1- LIBERDADE DE IMPRENSA: CONCEITUAÇÃO Valor inerente e essencial ao desenvolvimento da personalidade humana e da vida social, a liberdade deve ser compreendida pelo jornalista como indispensável para exercer sem entraves a sua atividade intelectual. Isso significa poder exprimir livremente suas idéias, em qualquer ordem de pensamento, quer seja pela palavra oral ou escrita. Para ser livre, o indivíduo precisa ter asseguradas condições em que possa expandir o seu intelecto e personalidade, sem outras restrições senão aquelas que constam na lei (BELTRÃO, 1992, p.158). A liberdade de imprensa é tão fundamental para o exercício do jornalismo quanto o fato o é para a notícia. De outro modo não é possível informar. Como forma de zelar pela liberdade, vários textos jurídicos trazem essa garantia, apesar de muitas vezes não serem cumpridos. A primeira emenda da Constituição dos Estados Unidos, elaborada em 1787 e em vigor até os dias de hoje, determina determina que não haverá nenhum nenhum tipo de controle controle sobre as liberdades individuais, além de abolir a autocensura e defender uma sociedade com os verdadeiros princípios democráticos: "O Congresso não legislará no sentido de estabelecer uma religião, ou proibindo o livre exercício exercício dos cultos; cultos; ou cerceando cerceando a liberdade liberdade de palavra, palavra, ou de imprensa, ou o direito direito do povo de se reunir pacificamente, e de dirigir ao Governo petições para a reparação de seus agravos".
1.1 – Liberdade garantida por lei A libe liberda rdade de de impre imprens nsa a é um co conc nceit eito o fund fundam ament ental al para para os gove govern rnos os regi regido doss pela pela democracia como forma de eliminar a censura. Esse princípio tem respaldo no artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovado em 10 de dezembro de 1948, pela Organização das Nações Unidas: Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião opinião e de expressão, expressão, o que implica o direito de não não ser ser inqu inquiet ietad ado o pelas pelas suas suas opin opiniõe iõess e o de proc procur urar ar,, receb receber er e difu difund ndir, ir, sem sem consideração de fronteiras, informações e idéias por qualquer meio de expressão. Na Constituição Constituição Brasileira o artigo 5º, inciso IX, estabelece a liberdade de manifestação de pensamento sem que os indivíduos sofram qualquer tipo de censura. A Carta Magna foi promulgada em 1988, três anos após o fim da ditadura militar (1964 - 1985), surgindo com a necessidade de restabelecer os direitos humanos e sociais do país, abalados durante os anos de chumbo: “É livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”. A garant garantia ia legal legal da liberda liberdade de de express expressão ão implica implica,, direta diretament mente, e, na consol consolida idação ção da liberdade de imprensa como ferramenta essencial para a liberdade da sociedade, seja essa para para serv servir ir co como mo difu difuso sora ra ou recept receptor ora a de info inform rmaç ação. ão. Po Porr me meio io da Decla Declaraç ração ão de Chapul Chapultep tepec, ec, em março março de 1994, 1994, no México México,, diverso diversoss países países das Améric Américas as do Norte, Norte, Central e Sul assinaram assinaram um protocolo de intenções intenções visando preservar o direito à liberdade de imprensa no continente. A Convenção Americana de Direitos Humanos, realizada em San José, Costa Rica, em 1969, estabelece, no artigo 13, atenção especial à liberdade de expressão. Nesse período, o Brasil vivia os anos de chumbo da ditadura militar e, por esse motivo, ratificou a carta apenas em 1992: Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão.
Esse direito inclui a liberdade de procurar, receber e difundir informações e idéias de qualquer natureza, sem considerações de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer meio de sua escolha. O código de ética dos jornalistas brasileiros, em vigor desde 1986, determina no artigo 1º que o acesso à informação pública é um direito inerente à condição de vida em sociedade, não podendo ser impedido por nenhum interesse. Adiante, no artigo 9º, estabelece que os jornalistas devem lutar pela liberdade de pensamento e expressão, além de defender o livre exercício da profissão (ANDRÉ, 2000, p.18). Apesar de toda a base legal, a liberdade de imprensa sofre ameaças em virtude de “brechas” oriundas dos textos. De acordo com Karam (1997), os dispositivos da Constituição permitem toda a sorte de interpretações particulares, conforme a posição política, ideológica e cultural de quem tem o poder para deliberar sobre determinado fato ou afirmação. No inciso IV do artigo 221, a Carta Magna determina que a programação das emissoras de rádio e televisão deve atender os valores éticos e sociais da família. Porém, o conceito “valores éticos e sociais da família” não determina que tipo de família a lei especifica, abrindo espaço para censura e atentados à liberdade de informação: “Podemos estar sujeitos aos padrões éticos de uma família do início do século, com tendências repressoras, ou daquelas que impulsionaram, juntamente com os filhos, o woodstok, pregando a liberdade no mundo”. (KARAM, 1997, p. 17) O jornalista Carlos Rizzini defende, no livro Liberdade de Imprensa, a criação de instrumentos para reprimir abusos que venham a ser cometidos por jornalistas. De acordo com Rizzini, o sentido de liberdade de imprensa não deve ser confundido com libertinagem, deixando o jornalista livre para fazer o que bem entender. É preciso seguir regras, leis predeterminadas que façam com que os profissionais da comunicação sigam uma legislação específica: “Devemos todos trabalhar por uma imprensa cada vez mais livre – livre das limitações externas, que são a opressão e livre das internas, que são a irresponsabilidade”. (RIZZINI, 1998, p. 45)
1.2 – Lei de imprensa No Brasil, todos os assuntos ligados à imprensa são tratados por meio de leis específicas. A Lei de Imprensa nº 5.250, de 9 de fevereiro de 1967, elaborada pelo governo militar (19641985), representa a quinta tentativa de instituir uma legislação específica à imprensa brasileira. Os militares, instalados no poder por meio de um golpe defendiam, a princípio, a liberdade de imprensa, mas a cerceavam na prática, de forma menos ou mais violenta, de acordo com cada momento histórico. Como observa Carlos Eduardo Lins da Silva (1991), essas contradições às vezes eram sutis, outras vezes escandalosas, como o texto da Lei de Imprensa de 1967 que, em seu artigo 15 primeiro, afirma com ênfase: “É livre a manifestação do pensamento e a procura, o recebimento e difusão de informação ou idéias, por qualquer meio, e sem dependência de censura”. Logo em seguida, no parágrafo primeiro, os militares instituíram um texto privando a liberdade de imprensa ao determinar que não seria aceita, entre outras, a publicação de notícias que fizessem oposição ao governo, determinando: “(...) não será tolerada a propaganda de guerra, de processos de subversão da ordem política e social ou de preconceitos de raça ou classe”. Tramita no Congresso, desde 1991, um projeto para substituir a presente lei. De autoria do ex-senador Josaphat Marinho (BA), teve aprovação da Associação Brasileira de Imprensa, mas sofreu pressões de grupos políticos de esquerda, que apresentaram outra propositura. Os dois projetos foram relatados em 1995 pelo senador José Fogaça (RS), mas ainda não
houve votação em plenário em virtude dos vários pontos de divergência nos setores políticos. Entre os temas mais polêmicos está o da obrigatoriedade do diploma para o exercício do jornalismo, a eliminação da exceção da verdade para certas personalidades, como o Presidente da República, e a substituição da pena de prisão para jornalistas por multas e prestação de serviços comunitários (ANDRÉ, 2000, p.80).
2 -A LUTA PELA LIBERDADE DE IMPRENSA NO BRASIL No Brasil, a discussão sobre a liberdade de imprensa é tão antiga quanto o próprio jornalismo. Ao longo da história, o país passou por diversas tentativas de supri-la em face de interesses particulares, que falavam mais alto que os interesses coletivos.
2.1 – O início da imprensa no Brasil A busca pela liberdade de imprensa no Brasil data do Império. Muitos foram os personagens que marcaram a história do início da imprensa lutando pelo direito de informar sem restrições, sejam essas legais ou por interferência dos governos. Em 1747, era proibida a instalação de tipografias no Brasil, prevendo-se prisão e exílio aos infratores. O clima de terror intelectual, segundo Rizzini (1957, p.23), dura até 1808. Esta data marca o lançamento da imprensa no país por meio de três acontecimentos. O primeiro é a publicação do Correio Braziliense, elaborado pelo jornalista Hipólito José da Costa. Em seguida, a instalação das oficinas da Impressão Régia e a elaboração da Gazeta do Rio de Janeiro, ambas motivadas pelos interesses particulares da família real, instalada no país após vir de Portugal fugindo da invasão francesa. Segundo Chaparro (1998, p.21), Hipólito escrevia e imprimia o jornal em Londres. Era exilado político, encontrando no governo britânico a proteção para a publicação do Correio, que era distribuído clandestinamente, primeiramente em Portugal, depois no Brasil. O jornal tinha característica enciclopedista e mantinha postura politicamente liberal. O jornalista mantinha o sonho iluminista de promover o homem a centro do universo, e no primeiro número escreveu: O primeiro dever do homem em sociedade é de ser útil aos membros dela. E cada um deve, segundo suas forças físicas ou morais, administrar, em benefício dela, os conhecimentos ou talentos que a natureza, a arte ou a educação lhe prestou. O indivíduo que abrange o bem geral de uma sociedade vem a ser o membro mais distinto dela; as luzes que ele espalha tiram das trevas ou da ilusão aqueles que a ignorância precipitou no labirinto da apatia, da inépcia e do engano. Ninguém mais útil, pois, do que aquele que se destina a mostrar, com evidência, os acontecimentos do presente e 23 desenvolver as sombras do futuro. Tal tem sido o trabalho dos redatores das folhas públicas quando estes, munidos da sua crítica sã e de uma censura adequada, representam os fatos de momento, as reflexões sobre o passado e as sólidas conjecturas sobre o futuro. (CHAPARRO, 1998:23) Em setembro do mesmo ano, começa a circular no Brasil a Gazeta do Rio de Janeiro, considerado jornal oficial do Império e impresso no próprio país a partir da instalação da Imprensa Régia, em 24 de junho de 1808, idealizando os princípios de D. João VI de contestar as opiniões proliferadas por Hipólito da Costa. A publicação do periódico era de responsabilidade de uma junta nomeada pela corte, havendo em grande parte atos oficiais e anúncios de compra e venda de escravos. Embora mantivesse visão unilateral, a Gazeta estampava um aviso aos leitores dizendo que, apesar de pertencer aos oficiais da secretaria de estado, não era oficial, sendo o governo responsável apenas pelas páginas dos atos oficiais (BAHIA, 1990, p.13).
O início da impressão no Brasil é tardio em comparação com outros países do continente americano, bem como a discussão sobre o tema de liberdade de imprensa. A primeira tipografia das Américas surgiu no México em 1533, a segunda, em 1584, no Peru. Em 1600, nos Estados Unidos, já havia tipografias preparadas para imprimir jornais. Em terras brasileiras coube a D. João VI a iniciativa da instalação da Impressão Régia, criando a junta imperial formada por oficiais do governo para examinar todos os papéis e livros que fossem publicados. Era a censura. Nada se imprimia sem o exame prévio dos censores reais (SODRÉ, 1998, p.18). A história da liberdade de imprensa no país foi, portanto, moldada durante maior parte a partir do fato de ser uma colônia portuguesa, deixando-a refém dos ideais repressores e controladores da corte. Para efeito de comparação, em 1787 os Estados Unidos já haviam promulgado a Constituição e logo na primeira emenda garantiam a liberdade de expressão a todos os cidadãos. Isso veio a acontecer tardiamente no Brasil, e somente graças às constantes batalhas travadas ao longo dos anos (SILVA, 1991, p.97).
2.2 – Primeira legislação De acordo com Bahia (1990, p.299), por mais bela que seja a declaração a respeito da liberdade de imprensa, incluída em qualquer constituição, sua garantia deve depender da opinião e do estado geral de espírito do povo e do governo. A primeira legislação específica para a imprensa no Brasil é de 1822. Houvealterações em seu texto original em 1823, 1826 e 1827. Em 1828, com a promulgação da primeira Constituição brasileira, o conceito de liberdade de imprensa ganha expressão no artigo 179, parágrafo 4º: Todos podem comunicar os seus pensamentos por palavras, escritos e publicá-los pela imprensa, sem dependência de censura, contanto que hajam de responder pelos abusos que cometerem no exercício deste direito, nos casos e pela forma que a lei determina. O Brasil colônia sofria com a falta de uma imprensa livre. Os movimentos pela liberdade se difundiam no mesmo passo que cresciam nos países europeus. O tema era sempre tratado com cautela pelos governantes, que temiam uma sociedade bem informada. Portugal foi um dos últimos países a declarar a liberdade de imprensa. A lei foi promulgada em 1820, mas dois anos depois foi cassada por interferência política (CHAPARRO, 1998, p.29).
2.3 – Movimentos populares: Cipriano Barata e Frei Caneca No Brasil, os movimentos populares tentavam antecipar essa liberdade. Em 1817 a Constituição Pernambucana, resultado de uma revolução popular, proclamava a liberdade de expressão, atribuindo aos autores de qualquer obra e seus impressos a responsabilidade pelos ataques à religião, à constituição e aos bons costumes (RIZZINI, 1998, p.34). Sobre a Constituição Republicana, Sodré (1998, p.92) comenta que os rebeldes brasileiros de 1817 se referem à liberdade de pensamento, proclamando-a, mas temendo-a. A liberdade é também um hábito difícil de adquirir, de entrar para a normalidade da aceitação e do comportamento. As declarações citadas refletem ainda o medo à liberdade que a servidão secular inspirava. A revolução revelou dois importantes personagens, que merecem destaque pela defesa da imprensa libertária. Os jornalistas Cipriano Barata e Frei Caneca foram os precursores do levante contra o império absolutista. Cipriano estudou em Coimbra, onde foi influenciado pelos ideais da Revolução Francesa. Ao retornar ao Brasil foi preso, envolvido em denúncias de conspiração contra o governo, mas por falta de provas foi liberado. Ingressou na revolução republicana em 1817 (CHAPARRO, 1998, p. 37).
Foi fundador do jornal republicano Sentinelas da Liberdade, que durante sua existência (1823 – 1889) era apontado como ícone dos periódicos republicanos e sinônimo de jornalismo combativo e livre. O ideal humanista está presente nas obras de Cipriano, que reclama a emancipação e a liberdade, ideal que o acompanha mesmo atrás das grades como alguém que não pode e não deve cessar de protestar (BAHIA, 1990, p.94). Eleito deputado à Constituinte pela Bahia em 1823, não pôde tomar posse, sendo substituído pelo suplente. Em dezembro havia sido preso e recolhido à fortaleza de Santa Cruz, no Rio de Janeiro. Mesmo preso, edita as Sentinelas de número 66 com o título Sentinela da Liberdade na Guarita de Pernambuco, atacada e presa na Fortaleza do Brum por ordem da força armada reunida, denunciando a violência de que é vítima e protestando contra o arbítrio do imperador. É libertado em 1830 e saudado por diversas províncias como “um campeão da liberdade”. Um ano depois edita a Sentinela da Liberdade – hoje na Guarita do Quartel General de Pirajá, na Bahia de Todos os Santos, denunciando a tentativa de suborno para deixar de escrever, e é novamente preso. Ao longo de sua militância pela liberdade, editou pelo menos 143 edições das Sentinelas. Deixou o combate em 1835, mudando-se para o Rio Grande do Norte, onde ficou até sua morte. Durante o período de 1823 a 1830, enquanto Cipriano estava preso, coube ao Frei Joaquim do Amor Divino Caneca, o Frei Caneca, a responsabilidade de ser o porta-voz dos rebeldes e defensor de uma imprensa livre. Herói pernambucano, guerreiro republicano, padre, jornalista, foi um dos mentores do levante separatista que em 1824 tentou implantar uma federação republicana reunindo as Províncias de 26 Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. Derrotado, foi preso e condenado à morte por fuzilamento no dia 15 de janeiro de 1825 (CHAPARRO, 1998, p.38). Frei Caneca foi responsável pela publicação do Tifis Pernambucano, que durante os oito meses de existência não deu tréguas ao absolutismo. No número 24, o jornal apresentou as bases de um programa político elaborado por intelectuais da província de Pernambuco. Nele, destacava como princípios a liberdade de imprensa, a admissão livre dos cidadãos às funções públicas e uma referência ao trabalho escravo (SODRÉ, 1998, p.95). Para Sodré, a historiografia oficial atribuiu a Frei Caneca o título de discípulo de Cipriano Barata, uma vez que as publicações de Tifis Pernambucanos supriam a ausência do jornalista preso, seguindo a linha crítica das Sentinelas.
2.4 – Evolução e retrocesso da liberdade Com o fracasso da revolução Pernambucana, a Constituição Portuguesa trouxe o texto sobre liberdade de imprensa no artigo 8º, determinando que a livre comunicação do pensamento é um dos mais preciosos direitos dos homens. A partir daí a censura começou a ficar mais branda até que, em 28 de agosto de 1821, ficou declarada inteiramente a livre manifestação do pensamento no Brasil: “Nunca mais se teve notícia sobre censura prévia no Brasil, nem no primeiro reinado, nem na Regência, nem no segundo reinado. Reapareceu, para vergonha nossa, nas humilhantes síncopes democráticas da República” (RIZZINI, 1998, p.35). Considerado por alguns como tirano e por outros democrata, D. Pedro I chegou a instituir no Brasil a liberdade absoluta de imprensa, permitindo, até, publicações anônimas. Mas o imperador começou a perder controle sobre as publicações e o teor das informações que eram transmitidas, até que proibiu os jornais anônimos. Em 18 de junho de 1822, foi regulamentado o texto da primeira Lei de Imprensa, redigida por José Bonifácio, ministro do imperador. A nova legislação proibia o anonimato e criava um júri para julgar os abusos cometidos pelos jornalistas. O primeiro jornalista a se sentar na cadeira do júri foi o português João Soares Lisboa, do Jornal Correio do Rio de Janeiro, que fazia oposição ao 27 imperador. Ele foi absolvido pelo júri, processado novamente pelo governo e exilado.
Morreu em um atentado no ano de 1824. De acordo com Rizzini, esse período histórico foi o grande marco de liberdade de imprensa vivido no Brasil, talvez pela influência das idéias iluministas e da maçonaria, que pregavam a liberdade e a justiça. Após a proclamação da república (15 de novembro de 1889), um decreto presidencial datado de 1921 inicia a instalação da censura nesse novo processo político brasileiro. A determinação é a proibição de publicações de textos com conteúdo ideológico-anarquista, difundidos pelos jornais e gazetas da época. Em 1930, a livre manifestação e a liberdade de imprensa voltaram a surgir mediante o artigo 113, capítulo II – Dos direitos e das garantias individuais, na Constituição de 1934, originada após a Revolução Constitucionalista de 1930. O texto permite ainda que sejam publicados livros e periódicos sem a prévia licença do poder público e assegura o direito de resposta: Em qualquer assunto é livre a manifestação do pensamento, sem dependência de censura, salvo quanto a espetáculos e diversões públicas, respondendo cada um pelos abusos que cometer, nos casos e pela forma que a Lei determina. Após a promulgação da Constituição, o governo edita o Decreto nº 24776 – Lei de Imprensa, trazendo as garantias de liberdade para o exercício profissional dos jornalistas. Mas essas leis possuem vida curta, uma vez que o presidente Getúlio Vargas institui o Estado Novo, criando a censura, com restrições e limites às manifestações do pensamento. Adotando a ideologia política fascista, Vargas exclui qualquer tipo de liberdade de imprensa. Em 1930, Vargas nomeia Salgado Filho para ocupar a 4ª Delegacia Especializada, no Rio de Janeiro, com a missão de organizar um serviço de censura. Os trabalhos do novo censor começam com as notificações às redações dos jornais e das rádios. As ordens não acatadas implicavam na apreensão das edições. A estratégia adotada pelo presidente era a de colocar jornalistas para fazerem o papel de censores. No início, a 4ª Delegacia contratou cerca de 30 jornalistas para desempenharem o trabalho com salário de 300 mil réis, valor que atraía a atenção de vários profissionais (BAHIA, 1990, p.299). Em 1939, Vargas cria o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) para executar o controle da opinião e regulamentar a censura. Dois anos antes, um decreto presidencial tornava obrigatória a publicação de propaganda e informações oficiais do governo. Com isso, as redações recebiam grande quantidade de verbas públicas. Além disso, o governo subsidia a compra de papéis, que representavam o maior custo para as empresas jornalísticas, e a compra de equipamentos gráficos e de som. Segundo Bahia (1990, p.309), essa cumplicidade do governo com os órgãos de imprensa dificultava o processo de luta pelo restabelecimento da democracia e pela liberdade de imprensa. Com a falta de liberdade de imprensa, os jornalistas ficavam obrigados a noticiar apenas o que os censores permitiam e com o consentimento dos proprietários dos veículos de imprensa. Com o suicídio de Getúlio Vargas em agosto de 1954, a imprensa restabelece a sua plena liberdade. Em 2 de dezembro do mesmo ano é eleito presidente o General Eurico Gaspar Dutra, iniciando um novo ciclo de constitucionalidade e liberdade de imprensa no país. Com o fim do Estado Novo e com a aprovação da nova Constituição, em 1946, o artigo 141, parágrafo 5º, determinava: “a manifestação do pensamento, sem dependência de censura, salvo quanto a espetáculos e diversões públicas, respondendo cada um, nos casos e na forma da Lei, pelos abusos que cometer”.
No ano de 1956 o presidente Juscelino Kubitschek apresentou ao Congresso um projeto de lei destinado a reformar a Lei de Imprensa. Num dos pontos mais polêmicos estava a punição de jornais que publicassem textos dos chamados “neoabsolutistas” que, segundo o presidente, incitavam a subversão da ordem pública. Essa medida proibia, por exemplo, que um determinado veículo de comunicação convocasse a população para a realização de protesto contra as altas taxas deinflação e, conseqüentemente, dos preços de diversos produtos. Antes de serem distribuídos, os jornais tinham suas reportagens avaliadas por uma equipe da polícia. Caso houvesse determinado assunto que não agradasse aos censores do governo, o jornal não poderia ser distribuído. Nesse período da história não havia a censura prévia, e sim a censura posterior (RIZZINI, 1998, p.79). O cerceamento à liberdade de imprensa volta à tona com a truculência do golpe militar. Em outubro de 1965 é baixado o Ato Institucional nº2 pelo presidente Castelo Branco. O AI-2 proíbe os políticos cassados de se manifestarem pelos veículos de imprensa sobre assuntos políticos. Em meados de 1968 a liberdade de imprensa é restrita com a edição do Ato Institucional nº5, determinando a censura em todo o país, proibindo toda e qualquer forma de manifestação de pensamento. O AI-5 impõe controle total aos veículos de comunicação com a justificativa de que o governo precisava de instrumentos legais para enfrentar e eliminar a subversão. Com isso, abriu caminho para que, em 1970, o presidente general Emílio Garrastazu Médici elaborasse o decreto-lei 1.077, conhecido como Lei de Segurança Nacional, responsável pela implantação da censura prévia. A lei determinava que os abusos da liberdade de expressão seriam julgados por tribunais militares (CHAPARRO, 1998, p.61). Para Kucinski (1998, p.60), o regime militar nunca estabeleceu um sistema oficial regular e amplo de censura, ao estilo do DIP (era Vargas). Ao analisar o totalitarismo, disse que nesses regimes o Estado tem uma “assustadora confiança na mentira”. A prática adotada durante os anos de chumbo foi a de instituir a autocensura, evitando a mentira direta, preferindo a meia verdade sobre os fatos. A aplicação desta lei deve-se principalmente ao fato de oferecer aval jurídico à operação de destruição da imprensa alternativa, qualificação dada aos jornais encarados pelo regime como transgressores. Kucinski (1991, p.15) afirma que parte desses veículos possuía jornalistas motivados por ideais políticos de esquerda, quer seja por opção política ou porque lhes faltava espaço profissional na grande imprensa. No livro Jornalistas e Revolucionários – nos tempos da imprensa alternativa, Kucinski constatou que apareceram durante a ditadura 131 jornais alternativos, sendo que 94 deles sobreviveram menos de um ano.