AS CORES DA MAÇONARIA
As cores da Maçonaria Na Maçonaria há uma forte influência do simbolismo das cores. Existe uma Maçonaria azul, uma Maçonaria branca e uma Maçonaria vermelha, cada uma dessas cores denotando uma fase do aprendizado apre ndizado iniciático da Arte Real. Não há uma razão histórica para a adoção desse simbolismo de cores, a não ser que se possa invocar motivos relativos á Revolução Francesa, relacionados com as cores da bandeira daquele país. Mas aí seriámos obrigados a diminuir consideravelmente o alcance da Arte Real, que na nossa opinião, foi muito mais razão que conseqüência daquele formidável momento histórico. A alusão á cor azul, muito provavelmente pr ovavelmente provém da influência da tradição alquímica, pois de acordo com os adeptos da Arte de Hermes, a pedra filosofal, no decurso do seu processo de elaboração, assume, seguidamente, três cores: um negro azulado, conhecido como asa de corvo, um branco leitoso e um vermelho ígneo. O negro simboliza o reino de Saturno, a partir do qual são obtidas a pedra branca, que é o símbolo da lua, e a vermelha, símbolo do sol. Portanto, são essas as cores da grande obra alquímica. Primeiro, um negro azulado profundo, evocando as trevas, a morte, o subterrâneo; depois o branco, que é o renascimento, a cor da regeneração; e por fim o vermelho, o fogo celeste, o raio de luz, o sol, como corolário desse processo. Por analogia se adotou esse simbolismo às diferentes etapas do simbolismo iniciático maçônico. A chamada Maçonaria negra foi acrescentada depois, para simbolizar a posse de segredos duvidosos. Mas em principio eram essas as cores, e na essência, repetia o caleidoscópio hermético. Os alquimistas justificavam esse simbolismo dizendo que toda semente seria inútil se permanecesse intacta na terra, sem apodrecer e ficar negra. Era preciso primeiro a corrupção e a morte para, em seguida, ocorrer a regeneração. Era no azul-negro que se encontravam, dissimuladas, todas as demais cores, como dizia Nicolas Flamel no seu Rosário dos Filósofos. Esse negro era, na verdade, um azul profundo, perfeito, que integrava em si a “rosa branca” e a “rosa vermelha”, imagem da regeneração e da ascensão espiritual, respectivamente. Essas duas cores do azul representavam os dois graus de perfeição da pedra filosofal, “ o pequeno e o grande magistério, “ o emblema da sabedoria, a coroa do filósofo, o selo da ciência e da fé, unidas á dupla potência, espiritual e temporal” no dizer de Fulcanelli. Na vida do operador alquímico eram representativas das duas mudanças no seu estado da consciência (etapas lunar e solar), que se operavam pela prática do magistério hermético. Na terminologia alquímica,“branquear latona”(deabbat ergo latonen) significava branquear o latão, isto é, liberar o metal de suas impurezas para que pudesse mudar de estado. Na mitologia grega, Latona era a mãe de Diana (a Lua), e Apollo (o Sol), deuses representativos da natureza e da luz, respectivamente. Na prática alquímica, é quando a “pedra” assume essa cor púrpura (fogo dos fogos), assemelhando-se a uma romã madura, que ela adquire a capacidade de transformar metais ordinários em ouro. Em contato com ela, os metais impuros “morrem” e “renascem” num outro estado, estado, da mesma forma que o iniciado iniciado maçom ao toque da espada flamígera. Na simbologia maçônica podemos encontrar um paralelo nas diversas fases graduais que o iniciado tem passar para atingir o ápice da Escada de Jacó. No Rito Escocês essas fases são representadas pela Maçonaria azul, correspondentes ás
Lojas Simbólicas, á Maçonaria branca, correspondente ás Lojas de Perfeição e Capitulares, e á Maçonaria vermelha, que corresponde aos graus filosóficos. Este último comporta ainda uma divisão em Maçonaria negra, que integra os três últimos graus da escalada de trinta e três graus previstos. “A cor negra, escreve Fulcanelli, “foi atribuída a Saturno, que se tornou em Espagiria, o hieróglifo do chumbo; em Astrologia, um planeta maléfico, em Hermetismo o dragão negro ou chumbo dos filósofos; em Magia, a galinha negra etc. Nos templos do Egito, quando o recipiendário estava pronto para as provas iniciáticas, um sacerdote aproximava-se dele e segredava-lhe no ouvido esta frase misteriosa: “Lembra-te que Osíris é um deus negro!.” Osíris, como se sabe, era o deus da ressurreição, aquele que guiava a alma do defunto pelas trevas da Tuat até o seu encontro com a luz. “,Tal como o dia, no Gênesis, sucede, á noite,” continua Fulcanelli,” a luz sucede á escuridão. Tem por símbolo a cor branca. Atingindo esse grau, os sábios asseguram que a sua matéria está livre de toda impureza, perfeitamente lavada e purificada. (....) A cor branca é a dos Iniciados porque o homem que abandona as trevas para seguir a luz passa do estado profano ao de Iniciado, de puro. É espiritualmente renovado.” Não se pode deixar de comparar a simbologia do magistério alquímico com as diferentes fases da iniciação maçônica. O que busca o irmão quando se inicia na Maçonaria, senão uma mágica transformação no seu ser? A passagem do estado de profano para o de iniciado equivale, na iniciação maçônica, a essa renovação espiritual, essa transformação de substância, que no magistério alquímico é obtida pela manipulação da matéria. Só que, diferentemente da Arte de Hermes, a matéria prima do maçom é o seu proprio psiquismo. Sobre ele o iniciado trabalha, utilizando-se dos influxos da Loja e dos ensinamentos que recebe, para tranformálo, de metal impuro em ouro. Troca o vicio pela virtude, a preguiça pelo trabalho, a indiferença pela participação, o desconsolo pela esperança. Dessa transmutação emerge como espírito renovado, purificado, pronto para exercer um novo papel na sociedade. Esse é o significado do simbolismo contido na iniciação maçônica, na qual o recipiendário passa sucessivamente, pelas três fases da transmutação alquímica: a negra, simbolizada pela sua descida ás sombras da morte, o branco da regeneração, simbolizado pela sua iniciação e o vermelho da exaltação, que simboliza o predomínio do espírito sobre a matéria, condição que ele, como iniciado, finalmente adquiriu. Evidentemente, na Maçonaria moderna todo esse simbolismo, que resume uma verdade iniciática, assumiu contornos de filosofia moral. O maçom é um homem do mundo e para ele vive. As verdades do espírito devem ser transformadas em atitudes práticas para a melhoria da sociedade na qual ele atua. A luta do maçom é contra ele mesmo, para submeter suas paixões e aprimorar seu espírito contra os males que infelicitam a espécie humana. Afinal, como diz o ritual, o mal é o oposto da virtude. O maçom deve trabalhar para eliminar esse mal, aperfeiçoando suas qualidades morais, e em conseqüência, as da humanidade como um todo. Em outras palavras, o que ele busca é a realização de um estado de perfeito equilíbrio dentro de si mesmo primeiro para, em seguida, transmiti-lo á comunidade na qual vive, pois ninguém pode dar senão o que tem. Essa é a ciência maçônica, a verdadeira ciência da vida. Através do trabalho prático, (do maçom operativo) e teórico, (especulativo, que é busca do conhecimento, da Gnose), o Obreiro da Arte Real pode realizar a Alquimia
maçônica., unindo-se , afinal, pelo trabalho de construção do universo moral que deve existir em todo irmão, com o Sublime Arquiteto do Universo, fonte fecunda de luz da qual todos saímos no início como matéria cósmica e á qual um dia voltaremos como espíritos radiantes de energia luminosa. Por isso é que aqueles temerários que batem profanamente á porta do templo, a fim de se iniciarem nos Augustos Mistérios dos Obreiros da Arte Real, ali estão em busca de luz. É que na desordem que reina no mundo dos homens, esses corações sensíveis sentem a necessidade de buscar o exato equilíbrio entre suas necessidades no mundo profano e as exigências do mundo sagrado, que são de cunho espiritual. Sem ordem e harmonia em suas próprias vidas, não as pode transmitir á comunidade em que vive, pois ele mesmo não as possui. Então precisa ser devidamente iniciado, para que possa adquirir tais qualidades. Mas para isso precisa ser puro e de bons costumes. Ontem como hoje, as esperanças da humanidade são as mesmas: ela quer viver num estado de harmonia, equilíbrio social e ordem. Se as formas de se buscar esse estado ideal mudam, se as visões assumem diferentes configurações, o conteúdo significante dessas visões, no entanto, são os mesmos. Em todos os tempos os homens repetem as mesmas fórmulas e sentem os mesmos anseios. Assim, o neófito que busca a realização maçônica carrega na sua alma o mesmo anseio do adepto que se iniciava na Arte de Hermes. E tanto nos laboratórios dos artistas, como nos templos maçônicos de hoje, quando um irmão é iniciado ouve-se dizer que A LUZ FOI FEITA , A LUZ SEJA DADA AO NEÓFITO. Por fim, é relevante lembrar que na referida prancha do Mutus Líber, um homem e uma mulher, representando os dois princípios, feminino e masculino, que se unem para a criação, torcem um pano branco para fins de extrair dele o chamado“orvalho dos filósofos”. Esse “orvalho” é exatamente a energia proveniente da natureza, a “flos coeli” capaz de animar a matéria inerte e provocar nela a transmutação. No templo maçônico, essa função é representada pelo equilíbrio de forças entre as duas colunas, sobre as quais Aprendizes e Companheiros realizam suas fases de aprendizado, recebendo cada um, conforme o ritual, o seu salário. É dessa maneira que os Obreiros da Arte Real, congregados no templo, formam um egrégore que capta, a exemplo da ação energética da síntese química, a “energia dos princípios”, que para o alquimista é o mercúrio filosófico, e para o maçom é a a tríplice argamassa com que se ligam as obras maçônicas. _________________________ Notas Fulcanelli- O Mistério das Catedrais, pg. 49 Idem , pg.115 Na Maçonaria, esses princípios são representados pelas colunas J e B. DO LIVRO "CONHECENDO A ARTE REAL- ED, MADRAS, 2007
http://www.recantodasletras.com.br/resenhasdelivros/2852807
nº 75 - Cores na Maçonaria
O estudo do significado das cores, na Maçonaria, é de vital importância pois permite facilidades e melhor entendimento no estudo do Simbolismo. Elas figuram e estão presentes em todos os Ritos e em todos os Graus. É muito importante que se estude, também, o simbolismo das cores para que possamos entender o seu significado nos nossos paramentos, painéis e estandartes. Na natureza, o “Arco Iris” formado pelas gotículas de água refletindo a luz solar tem as seguintes cores (de dentro para fora): violeta, anil, azul, verde, amarelo, laranja e vermelho.
No Rito Escoces Antigo e Aceito percebemos que há uma estreita ligação entre suas cores usadas e o que está descrito acima. Assim, nesse Rito, que é composto de 33 Graus, o mesmo é dividido em cinco secções. Nelas é que aparecem as definições das cores na Maçonaria, conforme descrito abaixo:
A “Maçonaria Azul” compreende os Graus Simbólicos, ou seja, Aprendiz, Companheiro e Mestre. A “Maçonaria Verde” que refere-se às Lojas de Perfeição, que compreende os grau do 4 ao 14. A “Maçonaria Vermelha” que refere-se às Lojas Capitulares (Capítulos RosaCruz), que compreende os grau do 15 ao 18. A “Maçonaria Negra” que refere-se às Lojas do Conselho Kadosh, que compreende os grau do 19 ao 30. A “Maçonaria Branca” que que refere-se às Lojas do Consistório e Supremo Conselho, que compreende os graus do 30 ao 33. De acordo com Mestre Nicola Aslan, em seu Dicionário Enciclopédico, temos:
AZUL: é simbolicamente, na Maçonaria, a cor do céu no seu infinito, como infinita deve ser a tolerãncia condicionada nas atitudes dos Maçons nos tres primeiros graus – Aprendiz, Companheiro e Mestre. VERDE: essa cor simboliza, precisamente, a transição, a passagem da “pedra cúbica” para a “pedra polida”. Esse polimento é a abertura da mente do Mestre para novos e surpreendentes conhecimentos. VERMELHO: é a cor do elemento fogo. É a cor do sacrificio e do ardor que deve animar o comportamento dos Rosa-Cruzes.
PRETA: é a cor do luto e da tristeza que atormentam o Iniciado quando acredita que o seu desejo de excelsitude, o seu sacrifício e o seu ardor têm sido vãos. BRANCA: é a cor que simboliza a paz e a serenidade do Iniciado que alcançou a plenitude da Iniciação, quando desenvolveu em si a espiritualidade pura, livre de toda sentimentalidade. Infelizmente, é comum se ouvir em trabalhos de Mestres, sobre “Maçonaria Azul” e “Maçonaria Vermelha” informando que a vertente da Maçonaria oriunda da França, com tendências revolucionárias, é a “Maçonaria Vermelha” e a vertente mais conservadora, mais comportada, oriunda da Inglaterra, é a “Maçonaria Azul”. Entretanto, essas afirmativas não encontram respaldo dos historiadores maçônicos, sérios.
A Bíblia dos Maçons Tradução José Filardo
por Daniel Ligou
É um problema bastante complexo, porque o podemos examinar a partir de vários aspectos complementares. Primeiro, o essencial, a presença ou não da Bíblia, ou, mais genericamente, do Volume da Lei Sagrada (VLS) na oficina; depois, o papel que ela desempenha ou não no recinto maçônico, tanto como “luz” ou “utensílio”. Some-se a isso a participação da Bíblia na trama do ritual maçônico que apresenta a particularidade que divide com o companheirismo, de completar um fundo bíblico, essencialmente do Antigo Testamento , através de toda uma série de lendas parabiblicas que se desenvolvem no ritual para delas se retirar uma lição simbólica ou moral; enfim, a extraordinária variedade de “palavras” correspondentes a cada grau, palavras de passe, palavras sagradas, “grandes palavras” que os ritos, e especialmente o rito escocês Antigo e Aceito (REAA), em seus 33 graus – não economizam nem um pouco.
Algumas observações preliminares primeiro. Nós provavelmente seremos incompletos, mas privilegiaremos os ritos que conhecemos bem e, especialmente, aqueles que praticamos regular ou ocasionalmente, porque em nossa opinião, a Maçonaria, para ser verdadeiramente compreendida, deve ser vivida espiritual e emocionalmente, e não ser apenas sinônimo de conhecimento. Também o nosso comentário será essencialmente baseado
nos três principais ritos praticados na França: o Rito Francês, o Rito Escocês e o Rito Escocês Retificado, pois não conhecemos os ritos ingleses a não ser através de textos que consultamos mais ou menos regularmente (fico feliz em concordar!). Por outro lado, para nosso grande pesar, não foi possível, por razões essencialmente linguísticas, usar os rituais alemães ou suecos. Quanto aos ritos praticados nos países latinos, eles não oferecem grande originalidade em relação aos que já conhecemos.
Outra observação. Trata-se de “ritos” e não de “obediências” ou “potências”. Portanto, não levaremos em conta “exclusivos”, “excomunhões” ou reivindicações de irregularidade. Além disso, o Rito Francês, conforme ele é praticado no Grande Oriente, ou o REAA na Grande Loja são ritos tão diferentes com o mesmo nome usado na Grande Loja Nacional francesa? Não, sem dúvida, porque suas fontes são comuns. Nós mesmos (tremo só de pensar) fizemos algumas alusões à “Maçonaria de Adoção”, que continuou até meados do século XIX, a Maçonaria feminina atual contentando-se em organizar – muito inteligentemente, diga-se de passagem – o textos masculinos do REAA ou do Rito Francês.
Notamos também que o Shiboleth da regularidade, aos olhos da Grande Loja Unida da Inglaterra, não é a Bíblia no sentido estrito, mas o VLS, isto é qualquer livro básico de natureza religiosa, e a crença no Grande Arquiteto e sua vontade revelada. Mas, se a Maçonaria tem, segundo as Constituições de Anderson de 1723, tem a pretensão, diga-se de passagem, com alguma justificação, de ser o “centro de União” e de agrupar “os homens bons e leais ou os homens de honra” e de probidade, quaisquer que sejam as denominações ou crenças religiosas que os ajudam a “se distinguir “, ela não deixa de ser o resultado de um legado, de uma tradição e de circunstâncias históricas que lhe deram um estrutura mental e um equipamento intelectual cristão, essencialmente reformado no início e mais ecumênico a seguir. Existe – e não pretendemos abordá-la -. uma maçonaria “sem Bíblia”.
Com efeito, onde quer que a Bíblia não é a alimentação diária dos Irmãos, ela se desvanece ou desaparece em favor do “livro da Constituição” na Bélgica e na França – evolução que não é de forma alguma incompatível com a crença no Grande Arquiteto conforme mostra a história do Rito Francês de 1787-1878, onde se prestava juramento ao Grande Arquiteto sobre o “Livro da Lei”. Em Israel é, obviamente, a Torah , sem o Novo Testamento, e em outros lugares o Alcorão, o Avesta, Confúcio. O REAA especifica, além da Bíblia, os Vedas, o Thipitaka, o Alcorão, o Zend Avesta, o Tao Teh King e os quatro livros de Kung Fu Tsen. Na loja (Inglesa) de Singapura, os irmãos têm uma dúzia de livros sagrados. E o Ir.´. Rudyard
Kipling expressa perfeitamente este ecumenismo: “Cada um de nós falava do Deus que conhecia melhor.” Mas, onde começa e onde termina o sagrado? Por que não os Pensamentos do Presidente Mao? Pode-se ainda se perguntar se a prática de religiões como o confucionismo está em harmonia com o conceito de “Vontade Revelada”, tal como concebido pelas religiões monoteístas da Europa ou no Oriente Médio.
Enfim, fazemos, ou tentamos fazer um trabalho de historiador. Isto significa que teremos de distinguir o que é histórico do que é bíblico e, em relação à Bíblia e a história, o que é pura lenda, deixando claro que para todo Maçom, a lenda não passa da tradição no dogma católico, isto é, algo que assume valor doutrinário. Por outro lado, não nos cabe neste momento fazer a exegese do que seja biblicamente inspirado e muito menos dos textos utilizado. Menos ainda, praticar os métodos alegóricos, tipológicos ou anagógicos caros aos Padres da Igreja e aos dialéticos medievais onde encontramos muitos vestígios das “Old Charges” (os Antigos Deveres) que regulamentavam a Maçonaria operativa. Para nós, o Templo de Salomão é um edifício construído por um rei de Israel para a glória de Yahwe e não temos que querer saber se ele representa a igreja ou o Cristo. Isto pode parecer simplista para alguns, mas não acreditamos na virtude da mistura de gêneros.
Analisemos agora nosso primeiro ponto: a Bíblia, “instrumento” em loja, sobre a qual se presta juramentado. Você não precisa fazer prova de vasta erudição para constatar que a Maçonaria “operativa”, aquela dos construtores, intimamente ligada ao mundo clerical, pelo menos, pela construção de catedrais, era – como, a propósito, era o corpo dos ofícios – “guildas de artesãos”, “empresas” diferentes – de inspiração cristã, católicos na Inglaterra até a Reforma, anglicanos ou reformados posteriormente. Na França, Itália, Espanha, eles permaneceram fiéis à Igreja romana até seu desaparecimento natural ou supressão revolucionária. Às vezes, com o estofo de uma guilda profissional, mais frequentemente distintas das confrarias de penitentes. Elas estavam colocadas sob a invocação de santos padroeiros da profissão, e para “as pessoas da construção” muito particularmente “os Quatro Mártires Coroados” (Quatuor Coronati) que a encontramos na Inglaterra, mas também na Itália (Roma ) e na França (Dijon). Além disso, não parece que, ao contrário das guildas, sempre suspeitas para a Igreja e o poder civil, estes “corpos” tinham, por pouco que seja, rompido com a ortodoxia. Mas, voltemos à Inglaterra.
É difícil afirmar que a Bíblia figurava entre o “material” das lojas operativas inglesas antes da Reforma, pelo menos segundo o que pudemos deduzir das “Old Charges”. Por outro lado, sabemos que se prestava juramento ali, e
que nada há de original, já que o “negócio jurado” era a regra um pouco por toda parte. O fato é que os primeiros documentos – o Regius (cerca de 1370) e o Cooke (cerca de 1420) – são perfeitamente silenciosos. Assim nenhuma suposição deve ser excluída: a Bíblia, quando se podia ter uma, o que, antes do desenvolvimento da impressão talvez não fosse tão fácil, o “livro” do estatutos e regulamentos corporativos, relíquias como é tão frequentemente o caso na França? De qualquer forma, o juramento tinha um caráter religioso que ele conservou – exceto na Maçonaria “secularizada”.
Os documentos mais recentes, mas também posteriores à Reforma, são mais explícitos e o juramento sobre a Bíblia é, mais frequentemente afirmado pelo “Grand Lodge Manuscript ” No. 1 (1573), e No. 2 (1650 ), o “Manuscrito de Edimburgo” (cerca de 1696): “Fazemos com que eles tomem a Bíblia e prestem juramento”, o “Crawley” (cerca de 1700) onde o candidato jura sobre o livro sagrado por “Deus e São João”; o “Sloane” do mesmo período, sobre o qual a questão permanece em dúvida, o “Dumfries” n º 4 (cerca de 1710). Pode-se, portanto, supor que, desde a Reforma, o juramento sobre a Bíblia tenha se tornado a regra, o que levou o historiador francês A. Lantoine a dizer que este era um “landmark de contrabando huguenote”, uma expressão engraçada, mas definitivamente exagerada. Esta constatação não nos deve fazer perder de vista a perfeita ortodoxia católica primeiro, depois anglicana, das “Old Charges”. A este respeito, o texto mais característico é, sem dúvida, o “Dumfries No. 4″ (cerca de 1710), descoberto nos arquivos da Loja desta pequena cidade, localizada na Escócia, mais nos confins da Inglaterra. O autor dá ao Templo de Jerusalém a interpretação cristã e simbólica tradicional e se inspira tanto no Venerável Bede quanto em John Bunyan. As orações são estritamente “niceanas”. As “obrigações” exigem a fidelidade a Deus, à Santa Igreja Católica (isto é, anglicana no sentido do Livro de Orações), ao mesmo tempo que ao Rei. Os degraus da Escada de Jacó evocam a Trindade e os doze Apóstolos; o mar de Airain é o sangue de Cristo; os doze bois, os discípulos; o Templo, os filhos de Deus e a Igreja; a coluna Jaquim significa Israel; a coluna Boaz a Igreja com um toque de antijudaísmo cristão. Lemos com surpresa: “Que ela foi a maior maravilha vista ou ouvida no Templo – Deus foi homem e um homem foi Deus. Maria foi mãe e entretanto era virgem”. Todo este simbolismo tradicional e a ”tipologia” cristã admitida até o desenvolvimento da exegese moderna, encontra-se neste ritual. O catolicismo Romano, afirma Paul Naudon. Certamente não – ou melhor, certamente mais – porque podemos pensar que este é o redesenho de um texto mais antigo. As citações bíblicas são retiradas da “Versão Autorizada” do rei James, o que testemunha a ortodoxia anglicana do tempo da piedosa rainha Anne.
Se a Maçonaria tinha se mantido fiel a esta ortodoxia, ela não pode ter pretensões de Universalismo. E é isso, aliás, é que é regularmente produzido sempre que se quer vincular mais estritamente o ritual maçônico a uma confissão religiosa. O Rito Sueco, de essência luterana, não saiu de seu país de origem. O Rito Escocês Retificado, de tom nitidamente cristão, viu sua expansão limitada.
Ao contrário, o REAA, os ritos agnósticos, os ritos anglo-saxões “deconfissionalizados” são susceptíveis de desenvolvimento infinito. Este é, portanto, o grande mérito de Anderson e dos criadores da Grande Loja de Londres de ter entendido perfeitamente o problema. As Constituições de 1723 permitiram a expansão, embora na linha de uma Inglaterra já orientada em direção ao fluxo.
Assim, em países cristãos, a Bíblia era e permaneceu com o VLS, os testemunhos do século XVIII são quase unânimes, e as coisas quase não mudaram. Nos países anglo-saxões, ela é a primeira “luz simbólica”, o Esquadro e o Compasso são as outras duas. No rito de Emulação atual, a Bíblia deve estar aberta sobre o triângulo do Venerável, orientada no sentido de o dignitário a poder ler, e recoberta pelo esquadro e o compasso A página na qual o livro está aberto não é indicada, mas é tradicional – e moda – abrir no Antigo Testamento, quando se inicia um israelita. Nos EUA, a Bíblia é geralmente depositada sobre um altar especial no meio do Templo.
No REAA, a Bíblia está presente, aberta durante os trabalhos e colocada sobre o “altar dos juramentos” instalado ao pé dos degraus que conduzem ao Oriente e é recoberto com um pano azul com bordas vermelhas (as cores da Ordem). Ela pode ser aberta em qualquer lugar; é aberta preferencialmente em Crônicas 2.5 e em I Reis 6.7 onde se trata da construção do “Templo de Salomão.”
Na França, a Bíblia conheceu destinos diferentes. Os documentos mais antigos que possuímos mostram grande religiosidade, de orientação um tanto jansenista, e sabemos pelos textos de origem policial, que a Bíblia era aberta no primeiro capítulo do Evangelho de João. Tradição que se conservou perfeitamente no Rito Retificado, de inspiração claramente mais cristã. Mas, nos países católicos, a Bíblia não é, como na Inglaterra, o alimento espiritual da maioria dos cidadãos, especialmente depois que o Concílio de Trento limitou as possibilidades de leitura pelos simples fiéis. Além disso, conservando uma expressão religiosa sob a forma do Grande Arquiteto, que será colocado em questão somente em 1877, a Maçonaria
francesa, em sua expressão majoritária, a Grande Loja e depois o Grande Oriente, viu desaparecer lentamente o livro dos “utensilhos das Lojas” desde meados do século. Quando, nos textos de unificação do Rito Francês de 1785 – 1786, o “Livro das Constituições” assumiu seu lugar, ao lado do esquadro e do compasso, sobre o triângulo do Venerável, não houve qualquer protesto, e nem mesmo o Inglês o formalizaram.
Exceto nos ritos totalmente seculares – como o atual Rito francês – os juramentos que acompanham a iniciação e os “aumentos de salário” são prestados sobre o VLS. O que, em 1738, irritou muito o Papa Clemente XII que, na famosa bula de excomunhão In Eminenti, fala de “juramento estrito prestado sobre a Bíblia Sagrada.” É óbvio que, para o mundo anglo-saxão, um juramento não tem valor a não ser que ele tenha um significado religioso, atitude encontrada nos tribunais ou na “inauguração” de uma Presidente americano.
Não houve grandes mudanças em três séculos: o “Manuscrito Colne No. 1″ especifica a forma do juramento: “Um dos mais antigos, tomando a Bíblia, e apresentando-a, de modo que aquele ou aqueles que deve(m) ser iniciado(s) maçom(s) possa(m) pousar e deixar estendida a mão direita sobre ela. A fórmula do juramento será então lida.” No Rito de Emulação atual, o candidato se ajoelha e coloca a mão direita sobre o Volume da Lei Sagrada, enquanto sua mão esquerda segura um compasso com uma das pontas dirigida contra o seio esquerdo exposto. Ao pronunciar a obrigação, o Venerável, em sua mão esquerda, trará o Volume, afirmando que a promessa foi feita “sobre este”. No Rito Escocês Retificado – que conservou algo da tradição cavalheiresca da maçonaria francesa do Iluminismo, completamente ausente em países anglo-saxões – o candidato coloca sua mão na espada nua do Venerável pousada sobre a Bíblia aberta no primeiro capítulo de São João. A promessa é feita sobre “o Santo Evangelho”. No Rito Escocês Antigo e Aceito, o candidato coloca sua mão direita sobre os “três grandes luzes” que estão sobre o “Altar dos Juramentos, o Volume da Lei Sagrada, o Esquadro e o Compasso”, enquanto o Grande Experto coloca uma ponta do compasso sobre seu coração e, “sob a invocação do Grande Arquiteto do Universo,” o candidato “jura solenemente sobre as Três Grandes Luzes da Maçonaria.”
Na França, nos anos 1745, de acordo com o Segredo dos Maçons do Abade Perau, o candidato se ajoelhava, o joelho direito descoberto, a garganta exposta, um compasso sobre o peito esquerdo e a mão direita sobre o Evangelho, “na presença de Deus Todo-Poderoso e desta sociedade.” Observe-se que o Rito Francês de 1785 prescrevia o juramento “sobre os
estatutos gerais da Ordem, sobre esta espada, símbolo da honra e diante do Grande Arquiteto do Universo (que é Deus). http://bibliot3ca.wordpress.com/a-biblia-dos-macons/