FTCB – FACULDADE TEOLÓGICA CRISTÃ DO BRASIL
MESTRADO EM BÍBLIA – NOVO TESTAMENTO Disciplina: Grego (Exegese do NT Grego)
Professor: Sebastião Veiga Gonçalves
Aluno:
Walter Leal Guedes
EXEGESE DE MATEUS 6:1 “Cuidem em não praticar a vossa justiça diante dos homens a fim de serdes vistos por eles; do contrário, não tendes recompensa junto ao vosso Pai nos céus”.
Brasília Brasília Fevereiro Fevereiro de de 2008 2008
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Grego (Exegese do NT Grego)
EXEGESE DE MATEUS 6:1
Esta obra, denominada “Exegese” , é caracterizada pela investigação acurada das idéias do texto grego eclético. Trata-se de um modelo de exegese, não sendo determinante como única forma de análise exegética, contendo, ainda, uma análise teológica. É de grande valia para a análise popular bem como sua aplicação no dia a dia da Igreja, considerando uma adequada associação do texto grego eclético e sua tradução literal com os textos bíblicos mais comuns em nossos dias.
Por: Walter Leal Guedes
Sob a orientação do professor Sebastião Veiga Gonçalves
Brasília, fevereiro de 2008.
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SUMÁRIO
ANÁLISE LINGÜÍSTICA ...................................................................................... 04 Texto Grego (Eclético) ........................................................................................ 04 Delimitação do Texto ......................................................................................... 04 Posicionamento no Contexto .............................................................................. 04 ANÁLISE MANUSCRITOLÓGICA ..................................................................... 07 Leituras Variantes .............................................................................................. 07 Comentário Acerca das Leituras Variantes ..................................................... 07 ANÁLISE MORFOLÓGICA ................................................................................. 09 Classificação Gramatical e Tradução ............................................................... 09 Considerações Gramaticais ................................................................................ 10 ANÁLISE SINTÁTICA .......................................................................................... 12 Diagramação da Relação Sintática de Mateus 6:1 ........................................... 12 Comentário da Relação Sintática ...................................................................... 12 Comentário Conclusivo da Análise Sintática ................................................... 15 Tradução Literal ................................................................................................. 16 Outras Traduções Bíblicas ................................................................................. 16 Comentários sobre as Traduções ...................................................................... 17 REFERÊNCIAS (Bibliografia) ............................................................................... 22
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EXEGESE DE MATEUS 6:1 “Guardai-vos de exercer a vossa justiça diante dos homens, com o fim de serdes vistos por eles; doutra sorte, não tereis galardão junto de vosso Pai celeste.”
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ANÁLISE LINGÜÍSTICA Texto Grego (Eclético) Prose,cete cete Îde.Ð th.n dikaiosu,nhn nhn u`mw/ mw/n mh. poiei/n e;mprosqen mprosqen tw/n avnqrw, nqrw,pwn pwn pro.j to. qeaqh/ nai nai auvtoi/ toi/j\ j\ eiv de. mh, ge( misqo.n ouvk e;cete cete para. tw/ | patri. u`mw/ mw/n tw/ | evn toi/j ouvranoi/ ranoi/jÅ jÅ
Delimitação do Texto As razões do estudo da perícope buscam adequada compreensão: •
A cerca da necessidade de uma introdução a advertências quanto à forma adequada de se exercer a religiosidade;
•
Da necessidade de ligação entre a disposição da Lei lida e ouvida (5:21-48) e as atitudes práticas, doravante, em relação às três bases da prática da justiça (religião) para os judeus, que eram as esmolas (6:2-4), a oração (6:5-15) e o jejum (6:16-18);
•
Sobre como ligar a determinação feita no trecho, percebida por meio do verbo Prose,cete cete ( preocupe-se com; cuide de; atente para [a]) no imperativo aos
variados modos práticos do exercício da justiça; •
Do motivo de haver, tão somente em um versículo, tão bem esclarecida instrução prática sobre o modo de vida cristão, contendo uma instrução detalhada em forma de imperativo proibitivo, um detalhamento sobre a motivação errada para a prática da religiosidade e a conseqüente “recompensa” pela má conduta diante de Deus, ainda que agradável aos homens.
Posicionamento no Contexto •
Quanto “à perícope” anterior: após proferir, em meio ao famoso Sermão do Monte, a lista das “Bem aventuranças” , seguida das instruções ao modo de vida dos discípulos (e especialmente deles, cof. 5:1-2) como sal da terra (5:13), luz do mundo
(5:14-16), cumpridores da Lei e dos ensinos dos profetas (5:17-20), e
as instruções orais a cerca do homicídio (5:21-26), do adultério (5:27-32), dos 4
juramentos
(5:33-37), da vingança (5:38-42) e do amor ao próximo (5:43-48),
mais precisamente no versículo 5:48, o Senhor determina aos discípulos o que para nós, hoje, se requerido por alguém, pode soar com ar de grande pretencionismo, de arrogância até, ou seja, é exigida deles perfeição, mas não qualquer perfeição, se não, tal qual à perfeição do Pai do Céu. E é com relação a todo esse trecho (cap. 5) que o versículo 6:1 atua como um desfecho realmente perfeito, em outras palavras, embora todas as atitudes práticas determinadas anteriormente digam respeito às relações entre os homens, é para com Deus que a verdadeira justiça deve ser exercitada. •
Quanto “à perícope” posterior1: o texto delimitado introduz, como já dito, por meio de uma severa determinação proibitiva, uma seção de determinações pormenorizadas a respeito da conduta adequada dos discípulos de Jesus quanto à prática da esmola, da oração e do jejum (pilares da religiosidade judaica). Anteriormente, pois, o Senhor já havia instruído aos discípulos quanto à necessidade de que sua justiça excedesse, “em muito”, a dos escribas e fariseus (5:20). Agora, ao darem esmolas, não devem alardear o feito como costume dos hipócritas
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(6:2). Na oração, do mesmo modo, ao discípulo é instruído que o
faça em secreto, de modo a não ser visto pelos homens, mas tão somente por Deus, diferentemente do que é comum entre os hipócritas (5:6-8). Na prática do jejum, de igual modo, o discípulo tem de proceder contrariamente aos hipócritas ,
que fazem questão de demonstrar a todos os homens que o estão
fazendo (6:16-18). A afirmação de Jesus, por três vezes (6:2,5,16), de que “certamente eles
(os hipócritas) já receberam a recompensa” em virtude da
forma como sua justiça é praticada combina, perfeitamente, com a exposição da conseqüência pelo exercício inadequado da justiça feita em 6:1, ou seja, Jesus afirma, com outros termos, que esses hipócritas “não têm recompensa junto do Pai Celeste” .
Praticam uma justiça, ou exercem uma religiosidade inútil. E não
só inútil, mas prejudicial.
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As expressões – “à perícope” – encontram-se entre aspas, nos dois itens, referente à anterior e à posterior, pelo fato de a ligação do trecho delimitado não se desligar definitivamente de todas as perícopes relacionadas com o tema tratado em 6:1. Portanto, a relação não se limita às perícopes imediatamente anterior e posterior, mas sim, a um considerável conjunto de perícopes que não convém (nem podem) ser desvinculadas uma da outra.
2
“Hipócritas” são todos os religiosos judaicos que procedem inapropriadamente tal qual referido por
Jesus.
5
•
Na perícope delimitada espera-se encontrar suficiente conteúdo que justifique a avaliação de um versículo só, privilegiando o que há gramaticalmente justificável, para que seja comprovada a existência de uma importante e particular ordenança. Ainda, fazer a devida associação dessa ordenança com o restante do exposto em todo o Sermão do Monte, por todo o Primeiro Grande Discurso do Evangelho de Mateus e, não negligenciando a sua importância relacionada com todo o Evangelho de Mateus, numa instância mais imediata, e com todo o Novo Testamento, numa instância mais ampla. E tudo isso buscando harmonizar a perícope em questão com todo o contexto bíblico, ou seja, a Bíblia considerada de Gênesis a Apocalipse.
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ANÁLISE MANUSCRITOLÓGICA Leituras Variantes •
Texto Eclético – NA 273
Prose,cete cete Îde.Ð th.n dikaiosu,nhn nhn u`mw/ mw/n mh. poiei/n e;mprosqen mprosqen tw/n avnqrw, nqrw,pwn pwn pro.j to. qeaqh/nai nai auvtoi/ toi/j\ j\ eiv de. mh, ge( misqo.n ouvk e;cete cete para. tw/ | patri. u`mw/ mw/n tw/ | evn toi/j ouvranoi/ ranoi/jÅ jÅ •
Textus Receptus
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Prose,cete cete de. th.n evlehmosu, lehmosu,nhn nhn u`mw/ mw/n mh. poiei/n e;mprosqen mprosqen tw/n avnqrw, nqrw,pwn( pwn( pro.j to. qeaqh/nai nai auvtoi/ toi/j\ j\ eiv de. mh,ge( ge( misqo.n ouvk e;cete cete para. tw/ | patri. u`mw/ mw/n tw/ | evn toi/j ouvranoi/ ranoi/jÅ jÅ
Comentário Acerca das Leituras Variantes A uma grossa vista não se vê considerável diferença entre um texto e outro, nem mesmo quanto à pontuação bem como a acentuação no Textus Receptus . O primeiro diferencial é percebido no fato de a conjunção δε, no Texto Eclético, estar entre colchetes. Nestle-Aland e UBS usam esse recurso, ou seja, apresentam fragmentos de palavras ou palavras inteiras, entre colchetes, indicando que a posição de tais palavras no texto é questionada.
δε
é uma conjunção adversativa, pospositiva,
também usada aditivamente como “e” (Mt 1:2-16, na Genealogia, várias vezes); também como “mas”, onde o Léxico até sugere sua aplicação em Mt 6:1. Pode indicar apenas transição como “ora” ou “então” (conf. Mc 5:11; Lc 3:21; 1ªCo 16:12); “isto é”
(Rm 3:22; 1ªCo 10:11; Fp 2:8); e ainda há outras possibilidades. Deste modo,
considerando o motivo de utilização dos colchetes, ou seja, a dúvida quanto à posição da palavra na frase, é possível que se admita que ela ficaria bem abrindo o versículo, 3
Novum Testamentum Graece Nestle-Aland, 4ª edição, também conhecido como NA27 (27ª edição da
UBS [United Bible Societes]), o texto grego mais aceito e recomendado nos círculos acadêmicos. 4
“Em 1516, Erasmo de Rotterdam publicou um texto grego (chamado Textus Receptus), do Novo Testamento que, apesar de muitas imperfeições e limitações, foi usado para as futuras e famosas traduções de Lutero (alemão), Tyndale (inglês), Pierre Olivetan (francês), Nicolaas van Winghe (holandês, católico), Giovani Diodati (italiano). Até os autores da conhecida versão para o espanhol, Casiodoro de Reina e Cipriano de Valera; bem como o autor da tradicional versão para a nossa língua (cerca de 200 anos mais tarde), João F. de Almeida (português), serviram-se do Texto Receptus (e da leitura de traduções em outras línguas), para a produção de suas obras”. http://www.bibliakingjames.com.br/asp/historia.asp
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embora conjunções não sejam os tipos de palavras mais adequados para se iniciar uma sentença. Todavia, entendendo que Mt 6:1 sucede a uma seqüência de instruções para a vida dos discípulos, após tantas ordenanças, uma sentença do tipo “Então, cuide em...” , ou ainda “Ora, atente para...” não pode ser desprezada. Por fim, e bem mais relevante, destaca-se a utilização da palavra evlehmosu, lehmosu,nhn nhn (esmola ; com 13 ocorrências no N.T., além desta variante textual) pelo Textus Receptus , enquanto o Texto Eclético empregou dikaiosu,nhn nhn ( justiça justiça ; com 91 ocorrências no N.T., mais 3 variações textuais). Em destaque, na transcrição dos textos gregos, acima, as palavras foram sublinhadas. O que o tradutor para os Textus Receptus fez foi uma substituição do termo justiça por esmola . Numa superficial avaliação, pela concordância do termo com sua posterior ocorrência no versículo seguinte, a aplicação do termo esmola
parece ser adequada. Todavia, isso quebra definitivamente a ligação do trecho
(6:1) com o restante do texto previamente estabelecido aqui, ou seja, com as perícopes 6:2-4; 5-8; 16-18, respectivamente. Ora, nossa perícope previamente demarcada (6:1) diz respeito ao trato dos judeus para com o que consideravam ser a forma mais adequada de praticarem sua religiosidade, baseada na esmola, na oração e no jejum. Com o emprego do termo esmola ao invés de justiça a ligação de 6:1 passa a limitar-se tão somente ao trecho subseqüente que se refere às esmolas (6:2-4), desvinculando-se completamente dos trechos reservados para tratar da oração e do jejum. Ainda, o isolamento das perícopes (6:5-8; 16-18) faria delas intervalos de esclarecimentos um tanto quanto sem sentido. Não que as instruções a esse respeito não continuassem válidas, mas as deixariam sem uma razão lógica se considerados critérios técnicos mínimos para a elaboração de uma narrativa, ou de uma “pregação” , o que parece ser o caso dos sinóticos. Assim, para todo o restante deste trabalho, tudo quanto será considerado diz respeito à avaliação de acordo com o Texto Eclético (dikaiosu,nhn nhn = justiça),
entendendo que o emprego do termo esmola pelo Textus Receptus é
completamente inapropriado para o texto em questão.
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ANÁLISE MORFOLÓGICA Classificação Gramatical e Tradução prose,cete cete – verbo, imperativo, presente, ativo, 2ª pés. plural para prose,cw cw; cuide em . Îde.Ð – conjunção coordenativa (ou adversativa) para de; mas, ora. th.n – artigo definido, acusativo, feminino, singular para o`; a. dikaiosu,nhn nhn – substantivo acusativo, feminino, singular para dikaiosu,nh nh; justiça. u`mw/ mw/n – pronome genitivo, feminino, na 2ª pessoa do plural para su,; vossa. mh. – partícula negativa para mh,; não. poiei/n – verbo infinitivo, presente, na voz ativa para poie,w; fazer. e;mprosqen mprosqen – preposição genitiva para e;mprosqen mprosqen; à vista de . tw/n – artigo definido, genitivo, masculino, plural para o` ``; os. avnqrw, nqrw,pwn pwn – substantivo genitivo, masculino, plural para a;nqrwpoj nqrwpoj; homens. pro.j – preposição acusativa para pro,j; para. to. – artigo definido, acusativo, neutro, singular para o` ``; o. qeaqh/nai nai – verbo infinitivo, aoristo, na voz passiva, acusativo para qea,omai omai; ser visto. por) eles. auvtoi/ toi/j – pronome masculino, dativo, na 3ª pessoa do plural para auvto, to,j; ( por
eiv – conjunção subordinativa para eiv vv; se. de. – conj. subordinativa (coordenativa) para eiv vv; e. mh, – partícula negativa para mh,; não.
Toda a sentença eiv de. mh, ge, literalmente, se e não..., melhor traduz-se por: do contrário.
ge – partícula enfática, enclítica sentencial para ge,5; misqo.n – substantivo acusativo, masculino, singular para misqo,j; pagamento. ouvk – partícula negativa (advérbio de negação) para ouv; não. e;cete cete – verbo presente do indicativo, na voz ativa, da 2ª pessoa do plural de e;cw cw; tendes. para. – preposição dativa para para,; com . tw/ | – artigo definido, dativo, masculino, singular para o`; o. patri. – substantivo dativo, masculino, singular para path,r; Pai. u`mw/ mw/n – pronome genitivo, na 2ª pessoa do plural para su,; vosso. tw/ | – artigo definido, dativo, masculino, singular para o`; o. evn – preposição dativa para evn; em. toi/j – artigo definido, dativo, masculino, plural para o`; os. ouvranoi/ ranoi/j – substantivo dativo, masculino, plural para ouvrano, rano,j; céus. 5
ge, freqüentemente pode deixar de ser traduzida. As traduções mais freqüentes, no entanto, são
ainda que, pelo menos; mesmo assim, por certo; se de fato, assim como, se é que; de outra forma; pelo contrário; para não dizer, quanto mais. Sempre associada a outras partículas, sentenças ou pronomes.
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Considerações Gramaticais O verbo prose,cete para]; guardai-vos , tenham o cuidado , prestem cete (cuide em [ para atenção )
no imperativo expressa uma ordem. É compreensível, em meio a uma seção
inteira de instruções relacionadas ao viver cristão, que uma “determinação” , nesses termos, seja feita. Dos outros três verbos da perícope, o segundo, poiei/n ( fazer fazer ) encontra-se em sua forma infinitiva, preservando o tempo presente e a voz ativa com relação ao sujeito, sendo indispensável a sua análise em conjunto com o substantivo relacionado (dikaiosu,nhn nhn = justiça ), para que não fique sem sentido; o terceiro, qeaqh/nai nai (ser visto), também na sua forma infinitiva, é alterado por ser um aoristo, bem
como, por ser conjugado na voz passiva com relação ao sujeito, sendo o único verbo da sentença exprimindo o fato de o sujeito sofrer a ação, motivo pelo qual merece destaque pela ênfase no interesse que o sujeito deve desprezar por ser a parte condenável de toda a advertência que está sendo feita (agir de determinado modo com o fim de ser visto [com bons olhos; ser agradáveis] pelos homens e não por Deus, que é o Verdadeiro Recompensador); o quarto e último verbo da perícope, e; e;cete cete (tendes), trás de volta o presente na voz ativa, sendo o presente do indicativo, indicando uma ação contínua ou num estado incompleto, chamada ainda de ação durativa ou linear (o Pai que está nos céus é o Recompensador agora e eternamente). Ainda cabe outra consideração quanto ao emprego do verbo e;cete cete (no presente do indicativo); a qualidade da ação, que é a idéia dos tempos verbais, segundo o estudo gramatical da língua grega, dá conta de que mesmo no indicativo a idéia temporal é secundária. Normalmente, o tempo presente indica uma ação incompleta ou continuada, carecendo de uma avaliação associada ao contexto de sua escrita ou de sua fala, podendo ser denominada de ação durativa ou linear. Assim, o “não tendes” do texto pode significar, se avaliado em um contexto mais amplo, que os hipócritas tanto não têm recompensa de Deus agora como não terão posteriormente, também. Ainda, com relação ao verbo prose,cw cw (prose,cete cete em seu modo imperativo, no tempo presente e na voz ativa para a 2ª pessoa do plural, como está em nossa perícope), que pode significar prestar atenção, estar preocupado com , cuidar de, dar atenção a, ser cuidadoso , estar vigilante ,
consideradas suas possíveis variações, percebe-se uma
quantidade significativa de seu emprego nos sinóticos, exclusivamente por Mateus e Lucas (10 vezes, sendo 6 delas em Mateus). Mateus emprega este verbo no imperativo por cinco vezes, todas elas em instruções dadas pelo próprio Jesus a seus discípulos 10
(6:1; 7:15; 10:17; 16:6,11). Ora, tão incisiva instrução de cautela, em forma de determinação, assevera a vigilância que se faz necessária para que, especificamente no caso que estamos avaliando, no decurso da prática de nossa religião, não caiamos no relaxo ou na armadilha de ver algo interessante em agirmos para demonstrar nossa justiça para as pessoas que nos cercam, quando só devemos demonstrar tal empenho ao Pai do céu, que é quem verdadeiramente recompensa aos fiéis por suas obras de justiça. O sujeito do texto em questão está oculto, embora não tenhamos dúvida de se tratarem dos discípulos de Jesus (5:1-2). A eles (os discípulos) é feita a recomenda. E a asseveração da ordenança se destaca, também, pela repetição do advérbio de negação por três vezes na perícope (mh, duas vezes; e ouvk uma vez). Essas negativas enfatizam a ordenança e a eventual conseqüência de sua desobediência, afirmando literalmente: “ não façam... se não... não receberão!”
– o que faz do texto em questão um trecho
auto-explicativo e que não suscita divergências consideráveis de interpretação. O objeto direto do texto th.n dikaiosu,nhn nhn [u`mw/ mw/n] (a vossa justiça ), adequadamente relacionado ao imperativo prose,cete cete, amparados pelo verbo secundário (subordinado ou auxiliar) poiei/n e sua partícula de negação mh., traduzível por “cuide em não fazer a justiça [vossa]”,
apontam a raiz do texto, sobre a qual, o restante da
sentença irá se basear para o desenvolvimento de toda a idéia. Todavia, a esse respeito, esse estudo receberá uma atenção maior na análise sintática, mais adiante.
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ANÁLISE SINTÁTICA Diagramação da Relação Sintática de Mateus 6:1 poiei/n mh,
prose, cete cete
Îde,Ð (X) (X)
th.n dikaiosu,nhn nhn u`mw/ mw/n qeaqh/nai nai
e;mpro m prosqe sqenn tw/ tw/n avnqrw, nqrw,pwn pwn
de, e;cete
pro,j
to,
auvtoi/ toi/j
misqo, n
ouvk
eiv
$prose,cete% cete%
(X) (X)
para para,, tw/ tw |/ patri,
mh,
u`mw/ mw/n
ge
ev n
toi/j ouvranoi/ ranoi/j
tw/ |
Comentário da Relação Sintática O versículo em questão é dividido em duas partes (frases). No caso, aqui, o que caracteriza essa divisão são as colocações dos verbos prose,cete cete e e;cete cete, respectivamente, abrindo cada uma das frases da perícope. E isto o diagrama a cima evidencia bem. Se a frase inicial do texto abre com a determinação “cuide para”, a frase complementar abre com o “tendes” , deixando claro que o que cumpre ou não a determinação feita tem ou não uma recompensa pela obediência ou desobediência à determinação. Analisemos, então, cada uma das frases: poiei/n mh,
prose,cete cete
Îde,Ð (X) (X)
th.n dikaiosu,nhn nhn u`mw/ mw/n qeaqh/nai nai
de,
e;mpros mprosqen qen tw/ twn/ avnqrw, nqrw,pwn pwn
pro,j
to,
auvtoi/ toi/j
cete sqon, Prose,cete cete Îde.Ð th.n e;dikaiosu, nhn nhn u`mmw/ miw/ n mh. poiei/n e;mprosqen mprosqen tw/n avnqrw, nqrw,pwn pwn pro.j to. qeaqh/nai nai auvtoi/ toi/j\ j\ouv/kCuide para eiv não fazer a vossa justiça diante dos homens a fim de
serdes vistos por para, areles; a, tw/ tw |/ patri,
(X) (X)
$prose,cete% cete% mh,
Algumas observações u`mw/ mw/n precisam ser feitas. •
•
ge
evn toiestá j/ ouvranoi/ rdeterminando anoi/j O verbo no imperativo e justificando a razão de existência da tw/ | instrução; A ocorrência de um verbo (poiei/n) auxiliar antes do objeto direto;
12
•
O objeto direto na frase (dikaiosu,nhn nhn) está acompanhado de um elemento especificador (u`mw/ mw/n) que não permite confundir a justiça em questão com nenhuma outra, ou seja, trata-se da justiça vossa, melhor dizendo, da justiça dos discípulos. É essa justiça que os discípulos têm de ter o cuidado de não praticar de modo condenável. Essa, como uma terceira forma de prática de justiça (sabemos que há uma justiça de Deus; conf. 5:20, onde se vê que há uma justiça dos escribas e fariseus e, essa “terceira” que deve ser praticada de modo a ser superior à “segunda”). Esse trecho das escrituras ecoa no restante dela levandonos ao entendimento de que podemos ser justos sim, que tanto podemos quanto devemos praticar atos de justiça sim, sendo que o condenável é a exposição de tais práticas com o intuito de nos auto-promover, requerendo algum mérito pela manifestação pública desses atos, que só devem ser percebidos por Deus;
•
O verbo auxiliar que precede o objeto direto carrega uma partícula de negação (mh.) que ampara e justifica a determinação que abre a frase (não fazer ), ), além de ligá-lo a uma explicação pormenorizada, nada genérica, sobre o “como ou o onde não fazer”, ou seja, diante dos homens. No diagrama, nota-se o apontamento de tal classificação por meio de um modificador sem idéia verbal, antes, o modificador serve para esclarecer que algo (a justiça dos discípulos ) não pode ser feita de certa forma (diante dos homens );
•
Ainda ligado ao verbo auxiliar, dessa vez por um modificador semi-verbal (já que trás consigo outro verbo – infinitivo – na sentença [qeaqh/nai nai = serdes vistos ]),
o modificador trás a idéia de que há uma intenção a ser evitada diante
dos homens, quanto à prática da justiça, trata-se de não fazer diante dos homens com o fim de ser visto por eles ;
Sendo assim, a frase: “Cuide para não fazer a vossa justiça diante dos homens a fim de serdes vistos por eles”
– constitui-se na parte notória e primordial da perícope.
Nela, estão contidas a determinação proibitiva a ser cumprida e a especificação a respeito do que é o ato condenável. A justiça tem de ser feita pelos discípulos. E tem de ser bem feita, de modo a exceder, e em muito, a dos religiosos hipócritas comuns à época e ao local em questão. Se a primeira frase da perícope, então, traz a determinação, a segunda, que passaremos a ver agora, traz a conseqüência da obediência ou não à determinação: 13
A segunda frase da perícope, então, diz:poiei/n mh,
prose,cete cete
th.n dikaiosu,nhn nhn u`mw/ mw/n
eiv Îde, de.Ð mh, ge( misqo.n ouvk e;cete cete para. tw/ | patri. u`mw/ mw/n tw/ | evn toi/j ouvranoi/ ranoi/jÅ jÅ / “do nai contrário, não tendes recompensa junto ao vosso Pai que está nos céus”.qeaqh/nai (X) (X) e;mpros mprosqen qen tw/ twn/ avnqrw, nqrw,pwn pwn pro,j to, de.de, auvtoi/ toi/j e;cete ouvk
misqon, eiv
(X) (X)
para, ara, tw/ tw |/ patri,
mh,
u`mw/ mw/n evn
$prose,cete% cete%
ge toij/ ouvranoi/ ranoi/j
tw/ |
Vamos às considerações: •
O ponto alto após o pronome auvtoi/ toi/j\ j\ ( por eles) marca o final da primeira frase da perícope;
•
A partir daí, todo o conteúdo compõe a segunda frase; a conjunção subordinativa de. (e), que segundo o diagrama é coordenativa, ligando a primeira à segunda
frase, precisa ser associada à outra conjunção subordinativa eiv (se) e à partícula de negação mh, (não), que por sua vez carrega consigo a partícula enfática sentencial ge que embora não sendo traduzida aqui, pelo diagrama, nota-se a ênfase e o cuidado em preservá-la, como asseveradora da negativa. Pelo diagrama, todavia, é necessário certo esforço para reunir as quatro partículas, separadas pelo único verbo da frase e; ( cete cete) e a providencial repetição gráfica do sujeito oculto [(X) = os discípulos ] e do imperativo da perícope (prose,cete cete). Como visto mais a cima, a reunião das quatro partículas de forma coordenada, considerando o contexto da frase como um todo, justifica uma tradução que sugere “se não” ou, como sendo preferida aqui, “do contrário” ; •
O único verbo da frase (tendes) liga o objeto direto da frase que ficou isolado (recompensa ). Todavia, o verbo, carrega dois modificadores no diagrama, o primeiro sem idéia verbal, e o segundo com modificador verbal. No segundo caso, o conectivo eiv (se), que passa pela simbólica repetição do sujeito e do imperativo do texto liga-o à enfática negativa mh, ge, não para que tenha ares de ação condicional hipotética, mas consecutiva, o que equivale dizer que, invariavelmente, se o sujeito não agir conforme o que está sendo determinado, 14
uma pré-determinada conseqüência será inevitável. Já o primeiro modificador, sem idéia verbal, modifica a sentença tendes recompensa para não tendes recompensa , pela ligação ao advérbio de negação (segundo o diagrama) ouvk. •
A expressão para. tw/ | patri. ( junto junto ao Pai ) complementa o modificador, ou seja, para os discípulos é enfatizado que eles não têm recompensa junto ao Pai, ainda que possam vir a ter entre os homens diante os quais os atos de justiça sejam praticados. Mas, o Pai também é sucedido de outro modificador, também sem idéia verbal;
•
Primeiro, o Pai ao qual Jesus se refere não é qualquer pai; certamente não se trata do pai dos hipócritas (conf. Jo 8:44), antes, trata-se do Pai dos discípulos ([u`mw/ mw/n] vosso Pai). Mas, para que esse Pai ainda não seja confundido com o pai natural de cada discípulo, o modificador no diagrama liga o Pai à pormenorizada informação de que se trata do Pai tw/ | evn toi/j ouvranoi/ ranoi/j (que está nos céus ).
Comentário Conclusivo da Análise Sintática Pela predominância de verbos na voz ativa (dos quatro, três deles estão na voz ativa), entende-se que o próprio sujeito (ainda que oculto), os discípulos, exerçam as ações contidas na instrução de Jesus. São eles que têm de cuidar, que têm de fazer adequadamente e que têm de ter conforme seu procedimento. A instrução do Senhor é dada, mas são os discípulos que se encarregam de executar a ordem tal qual o estipulado pelo Mestre. De modo intrínseco, no entanto, há que se esperar uma ação de Deus (o Pai dos discípulos que está nos céus ), e os modificadores sem idéia verbal que estão presentes no diagrama servem perfeitamente para dar essa idéia. Esses modificadores, ligados um ao outro, que por sua vez estão ligados ao verbo e ao objeto direto da segunda frase (tendes recompensa ), nem teriam maiores razões de existência, se não, para deixar claro que a recompensa verdadeira e útil que se pode esperar será a entregue pelo Pai que está nos céus, e não pelos homens eventualmente expectadores dos discípulos quando do exercício de sua religiosidade.
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Tradução Literal “Cuide em ora a justiça vossa não fazer à vista de os homens para o ser vistos por eles se e não pagamento não tendes com o Pai vosso o em os céus.”
(Conforme o Novo Testamento Interlinear)6: “Tende cuidado de a justiça vossa não fazer diante de as pessoas para serdes vistos por elas; se e não ( =do contrário), recompensa não tendes junto a o Pai vosso o (que está) em os céus.”
Outras Traduções Bíblicas ARA – Guardai-vos de exercer a vossa justiça diante dos homens, com o fim de serdes vistos por eles; doutra sorte, não tereis galardão junto de vosso Pai celeste. ARC – Guardai-vos de fazer a vossa esmola diante dos homens, para serdes vistos por eles; aliás, não tereis galardão junto de vosso Pai, que está nos céus. ACF – Guardai-vos de fazer a vossa esmola diante dos homens, para serdes vistos por eles; aliás, não tereis galardão junto de vosso Pai, que está nos céus. NTLH – Tenham o cuidado de não praticarem os seus deveres religiosos em público a fim de serem vistos pelos outros. Se vocês agirem assim, não receberão nenhuma recompensa do Pai de vocês, que está no céu. BJ – Guardai-vos de praticar a vossa justiça diante dos homens para serdes vistos por eles. Do contrário, não recebereis recompensa junto ao vosso Pai que está nos céus. TEB – Guardai-vos de praticar vossa religião diante dos homens para atrair os seus olhares; do contrário, não haverá nenhuma recompensa para vós da parte do vosso Pai que está nos céus. TVAMS7 – Guardai-vos de fazer as vossas boas obras diante dos homens, com o fim de serdes vistos por eles, doutra sorte não sereis remunerados pelo vosso Pai, que está nos céus. BEP8 – Prestem atenção! Não pratiquem a justiça de vocês diante dos homens, só para serem elogiados por eles. Fazendo assim, vocês não terão a recompensa do Pai de vocês que está no céu. NVI – “Tenham o cuidado de não praticar suas ‘obras de justiça’ diante dos outros para serem vistos por eles. Se fizerem isso, vocês não terão nenhuma recompensa do Pai celestial. NIV – "Be careful not to do your 'acts of righteousness' before men, to be seen by them. If you do, you will have no reward from your Father in heaven. RVR959 – Guardaos de hacer vuestra justicia delante de los hombres para ser vistos por ellos; de otra manera no tendréis recompensa de vuestro Padre que está en los cielos. 6
Novo Testamento Interlinear . Sociedade Bíblica do Brasil. 1ª Ed. 2004.
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Tradução da Vulgata Anotada pelo Pe. Matos Soares. 5ª ed. No Brasil, 1957.
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Bíblia Edição Pastoral. Editora Paulus.
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Reina Valera Edição Revisada 1995.
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Comentário sobre as Traduções A fim de partirmos para um comentário que vise apresentar o que seja mais próximo do que se acredita ter sido escrito originalmente, após considerar os contextos imediatos e mais amplos que circundam a perícope, antes de comentar as versões bíblicas mais comuns, vejamos, mais uma vez, uma tradução literal conforme a tradução léxica das palavras do texto grego eclético, associadas às análises lingüística, manuscritológica, morfológica e sintática: “Cuidem em não praticar a vossa justiça diante dos homens a fim de serdes vistos por eles; do contrário, não tendes recompensa junto ao vosso Pai nos céus”.
Crendo ser essa a tradução mais literal possível segundo o cruzamento das informações de que dispomos, vejamos as coincidências e discordâncias relacionadas às onze traduções bíblicas que apresentamos a cima. Das onze versões apresentadas, sete iniciam a perícope com o imperativo guardai-vos ;
duas com tenham o cuidado (igual à NIV “be careful” = seja cuidadoso );
e, apenas uma um tanto destoante, a Edição Pastoral, que abre a perícope com o imperativo excessivamente enfático “prestem atenção!” (com exclamação mesmo). Assim, pois, para com a proposta tradução literal que abre o verso com o cuidem, não há uma considerável discrepância que suscite algum debate, já que teologicamente o texto não sofre qualquer ingerência e os vocábulos empregados surgem como sinônimos, em português, para o termo grego utilizado pelo autor. O outro termo a ser considerado diz respeito ao emprego da palavra justiça por cinco das onze versões; religião e deveres religiosos por duas versões; e, boas obras e atos de retidão
por outras duas. Até aí não surge grande motivo para debates, a menos
que não se considere como atos de justiça ou de retidão e boas obras um bom sinônimo para religiosidade. E não é o que parece. Pelo contrário, todos esses termos ligam-se adequadamente à esmola, à oração e ao jejum, que são os pilares da religiosidade dos judeus, para quem o Senhor Jesus está dirigindo suas instruções, uma vez que não se contava nenhum gentio entre seus discípulos. Porém, duas das onze versões (ARC e ACF), priorizando a informação colhida no Textus Receptus, empregaram a palavra esmola
como sendo o ato a não ser praticado diante das pessoas. Como visto mais
acima, tal palavra liga a perícope delimitada à instrução quanto a dádiva de esmola (Mt 6:2-4), mas não a liga à instrução quanto à oração (Mt 6:5-8) nem quanto à instrução relacionada ao jejum (Mt 6:16-18). Os motivos pelos quais essa ligação se faz 17
necessária já foram comentadas mais a cima, todavia, reforça-se a máxima de que as instruções do Mestre para com a vida de oração e jejum praticamente perderiam seu sentido, caso fossem separadas da perícope aqui analisada. Isso faz com que essas duas versões (ARC e ACF), ao menos com relação a esse trecho das Escrituras, nos sejam consideradas menos apropriadas. Das onze versões examinadas, nove falam que é diante dos homens que não se deve praticar a justiça. A NTLH diz que os atos não devem ser praticados em público; e a NVI diz que é diante dos outros. Como o termo grego empregado é avnqrw, nqrw,pwn pwn, que pode ser traduzido por pessoas, seres humanos , dentre outros termos semelhantes, não é notada, aqui, uma disparidade considerável para que se debata a possibilidade de interpretações dúbias. Nove das onze versões sugerem que o condenável é a intenção de serem vistos pelas pessoas, quando da prática da justiça. Mas, a TEB condena a prática da justiça para atrair os seus olhares,
ou os olhares dos homens, claro. Realmente, a tentativa de
atrair os olhares dos homens para que fosse prestada a devida (ou indevida) atenção quando do exercício da prática religiosa é que foi condenado por Jesus deliberadamente. Os “toques de trombetas” (6:2) no momento de dar esmolas, as orações “em pé nas sinagogas e nos cantos das praças” (6:5), bem como os “rostos contristados e desfigurados” quando dos momentos de jejum (6:16), claramente identificados por Jesus como sendo com o mero fim de atrair os olhares das demais pessoas, é que lhes valeu o adjetivo de hipócritas e de terem suas atitudes condenadas e utilizadas como “o modelo” de como não se deve proceder, para que a justiça dos discípulos de Jesus viesse a exceder em muito a dos escribas e fariseus. Assim, embora sendo a tradução da TEB, aqui, um pouco destoante da maioria das versões (9 de 11), há que se admitir que ela trouxe, ao invés de discórdias e discussões, uma ótima contribuição para compreensão da instrução de Jesus que leva em conta toda a prática da religiosidade, abrangendo a esmola, a oração e o jejum, com a mesma instrução e, conseqüentemente, com a mesma advertência quanto à punição. Se observada a fidelidade lingüística, a TEB pode ser acusada de ter agido de modo a priorizar mais a questão teológica do que a gramatical, já que os termos gregos da perícope não apresentam nenhuma expressão que se traduza por “atrair” . Mas, a Edição Pastoral foi ainda mais além. Onde a maioria traduziu “para serem vistos” , ela traduziu por “para serem elogiados” . Assim, se a TEB terá dificuldades para justificar o emprego de atrair , o que dizer das dificuldades da BEP para justificar o emprego de elogiados ? O que a Bíblia Edição 18
Pastoral fez foi uma espécie de “adiantamento” de interpretação de expressão. Sim, pois se a preocupação dos hipócritas é, antes, a de chamar a atenção dos presentes para que os vejam exercendo a sua justiça, o mínimo que se pode esperar é que eles almejem algum reconhecimento do público em virtude das obras demonstradas. O termo grego traduzido por serdes vistos (qeaqh/nai nai, de qea,omai omai), não sugere essa possibilidade de tradução (elogiados ), assim, as questões de traduções, lingüísticas e gramaticais, mais uma vez, foram negligenciadas para que a questão teológica ganhasse a primazia. É preciso admitir, ainda, que o só esperar elogios das pessoas pode significar pouco, estendendo-se à espera de alguma recompensa material, moral, política, “eclesiástica” e etc. Daí, pela fertilidade da mente humana, as possibilidades de adendos e substituições de umas palavras, no grego, para outras no português, afim de “melhorar” o entendimento da Escritura pode vir a nos distanciar demais do que os autores canônicos inicialmente redigiram. Não é uma heresia a tradução da BEP, longe disso. Até, semelhantemente à TEB, traz uma boa contribuição para interpretação do texto avaliado em um contexto mais amplo. Todavia, isso não apaga o fato de o tradutor ter feito não somente uma tradução textual, mas sim, apresentado sua interpretação – pessoal – do texto em questão. Nessas empreitadas, às vezes eles agem bem, mas às vezes, nem tanto. Passando para a segunda parte do versículo, temos que das onze versões, cinco delas abrem a sentença com as expressões doutra sorte, ou do contrário; quatro dizem se agirem assim ,
ou fazendo assim; mas duas delas (ARC e ACF), de modo até
“desafinado”, abrem a frase com “aliás”, no que leva os leitores a crerem que, com relação à primeira parte da perícope, é certo que os discípulos agiram exatamente como Jesus lhes instruiu para não agirem. Essa opção do tradutor, semelhante a outras tantas opções de outros tantos tradutores, servem para que captemos as suas intenções, melhor, para que o flagremos colocando na tradução o que venha ser a sua interpretação pessoal10. Neste caso, especificamente, o que se pode dizer é que a interpretação foi, no mínimo, desastrosa. Diferentemente de outros casos analisados mais a cima, aqui, o emprego de uma simples palavra trás uma modificação de sentido ao texto. Como já dito, é válido repetir, o emprego de “aliás” para abrir essa segunda parte do versículo colocou a primeira parte como sendo uma advertência inútil. Talvez, e isso é tão 10
Quando se diz pessoal, como aqui, referindo-se à interpretações de textos bíblicos, não necessariamente a referência é feita a uma pessoa em especial, particularmente. Antes, e é o que ocorre na maioria das vezes, a referência é feita a um grupo de tradutores.
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especulativo quanto a tentativa de concertar a tradução feita, se ao final da frase, ou no início dela, a expressão “agindo assim” fosse adicionada – ou não fosse negligenciada – tal falta, tão grave, não viesse a ser observada. Trata-se, aqui, de um aparato dificultador para a interpretação do texto bíblico, onde se vê a possibilidade até da manutenção, por parte de alguns, da personificação de um Deus irado, castigador, contra a qual – personificação – Martinho Lutero se levantou. Isso pela interpretação, se considerado literalmente o exposto por essas duas versões, de que, independente da forma de agir para com a instrução dada pelo Mestre, de qualquer modo, “aliás”, a devida punição já está previamente estabelecida. De mais desanimador, ainda, é a constatação de que, ao menos a ARC, é uma das versões bíblicas mais populares do Brasil nos dias atuais, principalmente entre os crentes ligados aos grupos chamados de Pentecostais. Agora, bem mais polêmica, ainda, é a frase que se segue, onde misqo.n ouvk e;cete cete traduz-se literalmente por recompensa não tendes (ou, não tendes recompensa). Quanto ao termo recompensa , usado por sete das onze versões, ou galardão , usado por outras três, ou ainda, remuneração por uma delas (Pe. Matos Soares), não há qualquer problema, já que recompensa, galardão ou remuneração são sinônimos perfeitos. O problema aqui é bem mais sério, e diz respeito ao tempo verbal empregado pelas onze traduções analisadas para o verbo “ter” , que se no grego está no tempo presente – do indicativo – nas versões que estudamos aqui aparece no futuro. Certamente há uma fortíssima influência de cunho escatológico para justificar esse caso. No passado, tanto para teólogos europeus quanto norte americanos, a hoje falida linha Pós-milenista era fortemente considerada, sendo que, atualmente – e já há bastante tempo – as linhas Prémilenista e Dispensacionalista é que são praticamente dominantes. O que se conclui disso é que, inevitavelmente, todos esses intérpretes ou grupos de intérpretes priorizavam a idéia de recompensa estritamente pós morte em relação à obediência ou não às instruções bíblicas. A tradução que dá conta de uma recompensa que os discípulos “não terão” , da parte do Pai que está no céu, destoa, por exemplo, da declaração de Jesus afirmando: “Em verdade vos digo que eles já receberam a recompensa.”
repetida por três vezes (6:2, 5, 16), respectivamente, relacionada à forma
errada de se praticar a esmola, a oração e o jejum. Assim, em se traduzindo a declaração do grego, literalmente como foi escrito, teremos que o Pai que está nos céus está recompensando os hipócritas no exato momento em que eles estão procedendo inadequadamente. O verbo e;cete cete (tendes ) no presente do indicativo, como já abordado 20
mais a cima, indica uma ação contínua ou num estado incompleto (durativa ou linear), que muito bem pode indicar, para o caso em questão, uma recompensa que os discípulos receberão futuramente, porém, mais que isso, ele também indica que tal recompensa já pode estar sendo entregue – ou não – exatamente no momento da obediência – ou negligência – do discípulo para com a ordem dada pelo Senhor. Atualmente, pois, muito provavelmente só os Amilenistas fariam questão de preservar para o texto o verbo tendes
no presente do indicativo, crendo estarem os discípulos sendo recompensados
imediatamente, pelo Pai que está nos céus, por meio de bênçãos espirituais (não necessariamente materiais, naturais ou palpáveis, conforme Ef 1:3) instantaneamente, primeiro e, futuramente também, preservando a noção escatológica geral que possa prever tal recompensa para a Glória futura depois do fim dos tempos, não exclusivamente, mas tão somente admissível tanto quanto as recompensas imediatas. É bem verdade que o Néo-pentecostalismo pendeu para um extremo bem mais “agressivo”, transformando em algo absolutamente imediato, material e palpável as recompensas pela “adequada” prática da religiosidade ou demonstração de “fé”, o que é outro equívoco (este, bem mais prejudicial que o primeiro). De qualquer forma, para isso (melhor interpretação), especificamente, recursos como a exegese estão à disposição dos elaboradores de sermões, ou seja, para que ao se depararem com textos como este, onde a totalidade das versões correntes levam à crença de que o que temos nos está sendo colocado de modo indiscutível, ainda cabe uma mais acurada investigação. Assim, no caso analisado aqui, tendo que todas as nossas versões modernas possíveis apresentam as recompensas pela desobediência somente para o futuro (talvez pós morte), advertências precisam ser feitas para que se entenda que o texto em questão, comparado com outros tantos, dão contas de que as recompensas tanto pela obediência quanto pela desobediência, podem ser recebidas imediatamente também, ainda que essas possam nos passar despercebidas, não sendo vistas, tocadas, sentidas ou ouvidas, ou seja, tratando-se tão somente de bênçãos espirituais – ou a falta delas – nos céus. O final do versículo não suscita divergências quanto à tradução, apresentando como O Recompensador o Pai que está nos céus, ou seja, Deus. E fecha-se toda a sentença da perícope com a máxima de que a religiosidade não pode ser praticada com o fim de se mostrar para as pessoas no intuito de aguardar qualquer recompensa da parte delas, se não, de Deus, e tanto para o futuro quanto imediatamente.
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