem prejuízo dos engenhos podia-se fabricar ali anualmente “una nao de la índia, o quatro galeones de 800 toneladas cada uno”, o que mais nos convence do conhecimento que tinham as autoridades castelhanas das possibilidades que nesse sentido oferecia o es taleiro baiano. (19). Os cronistas do período colonial também não deixam de reconhecer as perspectivas que o Brasil apresentava à constru ção naval. Fre i Vicen te do Salvador afirm a que , graças às (17) Ms. 51-V-28, fls. 154-155 v., Bib. Ajuda. (18) Ms. 51-V-28, fls. 154-155 v., Bib. Ajuda (19) Cód. 3.015, BN Madri.
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agrestes da terra se podiam construir fortíssimos ga leões, além do aproveitamento das cascas de algumas destinadas à calafetagem e confecção de cordas para enxárcias e amarras. Vê-se que, embora substituindo o trabalho de reparos, êste indispensável e indiscutível, o de construção dos navios tam bém foi objeto de im ediato aceitam ento . Se teve lugar essa porfia no tocante ao desenvolvimento entre nós da construção naval não se deu o mesmo, ou pelo menos a argumentação contrária foi menos intensa, ao optar-se pela B ahia nesse sentido. S. Vicente, convidada a atender à ordem régia de 1(551 para a construção anual de um galeão, embora tivesse precá rio serviço de consêrto de naus e contasse também com boas madeiras e oficiais habilitados, não chegou em momento al gum a competir com Salvador. O arsenal vicentino, para o qual o conde de Castelmelhor acenara com a possibilidade dc auxílio em numerário por parte da capitania do Rio, não logrou interessar vivamente seus moradores na emprêsa. Com relação ao estaleiro do Rio, houve acalorada polê mica a propósito da construção de naus na Ilha Grande por fazer-se alusão às vantagens maiores que Salvador ofereceria a respeito (20). Essa, entretanto, não era a opinião do anônimo autor do Bre ve m a n if e s to ... redigido no século xvii, que defendia a fabricação de navios no Rio, por considerar que ali se ofe reciam me lhores pe rspec tivas à qu ela a ltu ra (21). Sôbre as maiores possibilidades que a Bahia apresentava para essa emprêsa, em relação aos demais portos destaca-se entre os inúmeros depoimentos o do governador Antônio Luís Gonçalves da Câmara Coutinho, prestado em 10 de julho de 1692 (22). Não era apenas em virtu d e dos recursos locais q u e o es taleiro baiano progrediu, principalmente depois das disposi ções regimentais trazidas po r T om é de Sousa. O fato de ser Salvador capital da Colônia, a importância de defesa e con servação do domínio americano ultramarino, sua situação de árvores
A viu ir), fl. 101-101 v.; Papei s vários, t. 34, Casa de Catlaval. rp o le m ic a a que aludimos eslá contida nos seguintes manuscritos do mesmo fl OQ1 Popáis vários, t. 34, Cód. 976 (K viu lr), fl. 100: cód. 976 (K vui lrV • *9-99 v.; cód. 976 (K vm br.), fl. 101-101 v., cód. 976 (K viu ir.), fls. 102-103. (|() |5^t) A. de Magalhães B a s t o , "Alguns documentos de interesse para a história in Br asília, vol. vn, pág. 184. (22) Ms. õl-ix-30, f. 17 v., Bib. Ajuda.
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entreposto comercial e a antevisão de tornar-se praça de guerra, destinada a importante papel na defesa do ultramar africano e asiático, contribuíram para reforçar a argumentação e tirar a hesitação da autoridade régia nessa escolha, concorrendo para que merecesse, também, o estímulo oficial. Como já vimos, a mando de Tomé de Sousa é que se con struiu a ribe ira das naus na capital baian a. Sua localização pare ce ter sido p erto da escola de m arinheiros e do mercado municipal, onde até o fim do século xix havia o Arsenal da Marinha. Devia ser já no século xvi u m com plexo de edifícios, ocupando largo espaço da ribeira, e comportando fundições, carpintaria, armazéns, casa de velas, oficinas de pintores, al faiates, etc. Assemelhar-se-ia a um a colm eia, pois o critério da administração era o de manter todos os profissionais que lhe estavam afetos trabalhando dentro das diferentes seções do seu recinto, para evitar roubos de material e permitir a con tínu a vigilânc ia do sup erin ten de nte dos serviços. A injusta demissão de Manuel Dias Maciel, mestre poleeiro do Arsenal da Bahia, que em conseqüência foi desalojado das acomodações que ocupava numa das tercenas do Arsenal juntamente com seus oficiais, deu margem pelos recursos e argumentos que o fato acarretou a que recolhêssemos diversas informações sôbre as instalações e o trab alh o no estaleiro oficial. Êsse mestre trabalhava com tôda uma equipe, na qual se incluíam oficiais, 16 escravos, além de aprendizes que êle próprio formou no co rrer dos 8 anos em qu e estêve serv indo n a rib eira. Graças aos serviços que essa oficina do poleeiro prestava ao arsenal, o seu desalojam ento foi m al recebido. P ara servir na ribeira, o mestre poleeiro recebia apenas o que fôsse ajustado pelos serviços qu e prestav a. Sua oficina era p ró p ria , mas o arsenal tinha grande interêsse em ali mantê-la, dada a carência que havia na cidade de profissionais de sua especialidade. Com essa concessão de usar o recinto do arsenal, gozava aquêle pro fissional de todos os privilégios dos seus confrades de profissão, inclusive a tab u le ta de arm as (23). Beneficiava-se, ainda, o arsenal baiano, com outros esta bele cim ento s subsidiá rio s de reparos e mesm o construção na val, como Ilhéu s e M atoim (24), de on de v inh am implementos, havendo, também, intercâmbio de mão-de-obra e matéria-pr*' (23) Ms. 11.300-11.301. Bahia, P.a.c., AHU. (24) Sôbre Matojm V. Wanderlei P i n h o , H is tó ri a
de um eng en ho do r e c ô n c a v o •
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T calidades como Boipeba, Cairu, Camarnu e outras, onde 103 be°que pelo menos desde o século x v i i se fabricavam emse sa -J! acrescentavam -se tam bém como com plem en tares ao Valeiro da cap ital (25). No século xviri os esta leiro s da pSla iça e da R ibeira de Itap ajip e construíram não poucas ações, muito embora fôssem preteridos em favor do el lejro da ribeira das naus, um a vez q u e o estabelecime nto da Preguiça tinha falta de fundo e o de Itapajipe ficava dis tante uma légua, encarecendo o custo da administração das obras devido às despesas com a locomoção dos profissionais ue não residissem naquele local, apesar do que era tido como excelente (2
, ' ' :' KaIha''s
(26) a o »
(»as ..
Ba s t o ,
“Alguns documentos de interêsse para a história
vo1- v,,> págs 183 c
' ' Bahla- f - i t-, AHU. *• S.122-9.124, Bahia. P.a.c., AHU
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Emprêsa complexa e de grande amplitude, exigindo ins. talações numerosas e recursos de diferente ordem, não deve ter o estaleiro demorado em estimular outras manifestações manufatureiras ancilares, domésticas até, distribuídas na pró. p ria cid ad e d o S alvador, em seus arre do res e em aldeias in. dígenas. Talvez só existissem em função dos estaleiros, como queria um missivista ao afirmar a 18 de outubro de 1781: “Nã0 há aqui manufatura alguma a não se querer contar como tal a construção de 3 e 4 navios, que regularmente todos os anos a q u i f a z e m . ( 28). É a partir da segunda metade do século xvii e durante o século xvtn que teremos notícias mais confirmadoras da im p o rtâ n c ia da fab ricação q u e ali se estabeleceu p o r interesse da ad m inistraç ão . Êsse interêsse estêve long e de limitar-se à ordem régia de 1651, na qual el-rei mandou que se fabricasse cada ano um galeão de 800 toneladas no pôrto mais conve niente do Estado do Brasil. Seguiram-se posteriormente outras ordens metropolitanas, como a carta de 1774 dirigida pelo marquês de Pombal ao governad or, prin cip alm en te com a fina lida de de disciplinar a construção de navios da parte dos particulares, ordenando fa zerem-se no estaleiro baiano navios de alto bordo, sòmente sob o risco do mestre Torcato José Clavim que era construtor do A rsen al R e al (29). Escrevendo no final do século xvin, afirma Vilhena que o arsenal existente na Bahia era o “mais regular que a Amé rica Portuguêsa conserva para ocorrer às precisões da Marinha não só Real, como Mercantil, tanto Nacional, como estran geira, qu e n este P ô rto e n tra necessitada de socorro” (30). N esse século foi re la tiv a m e n te g ra n d e o n ú m e ro de navios ali co nstruído s. A té o u tu b ro de 1775, ha via m sido lançados ao mar nesse ano, 3 navios, achando-se ainda sôbre os picadeiros, n a d a m enos de 6 q u ilh a s além de o u tra s tantas ideadas, sendo de se ressaltar que boa parte dessas construço® i era de iniciativa dos comerciantes da cidade da Bahia, a cujos recursos ficou el-rei de ve nd o g ran de es tím u lo à sua marinh* I m erca nte (31). Preo cupa ram -se m esmo as au torid ad es em evitar (28) C arta de José da Silva Lisboa ao Dire tor do Real J ard im Botânico d Lisbôa, in A n ais B N R io , vol. 32, pág. 494. (29) M s. 9.031, Bahia, P.a.c., AHU. (30) Cartas de Vilhena, vol. n, pág. 499. (31) M s. 8.951-8.953, Bahia, P.a.c., AHU.
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de continuidade na fabricação das embarcações, pois *oluÇ°^*iam prejuízos consideráveis, pela dispersão da mão estas tra^ nível, de teriora çã o de m ateriais e im plem entos, maneira, lançado ao mar um navio, procurava-se etc- , r imed iatame nte a con strução de ou tro (*'-). ^ „ • inicia1 X r- • A Assim os depoimentos nao se reterem apenas a efitiencia s e r v i ç o s de reparos pois as naus fabricadas na Bahia, chem a causar admiração na Europa e na Ásia segundo Rocha P h a (33) Além do que , resta lem bra r a exp ortaç ão pa ra o Reino, pelo estaleiro do Salvador, de [reças como “talhões”, "curvas", “cavernas”, “enchimentos”, “braços”, “aposturas”, “pés-de-carneiros”, “c ap elo de ro d a ”, “ cad aste s”, etc. (34), tpie nos mostram um outro tipo de atividade daquele estabeleci mento colonial, ou seja o beneficiamento inicial da madeira e a confecção de peças para os navios, com a finalidade de exportação. Assim, não se praticava apenas o simples envio da madeira para o Reino, como se subsidiava sua construção naval através do a p ar elh am en to dessa m esma m ad eira (:,s). Por sua vez, a autoridade governamental procurava de senvolver as instalações do arsenal baiano tanto no tocante aos serviços de reparos, quanto à construção naval propria mente dita. Durante o govêrno de D. Pedro Antônio de Noronha, marquês de Angeja (1714 a 1718) foram construídos 3 galões na Bahia os ma iores ali fab ric ad os at é en tã o (3
D
<2
e
s s a
256 7■Ba hia, P.a.c., AH U. ^'oc*la B it* , H istó ria da A m éric a P o rt u g u esa , pág. 9S. ■ain sôbre a ^ n ^ h ^evem ^ tábua s; ‘ cave rna” é cada um a das peças qu e assennjs pontas das í* form and o o arcabo uço do navio; "b raço ” são os cabos fixados t 8.3s' T am bé m significam as madeiras sôbre as qu ais assenta 0 cavername d cieiratnento a u° ?* V10; ap os tura s” ou "p os tur as” são as peças das balizas e m a gnificados. Ent ma ° b“ 131*0 <1° navio acima da cinta; "c ape lo” tem virios nto, nada encontramos nos dicionários para "capelo de roda” , <\k \ 523 3 532, Bahia, P.a.c., AHU. g arlas de Pilhena, vol. ii, pág. 420. M t~
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N a gestão de D. Francisco de Sousa foram lançados os alicerces do arsenal da M arinh a e do nôvo estaleiro. En qua nto se promoviam novas construções de embarcações, atendiam-se também os “infinitos comboios”, provenientes da costa meri dional do Brasil e da índia Oriental, como ficou registrado em abono do governo de D. Fernando José de Portugal, ini ciad o em 1788 (3T). O empenho da autoridade, no século xvni, pela constru ção naval na Bahia, que estamos agora apontando, nascia em parte das possibilidades com ercia is que a C arreira da índia oferecia, principalmente através da colocação do tabaco baiano em m ercados africanos e asiáticos. A pro du ção de tabaco vai ocupar em boa parte do século xvm o segundo lugar em nossa balança de exportação perdendo apenas para o açúcar. Com pletando êsse inte rêsse estava a necessidade de policiam ento do litoral, de estímulo ao tráfico africano, e de outras promo ções estreita e diretamente dependentes da marinha, que tinha Salvador como escala obrigatória nos seus roteiros. Registramos êstes casos de diligência da autoridade pela construção naval, para mostrar que fatores supervenientes con tribuíram para que, não obstante êsses estímulos, sob pressões, de diferente ordem, a emprêsa não progredisse a contento no Brasil-Colônia. Nos diferentes m om entos em que a autoridade, voltando sua atenção para essa emprêsa chegou a tomar providências a seu respeito, achamos em contrapartida, implicando a que bra do seu desenvolvim ento, a crônic a p en ú ria do erário régio e a má organização administrativa que, com sua falta de pre visão, não conseguia impedir, inclusive, seu abandono por parte dos m elhores profissionais atraídos p o r m ais altos salarios e possibilidades maiores junto aos engenhos de açúcar, bem como ain da o encarecim ento da sua m atéria -prim a essen cial, a madeira, pelo contínuo desflorestamento. Perdia-se, assim, excelente oportunidade de desenvolver-se um estabelecimento que oferecia excepcionais condições para progredir, carreando resulta dos com pensadores para Portugal, cujo poderio residia no mar. Subsistiria, entretanto, o estaleiro baiano, p re c e d id o das modestas oficinas do tempo de Caramuru, graças ao intenso ^ tráfico interno e externo, ao sistema intervencionista onc* (37) Ib id e m , pág. 441.
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oloração das madeiras qualificadas, à concentração re-
de .e mão-de-obra especializada, recru tada no R eino ou *atlV3da no B rasil, à m ov im en taçã o de recursos oficiais e A r t i c u l a r e s , à colaboração indígena, no tocante à matériaVemos assim, que , q ua nd o reclamam os um alcance maior a construção naval na Colônia, queremos nos referir a Pa Darque ind us trial qu e pudesse presc indir da dep end ência esTrangeira, assistindo Portugal na sua larga emprêsa ultra marina e trazendo ao Brasil resultados promissores e até re volucionários para a sua comprometida economia do período colonial. Não estamos, portanto, invalidando o esforço que foi feito nesse sentido, pois chegamos a acreditar que o estaleiro baiano se tornou o mais im p o rtan te arsenal ultram arin o , afe tando, com tôda a certeza os demais estaleiros, pela concorrên cia nas requisições de materiais e de pessoal, graças, até certo ponto, à atenção que o govêrno lhe destinou p o r im posição de suas necessidades m arítim as. Mesmo po rqu e o pró p rio C on selho Ultramarino aceitaria em 1714, a construção naval no Brasil, como mais conveniente do que a promovida nos pró prios estaleiros do R ein o (38). Não houve, assim, um total descaso da au to rid ad e pelo problema, com o q u er um histo riad or dos nossos d ia s(39). A n tes, como vimos, ela se mostrou continuamente interessada em uma boa solução, não conseguindo os resultados almejados pelos memorialistas e dem ais entu sia stas da construção naval, por dificuld ades da p ró p ria estru tu ra polític o-econôm ic a do estatuto administrativo colonial. Quanto à prioridade do estaleiro baiano, merece também ser ressaltada. Antes do govêrno-geral, como dissemos, já havia em dife rentes pontos da costa a possibilidade de serviços muito rudi mentares de reparos dos navios da Carreira, bem como de paros e até construção de em barcações p ara a navegação cosn *r^,e In tern a- Dêles se têm notícias, pelo me nos na B ahia, a Guanabara e São Vicente. que díztretant0 ’ ^°mo estaleiro p rop riam en te d ito, ta n to no •nclusi resPeito ^s. tarefas de reparo s e con struçã o de navios, . e a lravessia oceânica, p ar ticu lar m en te o serviço da (*>) T f . d A imeida TO! XCVIn’ píg' 2I8Pra do , Per nam buco
'°1- nr, p^g
e as cap itan ia s do N o rte do Bra sil,
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Carreira da Índia, reclamamos para Salvador, a merecida pri mazia. O Arsenal da M arinha do R io de Jane iro é bem pos terior ao estaleiro baiano. Sua prim eira construção de navio de alto-b ord o da ta de 1764. É aliás, a pri m eir a e ún ica ali ocorrida no período colonial, segundo nos revela um seu es tudioso, ao passo que na Bahia construções dêsse porte faziamse já em épocas bastante anteriores, como se pode verificai ao longo dêste tra b al h o (40). Dirigiu, inicialmente, êsse estaleiro, o carpinteiro Fran cisco Nicolas, co ad juv ad o po r ou tros profissionais. As insta lações primitivas que datam com suas maiores benfeitorias, do temp o de T om é de Sousa, não perm aneceram as mesmas. So freram , no co rre r dos anos, várias reform as (séculos xvi, xvii e x v i i i ), de que nos ficaram notícias vagas, geralmente em tôrno das providências tomadas pela autoridade-mor da Colônia. Assim, sabemos que, no govêrno de D. Fernando José de Por tugal (1788-1801), p o r exem plo, foi refo rm ad o o Arsenal da M arinh a, de confo rm idad e com o de Lisboa. Aliás, cumpre lembrar que, pelo alvará de 12 cie agôsto de 1797, a rainha D. Maria i dava ao arsenal do Rio de Janeiro e aos das de mais capitanias a mesma regulamentação do arsenal da Bahia, reorganizado êste segundo um alvará de 3 de março de 1770 e a Carta Régia de 11 de março de 1770, que deram sua dire ção a um oficial do Real Corpo da Marinha, com as funções de Inten de nte. V oltando , porém, aos obstáculos que se opu nham ao desenvolvimento satisfatório da construção naval no Brasil, ainda que se reconheça ter sido na época, uma das que deveriam merecer maior aprêço do govêrno, restaria con siderar o principal, isto é, a carência de recursos com que podia contar a Fazenda colonial. Fazia-se sentir essa carência tanto no tocante à reparaçao das embarcações da Carreira, quanto na construção de novos navios. O serviço de reparos devia ter caráter permanente e eia do mais alto interêsse. Já vimos os prejuízos qu e sua demora acarreta va, p ôsto q ue e ram inad iáveis. Os recursos de qll£ necessitava, diziam respeito tanto ao material empregado quan to à numerosa mão-de-obra indispensável ao querenar, devi ao pêso do casco. Os documentos que mais de perto nos dão idéia do co ple xo de tarefas exigidas nos reparos, bem como do v o l u (40) Juvenal G r e e n h a l g h ,
pág. 27.
_ h i s t á m
O arsenal de marinha do Rio de Janeiro na
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variedade de implementos necessários à mesma finalidade
C- as ' Relações” ou “ Atestações” dêsses consertos. Êsses !f° mentos eram fornecidos pelo mestre carpinteiro e pelo rre calafate, sob juramento dos Santos Evangelhos, uma mCS ter m ina do s os reparo s. U m a dessas "A testações”, da tad a de setembro de 1751, esclarece-nos qu e o serviço de reos realizados na nau N ossa Senhora das N ecessid ades imP.-cou e n t r e outras coisas, a querena do navio que estava a fazer água. Em seguida, foram desforradas a proa e a pôpa, be m como tôdas as “cin tas do grosso”. N o costado foram colo cadas tábuas novas. Estôpa e pregadu ras novas foram também colocadas em todos os lugares q ue necessitavam delas. Das cintas do grosso para cima foram calafetados os altos com estôpa nova (41). As co bertas e am ura da s foram calafetadas por d e n tro e po r fora. Fizeram-se du as bom bas novas. Os agasalhados e paióis foram refeitos, pois essa nau que viera da índia como navio mercante, estava agora na Bahia sendo "armada em guerra”, e aquelas dependências precisavam ficar nos lugares onde habitualmente as traziam as naus de guerra, para poder fun cion ar a artilh ari a das cobertas. Refi zeram-se também as carretas de tôda a artilharia da coberta de baixo, assim como o paiol da pólvora a ré e junto ao dos mantimentos e despensas, além dos reparos do depósito desti nado ao pan o e sobressalentes do m estre na na u. Fabricou-se nôvo leme, pois o velho estava comido pelo guzano. T u d o quanto carecia de consêrto e tudo o que precisava ser refeito foi executado conforme declaração dos mestres referidos, que esclarecem ainda ter sido pintada a nau, não só por estarem as tintas antigas desbotadas, como também para conservar a madeira. Sempre de acô rdo com o qu e se costuma va fazer para as naus de g uerra (<2). Essa enumeração e a que se segue, servem entre outras j ra, uma m édia do volu m e de serviços, m aterial e mãora especializada ou não, de que necessitavam as naus a*i arribadas. Paula ^naU ^ ossa Senh ora da Ca ridade e São Francisco de tendo h° ° U t r o exemplo que trazemos aqui. Vinha da índia, 1751 r a Salvad or a fazer águ a em 27 de ju n h o de Pmteiro 'e* ° T?ne “Rellação” ou "Attestação” dada pelo carP^o calafate que a serviram em completa reforma, Ubu« de basta ntt° ^ rosso • d o "cin tad o g rosso", isto t , umas tris carreiras de (42) Afi s d rSPcssura junto da flutuação à altura da primeira coberta. • B,h|a. P.a.c, AHU.
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foram inúmeros os reparos que sofreu, dos quais passamos a dar ligeira notícia, que permitirá completar a idéia de com ple xidade dos trabalhos do arsenal baiano com as arribadas das naus da índia. Virada de crena, com tôda a brevidade, foi refeito todo o pampeiro da proa com tabuados, pois os que tinha estavam podres (43). T am b ém as am uradas do castelo reconstruídas novamente, tendo sido postos nelas alcatrazes novos, verdugos em tôda a bo rd a de um a ba nd a e o u tra até os portalós (44). Pela banda de fora, a borda levou a maior parte de tabua dos novos a té a pô pa. A cob erta do convés sofreu os mesmos consertos, além de vãos novos de curvas como claves, tam bo rete do m astro no va m en te fabricad os, etc. (4r>). Foi ainda a nau tôda calafetada com estôpa nova, e re pregada com preg ad u ra ta m bém nova, além de dezenas de outros consertos, como novas fêmeas do leme, endireitamento do cadaste, reforma das ferragens, forrando-se de nôvo ainda tôda a nau(48). O em bon o foi todo preg ado com p reg ad ura s novas (47), en q ua n to era bo tado de crena o contracadaste nôvo (48). Averiguou-se que o leme velho estava completamente des truído pelo terrível gusano, verme temido pela ação que de senvolvia co ntra a m ade ira das embarcações. Foi aind a feito um nôvo mastaréu de gávea, pois o da nau estava quebrado(49). Recebeu a embarcação quatro novas bombas, tôdas chapeadas de ferro, além de um número bastante grande de pequenos consertos co nstantes da “A testação” j á referida (50). (43) “Crena” é variante de “querena”, que é a parte da navio que fica mer gulh ada na água. “Q ue ren ar” é virar de “qu eren a” (o navio) para limpeza ou consêrto. Não encontram os significado de “pam peiro ” . (44) “Castelo” é a parte mais elevada do convés do navio, enquanto que a pa lavra “am urada” in dica o pro lo ngam ento do costado do navio acima do pavi mento superior. Nâo encontramos “ alcatraz” nos dicionários e s p e c i a l i z a d o s ; “ver dugo” é o friso ou cinta saliente, ao longo da borda do navio; “portaló” é o lugar por onde se entra em um navio ou mesmo por onde se recebe ou se tira a sua carga. (45) “Coberta” é o pavimento do navio; “tamborete” é a peça de mad^lrj que serve para reforçar as “enoras”, que são aberturas por onde os mastros barcos vão assen tar na carlinga. (46) “Fêmea” é o círculo em que se engatam os machos de segurar o lc » “cadaste” é a rabada de um navio ou a peça da pôpa em que assentam as br adiças do leme. (47) “Embono” é o ato de embonar, que consiste em reforçar e x t e r i o r m e o casco do navio. Ta m bém “em bonad a” . ^ (48) “Contracadaste” é a peça que cobre o cadaste do navio. (49) “ M astaréu” é um pequeno mastro suplem entar; “gávea” é uma cSP ^ de tabuleiro ou plataforma, a certa altura de um mastro, sendo atravessada p°r (50) Ms. 2, Bahia, P.a.c., AHU.
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Quando a urgência do consêrto requeria, tanto pelo estado navio, quanto pelo tempo exigido para sua estadia, chegase a requisitar o pessoal da frota, cujos navios se viam v? • ados a fornec er u m a pessoa cada nav io m éd io e duas embarcação considerada grande, para trabalharem nos cada ros da nau assistida pe lo estaleiro. Escolhiam-se no caso os que fôssem práticos naqueles serviços, como se deu com a nau Nossa Senhora da P ie dade, que em setembro de 1725, se valeu do arse nal b a ia n o pa ra os seus co nsertos (31). No tocante às despesas, o id eal para a Coroa era que as Fazendas dos seus diversos Estados ultramarinos possuíssem suficiente nu m erá rio pa ra ate nd er aos gastos necessários. N ão obstante, essa auto-suficiência econômica praticamente nunca chegou a existir na Bahia e, com tôda a certeza, no resto da Colônia. Não perecia de todo o estale iro, devido aos inum eráveis recursos de que se valia a autoridade para direta e imediata mente atendê-los, onerando os colonos com contribuições até mesmo antecipadas. Nesse sentido, a docum entação que nos fic ou consiste em interminável petitório ao real erário. Como é fácil avaliar, a intervenção até mesmo violenta da autoridade na economia privada, para atender a serviços de interêsse público, fazia-se sentir, com maior freqüência, nas ocasiões das arribadas das naus da índia, quando invariavel mente se exigiam grandes sacrifícios da população de terra. Os expedientes utilizados pelas autoridades chegavam a tal ponto, na sua aflição, e êste é o têrmo, de bem atender as necessidades dos navios da Carreira, que as instruções co nhecidas são nu m ero sas e va ria da s (52). Nem sempre o seu critério era escrupulo so, pois até mes mo obriga a autoridade metropolitana a coibir abusos que se praticavam em nome das naus da índia. A crônica pobreza do erário vinha de um complexo de badS3S 3 mc>e^ a ’ 0 decréscim o das colh eitas, perturtra 3S estiaSem pr olo nga da, ou pelos agu ace iros a “invessaclo * ° S carn*n ^10s’ as pestes e a fun esta ação dos atra(52) Bah‘a’ P a n c - *•* série, Caixa 31, pasta de 28 /2/17 25, AHU . d o c u m e n t o s , Com clue s< devia atender o consêrto foi disciplinada em vários JJJnsertados, QUpUSI',e ° tempo que podiam ainda permanecer no pôrto uma vez *■ * horas, ^ í* * 2 Ordem Régia de 16 de feverçiro de 1719 foi fixado em
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Desviavam-se comumente para os arsenais verbas cuja especificação era tradicional ou mesmo prevista em disposições legais. N as ocasiões de m aior precisão, que eram as mais assí duas, poupava a autoridade apenas o dinheiro destinado ao pagam ento religioso e secular, como aquêle cpie tocava à conservação da in fa n taria e da p raça do Salvador. N o mais, quase nada era respeitado, nem mesmo as tenças clas viúvas pobres e dos entrevados que viviam da caridade do Estado, pois essas verbas de stinad as às "obras p ias”, tanto do R ein o qu an to I sua aplicação, para que, no caso de se verificarem sobras, (53) Doc. H is t. , vol. xix da série, pág. 145. (54) Ib id e m , vol. vu da série, pág. 303. (55) Ib id e m , pág. 324.
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em "feitos", para atender às vultosas despesas c0" Veors navios da C arreir a (88). \ execução dos contratadores em atraso com a Fazenda i foi também, prov idên cia qu e se tomo u, para a tend er ^despesas dos estaleiros no tocante ao reparo dos navios do ^ riCTam bém o cham ado “d inhe iro da imposição”, im pôsto ccial que devia recair sôbre cargas de determinadas frotas, heeoú a sei desviado p ar a a m esma fina lida de (57). * O rendimento de certas atividades econômicas da Colônia, como a exploração da pesca da baleia, em diferentes momen tos foi destinado ao pagamento dos serviços prestados pelo arsenal do Salvador, pa ra as nau s da í n d ia. Aliás, n o q ue se refere à pesca da baleia, quando esta não alcançava os índices esperados, prejudicava o consêrto dos navios, devido à carência de pipas de azeite de peixe, necessário à querena(58). A urgência com que comumente deviam ser feitos os con sertos, pelos motivos já expostos, contribuía para que os ex pedientes da autoridad e fôssem os m ais variados, de acôrdo com as circunstâncias e possibilidades, obrigando el-rei a enérgicas providências para rep rim ir os abusos, principalm ente em de trimento da população e do real erário. O ideal era que as próprias naus da índia atendessem às despesas com o seu con sêrto. M as como ne m sem pre elas conduziam dinheiro suficiente ou tinham essa possibilidade, costumava-se, atendendo a um Regimento real datado de 1654, perm itir que fôsse tom ado a risco sôbre os fretes o recurso necessário ao ap resto (89). No tocante às fazendas q u e conduzia m os navio s d a C a r teira, sabe-se que por volta de 1665, os Regimentos passaram a proibir que se valessem delas, quer estivessem "sãs ou cor ruptas , para efeito d e a ten çã o às despesas com o ars en al (60). ssas ordens proibitivas foram reiteradas pelo menos em 1669, e Provavelmente outras vêzes(«). er dinheiro resu ltante de cunhagem de m oeda, també m p,(f0Coniumente usado. C om o gale ão Noss a S en h o ra do Póem iulh n^veta N ° ssa Sen h o ra de N azaré, arribadas na Bahia 0 1665, o go ve rna do r viu-se ob rigad o a p erm itir
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(57) C a n '”!; P ig ' 397' (58) Doc h , ', D de Meneses, in A nais (59> « i d e » ' , Vo1- VI da pág. 62. J6») Ibidem vn ’ XX" ’ p4g' 194' (6I>' 8< W 'ol. v° ' vn, V"- pág. Pág- 397 223.
B N R io ,
vol. 57, pág. 46.
72 —A Bahia e a carreira da tndia que o provedor-mor da Fazenda lançasse mão do dinheiro do cu nh o qu e fôra da ca p itan ia de São V icente (3.000 cruzados), p ara aten d er às despesas do consêrto. Achava-se a Fazenda totalmente impossibilitada de aten der àquele gasto. O dinheiro oriundo de São Vicente deveria ser tomado como empréstimo, passando-se dêle os recibos competentes, a fim de que os oficiais da Casa da índia prestassem contas aos Ministros do Tribunal que fôsse o recebedor do dinheiro re su ltante do cu nh o do Estado do Brasil (62). Alvoraçava-se a autoridade em atender os navios pois a marujada ali acomodada e a descarga de fazendas destinadas à Capitania da Junta não estavam a permitir delongas e por outro lado, as embarcações estavam impossibilitadas de seguir viagem para o Reino ao menos naquela monção. Tais providências foram tomadas sòmente depois da minuciosa vistoria das naus, sendo que à N ossa Senhora do P ó pu lo , foi também permitida a descarga de todo o fato e fazendas, n atu ralm en te pa ra facilitar o re pa ro (63). Parece aliás que o dinheiro da capitania de São Vicente não serviu de solução, ou pelo menos não foi suficiente, pois o governador confessou ter-se “conformado” com a proposta dos ministros da Mesa da Fazenda para que se alvitrasse a obediência ao disposto em um regimento que servira em casos semelhantes ocorridos em 1654, naquele pôrto, e cujo texto infelizm ente desconhecemo s. Sabemos apena s qu e todo o as sentamento com o consêrto da nau, como o tempo gasto, tra balh os feitos, q u an tid ad e de d in heiro to m ado e gasto, foi feito em dois livros, um dos quais seguiu no galeão e o outro ficou na Casa dos Contos, de acôrdo com tôda s as formalidad es (M)Diga-se de passagem que essa nau Nossa Senhora do Po p u lo foi o b jeto de nã o po ucos co ntrate m po s. Seu sota-pil01® João Domingues fôra à capitania de Pôrto Seguro com 350J 0W réis e lá desaparecera, deixando desesperado o fiador que era o mestre da mesma n au M an ue l d a Silva (66). Antes da partida de tão acidentada nau foi n e c e s s á r i o dar-lhe um cirurgião e um pilôto, pôsto que o seu, em véspera de embarque, seguira para a capitania de Pernambuco. Tara bém foi preciso fornecer-lh e 8 q u in tais de pólvora dos arm a* (62) Ib id em , vol. vil, pág. 223. (63) Ib id e m , vol. vil, pág. 226. (64) Ibid em , vol. vn, pág. 233. (65) Ib id em , v o l . v i i , p á g . 245.
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idade, pa ra a inf an tar ia do galeão (100 soldad os), pois aue trouxera estava imprestável. 3 Vê-se que a pe rm an ên cia dêsses navios o ne ro u ba stan te ivador. Com ta ntas , tão variadas e avu ltada s despesas foi ecessário fazer um caderno para anotações de tudo, inclusive da praça dos soldados que voluntàriamente quiseram servir em sua companhia. A carência de recursos das naus do Oriente não afeta aoenas a necessidade de se atenderem às despesas do estaleiro, nois como é óbvio, enquanto o navio estivesse em reparos, a marinhagem também precisava ser sustentada, e nesse par ticular procedia a Fazenda conforme o estilo, pagando meio tostão por dia a cada marinheiro. Somando-se os gastos feitos durante a estadia de uma nau com o sustento da tripulação, a paga da mão-de-obra local, a internação dos enfermos, a vigilância dos guardas para evi tar o comércio clandestino, a locação de barcos para colabo rarem nos trabalhos da estiva, as férias da tripulação e o fornecimento de uma série enorme de miudezas não só para os trabalhos que então se processavam a bordo, como para a normalização necessária à vida interna do navio, que lhe permitisse o prosseguim ento da viage m, re sultarã o q uantias bem altas. Num ofício datado de 12 de agôsto de 1757, assin ado pelo vice-rei, encontramos uma relação expressiva de despesas feitas com os reparos e “costeamentos” das naus da índia, atendidas pela Provedoria-m or do Estado do Brasil: 1. 2-
nau Nos sa Senhora d o M o n te A le gre (1753) ............... nau No ssa Senhora da s B rota s ( j u l h o d e 1755) ........... nau Aowa Senhora da Caridade e São Francisco d e Pau la (queimada na B a h i a e m 1756) ................. nau N °ssa Senhora da Concei çã o (1755) ......................... nau São Franc isc o X a v ie r e T o d o o B e m ( q u e i m a d a na Bahia em 1757) ................................. .. ............... nau Santo A ntó nio e Justiça (setembro de 1757) . . . T
o t a l
(«O)
1051680 réis 221$560 réis 19.1200 réis 204.5120 réis 6245334 réis 14:4865364 réis 21:1 715 25 8 réis
(66) Njo as queima *1'"T *5 .aPurar 0 motivo da grande diferença entre os p excecãn í* 5 entre parênteses sâo das partidas dos navios c 2.508, Bahia °p ^ Ueles ^ue *ora m q ueim ados p or imp restáve is (cf.
2.504ln°’
14: —A Bahia e a carreira da Índia Com a nau N ossa Senhora das N ecessid ades, que chegou a Salvador em 23 de abril de 1754, precisando de provisões e reparos, foram gastos 14:541$448 réis, conforme relação de despesas que compreendem a maior parte das requisições que an terio rm en te a po ntam os (67). Em sete m bro de 1759, conforme a letra que sempre se passava a respeito, a provcdoria-mor do Estado gastaria a importância de 10:777.|S52 réis com o apresto da nau São José (8S). Em matéria de desvio de verbas, um dos expedientes mais comuns e que nos parece ter correspondido pelo menos em p arte e d u ra n te algum tem po à p erm an en te falta de recursos para se atenderem aos gastos dos navio s da C arreira no esta leiro baiano, foi o de lançar mão das contribuições destinadas ao Donativo da Inglaterra e Paz de Holanda. Como se sabe, Portugal, visando a reforçar seu sistema de defesa, aproximou-se da Inglaterra, através do discutido tra tado de 23 de junho de 1661, mediante o casamento da infanta D. C ata rina , filh a d a rainh a-re ge nte D. L uísa, com Carlos H, rei da Inglaterra, Escócia e Irlanda. N ão o bstante a oposição de Castela, o consórcio foi cele brado. Portugal assum iu outrossim , o com prom isso de ressar cir a Cia. Ocidental de Holanda das despesas com a guerra no Brasil, no total de 5 milhões de cruzados, pagáveis em 16 anos (1661), além do d ote da rain h a da G rã-B retanh a corres p ond ente a 2 m ilhões de cruzados, pagáveis em dois anos. Para tão grandes despesas era mister concorrerem não só o R eino, com o tam bé m as con quistas. Assim, a 4 de fevereiro de 1662, recebia o governador-gei al a com un icaç ão de que ao (67) A relação de despesas com a nau Xo ssa Senhora da s Xecessidades, verlida para linguagem atu al, foi a seguinte: Importaram os mantimentos, dietas, curativos dos doentes que se curaram im hospital, reforma da botica, sal para a salmoura da carne, lenhas e outras miudezas em um conto seiscentos mil e seiscentos e setenta réis — 1:600$670. Importou ou se dispendeu com os práticos, guardas, expediente do recebimento do oues(}), barcos para o desembarque e e m b a r q u e da infantaria, mantimentosconsérto das vasilhas da aguada, fogões, palhas, pindobas, estôpas para o calafe féria dos oficiais de calafate, carpinteiro, tanoeiro, ferreiro, funileiro, caldeirei vidraceiro, polieiro e outras miudezas mais, em um conto, quatrocentos e sesse e quatro mil, setecentos e sessenta réis — 1:464$760. Importaram os pagamentos de socorro e soldos de tôda a guarnição da ddjj fragata, como melhor constará dos livros da Ementa, em onze contos, quatro« e setenta e seis mil e dezoito réis — 11:476S018. „ Soma todo o costeamento quatorze contos, quinhentos e quarenta e um qua trocen tos e qu aren ta e oito réis — 14:541 $448. Fo nte: Ms. 1.S26 e I.S27, Bahia, P.a.c., AHU. ( 68) Ms. 4.764 e 4.765, Bahia, P.a.c., AHU.
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uberam 1 2 0 .0 0 0 cruzados cada ano do prazo estipu jjiasil to o donativo de Paz com a H olanda. Em latlí>' ri rt a da mesma da ta, v inha nôvo com unicado de que, °utia c-' a-n(ja a importância de 600.000 cruzados para o pa^nento do dote, deveria o Brasil, também contribuir para ô
J 0
' Ein melo a controvérsias e aceitações, foi ajustada a conv-in mie cada cap mbinçdu i itania deveria dar. N ão encontram os, t a n t o , cm nosSas pesquisas, nada que nos pudesse comt n v a r terem sido realmente efetuados êsses pagamentos ao s o b e r a n o inglês, embora tivessem sido recolhidas as contribui ções dos súditos de Portugal, residentes no Brasil, sob protes tações e delongas. Não se haviam passado 10 anos depois de assumidos êsses compromissos sem que saibamos direito se as arrecadações e pagamentos estivessem sendo feitos pontualm ente aqui na Co lônia, e vinham ordens de Portugal, em carta datada de 8 de março de 1671, permitindo que a autoridade colonial, bem como os seus sucessores, passassem a lançar mão dêsse dinheiro para atender às despesas com as naus da Ín d ia, q ue escalassem em Salvador, tanto na ida, quanto na volta, abatendo os totais gastos do que íôsse enviado a Lisboa para o Conselho Ultra marino. Aliás, parece não ter sido apenas com essa finalidade que se lançou mão da verba do donativo, pois chegou êle a sofrer um recolhimento antecipado de 15.000 cruzados anuais, des tinados ao financiamento de um grande estaleiro naval, para construção de navios encarregados de policiar as costas bra sileiras. Tal empreendimento não teria ido avante, por falta de mão-de-obra (70). Como o donativo vinha sendo feito tn natura, entrando c« o paga principalm ente o açúcar, era necessário reduzi-lo a In ro pa ra ate nd er aos gastos no estaleiro. ça,t^°Vve Por l^m. então, o governador Afonso Furtado de gj .° de M endonça baixa r um a Po rtaria da tada de açúca de 1672, o rd en an do a rep artiçã o das caixas de cio o í correspondentes ao donativo entre os homens de negóC1° e lojistas da praça. .
lhes pe!^” r•Pecl ueno nú m ero de caixas a cada um , p ara não -—, r’ ando o seu pag am ento dividid o em q u atr o pres(70) F
Ma „ . o ,
^ oc*la P ita , H is tó ri a
Por(uga,
_ p4g 44da Amér ica
po rt uguês a,
pág s. 222-223.
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tações: a primeira no ato da entrega da mercadoria e as três restantes ao fim de cada um dos meses seguintes, na base de 10 tostões o aç úc ar b ran co e 6 o mascavado (71). Era, como se vê, um curioso processo de conversão da mercadoria em moeda, forçando o comércio a adquirir o açúcar. Comprovando que o pagamento do donativo pelos colonos vinha sendo sonegado, foi preciso cobrá-lo, nessa ocasião, executivamente, sobretudo aos moradores remissos. A cobrança executiva foi feita por soldados e fintadores “em dinheiro de contado", e em falta em penhores de ouro, p rata, e escravos; visto não haverem pago em “assucares” . . . (72), Forçava-se, assim, os colonos, ao recolhimento das con tribuições atrasadas. Com o se vê boa p arte d a soma tinha originalmente outra finalidade. N ão deix ava de ser, tam bém , um a fórm ula de obter-se a compreensão ou pelo menos menor relutância dos colonos em atender a compromissos que muito indireta e remotamente lhes diziam respeito, pois agora sabia-se que parte do dinheiro tinha uma finalidade imediata, com aplicação inclusive aqui na Colônia, e com inegáveis reflexos no seu comércio. Às vêzes a autoridade colonial transferia ao próprio navio necessitado a mercadoria obtida a título de donativo, como, p o r exem plo , caixas de açúcar ou pau-brasil, para transform á-la em dinheiro destinado ao atendimento das despesas de reparos. Passaram a expedir-se, sempre que um navio da Carreira estivesse sendo reparado no estaleiro, ordens urgentes para os oficiais das vilas do interior, a fim de que promovessem a cobrança executiva dos donativos, enviando-os ao Salvador. Com as Câmaras de Cairu e Boipeba deu-se essa r e c l a m a ç ã o não poucas vêzes. Mas os problemas de numerário não se referiam apenas às despesas contraídas pelas naus da índia no seu consêrto. Maiores do que estas, eram as destinadas à fabricação de em barcações no m esm o esta le iro do Salvador. Já se viu como, por ordem régia, aquêle arsenal, a° menos desde o século x v i i , tinha por dever a fabricação de galeões, inclusive para a travessia oceânica, pois para a nave gação de cabotagem, sua produção regular data de bem antes(71) Doc. H is t., vol. viu, pág. 99. (72) Ibid em , pág. 114,
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r mo é fácil inferir, a construção de um nav io era em* Hp bem m aior m on ta do que as tarefas de reparo, tamÈ
a „ « , o Sa , a l i l s
geralmente, muito tempo, implicando numão-de-obra em intensa utilização de matéria-prima e •^lementos tanto coloniais quanto importados, a construção irnP oferecer não poucos problemas atinentes aos recursos ara a t e n d ê - l a , já qu e a au to rid ad e ré gia não lograva controlar o e q u i lí b r i o financeiro da Colônia, assistindo-a na crônica penúria. Como a matéria era de alto interêsse governamental, a ela se dando preferência sôbre outras atividades, viu-se o govêrno obrigado a lançar mão constantemente de recursos es tranhos, para não demorar a fábrica dos navios. Vestia-se em geral um santo, desvestindo outro, pois quase sempre os expedientes utilizados, como acontecia em relação aos consertos dos navios da Carreira, atingiam outros setores públicos, ligados até ao abastecim ento e assistência à p o p u lação. Assim, o variado critério da autoridade colonial no desvio de verbas não diferiu do que se aplicava nos gastos com con sertos de navios. A pen as os pro blem as da co nstruçã o assum iam às vêzes aspectos de interêsse mais particular. É verdade que nem sempre se chegou a bom têrmo nessas construções. Os m otivos eram qu ase sem pre os mesm os, e as funestas conseqüências para a Coroa podem fàcilmente estimar-se. Por volta de 1656 temos notícia de que poderoso galeão se construía no estaleiro baiano, com capacidade para “levar no porão mil e quinhentas caixas’’ e que segundo “os Officiaes da Ribeira, e outras pessoas intelligentes” não encontrava ou tro igual nas armadas reais. As despesas já iam além do previsto e faltava ainda enrcia real para o ma stro grand e. Ped iu, então, o governado r, nao só a enxárcia necessária, como também mil moios de sal da^rf110 C c*n(l^ en ta pipas de v inho, co m ple tan do o re stante obt sua con strução , com o frete q u e se calculava er da primeira viagem do navio. D e m o ra n d o ,
l’sacã^rr|Umentava nesse ser>tido o governador contra a para^ os° f a .0 ^ ra’ P°is esta traria como conseqüênc ia despedirem0 tciais, qu e dificilme nte seriam reen co ntrad os, po r se
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dispersarem. Apodreceriam, também, as madeiras cortadas correndo ainda o risco do fogo os “tujupares” levantados para abrigá-las. Providenciou o governador uma redução no número de oficiais que serviam a embarcação, naturalmente como medida de economia, e o fornecimento às obras do referido galeão de 300$000 réis, por mês, a título de empréstimo. N ão p o d e ria fazer m ais a F azenda R e al, pois os dízimos daquele ano ainda não haviam sido lançados, prevendo-se b aix a n a arrecadação, d ev id o à p ro d u ç ã o do açúcar, então em declínio, como à incerteza sôbre a vinda da armada. Com o em pré stim o evitava-se, o utrossim , sobrecarregar a p o p u laç ão d e o u tra fin ta p a ra a te n d e r a essa despesa do esta leiro. A argum en taçã o da au torid ad e gan ha m aio r ênfase nessa ocasião ao saber-se que a maioria dos seus conselheiros votara pela in te rru p ç ã o da o b ra. O exemplo que invocamos, da construção dêsse galeão, m ostra as dificu lda de s q ue a em prêsa enc errava . Devia ser sem pre assim. São a p ro p ó si to do m esm o caso, as seguintes afirmações do conde de Atouguia: “se se largasse mão desta obra é certo que teria o fim que experimentaram tôdas as da Ribeira a que se deu princípio por conta de Vossa Majestade neste Estado”. Vê-se que as obras iniciadas no estaleiro nem sempre che gavam ao seu final, sendo, provavelmente, abandonadas, com o que se perdiam preciosos cabedais. Vejamos porém outro caso que ilustra as nossas conside rações sôbre os problemas que o Erário sempre enfrentava para atender às requisições navais. U m a o r d e m d e S u a M a j e s t a d e , d a t a d a d e 10 de setembro de 1755, m a n d a ra q u e se fizesse nos e sta leiro s baian os ujJJ* J n a u s e m e l h a n t e à C a r i d a d e , perten cen te à C arreira da ín j e que ali fôra qu eim ad a po r im prestável. E ntretan to, a a ridad e real n ão chego u a d a r esclarecim entos sôbre os recu | necessários p a ra a re ferid a con strução . I I Dessa maneira, viu-se o provedor-mor da Fazenda obrigp^ a recorrer aos arquivos locais, tendo encontrado uma Po do vice-rei, de 7 de fevereiro de 1738, onde se esc^ar^Ciano'a àquela época também fôra mandado fabricar “hua Nau } nesta R ibe ira de Sessenta pessas pa ra aC arreira da l n j^o5 qual tivera sua despesa atendida graças ao dos q d
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nas daquela capitania e ao Donativo Real, pois as rendas daSF°tado se achavam muito diminutas. d° Nesta nova op or tun ida de (1755), em que se apresentava aso semelhante, p o n d erav a a a u to rid a d e q u e a B ahia já Um C profundam ente on erada pelo D onativo destinado, desta eS-3V aos “effeitos do T er re m o to ”, solicitando e n tão instruções *Clta sab er como procederia para atender aos gastos, não só c o n s t r u ç ã o daquela nau, mas também com reparos das P3* numerosas embarcações da C arr eira qu e ali ap orta va m (73). 11 R e p o r t o u - s e também a uma resolução real, datada de 20 de fevereiro de 1734, na qual el-rei suspendia a cobrança do Donativo dos seus “Reays Desponzorios”, o qual justamente vinha sendo destinado a atender às despesas com as naus da índia. Em vista disso, e enr face dos casos que continuavam apresentando-se, ouviu el-rei o Conselho Ultramarino, resol vendo em 19 de fevereiro de 1755, determinar que as referidas despesas passassem a ser feitas pelos ren d im en to s alfandeg ário s, provindos das fazendas d a ín d ia (74). Vê-se, portanto, que sempre variou muito a procedência das verbas concedidas aos estaleiros. Pôs to o pr o ble m a, rec o r ria a autoridade régia a expedientes transitórios, quando não tentava uma previsão que logo se tornava inexeqüível pelas conjunturas econômicas qu e ap resentav a o u ltram ar p ortuguês. Diante dessa situação, o recurso que se tornou mais usual foi o de valer-se a autoridade das verbas resultantes dos “donativos voluntários”, com que periòdicamente a Coroa brindava seus colonos. Foi preciso também considerar-se a ordem real de 1671 que determinava a venda do casco com sua ferragem ou então a^sua queima, aproveitando-se, neste caso, a ferragem, quando prestávei a n a h ad as em S alvador fôssem ju lg ad as im as ordp locan te às fazendas q u e condu zissem , cum prir-se-iam e m b a rk * 35 de e nas q u a*s se recom end ava o seguranca n ° S na v' os dispo níveis, desde q u e oferecessem dades” dos6 'p SP ?n ^ essern sua en tre g a. Q u a n to às “liberao Reino ° !clai,s’ de via m êles req ue rê-las q u a n d o cheg assem sunto (T5^ ’ ^ 01s ha via m ais p rá tic a e co n h ec im en to do asna ®ahia, s ô b r ^
*^n e ‘ P^S- 295. Êste é um dos inúmeros barcos cons-
ej-ii* Wlaçaó nii» P /i a a l n5° enco ntramo s docum entação qu e nos permitisse m M s- 2 169q ? o - o r a m o s nesse s en tid o. ^ 5) 'b i dt n , 2.172, Bahia, P.a.c., AHU.
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Da embarcação julgada incapaz aproveitar-se-ia ainda a enxárcia, mastreação, velame e artilharia, material êsse que se destinava à nova nau, cuja construção fôra ali ordenada. N ão descurou a autoridade real de recom endar ainda que não fôsse esquecido o resbordo a ser feito na nova nau, a fim de que uma vez pronta pudesse seguir cheia de madeira para o Reino. T am bé m a escolha das m adeiras relativam ente ao seu pêso e qualidade não admitiria quaisquer descuidos pre judiciais à obra a ser iniciada (76). Os recursos, indistintamente, tinham de dirigir-se tanto ao material quanto ao pessoal recrutado para o trabalho. O falecimento de algum funcionário ou o seu afastamento por qualquer motivo não podia envolver solução de continuidade no tra balh o. A mão-de-obra qu alificada, como vimos em outro cap ítulo, não era de fácil recru tam en to. D iferentes motivos concorriam, portanto, para desfalcar o arsenal causando sérios preju ízos. Faz-se mister destacar ainda o fato de que as despesas com a construção de embarcações eram sempre extraordinárias, isto é, não previstas no orçamento da capitania. Quando muito houve algumas tentativas de criação de taxas especiais para se atender a essa finalidade, bem como à dos reparos em embarcações necessitadas. E ntre tan to, não chegaram a representar grande ajuda, pelo menos não ser viram para atender às avultadas despesas que se faziam com umas e com outros. Com tantos entraves, o estaleiro do Salvador não podia mesmo desenvolver-se a conten to. O brig ad o a colocar em ser viço embarcações superadas e mal construídas, Portugal poderia ter estimulado a construção naval no Brasil, que podia atender às suas maiores necessidades. Embora isso não tenha acontecido, nossa contribuição, nesse sentido, não foi desprezível, permitindo mesmo que o Reino diminuísse a sua dependência com relação aos arma dores particulares que, desde o século xv e começos do xvi, se associavam à Coroa, mediante a venda ou construção de embarcações para serviço da Carreira. N ão foi p or falta de advertência s, p rincipalm ente da parte dos memorialistas, que sempre argumentavam com o espleo (76) Oficio dc José Venâncio de Seixas para D. Rodrigo de Sousa Coutiul» datado de 21/1/1797, in A na is B N R io , vol. 34, pág. 465.