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Batismo Cristão Imersão ou aspersão?
Charles
Hodge
0 BATISMO CRISTÃO: IMERSÃO OU ASPERSÃO ? Charles Hodge © 2003 Editora Cultura Cristã Traduzido do espanhol sob o título: De la Insígnia Cristiana Copyright © Asociación Cultural de F.studios de la Literatura Reformada Traduzido e publicado com permissão. I a edição: 1 998 2a edição: 2 003
Tradução: Sabatini Lalli Revisão: Denise Ceron Capa e editoração eletrônica: Magno Paganelli
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Superintendente: Haveraldo Ferreira Vargas Editor: Claudio Antônio Batista Marra
S um ário I 0 MODO DO BATISMO A. O significado do vocábulo “ batizar" 1. Não tem um sentido único 2. Não se emprega em sentido literal B. Os batismos dos judeus C. Os batismos dos judeus não eram feitos por imersão 1. A imersão não está estabelecida 2. Os batismos (ou purificações) eram por aspersão ou efusão 3. As aspersões e efusões são chamadas batismos 4. “ Batizar” equivale a “ lavar" 5. O batismo judeu como rito cotidiano 6. Casos em que a imersão era impossível 7. Hebreus 9.10 e os batismos por aspersão ou efusão I). A forma do batismo cristão e a forma do batismo judeu 1. Idêntico significado da água nas duas dispensações 2. Expressões simbólicas que favorecem a aspersão/efusão 3. |esus não altera o significado ou o uso do vocábulo 4. Exemplos de batismo por efusão 5. O elemento é aplicado ao sujeito e não o contrário 6. Batismos cristãos in situ 7. Resposta a três argumentos em favor da imersão 8. Nem o batismo de |oão nem o dos apóstolos era por imersão
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II - A QUEM St: DEVE BATIZAR A. Deus incluiu as crianças no pacto com seu povo 1. As promessas e as profecias são imutáveis 2. A identidade da igreja em ambas as dispensações 3. Composição da primitiva igreja cristã 4. A identidade da igreja, principal razão da inclusão das crianças B. O Novo Testamento confirma que os filhos dos crentes são membros da igreja C. A prática da igreja primitiva
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111- EXPOSIÇÃO PRÁTICA DO BATISMO DE CRIANÇAS
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ClIAR IM S H o i X i l :
A. Os pais 1. Sua fé com motor e condição do batismo 2. Sua fé como elemento benfeitor 3. Sua fé como fonte de benção divina 4. Sua fé como vínculo da criança comaigreja B. A igreja C. As crianças 1. O batismo regenera as crianças? 2. Benefícios derivados do batismo 3. O problema das deserções espirituais D. Deus Conclusão
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Capítulo 1 0 MODO DO BATISMO
Todos os protestantes crêem que o Senhor Jesus Cristo instituiu apenas dois sacramentos para sua igreja: o batismo e a santa ceia. Apesar de haver acordo com relação a isso, existem divergências sobre vários pontos relativos a essas ordenanças. No que se refere ao batismo, as diferenças dizem respeito ao modo, ao sujeito e ao efeito prático do sacramento. Os pastores da Igreja Presbiteriana não costumam discutir o modo de administrar o batismo, exceto quando provocados pela incessante insistência dos que adotam prática diferente da nossa. Isso não significa que nossa fé seja vacilante ou que pensemos que a Palavra de Deus seja obscura em relação ao assunto. Simplesmente, acreditamos que o modo de administrar o batismo é de importância relativa. Ou seja, não achamos que a validade dessa ordenança dependa da quantidade de água empregada ou do modo como a água é aplicada. Da mesma forma, a validade do outro sacramento — santa ceia — não depende do modo de administrá-lo. Supomos que todos aceitam essa maneira de ver a questão, pois se pode receber a santa ceia de pé, sentado, ajoelhado ou deitado; ao mesmo tempo em que se celebra um ágape ou não; na casa de um enfermo, na igreja ou no bosque; com mais ou menos pão ou com mais ou menos vinho. Na verdade não foi estabelecido um modo definido para celebrar a ceia do Senhor. Porém, o fato é que, segundo cremos, não há neste mundo uma única denominação cristã que pretenda celebrá-la exatamente como o Senhor a instituiu. Por que, então, o modo deve ser tão importante
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quando se trata do batismo? Essa pergunta não tem resposta s a tis fa tó ria . O modo de a d m in is tra r o batism o é, relativamente, de pouca importância. Há questões de muito maior relevância às quais devem dedicar-se os cristãos. Não existe, portanto, nada que nos obrigue a tratar do batismo, nem somos tão vaidosos a ponto de supor que vamos lançar nova luz sobre uma questão tão antiga. Apesar de tudo, há algumas razões gerais que demonstram que é oportuno dedicar-lhe ainda que seja um pouco de atenção. Em primeiro lugar, trata-se de uma ordenança cristã, que pertence à boa ordem da igreja e ao bem-estar, deveres e privilégios de seus membros. Assim deve ser entendida em todas as suas implicações. Em segundo lugar, em quase todas as igrejas há pessoas cujos critérios não estão bem fundamentados e cuja mente não tem sossego no que se refere ao assunto. Isso acontece particularmente onde há confronto com os que dão muita importância ao modo, tornando-o essencial, e que sempre entoam a mesma cantilena. Com o objetivo de ajudar essas pessoa, é preciso tratar dessa matéria, ainda que de modo sumário. Em terceiro lugar, nosso silêncio é, às vezes, mal interpretado, havendo quem diga que nossa forma de proceder não pode ser defendida pelas Escrituras. E, por último, existe uma grande denominação cristã — cujos membros nos regozijamos de reconhecer como irmãos em Cristo — que faz dessa ordenança uma condição de comunhão e uma prova de organização eclesiástica. Por todas as razões mencionadas, esse assunto deveria ser mais discutido em livros e nos púlpitos, ainda que sempre com o espírito manso, sem ofensa, cristão. É desse modo que pretendemos abordar a questão, pois a verdade não sofre menosprezo com esse método. A essência de nossa explicação pode ser decomposta em várias proposições particulares.
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A. 0 significado do vocábulo “ batizar” O modo do batismo não deve ser determinado com base no uso clássico das palavras empregadas para definilo. Freqüentemente, apela-se para tal uso como se isso fosse algo definitivo na questão. Afirma-se que bapco, baptizo e baptism os, etc., sempre e necessariamente expressam, em grego moderno, a idéia de imersão e que, por isso, devem ter o mesmo sentido quando são empregados pelos escritores sagrados. Nossa réplica é dupla: 1. Não tem um sentido único Em primeiro lugar, negamos totalmente essa hipótese. As referidas palavras nem sempre significam subm ergir. Freqüentemente se empregam com o sentido de derram ar sobre, la v a r , lim par, tingir, m anchar, etc., sem levarem conta forma concreta de alguma aplicação. Podem expressar imersão p arcial, imersão total, absorção ou efusão. Isso pode ser comprovado em qualquer bom dicionário da língua grega. De fato, nossos próprios irmãos batistas admitem que toda evidência está contra eles. Alexander Carson diz: “ Meu critério é que esse vocábulo ( baptizo) significa sempre submergir; e que sempre se refere ao modo. Pois bem: dado que tendo todos os lexicógrafos e comentaristas contra mim, será necessário dizer duas palavras a respeito da autoridade dos dicionários” .1 Com desesperada coragem, digna de m elhor cau sa, enfrenta "todos os le x icó g rafo s e comentaristas". O leitor pode imaginar qual será seu êxito nessa empreitada! Sua concessão demonstra, sem dúvida, que, segundo os melhores eruditos, aquelas palavras não têm o significado exclusivo e uniforme que ele lhes quer dar. Se os escritores gregos as empregaram em vários sentidos, como vamos, partindo de tão variados usos, estabelecer o sentido em que o Espírito Santo as utiliza ao p rescrever ou in s titu ir uma ordenança da ig re ja? Evidentemente, o testemunho clássico não nos serve.
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2. Não se emprega em sentido literal Em segundo lugar, supondo que os referidos versículos fossem usados de modo uniforme e que o Dr. Carson conseguisse demonstrar que eles sempre expressam a idéia de imersão, não se poderia concluir, necessariamente, que os escritores sagrados empregaram tais palavras com um único sentido. A palavra que designa a santa ceia não é utilizada no sentido fixo e uniforme que recebe entre os escritores profanos. Para eles, denota uma refeição completa, a principal do dia. Nunca significa comer um pedacinho de pão e tomar um gole de vinho. Não obstante, foi o que nosso Salvador fez ao instituir a cerimônia e foi só o que ordenou, ao dizer: “ Fazei isto em memória de mim” . Pois bem: se o sentido original e uniforme da palavra empregada, em relação a um sacramento, não se conserva, por que não pode ocorrer o mesmo em relação ao outro? Uma porção de água que se derrama ou se esborrifa sobre a cabeça do batizando está tão próxima da imersão quanto um pedacinho de pão e um gole de vinho de uma refeição oriental. Por essa razão, ainda que fosse certo que, no grego clássico, as palavras em questão sempre significassem ou favorecessem a idéia de imersão, não se poderia afirmar que esse tivesse de ser o seu sentido no Novo Testamento. Há na Bíblia muitas outras palavras gregas com significado completamente diferente do que têm no grego clássico. Por exemplo: logos, quando se aplica à segunda pessoa da Trindade: “ No princípio era o Verbo” . Algum escritor profano já empregou o termo com tal sentido? Negaremos por isso que na citada passagem esse termo tenha uma aplicação inspirada? Naturalmente, não. Porém, se num caso podemos separar-nos do uso comum, por que não podemos, com razão suficiente, fazê-lo no outro? Concluímos, portanto, que Dr. Carson não pode comprovar nada com seu argumento, ainda que este seja
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válido. 0 uso pagão não constitui a norma de interpretação das Escrituras. Às vezes pode ajudar a servir para confirmar, mas nunca deve servir de norma. Nós apelamos só para a Bíblia. Esta é a autoridade para os protestantes.
B. Os batismos dos judeus Em segundo lugar, o batismo, como prática, não foi uma novidade introduzida por Jesus, pelos apóstolos ou por João Batista, mas era uma cerimônia comum e já conhecida pelos judeus. Provavelmente isso difere da idéia disseminada entre muitos cristãos, especialmente entre os que insistem em que a imersão é o único modo de batizar. Tais crentes pensam que os judeus não conheciam nem praticavam nada semelhante; que João Batista, quando apareceu pregando no deserto, introduziu, por inspiração divina, um rito completamente novo; que o Senhor e os apóstolos o incorporaram à igreja cristã, quando esta começava a organizar-se; e que a própria forma da cerimônia foi disposta com a intenção de transformá-la numa prova para os crentes, uma espécie cie “ teste” de sua disposição para fazer ou submeter-se a qualquer coisa por causa de Cristo. Daí resultam, por um lado, a ostensiva declaração de que não se envergonham de seguir Cristo às águas e, por outro, a comum insinuação de que o modo contrário supõe orgulho ou a falta de disposição à abnegação. Em contraposição, afirmamos que a prática de batizar era comum entre os judeus desde muito antes da vinda de nosso Senhor (é claro que não em nome da Trindade). Essa cerimônia era um ato de purificação religiosa e, como ato, portanto, nada tinha de hum ilhante ou de prova de discipulado. Qualquer que fosse para o cristão a vergonha ligada ao batismo, não se devia ao ato, método ou m aneira de batizar, mas à profissão de fé no Nazareno. Este é um passo importante no argumento que nos propomos apresentar. Nosso primeiro argumento foi para
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simplesmente desbastar, ou seja, desembaraçar-nos das acusações tão insistentes sobre o sentido original e necessário das palavras. Sabemos que estas nada decidem: 1. porque, evidentemente, não têm um significado fixo e uniforme (apenas porque não há uma palavra, em qualquer língua deste mundo, que o tenha); 2. porque, ainda que o tivessem, isso não provaria que seu sentido, no Novo Testamento, fosse idêntico. Vamos, pois, à demonstração de nossa segunda proposição: batizar era uma prática corrente entre os judeus, muito antes do nascimento de Cristo. Procure o texto de Marcos 7.4, onde se lê: "quando voltam da praça, não comem sem se aspergirem; e há muitas outras coisas que receberam para observar, como a lavagem [o batismo] de copos, jarros e vasos de metal [e camas]". Veja também Lucas 11.38: “O fariseu, porém, admirou-se ao ver que Jesus não se lavara [b a tiz a ra ] prim eiro, antes cle com er” . Leia também Eclesiástico 34.25: 'Ao que se batiza depois de haver tocado um corpo morto, e torna a tocá-lo outra vez, de que lhe valerá o ter-se lavado?” (grifos nossos). Há que ter em conta que, nas versões portuguesas, temos as palavras aspergir, fazerablução, lavar, etc., porém, no grego, empregam-se os termos b atizar e batism os. E não há a menor dúvida de que tais termos se referem a ações comuns entre aquela gente, como a própria Bíblia demonstra: “ E quando voltam da praça, não comem sem se aspergirem” ; “e há muitas outras coisas que receberam para guardar, como a lavagem [o batismo] dos copos, jarros e vasos de metal [e camas]” . O fariseu, citado em Lucas 11.38, admirou-se de que Cristo não seguisse aquele costume e o texto de Eclesiástico 34.25 demonstra que se tratava de uma cerimônia comum. Não importa agora como os judeus se batizavam. A questão é que se batizavam e que o batism o, como ato, era algo norm al entre eles. Além disso, independentemente do que os termos b atizar e batism o implicassem ou expressassem, o ritual era praticado em pessoas e em diversos objetos, sendo um costume muito anterior à vinda de Cristo.
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Essas palavras foram, precisamente, as empregadas para designar o batismo de João e o do Pentecostes, ou seja, foram utilizadas para designar essa ordenança em todo o Novo Testamento. Oue os judeus se batizavam e batizavam objetos é um fato tão claro como o batismo de João ou de qualquer apóstolo, segundo vemos expressa e repetidamente assinalado. Por outro lado, um dos motivos de queixa contra o Salvador era que ele desprezava ou omitia esse costume ein algumas ocasiões; queixa muito estranha, por certo, se não houvesse existido tão generalizada cerimônia. O rito batismal também não foi de invenção humana. Na epístola aos Hebreus, o autor fala de “ diversos batism os impostos até ao tempo de se reformarem as coisas” (cf. Hb 9.10). “ Impostos” . Quando e onde? Com toda evidência, na lei de Moisés, que prescrevia minuciosamente as oferendas e sacrifícios que não podem “ aperfeiçoar aquele que presta culto” (Hb 9.9) e com as quais se associam esses batismos. É p ossível que o povo, em seu zelo supersticio so, acrescentasse algo aos detalhes de seus batismos, como o fez também com as oferendas e sacrifícios; porém, de qualquer maneira, tanto uns como outros (batismos, oferendas e sacrifícios) tinham sua origem num mandato divino, já que foram “ impostos até ao tempo de se reformarem as coisas". Q uando nosso Senhor veio, encontrou o povo praticando esses diversos batism os (o das pessoas, dos copos, das camas, etc.) habitualmente. Esse critério se vê confirmado pela forma normal e familiar com a qual o Novo Testamento trata a matéria. João apareceu batizando no deserto, porém não houve mostras de surpresas ou ignorância; não se dão explicações. Ele pregou “o batismo do arrependimento" (Lc 3.3), mas havia outros tais como o de copos, de camas e de pessoas que vinham da praça, etc. O que era novo era a doutrina que pregava, não a cerimônia que praticava. Essa prática todos conheciam havia muito tempo. Era algo que esperavam ver o Messias fazer, bem
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como todo profeta verdadeiro. Por isso, quando João lhes disse que não era o Cristo, nem Elias, nem o profeta, a pergunta imediata que lhe fizeram foi: “ Então, porque, pois, batizas?” (Jo 1.25), dando a entender claramente duas coisas: 1. que os profetas tinham o costume de batizar; 2. que esperavam que o Messias, quando viesse, fizesse o mesmo. As palavras que o Senhor pronunciou quando pediu o batismo são muito claras e demonstram aquele familiar uso e conhecimento da cerimônia: “ ... assim nos convém cumprir toda a justiça” (Mt 3.15b). A tal ponto era conhecido e normal que Jesus não se podia considerar devidamente de posse do seu cargo sacerdotal sem o batismo. Olshansen, comentando as palavras que acabamos de citar, diz: “O vocábulo iu stiça significa aqui aquilo que a lei exige. Essas palavras, portanto, contêm o princípio geral pelo qual o Senhor se conduzia e que João, do mesmo modo, tinha que observar nessa ocasião, a saber: obedecer a todas as ordenanças legais, como instituições divinas [...] O batismo de Jesus, portanto, é equiparável à sua circuncisão e purificação". Isto é, tratavase de algo que a lei exigia e, naturalmente, tinha de ser algo conhecido do povo. Assim, pois, o batismo não podia ser uma coisa nova para os judeus. Era uma prática cotidiana e normal, ainda que — repetimos — não se tratasse do batismo cristão, em nome da Trindade, mas de um ato aplicado tanto a pessoas como a coisas. Isso nenhum leitor da Bíblia, sincero e inteligente, poderá negar. Além disso, o batismo era uma cerimônia religiosa, e não um mero costume social, como demonstra a indicação de que os batismos eram “ impostos” , assim como os dons e sacrifícios, que, no tocante à consciência, são "ineficazes para aperfeiçoar aquele que presta culto” (Hb 9.9). Batismos, dons e sacrifícios eram "impostos” e, por isso, todos eram, igual e verdadeiramente, religiosos em sua natureza. Eram ordenanças religiosas e atos de adoração. Isso indica também o fato de que aqueles batismos se praticassem para tirar a impureza contraída na praça ou em qualquer outro lugar exposto. Com isso, as pessoas o praticavam para cumprir
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um fim religioso, do mesmo modo que o faziam com os sacrifícios que ofereciam. Nesse aspecto, o batismo era conhecido e praticado fazia muito tempo e está claro — quanto ao costume religioso comum — que nada indicava que tivesse sido ordenado para provar a fé daqueles que a ele se submetiam. Provavelmente, quase todos se haviam batizado muitas vezes ou haviam visto outros serem batizados e, portanto, não podiam ter qualquer preocupação especial em relação ao fato em si. Por mais importância que nossos irmãos batistas queiram dar agora ao espírito de inártir exigido para seguir Cristo às águas, o certo é que, em princípio, esse ato nada tinha como prova. Fosse qual fosse o modo ou forma de batismo, tratavase de algo corrente e, por isso, não podia causar ansiedade alguma nos que estavam a ponto de unir-se à causa de Cristo. A prova não estava na forma ou na maneira de praticar o ato, mas na pública adesão a uma causa odiada e a um nome desprezado.
C. Os batismos dos judeus não eram feitos por imersão O batismo conhecido e praticado entre os judeus não era feito por imersão, mas mediante a aplicação de água ou de outro elemento (uma vez que nem sempre se usava só água para batizar) na pessoa ou objeto, provavelmente, por efusão ou aspersão. Poderíamos agora pedir aos nossos irmãos batistas que nos demonstrassem que tais batismos eram feitos sempre por imersão. Levando-se em conta seus princípios exclusivistas, são, necessariamente, obrigados a fazê-lo; no entanto, não vamos esperar que realizem essa tarefa impossível. Trabalhando contra as regras normais da lógica, estamos, ao contrário, dispostos a assumir a tarefa de demonstrar uma proposição negativa: a de que tais batism os não eram feitos por imersão. E esse é outro passo importante em nosso argumento e, se pudermos afirmá-lo devidamente, deixaremos preparado o caminho para o passo seguinte.
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Vejamos as provas: 1. A imersão não está estabelecida Apesar de aqueles "d iverso s b a tism o s” serem “ impostos” ao povo como qualquer outra parte do ritual judeu (oferendas e sacrifícios, por exemplo), em parte alguma da lei de Moisés se estabelece a imersão como forma. Não se pode dar sequer um exemplo de que se exigisse ao judeu a imersão em água ou a submersão, em cumprimento a alguma cerimônia religiosa regular ou feita em qualquer outra ocasião. Isso é muito estranho, para dizer pouco, se se supõe que tal ato “ havia sido estabelecido” e era praticado diariamente. Onde está a prova? Se não existe um tal mandamento, que direito tem quem quer que seja de concluir que era assim que os judeus faziam com as pessoas e seus pertences? Temos, pois, para começar, uma fundada suspeita de que os batismos “ impostos até ao tempo de se reformarem as coisas” não eram por imersão. Em lugar algum se estabelece tal prática. 2. Os batismos (ou purificações) eram por aspersão ou efusão Essa suspeita torna-se ainda maior quando sabemos não só que a imersão não está registrada em lugar algum, mas também que é expressamente estabelecido outro método para levar a cabo essas purificações: “ assim lhes farás, para os purificar: asperge sobre eles a água da expiação...” ; “ Um homem limpo tomará hissopo, e o molhará naquela água, e a aspergirá sobre aquela tenda, e sobre todo utensílio, e sobre as pessoas que ali estiverem [...] O limpo aspergirá sobre o imundo ao terceiro e sétimo dias ...” (Nm 8.7; 19.1819). Assim, pois, na antiga dispensação estava claramente ordenado o modo como se devia purificar ou aspergir. Conseqüentem ente, supor que se b a tiz ava m ou se purificavam por imersão é im aginar que agiam sem
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mandamento ou, pior ainda, contra as mais claras instruções para a purificação. Seria provável que substituíssem uma forma ou outra, quando tanto se orgulhavam de observar com rigor a minuciosa referência a cada jota ou t il da lei? Uma atitude assim é totalmente improvável. Os batismos estavam “ estabelecidos" pela lei. Eram simples purificações, como todos os textos o demonstram, e não eram por imersão, mas por aspersão. Teriam todos os judeus desrespeitado o método estabelecido? 3. As aspersões e efusões são cham adas batism os Além de só ser ordenada a aspersão e nunca ser citada a imersão, no mínimo uns cento e cinquenta anos antes da vinda de Cristo o método de purificação por aspersão é, nos escritos judeus, designado pela palavra batizar. Preste-se atenção a esse ponto. A mesma palavra que, tantas vezes e em tanta confiança, nos dizem significar subm ergir — e nada senão isso — se aplica às aspersões judaicas. Eis aqui a prova: a tradução grega de Eclesiástico 34.25 diz: ‘Aquele que se batiza depois de haver tocado num corpo morto, e torna a tocá-lo, de que lhe valerá o ter-se lavado?” . Pois bem, o modo como alguém se batizava depois de tocar num cadáver é claramente referido na lei de Moisés: “ Todo aquele que tocar em algum morto, cadáver de algum homem, e não se purificar, contamina o tabernáculo do Senhor; essa pessoa será eliminada de Israel; porque a água purificadora não foi aspergida sobre ele, imundo será; está nele ainda a sua imundícia” (Nm 19.13). O fato de não ter-se batizado por tocar um morto, aspergindo-se com a água da purificação, tornava a pessoa imunda. Os versículos 19 e 20 de Números 19 revelam um método idêntico. Josefo também o descreve: “Quando alguma pessoa se contaminava com um corpo morto [...] ela se aspergia com a água da separação, no terceiro e sétimo dia e, depois disto, ficava limpa” .
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A ssim , pois, em tais ocasiões as pessoas se purificavam por meio da aspersão. E, sem dúvida, essa cerimônia era designada pela palavra grega b atizar , quando faltavam ainda cem ou duzentos anos para a era cristã. Sabendo que os judeus praticavam essa cerimônia e outras semelhantes no tempo de nosso Salvador ou de João Batista e constatando que ela era designada pela palavra b atizar , utilizada durante centenas de anos para indicar a aspersão, pode-se crer que eles realizavam seus batism os de outro modo? Cremos que não. Muito antes da vinda do Salvador, já se havia lido e ouvido que aspergir-se por ter tocado em mortos era como batizar-se por eles. Além disso, seria mera suposição afirmar que os diversos batismos eram realizados de outra m aneira, levando-se em conta particularmente o fato de nunca se ordenar nem se aludir a uma maneira diferente da aspersão, visto que esta é a forma ensinada no Antigo Testamento. 4. “ B a tiz a r” equivale a “ la va r” Outra prova de que aqueles batismos não eram por imersão está no emprego das palavras la va r e b atizar como termos equivalentes: “ ... pois os fariseus e todos os judeus, observando a tradição dos anciãos, não comem sem lavar cuidadosamente as mãos” (Mc 7.3,4). Veja-se também Mateus 15.2, comparado com Lucas 11.38: “O fariseu, porém, admirou-se ao ver que Jesus não se la v a ra [batizara] primeiro, antes de comer". “Àquele que se batiza depois de haver tocado num corpo morto, e torna a tocar nele, de que lhe valerá o ter-se lavado?” (Eclesiástico 34.25). Evidentemente, as palavras la va r e b atizar são usadas para descrever a mesma coisa. Porém, era por imersão que se la v a v a m ? Submergiam-se por causa dos mortos? Praticavam diversas imersões “ impostas pela lei"? Onde está a prova? A respeito das “lavagens” que são mencionadas no Novo Testamento, Olshansen diz: "Parece que usavam
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as mãos de forma alternada: com uma lavavam a outra". Ou seja: mergulhavam uma mão na água e, com a água que retiravam, lavavam a outra. Alguém pode chamar isso de imersão? No entanto, essas “ lavagens” são chamadas de batism os. Se la v a r e b a tiz a r são utilizadas de modo intercambiável, devem evocar a mesma idéia, ou seja, a de aplicar água ao objeto que se quer limpar. 5. O batism o judeu como rito cotidiano Entre os judeus o batismo era um costume conhecido e quase cotidiano. Não só se batizavam antes da refeição, ou batizavam as mãos antes de comer, ou batizavam mesas e camas, mas batizavam-se também por causa de outras impurezas, como, por exemplo, quando se contaminavam tocando um corpo morto. Pois bem, se isso era feito por imersão, cada família deveria ter um lugar apropriado. Nesse caso, o batistério seria tão essencial quanto a casa. No entanto, sem dúvida, em toda a história bíblica e judaica não há evidência alguma de que as famílias tivessem batistérios em casa, quer fossem ricas ou pobres, tivessem residência ou fossem nômades. Além disso, não tendo o necessário para praticar a imersão, seria necessário existir algo para fazê-lo de outra maneira. Os cântaros de pedra mencionados nas bodas de Caná da Galiléia, que estavam dispostos conforme o rito de purificação dos judeus (Jo 2.6), tinham como objetivo facilitar essa operação. Aquelas vasilhas, com capacidade para oitenta a cem litros, eram demasiado grandes para, simplesmente, mergulhar as mãos e não o suficientemente amplas para que nelas se submergisse uma pessoa ou outros objetos volumosos; porém, eram perfeitamente convenientes ao propósito de se tirar água delas e aspergir ou derramar sobre pessoa ou objeto. Certamente, essa era a forma pela qual se realizavam os batismos.
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6. Casos em que a imersão era im possível A sexta prova de que os batismos não eram feitos por imersão é o fato de que algumas das coisas batizadas não podiam ser submergidas. Tome-se como exemplo as mesas (ou camas, como diz uma segunda leitura). Não se sabe, com certeza, como eram essas mesas ou camas, porém seu tamanho e natureza tornavam improvável e difícil a imersão. Seguramente, eram suficientemente grandes para acomodar duas ou mais pessoas reclinadas e eram fixadas na parede da casa. Tais camas, desde logo, eram uso comum entre os judeus e necessitavam de purificação batismal, do mesmo modo que os outros objetos. Portanto, somos obrigados a descartar a imersão. Porém, limpá-las por meio da aspersão ou da efusão era fácil e, sem dúvida, assim era feito. O batismo desses móveis era tão certo como o das pessoas e, se dermos crédito à extraordinária probabilidade de que as camas não podiam ser submergidas, seremos obrigados a concluir que os judeus se batizavam sem se afundar na água. 7. Hebreus 9.10 e os batism os por aspersão ou efusão Podemos, ainda, acrescentar um último testemunho a este item. Na epístola aos Hebreus (9.10) faz-se menção a “ diversas abluções" e “ordenanças” impostas ao povo. )á notamos que a lei de Moisés não ordena a imersão e, em conseqüência, esses batismos “ impostos” não podiam ser feitos por imersão. Por outro lado, não podemos fazer deduções e conjecturas a respeito desses batismos. Pelo contexto imediato fica claro que eram batismos com “o sangue de bodes e de touros e a cinza de uma novilha, aspergidos sobre os contaminados" (Hb 9.13). O apóstolo contrasta o culto dos tabernáculos com a dispensação cristã. No primeiro, havia regulamentos em relação a comidas e bebidas e diversos batismos e ordenanças acerca da carne. O sangue dos
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diferentes animais on as cinzas de uma novilha aspergidos sobre os contaminados purificavam a carne. Na segunda, isto é, na dispensação cristã, é o sangue de Cristo que é eficaz. No primeiro, “ Moisés [...] tomou o sangue dos bezerros e dos bodes, com água, lã tinta de escarlata e hissopo e aspergiu não só o próprio livro, como também sobre todo o povo [...] Igualmente também aspergiu com sangue o tabernáculo e todos os utensílios do serviço sagrado" (Hb 9.19,21). Sem discussão, essas são as “diversas abluções” a que se refere Hebreus 9.10. Muito pouco há aqui, na verdade, para infundir a idéia de que tais batismos eram por imersão. Veja agora um resumo das provas alinhadas neste item. Afirm am os que os judeus, nos seus freqüentes batismos, não submergiam a pessoa ou o objeto, mas aspergiam ou derramavam o elemento sobre eles. As evidências são: 1. Não obstante haverem sido esses batismos impostos pela lei de Moisés, em lugar algum da lei se ordena a imersão. 2. A imersão não é prescrita nem insinuada, mas outro modo é ordenado claramente. 3. O modo ordenado, a aspersão, pelo menos dois séculos antes da era cristã recebe o nome de batismo. 4. L a va r e b atizar são palavras intercambiáveis. Nem para uma coisa, nem para outra se praticava a imersão. 5. Nas casas nada havia para praticar a imersão, ao passo que havia objeto apropriado para praticar a aspersão ou a efusão. 6. Entre as coisas que eram batizadas, havia algumas que não podiam ser submersas devidamente, mas podiam ser facilmente aspergidas. 7. Ao mencionar a aspersão, com relação àqueles diversos batismos, fica claro que essa era a prática adotada. Perguntamos, agora, se esta nossa terceira proposição não ficou estabelecida. Todas as considerações feitas para
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nossa conclusão formam um argumento sólido. Por outro lado, gostaríamos de saber que tipo de argumento se pode construir para demonstrar que todos esses batismos eram feitos por imersão.
D. A forma do batismo cristão e a forma do batismo judeu O batismo cristão foi instituído seguindo o modo do batismo dos judeus, ou seja, por aspersão ou efusão, e não por imersão. 1. Id ê n tic o s ig n ific a d o da á g u a n a s d u a s dispensações No Antigo Testamento, quando a água é utilizada com fins religiosos, seu emprego é feito por aspersão. Esse fato nos induzirá a esperar, como procedimento natural, que, no Novo Testamento, a água seja aplicada de modo idêntico ao do Antigo Testamento. Por que teria de ser mudado? Se a aspersão era suficiente antes, por que não o seria agora, principalmente se levarmos em conta que, em ambas as dispensações, é usada para o mesmo fim ? Nas duas dispensações é um emblema de purificação e consagração. Por que, pois, haveria de ser diferente a maneira de usá-la? Acaso uma grande quantidade de água será mais significativa do que uma pequena quantidade? Definitivamente, não! Por isso, se foi mudado o modo de usar a água no Novo Testamento, é necessário demonstrar tanto o motivo como o fato em si. Porém, nem uma coisa nem outra pode ser demonstrada. 2. E x p re s s õ e s s im b ó lic a s que fa v o re c e m a aspersão/efusão Por outro lado, não só existe base razoável para esse pressuposto como também aquilo que se vislu m b ra
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profeticamente do reino de Cristo nos leva a confirmar essa esperança: “Contudo ele aspergirá sobre muita gente” (Is 52.15MKJV);2 “ Então, aspergirei água pura sobre vós, e ficareis purificados; de todas as vossas imundícias e de todos os vossos ídolos vos purificarei” (Ez 36.25). Essas expressões são figurativas, mas mesmo assim têm significado. Indicam que o uso religioso da água é feito seguindo-se o mesmo método anterior. Não há nenhuma palavra a respeito de imersão; nem sequer um indício de que deva haver qualquer mudança nesse terreno. Ante a ausência de um mandado, devemos afirm ar que o uso idêntico que implicitamente se faz da água é um argumento em nosso favor. 3. Je su s não a lte ra o s ig n ific a d o ou uso do vocábulo Se a tudo isso acrescentarmos outro argumento, nossa suposição se fortalecerá ainda mais. Quando o Salvador veio e se dispôs a perpetuar em seu reino o uso simbólico da água, encontrou os judeus empregando o termo “ batizar” para denotar o seu método de purificação, que era por aspersão ou efusão. Jesus utilizou a mesma palavra para d esignar sua própria ordenança, sem indicar que o significado tivesse mudado. Teria sido assim se ele pretendesse introduzir uma nova forma de batismo? Não. É impossível sustentar tal suposição. Não há dúvida de que, ao usar a mesma palavra, queria significar a mesma ação que os judeus designavam com ela. 4. Exem plos de batism o por efusão Vejamos agora algumas provas mais diretas de nossa afirmação. A forma pela qual se menciona o batismo do Espírito Santo é completamente oposta à idéia de imersão; quanto ao modo, em contrapartida, favorece a idéia de derramamento ou aspersão. Observe a linguagem empregada
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neste texto de Atos: sereis batizados com o Espírito Santo, não muito depois destes dias” (At 1.5). No capítulo seguinte, encontramos o cumprimento dessa promessa. Estando todos os discípulos reunidos num mesmo lugar, o Espírito veio sobre eles com grande poder, e o apóstolo disse: “ ... é o que foi dito por intermédio do profeta Joel: [...] derramarei do meu Espírito sobre toda a carne” (At 2.16,17a). Aqui temos, indiscutivelmente, um batismo por efusão e, além disso, um batismo no mais elevado sentido da palavra. É certo que o modo pelo qual o Espírito Santo age é, para nós, um profundo segredo; no entanto, já que a Bíblia o representou como um derramamento, e o chamou de batismo, é muito apropriado que o entendamos assim, e não segundo nossas próprias idéias. Quando, em imediata relação com o derramamento do Espírito, se menciona o batismo com água de cerca de três mil pessoas, não podemos cre-r que estas tenham sido mergulhadas na água em vez de se aplicar a água sobre elas. O mais sublime batismo, o do Espírito Santo — do qual o outro é um tipo — é por efusão. Será o tipo administrado de um modo totalmente diferente? 5. contrário
O elem ento é ap licad o ao su jeito e não o
As Escrituras ensinam continuamente que o elemento se aplica ao sujeito e não o sujeito ao elemento: “ Eu, na verdade, vos batizo com água [...] ele vos batizará com o Espírito Santo e com fogo” (Lc 3.16); “ Eu batizo com água [...] esse é o que batiza com o Espírito Santo” (Jo 1.26,33b); “Porque João, na verdade, batizou com água, mas vós sereis batizados com o Espírito Santo” (At 1.5); "Porventura, pode alguém recusar a água, para que não sejam batizados estes que, assim como nós, receberam o Espírito Santo?” (At 10.47). Em todos esses casos se aplica o elemento ao sujeito, e não o contrário. Assim o demonstra regularmente a Escritura e julgamos que isso pesa muito contra a idéia da imersão.
( ) lÍA.ltSAIO C r ISIÁO. ISthRSÂO (>!■ ASPHRX-iO
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6. Batism os cristãos in sicu 3 É significativo o fato de que, nos tempos apostólicos, as pessoas eram batizadas no lugar em que se convertiam, quer fosse na cidade, quer no deserto; numa casa ou em qualquer caminho; na prisão ou à margem do rio; no inverno ou no verão, não havia demora nem mudança de roupa, nem saída para um lugar adequado para a imersão. Ouando alguém cria, no mesmo instante e no mesmo lugar, havia sempre o necessário para ser batizado. Por isso, é muito difícil acreditar que isso fosse possível no caso de ser praticada a imersão. Pode-se supor, está claro, mas é uma suposição por demais improvável. 7. R e sp o sta a três a rg u m e n to s em fa v o r da imersão Os diversos casos de batismos relatados na Escritura estão mais de acordo com a idéia de aspersão ou efusão, quanto ao modo, do que com a imersão. Por outro lado, há três coisas (e só três) que se aduzem como apoio para a imersão em tais batismos: 1. O significado atribuído à palavra b atiz ar, como se, necessariamente, em todos os casos, expressasse a idéia de submergir-, 2. O uso das preposições cm (dentro) e de (fora de);4 3. A expressão aplicada a João, o Batista: “João estava também batizando em Enorn [...] porque havia ali muitas águas” (Jo 3.23). Essas objeções podem ser facilmente rebatidas. Quanto à primeira, negamos que o vocábulo b atiz ar signifique apenas subm ergir ou m erg u lh ar.5 Nabucodonosor foi “ batizado” com o orvalho do céu (Dn 4.33); o povo foi batizado, com respeito a Moisés, na nuvem e no mar (ICo 10.2). O Espírito Santo caiu sobre o povo em cumprimento
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da promessa:"... sereis batizados com o Espírito Santo” (At 1.5; 2.3,16,17; 10.44). As pessoas se batizavam por causa dos mortos — isto é, depois de haver tocado um corpo morto (Eclesiástico 34.25; Nm 19.13) — e quando regressavam do mercado. Em nenhum desses batismos havia imersão. Em conseqüência, negamos o significado atribuído ao vocábulo batizar. Quanto às partículas em (dentro) e de (fora de), é preciso dizer que o normal é traduzir as preposições gregas correspondentes por a e de (procedência); portanto, com a mesma razão, se podia ter feito assim nesses casos, como acontece, por exemplo, em João 20.4 (“ ... o outro discípulo correu mais depressa do que Pedro e chegou primeiro ao sepulcro") e em Lucas 12.36 (“ Sede semelhantes a homens que esperam pelo seu senhor, ao voltar ele das festas de casamento" — grifos nossos). As referidas preposições se traduzem nesses casos por a t de (procedência), que é sua acepção comum. Portanto, com tais preposições nada se pode provar a respeito do modo do batismo. Podem significar simplesmente à água ou da água. E mesmo no caso de precisarem ser traduzidas por em ou de (fora de) não se poderia afirmar que se tratava de imersão, pois se pode concluir, com a mesma facilidade, que se está à margem de uma corrente de água ou de um tanque. Por outro lado, qualquer pessoa versada em grego sabe que a expressão “ muita água” , no original, significa “ muitas águas", ou seja, m uitasfontes ou arroios. Não há dúvida de que tais águas eram de pouca importância, pois não podia haver muitos rios caudalosos perto de Enom. Não havia senão as pequenas fontes de que as multidões — que atendiam ao ministério de João — necessitavam para beber. Tais fontes, porém, não serviam para a imersão. Além disso, se para submergir é necessária “ muita água” , por que a frase diz “ muitas águas” ? João não podia utilizar mais águas que a de um arroio e, com isso, ficaria cumprido o seu propósito. E, insistindo mais, se esse era o seu propósito, por que deixou o
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Jordão para fixar-se a li? Onde estava havia água em abundância. Para que buscá-la em outro lugar? Portanto, essa frase não tem força alguma para determinar o modo do batismo. Parece, pois, que todos os argumentos que favorecem a imersão podem ser facilmente desfeitos. O vocábulo batism o não significa o que pretendem os partidários da imersão. As partículas traduzidas por em e de (fora de) podem significar também a e de (procedência). “ M uita água” sig n ific a sim p lesm ente m u ito s a rro io s ou fo n te s, imprescindíveis para a necessidade da multidão. Devemos dizer, por conseguinte, que argumentos tão vagos não provêm senão de um débil fundamento para os exclusivistas dogmas de nossos irmãos batistas. Fora disso, todo o resto, tanto em fatos como em circunstâncias, está inteiramente contra a opinião que eles mantêm, como agora nos esforçaremos em demonstrar.
8.
Nem o batism o de João nem o dos apóstolos
era por imersão Os primeiros exemplos de batismo são os do precursor de Cristo. É verdade que o batismo de João não era cristão. No entanto, quanto ao modo era, sem dúvida, idêntico ao que Cristo e os apóstolos adotaram. João submergia aqueles que batizava? Cremos que não. Em primeiro lugar, por fa lta de tempo. Mesmo que durante o seu ministério não tivesse feito outra coisa senão batizar, não teria podido submergir as multidões que iam a ele para ser batizadas, constituídas por moradores de “Jerusalém, toda a Judéia e de toda a circunvizinhança do Jordão” (Mt 3.5). Seu ministério durou de dezoito meses a, no m áxim o, dois anos. A d m in istro u o batism o principalmente antes do aparecimento público de nosso Senhor, e as multidões referidas foram a João antes de Jesus aparecer. É impossível admitir que, em tão pouco tempo, ele tivesse podido submergir toda aquela gente.
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Por outro lado, se não lhe tivesse faltado tempo, certamente lhe teriam fa lta d o fo rç a s , pois seria necessária resistência super-humana para permanecer na água e submergir tão grandes multidões. Em terceiro lugar, não f o i ele quem introduziu a cerim ônia do batism o. Deparou-se com o hábito que o povo já tinha de batizar-se e de batizar também camas, vasos, etc., e fazia isso como cerimônia de purificação, seguindo todas as prescrições da lei levítica, por aspersão ou efusão. Não existem provas de que os judeus jamais o fizessem por imersão. Mesmo admitindo que metiam as mãos na água quando voltavam do mercado, não se demonstra com isso que eles a submergissem. Metia-se também um pássaro no sangue do outro (Lv 14.6) e se metia a mão no prato, sem que houvesse imersão. Não há provas de que, nas cerimônias de purificação, submergissem o corpo ou as mãos. Ao contrário, há muitas razões para crer que as aspergiam. E, não obstante essa prática, o que faziam era um batismo. E, visto que se emprega essa mesma palavra para descrever o rito que João praticava, somos levados à conclusão inevitável de que o batismo de João também era por aspersão. Vejamos agora os batismos do Pentecostes. Estavam todos reunidos num mesmo lugar; foram batizados do alto pelo derramamento do Espírito sobre eles; falaram em outras línguas; muitos creram e foram batizados com água. Naquele mesmo dia foram acrescentadas à igreja umas três mil almas. Foram submergidos esses convertidos? Para responder afirmativamente, só se pode recorrer ao pretenso significado da p alavra batism o (subm ergir), significad o que já descartamos. Porém, para negá-lo, amontoa-se uma série de circunstâncias que proíbem fazer essa suposição. Não houve tempo, pois, ao que parece, só os onze apóstolos estavam ali para oficiar, e não teriam podido submergir tantas pessoas numa fração de dia. Mesmo supondo que os setenta discípulos os ajudassem, era mais do que todos eles podiam fazer nesse espaço de tempo. Além disso, não havia lugar para realizar essa forma de batismo,
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nem no templo nem em seus arredores, onde estavam reunidos. Nem na cidade ou em suas proximidades havia um lugar em que pudessem levar a cabo esses batismos por imersão, subm ergindo uma tão grande m ultidão de conversos em tão pouco tempo. Se havia esse lugar, não temos prova de que tenham ido a ele. Não há provas de que tenham esperado para mudar de roupa ou de que, depois da imersão, andassem pelas ruas com roupas molhadas, gotejando. Tudo isso, além do fato de o primeiro grande batismo ter sido pelo derramam ento do Espírito sobre eles, se opõe fortemente à idéia de imersão, ao passo que se harmoniza perfeitamente com a da aspersão ou efusão. Para essa forma de batismo havia tempo suficiente; o lugar onde estavam bastava, e não era necessário ir à procura de outro; não era preciso mudar de roupa e, portanto, nem era necessário buscá-la. Ninguém precisou voltar molhado para casa. Não há contradição entre o batismo do Espírito e o da água. A palavra b atizar é empregada em ambos os casos com o mesmo sentido, pois tanto a água como o Espírito são derramados sobre as pessoas. Não são suficientes todas essas considerações para contestar as poucas e únicas afirmações que os batistas exibem em favor da palavra — ou seja, que a palavra batizar significa submergir — ainda que, como reconhece o Dr. Carson, ‘‘todos os lexicógrafos e comentaristas" estejam contra o seu critério? Vejamos agora o batismo de Saulo de Tarso, à luz do qual se impõe, forçosamente, a mesma conclusão. Ouando Saulo se dirigia a Damasco, respirando ameaças de morte contra os discípulos, o Senhor Jesus lhe apareceu com um resplendor que o cegou. Caiu por terra e ouviu uma voz que lhe dizia: “Por que me persegues?". Temeroso e espantado, perguntou: “Quem és tu, Senhor?". Conduziram-no, em seguida, a uma certa casa em Damasco, onde permaneceu três dias e três noites sem comer nem beber. Nessa circunstância, Ananias, guiado por Deus, foi ao encontro de
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Sauio e, depois de havê-lo instruído durantes alguns momentos, lhe disse: "E agora, que te impede? Levanta-te e batiza-te” . E, imediatamente, levantando-se,Joi batizado (At 9.1-19). Foi por imersão? A única prova em sentido afirmativo é, mais uma vez, o pretendido significado da palavra batizar. Nada mais há em favor dessa posição. Ao contrário, todas as circunstâncias são contra a tese da imersão. Na mesma casa, em pé, sem demora para preparar-se, sem sair nem entrar, pôs-se imediatamente ao serviço de Cristo.
Supor que havia um tanque em casa, ou que foram a outro lugar, no estado em que se encontrava Paulo, fraco, depois de jejuar três dias e três noites (além de não haver menção a esse lugar), é ir longe demais, recorrendo a meras suposições para dar força às partes fracas de um argumento. Ninguém há mais veemente na recusa e na condenação de tal expediente do que os partidários da imersão. E, sem dúvida, como comprovamos, ninguém é mais inclinado a recorrer a esses expedientes do que eles. Tudo é suposição: que b atizar significa subm ergir, contra toda razão; que a tradução correta das partículas gregas eis e apó é em (dentro) e de (fora de), contra o uso normal do Novo Testamento; que era necessária muita água para batizar tanta gente, e em Jerusalém, nos arredores do templo, onde não havia tanta água, foram batizadas, por imersão, três mil pessoas, em poucas horas, fato que não é mencionado. Supõem , igualmente, que Paulo encontrou um lugar adequado para batizar-se por imersão na casa de Judas ou foi a outro lugar onde havia água suficiente para isso. Supõem... afinal, o que não supõem? E, no entanto, esses são os irmãos que exclamaram: “ Mostra-me um assim diz o SenhorV' — como se eles tivessem o hábito de guiar-se por essa luz. As observações que acabamos de fazer sobre o batismo de Saulo podem ser apreciadas com a mesma força no caso do batismo do carcereiro e sua família. Convertido na prisão a altas horas da noite, e batizado junto com os seus, imediatamente, sem sair daquele lugar, que instalação havia ali para a imersão? Acaso teriam ido a algum rio em plena
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noite? Construíram um lugar para banho ali mesmo? Ouantas suposições faltam aqui para convencer alguém de que se tratava de uma imersão? E tudo isso pelo fato de se fu ndam entarem — contra todos os lex icó g rafo s e comentaristas — no prévio pressuposto de que o termo batizar significa subm ergir. Por outro lado, torna-se simples o relato se se levar em conta que, para o povo judeu, era uma coisa normal batizar-se por aspersão ou efusão. Paulo e Silas estavam no calabouço “ mais interior” . Ali os encontrou o carcereiro, cheio de temor, já livres de suas cadeias. Levou-os para o pátio e lhes curou as feridas, batizando-se em seguida, ele e os seus. Depois os fez entrar em sua casa e os reconfortou (At 16.2734). Desse modo é tudo natural e fácil. Examinemos agora o batismo de Comélio e sua família. A respeito desse episódio, se diz que “caiu o Espírito Santo sobre todos os que ouviram a palavra [...] admiraram-se porque também sobre os gentios foi derramado o dom do Espírito Santo"; “ ... caiu o Espírito Santo sobre eles, como também como sobre nós, no princípio. Então, me lembrei da palavra do Senhor, quando disse: João, na verdade, batizou com água, mas vós sereis batizados com o Espírito Santo” ; “Porventura, pode alguém recusar a água, para que não sejam batizados estes que, assim como nós, receberam o Espírito Santo?” (At 10.44,45; 11.15,16; 10.47). Esses são os fatos. Pedro batizou por imersão aquelas pessoas? De um lado, não há mais do que uma suposição contra toda evidência. Nada mais. De outro, porém, temos o fato de que, segundo parece, o batismo foi realizado na casa de Comélio e também o fato de que o derramamento do Espírito Santo sobre eles os fez pensar que os termos batizar, derram ar e ca ir — aplicados ao Espírito Santo — assinalavam uma idéia semelhante à da água. Além disso, a questão de recusar ou im pedir a água ou significa que tinham de levar a água à casa, para a cerimônia, ou não tem sentido. Se aquelas pessoas tivessem de ser submersas em alguma corrente de água ou tanque público, quem as impediria de ir a um lugar
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com condições para isso? Ao contrário, na casa, no momento de realizar o ato, a pergunta tem sentido: pode alguém impedir que se faça aqui, imediatamente? Chegamos, agora, ao caso de Filipe e o eunuco (At 8.2639), que comumente se tem como o mais claro e decisivo em favor da imersão. Em sua viagem, o pensativo etíope lia aquela bela passagem de Isaías na qual se faz clara e especial menção de Cristo e de seu reino: “ ... como cordeiro foi levado ao matadouro” (Is 53.7). Na mesma passagem se diz: “ Ele aspergirá muitas gentes” (Is 52.15).6 Parece que Filipe lhe explicou toda a passagem e, quando chegaram a lugar onde havia água, o eunuco disse: “ Eis aqui água; que impede que seja eu batizado? [...] ambos desceram à água, e Filipe batizou o eunuco. Ouando saíram da água, o Espírito do Senhor arrebatou a Filipe...” . O eunuco foi submergido? Os que respondem afirmativamente têm de assumir duas coisas: 1. Oue b atizar significa subm ergir; 2. Que as partículas gregas devem ser traduzidas por em (dentro) e de (fora de). Já conhecemos a resposta a essas duas suposições: b atizar não significa o que supõem e as preposições podem ser traduzidas normalmente por a e de (procedência). No caso em questão podem significar simplesmente isso. E, mesmQ que o sentido seja de uma entrada real na água e a subseqüente saída dela, não fica demonstrada a imersão. Leve-se em conta que as sandálias podiam ser facilmente tiradas (o que estaria bastante de acordo com os hábitos orientais) e que, depois de descerem à água, Filipe batizou o eunuco por aspersão ou efusão. Por outro lado, é duvidoso que, no lugar deserto em que se encontravam, houvesse uma corrente de água suficiente para submergir uma pessoa. Tudo indica que não esperaram para obter roupas próprias para o batismo e não é provável que o viajante trouxesse alguma consigo ou que entrasse na água com a roupa que trazia no corpo. A passagem que estava lendo no livro de Isaías, e
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que induziu Filipe a falar-lhe de Cristo e do batismo, faz pensar que o modo do batismo ali administrado foi por aspersão, e não por imersão: “ Ele aspergirá muitas gentes” (Is 5 2 .1 5 ).7
Todos esses exemplos de batismo registrados no Novo Testamento são suficientemente detalhados para lançar luz no que concerne ao modo do batismo. Segundo vimos, em todos os casos, com exceção de dois, o único argumento em favor da imersão é a suposição gratuita de que b atizar significa subm ergir. Em todos esses casos existe a suposição adicional a respeito das partículas gregas eis e ap ó , traduzidas como em c de (fora de), ou melhor, a e de (procedência). Essas são as únicas razões da parte dos batistas. Não é, pois, de estranhar que o Dr. Carson se sentisse chamado a empreender a titânica obra de deixar assentado um sentido exclusivo e definitivo do vocábulo batizar. Porém, se não consegue levar adiante sua empreitada, nada mais tem a dizer. E se, além de tudo, b atizar é o termo que se aplica à purificação de pessoas e coisas — purificação que se fazia por aspersão ou efusão — , então, sua causa está totalmente perdida. Mas deixemos essa questão. Estas páginas não foram escritas porque desejamos discutir com os irmãos batistas. Ainda que acreditemos que o modo não é essencial para a validade do batismo, podemos reconhecê-los — e o fazemos — como um ramo verdadeiro da igreja de Cristo, apesar de não seguirem eles o modelo bíblico. Sua causa se apóia em margens muito estreitas — como são o significado assumido de um verbo e duas partículas — , ao passo que tudo o mais está contra eles. Se se contentam com isso, tudo bem. Porém, que não pretendam cortar nossa liberdade ou amarrar-nos com cordas de areia. Nosso modo de batizar está de acordo com a Escritura e é também o mais edificante; é o modo que se adapta a todas as idades, climas e constituições físicas. Se tivéssemos as mesmas convicções a respeito da imersão,
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adotaríamos esse modo. Porém, como não as temos, sentimc nos impelidos a defender e a manter o nosso modo de batizar.
Capítulo 2 A QUEM SE DEVE BATIZAR
Admite-se, universalmente, que o batismo pode ser administrado, com toda propriedade, aos crentes adultos, se não foram batizados anteriormente. Como a respeito desse ponto não há opiniões diferentes, não nos estenderemos nessa discussão. Porém, serão os crentes as únicas pessoas a quem se pode batizar? Nossos irmãos batistas dizem que sim, ao passo que nós, com a maior parte da igreja cristã, não concordamos. Nós cremos que os filhos dos crentes, já que fazem parte da igreja visível, devem ser batizados. O próprio Senhor Jesus Cristo delegou aos crentes a obrigação e o privilégio de, mediante essa ordenança, consagrar-lhe o fruto de seu matrimônio. Em defesa dessa d ou trin a u tiliz a re m o s três argumentos que, combinados, formam um poderoso bloco impossível de ser derrubado ou removido por nossos oponentes. Certamente, esses argumentos não são novos, mas merecem nossa atenção. Considerar, pois, como permanecem essas antigas colunas e como se relacionam — no templo da verdade — reafirmará as convicções dos que crêem, em lin has gerais, no mesmo que nós e, possivelmente, servirá também para convencer aqueles que pensam de modo diferente do nosso.
A. Deus incluiu as crianças no pacto com seu povo 0 primeiro ponto para o qual queremos chamar a atenção é o seguinte: na constituição original da igreja, o
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pacto que Deus estabeleceu com seus escolhidos inclui os filhos destes. Aplicava-se a eles o sinal visível ou o selo do pacto e, por essa razão, enquanto não for demonstrado que tal pacto foi abolido ou que os filhos dos fiéis foram excluídos dessas provisões ou disposições, eles ainda têm direito ao mesmo privilégio. A simples passagem de tempo ou a mudança de circunstâncias ou a substituição de um selo por outro — não os afeta. Sua posição é a mesma de que sempre gozaram desde o princípio, a menos que tenham sido excluídos do pacto. A igreja pode ser comparada com uma sociedade estatuída e dotada de certos direitos e privilégios. Se, no decurso do tempo, não foram revogados os estatutos de tal sociedade nem foi ela dissolvida, mas tivessem de ser introduzidas algumas mudanças — tais como substituir um sinal antigo por um novo, mudar o campo de operações, readaptar o ministério ou coisas parecidas — , estas só afetariam a sociedade até onde elas alcançassem e na área em que ocorressem. No entanto, todos os direitos e privilégios originais subsistiriam, a menos que tivessem sido anulados ou modificados por uma legislação posterior. Tudo o que podia ou não podia ser feito até então, se não foi posteriormente proibido ou permitido por modificações introduzidas, continuaria da mesma forma. No que se refere a qualquer organização humana, não há dúvida de que essa afirmação é correta. Não se pode afirmar que uma sociedade organizada ganha ou perde algo pelo fato de se modificarem seus estatutos, com exceção d aq u ilo que está expressam ente m an ifesto ou necessariamente implicado nessas modificações. Tudo aquilo que não é modificado permanece como antes. Isso se aplica também em relação à igreja. Todos os seus direitos, privilégios e obrigações, conforme aparecem na antiga dispensação, estão em vigor ainda, se não foram cancelados pela nova. No princípio, os filhos do povo de Deus estavam incluídos no pacto. Este jamais foi abolido.
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As crianças nunca foram excluídas. Portanto, na verdade, são parte dele e têm o direito de receber seu selo. Neste ponto, nos damos conta de que, no que se refere à força desse argumento, tudo depende da visão que tenhamos da igreja cristã. Se esta é uma organização totalmente nova e independente da antiga dispensação, certamente não há relação entre ela e a antiga instituição, e, assim, o argumento exposto até aqui perde todo o seu peso. No entanto, se a vemos como uma perpetuação da p rim itiva igreja de Deus, sob uma forma um pouco modificada, o argumento é. válido e inquestionável. Portanto, é imprescindível examinar esse ponto antes de prosseguir. A igreja cristã é uma organização totalmente nova ou é, simplesmente, a continuação modificada da única igreja de Deus? Acreditamos que seja válida a última proposição, isto é. sustentamos a identidade do homem que é o mesmo, a mesma pessoa, tanto quando jovem como quando adulto, ainda que o seu aspecto, a idade e as circunstâncias tenham mudado. Nossos irmãos antipedobatistas adotam o primeiro critério, ou seja, afirmam que a igreja não é a mesma, mas é uma nova organização que sucedeu a antiga, e não a perpetuou. Essa absoluta separação entre o novo e o antigo tem sido, às vezes, levada a tal extremo que tem chegado a negar que as Escrituras do Antigo Testamento façam parte de nossa regra de fé. Pode ser — admite-se — que elas contenham coisas boas, verdadeiras e até proveitosas na História, na doutrina e na biografia. Porém, o Novo Testamento é a nossa única regra de fé. Nossas relações com o Antigo Testamento, como lei, não são diferentes das que mantemos com as velhas constituições e leis coloniais, sob as quais viveram nossos antepassados, antes de o nosso país ser composto de Estados independentes. Parece ser essa a conclusão que se deduz de semelhante teoria a respeito da igreja, conclusão que não deixa de ferir nossa sensibilidade cristã. Não vale a pena discutir essa questão, mas será útil observar algumas das
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muitas considerações que se encarregarão de estabelecer a identidade da igreja em ambas as dispensações. 1. As promessas e as profecias são im utáveis As promessas e profecias das Escrituras cobrem totalmente o período da existência da igreja. E, em seu espírito, letra e alcance nos apresentam, evidentemente, um só e idêntico corpo. Começam com a igreja em seus primeiros tempos e continuam com seu posterior e mais amplo d ese n vo lvim e n to , coisa que im p lica co n tin u id a d e , p rosperidade e crescim ento, porém que d escarta completamente qualquer idéia de que a igreja de então tivesse de ser substituída por outra posterior: “O Senhor Deus vos suscitará dentre vossos irmãos um profeta semelhante a mim; a ele ouvireis em tudo quanto vos disser” (At 3.22); “ Mas, nos últimos dias, acontecerá que o monte da Casa do Senhor será estabelecido no cume dos montes [...] e para ele afluirão os povos” (Mq 4.1); “ Levanta-te, resplandece” — diz o profeta a Sião, como antecipação de sua glória. “Dispõete, resplandece, porque vem a tua luz, e a glória do Senhor nasce sobre ti [...] As nações se encaminham para a tua luz, e os reis, para o resplendor que te nasceu [...] Então, o verás e serás radiante de alegria; o teu coração estremecerá e se dilatará de júbilo, porque a abundância do mar se tornará a ti [...]” (Is 60.1,3,5). Citações como essas poderiam ser multiplicadas quase indefinidamente, se fosse necessário. Acreditamos, porém, que as citadas sejam suficientes para mostrar que a igreja de então não deveria ser substituída, mas ampliada e engrandecida, recebendo em seu seio o mundo gentílico. Era assim que os judeus piedosos entendiam esses textos, e olhavam o porvir com exultante gozo que antecedia seu cumprimento. A igreja sempre considerou que essas promessas seriam cumpridas, em parte, em seu próprio engrandecimento e que apontavam para uma bendita herança.
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2. A identidade da igreja em ambas as dispensações Como complemento a essa argumentação, deve-se notar, também, que as declarações formais, didáticas e argumentativas do Novo Testamento ensinam claramente a mesma coisa, a saber, ensinam a identidade da igreja em ambas as dispensações: “ edificados sobre o fundamento dos apóstolos e profetas, sendo ele mesmo, Cristo Jesus, a pedra angular" (E f 2.20). Os gentios são “ co-herdeiros, membros do mesmo corpo e co-participantes da promessa em Cristo Jesus por meio do evangelho” (E f 3.6). Por meio de Cristo, judeus e gentios têm acesso por um mesmo Espírito, ao Pai, e são, portanto, concidadãos e membros da família de Deus (cf. Ef 2.18,19). A oliveira plantada no princípio continua sendo a mesma. Os velhos e decadentes ramos podem ter-se quebrado e outros novos, da oliveira brava, foram enxertados nela, mas a árvore continua sendo a mesma. Esse ilustrativo argumento do apóstolo carece totalmente de sentido e adequação se a igreja não tem sido preservada. 0 mesmo se pode dizer do fato de Cristo ocupar agora o trono de Davi. Onde estaria a realidade e a pertinência de uma declaração semelhante se o trono de Davi tivesse perecido? Nesse ponto, o Novo Testamento ensina claramente — a respeito da identidade da igreja — o mesmo que as promessas e profecias do Antigo. Essas considerações ilustram e confirmam umas às outras e seriam suficientes para tornar firme nossa posição, mesmo que nada mais pudéssemos dizer em apoio de nossa tese. 3. Composição da prim itiva igreja cristã A história da igreja cristã, em seus primeiros passos, está plenamente de acordo com os ensinos do Antigo e do Novo Testamentos. O teor uniform e das declarações proféticas era de que Sião sobreviveria e seria engrandecida e Davi jamais teria falta de um sucessor que se sentasse em
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seu trono. O testemunho constante e invariável dos apóstolos é de que S iã o perm anece, recebe seu prom etido engrandecimento e agora está sob o senhorio de Cristo, sentado no trono de Davi. Ouem compunha a igreja primitiva? Os crentes judeus, inquestionavelmente. Conservaram as Escrituras judaicas; tinham recebido o Messias prometido à igreja judaica; pediam para si todas as promessas feitas a Sião, como herança que lhes pertencia: “ Sabei, pois, que os da fé é que são filhos de Abraão” (G1 3.7). Todos os apóstolos eram judeus. Durante um tempo considerável não falaram “ a ninguém a palavra, senão somente aos judeus" (At 11.19). Por indicação divina, abriram a porta aos gentios, introduziram-se entre eles e lhes pregaram o Evangelho, em outro tempo dado a conhecer a Abraão. Poderíamos dizer que, por terem recebido a Cristo e pregado seu nome a outros, separaram-se da igreja de Deus e perderam o direito que tinham às promessas? Certamente, não. Era isso, precisamente, o que os unia à única e viva igreja de Deus, e os mantinha nela. “ E, se sois de Cristo, Lambém sois descendentes de Abraão e herdeiros segundo a promessa (G1 3.29).
4. A id entidade da igreja, p rin cip a l razão da inclusão das crianças Além de todos esses fatos e ensinos, a identidade da igreja pode ser estabelecida de outra maneira. O objeto de adoração e culto é o mesmo: o Deus vivo e verdadeiro. Porém, é necessário que todos os que o adoram e lhe prestam culto adequadamente, em qualquer época, lugar ou país, tenham a mesma religião e pertençam à mesma igreja. Na verdade, que é a igreja senão a congregação ou companhia dos que prestam culto ao verdadeiro Deus? O caminho da salvação é também o mesmo ein ambas as dispensações, a saber, a fé em Jesus Cristo: “ Eis que ponho em Sião uma pedra angular, eleita e preciosa; e quem nela
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crer não será, de modo algum, envergonhado" (1 Pe 2.6). Esse foi o Evangelho que Deus "anunciou a Abraão" (cf. Gl 3.8). Cristo era a glória, a formosura e fortaleza tanto da antiga como da nova dispensação. Seus tipos, cerimônias e sombras apontavam para ele, e assim o entenderam os fiéis: 'Abraão, vosso pai, alegrou-se por ver o meu dia, viu-o e regozijouse" (|o 8.56); "... porque bebiam de uma pedra espiritual que os seguia. E a pedra era Cristo" (ICo 10.4). Os crentes daquele tempo (verdadeiramente cristãos, ainda que não fossem chamados por esse nome) eram como nós. Pode-se dizer, portanto, que se trata de uma igreja nova ou diferente, vivendo, como vive, na fé do mesmo Salvador? Em ambas as dispensações, encontramos a mesma total dependência do poder do Espírito Santo. Nas duas rege a mesma lei: "Não por força nem por poder, mas pelo meu Espírito" (Zc 4.6). A natureza da vida que se recebe é, também, idêntica em ambas as dispensações — o amor a Deus e ao próximo, como suma e compêndio espirituais do mandamento que diz: "Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todas as tuas forças e de todo o teu entendimento; e: amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Lc 10.27). Assim, em todos os aspectos existe identidade entre as duas dispensações: um mesmo objeto de culto e adoração; um mesmo mediador entre Deus e os homens; um mesmo Espírito de vida e poder; uma mesma disposição interior de que todos participam. Pedimos ao leitor que repasse, por um momento, o que já antecioamos em prol da identidade da igreja, que cremos ter ficado estabelecida: pelo teor uniforme das provas e profecias da Escritura; pelo ensino consciente e invariável dos apóstolos; pelos fatos ocorridos nos primeiros tempos da história da igreja cristã; pela unicidade ou identidade das duas dispensações quanto ao objeto de culto, ao caminho da salvação por Cristo, à dependência do Espírito Santo e à disposição espiritual do povo.
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A igreja de Deus, em cujo seio a constituição original incluía os filhos dos justos, é, indiscutivelmente, a mesma em ambas as dispensações e ainda goza desse privilégio, a menos que se demonstre que eles foram excluídos. Insistimos, portanto, no fato de que os que negam esse direito devem mostrar em que autoridade se baseiam. Se em outro tempo a semente dos justos foi contada como pertencendo à igreja, com que autoridade é ela, agora, excluída da igreja? A obrigação de provar isso, com justiça, recai sobre nossos oponentes, e não sobre nós. Eles exigem de nós um "assim diz o Senhor” para admitir os filhos dos crentes na igreja. Nós, porém, exigimos um testemunho igualmente explícito para excluí-los. Enquanto esse testemunho não nos for apresentado, sustentaremos que uma prova direta, em nosso favor — que sirva para receber na igreja os filhos dos crentes — não é necessária e nem sequer há razão para esperá-la. Por que deveria existir um testemunho ou mandamento a respeito se a prática da igreja havia sido uniforme nesse particular? Os privilégios da semente dos justos permanecem em vigor, a menos que tenham sido proibidos. Existe uma posição assim? Nossos oponentes devem apresentá-la. Porém, estamos totalmente seguros de que jamais poderão fazê-lo... Eles nos dizem que não há menção e x p lícita do batism o de cria n ça s no Novo Testamento; porém, a resposta óbvia é de que o silêncio, mesmo que o admitamos, não o excluiu. Não temos uma repetição do quarto mandamento na nova dispensação e, sem dúvida, nem por isso perde a validade a lei do dia do descanso. Esse antigo mandamento está ainda em vigor. Também nada se diz, no Novo Testamento, a respeito da participação das mulheres na ceia do Senhor, mas nem por isso elas ficam excluídas da mesa da comunhão. Comiam a Páscoa e eram membros da igreja na antiga dispensação; por isso, com toda justiça, se não foram proibidas, têm direito aos privilégios correspondentes na nova. Assim, pois, não se necessita de mandamento para
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admiti-las, mas para excluí-las. Enquanto um mandamento em co n trá rio não for encontrado, seus p riv ilé g io s permanecem em toda a extensão e integridade. Tudo indica que participavam, ainda que isso não fosse ordenado nem se mencionasse o fato expressamente, pois, pelo que vemos, não houve necessidade de fazê-lo. É exatamente isso o que ocorre no caso das criançasmembros. Foram recebidas segundo os estatutos originais e sempre estiveram incluídas na igreja. Não houve, portanto, necessidade de se determinar sua admissão. Porém, ao mesmo tempo, todas as alusões incidentais (com o ve re m o s a g o ra ) m o stram que e la s fo ram recebidas com seus pais. Certamente não necessitamos de maior autoridade do que essa e, nas circunstâncias, não poderíamos esperá-la. As crianças ocupavam o seu lugar na igreja como as mulheres o seu, na mesa de comunhão, a menos que tivessem sido proibidas. O silêncio das Escrituras é significativo para o nosso modo de pensar e agir. Se tivesse havido a intenção de excluir da Páscoa cristã as mulheres ou de revogar o quarto m andam ento, ambos os pontos teriam sido mencionados. Visto que coisa alguma nos é dita a respeito e estando clara a prática dos apóstolos, esses antigos costumes permanecem imutáveis. Se existisse a intenção de privar as crianças de seu scatus na igreja, ela se teria manifestado. Não havendo nada a respeito, as crianças permanecem no seio do pacto e têm direito ao seu selo. Tem-se dito, porém, algumas vezes, que a filiação das crianças era parte do ritual mosaico e que, portanto, terminou quando este perdeu a validade. Isso não é verdade, pois a filiação infantil não era parte do ritual mosaico. Admite-se, geralmente, que a igreja se inicia como comunidade organizada com a família de Abraão, uns quatrocentos anos antes de Moisés, e já então se considerava e ensinava que as crianças eram membros dela: “ Estabelecerei a minha aliança entre mim e ti e a tua descendência no decurso das
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suas gerações, aliança perpétua, para ser o teu Deus e de tua descendência [...] Esta é a minha aliança, que guardareis entre mim e vós e a tua descendência: todo macho entre vós será circuncidado” (Gn 17.7,10). Essa é a lei que estatui a filiação das crianças, e que foi dada muito antes de Moisés aparecer. A revogação do ritual mosaico, decretada num período posterior, não pôde causar efeito algum sobre o pacto original. Um juízo imparcial bastaria para certificar-se disso; porém, temos o testemunho da inspiração, que trata diretamente desse ponto: “ ... uma aliança já anteriormente confirmada por Deus, a lei, que veio quatrocentos e trinta anos depois, não a pode ab-rogar, de forma que venha a desfazer a promessa" (G1 3.17). Os antigos estatutos permanecem ainda intocados pela lei cerimonial. Poderíamos dar uma resposta bem parecida com essa, ou seja, poderíamos alegar que a comunidade israelita era uma organização secular e que as crianças pertencem também à igreja cristã, que é um corpo espiritual. A resposta é que a igreja israelita, ainda que se regesse por um código civil e cerimonial que foi dado por Deus a Moisés — , era também um corpo espiritual e incluía as crianças muito antes de suas leis civis serem promulgadas. O povo de Deus no Antigo Testamento adquiriu organização com a família de Abraão, quatrocentos anos antes de Moisés. A lei cerimonial foi um apêndice acrescentado para reger o culto a Deus e para prenunciar o Redentor até a vinda de Cristo. Depois da vinda de Jesus, o ritual nacional, com todos os seus tipos e sombras, foi anulado. Porém, tal anulação em nada afetou o pacto original feito com Abraão, que ainda permanece para ele a sua semente, de modo tão certo como no dia em que foi estabelecido pela primeira vez. Tal pacto está em vigor como verdadeiro fundamento da igreja invisível. Os crentes são agora os filhos do fiel Abraão, e o pacto e a promessa são para eles e seus descendentes tão legítimos como no princípio, por mais que a lei de Moisés, no que se refere a
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algumas de suas exigências, tenha sido revogada. Esse é, pois, o primeiro argumento, e poderíamos dizer que é o principal, para admitir os filhos dos crentes na igreja visível. Assim foi estabelecido por mandado divino, na organização original da igreja, na família de Abraão. A constituição da igreja, quanto a isso, jamais foi alterada. O privilégio dos filhos não cessou, nem acabou a obrigação dos pais. A semente dos justos ainda tem o direito de ocupar um lugar no reino visível. A única via de escape, à força, desse argumento é a negação da identidade da igreja em ambas as dispensações. Mas, como já vim os, isso é impossível. A igreja de Deus é uma — uma família de filhos, uma irmandade de crentes — em qualquer época ou nação e quaisquer que tenham sido as modificações externas introduzidas. A menos que os filhos de pais crentes tenham sido excluídos, estão ainda no seio da dita família. Antes de passar para o próximo argumento em favor de nossa tese, propomos a consideração de três pontos preliminares, bastante apropriados. Oue a igreja incluía, originalmente, os crentes e seus descendentes é um fato inquestionável. O pacto compreendia ambos e também se aplicava a seu selo. Assim, pois:
1. Se nosso Salvador e os apóstolos houvessem introduzido uma mudança tão importante e radical, como é a exclusão de metade dos membro da igreja, o menos que podemos supor, razoavelmente, é que deveriam ter feito alguma menção específica a respeito. De outro modo, como poderíamos conhecer suas intenções? Porém, a respeito disso não se faz a mais leve referência. Ao contrário, como veremos em seguida, muitas são as indicações diretamente opostas, que aparecem como demonstração de que a mesma ordem já estabelecida deveria continuar. É isso possível segundo a teoria de que tanto o Senhor como os apóstolos tiveram a intenção de suspender a filiação infantil da igreja?
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b) Se in tro d u z iram sem elhante m udança na constituição da igreja, é improvável que o fato tenha passado despercebido a amigos e inimigos. Os judeus apreciavam, em grau máximo, a relação do pacto que os unia a Abraão. Por outro lado, eram particularmente sensíveis no que se referia à separação — por menor que fosse — de suas leis e costumes. E não teriam eles reparado no que nos ocupa se, na verdade, tivesse acontecido? No caso de terem ficado em silêncio, não teriam os próprios discípulos de Cristo pedido uma explicação? Se pertenciam à igreja no passado, os filhos dos crentes deveriam ser excluídos dela posteriormente? Se até então tinham gozado de uma relação peculiar com Deus, deveriam, agora, ser colocados em pé de igualdade com os filh o s dos p agão s? É totalm ente in c rív e l que não encontremos nenhuma alusão de amigos ou de inimigos a tais mudanças, se elas, de fato, foram introduzidas na igreja. E não consta nem uma só palavra, nem de amigos nem de inimigos, que implique ter-se introduzido qualquer mudança a respeito desse assunto. Ao contrário, há muita coisa que denota a continuidade da antiga prática. Como é possível conciliar isso com a tese batista? c) Se não h a via m udança algum a prevista na constituição da igreja e se os privilégios dos crentes, nesse particular, tinham de continuar como até então, não deveríamos esperar como norma uma determinação expressa pela qual se incorporassem à igreja os filhos dos crentes junto com seus pais (pois tal determinação era desnecessária, já que isso era o que se cria e praticava), mas uma alusão incidental ou ocasional a essa prática como uso ou costume em vigor. E é isso, precisamente, o que encontramos, segundo procuramos mostrar. Não há referência alguma a mudança nem se tem notícia de discussão ou queixa de parte alguma que dê a entender ter havido tal mudança. Há apenas alusões e relatos que mostram, claramente, a continuidade da ordem estabelecida.
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B. 0 Novo Testamento confirma que os filhos dos crentes são membros da igreja Utilizaremos agora alguns testemunhos como um segundo argumento em favor de nossa tese. Em primeiro lugar, tomemos a declaração do apóstolo Pedro a seus irmãos judeus:"... para vós outros é a promessa, para vossos filhos e para todos os que ainda estão longe” (At 2.39). Como judeus, estavain acostumados a associar sua prole a todos os privilégios e bênçãos relacionados à igreja. Se deviam ser despojados desse privilégio ao se tornarem cristãos, é estranho que Pedro mencione, da forma como o faz, a relação do antigo pacto. “Arrependam-se e sejam batizados, cada um de vocês, porque o pacto é para vocês e para os seus filhos." Pedro teria feito tal afirmação se acreditasse que os pais, ao crer em Cristo, veriam seus filhos excluídos da igreja? Acreditamos que não. Pode ser que a linguagem que usamos não deva ser considerada uma prova do batismo infantil, porém, segundo o nosso melhor modo de entender, essa linguagem é totalmente hostil à idéia de que a descendência dos crentes tenha uma condição menos favorecida na nova do que na antiga dispensação. Dizemos isso com base no pressuposto de que o pacto de Deus com seu povo é imutável a esse respeito. Além disso, a afirmação de Pedro aparece quase no princípio da dispensação cristã, ocasião em que — se devia ser instituída uma ordem totalmente nova ele estaria obrigado a fazer afirmação inteiramente diferente. Em vez de deixar que os pais inferissem a continuidade do status de seus filhos, Pedro deveria terlhes dito claramente que, a partir de então, seus filhos não receberiam mais o selo do pacto. Examinemos agora a importante passagem de 1 Coríntios 7.14: "... o marido incrédulo é santificado no convívio da esposa, e a esposa incrédula é santificada no convívio do marido crente. Doutra sorte, os vossos filhos seriam impuros; porém, agora, são santos” . Em que sentido
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são “ santos” os filhos quando um dos pais é crente? Não são santos inerentemente, pois nem quando ambos os pais são fiéis se pode dizer que o sejam. Deve referir-se ao pacto ou à relação eclesial em que os filhos estão postos. E, sem que haja lugar a dúvida, a intenção de Paulo era resolver uma dificuldade prática que surgiu muito cedo na igreja. Parece que os cristãos não sabiam o que fazer quando só um dos cônjuges era convertido. Essa dificuldade não poderia existir se as crianças, de qualquer modo, tivessem de ser excluídas, supondo-se até o caso de ambos os pais serem crentes. Diante dessa dúvida, o apóstolo diz que a fé de um dos pais basta para garantir a posição das crianças no pacto. Não havia por que excluí-las. “ Baseado na mais serena e imparcial consideração desta passagem” , diz Dodridge, “ devo julgar que ela se refere ao batismo infantil. Está claro que a palavra santo significa alguém que pode ser admitido na participação dos ritos distintivos do povo de Deus” . Scott diz: “ Não posso senão concluir, depois de ter prestado grande e delida atenção ao tema, que temos aqui uma clara referência ao batismo dos filhos dos crentes, como costume normal na igreja daquele tempo” . Não existe outra interpretação p lausível da passagem que nos ocupa aqui. Olshansen, que nega a referência do texto ao batismo infantil, descobre que o benefício que recai sobre o cônjuge incrédulo está enraizado "na importante idéia de que uma santificação relativa pode ter lugar, simplesmente, mediante o trato freqüente com os que a possuem” . “ Naqueles que estão estreitamente unidos aos crentes, sem submeter-se plenamente à influência deles", diz Olshansen, “ é sempre de imaginar-se certa resistência; porém, o infinito poder de Cristo se une às melhores qualidades que há neles, elevando-as até determinado nível". E na santidade ou pureza que a passagem atribui aos filhos do casal do qual só um cônjuge é crente, Olshansen só encontra “ uma destinação à conversão e, inquestionavelmente incluído, o meio que a facilita. Esta é a bênção de ter progenitores
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crentes". Sombra de Abraão! E, não obstante, admite que, “no pensamento que o Apóstolo expressa aqui, reside a plena autorização à igreja que instituir o rito do batismo infantil. O que pertence aos filhos dos cristãos, em virtude de seu nascimento, lhes é afirmado no batismo e se lhes oferece, plena e realmente, em sua confirmação espiritual” . I-Iá outra alusão a crianças, de natureza menos definida, nas familiares palavras de nosso Salvador: “ Deixai vir a mim os pequeninos e não os embaraceis, porque dos tais é o reino de Deus" (Lc 18.16). O reino a que o Senhor se referiu era a igreja. As crianças eram levadas a ela desde o começo. Se a partir daquele momento devessem ser excluídas, a declaração de Jesus seria, certamente, estranha. Em vez de esperar uma continuidade explícita de seus direitos, deveríamos esperar uma explícita negação deles. Não podemos senão crer que teria sido assim se a intenção de Jesus fosse afastar as crianças de sua posição no pacto. Essa seria, certamente, uma ocasião apropriada para a promulgação de uma nova ordem. No entanto, estava longe de proceder dessa maneira, pois, na verdade, bem parece que ele sancionou o antigo uso. Essa é a forma pela qual os crentes têm entendido as palavras de Jesus e, com alegria, têm consagrado a ele o fruto de seu matrimônio, na doce confiança de que serão guardados como cordeiros de seu rebanho e recebidos finalmente no reino celestial. Estariam eles alimentando uma falsa ilusão? Essas são algumas das principais alusões que mostram que, tanto na antiga como na nova dispensação, os filhos dos crentes estão incluídos no pacto e têm direito ao seu selo. O Senhor Jesus disse que eles pertenciam ao reino. O apóstolo Pedro afirmou que a promessa os inclui. E, num caso em que os crentes não sabiam o que pensar ou fazer, receberam instruções reconhecendo a posição dos filhos. Cremos que essas alusões, a falta de outras que as contradigam e a relação com a antiga prática da igreja devem pesar na decisão relativa a esse assunto. Parece-nos
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inconcebível que essas ratificações tenham sido dadas se a semente dos justos nunca mais fosse admitida no reino visível. O terceiro dos nossos argumentos, que exporemos a seguir, reforça grandemente o que cremos.
C. A prática da igreja primitiva A prática da igreja primitiva parece haver coincidido com a interpretação que temos dado e com o antigo costume do povo de Deus. Encontramos a evidência disso nos batismos de famílias ou casas inteiras que aparecem no Novo Testamento. Destes, estão claramente relatados quatro: o da família de Cornélio, de Lídia, de Estevão e do carcereiro. Temos também referência a outros quatro em que o batismo das crianças é bastante provável (os das casas de Crispo, de Onesíforo, de Aristóbulo e de Narciso). É muito difícil acreditar que em nenhuma dessas fam ílias houvesse crianças. Tomemos ao acaso algumas famílias de qualquer comunidade ou época, e a probabilidade de encontrar crianças em alguma delas será quase de mil em uma. É digna de destaque, também, a forma com que se menciona o batismo de uma dessas famílias, pois parece indicar um costume que prevalecia: “ Depois de ser batizada, ela e toda a sua casa ...” (At 16.15). Parece que o batismo da família era tão natural como o do pai ou do chefe da casa. Esse detalhe é significativo também quando nos lembramos de que, na antiga dispensação, sempre que um pai prosélito, por exemplo, professava a verdadeira religião, a ordenança iniciadora se aplicava à sua família ao mesmo tempo que se aplicava a ele, pois ele e os seus eram circuncidados e consagrados, publicamente, a Deus pelo selo do seu pacto. A alusão a essa cerimônia deve ter sido tão natural, como a feita em relação ao batismo de Lídia. Circuncidavase alguém com sua família. Se se batizava alguém com sua família, o segundo era batizado tão naturalmente como o
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primeiro, em seguida à conversão. Nada podia ser mais natural e sem artifício do que afirmar diretamente que, segundo a natureza do pacto e da prática comum dos apóstolos, ela e os seus eram recebidos na igreja pela mesma ordenança, com base na fé individual de Lídia. Esse e os demais casos mencionados devem ser considerados somente como amostra do que era comum naquele tempo. A simples alusão passageira a esses fatos é inexplicável em qualquer outra teoria. Pode-se mostrar que a história anterior da igreja confirma a conclusão a que esses argumentos nos têm levado. Porém, preferimos, por enquanto, expor apenas o enfoque bíblico do tema, o qual qualquer pessoa capaz de raciocinar pode compreender e apreciar. Se se aceita isso, nada mais é necessário. E, se temos falado nisso, não desejamos que a história não inspirada nos apóie. As principais proposições que temos defendido são: que os filhos dos crentes estavam incluídos no pacto, que pertenciam à igreja e que, na organização original da casa de Deus (cuja constituição não foi ab-rogada e é, todavia, a norma da igreja), recebiam o batismo. Portanto, estão ainda incluídos no pacto e, naturalmente, ainda lhes pertence o rito de iniciação. Se alguém os deixa de fora, deve explicar em que mandamento se baseia para excluí-los. Isso de modo algum pode fazê-lo. Porém, em vez de esperar que nos dem onstrem a exclusão, mostramos como d ive rsas declarações implicam, claramente, a continuidade de tal costume sob o Evangelho. Por conseguinte, a prática da igreja parece ter-se fundamentado nisso. Como observamos no princípio, cada um desses argumentos tem seu próprio peso; porém, combinados, reforçam-se e confirmam-se mutuamente de maneira incomensurável. Deus, primeiramente, deu guarida aos filhos dos crentes em sua igreja e, já que não os excluiu, continuam pertencendo a ela. Só isso deveria bastar. Poderíamos deternos aí e esperar, tranqüilamente, que nossos opositores
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provassem que as crianças foram excluídas da igreja. Porém, continuando, mostramos que Cristo e seus apóstolos ensinaram a permanência continuada das crianças no pacto. Na falta de algo que o contradiga, isso reforça a primeira conclusão. Por último, para completar a demonstração, provamos que a prática dos apóstolos, assim como suas instruções didáticas, era também favorável ao batismo infantil. Naqueles dias, os pais crentes apresentavam seus filhos para receber o batismo de forma tão natural como eles mesmos se apresentavam. Ouem somos nós, pois, para impedir que se faça a mesma coisa hoje? Cremos que o privilégio e a obrigação estão apenas menos claros do que estiveram a respeito da circuncisão. Já refutamos alguns dos argumentos mais correntes que se opõem ao nosso modo de ver as coisas. Certamente, não existe mandamento para batizar crianças; porém, o silêncio a respeito não as exclui. Não era necessário um novo requerimento. A antiga prática da igreja e o exemplo dos apóstolos fornecem tudo quanto de informação e autoridade necessitamos. Para excluir as crianças seria necessária uma proibição que, sem dúvida, teria sido feita se as crianças tivessem de ser depostas de sua primitiva posição. As crianças eram membros da igreja de acordo com o ritual mosaico — diz-se — , coisa que já acabou quando este foi revogado. Não negamos totalmente essa afirmação. Dita filiação foi instituída na família de Abraão e, quanto à sua origem e continuação, nada tem que ver com Moisés. Mas — responderão - - a igreja israelita era uma organização secular e sua filiação não pode implicar a mesma coisa na igreja cristã, que é um corpo espiritual. Respondemos a isso dizendo que a igreja de então existia anteriormente e independentemente da organização nacional e que, então, era um corpo espiritual tanto quanto o é agora. A dispensação israelita era apenas um sistema transitório, com um propósito específico, estatuído muito depois de a igreja existir e concluído, mas seu fim não afetou o pacto.
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Uma ou duas objeções mais exigem nossa atenção antes de terminar. Diz-se que as condições para receber o batismo são o arrependimento e a fé. Só aqueles que podem cumprir essas duas condições são sujeitos adequados para receber o sacramento. Se as crianças não podem arrepender-se nem crer, não devem ser batizadas. Nossa resposta é tríplice: 1. A mesma forma de raciocínio as exclui também do céu, pois o arrependimento e a fé são as condições que se exigem tanto para o batismo como para a salvação. “Testificando tanto a judeus como a gregos o arrependimento para com Deus e a fé em nosso Senhor Jesus [Cristo]" (At 20.21) era a súmula da pregação de Paulo. “ ... se, porém, não vos arrependerdes, todos igualmente perecereis” (Lc 13.3); “ ... o que não crê já está julgado, porquanto não crê no nome do unigénito Filho de Deus" (Jo 3.18). Como as crianças não podem arrepender-se nem crer, não podem salvar-se. 0 argumento prova demais e, portanto, não serve para nada. 2. Os testemunhos aduzidos têm que ver com os adultos, porém nada provam com respeito às crianças. Isso é o que comumente se crê quanto à sua salvação, no caso de eleitos morrerem na infância. E por que não há de ser certo também no que se refere ao batismo? 3. Na antiga dispensação, exigia-se dos prosélitos a fé e a submissão a Deus. Seus filhos eram incapazes de realizar esses atos; não obstante, eram recebidos pela autoridade do pacto e recebiam seu selo. Por que não temos de seguir a mesma ordem na nova dispensação? No entanto, nos dizem: que bem lhes pode trazer o batismo? Não pouca chacota se tem feito, às vezes, à custa dos pedobatistas (que batizam crianças) em função dessa pergunta. A aspersão de crianças inconscientes é considerada o supra-sumo da idiotice. O mesmo poderiam ter dito alguns, se é que já não o fizeram, a respeito da circuncisão. Que sentido tem a circuncisão e qual é a vantagem de submeter os meninos a uma cerimônia tão dolorosa? Porém, antes, ó homem, quem és tu para discutires com Deus? Ouem somos nós para acusar
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Deus de néscio? Conhecer o que ele exige deveria bastarnos. Até aqui, a nossa primeira resposta. A segunda é que nossa incapacidade para descobrir a utilidade da ordenança não prova que esta não tenha valor. A água não tem eficácia purificadora em si mesma — jamais o imaginamos; mas seu uso religioso, na forma prescrita, pode ser valioso. Se consagramos nossos filhos a Deus, com espírito de amor e submissão a ele, quem poderá dizer que, por meio do batismo e da instrução que ele implica, não possa descer uma bênção inefável sobre cada uma das partes interessadas: pais, filhos, igreja e mundo? É um fato notável que a igreja de Deus se tenha mantido e perpetuado, de século em século, em grande parte, pelas famílias dos justos. Quem poderá dizer em que medida a consagração de sua semente a Deus pode ter contribuído para o seu próprio bem-estar, para o consolo dos pais, prosperidade de Sião e bem do mundo? Estamos convencidos de que o cumprimento dessa ordenança tem trazido bênção incalculável e que eliminar seu uso na igreja seria altamente nocivo e perigoso. Apesar de todas as solenes considerações e vantagens que a reforçam, estamos inclinados, lamentavelmente, a descuidar da devida instrução de nossos filhos e eles, por sua vez, estão inclinados a ter em pouca conta o grande bem que lhes traz e suas próprias obrigações. Qual seria o resultado se esse batismo desaparecesse da igreja? Contudo, não podemos agora deter-nos nesse particular. É possível que, em outra ocasião, discutamos as conseqüências práticas e o valor da ordenança. Uma vez estabelecido o ininterrupto privilégio de considerar nossos filhos juntos conosco na arca e de consagrá-los ao nosso Deus, guardador do pacto, nos deteremos aqui. A cada etapa de nossa argumentação, temos mais e mais nos convencido de que nosso comportamento é bíblico e de que, em sua consciente observância, se funda a razão que temos para esperar a bênção divina.
Capítulo 3 EXPOSIÇÃO PRÁTICA DO BATISMO DE CRIANÇAS Os filhos de pais crentes devem ser admitidos na igreja visível por meio do batismo. São santos não simplesmente pelo ato formal do pai, que os consagra a Deus, mas em virtude do pacto de Deus com seu povo, pelo qual os incorpora a seu reino visível com o intuito de prepará-los para o reino eterno e espiritual. É o mesmo que ocorre com todos os governos humanos, que ligam os filhos ao Estado por causa cle sua relação com os pais, ficando aqueles sob as leis destes, à espera da cidadania plena, que passam a gozar quando alcançam a maioridade. Por sua constituição original e inalterada, o reino visível de Deus inclui em seus termos os crentes e seus descendentes. Em conseqüência dessa disposição divina, o selo do pacto foi aplicado a ambos nos dias de Abraão, e desde então tem sido feito sempre assim, tanto na antiga como na nova dispensação. Sem repetir os argumentos já aduzidos, queremos agora apresentar as implicações práticas desse importante tema. Não somos pragmáticos. No sistema teológico e filosófico que sustentamos, a utilidade não é o fundam ento nem a m edida da virtude. E, sem d ú vid a, estamos convencidos de que, em todos os planos da providência e da graça, o dever e a utilidade apontam para a mesma direção: “ ...a piedade para tudoé proveitosa, porque tem a promessa da vida que agora é e da que há de ser” (lTm 4.8). Devemos considerar suas vantagens, pois só assim nossa mente perceberá a sabedoria e a bondade divinas. Por conseguinte, nos esforçaremos em fazer assim, apresentando do modo mais claro possível todas as partes dessa transação, suas
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m útuas relações, suas promessas, com prom issos e obrigações. Acreditamos que assim se verá que o batismo, em todos os seus aspectos, é sumamente benéfico e bíblico. Segundo nossa concepção, há quatro partes nesse pacto: os pais, a igreja e as crianças, de um lado, e o Deus trino, de outro lado. Todos estão íntima e profundamente envolvidos. Os três primeiros, ainda que distintos, estão de um mesmo lado, como se fossem partes aliadas. Deus, porém, como parte única, está do outro lado, mantendo uma relação maior com os três unidos a ele por meio do pacto. Assim, quando tratarmos cada uma das partes, não nos será possível deixar as outras isoladas, uma vez que existe tão íntima relação entre elas. Porém, nos fixaremos isoladamente em cada uma dentro do possível e na ordem que acabamos de indicar. A igreja tem o dever de compreender o que significa essa solene ordenança em toda sua extensão.
A. Os pais Os pais figuram em primeiro lugar, pois são, pelo menos neste momento, a parte mais profundam ente interessada na transação. Para eles há derivações e implicações de incalculável importância. 1. Su a fé como motor e condição do batism o O direito de levar o filho ao batismo depende de uma condição moral interna, ou seja, da fé: “Porque o marido incrédulo é santificado no convívio da esposa ["crente"] [...] Doutra sorte seus filhos seriam impuros; porém, agora, são santos" (ICo 7.14 — grifo nosso). O ato de batismo provoca estas perguntas: sou filho de Deus? Possuo a fé que protege esta criança “ santa” , ou seja, “ separada” , que Deus incorpora ao seu reino invisível? Se não, que faço eu aqui? Sem fé é impossível agradar a Deus. Assim, imediatamente, os pais
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se confrontam com um exame de consciência e se vêem levados a renovar sua consagração. Nesse espírito levam a cabo a oferta, com a sincera e firme esperança de que o Deus providente e misericordioso aceite o cordeiro. 2. Sua fé como elemento benfeitor Por outro lado, a fé dos pais e seus propósitos a respeito da criança são bíblicos e saudáveis. A criança é impura por natureza. Pertence a um gênero humano decaído e tem de nascer de novo pelo poder do Espírito Santo. Por isso, fez-se dela oferta a Deus para sua purificação. Os pais fiéis, por estar profundamente convencidos da depravação da criança, prometem guiar e vigiar seu descendente com o mais terno cuidado. Ao mesmo tempo, prometem cultivar sua própria mente e seu coração para tratar com justiça e ordenar a conduta e a conversação da criança visando à devida formação desta. Com espírito de oração e grande solicitude, prometem evitar o que possa ser pernicioso e prover o necessário às necessidades de seu filho. Freqüentemente, suas deficiências constituirão motivo de profundo arrependimento e humilhação diante do Senhor, levando-os a renovar sua fidelidade. Em tudo isso há uma garantia, não pouco valiosa, de que a criança crescerá rodeada de santas influências. 3. Su a fé como fonte de bênção divina A fé dos pais é muito importante para as relações da criança com Deus, pois aquela é propriedade deste. Elas nos são emprestadas para que lhes demos uma formação santificada. O Senhor se interessa pela criança e a protege, levando em conta a fidelidade ou a infidelidade dos pais. Deus se solidariza com a preocupação dos pais e coroa com suas bênçãos os esforços do amor paternal. Os filhos não são nossos, mas de Deus. Jesus disse que as crianças lhe pertencem. Por amor a elas, de acordo
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com nosso anelo e segundo a fé cristã implantada em nosso coração, Deus ajudará na obra que colocou em nossas mãos. Ele tocará nosso coração para despertar-nos à fidelidade e tocará também o coração dos filhos quando nós não pudermos fazê-lo, de um modo que não está ao nosso alcance. Ele ouvirá nossa oração e regará a semente plantada. Fará que nossos cuidados resultem em benefícios para que, no final, entremos na glória com os filhos que ele nos deu. A fé nessa providência tem um valor que sobrepassa toda definição. A ordenança do batismo a estimula. 4. Su a fé como vínculo da criança com a igreja No que concerne à igreja, segundo nos ensina a ordenança do batismo, a fé dos pais tem igualmente muito valor. A igreja é para eles como uma mãe adotiva e as gratas recordações de sua própria formação, em santidade, continuam vivas. Tudo o que receberam, pela graça divina, por meio da igreja, os induz a esperar as mesmas bênçãos para sua semente. Os filhos, incorporados à igreja visível pelo batismo, recebem uma formação para o bem desta e de acordo com suas leis. Os pais fazem uso dos recursos da igreja, promovem nesta a paz e trabalham para sua prosperidade. Fazem que seus filhos permaneçam no seio da igreja, levandoos à casa de Deus, ensinando-lhes os louvores e fazendo que considerem a igreja com respeito filial. Assim, os próprios pais se reconfortam e a igreja encontra neles — e posteriormente em toda a família — a atitude que seu bemestar exige, ao mesmo tempo em que os filhos têm assegurados exemplos e influências que lhes serão benéficas tanto para este mundo como para a vida futura. Assim, pois, sempre será pouco o que dissemos de uma in stitu ição como essa, que vem em socorro de pais preocupados, que coloca na mente deles o alto significado de suas obrigações em todos os aspectos e que, ao mesmo tempo, anima-os com princípios e esperanças edificantes. O
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efeito que produz nos pais e, por intermédio deles, na geração seguinte e na prosperidade do Cristianismo é incalculável. Tratando-se de uma instituição permanente da igreja, não há dúvida de que o propósito do batismo é animar e alentar os pais na obra mais importante que foi confiada a mãos humanas, assegurando para os pequenos todo o cuidado necessário e as melhores influências possíveis. Ainda que fosse apenas isso, já seria suficiente para justificar a sabedoria e a bondade divinas ao instituir o batismo infantil. Como seria bom se os pais compreendessem e apreciassem esse sacramento em toda sua extensão! Com sua linguagem concisa, é uma expressão de fé e os compromete, solenemente, diante da criança, diante de Deus e de sua igreja. Têm sido cumpridos os compromissos assumidos pelos pais na cerimônia do batismo? Têm sido beneficiados os filhos pelos exemplos e os conselhos da educação cristã? Quando aquele que conhece os corações olha para a família, vê fidelidade nela? Pode a igreja de que somos membros ver que tratamos as ovelhas de Cristo como prometemos, como as ovelhas necessitam e como a igreja tem o direito de esperar? Oue o Senhor nos dê graça para sermos fiéis.
B. A igreja Veremos agora a igreja como uma das partes m encionadas em relação com essa ordenança. Nos referiremos tanto à igreja local, de que fazem parte os pais, como à totalidade do rebanho de Cristo. O compromisso e a responsabilidade da igreja, pode-se dizer, são inferiores apenas aos dos pais. A relação da igreja com a criança, com os pais e com Deus é tão variada e quase tão solene como a dos genitores. A criança, por meio do batismo e dos ministros ordenados, é recebida pela igreja no reino visível de Cristo. A igreja
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compromete-se a orar a Deus pela criança, assegurando a esta simpatia, ajuda e cuidado. Os batizados não são estranhos; são filhos adotivos pelos quais a igreja tem o mais profundo interesse. Ela cuidará para que os pais cumpram seus deveres e os ajudará nessa tarefa. É preciso que se ofereçam às ovelhas os ensinos do Evangelho, assegurando-lhes também as saudáveis influências de uma preparação e formação bíblicas. Junto com os pais, a igreja o rará e tra b a lh a rá para o benefício dos pequenos, conduzindo-os ao amadurecimento, na compreensão inteligente, na respeitabilidade, na piedade, na utilidade e, finalmente, preparando-os para o céu. Com esse objetivo, será feito todo o necessário para o bem-estar e segurança dos pequenos, contra todo perigo. Certamente, essa não é uma pequena bênção para essa geração que começa a crescer, pois assim ela encontra uma dupla garantia de que sua educação não será descuidada. Em relação aos pais, a igreja promete ajudá-los animando-os em seu árduo trabalho. U nirá sua fé e insistência à fé dos pais, para suplicar a promessa do pacto com Deus. Sua influência e a dos pais se somarão para aplicar os ensinos da Escritura. Os ministros da igreja explicarão, do púlpito, a Palavra de Deus; visitarão os pequenos no lar e na Escola Dominical, para despertar-lhes o interesse e instruí-los nas grandes verdades a respeito de Deus e deles mesmos, no que se refere tanto a esta vida quanto à vida futura. Essa ajuda será de grande benefício para os pais sinceros e humildes. Sua fé é fraca e seus esforços, pequenos; seus recursos são limitados; suas faltas, inumeráveis. Porém, na igreja está toda a companhia dos fiéis que Deus preparou para ajudá-los em seu trabalho. Muitos fiéis que também têm filhos sabem como alentar os pais em suas tribulações. A fé e as orações da igreja acompanharão e inspirarão a fé e as orações dos pais. A congregação dos crentes é como uma grande sociedade de ajuda mútua para educar corretamente as crianças. Todos
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os pais se sentirão fortalecidos por esse pensamento e a igreja, por sua vez, receberá bênção por essa obra celestial. O batismo coloca a igreja numa posição igualmente importante em relação a Deus. A igreja toma a seu cuidados os cordeirinhos do rebanho de Deus. Responde, pela fé, ao pacto divino: “ Estabelecerei a minha aliança entre mim e ti e a tua descendência no decurso das suas gerações, aliança perpétua, para ser o teu Deus e o da tua descendência" (Gn 17.7). Aqui está a esperança da igreja. Vive dessa fé e nela se fortalece, ao mesmo tempo em que conduz seus filhos a Deus. Ei-los aqui. Ajuda-nos a crer! Revela-te, ó Senhor, como o Deus que cumpre o pacto. Como se estivesse ancorada no Senhor, a igreja aguarda. Onde poderia ela repousar, se estivesse separada dele? Como poderia viver e florescer, se não fosse em sua descendência e por meio dela? Esse tem sido sempre o princípio de sua continuidade e principal via de seu progresso. Para onde olhará ela, se a sua descendência desaparecer? Até aqueles que se recusam a reconhecer a relação do pacto com o seu selo vêem nos descendentes a mesma fonte de crescimento e sobrevivência, ainda que não tenham nem uma centésima parte da confiança e do consolo dados aos que se apegam a Deus, segundo o ensino do batismo. A esperança deles está turvada pelo temor, mas ainda existe, apesar de uma teoria oposta. A nossa, porém, está fundamentada na verdade. Assim, pois, afirmamos que é muito importante para o batismo de crianças esse aspecto do nosso tema, ou seja, que a igreja, como uma das partes co n tra tu a is, se compromete diante da criança, dos pais e de Deus. Isso pressupõe e promove o bem de todos os interessados. As crianças e os pais recebem bênçãos ao mesmo tempo em que cresce a santidade da igreja e a glória de Deus. Tem sido sempre essa a postura de nossa amada igreja. Daí procede sua atenção para com os pequenos.
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Por conseguinte, na educação secular e, sobretudo, na formação moral, a igreja não tem sido omissa. Suas escolas, faculdades e seminários, nos quais se deve ensinar e viver Cristianismo, são exemplos vivos de sua atividade; e a inteligência, a maturidade, a sobriedade e o valor moral de seus filhos são, ao mesmo tempo, fruto, evidência e recompensa de sua fidelidade. O Senhor tem abençoado muito a igreja com sua juventude. Isso, no entanto, deve induzir-nos a um esforço ininterrupto e mais vigoroso. Nesse tipo de trabalho, não alcançamos a plenitude do dever nem do êxito. Há muito por fazer ainda e podem-se alcançar muitas melhoras. E mais: não se tem certeza se a igreja, como totalidade, alcançou plena tomada de consciência a respeito de suas relações e deveres nesse assunto e do enorme poder dessa alavanca com a qual tanto pode fazer para elevar o padrão da humanidade. Em muitas de nossas congregações, quando uma criança é apresentada para o batismo, pensa-se que a questão só interessa aos pais e a Deus. A igreja não chega a sentir-se parte interessada ou comprometida diante da criança, dos pais e de Deus. Por causa da fraqueza de sua fé, deixa de assumir plenamente suas responsabilidades. Deve-se principalmente a essa pecaminosa negligência o fato de a instituição não ser tida em mais alta estima. Se fizéssemos com ela o que foi originalmente determinado, tratando-a como ela deve e pode ser, o mundo não poderia deixar de apreciá-la com adm iração. Veria que essa ordenança é adequada à constituição da sociedade e à prosperidade da igreja. A respeito disso diremos algo mais em outro tópico.
C. As crianças Agora consideraremos as crianças, pois são o sujeito da ordenança. O batismo foi instituído para o bem delas. Para evitar incorrer em erros e exibir a verdade tão plenamente quanto possível, precisamos levar em conta várias questões importantes.
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1. O batism o regenera as crianças? Será que o batismo regenera? Tem-se falado tanto a respeito da regeneração batismal que não será demais fazer aqui alguns reparos a essa opinião doutrinária. E, visto que vamos tratar dela, aqui, com imparcialidade e franqueza, devemos dizer, desde já, que a doutrina — na forma em que a defende seus partidários — é geralmente mal entendida. É possível que, às vezes, tenham empregado formas de expressão que pareçam implicar essa idéia. Porém, não cremos que seja isso que desejam expressar. Os que sustentam a regeneração pelo batismo são sensatos e sensíveis o bastante para supor que se pode operar uma mudança espiritual pelo poder da aplicação externa da água. A exagerada linguagem usada pelos padres denota que algo se acrescentou ao elemento visível ou que este comunica algo que não lhe seja inerente. Assim disse Crisóstomo: ‘A água pura e simples não age em nós, senão quando recebeu a graça do Espírito Santo, quando só então lava os nossos pecados” . Cirilo afirmou: “ Do mesmo modo que a água, aquecida pelo fogo. queima como o próprio fogo, assim a obra do Espírito Santo transforma, em poder divino, as águas que lavam o corpo de quem é batizado". Segundo esses escritores, portanto, a água não opera, por si mesma, a mudança regeneradora, mas o faz por meio de algum misterioso poder. Cremos que isso é o que mais se aproxima da regeneração pela água. Provavelmente ainda há pessoas que mantêm substancialmente esse ponto de vista. Consideram a própria ordenança misteriosamente eficaz e capaz de produzir uma mudança espiritual. Porém, estamos convencidos de que não pode haver muitos que pensam assim. Acontece o mesmo com o dogma romano da transubstanciação: contradiz tão flagrantemente a razão, a lógica e a Bíblia que só podem aceitá-lo os que estão cegos pela ignorância, por equívocos ou por fanatismo. Assim, pois, perderemos tempo em refutá-los.
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A idéia mais corrente e plausível a respeito da regeneração batismal não é a de que a água tenha sido dotada de um poder misterioso ou que possua esse poder quem ministra o batismo, mas a de que Deus se obrigou por seu pacto com sua igreja e seu povo. Por isso, sempre, onde quer que o batismo seja ministrado corretamente, pelo Espírito Santo, Deus muda o coração de quem recebe o sacramento. Essa é, sem dúvida, uma maneira de crer muito mais razoável do que a anteriormente mencionada. E, se for provada pela Bíblia, pode exigir que a aceitemos. Porém, aí está a dificuldade: a Escritura nada diz a respeito dessa teoria. Na Palavra de Deus não há nenhuma promessa ou declaração que nos autorize a crer que, no momento do batismo, é produzida a transformação do coração. Os fatos também não apóiam tal teoria. Pode ser que haja alguns que nasçam de novo no momento do batismo ou até logo antes dele. Isso não sabemos. Porém, na maioria dos casos, a vida que se manifesta depois mostra claramente que a regeneração não teve lugar no batismo. O crer que a regeneração ocorreu no batismo é falso e nocivo como artigo de fé, pois é contrário à verdade e tende a gerar confiança supersticiosa numa simples cerimônia, provocando, em decorrência, zombarias contra a igreja de Cristo, além de provocar, nos pais e nos filhos, um espírito de negligência em sua formação cristã, matando neles o sentido de dependência da graça divina. Sendo assim, torna-se claro que o propósito é invalidar os fins que o batismo — corretamente entendido — tem como missão alcançar. Portanto, seguindo a orientação bíblica, que tem sido sempre a diretriz do povo de Deus, devemos rejeitar essa interpretação. Sem dúvida, ao rejeitar essa teoria insustentável, não demonstramos, por outro lado, que esperamos pouco em relação à ordenança e à instrução que ela encerra. É de temerse que nossa fé seja débil em demasia, em relação à deles, que é forte em excesso. Eles crêem demais; nós, muito pouco. Para nós o batismo é uma consagração formal e pública de
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nossos filhos a Deus; uma expressão de nossa fé na promessa de seu pacto; uma representação em b lem ática da necessidade da purificação de nossos filhos e da natureza da obra do Espírito Santo. Nossos filhos foram concebidos em pecado e são tão inclinados para a rebeldia quanto nós. Estamos persuadidos, contudo, de que a fé deve capacitarnos a dizer: “ Estas crianças pertencem a Deus. Se as entregamos na confiança da promessa de seu pacto, e ele as aceitou segundo sua própria palavra empenhada, foi-lhes aplicado o selo de seu pacto. Não as estamos formando para o mundo, mas para a glória de Deus. E nossa confiança nele é esta: ainda que jamaispossamos estabelecer limites quanto ao tempo, lugar e forma de conversão de nossos filhos, cremos firmemente na realidade de seu pacto e cremos que, depois de utilizá-los para sua glória aqui, Deus os levará com ele para o seu reino celestial” . Uma fé assim, com o inteligente zelo e o fiel ensino que ela inspira, não deveria ser frustrada. O Deus dos pais, segundo essa fé, será o Deus dos nossos filhos. E, se não chegarmos a esse nível de confiança, deixaremos de tirar o melhor partido de nossos privilégios pactuais. Não seja o povo de Deus atemorizado pela extravagância e pelo erro, por um lado, nem se desfaça daquilo que lhe pertence legitimamente, por outro. O batismo não regenera, ou seja, não é acompanhado ou seguido pela regeneração. Não podemos ditar a Deus quando ou em quem ele deve operar tão misericordiosa e soberana transformação. Deus não está atado a nenhuma observância cerimonial nem limitado à infindável sucessão de mãos consagradas, por meio das quais sua graça deva fluir. Mas, sem dúvida, a obediência à sua vontade e a fé em suas promessas não são vãs. Entregando-lhe nosso fruto (nossos filhos), cremos na fidelidade com que ele cumpre suas promessas. Nesse espírito, oramos, confiamos e aguardamos, ansiosos, a manifestação de uma vida renovada. Seu povo não se sentirá frustrado. A vida se mostrará em seu devido tempo, ainda
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que ninguém possa dizer quando se operou a mudança. O vento sopra onde quer; porém, mais cedo ou mais tarde, soprará sobre estes ossos secos, e eles viverão. Na promessa do pacto que Deus fez com seu povo e sua semente, temos uma sólida rocha sobre a qual podemos nos manter.
2. Benefícios derivados do batismo Se o batismo não regenera nem é acompanhado de regeneração, para que serve? Em parte, já antecipamos a resposta; porém, o assunto merece ser tratado mais detalhadam ente. Oxalá os jovens compreendessem e considerassem a resposta a tal pergunta. Nossa resposta formal à questão apresenta um quádruplo aspecto: 1. O batismo relaciona as crianças com a igreja visível, colocando-as sob o cuidado do povo de Deus e compelindoas a andar segundo o teor de seus ensinos. 2. O batismo vincula a igreja com as crianças. A igreja as adota e as inclui em sua família, assumindo a solene obrigação de velar por elas, procurando capacitá-las, por todos os meios, para ser úteis e dignas herdeiras do céu. 3. O batismo introduz os pais no pacto público com Deus, com sua igreja e com as ovelhas do seu rebanho, obrigando-os, por meio dos mais sólidos estím ulos imagináveis, a cuidar do crescimento dos filhos e a trabalhar em favor de sua salvação. 4. O batismo introduz também o Senhor no pacto com o seu povo e com sua igreja. Até aqui, é o que o batism o sig n ifica direta e praticamente, no que se refere às crianças. É a medida mais direta que se pode tomar para conduzir as crianças a Cristo, a fim de que ele as tome em seus braços e as abençoe. É o mais firme e cálido empenho de fé e amor maternal para conduzi-las ao céu. Neste mundo, são introduzidas no reino para que possam crescer sob suas leis, familiarizar-se com
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suas doutrinas e costumes, reconhecer seu cabeça, promover sua prosperidade e, finalmente, ser um dia transplantadas para a morada celestial. Não terão as crianças interesse ou responsabilidade em tudo isso? Ainda que no momento de sua consagração sejam agentes in co nscientes, para elas deve ser importantíssimo o fato de haverem sido entregues a Deus. Seus pais, crentes, não podiam — nem deviam — ter o atrevimento de deixar de consagrá-las a Deus. São, portanto, membros da igreja (ainda que menores de idade) da mesma forma que os que desfrutam sua filiação de modo pleno. O Senhor mesmo as colocou nessa posição, por meio do pacto com seu povo. Os membros da igreja não podem desfazer essa relação nem livrar-se da responsabilidade que ela acarreta. Os olhos de Deus repousam sobre eles com paternal ternura. Deus espera que sob essa bendita tutela se comportem com a devida dignidade. Se estão dispostos a fazer o bem, por essa mesma disposição lhes provê toda a ajuda. Se estão inclinados a extraviar-se, põe todos os obstáculos possíveis em seu caminho para a ruína e proporciona todo tipo de influências, para fazê-los voltar atrás e fugir da destruição. Portanto, se quiserem perecer, terão de destruir a cerca que Deus levantou ao redor deles e, conseqüentem ente, precipitar-se na perdição com a carga de sua culpa horrivelmente agravada. Prouvera a Deus que estivessem conscientes de sua posição e agissem com sabedoria. Já que crêem na comunidade dos redimidos, devem prestar às suas leis uma saudável obediência. Desse modo, gozarão de seus maiores favores e derramarão sobre o mundo os mais positivos benefícios. 3. O problema das deserções espirituais Resta, todavia, examinar outra questão importante. Que acontecerá com aqueles que, chegados à idade da
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d iscriçã o , esquecem suas obrigações e recusam o conhecimento de Cristo? Freqüentemente, considera-se essa pergunta um dos pontos mais embaraçosos do assunto. No entanto, nem por isso deixaremos de examinar a matéria justa e lealmente. Encontramo-nos diante de um fato triste descaradamente palpável: o fato de muitas pessoas que consideramos membros da igreja pisotearem habitualmente as leis de Cristo. Oue devemos fazer com elas? Devemos considerá-las merecedoras de uma perseguição judicial? Devemos processá-las, julgá-las e condená-las? Devemos expulsá-las da igreja? Às vezes, há os que pensam que a lógica do nosso sistema exige esse procedimento. Continuarão tais pessoas ocupando o seu lugar livres de censura? Alguns acreditam também que a coerência se opõe a isso. Qualquer dificuldade prática sobre esse particular se desvanece quando nos lembramos da natureza da filiação de tais pessoas. Não são membros com plenos direitos, mas semelhantes aos menores com relação à sua prática ou às crianças com relação à sua família: legalmente têm direito de ser protegidas e educadas; porém, carecem de certos privilégios enquanto não estiverem capacidades para usufruir deles de modo inteligente e proveitoso. De modo algum se pode considerar essa posição anômala ou irrazoável. A analogia com a situação das crianças, na família ou na pátria, é perfeita, e o modo de tratar o assunto é muito semelhante. Um bom pai não se precipita em expulsar de casa o filho ingrato e rebelde. Lança mão de toda sua paciência, arrazoa, persuade, suplica e lhe permite continuar ainda sob os privilégios e influências do lar. Agindo desse modo há mais esperança de que se produza uma mudança benéfica do que aplicando um castigo severo. Eis aí o modelo que a igreja deve seguir no trato com seus filhos indóceis e desobedientes. Ainda que cresçam recusando-se a conhecer o Senhor, nenhum mal prático pode derivar-se do fato de conservá-los sob sua in flu ê n c ia . Ao co n trá rio , da
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conservação deles na igreja só o bem é de se esperar. Ao mesmo tempo em que os priva de certos privilégios, a igreja os mantém como membros em condições um pouco diferentes, e espera, vela por eles, instrui, persuade e ora para que sejam restaurados a uma consciência plena de sua obrigação como membros do corpo de Cristo. Por motivo ainda mais justo deve a igreja seguir a mesma norma com os membros apenas batizados. Os ministros devem visitá-los, instruí-los e exortá-los. A igreja deve demonstrar o mais profundo interesse por eles e, utilizando todos os meios possíveis, fazê-los compreender que, por causa do pacto de Deus com seus pais e com a igreja, gozam de uma solene e peculiar posição. A igreja deve gravar na mente e no coração deles todos os convites e incentivos do Evangelho e, a cada dia, pôr diante de seu rosto o espelho da verdade para que contemplem suas excelências e reconheçam sua ingratidão e a gravidade de sua culpa ao pecar contra Deus. Devem ser levados a ver o terno amor de Jesus, cujo sangue pisoteiam. Devem ser levados a ver a fé, o amor e o zelo que o povo de Deus tem por eles. Tudo isso pode ser feito não somente sem prejudicar nossa doutrina, mas de maneira eminentemente facilitada por ela. Se a compreendermos com propriedade, seremos levados direta e necessariamente à maneira exata de proceder, pois assim o exige o bem supremo de uma geração que cresce. Se nos prendermos a isso, gozaremos de uma posição vantajosa para tratar com nossos filhos rebeldes. Se inculcamos neles, adequadamente, essas coisas, a maioria deles chegará um dia ao conhecimento de Cristo e a ocupar um lugar na sua igreja. E aqui, correndo o risco de uma pequena digressão, não podemos deixar de perguntar por que há tantos filhos de crentes que crescem no seio da igreja sem abraçar Cristo, como Salvador. Como questão prática, a mente de ministros e pais tende, com freqüência, a encarar com inquietação tal pergunta, à qual podemos dar várias respostas.
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Digamos, em primeiro lugar, que não chegamos a ter uma concepção clara e firme a respeito do pacto que Deus estabeleceu conosco e com nossos filhos (e sob o qual acreditamos que eles estejam). Nós mesmos não estamos advertidos a respeito disso, nem gravamos, na alma de nossos filhos, todo valo r que esse pacto encerra. O m aravilh o so pacto com Deus, no qual confessam os descansar, acaba se transformando em mera observância cerimonial. Por essa razão, o bem que o batismo comunica deixa de ser alcançado como deveria. A causa disso é a nossa incredulidade; Deus não age por nós como o faria em favor de um Israel fiel, porque sem fé é impossível agradar a Deus. Não agimos em favor de nossos filhos como faríamos se tivéssemos uma fé viva e consciente, visto que a força motriz não existe quando falta essa fé. Não se submetem à influência do Evangelho como o fariam se estivessem cheios do Espírito Santo. Essa é uma das respostas. Outra resposta é que a instrução prática que lhes demos, em decorrência dessa falta de fé viva, é extremamente defeituosa. Depois de consagrar nossos filhos a Deus, confiados no seu pacto, continuamos crendo que não são dele; que crescerão em pecado, como filhos de Satanás, até o dia em que serão levados a ter convicção do pecado e a receber o Salvador. Vistas as coisas desse modo, eles não crescerão considerando Deus como seu Pai, nem Jesus como seu Redentor, nem o Espírito Santo como seu santificador, nem a igreja como seu lar. Se sentirão estranhos e verão Deus como inimigo. Em outras palavras: pela maneira como os tratamos, os colocamos fora do reino, por mais que, teoricamente, os consideremos dentro. Continuamente, damos por pressuposto que suas primeiras ações e emoções de índole moral serão más e somente más, em lugar de crer, baseados na fidelidade do Altíssimo às suas promessas, que, pela graça divina, se exercitarão na verdade espiritual desde a infância. Por essa razão, à medida que alcançam mais maturidade, vão ficando
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mais distantes e alheios, esperando, por assim dizer, que Deus os inscreva, em vez de sentir-se dele, obrigados a amálo e a servi-lo desde o nascimento. Está aqui um erro prático muito pernicioso. Se oferecemos nossos filhos a Deus, não devemos sentir nem agir como se o batismo não servisse para coisa alguma. Cremos que o que se deve dar por pressuposto é que nossos filhos são propriedade do Senhor e que, conforme crescem fisicamente, crescem também espiritualmente na vida de piedade. Longe de esperar até o dia em que sintam a convicção de pecado e se convertam, devemos esperar deles, e provocálos com empenho — desde o momento em que sejam capazes de ação moral —, que sintam e ajam segundo os princípios de um coração renovado. Precisamos ensiná-los a odiar o pecado e a pensar e falar de Deus como Pai e do Senhor Jesus Cristo como Salvador. Devemos ensiná-los a dizer: ‘Amo o Senhor! Amo Jesus e confio nele! Odeio o pecado e todas as suas manifestações e, com a ajuda de Deus, estou determinado a não ser mais seu escravo” . E esperemos que, quando chegarem à idade adulta, a vida deles corresponda a esse ensino. Será isso menos agradável a Deus do que um espírito de incredulidade que invalida sua Palavra? Cremos que não. É possível que, para essas coisas, seja indispensável uma fé sólida, legítima, que agrada a Deus, que nos consola e que obtém as maiores bênçãos para os nossos filhos. Se apenas exercitássemos essa fé, com a ajuda de Deus, muitos de nossos filhos seriam justificados desde cedo e cresceriam "na disciplina e na admoestação do Senhor" (Ef 6.4). Seriam, então, como a videira que produz o fruto ao lado de nossa casa e como plantas de oliveira ao redor de nossa mesa (cf. Sl 128.3). É esse, evidentemente, o curso das coisas, e assim o espera a igreja. “As crianças nascidas no seio da igreja visível e dedicadas a Deus pelo batismo, estão sob o cuidado e governo da igreja, e devem ser ensinadas a ler e a repetir o Catecismo, o Credo dos Apóstolos e a Oração do Senhor. Devem ser
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ensinadas, também, a orar, a aborrecer o pecado, a temer a Deus e a obedecer ao Senhor Jesus Cristo. E quando chegarem à idade da discrição, se estiverem livres do escândalo, se forem sóbrios e determ inados e tiverem su ficien te conhecimento para discernir o corpo do Senhor, devem ser informados a respeito da obrigação e privilégio que têm ao particip ar da Ceia do Senhor.” 8 Essa é a verdadeira perspectiva da posição dos pais e indica o modo adequado de conduzir-se com os filhos. Estes são do Senhor, a menos que, por sua conta, recusem o seu pacto. Cultivemos, pois, uma fé mais vigorosa e adotemos um procedimento que tenha analogia com ela. Estamos convencidos de que é muito grande o dano que a negligência dos pais cristãos sobre essa questão provoca nos jovens e na igreja. Esta não deve buscar tanto a conversão de adultos entre seus próprios filhos, mas a orientação deles desde a mais tenra idade. Isso está de acordo tanto com a natureza do pacto como com a natureza da vida espiritual, cujo desenvolvimento é progressivo. Abrigamos a convicção de que, de fato, muitos dos que fazem profissão de fé, em determinado momento, nasceram de novo e estão sob a influência divina muito tempo antes de tomar a decisão. A nova vida aparece de modo muito mais manifesto aos seus olhos e aos dos demais no momento em que professam a fé, ainda que essa vida se desenvolva neles desde os dias de sua infância — como fruto imperceptível do pacto cujo selo é o batismo. Se estas considerações estão de acordo com a verdade, quão importante é o período da infância numa família cristã! Ouão maravilhosos são a sabedoria e a bondade de Deus ao colocar a mente plástica de um pequeno sob influências tão bem calculadas para modelá-la! E quão responsabilizante, quão em consonância com a obra de Deus é a obra de cada pai e da igreja. Nisso, em verdade, descansa a esperança do mundo. Só no fato de a igreja despertar para a grande verdade de que ela é a escola de Jesus Cristo, na qual o
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mundo há de ser educado pelo meio simples e natural de formar seus próprios filhos no caminho que devem seguir, brilharia sobre ela um dia de. glória e prosperidade. Porém, se a igreja subestima essa formação e tenta alcançar seus próprios fins de algum outro modo, são de esperar-se apenas frustração e desengano. O Senhor mostrará que os meios que ele estabeleceu não podem ser desprezados impunemente.
D. Deus A única parte que nos falta considerar, a respeito do batismo, é a que se refere ao próprio Deus. Vimos as interrelações e deveres mútuos das outras partes e ao longo desta discussão demos por assentado que Deus mantém íntima relação com cada uma delas. Porém, vamos considerá-las agora de modo mais específico. Aqui se enraíza a base de toda a questão. Se não é verdade que Deus é uma das partes, a transação que o pacto representa nada significa e para nada serve. Nada subsiste se não cremos num Deus comprometido, de modo bondoso e condescendente, com a realização de sua parte no pacto. É, pois, agradável e proveitoso vê-lo relacionado com os pais, com os filhos e com sua igreja nessa aliança. Deus diz, expressamente, aos pais: “ ... para vós outros é a promessa, para vossos filhos ...” (At 2.39); “Para ser o teu Deus e da tua descendência” (Gn 17.7). Isso equivale a dizer: “O que sou para vocês serei para eles. Como escolhi, chamei, amei, aceitei e abençoei vocês, assim farei com eles também". Como são consoladoras essas palavras para o coração de um pai ansioso! Seu coração se enche de celestial emoção quando, como Davi, diz: "Ouem sou eu, Senhor Deus, e qual é a minha casa, para que me tenhas trazido até aqui? Foi isso ainda pouco aos teus olhos, Senhor Deus, de maneira que também falaste a respeito da casa de teu servo para
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tempos distantes” (2Sm 7.18,19). Essa esperança é o legítimo lugar de descanso para todo pai piedoso. Somos a semente de Abraão e herdeiros das promessas, que são o sim e o amém em Cristo Jesus. "Não abandoneis, portanto, a vossa confiança; ela tem grande galardão” (Hb 10.35). Ainda assim, o Senhor mantém uma peculiar relação não só com os pais, mas também com os filhos. São dele num sentido diferente de qualquer outro, até mesmo antes de terem alcançado a idade madura. "... agora são santos” (ICo 7.14), isto é, são consagrados ao Senhor, porque ele mesmo os aceitou. Pelo fato de Deus ter assim determinado, gozam de um lugar na sua vinha, de sua instrução, da moderação de sua lei, dos incentivos de sua verdade, da ação do seu Espírito, do cuidado de seus ministros, das reiteradas chamadas do seu Evangelho, das sempre abertas portas de acesso a ele e da contínua e crescente disposição de serem abençoados pelo amor dos pais. O grande pastor estenderá suas mãos protetoras sobre eles e lhes infundirá o seu Espírito. Não são como os filhos dos pagãos e dos estranhos. Pode dar-se o caso de algum as das vantagens desfrutadas por eles serem também desfrutadas pelos que os rodeiam; porém, isso ocorre de maneira incidental, na medida em que o propósito do plano de Deus o permite; ao passo que, para os filhos da promessa, o propósito de Deus assegura providencialmente tais bênçãos. A consideração de Deus para com eles e sua fidelidade ao pacto se m anifestam no fato de o Senhor ter-lhes, realmente, assegurado essas bênçãos. Lembrem-se, pois, as obrigações sob as quais essa benéfica disposição os coloca. Deus olha a igreja com a mesma condescendência. Ela vive por sua graça. O Senhor a ama como a menina de seus olhos. Assegura-lhe paz e continuidade, bem-estar e progresso para todas as famílias compreendidas no pacto que estamos considerando. O anelo natural do coração da igreja se volta para seus rebentos. A ela é dado cultivar com
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amor e manter vivos esses anelos, que ela poderá realizar totalmente. Do mesmo modo, no círculo doméstico, seus filhos estão, em alto grau, em sua responsabilidade. O Senhor a vê com benevolência e se alegra com os esforços que ela faz para tornar suas as promessas dele, procurando formar seus filhos para a glória divina. Deus lhe deu o pacto com seu selo e tudo o que essa ordenança tem de estímulo e alento. Na observância de suas condições, está seu bendito trabalho por cujo meio é acrescentada, perpetuada e confortada à medida que forma os filhos de suas famílias como cidadãos úteis e herdeiros do céu. Certamente, o valor desses compromissos ou promessas está acima de qualquer avaliação. O Senhor é fiel e, por isso, havendo-se obrigado nesses termos com as três partes já mencionadas (pais, filhos e igreja), cumprirá sua palavra. Deus se alegra com a confiança que depositamos nele e não nos desapontará.
C o n clu sã o Cremos haver dito o suficiente para m ostrar o sentimento prático e o valor do batismo. Em cada uma de suas facetas, essa ordenança é incalculavelmente benéfica. Os pais cristãos são estimulados, animados, fortalecidos e confortados em sua árdua tarefa. A igreja, por esse canal, é abençoada abundantemente. Por meio dele se relaciona com as famílias e com Deus. Ela sustenta pais e filhos e se sustenta em Deus, ao mesmo tempo em que, por seu Espírito, este preserva e santifica todos os envolvidos. As crianças recebem toda sorte de influências destinadas a encaminhálas para o bem e toda a defesa e salvaguarda contra o mal. Os maiores interesses e aspirações do indivíduo, da família, da igreja, do Estado e do mundo são promovidos por essa ordenança. A glória de Deus e o bem do homem estão juntamente assegurados. Assim, pois, em vez de subestimar o batismo, como parece ser a tendência destes tempos, deveríamos apreciálo ao máximo grau. Essa ordenança coloca, diante de nós, um profundo e interessante enfoque da economia divina por meio da igreja, e nos impõe o dever de dirigir nossa fé e esforços para obedecer ao seguinte provérbio: "Ensina a criança no caminho em que deve andar, e, ainda quando foi velho, não se desviará dele" (Pv 22.6).
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1On Baptism, p. 79.
1"Aspergirá" ou "borrifará” são traduções alternativas possíveis, a partir do hebraico nazah. A Almeida Revista e Atualizada traz "causará admiração''. N. do E. 3!n sim = no lugar. 4 Tenha-se em conta que o autor argumenta com base na versão inglesa King |ames. que traduz essas partículas por inco e oitr, quando, como proporá imediatamente sua tradução normal, deveria traduzi-las por to e from (N. T.). 5 Subentende-se que é no sentido absoluto e exclusivo dado por círculos batistas (N. I) . ° Ver nota 2. 7 Ver nota 2. 6Dirccrory/or Worship. cap. 9. seç. I .
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C h a r le s H odge (1797-1878). Teólogo e educador americano. Hodge graduou-se pelo College of New Jersey (mais tarde Princeton University) em 1815 e pelo Princeton Theological Seminary em 1819. Em 1820 começou a lecionar no Seminário, o que fez até o final de sua vida, ensinando primeiro Literatura Oriental e Bíblica e depois Teologia. Sua fidelidade bíblica foi importante para a igreja na luta contra os desvios de seus dias e sua influência chega até nós.
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