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Joseph Ratzinger
Natur Natureza eza Teologia
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D a d o s I n t e r n a c i o n a i s d e C a t a lo lo g a ç ã o n a P u b l i c a ç ã o ( C IP IP ) (Câmara Br asileira do Livro, SP SP, Brasil) Brasil)
Ratzinge Ratzinger, r, Josep Jo sep h Cardeal Nat N atuu rez re z a e missã mi ssãoo d a te o lo g ia/ ia / Jo s e p h C arde ar deal al Ratzinger ; tradução traduç ão de Carlos Almeida Pereira. Pereira. Petrópolis, RJ : Vozes, 2008. Título original: Wesen uncl Auftrag der Theologie : Versuche zu ihrer O rtsbestimm rtsbestimm ung im Disput der Gegenwart Gegenwart..
ISBN 978-85-326-3635-5
Icologia católica 4. Tradição (Teologia) I. Título.
08-00465 índices para catálogo sistemático: I . Teologia : N atu reza rez a e missão : Cristianism o
CDD-230 230
Joseph Ratzinger
N a t u r e z a e m i s s ã o DA TEOLOGIA
Tradução de Carlos Almeida Pereira
{fà EDITORA VOZES Petrópolis
Joseph Cardeal Ratzinger / Bento XVI, Wesen and Auftrag der Theologie
© Libreria Editrice Vaticana/ j) j) J o h a n n e s Verlag Verl ag Ei Eins nsie iede deln ln,, Frei Fr eibu burg rg 1993. 1993. Direitos de publicação em língua portuguesa: 2008, Editora Vozes Ltda. Rua Frei Luís, 100 25689-900 Petrópolis, RJ Internet: http://www.vozes.com.br Brasil Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra poderá ser repro duzida duz ida ou transmitida por qu alquer forma e/ou e/ou quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravaç gravação) ão) ou arqu ivada em qual q ualque querr sistem sistemaa ou banco de dados sem permissão escrita da Editora.
Editoração: Fernando Sergio Olivetti da Rocha Projeto Pr ojeto gráfico: gráfic o: bembolado Capa: Bruno Margiotta
ISBN 978-85-326-3635-5 (edição brasileira) ISBN 3-89411-316-2 (edição alemã)
Este livro foi composto e impresso pela Editora Vozes Ltda. Rua Rua Frei Luís, Luís, 100 100 - Petrópolis, R J - Brasil Brasil - CEP 25689-900 Caixa Postal 90023 -Tel.: (24) 2233-9000 Fax: (24) 2231-4676
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m á r io
Prefácio, 7
I. As bases e os pressu pre ssupo posto stoss do trab alho alh o teológico, 11 Fé, filosofia e teologia, 13 1. A un id ad e de filo filoso sofi fiaa e teologia no cristianismo pri m i tivo, 13 2. Um a distinção distinção que tra nsform ou-se em oposi oposição, ção, 15 3. Tentativa de uma nova relação, 20 Observa Obs ervação ção final: final: gnose, gn ose, filosof filosofia ia e teologia, Na N a t u r e z a e l i b e r d a d e d o sist si stem emaa a c a d ê m i c o , 27 1. O diálogo, 28 2. A liberda libe rdade, de, 30 3. O centro: a verdade como fundamento e medida da liberdade, 32 4. O culto, 35 II. Natureza e forma da teologia, 37 Fu nda m ento espiritual e lugar da teologia teologia na Igreja, Igreja, 39 1. O novo novo sujeito sujeito como pressuposto e fun dam da m ento en to de toda teologia, 43 2. Conversão, Conv ersão, fé fé e pen sam ento, ent o, 48 48 3. O caráter eclesial da conversão e suas conseqüências pa p a r a a teol te olog ogia ia,, 50 4. Fé, preg pr egaç ação ão e teologia, 52 52 5. Tentação Tenta ção e gran gr ande de za da teologia, 59 O pluralismo como questionamento à Igreja e à teologia, 63 1. Os limites limites impostos impost os às às exigências da Igreja Igr eja e o plurali plu ralis s mo das decisõ decisões es hum anas, ana s, 63
2. Pluralismo no int erior er ior da Igreja, 71 71 a) Igreja universal e igrejas particulares, 73 b) Teologia e teologias, 77 III. Aplicações, 85 A “Instrução sobre a vocação do teólogo na Igreja”, 87 Observa Observação ção preliminar, prelim inar, 87 1. Apresentação, 87 2. Pontos da discussão do texto, 92 a) Autoridade só em caso de definição infalível?, 95 b) Magi Ma gist stér ério io,, u n ive iv e r s ida id a d e e meio me ioss d e comu co munn icaç ic ação ão,, 98 c) Tradição pro fética con tra tradição episcopal?, 102
P r e f á c io Na N a I g r e ja, ja , o u m e s m o n a s o c i e d a d e o c i d e n t a l c o m o u m t o d o , a teologia e os teólogos passaram a ser hoje um tema discutido po p o r tod to d o s , e t a m b é m u m t e m a c o n t r o v e r t i d o . N o m u n d o m o derno, ao que me parece, o teólogo depara-se com uma dupla expectativa. Ele deve, por um lado, esclarecer racionalmente as tradições do cristianismo, isolar nelas o núcleo que tem condi ções ções de ser assimil assimilado ado hoje, e ao mesmo te m po força r à m od er a ção a instituição da Igreja. Mas espera-se dele também que ao mesmo tempo ele confira rumo e conteúdo aos anseios religio sos e de tran scen dên cia capazes de ser propost pro postos os hoje. Na socie socie dade mundial em formação impõe-se, além disso, ao teólogo a tarefa de levar adiante o diálogo das religiões e de contribuir pa p a r a o d e s e n v o l v i m e n t o d e u m ethos mundial, que tenha como po p o n t o c e n t r a l os c o n c e ito it o s d e jus ju s tiç ti ç a , p a z e p r e s e r v a ç ã o d a c r i a ção. ção. Por último o teólogo deveria ser ain da algu ém que q ue tro ux es se consolo às almas, que ajudasse os indivíduos a se auto-encontrarern e a su pe ra r suas suas próp rias alienações alienações,, pois o mero me ro consolo coletivo de um mundo melhor e mais pacífico que viria a realizar-se no futuro comprovou-se como de todo insuficiente. Em todo este esforço, não raro a Igreja como instituição, e sobretudo o magistério da Igreja Católica, é vista como um obs táculo concreto. O ponto de partida do magistério é que o “sercristão”, e mais ainda o “ser-católico”, possui um conteúdo de terminado , tendo po r conseguint conseguintee pa ra o nos nosso so pen sar um a di retriz retriz que nã o po de ser ma nip ulad a à vontade, diretriz diretriz essa essa que confere ao discurso do teólogo seu peso próprio, acima de todo discurso meramente político ou filosófico. A teologia - na visão do magistér magistério io - não surge pelo pelo simpl simples es fato fato de se se ima gina r qu an ta religião pode ser exigida do Homem, empregando para isso elementos eleme ntos da tradição crist cristã. ã. El Elaa surge pelo fato de impor-se u m limite à arbitrariedade do pensamento, pois adquirimos conhe-
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pa p a r a u m a m e l h o r c o m p r e e n s ã o d a n a t u r e z a d o t r a b a l h o t e o l ó g i co nas circunstâncias do nosso tempo e para apoiá-lo em sua tarefa mais importante, o serviço ao conhecimento da verdade revelada, e a partir dela à unid ade na Igreja Igreja.. Rom a, n a Festa Festa da Assunção de Maria, 1992 1992 Josep Jos ephh Cardeal Cardea l Rat R atzi zing nger er
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I AS BASES E OS PRESSUPOSTOS DO TRABALHO TEOLÓGICO
Fé , f i l o s o f i a e t e o l o g i a 1. A unidade de filosofia e teologia no cristianismo primitivo A relação entre fé e filosofia parece, à primeira vista, uma questão bastante abstrata. abstrata. Mas Mas não era um a questão abstrata pa ra os cristãos cristãos dos dos pri m eiro s tem pos d a Ig reja. Foi ela que possibili possibili tou as primeiras imagens de Cristo, pode-se mesmo dizer que em suas primeiras origens a arte cristã surgiu da pergunta pela verdadeira filosofia. Foi a filosofia que deu à fé sua primeira vi são concreta. As mais antigas pinturas cristãs que conhecemos são encontradas nos sarcófagos do terceiro século; seu Cânon imagético imagéti co inclui três figuras: o pastor, a ora n te e o filósofo1. filósofo1. Este Este é um contex to impo im portan rtante. te. Si Sign gnif ific icaa que um a das raí raíze zess da arte cristã cristã está está na superaçã o d a morte. mo rte. As As três três figuras figuras re sp on de m às pe p e r g u n t a s d o s e r h u m a n o sob so b r e a m o r t e . O sig si g nifi ni fica cado do d a s d u a s pr p r i m e i r a s figu fi gura rass n ã o t em n e ces ce s s idad id adee d e exp ex p lica li caçã ção. o. M esm es m o q u e pre p recc i s e m o s t o m a r c u i d a d o com co m u m a i n t e r p r e t a ç ã o cris cr istt ológ ol ógic icaa e eclesiológica direta das figuras do pastor e da orante, é clara a menção às bases da esperança cristã, presente nelas. Existe o past pa stoo r, q u e m e s m o em m e i o às so s o m b r a s d a m o r t e i n f u n d e conf co nfi i ança, e que p ode od e dizer: “Não tem o n e n h u m mal” ma l” (SI 23,4). 23,4). Exis Exis te a proteção da oração, que acompanha e protege a alma em sua peregrinaç pereg rinação. ão. Mas Mas que significado significado tem neste con texto tex to o filó filó sofo? Sua figura corresponde à imagem do cínico, do filósofoapóstolo itinerante. O que a ele ele im po rta não são são as as do uta s teo rias: “Ele prega porque a morte o persegue”2. Não vai atrás de hipóteses, mas sim de superar a vida enfrentando a morte. O filósofo cristão, como ficou dito, é representado de acordo com esse esse tipo, tipo, e no ent e ntan an to é diferente. difere nte. Ele leva em suas mãos o Evan Evan gelho, de onde aprende não as palavras, mas sim os fatos. E o 1. Cf. F. Gerke. Christus in der spàlantikm Plastik. Mainz,M1948, p. 5. Cf. também F. Ur sprün rünge ge chnst ch nstlic liche herr K u nst. ns t. Freiburg, 1982, p. 51 ss. van der Meer. Die Ursp 2. Ibid. p. 6.
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verdadeiro filósofo, porque sabe do mistério da morte. Gerke resume a visão do que constitui o cristão, representada nesta aniiqüíssima arte, na seguinte frase: “O que se encontra no cenIro das composições compo sições cristãs cristãs mais mais antigas não é o m u n d o da d a Bíblia Bíblia ou da d a histó ria sagrada, mas sim sim o filó filóso sofo fo,, como mod elo d o homo chmtianus, a quem que m pelo Evang E vangelho elho foi foi feit feitaa a revelação do v erd a deiro paraíso”3. A fusão en e n tre tr e filos filosofi ofiaa e cristianismo, cristianism o, que q ue aqui, face face à questão da morte, se manifest manifestaa como como imagem da verd adeira questão da vida vida do Hom em , logo atinge um a den sidad e ainda maior. maior. O filó filó sofo passa a ser a imagem do próprio Cristo. O que se deseja rep resen tar não é a aparência ex tern a de Cris Cristo to,, mas sim sim quem e o que qu e Ele realm re alm ente en te era: o perfe ito filós filósof ofo. o. Cristo, Cristo, como G erke formula muito bem, aparece 11a roupagem daquele que o invo cou4 cou 4 . A filos filosof ofia ia,, a busca d o sentido sent ido em face face da mo rte, rte , é ap rese re senn tada agora como sendo a pe rg un ta sobre Crist Cristo. o. Na ressurreição de Lázaro Ele se apresenta como o filósofo que realmente res po p o n d e m u d a n d o a mo m o rte rt e , e com c om isto ist o m u d a n d o a vida vi da.. Aqu A quii aqu a quililoo que já desde os apologetas era um a convicç convicção ão transforma-se em contemplação. Já o mártir Justino, na primeira metade do se gu nd o sécul século, o, havia caracterizado caracterizado o cristianis cristianismo mo como a ve rda deira filosofia, e isto por duas razões: A tarefa mais importante do filós filósof ofoo é pe rg u n tar ta r po r Deus. A atitu de do d o verd ad eir o filó filóso so- Log os, e com Ele. fo é viver seg un do o Logos, le. J á que o significad significadoo do d o ser Log os, os verdadeiros filósofos cristão é viver de acordo com o Logos, são os os cristãos, cristãos, e po p o r isso isso o cristianismo cristian ismo é a ver da de ira filosof filosofia5. ia5. Com estas afirmações, que podem parecer-nos abstratas, repre sentava-se concretamente o que é ser cristão, porque o filósofo itinerante faz fazia parte do m un do dos homens. A experiência da ausência de sentido, da desorien tação e dos recei receios os po r ela p ro vocados, oferecia um mercado abundante, do qual se podia vi ver. Assim como hoje, ela convocava não só moedeiros falsos da pal p alav avra ra,, mas ma s t a m b é m a q u ele el e s q u e r e a l m e n t e e sta st a v a m abal ab alad adoo s, c que ajudavam. Assim, apesar de todas as decepções e falsifica 3. Ibicl., p. 7. 4. Ibicl., p. 8. >. (.1. (.1. (). M ichel, ichel , cpi cpiÂo Âoao aocp cpía ía.. In: T h W N T , 185. Refe rênc ias imp ortan ort antes tes tam bém em em I I I . von Balth Balthasa asar. r. Philosop hie, Christen tum, Mõnchtum . In: In: H .U. von Baltha Balthasar sar.. Spoiisa Yerln . Kinsiedeln, 21971, p. 349-387. 14
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ções presentes neste contexto, o filósofo oferecia o esquema de idéi id éias as em em que se podia en tend er qu al era a verdadeira mens a gem de Cristo e da ressurreição. Tudo isto, como é do conhecimento de todos quantos com pa p a r t i l h a m d a vid vi d a d o m u n d o d e h o j e c o m u m m í n i m o d e a t e n ção, ção, não é apenas coisa coisa do passado. passado. Dep ois qu e em tod a p arte foi abalada a segurança d ad a pelo cristianismo cristianismo na questão da m orte e do caminh o p ara a vi vida da,, volt voltaa a crescer p or to da pa rte o n úm e ro dos “sábios”, “sábios”, que qu e oferecem oferece m como co mo p ro d u to a “fil “filosof osofia”. ia”. Para a questão ques tão com q ue nos ocup amos, amo s, a relaç ão en tre fé e filo filoso sofi fia, a, ist istoo po p o d e s e r d e i m p o r t â n c i a , n a m e d i d a e m q u e c o m isto is to volt vo ltaa-se se a lem brar br ar mais mais um u m a vez aos fil filós ósof ofos os e teólogos profissionais o que em última análise, para além de toda sua erudição, se espera dele deles: s: a resposta às às gran des ques tões da vida. vida. A resposta à p er gunta: Como é mesmo que o ser-Homem se torna realidade? Como se deve deve vive viverr para que o ser-H om em obte nha êxit êxito? o? Ach Achoo que em nossa nossa perg un ta precisamos precisamos ter sem pre este este apelo diante dos olhos, olhos, po rqu e nele realme nte se toca toca naquilo qu e constitui o elo de união entre filosofia e teologia. Mas a questão de como ambas se se relacionam relacionam con cretam ente, de como as diferentes diferentes exi gências racionais de ambas podem ser assumidas, esta, natural mente, não pode ser respond ida a pa rtir daqui, ela ela exig exigee um u m esfor esfor ço metódico próprio.
2. Uma distinção que transformou-se em oposição No N o iníc in ício io d e s u a h ist is t ó ria ri a , c o m o o u v i m o s , o c ris ri s tia ti a n i s m o c o n siderava-se a si p ró p rio como filos filosof ofia ia,, ou o u mesmo mes mo como a filos filoso o fia por excelência. Será que se pode afirmar isso também nos dias de hoje? E se não, por que não o podemos? Que foi que mudou? Como deve hoje ser melhor definida a relação entre ambos? A identificação entre cristianismo e filosofia deve-se a um determinado conceito da filosofia que aos poucos passou a ser criticado pelos pensadores cristãos, sendo definitivamente aba nd ona do no sécul séculoo 13. A diferença entre um e outro, que é obra antes de tudo de Tomás de Aquino, os distingue mais ou menos assim: Filosofia é a razão pura procurando responder às questões últimas últimas da d a realidade. Conhe Co nhecim cimento ento filo filosó sófi fico co é somente o conhecimento a que se pode chegar pela razão como tal, sem 15
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sc recorrer à revelação. Sua certeza provém unicamente do ar gum ento , e suas suas afirmações afirmações valem valem tanto qu anto an to os argum entos. A teologia, ao invés, invés, é a realização comp co mpre reen ensiv sivaa da revelaçã r evelaçãoo de 1)eus )eus;; é a fé fé em busca de com co m pree pr eend nder. er. Por consegu con segu inte ela pró>ria não encontra seus conteúdos, mas os obtém da revelação, )ara em seg uida com preen dê-los em sua ligaç ligação ão e em seu senti do interno. Com uma terminologia que teve início apenas com Tomás de Aquino, passou-se a fazer referên cia a esse essess dois dois terr te rr e nos diferentes, filosofia e teologia, como a ordem natural e a ordem sobrenatural. Estas distinções só passaram a ser inteira mente claras na Era Moderna. Esta, então, projetou sua leitura sobre Tomás de Aquino, com isto conferindo-lhe uma interpre tação tação que o distancia distancia mais forte me nte da tradição mais mais antiga do que o que p ode ser encontra do nos simp simples les textos6. textos6. Mas nossa nossa atenção não precisa precisa se ocu par aqui com este estess p ro ble b lem m a s hist hi stór óric icos os.. De q u a l q u e r f o r m a , é u m fato fa to q u e d e s d e a Idad Id adee Media ta rdia rd ia a filo filoso sofi fiaa é associada associada à razão pu p u ra e a teolo gia à fé, e que até o presente esta distinção marcou a imagem tanto de uma quanto da outra. Mas uma vez feita esta distinção, inevitavelmente surge a questão se filosofia e teologia ainda po dem ter uma com a outra alguma relação metódica. De início isto isto é nega do de ambas amba s as as partes, com fortes razões. razões. Com o exem ex em plo p lo d a c o n t r a d i ç ã o p o r p a r t e d a filoso fil osofi fia, a, m e n c i o n o a p e n a s os nomes de H eide gge r e Jaspers. Para He idegg er a fil filoso osofia fia con sist sistee essencialmente em pe rgunta r. Q ue m acha que já conhece a resp osta n ão pod e mais fil filos osof ofar ar.. A p ergu er gu nta nt a filo filosó sófi fica ca,, do p onto on to de vista teológico, é uma loucura, e por conseguinte falar de uma filosofia cristã é como falar de um ferro de madeira. Tam bém bé m J a s p e r s a c h a q u e a q u e l e q u e ju j u l g a já j á e s t a r d e p osse os se d a r e s po p o s ta fra fr a cass ca ssoo u c o m o filósofo fil ósofo:: o m o v i m e n t o a b e r t o d a t r a n s c e n dência é inte inte rro m pid o em favor favor de um a suposta certez certezaa definiti definiti va7. Na verdade deve-se dizer: Se do filosofar faz parte uma ra Di e Philoso Phi losophie phie 0. dom referência aos problemas históricos, cf. F. van Steenberghen. Die im I 3. 3. Jah rhu nde rt. Munique/Paderborn, 1977. • E. Gilson. Le T h o m im e . Paris, 51945. • A. Hayen. Thomas Thomas von Aq uin geste gestern rn un dhe ute. Frankfurt, 1953. • Do ponto de vista De r Geist der de r mittelalte mittel alterlic rlichen hen Philoso Phi losophie phie.. sistemático, sobre a mesm a questão: E. Gilson. Der Viena, 1950. 7. Cl. J. Pieper. Verteidigungsrede Verteidigungsrede f ü r die Philosophie. Munique, 1966, p. 128. • W.M. Neidl. Christliche Absurditat? Salzburg, 1981. 1981. Christliche Philosophie P hilosophie - eine Absurditat?
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zão inteir int eiram am ente en te n eu tra tr a em relação à fé cristã, cristã, e se a filoso filosofia fia não po p o d e t e r c o n h e c i m e n t o d e n a d a q u e é d a d o ao p e n s a m e n t o p ela el a fé, fé, entã o a fil filos osof ofia ia de u m fiel iel cristão cristão não p od e d eixar eixa r de parec pa recer er um pouco fictícia. Mas será que efetivamente as respostas cristãs são são de tal tal naturez a que fecham o caminho cam inho ao pens amento? am ento? Não po p o d e r i a m as ú ltim lt imas as res re s p o s tas ta s , p o r s u a n a t u r e z a , e s t a r s e m p r e abertas par a aquilo aquilo que não foi foi nem p od e ser dito dito?? Não p oderia od eria acontecer que a verdadeira profundidade e dramaticidade só pu p u d e s s e s e r c o n f e r i d a às p e r g u n t a s p o r esta es tass res re s p o sta st a s? N ã o p o deria ocorrer que elas radicalizassem tanto o pensar quanto o pe p e r g u n t a r , q u e os pu p u ses se s sem se m e m a n d a m e n t o , e m l u g a r de d e blo b loqq u eáeá loss? O pr óp rio Jaspe rs di lo diss ssee certa vez vez vez vez que o pens am ento ent o que se desvincula da grande tradição cai numa seriedade tal que se torna vazio8. Não mostraria isto que o conhecimento de uma grande resposta, como a transmitida pela fé, constitui mais um estímulo estímulo do que u m empecilho para as verdadeiras perguntas? Teremos que retornar mais adiante a estas considerações. Ne N e s te m o m e n t o , ao invé in vés, s, p reci re ciss a m o s v o l tarta r-nn o s p a r a a ne n eg ação cia filosofia por parte da teologia. A oposição contra a filosofia, como prete nsa d estr uid ora da teologia teologia,, é muito mu ito antiga. antiga. Pode ser enc on trada de um a forma muito agud a em Tertuliano, Tertuliano, mas vol vol tou a se acender sempre de novo na Idade Média, alcançando um a notável notável radicalidade, radicalidade, como po r exem plo n a obra tardia de São Boaventura9. Uma nova era de contradição à filosofia em favor da pura palavra divina teve início com Martinho Lutero. Seu grito de batalha sola scriptura não foi só uma declaração de gu erra er ra c ontra a interpr etaçã o clá clássic ssicaa da escritura pela tradição tradição e o magisté magistério rio da Igreja; fo foi também um a declaração de gu erra er ra à escolá escolásti stica, ca, ao aristotelismo e ao ao platonism p latonism o na teologia teologia.. Inclui Inc luirr a fil filos osof ofia ia na teolo teologia gia era pa ra ele o mesmo que des trui r a m en sagem da graça graça,, porta nto destruir o pró prio núcleo núcleo do Evange lho. lho. Fi Filo loso sofi fiaa é pa ra ele ele a expressão do H om em que n ada ad a con he ce da graça, e que tenta por si mesmo construir sua sabedoria e ju j u s tiça ti ça.. A o p o siçã si çãoo e n t r e a j u s t i ç a das da s o b r a s e a j u s t i ç a d a g raç ra ç a, 8. K. Jaspers e R. Bultmann . Die D ieFr Fr aged ag eder erEn En tm yth olog ol ogL L sie rung ru ng.. Munique, 1954, p. 12. Cf. J. Pieper. Über die Schwierigkeit heute zu glauben - Aufsãtze Aufsãtze und Reden. M unique, 1974, p. 302. 9. Cf. J. Ratzinger. Die Geschichtstheologie des heilige he iligenn B on av en tura tu ra . Munique/Zurique, 1959, p. 140-161.
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que segundo Lutero representa a separação entre Cristó e o nnl nnl it rislo, rislo, é pa p a ra ele como se íòsse íòsse o mesmo mes mo qu e a oposição oposição entr en tree a lilosoíia e um pensamento baseado na Bíblia. Vista assim, filo sofia sofia é pu r a d estrui est ruiçã çãoo d a teolo te olo gia 10. Em nosso sécu século lo,, como com o sa bem b emoo s, foi K a r l B a r t h q u e m c o n f e r i u c a r á t e r mais mai s a g u d o a este es te pr p r o t e s t o c o n t r a a filo fi losof sofia ia n a teol te olog ogia ia,, c o m a objeção obje ção c o n t r a a analogia entis, na qual ele viu uma invenção do anticristo, mas também a única e inabalável razão para não se tornar católico. Mas a analogia entis res são simples s implesment mentee da opção opção ontológica ontológica entis é exp ressão da teologia católi católica ca pa ra a síntese en tre tr e a idéia do ser ser na filos filosof ofia ia e a idéia de Deus na n a Bíbli íblia. a. Con C ontra tra esta esta continuida contin uidade de entre a busca filos filosóf ófic icaa das razões raz ões últimas e a apro ap ropr pria iaçã çãoo teológic teológicaa da fé bíbl bíblica ica,, ele opõe a descontinuidade radical: a fé, segundo ele, desmascara como de ídolos ídolos todas as as imagens de Deus criadas pel peloo pensa pe nsame me n to. to. Ele não vive vive da ligação, ligação, mas sim do para pa rado doxo xo.. Concebe o Deus inteiramente diferente, que não deve desenvolver-se a partir do noss nossoo pen sam ento nem ser po r ele ele ame aça do11 do11. Assim o caminho parece estar bloqueado de ambos os lados: a filosofia defende-se contra os dados cio pensamento constituí dos pela fé fé; na p ure za e liber dad e do seu pe nsam ento, ela sentesentese prejudicada por eles. A teologia defende-se contra os dados do c onhe cimento cim ento filo filosó sófi fico co,, ven do neles neles um a ameaça à purez pu rez a e à nov idade da fé fé. Mas Mas na rea lidade o p alhos alhos dessas negações não consegue ser mantido. Como poderia o pensamento filosófico pô p ô r - s e a ca c a m i n h o s e m n e n h u m d a d o p rév ré v io? io ? D esde es de P latã la tãoo a filo f ilo sofi sofiaa viveu viveu sem pre pr e do diálogo crítico crítico com a gra nd e tradição trad ição reli gio iosa sa.. Sua dignida de pró pria sem pre pe rma nece u ligada ligada à dig nidade nida de das tradições tradições,, a partir pa rtir das quais lutou pela verdade. Q ua n do fez com que este diálogo se calasse, logo ela veio também a sucumbir como filosofia. E vice-versa, na reflexão sobre a pala vra revelada, simplesmente a teologia não pode evitar compor tar-se filosoficamente. Desde que não se restrinja a recontar, a reun re un ir un icam ente fato fatoss histó histórico ricoss marginais, marginais, mas tente c hega r à compreensão 110 sentido próprio, ela ingressa 110 pensamento sein Leben Leben und sein sein Werk. Muni10. ( ]f. B. Lo hse e Martin Luth er. Eine E infü hru ng in sein (jiie, 1981, p. 166ss. I I. Sobre o raciocínio de K. Barth referen te à analogia entis, comp are- se antes cie cie lu do I f.l . von Balthasa Ba lthasar. r. Karl Barth. Einsiedeln, 11976.
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filosófico. De fato nem Lutero nem Barth puderam suprimir o pe p e n s a m e n t o filo fi losóf sófico ico e a h e r a n ç a filosó fil osófic fica, a, c a h i s t ó r i a d a t e o l o gia evangélica é pelo menos tão fortemente determinada pelo intercâm inte rcâmbio bio com a filoso filosofia fia qu anto an to a da teologia cató católic lica. a. Nã N ã o o b sta st a n t e , é pos p ossí síve vell se co c o n s t a t a r aq a q u i u m a d i fere fe renn ç a , cu c u ja análise análise ao ao mesmo tem po nos leva leva ao cerne cer ne do nosso problem a. A um e xam e mais mais acurad acu rad o, a reje rejeiçã içãoo qu e se se mantém mant ém em múltiplas variações, variações, de Lu tero ter o a Barth, Bar th, refere-se n ão à filo filoso sofi fiaa em si, mas sim à metafísica, em sua forma estabelecida por Platão e Aris tóte tó tele les. s. A atitude antimet antimetafí afísic sicaa de Lu Lutero tero perm per m anece ane ce aind a subs tancialmente presa à escolástica da Idade Média tardia, que era o que ele conhecia. Ela encontra seus limites na adesão ao dogma da Igreja primitiva. A ortodoxia protestante, que cons truiu sua pr ó pr ia escolá escolásti stica ca,, com a fidelidade às antigas antigas profis sões sões de fé ate nu ou mais mais ainda aind a o que a posição posição de Lu tero po ssuía de revo lucionário, d e m od o que q ue esta só veio veio a manifestar-se ple namente na segunda metade da Era Moderna. Nela o próprio do gm a da Igreja p rimitiva aparece como a quintessê quintessência ncia da helenização e da ontologização da fé. Efetivamente, tanto com a do utr ina do Deus uno e trino trino q uan to com a profi profissã ssãoo de Cristo Cristo como verdadeiro Deus e verdadeiro Homem o conteúdo ontológic lógicoo das afirmaçõe afirmaçõess bíbl bíblic icas as passou passou a oc up ar o centro do p e n sam ento e da fé crist cristã. ã. A acusação acusação de h elenização, elenização, que q ue do m ina a cena desde o século 19, vê nisto o distanciamento da pura fé bíbl bí blic icaa na n a salvaç sal vação. ão. O v e r d a d e i r o e l e m e n t o i m p u l s i o n a d o r é aq aqui a rejeição rejeição bási básica ca do pens pe nsam am ento en to metaf metafísi ísico, co, ao passo passo que qu e p ar a as idéias idéias histór históric ico-f o-filo ilosó sófic ficas as a porta port a perm pe rm an ece am pla m ente en te abe a be r ta. Pode-se certamente dizer que a progressiva substituição da metafísic metafísicaa pela filoso filosofia fia da história, qu e oc or reu re u depois depo is de Kant, K ant, também é substancialmente dete rm ina da po r este estess proce processo ssoss na teologia, e que por sua vez o desenvolvimento filosófico assim ocasionado retroagiu fortemente sobre as opções teológicas12. Na N a s i tua tu a ção çã o filo fi losó sófi fica ca assi as sim m s u r g i d a , p a r a m u i t o s a ú n i c a cois co isaa filosoficamente razoável parece ser a negação da ontologia, ou pe p e l o m e n o s a re r e n ú n c i a filo fi losóf sófic icaa à on o n t o l o g i a . Mas p o r o u t r o l a d o 12 12.. Cf. Cf. agora a este respe ito H. Thielick e. Glmibm und Dcnken Dcnken in derNeuzeit. derNeuzeit. T iibingen, iibingen, L u iher ih er a nd He.gel - Untersuchungen zur 1983. Também é instrutivo K. Asendorf. Lu Grundlegung einer neuen systernatischen Theologie. Wiesbaden, 1982.
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não se se po de p ar ar na renú nc ia à ontologia. ontologia. C om ela cai também, a longo prazo , a pró p ró p ria iclé icléia ia de Deus, e então ent ão passa a ser lógi co, ou mesmo a ser a única coisa possível, construir a fé como pu p u r o p a r a d o x o , c o m o o fez fe z B a r t h , o u p elo el o m e n o s c o m o o t e n t o u faze fazer. r. Mas com isto volta-se a rejei rej eita tarr a aceitação aceita ção inicial inicial da d a razão. Uma fé que se transforma transforma em parado xo a rigor já não p ode in terp te rp ret ar nem pe ne tra r o m un do do dia-adia-a-dia dia.. E vice vice-v -ver ersa sa,, não se po de viver na p u ra contrad ição. A meu ver, ver, isto isto mos tra sufici sufici ent em ent e qu e a questão da metaf metafísi ísica ca não po de ser excluída excluída da questão filosófica sendo degradada a um resquício helenístico. Q uan do se deixa deixa de inter rog ar pela origem e o destino destino do todo, todo, se está dei xan do de lado o qu e é pr óp rio e característico característico do ques tionam tio nam ento ent o filos filosóf ófic ico. o. Apesar Ape sar de na história, e nos dias de hoje, a oposição contra a filosofia na teologia ser em ampla escala ape nas oposição contra a metafísica, e não contra a filosofia em si, o teólogo é o últim o a conseg cons eguir uir sep arar ara r um a coisa coisa da outra. E vic viceversa, versa, o filó filóso sofo fo que qu e deseje realm rea lmen ente te chega ch egarr até às às raízes raízes não pod p odee se desfazer do aguilhão da pergunta sobre Deus, da pergunta so bre b re a o r i g e m e o d e sti st i n o d o s er e m si.
3. Tentativa de lima nova relação Com as considerações considerações até aqui apresen tada s começamos po r esclarecer em largos traços a difere nça en tre filos filosof ofia ia e teolog teologia. ia. Ao mesmo tempo ficou evidente que na história de ambas as disciplinas disciplinas esta distinção distinção assum iu cada cad a vez vez mais mais a form a de uma um a oposição. Mas ficou claro também que a oposição entre filosofia e teologia provo cou modificaç modificações ões nelas nelas próp rias. No âmbito âmbi to des te desenvolvim desenv olvim ento, a filo filoso sofi fiaa pro cu ra s em pre mais mais desfazerdesfazer-se se da ontologia, isto isto é, da questão que lhe é pró pr ia e prim ordial. A teologia, por sua vez, envolve-se nesse processo dos fundamen tos, que a tornaram possível em sua tensão característica entre revelação e razão. Em oposição a isso dissemos que a filosofia, como tal, não pode renunciar à ontologia, e que a teologia não é menos dependente dela. Excluir a ontologia da teologia não li be b e r t a o p e n s a m e n t o filosó fil osófic fico, o, a n t e s o para pa raliliss a. S u p r i m i r a o n t o logia da filosofia não purifica a teologia, mas antes retira-lhe o ( hão de d e debaixo deb aixo dos pés. pés. A comu m oposição con tra a metaf metafísic ísica, a, que hoje parec e p o r veze vezess ser a verda ve rda deira de ira ligação ligação ent re filós filósof ofos os 20
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e teólogos, foi necessário contrapor que ambas estão indissoluvelmente ligadas a esta dimensão do pensamento, e indissoluvelmente interligadas entre si. Este Este diagnóstico, de iníci inícioo inteira inte irame mente nte genérico, precisa ago ago ra de certa form a ser precisado e concretizado. concretizado. Um a vez vez ultrapa ultr apa s sada esta contradição dos opostos, a pergunta precisa agora ser form fo rm ulada ula da positivamente: positivam ente: Em que qu e sentido sentid o a fé fé neces necessita sita da filoso filoso fia? ia? De que m aneira ane ira a filos filosof ofia ia está aberta abe rta p ara ar a a fé e inter int erior iorm m en en te disposta a dialogar dialo gar com a mens m ensage agem m da fé? fé? Desejo Desejo esboçar esboça r aqui com a maior brev idade idad e três níve níveis is de um a resposta. resposta. a) Um prim pr im eiro ei ro nível nível da ligação ligação e n tre tr e as questões quest ões filos filosóf ófic icas as e teológicas nós já podemos encontrar quando consideramos as imagens mais antigas da fé. Tanto a fé quanto a filosofia estão voltadas para a questão primordial do Homem, a pergunta que lhe é dirigida pela morte. A questão da morte é apenas a forma radical da pergunta pelo como do bem viver. E a pergunta pela origem e o destino destino do Hom em: de on de ele ele vem e pa ra o nd e va v ai . A mo rte é a pe rgu nta que em última última anál análise ise não po de ser rep ri mida, e que se faz faz presen pre sente te na existênci existênciaa hu m an a como um agui lhão metafísico. O Homem não pode deixar de interrogar-se sobre o signi significa ficado do deste fim fim. Mas po r outr o utroo lado, pa ra todo aquele aque le que pensa, é claro que em última análise análise esta esta perg un ta só só pod p od e ria ser respondid a com fund am ento po r alguém alguém que conhec conhecesse esse o outro lado da morte. Mas a fé, sabendo que é dada a resposta a esta per gunta gu nta,, exige a atenção e reflexão provocadas pela p e r gunta. Tal Tal resposta não implica implica de form a algum algu m a no fracasso fracasso da pe p e r g u n t a , c o m o p e n s a J a s p e r s . Pelo Pe lo c o n t r á r i o , a p e r g u n t a f r a cassa cassa qu an do não existe perspectiva d e resposta. respos ta. A fé ouve ouv e a res po p o s t a p o r q u e m a n t é m viva viv a a p e r g u n t a . El Elaa só p o d e r e c e b e r a resposta como resposta quando consegue levá-la a uma relação compreensível compreensível com com sua pergunta. Q ua nd o a fé fé fala fala da re ssur rei ção dos mortos, não se trata de uma afirmação mais 011 menos obscura sobre um lugar futuro que não se possa controlar e so br b r e u m t e m p o f u t u r o q u e n os é d e s c o n h e c i d o , m as sim si m d e c o m pr p r e e n d e r o s er d o H o m e m n o c o n j u n t o d a r e a l i d a d e . A q ui está es tá em jogo também tam bém a questão básic básicaa da justiça, que é inseparável da questão da esperança; trata-se da relação entre história e ethos, d a relação entre ent re o agir do H om em e a imutabilidade imutabilid ade do real. real. Trata-se Trata-se
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de pergunt as que po dem assumir formas diferentes diferentes de um período pa p a r a o u t ro, ro , mas ma s q u e sub su b stan st anci cial alm m ent en t e p e r m a n e c e m as mesm me smas as,, e que só po dem de m avançar pelo intercâmbio intercâmbio de p erg un ta e respos resposta, ta, de pe p e n s a m e n t o filosófico e teoló te ológic gico. o. Este Est e diá d iálo logo go d o p e n sam sa m e n t o h u mano com os os dados da fé terá um determi dete rminad nad o aspecto aspecto quando quan do for realizado como um u m diálogo rigorosam rigor osamente ente filo filossófic fico, e outro ou tro total total mente diferente quan do for pensado como diálo diálogo go propriam ente teológico. Mas entre um e outro deve existir alguma relação, em última anális análisee nenh ne nh um pode pod e dispensar o outro ou tro inteiramente. b) Do s e g u n d o níve ní vell d e liga li gaçã çãoo t a m b é m j á se falo fa louu a ntes nt es:: a fé rep res enta en ta um a afirmação fil filos osóf ófic ica, a, quase que ontológica, qu an do professa a existência de Deus, e de um Deus que tem poder sobre a realidade como um todo. Um Deus sem poder é em si uma contradição. Se Ele não puder agir, falar, e se não puder mos dirigir-nos a Ele Ele,, pod em os considerá-lo como um a hipótese abstrata; mas isto não tem nada a ver com aquele que a fé dos homens chama de “Deus”. Afirmar um Deus criador e salvador pa p a r a o m u n d o i n t e i r o u l t r a p a s s a a c o m u n i d a d e p a r t i c u l a r d e religião. Ela não quer ser um símbolo do inominável, que nu ma religião aparece de uma forma e em outra de uma forma diferente, diferente, mas sim sim uma afirmação afirmação sobre a pró pri a realidade em si. Este irromper do pensamento de Deus para uma exigência bási bá sica ca à r a z ã o h u m a n a é m u i t o c l a r a n a crít cr ític icaa à reli re ligg ião iã o dos do s pr p r o f e t a s d e I sra sr a e l e d o s livr li vros os sapi sa pien enci ciai aiss d a Bíbli Bíb lia. a. Q u a n d o n e les les são são mo rda zm ent e ridicularizados ridicularizados os deuses autofabricados, e qu an do a est estes es se se opõ e o único Deus verd ade iro e real real,, estamos diante do mesmo movimento espiritual que pode ser encontra do nos pré-socráticos do antigo iluminismo grego. Quando os pr p r o f e t a s v ê e m n o D eus eu s d e Isr Is r a el a r a z ã o c r i a d o r a d e t o d a r e a l i dade, trata-se claramente de crítica religiosa em favor de uma visão correta da realidade. Aqui a fé de Israel ultrapassa clara mente os limites de uma religião do povo; ela representa uma exigência universal, onde a universalidade está ligada à racio nalidade. Sem esta crítica crítica religiosa religiosa profética, o universalismo universal ismo cris cris-lão lão teria teria perm anecid o inimagináv inimaginável. el. Nela prepar ou- se 110 inte rior rior do pró prio Israel Israel aquela sínte síntese se elemen tar entr e o elemento elemento grego e o bíblic bíblico, o, pela qual lu tar am os Padres Padre s da Igreja. Por iss isso a ccniralização da mensagem cristã no Evangelho de João em 22
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torno dos conceitos de logos e aletheia não pode ser reduzida a uma mera atribuição de sentido hebraico, em que logos fosse apena ap ena s “palavra ” no sentido de um discurso histórico histórico de Deus, Deus, c aletheia apenas a confiabilidade ou fidelidade. E vice-versa, pela mesm a razão razão não se pode a cusar João Jo ão de torcer to rcer o elem ento bí bíbl bli i co para o helenista. Ele está dentro da tradição sapiencial clás sica. Justamente nele se pode estudar o acesso interior da fé bí blic bl icaa e m D e u s e d a c rist ri stoo log lo g ia bíbl bí blic icaa ao i n t e r r o g a r filosó fil osófi fico, co, tanto em suas suas conseqüên cias quan q uan to e m suas orige ns13 ns13. A alternativ alternativaa se se o m un do deve deve ser en ten did o a par tir de um intele intelecto cto criador ou de um a combinação combinação de probabilidades d en tro ci cie algo qu e em si não possui sentid o - tam bém hoje é esta alternat alternativa iva que const constit itui ui a perg unta unt a determ de term inante inan te p ara noss nossaa com pr p r e e n s ã o d a r e a l i d a d e , e a ela el a n ã o se p o d e fugir fug ir.. Q u e m , a o invé in vés, s, quiser reduzir a fé a um paradoxo ou a um mero simbolismo histórico, histórico, deix a de atingir atin gir a posição histórico-religiosa histórico-religiosa da fé, fé, pela qual tanto os profetas quanto os apóstolos combateram. A uni versalidade da fé, fé, pressu posta pos ta na tarefa missionári missionária, a, só tem sen sen tido, tido, e só só pode po de ser mo ralm ente en te justif justificada icada,, se nela re alm ente en te for superado o simbolismo das religiões em vista de uma resposta comum, em que também se faz apelo à razão comunitária do Hom em. O nd e este este aspect aspectoo com unitário estiver estiver excluído, excluído, já não exist existee mais mais ne nh um a comunic comunicaçã açãoo da hu m anid ade q ue chegue até às últimas conseqüências. Por isso, a partir da questão de Deus a fé tem que expor-se à disputa filosófica. Se desistir da exigência de raciona lidade de sua afirmação básica básica,, ela não está se retraindo para uma fé mais pura, mas sim traindo um ele m ento en to básico de si próp pr óp ria. ri a. E vice-versa, vice-versa, se a filos filosof ofia ia quise qu iserr pe pe r manecer fiel à sua causa, terá que expor-se à exigência da fé pa p a r a c o m a raz ra z ã o . T a m b é m n e ste st e níve ní vell o i n t e r - r e l a c i o n a m e n t o de filosofia e teologia é indispensável. c) Por último desejaria pelo menos com poucas fras frases es mencio men cio nar a luta em torno dessa questão dentro da teologia medieval. Em Boave ntura eu enco ntro duas resposta respostass principai principaiss à pe rg un ta se e po r que é certo certo t enta r com pr ee nd er a men sagem bí bíbl blic icaa com métodos do p en sam en to filo filosófico fico.. A prim eira resposta ba 13. Importantes referências a estas questões são oferecidas por H. Gese. Der Johannesprolog. In: II. Gese. Z u r biblischen Theolo The ologie gie.. Munique, 1977, p. 152-201.
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seia seia-s -see nu m a frase frase de lP d 3,13 3,13,, que na Id ade Média constituía constituía o tópico clássico que fornecia a base para a teologia sistemática como tal: tal: “Es “Esta taii semp re pro nto s p ara vos vos de fen de r contra que m pe p e d i r raz ra z õ es d e voss vo ssaa e s p e r a n ç a ” 14. Aq A qui o tex to g reg o é bem mais mais expressivo expressivo que qu alque r tradução. A quem pe rgu nta r pelo pelo eran ça, d evem os fiéis iéis d ar sua apo-logia. O logos pre logos da esp erança, cisa cisa ter sido tão assimilado assimilado p o r eles eles que possa transfo rmar-se rma r-se em apo-logia; a palav ra passa a ser pelos pelos cristã cristãos os respo sta à in terr te rroo gação gação dos dos homen s. A prim eira vist vistaa ist istoo parece u m a fu nd am en tação puramente apologética da teologia e da procura pela ra zão zão da fé. fé. Tem-se Tem-se que po de r explicar ao ou tro p or que se crê crê.. A fé não é pura decisão, se o fosse ela não atingiria o outro. Ela qu er e pod e ser comprovada. Q ue r tornar-se compreensível compreensível para o outro. Exige ser um logos, e por isso sempre de novo poder tornar-se apo-logia. Num nível mais profundo, no entanto, esta interpr inte rpreta etação ção apologética apo logética da teologia é missionária, missionária, e a concepção missionária manifesta, manifesta, p o r sua vez, vez, a natur na tureza eza inte i nterio riorr da fé: ela só po p o d e ser se r m iss is s ion io n ária ár ia q u a n d o r e a l m e n t e u l tra tr a p a s s a tod to d a s as t r a d i ções e constitui um apelo à razão, um voltar-se para a própria verdade. Tem que ser missionária também, uma vez que o Ho mem está destinado a reconhecer a realidade e tem que, na sua resposta às últimas coisas, comportar-se não apenas tradicional mente men te mas tamb ém de aco rdo com a verdade. A fé crist cristã, ã, com sua sua exigência missionária, distanciou-se da história das outras reli giões; esta sua exigência provém de sua crítica filosófica das re ligi ligiõe ões, s, e só a partir pa rtir daí pod e ser fund fu ndam am entada ent ada.. O fato de hoje o elemento missionário estar ameaçado de debilitar-se está associa do à per p erdd a de filos filosof ofia ia que caracteriza a atual situação teológic teológica. a. Mas em Boaventura ainda pode ser encontrada uma outra fundam entação da teol teolog ogia ia,, que primeiro interp reta nu m a dire ção inteiramente diferente, mas que mesmo assim confirma a pa p a r t i r d e d e n t r o o q u e j á foi d i to ante an tess . O s a n t o sabe sa be q u e o i n t r o duzir a filosofia na teologia não é incontestaclo. Ele admite que existe existe um a violê violênci nciaa da razão, razão, que n ão se pode po de h arm on izar com a fé fé. Ma Mas diz diz que tamb ém existe existe um a interro gação po r um outro out ro moti motivo vo:: Pode ser que a fé deseje deseje co m pree pr ee nd er p or am or àquele a que m ela deu seu consen timen to15 to15. O amo r pro cu ra co m pre I I. Boaventura, Sent. Sent. Prooem. qu 2 secl contra 1 I5. Ihid., c|u 2 ad 6. 24
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ender. ender. Q ue r conhecer sempre m elhor aquele a que m ama. “Bus “Bus ca sua face”, como sempre de novo diz Agostinho, baseando-se nos salmos10 salmos10. Am ar é q ue re r conhecer, e assim assim o buscar c om p re en d er pode ser precisamente um a exigência exigência do amor. amor. Dito Dito com outras palavr palavras: as: E ntre a m or e verdad e existe existe um a ligaç ligação ão que é im po rta nt ntee pa ra a teologia e a fil filos osof ofia ia.. A fé cristã pode pod e dizer di zer de si mesma: Achei o amor. Mas o amor a Cristo e ao próximo a pa p a r t i r d e C rist ri stoo só s ó p o d e t e r co c o nsi ns i stên st ênci ciaa q u a n d o f o r n o m a i s p r o fund o de si si am or à verdade. O fator missi missionár onário io ganha aqui um novo aspecto: O verdadeiro amor ao próximo quer dar ao pró ximo tam bém aquilo que o Ho me m necess necessita ita de mais mais profun pro fundo: do: conhecimento e verdade. Nós havíamos partido mais acima da questão da morte como aguilhão filosófico da fé; descobrimos então a questão questão de Deus e sua exigência exigência universal como como lug ar da filosofia na teologia. Agora podemos acrescentar, como terceiro po p o n t o : o am a m o r, c o m o c e n t r o d o serse r-cr cris istã tão, o, d o q u a l “d e p e n d e m a Lei e os os Profetas”, é ao m esm o tem te m po am or à verda ve rdade de,, e só só assim assim se mantém como ágape a Deus e ao Homem. Observação fin al: gnos gnose, e, fil os of ia e teologi teologia a
Por último eu gostaria de voltar mais uma vez ao início, à idéia idéia dos primeiros Padres, de que o cristianismo cristianismo é a verda deira dei ra filo filoso sofi fia. a. Otto Michel Michel lem brou br ou que a p alavra alav ra filos filosof ofia ia era evitada evitad a pelo pe loss gnós gn óstitico cos. s. A pa p a l a v r a g n o se r e p r e s e n t a v a p a r a eles ele s u m a e x i gência mais alta. A filosofia que sempre permanece interroga ção, ção, esperan do u m a resposta que sozinha sozinha ela ela não pode dar, dar, não sign signif ifica icava va muita cois coisaa pa ra eles eles.. Q ueria ue riam m ter um conhecim conh ecim ento claro claro - conhecim ento que é poder poder,, com o qual qual pode ser dom ina do o m undo un do de um e outro lado da m o rte 17. A gnose passa a ser a negação da filosofia, ao passo que a fé defende a um só tempo o que a filo filoso sofi fiaa possui de gr an de e de h umilde um ilde.. Não é algo mu i to semelhan semel hante te a ist istoo o que existe hoje? hoje? Da filo filoso sofi fiaa pr op ria m en te dita, com sua incerteza última, nós estamos fartos. Não quere mos filo filoso sofi fiaa mas sim sim gnose, isto isto é, é, um con hec iment im entoo exato, que pos p ossa sa s e r c o m p r o v a d o . A filosof fil osofia, ia, e m larg la rgaa escal esc ala, a, está es tá c a n s a d a 16. Cf. p. ex. En in ps 104,3 Chr XL, p. 1537. 17. Cf. sobre isto O. Michel. (piÀoooqría. In: ThWNT IX 185, nota 136. 25
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s is t e m a
a c a d ê m ic o
O adjetivo “acadêmico” provoca hoje reações conflitantes. Lembra, em primeiro lugar, coisas velhas e empoeiradas, uma teoria teoria que se se insta instalou lou em seu seu p róprio m un do privado passando ao largo das exigências exigências da realida de. Talvez Talvez nos lembre lem bre tamb ta mbém ém que qu e o fu n da d or d a acad emia foi foi Platão Platão;; mas o platonism o é vi vist stoo p o r m u i tos to s c o m o a fu f u g a p a r a u m m u n d o i r r e a l das da s idéi id éias as p u r a s , como a essên essênci ciaa de um a sup era da orientação d o espírito, espírito, apesar de todas as reabilitações de Platão que se podem observar, por exemplo, na ciência natural ou na política1. Foi apenas em um “acadêmico” con tinuo u o único terren o que o brilho da palavra “acadêmico” mesmo, c heg ando and o até mesmo a cresce crescer: r: é qu an do se fala fala da “li “li be b e r d a d e a c a d ê m i c a ” . Q u e d e v a e x i s t ir u m e s p a ç o livr li vree p a r a o espírito, obedecendo apenas às suas próprias regras, sem estar subordinado a nenh um a norm a externa, externa, passou passou a ser ser im po rtan te nu m a sociedade que d e m odo geral geral se caracteriz caracterizaa pelo apelo à liberdade, mas que em toda parte é determinada também por vínculos que dificilmente poderíamos imaginar em um mundo pré p ré-t -téc écnn i co. co . A pa p a l a v r a “ l i b e r d a d e a c a d ê m i c a ” pr p r e t e n d e le v a n ta r um dique contra o omniabrangente poder da burocracia, bem como contra a pressão proveniente da ditadura das necessida des. A luta que se trava aqui conh ece muitas m odalid ades. Tratase, se, p o r u m lado, d a defesa das disciplinas disciplinas “inúteis” - as assim assim cham adas ciên ciênci cias as do espírito espírito - contra con tra a prep otên cia do út útil il.. Mas as ciências naturais lutam também pela liberdade de elas próprias dete rm inare m seu obje objeto to,, de não serem obrigadas a receber o r dens das exigênc exigências ias do mercad o. E existe existe,, po r fim, fim, o clamor p a r ticular dos teólogos por sua liberdade acadêmica frente à insti tuição da Igreja, seu desejo de poderem determinar suas pró pr p r i a s q u e stõ st õ e s e r e s u l t a d o s , c o m o o faze fa zem m , p o r e x e m p l o , os filó Z u fa ll u nd Notw No twen endig digke keit it - Philosophi 1. Cf. J. Monod. Zu Philosophische sche Fragen Fragen der modernen Biologie. Munique,51973 (Paris, 1970). Cf. sobretudo p. 127ss e 186.
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solo solos. s. Dess Dessaa for m a convém q ue se tente u m a reflexão refle xão básica básica so br b r e a n a t u r e z a p r i m i t i v a d o a c a d ê m ico ic o . ( lomo lomo deve rá ser enfr entad en tad a esta esta questão questão?? Não seriam as as di versas modalidades do acadêmico por demais diferentes para |iie |iie aqui poss possaa ser dado da do algo pare cido com um a fund am enta ção om um , com respost respostas as comuns? É in inegá egável vel a gra nd e variedade laquilo que se pretende hoje incluir na liberdade acadêmica. Mas tem que haver algo assim como uma base comum, se é que a palavra “acadêmico” tem realmente um sentido capaz de fun dam entar a exigênci exigênciaa de um a de term inad a forma de liberda liberdade. de. Uma vez que as várias realizações concretas divergem, tudo de pe p e n d e em ú l t i m a a n ális ál isee d a q u e l a e x igê ig ê n c ia d o e s p í r ito it o feit fe itaa a suas próprias interrogações e ao seu próprio caminho, que pe la primeira vez tomou forma em Platão. Gostaria, pois, sem de imediato imediato estar preo cup ado em d ar respostas respostas práti práticas cas,, de descre ver aqui algumas propriedades essenciais daquilo que em todas as variedade s históric históricas as po de manifestar-se manifestar-se como a natu rez a do acadêmico2.
1 . O diálogo Comecemos a partir de fora, o que não é o mesmo que se começar pela pura exterioriclade. A academia, como pensada po p o r Pl Plat atão ão,, é e m p r i m e i r í s s i m a l i n h a o l u g a r d o diá di á log lo g o. Mas Ma s o que é mesmo o “diálogo”? Diálogo não acontece simplesmente pe p e lo fato fa to d e se fala f alar. r. O m e r o f a l a r é o fim f im e a a u s ê n c ia d o diál di álog ogo. o. Diálog Diálogoo só só se dá qu an do oco rre não ap enas o falar mas também o ouvir, e quando 110 ouvir realiza realiza-se -se o encon tro, no en con tro o relacionamento, relacionamento, e no relacionamento a compreensão, como ap ro funda men to e transformação transformação do ser ser. Tentemos Tentemos com pre en de r em seu significado os diferentes elementos do processo menciona dos aqui. Temos aqui, em primeiro lugar, o ouvir. É um processo de abertura, de abrir-se abrir-se para o diferente, diferente, pa ra os os outros. outros. Procu re mos mos ima ginar a arte q ue é alguém saber escut escutar. ar. Não se trata de uma habilidade, como o man useio de um a máquin a, mas sim sim de As c o n s i d e r a i s q u e se se s eg eg u em em d e v em e m - se se 110 essencial ao livrinho de J. Pieper. II V/v lirissl akadmisch? Munique, 21964. Cf. também R. Guardini. Verantwortung( íedanken zur jtidischen Frage. Munique, 1952. 1952. 28
Joseph Rafzinger
um poder-ser, em que a pessoa é exigida como um todo. Ouvir significa conhecer e reconhecer o outro, deixá-lo penetrar no espaço do p róp rio eu, estar disposto disposto a assim assimilar ilar sua palavra n a quilo que me é próprio, e com ela o seu ser, deixando-me por minha vez assimilar por ele. Após o ato de ouvir eu sou outro, meu próprio ser foi enriquecido e aprofundado, por se haver fund ido com o ser do o utro, e no outro com o ser do m und o. Para isto se pressupõe que a palavra do outro no diálogo refere-se refere-se não ape nas a algum a coi coisa sa do que po de ser conhecido, ou das habilidades, alguma coisa do poder exterior. Quando fa lamos lamos de diálogo diálogo em sentido pr óprio, óp rio, nós estamos estamos nos nos referind o a um a palavra em q ue se manifesta algo algo do p róp rio ser, em que se manifesta a própria pessoa, de modo que aumenta não ape nas a quant qu antida idade de do qu e se sabe sabe e do que se pode, mas o próp rio ser-Homem é tocado, e o poder-ser do Homem se purifica e se aprofunda. Mas Mas desta form a se se abre um a nova dim ensão do diálogo, diálogo, do seu ouvir e do seu falar, à qual o Agostinho dos primeiros tem pos p os a t r ibu ib u í a u m v alo al o r espe es peci cial al,, ele c u ja h i s t ó ria ri a de d e c o n v e r s ã o está es tá do cu m en tad a de form a palpável e concreta nos diálogos diálogos com com os os amigos, amigos, qu ando an do a pequ pe qu en a academia de Cass Cassic icía íaco co,, como qu e às apalpadelas, apalpadelas, encaminhavaencaminhava-se se para aquele mom ento em que p or fim poderia cair em seu meio uma palavra nova, desconhecida de Pl Plat atão, ão, que p oderia od eria se se trans form ar em um a mu dança da nça de vida. vida. Analisando re trospectiv amente ame nte essa essass conversas, conversas, Agostinho Agostinho ch e ga ao resultado de qu e a com unidad un idad e de amigos pod ia se se ouvir e se compreender mutuamente porque todos eles escutavam o mestre interior interior,, que qu e é a ve rdad rd ad e:í e:í. As pessoas pessoas po dem de m entend ent end er-se er-s e umas às outras porque não são meras ilhas do ser, mas estão em comunicação na mesma verdade. Encon tram-se tanto mais mais umas com as outras quanto mais entram em contato com aquilo que realmente as une, com a verdade. Sem este escutar interior da base ba se c o m u m , o d i á log lo g o p e r m a n e c e r i a u m a c o n v e rsa rs a d e s u rdo rd o s . Deparamo-nos aqui com com um a situa situaçã çãoo que é de extrem a im po p o r t â n c i a p a r a o de d e b a t e d o s dia d iass atua at uais is,, e qu q u e m o stra c la ra m e n te 3. Sobre a filosofia da primeira fase de Agostinho, cf., por exemplo, E. Kõnig. Aug A ug us tin ti n u s philosopliiis philoso pliiis - Christli Christlicher cher Glaube Glaube und philosophisches D enken in den Frühschriften Augustins. Munique, 1970. 29
N a t u r e z a c m i s s ã o d a t e o l o g i a
o s pe p e r i g o s a q u e o d i á l o g o est es t á suje su jeitito: o: as p esso es soaa s p o d e m c h e g a r
a um consenso p orq ue existe a verda ve rda de com um ; mas o consenso não pode ocupar o lugar da verdade. Nesse ponto, que já nos levou até o centro da questão, laçamos uma interrupção, para considerarm os um a seg und a caracter característ ística ica do acadêmico acadêmico..
2. A liberdade Da essência do acadêmico, e do seu esforço por compreen der, tem feito parte desde sempre a liberdade. Liberdade, aqui, signif significa ica essencialmen essencia lmen te duas du as cois coisas as.. Em E m prim pr im eir o lu ga r é a pos sibil sibilida idade de de tudo pergu ntar, de dizer tudo qu anto na luta luta pela pela verdade parecer merecedor de ser dito, de ser perguntado e pe p e n s a d o 4 . Até a q u i n ó s nos no s e n c o n t r a m o s c l a r a m e n t e n o â m b i t o daquilo que hoje é pelo pelo meno s teoricamente acei aceito to e defendid o po p o r t odo od o s. M e s m o assi as sim m p rec isam o s p e r g u n t a r : Q u e é q u e j u s t i fica esta liberdade, que em certas circunstâncias é tão perigosa? Qual Qua l o seu fun da m en to? to ? Este risco risco é assum ido em favor ci cie quê? - A única resposta satisfa satisfatóri tóriaa é a seguinte: A p ró pr ia verda de, po p o r c a u sa d e l a m e s m a , p ossu os suii tão tã o g r a n d e v a l o r q u e jus ju s tif ti f i c a o risc risco; o; n en h u m a ou tra cois coisaa ou pessoa seria seria capaz de justif justificá icá-lo -lo.. Mas aqui logo nos vemos envolvidos em um dramático conflito com todas as estratégias de mudança, ao mesmo tempo que nos deparamos também com a questão dos fundamentos da nossa sociedade. sociedade. Tentemos, p or iss isso, descrever com to da exatid ão po s sível este ponto, que Josef Pieper define como segue: “O que distingue (o acadêmico) é antes de tudo este estar livre de liga ção ção a qu aisq uer ue r eventuais finalidades de uso - um estar-l estar-livre ivre que constitui a verdadeira ‘liberdade acadêmica’, e que, portanto, p o r d e fin fi n i ç ã o se e x t i n g u e logo lo go q u e as ciên ci ênci cias as p a s s a m a s e r m e ros objetos de qualquer grupo, seja qual for sua organização”5. “Pode-se querer tomar a filosofia a seu serviço; mas o que é to mad o a serviç serviçoo de algu ma cois coisaa já não é filos filosof ofia ia”” 6. A pergu pe rgu nta pela liberdade está está insepar inseparável ável men te ligada ligada à pe r gunta pela verdade. Quando a verdade deixa de ser um valor 4. Sobre esta seção, cf. J. Ratzinger. Freiheit und Bindung in der Kirche. In: Ratzinger. Kirche-Õkumene-Politik. Einsiedeln, 1987, p. 165-182.5. L.c., p. 28. 5. L.c., p. 28. 6. Ibid., p. 29. 30
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Joseph Ratzinger
em si mesma, quando deixa de ser merecedora de empenho e atenção, o conhecim ento só pod erá ser avali avaliado ado através através da utili utili dade. dad e. Nesse Nesse caso caso ele ele já não se justifica po r si mesmo, mas apen as pel p eloo s obje ob jett ivos iv os a c ujo uj o serv se rviç içoo se e n c o n t r a . Passa Pas sa,, e n t ã o , a faze fa zerr pa p a r t e dos do s obje ob jetitivo voss e meio me ios, s, e isto ist o sign si gnif ific icaa q u e d e a l g u m a f o r m a ele ele está está subo rdinad o a alguma forma de po de r ou de conquista conquista do poder. Expressando isto com outras palavras: se o Homem não pudesse de alguma forma reconhecer ele próprio a verda de, mas unic amente am ente a utilidade das das coi coisa sass par a isto isto ou para pa ra aqu i lo,, então a no rm a de todo agir e de todo pen sar passaria a ser lo ser o uso e o consumo; então o mundo se transformaria unicamente em “matéria p ara a prát ica”. Torna-se clara clara aqui a inexorável e inevit inevitáve ávell decisã decisãoo que se mp re mais mais pro fu nd am en te passou passou a ser ser o dilema da Era Moderna, e que hoje é apresentada como seu destino: será que a verdade é realmente acessível ao Homem? Adianta Adia nta procu rá-la? Será que a única salvação salvação consistir consistiria, ia, talvez talvez,, em buscar a verdade, reconhecê-l reconhecê-laa como a verdadeira senho ra dos ho mens, me ns, como a única úni ca coisa coisa que salv salva? a? Ou consistiria consistiria a ver dadeira libertação do Homem em abandonar a questão da ver dade, como fica claro na nova lógica de Francis Bacon, quando ele ele desper des perta ta do sonh o especulati especulativo vo e finalmente assume em suas suas mãos o domínio das cois coisaas par a torn ar-se o “mestre e senh or da natur na tureza eza”? ”?77 Seria válida a definiç definição ão de Giambattista Vic Vicoo, de que verdade é unicamente aquilo que é feito (e portanto aquilo que po p o d e s e r íéit íé ito) o),, o u s e r á váli vá lida da a a f i r m açã aç ã o cris cr istã tã d e q u e a v e r d a de antecede o fazer?8 fazer?8 A liberdade que resulta do novo pensa pe nsa mento de Bacon Bacon é a liberdade para fazer fazer tudo e para recon hecer o saber saber e o pod er como a única única lei do H om em - um a liberdade, no enta nto, que antes não estivera estivera em vi vigo gor, r, e que p ôde ser a p re sentada como a verdadeira libertação na conduta do filho mais novo, que toma posse da herança e com ela parte para o desco nhecido. Mas a liberdade para fazer tudo, a liberdade que não rg an um F. Bacon tentou dar uma nova definição da essência da 7. No seu N o v u m O rgan filosofia. Ela já não pergunta simplesmente pela verdade mas sim pelo poder e sa ber, pelo poder do Homem sobre o mundo. .Seu objetivo é conquistar o domínio sobre a natureza. Cf. J. Pieper, l.c., nota 2, p. 20. A importância de F. Bacon na B efre re iun iu n g u n d origem da Era Moderna é enfaticamente demonstrada por M. Kriele. Bef politisch poli tischee A u fk la r u n g . Freiburg, 1980, p. 78-82. C f ainda R. Spae ma nn e R. R. Lõw. Die Frage Wozti? Munique/Zurique, 1981, p. lOOs. das Ckrist Ckristent entum. um. Munique, 1968, p. 33-43. 8. Cf J. Ratzinger. Ein fülim ng in das
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reconhece mai maiss ne nh um compromisso com a verd ade - com o pai pa i vive viv e sob so b a c o m p u l s ã o d e q u e o q u e a g o r a d e t e r m i n a o I lom em é un icam ent e o usar e o ser-usado, send o po r iss isso em em última última análise análise u ma liberd ade de escravo escravo - mesm o qu e isto isto só só cheg ue a evidenciar-se mais tarde, e mesmo qu e d u re até esgo tar-se, a ponto de chegar às bolotas dos porcos e de invejar os po p o r c o s p o r n ã o e s t a r e m s u jei je i tos to s à m a l d i ç ã o d a l i b e r d a d e . C h e gou-se a esse ponto nos postos mais avançados do desenvolvi mento moderno, mas o clamor ecológico, contra o Homem como de struid or do ser ser, não traz salv salvaç ação ão en qu an to a pe rgu nta pe p e l a v e r d a d e n ã o f o r n o v a m e n t e colo co loca cadd a . “A v e r d a d e vos vo s li li b e r t a r á ” (Jo (J o 8 ,32 ,3 2 ) - e s ta p a l a v r a d o S e n h o r p o d e s e r c o m p r e endida hoje de uma forma inteiramente nova na profundida de e grandeza de sua exigência. A verdadeira alternativa do nosso tempo passou a ser entre a liberdade do fazer e a liber dade da verdade. Mas a liberdade do fazer que não se deixa tolher pela verdade é a ditadura dos fins, em um mundo de on de a ve rdad rd ad e já se enco nt ntra ra ause nte, e com isto isto a escr escravi avizaç zação ão do H om em sob sob a aparência de libert libertaçã ação. o. Só Só quan do a verd a de tiver valor em si mesma, e quando ver a verdade for mais importante do que todos os êxitos e sucessos, só então é que seremos livres. E por isso a liberdade verdadeira é apenas a liberdade liberdade da verdade.
centro ro:: a verdade com como fund fu ndam am ento en to e medida da 3. 0 cent liberdade Com isto isto nós chegam os ao verda deiro dei ro núcleo de nossas nossas concono que a justifica é estar aí para a verdade, sem ter que preocu pa p a r-se r- se com co m os fins fi ns a alca al canç nçar ar.. A m u l h e r d e Ló Ló,, q u e o l h a p a r a trás, é transformada numa estátua de sal; e o Orfeu, depois de subir subir na lu luz, p erd e tud o q uan do procura garantir o êxit êxito9. o9. Tentemos agora ap ree nd er com a máxima precisão precisão poss possív ível el esta idéia, para que possamos ver com clareza suas exigências e implica implicaçõe ções. s. Parece-me Parec e-me significa significativ tivoo o fato fato de Roma Ro mano no Gu ardini ard ini havêhavê-la la form ulad o u m a vez vez em em conexão com a questão judaica, judaica, !). lista imagem em Pieper, p. 69, lembrando Iv. Weiss. 32
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com a clareza e severidade que lhe são próprias. Não foi por acaso acaso que isto isto aconteceu, pois pois aqui, aqui, nos dias dias de te rr or do Tercei ro Reich, Reich, o aspecto aspecto destrutivo d a aliança aliança en tre razão, má qu ina e polí po lítt ica ic a já se havi ha viaa m a n i f e s t a d o c o m a b s o l u t a clar cl arez eza. a. Aqui Aq ui se havia torn to rnad ad o manifesto m anifesto o que é a razão q ua nd o os fins fins e a efic eficá á cia são erguidos à condição cie único Deus, e com isto pôde-se ver que unicamente o valor da verdade, seu caráter intocável, é capaz de salv salvaar. O que G uardin ua rdin i disse disse então sobre a universidad e mostra bem a essência do verdadeiramente acadêmico: “Se a universidade possui um sentido espiritual, é o de ser o lugar onde se pergunta pela verdade, pela pura verdade - não por causa de algum objetivo, objetivo, mas por po r causa causa dela mesma: m esma: pelo fato fato de ser verdade”10. No contexto de nossas preocupações atuais, a mesma idéia foi formulada pelo bispo Hermann Dietzfelbinger, ao receber o prêmio Romano Guardini. Nessa ocasião ele mos trou como a questão questão da v erda de estav estavaa sendo desviada desviada pa ra a do valo valor, r, lem bran br ando do que qu e de início início as idéias idéias das origens origen s do nacionalsocialismo foram vistas como “valores” sensatos e libertadores, sendo desta forma legitimados. A frase de Carl Friedrich von Weizsàcker, citada então, merece ser repetida aqui: “Afirmo que a longo longo prazo prazo só só pode p rosp erar um a socieda sociedade de orientada para a verdade, não para a felicidade”11. Mas isto, precisamente no momento em que recordamos o contex to d a palavra de Gu ardini men cionad a acima, acima, sign signif ific icaa o seguinte: A maior e a melhor defesa do Homem, e a melhor defesa e purifi purificação cação do munclo, ocorre oco rre q ua nd o se resi resist stee ao do mínio do dogma da transformação, ou melhor, do dogma da factibilidade, e se adere ao direito cia verdade por causa dela mesma. Pois quando o Homem torna-se verdadeiro, isto é, ao mesmo tempo um pouco o mundo tornando-se verdadeiro, e quando o Homem se torna verdadeiro ele se torna bom, e lá on de ess esse Hom em se encontra o mu nd o se torn a bom. bom. Tomás Tomás de Aquino, como se sabe, definiu a verdade como o adequar-se do espírito à realidade. A falha desta definição foi mostrada com mu ita clareza clareza sobretu do na filo filoso sofi fiaa personalista do períod per íod o en10. R. Guardini, l.c., nota 2, p. 10. Ak adem emie ie in Bayer Ba yern. n. 11. H. Dietzfelbinger. Dimensionen der Wahrheit. In: Kath. Akad Chronik 1980/1981, p. 148-156; citação 150.
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Ire as gu erras err as e no apó a pó s-g s- g ue rra '2. Esta fórmula, fórm ula, certam c ertam ente, ent e, n ão
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nidade da verdade, verdade, de que por sua sua ve vez depe nd em a dignidade dignidade do Homem e do mundo, se não se aprende a ver nisto o ser e a dignidade do Deus vivo. Por isso cm última análise o respeito à verdade é inseparável daquela atitude respeitosa que nós cha mam os de adoração. Verdade Verd ade e culto culto estão estão entr e si nu m a relação inseparável - um não pode realmente prosperar sem o outro, como efetivamente tantas vezes chegaram a separar-se no de curso da história.
4. 0 culto culto Com isto, em nossa pesquisa do acadêmico e da teoria do acadêmico, chegamos já a um último po nto de vist vistaa. Que a pala vra “Academia” tenha sido de início o nome de um templo préurbano, antes que Platão criasse ali sua escola, pode de início não parecer muito significativo para a história da nova institui ção. Mas considerando com mais atenção poderemos perceber aqui uma ligaç ligação ão mai maiss profu nda , que certam ente não deixou deixou de ser im portan te para o fundador. Pois do p onto de vist vistaa jurídic o a academ ia de Platão Platão era um a associ associaçã açãoo de culto. Dessa Dessa forma, a veneração das das musas era uma com pon ente im por tante d a vid vida; a; existia expressamente o cargo do preparador dos sacrifícios13. Isto é bem be m mais mais do que um a simples simples coincidência externa, exte rna, possi possi velm ente uma um a concessão às estrut est rutura ura s socioló sociológic gicas as de então. Em última anál análise ise,, a liberdade pa ra a verdade verd ade,, e a liberdade liberd ade da d a ver dade, não pode existir sem que o divino seja reconhecido e ve nerado ner ado.. O estar livre livre da obrigação obrigação de ser útil útil só pode ser fun da mentado, e só pode permanecer, se realmente existir o que foi retirado da propriedade e do proveito do Homem, se existir o direito mais elevado de propriedade do divino, a intocável exi gência da divindade. “A liberdade da Theoria, diz Pieper, reportando-se a Platão, “está indefesa e desprotegida - a não ser que esteja especialmente incluída na proteção dos deuses”14. O ser livre livre da utilidade, o estar livre livre dos dos objeti objetivos vos do pode r, só en co n tra sua garantia mais profunda na reserva do que não está su Hist orisches hes 13. Pieper, l.c., p. 37s. Cf. H. Meinharclt. Akademie. In: J. Ritter (ed.). Historisc Wórterbuch der Philosophie /. Basiléia/Stuttgarl, 1971, p. 121-124. 14. Ibid., p. 36.
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bo b o r d i n a d o a n e n h u m p o d e r h u m a n o : n a l i b e r d a d e q u e Deu De u s lem e dá em relação ao mundo. Não é mera casualidade que a liberdade da ver dad e se se enco ntre em Platão Platão,, que p or p rimeiro a formu lou filosofica filosoficament mente, e, mas tam bém que se enc ontre on tre sub stan cialmente no contexto da veneração, do culto. Onde este não existe, aquela deixa de existir. Deixa também de existir, eviden temente, onde as formas de culto, apesar de mantidas, são reint rei nterp erp ret adas ad as de nt ntro ro de um agir si simbé>lico m era m en te soc social. ial. Mas Mas tudo tud o iss isso signif signific icaa que qu e a pseu dolib do liberd erd ade anár a nárqu quica ica sem pre está em ação quando se negam as bases da adoração, quando deixa d e ser aceita a ligaç ligação ão com a verdad ver dad e, a exigência da ve r dade. Hoje estas estas fal falsa sass liberdades são são sup erpod erp odero erosas, sas, e consti tuem a verdade ira ameaça ameaça à verdad eira liberdade. liberdade. Q uan do nos nos ocupamos com a salvação do Homem e do mundo, esclarecer o conceito de liberdade é uma das tarefas mais importantes.
II N
a t u r e z a
e f o r m a
d a t e o l o g ia
F
u n d a m e n t o
e s pir it u a l
e
l u g a r d a
TEOLOGIA NA IGREJA “Ne nh um crist cristão ão inteligente inteligente há de neg ar que o cuidado cuida do com a palavra de Deus entre os homens foi confiado unicamente à Igreja”1. Não se trata aqui de uma frase proveniente de algum funcionário d a cúria envolvido envolvido na rotina do seu m agistério agistério e que tenh a olhos olhos apenas pa ra ver a autorid ade do seu carg cargo, o, incapaz incapaz de perceber perc eber os problema s na n a sua totalidade. totalidade. Esta Esta frase frase,, pelo con trário, foi form ulad a no ano de 1935 935, no au ge da luta nacionalnacionalsoci social alis ista ta contra con tra a Igreja, p o r um discípulo discípulo de Ru dolf Bultma Bu ltma nn, que se encontrava na linha mais avançada da Igreja Evangélica Confessante, e que num insistente discurso lembrava à Igreja sua responsabilidade pelo ensino da teologia. Estamos falando de Heinrich Schlier, que estava longe de com estas palavras pre tend te nd er ocu par-se com teorias teorias acadêmicas acadêmicas ou com com instruções bu rocrátic rocráticas. as. A tentativa tentativa do Estado de fazer fazer do cristianis cristianismo mo lute ran o um cristianismo alemão, e de com isto servir-se dele em benefí cio cio do totalitarismo d o parti p artido, do, abrira-lh abri ra-lhee os olhos, olhos, assim assim como a muitos de seus companheiros, para o fato de que a teologia ou está na Igreja e parte da Igreja, ou então não existe. Assim esta frase frase carreg car regaa em si si um destino: destino: re nu nc iar ao ensino na universi unive rsi dade, que já não era exercido por uma Igreja que se tornara tímida e confusa. Mas a teologia, dessa forma isolada, e que se havia havia retraído à sua ap are nte liberdade acadêmic acadêmica, a, transfo rm a ra-se em joguete dos poderes dominantes, estando exposta à
1. H. Schlier. Die Verantwortung der Rirche für den theologischen Unterricht. In: H. Schlier. Der De r Geist un u n d die Kirch Ki rche. e. Freiburg, 1980, p. 241-250 [Ed. por V. Kubina e K. Lehm ann - Citação Citação da p. p. 241, primeira publicação: publicação: Wupp ertal-Ba rme n, 1935].
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intervenção do partido2. Ficou claro, com esta situação, que a liberdade da teologia é a vinculação à Igreja, e que com qual qu er o utr a espécie de liberd ade ela está está se se traind o a si si mesma e a causa que lhe foi confiada. Ficou claro que não pode haver ensino teológico se não houver um magistério eclesiástico, por que nesse caso a teologia não teria outra certeza a não ser a de qualquer ciência humana, isto é, a certeza da hipótese, sobre a qual se pode discutir, mas pela qual ninguém há de pôr a vida em jogo. Se assim fosse, seria pretensão a teologia querer ser qualquer outra coisa que não história, e talvez psicologia ou so ciologia, ou ainda filosofia do cristianismo. Na N a é p o c a e sta st a visã vi sãoo se i m p ô s c o m c a n d e n t e cla cl a reza re za,, e m b o r a não fosse de nenhum modo reconhecida como evidente pela maioria maior ia dos teólogo teólogos. s. Passou Passou a ser a linha divisória divisória entr en tree ac omo om o dação liberal, que por liberalidade logo transformou-se em ser vilismo totalitário, e opção pela Igreja Confessante, que ao mes mo tem po era um a opção pela teologia teologia ligada ligada à conf confis issã são, o, e com isso à Igreja docente. Hoje, numa época de paz exterior, não é tão fá fácil cil ver os con torn os com a mesm m esmaa clareza. clareza. Teólogos católi cos cos, com certeza, de fo rma geral não c ontestarão a existên existência cia do magistério3. Nesse Nesse pon to os dado s da tradição e da o rde m ecle ecle siás iástica tica - diferentem ente da tradição tradição re form ada - são são clar claros os para o cat catól ólic ico. o. Mas Mas de f orma geral a necessidade in terna ter na e o cará ter 2. Cf. a este respeito o cronograma biográfico cia vida de Schlier, l.c., p. 304. Schlier restituiu em 1935 a Venia legendi, depois de um pedido de licença à Faculdade Ecle siástica ter sido rejeitado. Já antes fora rejeitado um chamado para a Universidade de Halle, bem como a nomeação de Schlier como professor extraordinário em Marburgo; Marburgo; um a e outra coisa por ele pe rtenc er à Igreja Igreja Confessante. Pode servir de introdução ao pensamento teológico de Schlier, A. Schneider. Worl Gottes im theologis theologischen chen Denken Denk en von vo n H . Schlier. Schlier. Frankfu Frankfurt, rt, 1981. Uma bem fundam entad a recensão a esse respeito, de P. Kuhn. In: Theologis Theologische che R evu e 82, 1986, p. 31-;34. Merece aten ção também J. Junttila. Corpus Christi Pneumalicum - He inrich S chlier in kasi kasity tyss kirkosta. Helsinki, 1981 [em finlandês, com um extenso resumo em alemão]. 3. A situação atual da discussão na teologia de língua alemã torna-se bem visível na The ologie gie an d das Lehra Le hra mt. mt . Freiburg, 1982. É im antologia editada por W. Kern. Die Theolo portante sobretudo o rico e equilibrado artigo de M. Seckler. “Kirchliches Lehramt u n d t h e o l o g i s e h e W i ss s s e n sc s c h a f t - G e s c h i c h t l ic i c h e A s p e k te t e - P r o b l em em e u n d Lehrhauses es I.osungselemente”, p. 17-62. Cf. também M. Seckler . Dieschiefen Wà ndede s Lehrhaus Katholizitát ais Herausforderung. Freiburg, 1988, p. 105-155. • M. Seckler. I heolo gic ais Glaubensw issenschaft. In: In: W. Kern, II. II. Po ttmeyer e M. Seckler. Seckler. l/andlnuh der Fundavientaltheologie IV. Freiburg, 1988, p. 180-241. 40
Joseph Ratzi nger
pos p osititiv ivoo d o m a g i s t é r i o t a m b é m d e i x a r a m h o j e d e ser se r e v i d e n tes te s pa p a r a a c onsc on sciê iênn cia ci a c o m u m d a teo te o log lo g ia cató ca tólilica ca.. A a u t o r i d a d e eclesiástica aparece como uma instância alheia, que a partir da lógica cientí científica fica não deve de veria ria existi existir. r. A ciência - assim assim parec par ecee - só pocl po clee s e g u i r s u a p r ó p r i a lei. Mas e sta st a lei é q u e n e la a ú n i c a coisa coi sa que p ode contar é o argu me nto racional racional e obje objeti tivo vo.. Q ue em lu gar do argumento e da visão obtida através dos argumentos o que decida o que deve ou não deve ser ensinado seja urna auto ridade , é considerado como estando em contradição com com a ciên ciên cia. cia. E isto isto desacre dita a teolog teologia ia den tro do organism o da unive un iver r sidade. sidade. O que im porta n ão é a autorid ade, mas sim os argu m en tos, to s, e, se mesm o assim assim a auto rid ad e ten t en ta r decidir, decidir, isto isto só pode po de rá ser vis visto to como um a pre tensão ten são de poder, c ontra on tra a qual qual é necessá necessá rio precave r-se4. r-se4. O fato de hoje a teologia católica também pensar assim a colocou nu m a situação bastante bastan te contradi con traditória tória.. Aplica Aplica-se -se a ela mais um a vez, vez, e em maior intensidade, o que R oman o G uard ini cons tatou nos seus professores de teologia na época da crise moder nista e pou co depois, dep ois, a sab saber er,, que seu catolicismo catolicismo era ape nas na s um “liberalismo restringido pela obediência ao dogma”n. Seu pen samento claudicava assim para ambos os lados: não conseguia convencer como liberalismo, porque a obediência ao clogma, suportada a contragosto, o impedia. Nem tampouco conseguia reco re co m en dar da r o catoli catolicis cismo, mo, que não passava de algemas, sem nada cie pró prio , de positi positivo, vo, viv vivoo e gran de. Não se consegue p e rm a necer por muito tempo numa situação dividida como esta. Se a Igreja e a au torida tori da de ecle eclesi siás ásti tica ca forem pa ra a teologia teologia um fator estranho à ciência, então tanto a teologia quanto a Igreja estão igualme igua lmente nte co rre nd o risc risco. o. Po Pois um a Igreja Ig reja sem teologia teologia se em em po p o b r e c e e p e r d e a visão; vi são; mas ma s u m a t e o log lo g ia sem se m I g rej re j a diss di ssol olve ve-s -see na arbitra rieda de. Por is isso a questão da ligação ligação inte rna en tre as 4. Cf. a crítica do magistério, apesar de mais uma vez modificada, de P. Eicher. Von de n Schwierigkei Schwierigkeiten ten bürgerlicher Th eolo gie mit d en katholischen katholischen Kirchenstruk Kirchenstrukturen turen.. In: W. Kern. L.c., nota 3, p. 116-151. B eric icht htee ü ber be r m ein ei n Lebe Le benn - Autobiographisèhe Atifzeichnungen 5. R. Guardini. Ber Atifzeichnungen (Díisseldorf, 1984) sobre o teólogo moralista de Bonn, F. Tillmann: “[...] mas a atitu de crític crítica, a, como o mostrou a ‘linha ‘linha de Boni BoniV V que mais tarde esteve em ev idência, n o fun do era um liberalismo restringido pela obediência em relação relação ao do gm a” (p. (p. 33).
N a t u r e z a e m i s s ã o d a t e o l o g i a
duas precisa precisa ser refletida desd e os fund am ento s, precisa precisa ser in teiram ente esclarecida esclarecida;; n ão p ara delimitar esfera esferass de interesse interesse,, nem para manter ou para excluir o poder, mas sim em favor da honestidade da teologia, e em última análise da honestidade de nossa nossa pr óp ria fé. O tema é imenso; imenso; não pod e tratar-se tratar-se aqui aqui de n en hu m estudo estudo completo, nem de algo que pelo menos aproxime-se disto. Ten tarei apenas ocupar-me com alguns pontos de vista que ajudem a levar adiante nossas idéias. E em tudo isto quero consciente mente, senão exc exclu luir ir,, pelo pelo menos a bo rdar ap enas marg inalmen te a questão do magistério, magistério, po rque rq ue não h á como abo rdá-la sati satis s fatoriamente sem que antes fique esclarecido o que de fato é fund amental: am ental: a íntima e essenc essencial ial conexão cone xão e ntre ntr e a Ig reja e a teo logi lo gia. a. Para apre sent se ntar ar isto isto existem múltiplos caminhos. No p erío do en tre as guerras , qu ando an do en tro u em e m colapso colapso o mod elo cl clássico-liberal, e mais ainda 110 tem po da luta da Igreja no Terceir Terceiroo Reich, esta conexão foi retomada pelos pensadores teológicos mais importantes da época, sendo por cada um apresentado à sua maneira própria. Talvez o primeiro a abrir as portas tenha sido sido o então doc ente Rom ano Guard ini, que pesso almente havia havia pa p a s s a d o p e l a e x p e r i ê n c i a d e d o i s p r o c e s s o s i n t e l e c t u a i s : o kantism o havia d estruí est ruído do a fé fé de sua infância; infância; e a conversão veio veio a representar a superação de Kant, e a superação de Kant o rein reinic icio io do pen sam ento na obediência obediência a uma palavra palavra prov enien te de um interlocutor vivo com quem se está comprometido, a Igreja'1 Igreja'1. Após a Prim eira G ran de Gu erra, err a, foi foi o gra n de exeg eta e historiador historiad or evan evangéli gélico co Erik Erik Peterson qu e na dispu ta com Harnac k e Barth mostrou a insuficiência da dialética e que sua seriedade era apenas aparente, bem como a insuficiência do liberalismo, encon trando o caminho para o dogma e por último último para a Igre ja j a Cató Ca tólilica ca77 . Mas à s u a m a n e i r a t a m b é m Karl Kar l B a r t h , mais ma is u m a (>. R. Guardini. L.c., p. 32ss, 68-72, 83-87. Gf. meu ensaio: Von der Liturgie zur ( ihristol ihristologie ogie - Rom ano Guardinis Guardinis theologischer Grundansatz un d seine Aussage Aussagekral kralt. t. Wahrheit- Die bleibende In: J. Ratzinger. Wegezur Wahrheitbleibende Bedeutun g von Romano Guardi Guardini. ni. Ro m ano an o G uard ua rdin ini.i. Mainz, 1985, p. 52-76. Düsseldorf, 1985, p. 128-133. • H.B. Geri. Rom 7. Os testem unh os mais importan tes deste caminh o estão reun idos em: E. Peterson. Peterson. I hrologische T rakt ra ktat ate. e. M uniqu e, 1951. Sobre a caminhada e a obra obra de Peterson, veja o grande trabalho de B. Pflichtweiss. Erik Peterson - Neu e Sicht Sicht auf Leben Leben u nd Werk Werk.. Ireiburg, 1992. 42
Jo s e p h Rat Ra t z i nge ng e r
vez vez em em dis puta com Ila rnac rn ack, k, recon heceu que a teologi teologiaa ou é de Igreja ou en tão não é teolo teologia gia;; o fat fatoo de have r den om ina do sua [Kirchliche iche Dogma Dog matik tik ] foi g ran ra n de obra de “Dogm ática Ecles Eclesiás iástic tica” a” [Kirchl e continua sendo uma profissão de fé, e se não fosse essa decisão esta esta obra não existiria8. existiria8. E po r último precisa ser m encio nad o o nome de Heinrich Schlier, que na disputa com o nacional-socialismo, e ao assumir posição contra uma teologia acadêmica claudicante, reconheceu que a teologia necessita da Igreja e da decisão decisão magisterial ci cia Igreja, po rq ue ela existe inteira inteir a e exclusi vamente p ara “ap “ap re n d er de forma orde na da e expressa” a Pala Pala vra de Deus9. Deus 9. Assim ssim como as outras, tam bém essa essa decisã decisãoo - como já vimo vi moss - c a r r e g a v a u m g r a n d e d est es t ino in o : a n t e s d e t u d o o d e na pe p e r s e g u i ç ã o polí po lítitica ca p e n s a r n a r e n ú n c i a a o car ca r g o , c a m i n h o este es te que qu e mais mais tard e o levou à Igrej a Católi Católica ca.. Seria interessan inte ressan te escla escla recer e analisar o tema da eclesialidade da teologia no pensa mento me nto dessas dessas quatro qu atro gran des figuras, figuras, no que elas elas têm de con tra tra ditório e no que têm de comum10.
1. O novo sujeito como pressuposto e fundamento de toda teologia Mas isto nos levaria longe demais. Por isso eu gostaria de ten tar aqui um ponto de pa rtida que à prim eira vis vista ta parece não ter ligação com nosso tema, mas que na realidade estou conven cido cido que leva leva ao fun dam ent o sem o qual nada pode ser enten di do. Refiro-me à palavra da Epístola aos Gálatas, em que Paulo, ao mesmo tempo temp o como revolucionária revolucionária experiência experiênc ia pesso pessoal al e como realidade objetiva, descreve o que distingue o cristão: “Eu vivo, mas já não sou, é Cristo que vive em mim” (G1 2,20). Esta frase encontra-se no final daquela breve autobiografia espiritual esboçada po r Paulo fre nte aos aos seus seus leitores leitores - não p ara se autogloriar, autogloriar, mas sim sim para pa ra lem brar sua pró pria pri a história com CrisCrisBarth - Darstell 8. Cf. li.U. von Balthasar. Ka rl Barth Darstellung ung und D eutung seiner seiner Theologie. Einsiedeln, 41976. 9. H. Schlier. L.c., nota 1, p. 227. 10. Do universo de língua francesa ainda teria que ser acrescentado, com o mesmo peso, L. Bouyer. Cf. o fascinante retrospecto sobre sen caminho e a ampla apresen tação cie sua visão da teologia no livro surgido dos diálogos com G. Daix: L. Bouyer. Das H an dw erk er k des Theo Th eolog log en . Einsiedeln, 1980.
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lo i'i' com com a Ig reja e esclarecer esclarecer a mensa me nsagem gem que lhe foi foi confiada. confiada. Sempre de novo esta apologia do seu caminho leva, por assim dizer, de fora para dentro. Primeiramente são apresentados os acontecimentos externos de sua vocação e de sua caminhada, mas por fim, nesta única frase, como que sob a luz de um raio, lica lica vi visí síve vell a oco rrên cia in terior ter ior do que aconteceu acon teceu com ele e que serve de base base a tud o iss isso. Esta oco rrên cia in terio r é a um só tem po p o i n t e i r a m e n t e pess pe ssoa oall e i n t e i r a m e n t e obje ob jetitiva va.. É a mais ma is p r ó pr p r i a d as e x p e r i ê n c i a s , m a s diz di z o q u e é a ess e ssên ênci ciaa d o cri cr i stia st iann ism is m o pa p a r a c a d a u m . S e r i a p o u c o d e m a is exp ex p licá li cá-l -laa com c om esta es tass pala pa lavr vras as:: “Tornar-se cristão e permanecer cristão tem a conversão como fun dam ent o”, apesar de com com ist istoo nos nos encontrarm os inteira m en te na direção correta. Mas conversão, no sentido paulino, é algo muito mais mais radical radical do que, digamos, a revis revisão ão de algum as opi ni ões e atitudes. E um processo de morte. Dito com outras pala vras: é uma mudança de sujeio. O eu deixa de ser um sujeito autô nomo no mo , u m sujeito sujeito que subsis subsiste te em si si mesmo. mesmo. El Elee é arran ca ca do de si próprio e introduzido em um novo sujeito. Não que o eu sim plesmen te desapareça, mas de fato fato ele ele tem tem q ue deixar-se cair cair inteiramente, inteiramente, para em seguida seguida ser concebi concebido do nov amente n um eu maior, e ju n ta m en te com est este. e. A idéia idéia básic básicaa de que a conversão é a ent rega reg a da an tiga subje tividade isolada do eu e o voltar a encontrar-se em uma nova unidade de sujeito em que os limites do eu foram rompidos e dessa forma o contato com a base de toda realidade se torna poss po ssív ível el - esta es ta i d é ia bási bá sica ca volt vo ltaa mais ma is u m a vez ve z n a E píst pí stol olaa aos ao s Gálatas Gálatas,, em ou tro contexto con texto e com novas ênfase ênfases. s. Paulo, com au xíli xí lioo da oposição oposição entr e ntree lei lei e promes sa, se inte rrog a se o pró prio pr io Ho m em pode po de po r assi assim m dizer faze fazer-s r-see a si mesmo ou se ele ele pre cisa cisa deixar-se presentear. El Elee enfatiz enfatizaa aqui ex pres sam ente que a pr p r o m e s s a d e u - s e n o sing si ngul ular ar.. A p r o m e s s a n ã o é d i r i g i d a a u m a multidão de sujeitos um ao lado do outro, mas vale para “a se mente”, para a descendência de Abraão, no singular (G1 3,16). Nã N ã o exis ex iste te mais ma is d o q u e u m portador da promessa, e fora dele está está o mu nd o confuso da auto-real auto-realizaç ização, ão, em q ue as pesso pessoas as qu e rem concorrer umas com as outras e com Deus, mas com isso deixam de en con trar sua verdadeira esperança. esperança. Mas Mas como have ria a promessa de ser esperança, se ela só é válida apenas para 44
J o s e p h R a t z i n g c r
um único? A resposta do apóstolo é a seguinte: “Todos vós que fostes batizados em Cristo vos revestistes de Cristo. Já não há ju j u d e u n e m g r e g o , n e m e scra sc ravo vo n e m livr li vre, e, n e m h o m e m n e m mulher, pois todos vós sois um em Cristo Jesus. Ora, se sois de Cristo, então sois verdadeiramente a descendência de Abraão, herdeiros segundo a promessa” (G1 3,28). É importante obser var qu e Paulo não diz: diz: vós sois sois um a só coisa, coisa, mas ele acentua: acent ua: vós vós sois um . Vós vos tornastes um novo e único sujeito com Cristo, e assim assim - pela fusão dos sujeitos - estai estaiss incluídos n a p rom ro m es sa1 sa 11. Este Este segundo texto é importan te, por que escl esclar arec ecee o co nte ú do objeti objetivo, vo, que e m bo ra sirva sirva de base base par a a pr ime ira fórmula: “Eu, mas já não e u ”, não é tão claro pa ra o lei leito tor. r. A m ud an ça de sujeito sujeito de que se trata aqui não p ode od e ser feita feita po r inici iniciati ativa va pr ó pr p r ia. ia . Isto Is to n ã o t e r i a lógi ló gica ca,, seri se riaa u m a c o n t r a d i ç ã o . Pois h a v e r i a d e pe p e r m a n e c e r n a “o b r a ”, no n o im p en etrá v el fe cha m ento d o p ró p ri o sujeito. A mudança de sujeito envolve um passivo, a que Paulo com razão se se refere como morte, como participação no aconteci me nto da cru cruz. z. Esta Esta mud anç a só pod e suce der a alguém alguém a pa rtir de fora, fora, a partir de um outro. Como a conversão conversão cris cristã tã rom pe a fron teira e ntre o eu e o não-eu, ela só po de ser dada a alguém a pa p a r t i r do d o n ã o -eu -e u , n u n c a p o d e c o m p let le t a r-s r- s e n a m e r a i n t e r i o r i d a d e da p róp ria deci decisã são. o. A conversão possui possui estru es tru tu tura ra sacramental. O “eu vivo, mas já não eu” não descreve uma experiência mística pess pe ssoa oal,l, m a s sim si m a essê es sênc ncia ia d o b a t i s m o 12. T r a t a - s e d e u m p r o c e s so sacramental, isto é, de Igreja. O passivo do tornar-se cristão exige o ativo ativo da ação da Igre ja, on de a u ni nidd ad e de d e sujeito sujeito do fie fiell se apresenta corporal e historicamente. Só a partir daqui é que po p o d e ser se r a d e q u a d a m e n t e e n t e n d i d a a p a l a v r a p a u l i n a d a I g r e j a como o “corpo de Cristo”. Ela se identifica com o revestir-se-deCristo ou com o ser-revestido-de-Cristo, onde esta nova veste, que ao mesmo tempo protege e liberta o cristão, é o corpo do Cristo ressuscitado. Q uem lê Paulo pa rtin do dessa dessa vi visã são, o, sem pre de novo, a pa r tir das mais diferentes abordagens, depara-se com a mesma vi D erB B rieJ ri eJ a n die Galciter. Galciter. Gõttingen, I 1. Para a interpr etação d e Gálatas 2,20: H. Schlier. Der Ga laterbrie rbrief.f. Freiburg, 1974, p. 182-187. Ver 1962, p. 101-104. • F. Mussner. De r Galate também os dois comentário s sobre os outros textos citados de Gálata Gálatas. s. 12. H. Schlier. L.c., p. 102.
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s;i<> básica. Na teol te olog ogia ia batism bat ismal al da d a Epís E pístol tolaa aos Rom Ro m anos an os ela e la está ligada às idéias da tradição, isto é, aos conteúdos do conheci mento e da profissão cristã. Aqui o batismo é descrito como o ser-incluído na regra da doutrina; o que neste processo de en trega corresponde a um espaço de conhecimento comum é a obediência que par te do coração (Rm (Rm 6,17),; 6,17),;í. N um a ab orda gem mais uma vez diferente, nos deparamos com o mesmo pensa mento na Primeira Epístola aos Coríntios. Paulo desenvolve a comparação do corpo e dos membros, membros, que era conhecida na an tiga filosofia social. Ao transportá-la para a Igreja, segue-se uma sur pre en de nte expressão, que quase quase sempre deixa de de ser ser perce bi b i d a - o q u e f o r ç o s a m e n t e leva lev a a u m a i n t e r p r e t a ç ã o e r r ô n e a das da s bases ba ses d a ecle ec lesi siol olog ogia ia p a u l i n a , q u e e m b o r a n ã o d e s d e n h e e m p r é s timos timos à soci sociolo ologi giaa de então, é orient ada po r um a concepção bá sica inteiramente diferente. Pois Paulo não diz: Assim como no organismo existem muitos membros atuando em conjunto, as sim também na Igreja. Este seria um modelo de Igreja pura mente sociológico. No momento em que abandona a imagem antiga, antiga, ele ele transfere o pensa me nto p ara um plano inteirame nte novo, quando diz: Assim como ocorre com o corpo e os mem br b r o s , “assi “as sim m é C r i s t o ” ( l G o r 12,12) 12, 12).. O suje su jeititoo q u e se c o n t r a p õ e não é a Igreja, pois esta, segundo Paulo, não é nenhum sujeito sepa rado, rad o, subsistente em si si mesmo. Mas o novo sujeito sujeito é “o p ró pr p r i o C r i s t o ”, e a I g r e j a n ã o é o u t r a coisa co isa s e n ã o o esp es p aço aç o d e sta st a nova un ida de de sujeito, sujeito, que com iss isso é muito mais mais do q ue um a mera interação social. Trata-se, portanto, do mesmo singular cristológico como na Epístola aos Gálatas, também aqui apon tando tan do pa ra o sacramen to, se bem que desta vez vez pa ra a Eucaris Eucaristia, tia, cuja natureza havia sido descrita por Paulo dois capítulos antes com esta ousada frase: “Somos um só corpo, apesar de muitos, pois po is tod to d o s p a r t i c i p a m o s d esse es se ú n i c o p ã o ” (10, (1 0,17 17). ). “ U m c o r p o ” de acord a cord o com o significa significado do bíblic bíblicoo de soma - pode perfeitamen perf eitamen te ser tradu zid o també m po r “um sujeito”, sujeito”, se levarmos levarmos em conta a corpor alida de e historicidade deste sujei sujeito to.. Antes de nos interrogarmos o que tudo isto tem realmente a ver com teologia, teologia, gostaria de ao meno s de passagem indicar como 11. Schlier. Der D er Rõme Rõ merb rbrie rief.f. Freiburg, 1977, p. 207-210. • E. Kasemann. A n (lie (lie 171 s. 1’ower. Tub ing en , 1973, p. 171
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este mesm me smoo assunto reflete-se reflete-se no Evangelho Eva ngelho de d e João. Anis se Paulo é movido mov ido sob retud ret udoo pela questão da fé e da resperliva profissão, profissão, Joã o levant levantaa com mu ita ins insis istê tênc ncia ia a questão questão da reta reta co m pr em são. O que a ambos importa é em última análise a queslão «Ia verdade do nosso ser. João se vê diante do fato de que todo «lis curso me ram ente emp írico - nós nós diría diríamos: mos: m eram ente hi histó stóri rico co - de Jesus fica enredado num quase absurdo novelo de mal-en tendidos. tendidos. Perg untar qu em é Jesus reduz-se aqui aqui a pe rgu nta r de onde on de ele realm ente vem. vem. Já nos nos encontram os aqui diante do mal en ten did o histori historici cista sta,, qu e acredita have r esclare esclarecido cido um assun assun to qu an do analis analisaa seu processo processo de origem . Para Joã o este é um err o grossei grosseiro. ro. Mas Mas se se não podemos co nhecer verd adeira m ente Jesus esclarecendo esclarecendo sua origem, que pod erem ere m os faze fazer? r? A is isso João Joã o dá uma resposta que ao pensamento moderno pode de início pa p a r e c e r mito mi toló lógi gica ca.. El Elee diz: Só o P a r ácli ác lito to p o d e t o r n á - l o c o n h e cido, o Espírito, que é o espírito cio Pai e do próprio Filho. Só se po p o d e c o n h e c e r a l g u é m a tra tr a v é s d e l e m e s m o . Se p r e s t a r m o s mais ma is atenção, logo perceberemos que a menção à pneumatologia é um a introd in troduçã uçãoo à ecle eclesi siol olog ogia ia,, e que aqui se se trata de um proces proc es so de compreensão descrito com exatidão. Pois como atua o Es pír p íritito? o? P r i m e i r a m e n t e r e c o r d a n d o , u m r e c o r d a r em q u e o i n d i vidual é reunido em uma totalidade, que confere ao que antes não havia sido ente en tend nd id idoo seu reto signifi significado cado.. Caracteriza-se tam bé b é m p e lo ouvi ou virr : Ele n ã o fala fal a d e si m e s m o , m as i n t r o d u z à p a l a vra qu e no ouvir ou vir torna-se torn a-se luz. luz. Ele não força, mas dá a palavra palav ra ao interlocutor, e o fa faz en tra tr a r em mim. E ali, li, então, já se en co nt ntra ra o resto: ele produz um espaço de ouvir e de recordar, um “nós” que em João circunscr circunscreve eve a Igreja como lugar do conhecimento. Só neste nós de participação na origem, só pela participação em si, é que ocorre a compreensão. Bultmann esclareceu isto bela mente quando disse sobre o testemunho do Espírito segundo João: “Ele é ‘repetição’, é recordação à luz da atual comunidade com ele”14. 14. R. Bultmann. Das E va n g eliu el iu m na cliJ cl iJoh oh an nes. ne s. Gõttingen, 15 1957, p. 427. Sobre o que foi explicad o aqui sobre João , cf. cf. o belo artigo de H. Schlier. Schlier. “Der I leilig e Geisl Geisl De r Geist u n d die. ie. Kirch Ki rche, e, p. 165ais Interpret nach dem Johannesevangelium”. In: Der 178 [ver nota 1, acima].
N a t u r e z a c m i s s ã o d a t e o l o g i a
Conversão, o, f é e pensamento pensam ento 2. Conversã Embora de início todas essas coisas estejam muito distantes de nossas questões correntes sobre o conceito e os métodos da teologia teologia,, aos poucos pouco s as ligaç ligações ões começam começ am a to m ar forma. Co m e cemos cemos com com u m a ap aren te banalidad e: a teolo teologia gia pressupõ e a fé fé. Ela vive do paradoxo de que existe uma ligação entre fé e ciên cia. Aquele que pretender suprimir este paradoxo está supri mindo a teologia, e deveria também ter a coragem de dizê-lo. Mas quem basicamente o aceita tem que aceitar também as ten sões sões nele presentes. Nele Nele transp arece a forma partic ular da exi gência gência crist cristãã da verdad e, o que verd ade iram ent e m ostra a essên cia do cristianismo no conjunto da história das religiões. Pois o fenôm eno da teologia teologia,, no sentido estrito da palavra, palavra, é um fenô meno me no exclusivam ente crist cristão, ão, inexistente em out ras partes. Nele está pressuposto que na fé trata-se da verdade, isto é, de um conhecimento que não se refere apenas ao funcionamento de coisas quaisquer, mas da verdade do nosso próprio ser; que se trata, portanto, de saber como devemos ser para estarmos cer tos. Pressupõe-se que só na fé esta verdade se torna acessível; que a fé fé é um novo começo começo do pe ns ar que nos é dad o de p rese n te, e que não pode por nós mesmos ser estabelecido ou substi tuído. Mas Mas se se pres sup õe ao mesmo te mp o qu e então esta verd a de esclarece todo nosso ser, e por isso ela fala também ao nosso intele intelecto cto e qu er ser comp reen did a p or ele. le. Pressupõe-se Pressupõe-se que esta esta verdade, como verdade, se dirige à razão, precisa ser pensada pe p e la raz ra z ã o p a r a q u e poss po ssaa p a s s a r a s e r p r ó p r i a d o H o m e m e a desenvolver plena me nte sua forç força. a. En qua nto o mito na Grécia Grécia e na ín dia que r apenas difu ndir múltipl múltiplas as imagens imagens do verdadeiro, que sempre permanece inapreensível, a fé em Cristo não pode ser modificada em suas afirmações básicas. E verdade que ela não s usp end e o limite limite bási básico co do Ho me m frente à verdade , isto isto é, é, não sus pen de a lei lei da analogia, mas analogia não é o mesmo que metáfora. Analogia sempre está aberta à ampliação e ao apro fundam ento, mas mas nos nos limi limite tess do hu m ano ela ela proclama proclama a próp ria verdade. verd ade. Neste sentido, a racio nalid ade faz faz pa rte d a essênc essência ia do cristia cristianism nismo, o, e ist istoo de um a forma que não é exigida po r n en h u ma das outras religiões. Quem reprimisse sua marcha estaria contrariando uma indispensável dimensão da fé. Nisto está o X
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limite que o magistério da Igreja precisa observar em sen rela cionamento com a teologia. Mas antes antes precisamos levar levar adian te o pen sam ento esboçado esboçado a p ar tir de Paulo e a p artir ar tir de João João.. Agora Ago ra nós pode mo s dizer: dizer: a fé e o pen sar sa r fazem p arte ar te da teologia. teologia. A falta de u m a ou do out r<> haveria hav eria de dissol dissolvêvê-la. la. Isto signi signific ficaa qu e a teologia pres pr essu supõ põ e no pe p e n s a r u m n o v o iníc in ício io,, q u e n ã o é p r o d u t o d e n o ssa ss a p r ó p r i a r e flexão mas provém do encontro com uma palavra que sempre nos antecede15. O aceitar este novo início nós o chamamos de “conversão”. Como não existe teologia sem fé, não existe teolo gia sem conversão. A conversão pode ter muitas formas. Esta não precisa precisa oc orr er sem pre em u m fato fato pon tual, como em Agos Agos tinho ou Pascal, em Newman ou Guardini. Mas de alguma for ma este sim tem que ser assumido neste novo início, tem que realizar-se a mudança do eu para o não-eu. Resulta daí, direta mente, ment e, que qu e a chance d e um u m a teologi teologiaa cria criativ tivaa é tanto maior maio r quanto qua nto mais a fé tiver se tornado experiência real; quanto mais a con versão, versão, em doloro so processo de transfo rmação , tiver obtido evi dência interior; quanto mais tiver sido reconhecida como o ca minho indispensável para penetrar na verdade do próprio ser. Por is isso, nos nos convertidos, o cam inho po de estar est ar orien tado tad o pa ra a fé; por isso eles nos ajudam a reconhecer melhor e a testemu nhar a razão da esperança cjue está em nós (cf. IPd 3,15). Por iss isso a liga ligaçã çãoo entre en tre teologia teologia e santidade santidad e não é nenh ne nh um palavrório sentimental ou pietista, mas resulta da lógica da coisa e confir ma-se ao longo lon go de to toda da a história. N ão é possíve possívell pensa pe nsa r-se Ata Ata-násio sem a nova experiência de Cristo do pai do monaquismo Antônio16; Agostinho, sem a paixão do seu caminho rumo à radica lidade lidad e crist cristã; ã; Bo ave ntu ra e a teologia franciscana franciscana do sécu lo 13, sem a imensa e nova presença de Cristo na figura de São Francisco Francisco de Assis; is; Tomás de Aquino, sem a ru p tu ra p ar a o Evan Evan gelho e a evangelizaçã evangelizaçãoo em Domingos, e assi assim m se se po de ria conti c onti nuar ao longo de toda a história da teologia. A racionalidade p u r a e sim si m p les le s n ã o b a s t a a i n d a p a r a d a r o r i g e m a u m a g r a n d e Da s Bild Bi ld vou 15. Islo íoi mostrado mu ito clarament e por R. Guardini em seu livrinho Das Je su s d emChrislus im Neuen Testament. Ilerderbücherei, 1962, p. 138-141. 16. 16. Muito esclarecedor so bre este assun to é J. R oldanus. “Die Vila Antonii ais ais Spiegcl der T heo logie des Athanasius”. Athanasius”. In: In: Theol. Phil., 58, 1983, p. 194-216.
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icologia cristã. No fundo, mesmo figuras tão eminentes como Kiisc iischhl, Jülicher, Ha rna ck, lidas lidas a part pa rtir ir das gerações su bse qüen qü en tes, pe rm ane cem estr an ha m en te vazi vazias as do pon to de vist vistaa teo teo lógico. E vice-versa, uma piedade medrosamente fechada em si própria não pode levar a uma declaração em que a fé ga nhe nova evidência e dessa forma, ultrapassando seus pró pr p r i o s lim li m i t e s , v o l t e a s e r m e n s a g e m p a r a os h o m e n s q u e b u s cam a verdade.
3. 0 caráter eclesial eclesial da conversão e suas conseqüências pa p a r a a teologia teol ogia Nes Ne s tas ta s c o n s i d e r a ç õ e s já j á está es tá i n c l u ído íd o u m pas pa s so a mais ma is.. A fé exige conversão, dissemos dissemos,, mas a conversão é u m ato de o bedi ência para com aquilo que me antecede e que não provém de mim mesmo. E esta obediência permanece, porque aquilo que me antecede não se torna parte do meu próprio pensar, mas pe p e l o c o n t r á r i o sou so u e u q u e s ou i n c o r p o r a d o a ele e le,, ele el e s e m p r e fica acima acima de mim. P ara o cristã cristãoo aquilo aquilo que antece de não é ne nh um “algo”, mas sim um “ele”, ou melhor, um tu. E Cristo, o Verbo Encarnado. E o novo início, a partir do qual nós pensamos. E o novo eu, o nd e o limite limite da subjetividad e, os limites limites en tre sujeito e objeto, foram ultrapassados, de tal modo que posso dizer: eu, e no entanto não mais eu. A partir deste ponto abrem-se agora visões para diversos la dos. dos. Tento apenas ape nas indicá-l indicá-las as breve bre vem m ente. en te. A conversão convers ão nã o leva leva a uma relação privada com Jesus, que no fundo seria mais uma vez apen as um a conversa consigo consigo mesmo. El Elaa é aprop riaç ão ao tipo de doutrina, como diz Paulo; é entrar no “nós” da Igreja, que encontr enc ontr am os em João. Só assi assim m a obediência é concreta, é a obediência a que a verdade tem direito. Guardini, sobretudo, sempre de novo apresentou este núcleo de sua experiência de conversão, que torno u-se o centro de sua teolog teologia ia e um reinic reinicio io na teologia após o fracasso do modelo liberal. A palavra de con versão, que pa ssou a ser pa ra ele a m ud ança an ça de d e vida, vida, foi foi Mt 10,3 10,39: 9: “Q uem pr oc ur ar a sua vida vida (quem quiser auto-rea auto-realiz lizar-s ar-se) e) há de pe p e r d ê - l a ; e q u e m e s q u e c e r a s u a v ida id a p o r a m o r a m i m , h á d e encontrá-la”. Depois de todas as tentativas frustradas de auto-
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realização, esta palavra lhe ficou gravada na alma com uma evi dência humana absoluta. Precisamos perder-nos para que nos encontremos. Mas perd er-no s para onde? De certo não para u m luga r qualqu qualquer. er. Este Este pe rd er só pode ter um destinatár destinatário io ade qu a do: Deus. Mas onde está Deus? A experiência de Guardini diz: “O ‘Deus ‘Deus livrem liv rem ente en te acessível’ acessível’ não existe. Ao cont co ntrá rário rio da exi gência da busca autônoma de Deus [...]. Ele é o desconhecido, que qu e ‘habita um a luz inacessível’ inacessível’ (l T m 6,16)”17 6,16)”17. Só o Deus con creto pode ser diferente de uma nova projeção do próprio eu. Só a imitação de Cristo é o caminho da “perdição” que leva ao destino destino.. Mas Mas também aqui surge surge novame nte um a pergunta : Qual a imagem de Jesus que é mais que uma imagem? Onde eu o encontro realmente, a Ele, e não apenas idéias a respeito dele? Guardin Gu ardin i apon ta pa ra a plura lidade das imagens de Crist Cristoo e cons tata: “Mas um ocupar-se mais penetrante vê novamente aquela inquietante inqui etante sem elhança das diversa diversass imagens de Cristo com aque aq ue le que as projetou. Muitas vezes é como se todas essas figuras de Cristo fossem fossem auto -retra -re tratos tos idealizados dos q ue as pe ns ar am ”18 ”18. E a respo resposta sta?? Aquele que se tornou torn ou c arne arn e pe rm anece an ece u carne. Ele é concreto. “A partir cia Igreja de Cristo surge sempre de novo pa p a r a o i n d i v í d u o a e x i g ê n c i a d e d a r a p r ó p r i a a lma, lm a, p a r a q u e seja seja nova me nte concebida em sua novid ade e pecul pe culiarid iarid ade ”19 ”19. O lado concreto de nossa obediência é a obediência p ara ar a com a Igreja. A Igreja é o sujei sujeito to novo e maior em que passado e pr e sente se tocam, sujeito e objeto se encontram. Ela é nossa contemporaneidade com Cristo. Outra não existe20. A palavra encarnação abre outras visõ visões es,, detalh de talhada ada m ente en te de d e senvolvidas por Heinrich Schlier no relato de sua conversão21. Nã N ã o p osso os so f a z e r dela de lass a q u i mais ma is q u e u m a b r e v e m e n ç ã o . H á e m Beric hte üher üh er rnein Leben Leb en , p. 7 Iss [ver 17. A experiência cia conversão ó descrita em: Berichte nota 5, acima]. Guardini voltava sempre de novo à passagem de Mt 10,39, como K irche he des mostrou H.B. Geri. L.c., p. 44s [ver nota 6, acima]. No seu ultimo livro: Die Kirc Her H errn rn (Würzburg, 1965), 1965), ele a interpretou mais um a vez cie cie forma impression ante. A citação apresentada encontra-se ali na p. 62. Kirc he des H e rrn rr n , p. 63. 18. Die Kirche 19. Ibid., p. 64. 20. Cf. ibid., p. 67-70. De r Geist u n d die Kirch Ki rchee , p. 270-289 [ver no 2 1. II. Schlier. Kurze Rechenschaft. In: Der ta 1, acima].
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pr p r i m e i r o l u g a r a liga li gaçã çãoo e n t r e c o s t u m e e t r a d i ç ã o viva. N e ste st e contexto exist existee a plenitude do p od er apostó apostóli lico co,, que inte rpret a a palavra da tradição, conf erindo -lhe clareza clareza.. E existe, existe, p or últi mo, a definitiva decisão de Deus por nós. Existe a partir dela, “segund “segu ndoo o Novo Te stam ento ent o [...] ...],, o fato fato de a fé fixar-se fixar-se em fra f ra ses concretas, que exigem de la recon hecime hec imento nto concreto de sua ve rdad rd ad e”22 e”22. Sendo Se ndo assim assim,, Schlier Schlier pôd e dizer dize r que to rnou-se rno u-se cató lico por um caminh o pro testante - ou seja seja,, pela sola scriptura. Quem pôde desfrutar de sua amizade sabe que ele não perdeu nad a de sua hera nça protestante, mas simplesmente simplesmente a levou levou até até às últimas conseqüências. co nseqüências. Int er ro m po aqui a marc ha de minhas cons consider ideraçõe ações, s, porque o que mais mais imp orta or ta deve ter ficado ficado clar claro: o: A Igreja não é para pa ra a teologia uma instância alheia à ciência, mas sim a razão de sua existência, o que faz faz com que q ue ela seja seja poss possív ível. el. E po r o ut utro ro lado a Igreja não é um princípio abstrato, mas sim um sujeito vivo e um con teúdo concreto. Este Este suje sujeito ito é por n aturez a m aior do que qualq uer pessoa pessoa individual individual,, ou mesm o do que q ualq uer geração isol isolada ada.. A fé sem pre é participação em um todo, e precisam ente nisto nisto ela é guia pa ra a amplidão. Mas Mas a Igreja tamb ém não é um espaço espiritual inapreensível, inapreensível, no qual qual que r um possa possa esc esco o lher o que mais lhe agrade. Ela é concreta na palavra compro metida da fé. E é a voz viva que fala nos órgãos da fé2:!.
4. Fé, pregação e teologia Nã N ã o é n e c e s sári sá rioo e l a b o r a r a q u i m i n u c i o s a m e n t e a t e o r i a d o magistério e das for mas q ue dele d ele se seguem; sobre isso isso já se tem falado com bastante freqüência. Mas Mas é precis precisoo res po nd er ain da a algumas pergunta s concret concretas as que sem pre de novo ocorrem de n tro desse contexto. Pois os problemas encontram-se no terreno concreto. Em teoria não há qualquer dificuldade para se reco nhe cer que a teolog teologia, ia, po r sua nature za, faz faz pa rte d a Igreja; que a Igreja não é apenas uma moldura organizativa, mas sim sua razão íntima e sua fonte direta; direta; qu e p or consegu inte a Igreja não 22. Ibicl., p. 279. 23. A idéia da Igreja como sujeito da teologia foi desenvolvida detalhadamente por R. Guardini em sua preleção inaugural em Bonn: Anselm von Canterbury und das A u fcle fc le m W e.ge e. ge - Versuche. Mainz, 1928. Wesen der Theo logie. In: In: Au 52
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é incom incom petente no tocante ao conte údo nem pode ser teol teologi ogica ca mente muda, mas que precisa ter uma voz viva, ter também a capacidade de falar vinculantemente para o teólogo. Na verda de mais uma vez impõe-se aqui um caminho de fuga desta concretude, que hoje conta claramente com defensor defensores. es. A Ig re ja j a , diz-s diz -se, e, r e c e b e u o e n c a r g o p a s tor to r a l; ela el a p r e g a aos ao s fiéis, fiéi s, m as não ensina aos teól teólogo ogos. s. Mas esta esta separação entre en tre an úncio e en sino é profundamente contrária à essência da palavra bíblica. Elaa apenas re pete aquela divisã El divisãoo entr e pneum áticos e gnóstic gnósticos os com com que já na Antigüidade a chamada gnose gnose proc urou criar para si um espaço livre, que na realidade a levou a distanciar-se da Igreja e da fé. Pois esta divisão pressupõe a relação pagã entre mito e filosofia, entre simbolismo religioso e razão esclarecida, a que a crítica cristã se havia oposto, e que como tal identificou-se tam bém precisa men te com com a crít crític icaa de um pensam pen sam ento religi religioso oso classista. Realizou a emancipação dos simples, atribuindo-lhes também a capacidade de serem filósofos no verdadeiro sentido da palavra, isto é, de entenderem tão bem ou melhor do que os instruídos o que na verdade caracteriza o humano. As palavras de Jesus Jesu s sobre a incom preensã pree nsãoo dos sábio sábioss e a com preensão pree nsão dos pe p e q u e n o s ( s o b r e t u d o M t 11,25 11, 25 p a r ) são sã o a p lic li c a d as p r e c i s a m e n t e a esta situaçã situação: o: elas elas justificam justifica m o cristianismo como um a religião religião po p o p u l a r , c omo om o u m a fé e m q u e n ã o e x iste is te s i s t e m a al a lg um de dua s classes. E de fato: o anúncio da pregação ensina com autoridade; é nisto que qu e consist consistee sua nature na tureza. za. Pois ele não prop pr op õe um a espécie espécie de laze lazer, um a distração religios religiosaa qualquer. A pregação p re tend te nd e dizer ao Homem quem ele é e o que ele tem que fazer para ser ele mesmo. Quer lhe revelar a verdade sobre si mesmo, isto é, a verdade para a qual ele pode viver e pela qual pode morrer. Ni N i n g u é m m o r r e p o r m ito it o s desc de scar artá táve veis is;; se p o r a l g u m a r a z ã o algum deles deles provo car dificuldad dificuldades, es, po de ser substituído substituído po r ou o u tro. E de hipóteses não se pode viver; pois a própria vida não tem nada de uma hipótese, ela é uma irrepetível realidade, na qual basei baseia-s a-see o destino de u m a ete rn id idad ad e24 e24. Mas Mas como p od eria er ia 24. Uma brilhante análise da civilização da hipótese é oferecida por R. Spaemann. Die christl christliche iche Religion Religion un d das Ende des m ode rne n Bewusstseins Bewusstseins.. In: IK Z C o m m u n io , 8, 1979, p. 251-270, sobretudo p. 264-268.
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a Igreja Igreja ensina r vinculantemente , se ao mesmo tempo este ensino pe p e r m a n e c e s s e n ã o vinculante pa ra os teólogos? teólogos? A essência essência do m a gistério consiste consiste precisam preci sam ente ent e em q ue o anúncio anún cio da fé constitui o pa p a d r ã o váli vá lido do t a m b é m p a r a a teol te olog ogia ia:: pois po is é e x a t a m e n t e este es te anún cio q ue constitui o objeto objeto de sua reflexão. reflexão. Neste sentido, a fé dos dos simples simples não é algo algo como um a teologi teologiaa rebaixa da p ara uma grande massa de leigos, algo como o “platonismo para o povo”, mas a relação é exatamente o contrário: a pregação é a medida da teologia, e não a teologia a medida da pregação. Aliás, esta pr p r e d o m i n â n c i a d a fé simp si mple less t a m b é m c o r r e s p o n d e p e r f e i t a m e n t e a uma ordem antropológica básica: os grandes temas da condi ção humana são apreendidos numa percepção simples, funda men talmen te acess acessív ível el a cada um, e que jamais pod e ser supe ra da na reflexão. De modo um tanto informal se poderia dizer: o Criador, por assim dizer, procede de uma forma muito demo crática. E verdade que ele não concede a todas as pessoas faze rem ciência teológica; mas o acesso aos grandes conhecimentos bási bá sico coss e stá st á aces ac essí síve vell a q u a l q u e r u m . (3 m a g i sté st é r i o , n e s t e s e n t i do, possui possui algo algo de um cará ter democrático: ele ele defe nde nd e a fé fé co mum , on de não existe existe diferença de categoria categoria entre instruídos e simpl simples. es. E certo qu e a Igreja, Igreja, em seu m ún us pastoral, está está au to rizada a pregar, e não a expor doutrinas teológicas científicas. Mas para a teologia o múnus da pregação é também o múnus magisterial. Com ist isto já fico ficouu respo ndida um a p arte d a p ergu nta levan levan tada ante riorm rio rm ente. en te. Havíamos dito que aceitar o magistéri magistério, o, em teoria, não é difícil. Mas logo que se passa para a prática surge um grave receio. Não estaria aqui sendo restringida indevida mente a liberdade de pensamento? Não surgiria aqui necessa riam ente um a estreita vigilâ vigilânci ncia, a, tiran do o fôlego fôlego à grand gra ndeza eza do pe p e n s a m e n t o ? N ã o t e r í a m o s q u e r e c e a r q u e a I g r e j a u l t r a p a s s a s se o quadro do anúncio, interferindo também na parte científi ca, ca, e dessa form a ultrap ul trap assand ass and o seus direitos? direitos? São São pergu pe rgu ntas nta s que pr p r e c i s a m s e r l e vada va dass a séri sé rio. o. P o r isso está es tá c e r t o q u e 11a relação entre teologia e magistério se procure pôr ordem, se procure garantir espaço suficiente para a responsabilidade da teologia. Mas Mas por p or mais que isto isto seja seja justificado, justificado , é preciso qu e sejam o bser bse r vados também os limites destes questionamentos. Quando a ✓
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eclesia eclesialida lidade de é vi vist staa apenas como u m a algema, já se está está t rab a lhan lh ando do nu m a constru ção err e rrad ad a da teologia. teologia. Foi esta esta a vis visão ão que surgiu pa ra Guard ini no enco ntro com seus seus profess professores ores pessoal pessoal mente me nte ortodoxo o rtodoxo s e cientific cientificamente amente adepto s do d o liberalism liberalismo, o, o que o levou levou a um recom eço rad icalm ente ent e novo. Se a teologia vê aqui aq ui lo que lhe é próprio apenas como um obstáculo, como poderia ela produzir frutos? Em teologia, Igreja e dogma devem ser le vados em conta como força criadora, não como algema. E de fato essa essa “força “força cria cr iado do ra” ra ” abre à teologia suas grand gra ndes es p erspe ers pecti cti vas25. Procuremos ver isto no exemplo da exegese, que ainda hoje é conside rada como o exemplo clá clássic ssicoo de qu e p ara o teólo go a Igre ja não passa passa de u m obstácul obstáculo. o. Mas Mas o que um a exegese que emancipou-se da Igreja é realmente capaz de conseguir? Qual a liberdade de que ela pode desfrutar? Tal exegese trans forma-se num antiquariato. Ela passa a pesquisar unicamente coisas passadas, a levantar várias hipóteses sobre a origem dos diversos textos, bem como sobre sua relação com a realidade histórica. Tais hipóteses só nos interessam mais do que outras teorias literárias porque a Igreja sempre está aí, afirmando que esses esses livros livros não nã o atesta ate stam m ap enas en as coisa coisass passadas passad as mas nos falam do que é verdadeiro. Aliás, a coisa não fica melhor quando se tenta atualizar a Bíblia com filosofias privadas, pois existem filosofias melhores que nos deixam frios. Mas como a exegese torna-se excitante q ua nd o ousa ler a Bíb Bíbli liaa corno corno totalidade e como u ni dade! Q ua nd o surg e do sujeito sujeito único do povo de Deus, Deus, e através através dele do p rópr ró prio io Deus como sujei sujeito, to, ela ela então nos fala fala do pr es en te. te. E então ent ão os conhecim con hecim entos ento s sobre a diversida div ersidade de de suas conste const e lações históricas também se tornam fecundos. Precisamos cntão descobrir a unidade nessa diversidade. As hipóteses, ao esforço do conhecimento histórico, é dado aqui um amplo espaço, espaço, com com a única restrição de qu e não seja seja de stru ída a un i dad e do todo, que se se enc on tra em em um plano d iferente do que po p o d e r i a s e r d e n o m i n a d o o a s p e c t o a r t e s a n a l d o s d i v e r s o s t e x tos. Encontra-se num plano diferente, mas faz parte da reali dade literária da própria Bíblia. Gostar Gostaria ia ainda de mencio nar mais mais um rápido exemplo. Q ua n do a crítica neotestamentária começou a revelar as diferentes \
Beri chte ilber ilbe r mein mei n Leben. Leb en. L.c. 86 e outras. 25. Cf. Berichte
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( amad as d o test t estem em un ho de Cristo, Cristo, abriram-se perspectivas a pa p a r t i r das da s q u ais ai s se t o r n o u poss po ssív ível el t e r m o s u m a n o v a visão vi são d e Jesus e chegarmos ao conhecimento de coisas que jamais havía mos imaginado. Mas quando se começa a separar umas das ou tras tras essa essass camadas e a identificar identificar a ve rda de com a idad e hipoté hip oté tica do surgimento de cada uma, a imagem de Cristo se empo br b r e c e c a d a vez ve z mai m ais, s, n o fim n ã o r e s t a n d o o u t r a cois co isaa se s e n ã o u m as po p o u c a s h ipó ip ó tes te s e s . C o m o s eria er ia e s t i m u l a n t e e b o n i t o v o lta lt a r m o s a pr p r o c u r a r n o v a m e n t e a fi f i g u r a d e Jes Je s u s , n ã o a de d e s c r i t a p o r esta es ta ou po p o r a q u e l a s u p o s t a fon fo n te, te , m as sim si m p e l o v e r d a d e i r o N o v o T e s t a mento. E aqui aparece uma coisa pela qual não esperávamos: a fragm entação entaç ão da Bíbl Bíblia ia levou levou a um a nova espécie espécie de in terpr ter pr eta ção alegórica. O q ue se lê não nã o é mais o texto, mas sim as as supostas experiências de supostas comunidades, dessa forma criandose muitas vezes uma interpretação alegórica extremamente aventuro sa, com que no fim a gente simplesm ente está se confir mando a si próprio. Por muito tempo ficou-se com a impressão de que o magistério, isto é, o anúncio de fé da Igreja, forçaria a uma superposição dogmática do texto bíblico, impedindo que fosse tranqüilamente interpretado do ponto de vista histórico. Hoje torna-se evide nte que só qua nd o se apóia na fé fé da Igreja é que a seriedade seriedade histórica histórica do texto está protegida, torn an do pos sív sível um u m a visão visão literal literal que qu e nã o se identifica identifica com fund amental am entalism ismo. o. Pois Pois sem o sujeito viv vivo, o, ou se tem q ue absolutizar abso lutizar a letra ou e ntão ntã o ela ela desaparece na indeterminação. Confirma-se assim, mais uma vez, o que já foi visto antes, quando nos ocupamos com o contexto de conversão, fé e teolo gia. ia. Jamais os mom entos de uma fecunda re tom ada da teol teolog ogia ia surgiram da separação da Igreja, mas sempre de um novo vol tar-se para ela. O afastamento da Igreja sempre resultou num empobrecimento e nivelamento do pensar teológico. O grande impulso da teologi teologiaa ocorrido en tre as duas duas g randes guerras, que pos p ossi sibi bililito touu o Conc Co ncililio io Vati Va tica cano no I I , volt vo ltaa mais ma is u m a vez a d a r em nosso nosso sécu século lo um imp ression ante te stem un ho desta lig ligaç ação ão.. Não deve isto, de forma alguma, resultar numa espécie de apoteose do magistério. mag istério. O p erigo erig o de u m a estreita e rígida vigilância vigilância não é m era fantasia fantasia.. É o que mo stra a história história da disputa m odern ista, apesar de os julgamentos sumários, comuns em nossos dias, se rem unilaterais unilaterais e não fazerem justiça à seriedade da questão. Na 56
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realidade, abdicar do magistério e da disciplina estaria tão dis tante de u m a resposta a esta esta questão questão qu anto ant o o neg ar a existên existência cia de problemas. Permitam-me, Permitam -me, neste contexto, voltar voltar mais mais um a vez vez a Heinrich Schlier, cujos discursos teológicos dos anos 1935 e 1936 podem ser considerados co mo represen tativos d a luta d e fé dos dos cristã cristãos os evangé evangélic licos os pela preservaç ão da id entida ent idade de cristã cristã contra a inte r venção do poder totalitário. Mas eles definem também a cora gem do teólogo, capaz de convencer a pseudoteologia de sua inverdade e de manter dentro dos limites a falsa ousadia da ali enação enaç ão herética. Frente Fren te a u m a situação situação em que os órgãos ofic oficia iais is da Igreja continuavam ainda aind a amp lam ente ent e em silên silênci cio, o, com seus seus receio receioss deixa ndo o cam po aberto a berto ao abuso do nom e cristão cristão,, ele voltou-se voltou-se direta dir etam m ente en te para pa ra os estudan tes d e teologia e disse disse-lh -lhes es:: “[...] Reflitam um momento e digam o que é melhor: que a Igre ja, d e f o r m a o r d e n a d a e r e f leti le tidd a, r e t i r e d e u m teól te ólog ogo, o, p o r falsa fal sa doutrina, o ofício de ensinar, ou que o teólogo isolado, de ma neira d escom prom etida, acuse este este ou aqu ele de fals falsaa dou trin a e advirta contra ele. Aqui só possui cabimento a opinião liberal, que de nenhum modo existe algo assim como decidir sobre a verdade e inverdade de uma doutrina, e que por isso toda dou trina possui possui um p ouco de ve rdade rda de e deve ser tolerada na Igreja. Mas Mas nós não com c om partilham part ilham os dessa vis visão ão.. Pois Pois ela ela nega que qu e Deus realme nte ten ha decidido entre nós” 26. Olhando-se Olhand o-se a partir par tir de hoje, hoje, é fá fácil dizer que naq uela época é poca tratav tratava-s a-see re almente de saber se se a Igreja continuaria an un cian do o Evangelho de Cristo ou se passaria a ser um instrumento do anticri anticristo sto.. Tam bém é fá fácil dizer que um a apa ren te liberalida de servia efetivamente à causa do anticristo. Mas no momento histórico em que qu e a pessoa tem que agir, agir, sem pre existem mil mil prós e contras. contras. Não existe existe ne nh um a prova p rova m atemática que seja seja capaz capaz de dispensa r a decisão decisão,, de torná-la s upérflua . A evidência da fé 26. Assim ele falou em 1936 na palestra feita feita dur ante o congre sso dos estudan tes renanos de teologia: Die Kirchliche Verantwortung des Theologiestudenten. In: Der De r Geist u n d die d ie Kirch K irche. e. L.c., L.c., p. 225 -24 0, citação citação 232. Schlier foi o prime iro a retom ar aqui a idéia da decisão, manifestada na disputa do período pós-conciliar, e a desen volvê-la sistem aticam ente ern seu trabalho básico básico:: Das bleiben d K atholische Ein Versuch über ein Prinzip des Katholischen (1970). In: H. Schlier. Das Da s E n d e der Aufsátze und Vortràge III. Freiburg, 1971, p. 297-320. Zeil - Exegetische Aufsátze
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não é a evidência da geometria; sempre é possível passar por cima dela. Exatamente por ser assim, existe a tarefa do ofício apost apostól ólic ico, o, que depois de cuidadoso e xam e ap resen ta a evidên cia interior da fé sob a forma de uma decisão. Não resta dúvida que é importante encontrar formas jurídicas capazes de prote ger um a adeq uad a autonom ia do pensam ento cien cientí tíffico ico dentro de seus limit limites es e de ga ran tir o necessário necessário espaço par a a disp uta cien cientí tífi fica ca.. Mas a liberdad liberdad e de q uem ensina indiv idualm idu almente ente não é o único nem o maio r direito direito a ser ser preserv ado aqui. aqui. Para a ques tão tão da priorid ade dos bens bens na comu nida de do Novo Novo Testamento existe uma forte palavra do Senhor, a cuja seriedade a Igreja não pode se eximir: “Qu “Qu em co rro m pe r a um dess desses es pequen inos que crêem, melh or seria seria se lhe am arrassem um a ped ra de moi nh o ao pescoço pescoço e o jogasse jog assem m ao m ar ” (M (Mc 9,42 9,42). ). Os “peq ueni ue nino no s” deste versículo não são as crianças, mas este é o nome usado na lingu agem dos discípul discípulos os de Jesu s p ara desig nar os os futuros cris cris tãos. E quando se fala do escândalo que os ameaça não se está fazendo referência a uma possível sedução sexual, mas sim ao estímulo que leva à perda da fé. “Dar escândalo” significa, de acordo com o atual conhecimento da exegese, exegese, “per tu rb ar a fé” fé”,, e com isso “levar a perder a eterna salvação”27. O bem maior pe p e l o q u a l a I g r e j a é res re s p o n s á v e l é a fé d os p e q u e n i n o s . A m e d i d a interior de toda doutrina teológica precisa ser o respeito a este be b e m . Disso p r e c i s a t e r c o n s ciên ci ênci ciaa n ã o só q u e m faz pe p esq u is a p a r ticular, mas também quem ensina em nome da Igreja. Assumir esta tarefa e não falar em seu próprio nome, mas em nome do sujeito sujeito comu m que qu e é a Igreja, inclui inclui a obrigação de o indivíduo impor limites a si próprio. Pois com isso lhe é transferida tam bé b é m u m a a u t o r i d a d e q u e , c o m o sábi sá bioo p r i v a d o , e sem s em a co c o n fia fi a n ça das pess pessoas oas na palavra da Igreja, ele ele não tem. Com a au torida tor ida de lhe é dad o um po de r que impl implic icaa responsabilidade, porq ue não pr p r o v é m d e le p r ó p r i o mas ma s base ba seia ia-s -see n a miss mi ssão ão - n a I g r e j a , e m nome da qual ele agora pode falar. Quem no contexto da disci pl p l i n a m a g i s t e r i a l d a I g r e j a fala fa la d e a b u s o d o p o d e r , e m g e ral ra l só está pensando hoje no abuso do poder pelo ofício eclesiástico, Da s M arku ar ku seva se va ng eliu el ium m II. II . Freiburg, 1977, p. 114, com menção a G. 27 Ver R. Pesch. Das Stahlin. ThWNT VII, Col. 351 [mcavÔodov ktà].
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que sem dúvida pode existir. Mas quase sempre fica esqueci do que existe também o abuso do poder transmitido pela mis são são, onde par a um a palavra m eram ente privada se se abusa da dis dis pos po s içã iç ã o e co c o nfia nf ianç nçaa p a r a o u v i r q u e a i n d a h o je é de d e d ic a d a à p ala vra da Igreja. A autoridade eclesiástica serve ao abuso do poder quan qu ando do o concede tranqü ilamente, ilamente , com isso disponibiliza disponibilizando ndo um a autoridade de que ela não dispõe. O cuidado com a fé dos pe queninos tem que ser para ela mais importante do que o medo da contradição dos grandes. Quero parar por aqui, porque as perguntas sobre como ga rantir na prática os diferentes bens de direito levam a questões de aplicação que não podem ser discutidas neste contexto. Mas quando todos se deixarem conduzir pela consciência, e quando os comportamentos estiverem basicamente orientados pela con versão ao Senhor, as dificuldades deixarão de existir, embora os conflito conflitoss jamais jamais desap de sap areçam are çam de todo. A relação en tre teologia e Igreja será tanto melhor quanto mais de um e de outro lado o pe p e n s a r e o a g i r t i v e r e m c o m o p o n t o d e p a r t i d a a u n i ã o c o m o Senh or; q uanto mais mais cada um p u d er di dize zer, r, como Paulo: Paulo: eu, mas não mais eu...
5. Tentação e grandeza da teologia Permitam-me concluir esta estass considera considerações ções com com u m a pe qu e na experiência pessoal, onde as questões com que estamos nos ocupando passaram a ter para mim uma forma concreta. Por ocasião de uma palestra que fiz no sul da Itália, tive ocasião de visitar a esplêndida catedral românica da cidadezinha de Tróia, na Apúl Apúlia ia.. () que nela cham ou m inha atenção fo foi sobretudo um enigmático relevo no púlpito, datado do ano de 1158. Já antes um amigo me havia havia desperta do a atenção pa ra ess esse relev relevo, o, p o r que a seu ver encontrava-se ali uma apresentação alegórica da teologia, com o significado de uma verdadeira laus theologiae um verdadeiro louvor da teologia na Igreja e para a Igreja. O relevo apres enta três animais, animais, po r cuja atitude o artista deseja desejava va claramente representar a situação da Igreja de seu tempo. Em baix ba ixoo p o d iaia - s e v e r u m c o r d e i r o , s o b r e o q u a l u m e n o r m e leão le ão se havia havia precipitado com gra nde avid avidez ez,, já o m anten do preso com com suas suas poderosas garras e dentes. dentes. O corpo do co rdeirinho já está está
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cm parle dilacerado. Podem-se ver os ossos e perceber-se que algumas partes já foram devoradas. Só o olhar infinitam ente trist tristee do animal gara nte ao espectador que o semidilace semidilacerado rado cordeiro aind a co ntinua ntin ua viv vivoo. Frente à fraqueza do co rdeiro, o leão leão é ex pre p ress s ã o d e u m a forç fo rçaa b r u t a l , à q u a l o c o r d e i r o n ã o t e m o u t r a coisa a opor a não ser o seu medo e seu desamparo. Está claro que o cordeiro rep res enta en ta a Igreja, Igreja, ou melhor, melhor, a fé da Igre ja e na Igreja. Igreja. N a escultura, po rtan to, trata-se trata-se de um a espéci espéciee de “rela “rela to sobre a situação da fé”, relato este que nos pa rece ao ex trem o pess pe ssim imis ista ta:: a v e r d a d e i r a I g r e j a , a I g r e j a d a fé, p a r e c e já e s tar ta r meio dev orad a pelo leão leão do po der, em cuja cujass garras ela se enc on on tra. tra. Nada Nad a mais ela ela po de fazer fazer a não ser agu ard ar trist tristee e indefes indefesaa pe p e lo d e s t i n o fina fi nal.l. Mas a e s c u l t u r a , q u e d e s c r e v e c o m t o d o r e a lismo lismo a falta falta de perspectivas d a situação situação da Igreja, Igre ja, expre ex pressa ssa tam t am bé b é m a e s p e r a n ç a e con co n s ciên ci êncc ia d e q u e a fé n ã o se d e i x a venc ve ncer er.. Esta Esta esperança revela revela-s -see de u ma forma surp reen den te: sobre sobre o leão precipita-se um terceiro animal, um pequeno cão de cor bra b rann c a . Suas Su as forç fo rças as p a r e c e m i n t e i r a m e n t e d e s p r o p o r c i o n a d a s qu an do com para das com as do leão leão,, mas mesmo assim assim ele ele ataca ataca o m onstro com seus dentes e garras. Talve Talvezz venh a a ser ser ele ele pró pr p r i o v ítim ít imaa d o leão le ão,, m as sua su a i n t e r v e n ç ã o h á d e f o r ç a r a fer fe r a a soltar o cordeiro. cordeiro . O significado do cordeiro é bastante claro, mas o do leão e do cãozinho branc o co ntinu a em aberto. Não tive tive ocasiã ocasiãoo ainda de consultar nen hu m a obra de história história da arte; arte; também não se sei em que fontes meu amigo foi buscar sua interpretação para o quadro qu adro , e po r iss isso vejo-me vejo-me forçado forçado a também deix ar em aberto a questão da reta interp retação históri histórica ca.. C omo a obra prov ém da era dos H ohen staufen , poder-se-ia poder-se-ia pen sar em ver aí aí, de alguma forma, a luta entre o poder imperial e a Igreja. Mas talvez seja mais mais correto en ten de r o conjunto da linguagem simb simból ólic icaa a p ar tir da iconografia cristã28. Nesta o leão pode representar o de mônio, ou - mais mais concretamen te - a heresia, heresia, que dilacera dilacera e con some a carne da Igreja. O cão cão branco bran co simboliz simbolizaa a fidelidade; é o cão do pastor, representando o próprio pastor: “O bom pastor 28. Cf. J. Seibert. Lexikon christlicher Kunst. Freiburg, 1980 [artigos “Hund” (p. 149) e “Lõwe” (p. 20'7s).
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d á a vida po r suas suas ovelhas” ovelha s” (Jo (Jo 10,1 10,11) 1).. Fica Fica a perg un ta: O n de se enc on tra a teologi teologia, a, nesta dram ática di spu ta en tre os três três seres seres?? Na N a o p i n i ã o d o m e u a m i g o , o p e q u e n o e v a l e n t e cão cã o q u e salv sa lvaa a fé do ataque do leão é uma imagem da sagrada ciência. Mas qu anto mais mais eu eu refl reflit ito, o, tanto mais ais me convenço convenço que a escu ltu rase nos for líc lícit itoo interp retá-la retá -la nesta linha - deixa a questão em aberto. O quadro não é simplesmente um elogio da teologia, mas mas sim sim um apelo, apelo, um exam e de cons consci ciên ênci cia, a, um a pe rgu nta a ber be r ta. ta. Só o signif significa icado do do c ordeiro orde iro q ue é apres ap resen entad tad o descreve com com clarez clareza. a. Mas os os dois dois out ros animais - o leão e o cão cão - não p o d e riam eles eles repr re pr esen es en tar ta r as duas possibilidade possibilidadess da teolog teologia, ia, seus dois dois caminhos opostos? O leão: não representaria ele a tentação his tórica da teologia de fazer-se dona da fé? Não encarnaria ele aquela violentia rationis - aquela razão convencida e violen violenta, ta, da qual um século mais tarde Boaventura haveria de falar como u m a form a errô err ô n ea do p ensam en sam ento en to teológico?2 teológico?299 E o bravo cão: cão: ele ele repre senta ria en tão o caminho oposto, u m a teologia teologia cons consci ci ente en te de d e estar esta r a serviço serviço da fé, fé, e que p o r isso isso aceita fazer-s fazer-see ridí ri dícu cu la tentando manter dentro dos limites os excessos e o absolutismo da mera razão. Mas se for este o verdadeiro sentido, que mensagem não traz o alto-relevo no púlpito de Tróia para os pr p r e g a d o r e s e teó t eóll o g o s d e t o d o s os te t e m p o s ! Pois Poi s ele e le colo co loca ca o es espe lho diante daq uele q ue fala fala e diante daq uele uel e que escuta escuta.. Signif Signifi i ca um exame de consciência para os pastores e para os teólogos. Pois uns e outros tanto podem ser devoradores quanto proteto res. res. E ass assim im esta imagem imag em nos atinge a todos todos como u m question que stion a mento pe rm ane nte 39.
29. Boaventura, Sent. Prooem. q 2 ad 6. 30. Partindo de um a analogia seme lhante , a ligação entre teolo gia e Igreja foi inteli be stia e il i l cavalie.re - Saggio di gentemente apresentada por G. Biffi. 1a he.Ha, Ia bestia di teolo gia inattuale. Milão, 1984.
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O PL PLUR URAL ALIS ISMO MO COMO QUESTIONA MEN TO À I g r e ja e à t e o l o g ia
/ . Os limites impostos às exigências da Igreja e o pluralis mo das decisões humanas A palavra pluralismo foi criada na Inglaterra por volta da virada do sécu século lo 20 20 - sobretu do por H. Laski Laski - para a área polí tico tico-so -soci cial1 al1.. O punh pu nha-s a-see a um a do ut utrin rin a de soberania em q ue ao Estado e às suas exigências contrapunham-se unicamente os in divíduos. Diante desta exigência puramente estatal, o pluralis mo afirma que cada indivíduo está inserido em uma variedade de grupos sociais, de onde resulta também uma variedade de pa p a p é i s , n e n h u m d o s qua qu a is esgo es gota ta o se s e r h u m a n o p o r c o m p l e to. to . O Estado, nessa visão, é apenas um grupo entre outros. Não pode exercer nenhuma autoridade última sobre o Homem, ele ape nas pode exigi-la em um determinado papel social, lado a lado com outros papéis sociais. O entrelaçamento dos papéis sociais concorrentes é en tendid o, assi assim, m, como como u m a forma de liberdade. O Homem sempre é mais do que qualquer papel; e nenhum pa p a p e l p o d e m o n o p o liz li z á - lo. lo . A mu m u l t i p l i c i d a d e dos do s tit ti t u l a r e s d a o r dem que contribuem para configurar a vida social passa a ser uma garantia contra a concentração do poder, devendo dessa forma g arantir espaço espaço para o que a perso nalidade possu possuii de p ró pr p r io. io . Esta Es tass idéi id éias as,, q u e e s tav ta v am e m m a n i f e s t a opos op osiç ição ão à idé id é i a iluminista do Estado, resultaram das pesquisas sobre o sistema com unitário da I da de Média, Média, e sob sob esse esse aspecto ela elass se se enco ntr a vam inteiramente na linha das tradições sociais e políticas do cristianismo. Aliás, a doutrina social católica havia desenvolvido argumentos semelhantes a partir do século 19. A restrição da auto ridad e do Estado Estado ao terre no qu e lhe compete, ass assim im como como a ênfase conferida às unidades sociais no âmbito pré-estatal, per I K Z C ovim ov imun un io , 12, 1983, p. 97-100. • 1. Cf. P. Henrici. Kirche und Pluralismus. In: IK Chr. Grafv. Krockow. Pluralismus. In: RGG V 42 ls (Lit.).
Natureza c missão da teologia
lence ao número das constantes mais antigas do esforço cris tão por uma reta forma do sistema social2. Nã N ã o o b s t a n t e , a p a r t i r d e s u a lógi ló gica ca i n t e r n a , u m d i a as idéi id éias as de Laski e de outros pensadores teriam necessariamente que transformar-se em uma pe rgu nta dirigida à Igrej Igreja: a: Se todo todo cor po p o social soci al é a p e n a s rela re latitivo vo,, se n e n h u m del de l es p o d e e x i g i r o b e d i ência a não ser dentro de sua esfera e do papel social a ela asso ciado, não deverá isto valer também para a Igreja? Não deve também ela ser vista como uma associação entre outras, com as limita limitaçõ ções es autoritárias que d aí resultam? Não dev erá a consciên cia, ia, como o valor valor mais mais autêntico e mais mais pro fund fu nd o d e tod a perso p erso nalidade, como o mais intocável dos elementos, situar-se tam bé b é m p a r a a I g r e j a aci ac i m a d e t o d o e q u a l q u e r p a p e l social? soci al? N ão deveria a Igreja retrair-se pa ra o campo de seus seus interesses interesses e ne cessidades, cessidades, pa ra a ord enaçã en açãoo das necessidades religiosas religiosas?? É ver dade que surge aqui aqui também a perg un ta inver inversa sa.. Q ue q ue r dizer dizer necessidade religiosa, que quer dizer interesse religioso? Será uma necessidade ao lado das outras, e simultaneamente com as outras, u m a necessidade limitada, assim assim como como a necessidade de alimento, de veste, de lazer, de realização profissional etc.? Ou não seria talv talvez ez ju justa sta m ente en te a necessidade religios religiosaa a expressão expres são da verdad ver dad eira e última últim a ligaç ligação ão do H om em , aquela onde on de total total e intei intei ramente trata-se dele mesmo? E também a comunidade voltada pa p a r a esta es ta ú l t i m a nec n eces esss idad id ade, e, e m q u e está es tá em e m j o g o a pr pr ó p ria iden tidade do Homem, não seria ela necessariamente o verdadeiro lugar lug ar da identificação do Home Ho mem, m, que se coloca coloca acima de todos tod os os os demais demais papéi papéis? s? Em que o utro lug ar e de que outra maneira mane ira deve ria o Hom em superá-la, superá-la, e em algum lugar e algum algum m om ento ser ele mesm o em todos os seus seus papéis? Não deveria, pois, pois, a com co m uni un i dade dad e voltada voltada pa ra este este fim fim ser necessariamente necessariamente de uma um a natureza natu reza inteiramente diversa de todas as demais comunidades? De in iníc ício io os os question amentos amen tos prov enien tes da linh a de Laski aski não encontraram muitos adeptos na Europa Central, porque, no intervalo entre as duas guerras mundiais, predominou aqui um novo retorno à idéia da autoridade. Nos anos 1920, Carl 2. Cf. J. Hõffner. Christliche Gesellschaftslehre. Kòln, 1975. • Cl. Ruhnau. Der D er Kathülizisrnus in der sozialen Bewãhmng. Paclerborn, 1980. Para as raízes históricas, a deutsche Geno Genosse ssensc nscliaf liaftsre tsrecht. cht. 4 vols. Berlim, 1868-1913. obra clássica de O. v. Gierke. Das deutsche
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Schmitt, o fundador da teologia política, criticou as idéias do pl p l u ral ra l i s m o co c o m o d e s a g r e g a ç ã o , nisso nis so e n c o n t r a n d o a m p l o a p o i o :i. Só depois do tremendo abuso de autoridade no autoritarismo dos sist sistema emass totalitári totalitários os fo foi que tam bém surgiu, na Eu rop a C en tral, tral, um a situaçã situaçãoo nova. A imagem imag em da sociedade passou a corre s po p o n d e r a g o r a a o m o d e l o d o p l u r a l i s m o . Do p o n t o d e vist vi staa ju ju r í dico e social, as igrejas passaram a ser vistas como uma espécie de associação; foi com esta forma social que elas conseguiram afirmar seu espaço e autonomia em relação ao Estado. Não de veriam ela elas, s, então, comp ortar-se de fato fato,, tamb ém inte i nterna rnam m ente, en te, como associações? Será que neste desenvolvimento social a exi gência gência de obediência obediência das igrej igrejas as pod eria ir alem, alem, p or exem plo, da de um sindicato? sindicato? Podia a Igreja, com seus imperativo impe rativoss morais ao legislador, exigir maior atenção do que outros grupos de in teress teresse? e? Mas Mas que m par p arte te de d e tais tais parâm par âm etro s, e a pa rtir deles p re tende fun dam entar po r exemplo a liberdade de ens ensino ino da Ig re ja, s e r á f o r ç a d o a o u v i r q u e , n o t o c a n t e a suas su as posi po siçõ ções es i n t e r n a s , ne nh um partido e ne nh um grupo de inte intere ress sses es pode tolerar se se melha nte pluralismo pluralismo de opiniões opiniões como ele ele imagina atualm ente na Igreja, porque com isso toda defesa de interesses comuns se torna to rna ria ilusóri ilusória. a. Antes de levar adiante essas idéias, precisamos considerar ou tro desenvolvimento desenvolvimento que veio veio entr em ente s a manifest manifestar-s ar-see na sociedade e na Igreja4. Pois, simultaneamente com a busca do pl p l u r a l i s m o , o c o r r e n o m u n d o m o d e r n o u m m o v i m e n t o s e m p r e mais intenso em direção à uniformidade. Surgem vínculos eco nômicos e políti políticos cos cada vez vez mais mais fortes, fortes, com as corre co rrespo spo nden nd entes tes concentrações de poder. Através dos meios de comunicação de massa massa se se pro du z u m a uniformização das idéi idéias, as, do discurso e do com co m portam po rtam ento, en to, que a ntes nã o seria seria imaginável. imaginável. Esta Esta esta estancl nclarardização do Homem, que o marca de fora para dentro, atingin do até o inconsciente, inconsciente, é um dos efei efeito toss da comu nicação an terio te rio r me nte pr oc ura da na configuraçã configuraçãoo técni técnica ca do mu ndo , a qual qual por sua vez vez base baseiaia-se se na decodificaç decodificação ão m atemática da naturez a. En 3. C. Schmitt. Staatsethik und pluralistischer Staat. Kantstudien , 35, 1930, p. 28-42. In tern rnat atio iona nale le 4. No que segue eu retomo idéias que desenvolvi pela primeira vez em Inte Theologenkommission - Die Einheit des Glaubens und der theologische Pluralismus. Einsiedeln, 1973, p. 11-16.
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quanto as grandes filosofias sempre conservaram entre si um certo particularism pa rticularism o, a ciênc ciência ia matem ma temática ática da natu na turez rez a e as disci disci plin pl inas as técn té cnic icas as q u a s e q u e n ã o a p r e s e n t a m p e c u l i a r i d a d e s c u l t u rais rais.. Tal Tal unif orm ida de, de , no entan en tanto, to, só é possív possível el po rq ue a civ civil ili i zação técnica se restringe a um setor bem determinado do co nhecimento humano. Ela é essencialmente positivista. Quer di zer, abrange apenas o setor da realidade que pode ser submeti do ao método positivo, ou seja, à possibilidade da falsificação. Todos nós sabemos q uanto ua nto é poss possív ível el se se consegu con segu ir com isto; isto; ex pe p e r i m e n t a m o s d i a r i a m e n t e e vive vi vemo moss a m p l a m e n t e e m noss no ssos os hábitos do dia-a -dia o que assim assim se se consegue. Mas Mas o preço a p a gar por isso nós o percebemos com uma clareza cada vez maior no ocult ocultoo ressentimento do ser ser hum ano , ou mesmo da terra em que vivemos e do ar que respiramos. Quando falo do preço a pa p a g ar, ar , e s t o u p e n s a n d o n ã o p r o p r i a m e n t e n o fato fa to d e t o d o s os efeitos possuírem verso e anverso, mas sim no que está em jogo de mais profundo: o permanecermos restritos ao que pode ser constatado e ao que n a repetição pod e ser fal falsi sifi fica cado do pressupõ e que se renuncie às legítimas decisões de valor, ou mesmo à per gunta gu nta pela verd ade. ad e. Não digo qu e isto isto impeça ambas amb as as cois coisas as de estarem em seu lugar próp rio, apen as as as duas não pode m acon tecer ao ao seu seu ritmo próprio pró prio.. Mas como é est estaa a m archa arc ha na estrada do sucesso, fica sugerida a enganosa conclusão de que só dessa maneira a consciência seria razoável, e que sé) o que dessa forma é razoável razoável é que qu e tem te m dire ito de existi existir. r. Não é o m éto do como co mo tal, tal, mas sim sim o êxito que ele consegue, consegue, q ue am eaça levar o Hom em à destruição. A partir daqui se explica, primeiramente, que a uni ficação da civilização técnica tenha levado à fragmentação da consciência filosófica e à dissolução do seu verdadeiro teor, isto é, a questão da verdad ver dade. e. São duas as saídas saídas que existem , mas que na verdade se reduzem a uma: a filosofia pode tentar ser ela pr p r ó p r i a i n t e i r a m e n t e “po “p o siti si tivv a ”; m as c o m isto is to ela el a se e x t i n g u e como filoso filosofi fia, a, e a questão da ve rda de, de , que um dia fo foi resp onsá on sá vel pelo surgim ento da u niversidad e, passa a ser relegada como não-científica. Mas como não se pode por muito tempo viver exclusivamente do positivismo, é oferecida uma saída diferente: a verdade não é a medida do Homem, é o seu produto. Ela é substituída pela comprovação, pelo resultado. Agora a verdade 66
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tam bém pod e ser pr od uz ida “cientificamente”; “cientificamente”; ela ela está está na prá ti ca que p rod uz o futuro. Q uan do o méto do é desenvol desenvolvido vido como forma de configurar o futuro, a verdade passa a ser método. A situação situação que daí resulta pa ra o cris cristão tão individual fo foi descrita por Albert Gõrres com estas palavras: “Eu escolho o coquetel de pl p l a u s i b i l i d a d e s q u e mais ma is m e a g r a d a . Os cris cr istã tãos os q u e e stã st ã o f irm ir m e s em sua fé muitas vezes vezes são são po r eles eles pr óprio óp rio s e pelos outro s visto vistoss como m egalomaníacos egalomaníacos ou arr ogantes, ví víti tima mass de um complexo de infalibilidade”5. Num pluralismo assim entendido, o magis tério tério transforma-se em p ur o absurdo, em presunção. A meu ver, a violência violência com qu e hoje ho je se combate comb ate toda to da espécie de inter venção venç ão magisterial escora-se muito neste estado de consciência. Poder declarar a verdade como uma grandeza comum, e por conse guinte também vinculante, aparece como uma arrogância “me dieval” absurda. Mas talvez também estejam em jogo camadas mais mais pro fun das da s da alma: A suspeita de que q ue talve talvezz a verd ade pos sa existir como grandeza conhecível, e por conseguinte como uma exigência feita a mim, atua como ofensa, ou mesmo co mo um perigoso ataque à forma de vida com que nos envol vemos; vemos; contra iss issoo é necessário necessário defen de fender der-no -noss apaix ona dam ente , com a paixão que manifestamos quando nós mesmos nos senti mos atingidos no mais profundo da existência. Mas Mas com com o que ficou ficou dito dito não está completo com pleto aind a o pan p an or a ma dos problemas. Pois acabamos de falar apenas de uma crise da filo filoso sofi fia, a, que é tam bém um a crise crise da universid ade, e p o r con co n seguinte uma crise da civilização atual, porque se ocupa com a questão da verdade e com a questão da existência do Homem. Mas como fica fica a situação da teologi teologia? a? Um característico característico e ins us pe p e i to lam la m p e j o s o b r e este es te p r o b l e m a eu e n c o n t r e i nos no s a p o n t a m e n toss autobiográficos de Roma to Ro mano no Guardi Gu ardini. ni. El Elee descreve sua difí difíccil caminhada para o doutorado e o magistério acadêmico, que se tor no u tão di difíc fícil pa ra ele porq ue na Alem anh a a teologia teologia se ha via submetido inteiramente ao cânone metódico da universida de, onde só história e ciência natural eram consideradas como ciências. Assim a teologia científica ficou reduzida a uma teolo giaa histó gi histórica rica,, mas G uar din i não queria que ria ser historiador, ele ele queria I K Z , 12, 1983, p. 1175. A. Gõrres. Glaubensgewissheit in einer pluralistischen. In: IK 132, citação 119.
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apenas teólogo e filósofo, isto é , não queria mostrar como isto isto ou aquilo tinh t inh a ocorrido, oco rrido, mas sim sim o que n o antigo e no atual é verdadeiro, e que por isso nos interessa. Com esse empenho, no entanto, ele ele não encontro u espaço espaço para o dou tora do em teo logia. Como tinha conscientemente o desejo de mesmo assim realizar algu m a coisa coisa que qu e foss fossee dig na da vida univ ersitária, disse disse que trabalhava trabalhava po r u m a universidade futura, que ainda não exis exis tia6. Enquanto consigo ver, mesmo hoje esta universidade não existe ainda, mas precisaria existir, e devemos continuar lutan do para pa ra que ela ela ven ha a exi exist stir ir.. Comp Co mp arada , no e ntanto, com a teolo teologia gia dos anos anos 1920 1920,, qu an an do Guardini viu-se obrigado a procurar seu caminho, ocorreu um a m ud anç a imp ortante. A teol teologi ogiaa históri histórica ca é impo rtante; eu mesmo trabalhei trabalhei apa ixon adam ente com a hist históri ória, a, e teria teria dispo sição sição para pa ra volta vo ltarr a fazêfazê-lo. lo. Mas Mas é óbvio óbvio que qu e ela não esgota esgo ta o todo da teologia. A reorientação da idéia da verdade para a prática, oco rrida a partir da Esco Escola la de F rank furt e de todo o mov imento neomarxista, que questio nou radicalm ente o antigo antigo positi positivis vismo mo universitário, universitário, manifestou-se assi assim m como um a ines perad pe radaa chance pa p a r a q u e a t eol eo l o g i a r e a d q u i r i s s e u m a n o v a posi po siçã çãoo n a u n i v e r s i dade e uma nova importância social. Agora não se trata mais de isolar isolar a verd ade, ade , mas sim sim de construí-la por m eio da práxis m e tódic tó dica. a. Dentro D entro da est rutur ru turaa global global da teolog teologia, ia, agora é a chama cha ma da Teologia Teologia Prática Prática que oferece o verdad ver dad eiro ponto po nto d e partida pa rtida e de cheg ada p ara ar a o todo. loclo o conjun to das discipl disciplina inass teológi teológi cas podia, a partir daí, ser entendido como parte de um empe nho po r um futuro mais mais hu m an o, com base base nas recordações recordações da história da fé fé. De re pe n te a teologia teologia pô de voltar agora a ser “ci “ci entífica”, entífica”, e isto isto no sentido s entido mais atual e tam bém concreto conc reto d a pala vra. vra. E a pa rtir daqui pode-se pode-se co m pre en de r também o incom pre ensível, que de repente os teólogos e suas comunidades passa ram a ser os mais mais efi efica caze zess portad po rtadore oress do movimento mov imento neomarxista. PodePode-se se com pr een de r também que a paixão paixão pelo pelo caráter cientí cientí fic fico da análise análise marxista t enha en ha passado passa do a ser ser exigida, torn t orn and o-se o-s e cons co nseq eqüe üent ntem emen ente te indispensável. indispensáv el. Pois, ois, se não fosse fosse cientí científic fica, a, toda tod a esta esta oferta ruiria sobre si si mesma. Há um curioso curioso pa radox rad ox o que s
Ber ichte über übe r mein me in Leben Leb en - Autobiographische 6. R. Guardini. Berichte Autobiographische Schriften Schriften - Aus dem Nachlass hg. von F. Henrich. Düsseldorf, 1984, p. 46.
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po p o d e s e r c o n s t a t a d o aqu aq u i : foi só o m a r x i s m o q u e c o n s e g u i u reerguer a teologia de sua enfermidade e restituir-lhe a autoconsciência científica. E só a paixão e esperança religiosa pude ram trazer no vam ente pa ra o marxismo, cien científ tífic icaa e politicamente politicamente desgastado fora do seu espaço próprio, o brilho de uma espe rança da humanidade. Mas quando um cego conduz um cego, ambos caem no precipício7. Aqui mais uma vez nós nos confrontamos com o problema do pluralismo. Em últim a anális análise, e, o conceito de teologia em que a práxis práxis passou passou a oc up ar o lugar da verda de não prevê p luralis mo nen hu m , tamp ouco qu anto conta conta com com plurali pluralismo smo a concep ção ção marxist marxista. a. Por is isso recentem ente u m con hecido exp oen te da Teologia Teologia da Libertaçã Libertaçãoo completava as as funções funções d a un ida de m en cionadas cion adas n a Epístola aos Efé Efési sios os.. A epístola, par p ar a definir defi nir os p o n tos em que se baseia a unidade cristã, diz: Um senhor, uma fé, um batismo, um Deus e pai de todos. Aquele teólogo acrescen tou, uma um a opção, com o que, evidentemente, ele se refere a uma opção política, sendo esta na prática a verdadeira unidade. O pl p l u r a l i s m o só e n t r a e m c o n s i d e r a ç ã o a q u i c o m o u m est es t ági ág i o i n termediário. termediário. Enq uanto a teo teolo logi giaa da Igreja, Igreja, determ inad a a par tir da profissão de fé, estiver em vigor, para a teologia orientada pe p e l a “pr “p r á x i s ” p r e c i s a s e r c r i a d o u m e s p a ç o p e lo p o s t u l a d o d o pl p l u r a l i s m o . A re r e n ú n cia à verd ad e n ão p o d e lib ertar p e r m a n e n temente; no fim ela uniformiza. Em lugar do mau espírito de uma estreita ortodoxia escolar, que foi expulso, voltam no fim sete espíritos piores do que ele. Aos poucos delineia-se com isto algo assim como um primei ro result re sultado ado concreto con creto de nossas considerações. consideraçõ es. Desde o iníci inícioo fo foi constitut constitutivo ivo para a fé fé cristã cristã que ela pr ete nd e o rien tar o Ho m em em seu compromisso mais pro fund o, o compromisso com a ver dade. Nisto o compromisso proveniente da fé distingue-se do que se origina de todas as outras associações. Mas precisamente 7. Redigido em 1985, este texto íicou apenas externamente superado com a queda dos sistemas marxistas, marxistas, ocorrida mais tarde. tarde. A convicção básica básica do p rim ado da práxis e da possibilidade de se criar uma sociedade melhor não íicou abalada com isso, apesar de seu instrumental conceituai ter ficado um tanto confuso. Entrementes se perceb e com clareza clareza a difusão da idéia de que a partir daqui tamb ém se p od e chegar à conciliaç conciliação ão das religiões, religiões, que deveriam convergir no comp romisso por um futuro melhor para o mundo.
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po p o r q u e a fé a t i n g e o H o m e m n e s t e c o m p r o m i s s o , ela el a é a b e r t u r a pa p a r a os se s e t o r e s d a e x i s tên tê n c ia q u e se e n c o n t r a m mais ma is n o p r i m e i r o pla p lann o . E nis n istt o q u e cons co nsis iste te a liga li gaçã çãoo com co m o m o d e l o d e Lask La ski:i: a fé orienta o Homem mais profundamente do que qualquer outra coisa coisa,, mas m as ela não nã o lhe prescrev pres crevee seus vários papéis pa péis soci sociai ais. s. A Igreja, po p o r isso, n ã o é n e n h u m e s t a d o , e o cris cr istã tãoo p o d e v iver iv er e m d i fe fe rentes rent es form as de d e estado e em difere ntes associaç associações ões.. Não N ão signifi signifi ca isto nenhuma falta de compromisso, nenhum recuo para a mera interioridade, nenhuma renúncia à responsabilidade do cristão. A fé, certamente, é uma “opção”, que no decálogo neo testam entário entá rio possui con torno s m uito cla claro ros. s. E um a opção a favor de iguais direitos p ara ar a todos tod os os hom ens, e com isso isso a favor da intocabilidade do direito por parte do poder. E a opção pela validade incondicional da verdade e da ligação do Homem com a verdade. E opção pela fidelidade matrimonial e pela família como fo rma básica básica da sociedade. sociedade. E opção p ela intocabilidade da vida humana e pelo direito à vida. Assim ela foi desde o início opção pelos pelos injustiçados injustiçados e oprim idos, ou , como enco ntra mo s na Bíbl Bíblia ia,, pelas viúvas viúvas,, órfãos e estrang eiros. Neste sentido sen tido ela con tém claros claros imperativ imp erativos os políticos políticos e soc socia iais is,, que qu e s em pre pr e levarão os cristã cristãos os e a Igreja a en trarem tra rem em confli conflito to com com os pode po deres res d om i nantes. Mas nem por isso é uma receita política, e a Igreja não po p o d e p o r isso t r a n s f o r m a r - s e e m p a r t i d o polí po lítitico co.. C o m o t e m q u e contestar desde a base a exigência totalitária do político, ela se opõ e tam bém a toda análise análise que a considere como o único cami nho possível, e também como o caminho seguro para produzir um a sociedade sadia. sadia. Este Este prete nso ns o caráter c aráter cientí científi fico co só só po de ser antic anticie ient ntíf ífic ico, o, po rqu e p ressup õe u m a fís física do H om em que não existe. Se existisse, o Homem já não seria mais Homem, seria uma máquina. No confronto de Igreja, política e sociedade, o pl p l u r a l i s m o é c o n s titu ti tutt ivo iv o p a r a o cri cr i stia st iann ism is m o . El Elee p r o c e d e d a abordagem cristã que prega a relatividade de todas as reali zações políticas e sociais quando transferem para o aquém a teocracia, o total domínio do Reino de Deus. Por isso a Igreja não pode deixar de olhar com ceticismo todas as monoculturas polí po lítitica cass e sociai so ciais. s. A lib li b e r d a d e p a r a as vári vá rias as o p ç õ e s polí po lítitica cass es e s tá 110 interesse da própria fé, assim como surgem de sua própria natureza, po r exem plo, a distinção distinção entre Estado e Igreja, Igreja, a liber /
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dad e pa ra a formação de comun idades d en tro do Eslado Eslado,, e com com ela a liberdade de fé. Apesar disso, podem naturalmente existir situações que tornam necessária a unidade de ação política dos crist cristãos ãos,, po r exem ex em plo qu an do estão estão em jog o uma ou várias várias das das opções bás básic icas as menciona men cionadas. das. Mas estas estas unid ades ad es de d e ação são são tem po p o r á r i a s , elas el as n ã o c o n f e r e m à re r e spe sp e c tiv ti v a asso as soci ciaç ação ão u m m a n d a t o geral e perm an en te da Igreja; Igreja; além além disso disso sua forma forma no do mínio polí po lítitico co p r e c isa is a ser se r e n c o n t r a d a , e n ã o p o d e ser se r o r d e n a d a p e l a Igreja, Igre ja, nem pela pela hierarquia, nem po r outra base base qualquer. qualq uer. Minha tese seria, pois, a seguinte: Como a fé significa um compromisso último com Deus, com a verdade, ela de fato for nece ao Homem normas para sua ação social concreta, mas o po p o n t o d e u n i ã o d a c o m u n i d a d e d o s c r e n t e s n ã o está es tá n a p r á t i c a social ou política, e sim unicamente no compromisso propria mente dito da verdade. Quando esse compromisso é desfeito, surgem em lugar dele novos laços. “A verdade liberta”. O com pr p r o m i s s o c o m a v e r d a d e e qüiv qü ivaa le a l i b e r t a r a polí po lítitica ca d o s c o m pro p rom m i sso ss o s c o m o s a g r a d o . N e ste st e s e n t i d o o p l u r a l i s m o n ã o a p e nas pode estar ligado com a fé, mas lhe é adequado, e em certa medid me didaa necessá necessário rio..
2. Pluralismo no interior da Igreja Tudo quanto foi dito até aqui serviu apenas para tratar das relaçõe relaçõess externas exte rnas da Igreja, que na verda de, com a pragmatização pragmatiz ação da fé, passaram a ser sempre mais seu setor interno, ou mesmo que ameaçam reprimi-lo. Surge agora a pergunta: Qual é mes mo a sit situaç uação ão neste neste setor interno? interno? Im pe ra aqui o pu ro monismo do dogma, do magistério, ou existirá aqui também um espaço em que a variedade possa respirar? Depois de tudo quanto foi visto até agora, não podemos deixar de considerar errôneas as concepções que tratam a Igreja como se fosse um Estado, cujas exigências precisam precisam ser restringidas pelas pelas formas contrárias das associações e pelos direitos do indivíduo. Pois ao contrário do Estado, Estado, ao qual eu p erte nço sem ter sido sido consultado, e que neste sentido const constit itui ui um a corporação forçada, a Igreja Igreja é um a co m u nidade voluntária, com uma forma de conteúdo bem determi nada, sem a qual ela perde o sentido. Teremos que voltar no vamente a este ponto; por enquanto pressupomos que a Igreja
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poss po ssui ui u m c o n t e ú d o d e f i n i d o p e l a fé, e q u e p o r isso só p o d e abranger aqueles que podem e querem aceitar este conteúdo. Dess Dessaa forma forma perm anec e ainda a pergunta: de ntro dessa dessa dec decis isão ão bási bá sica ca,, e x iste is te a i n d a e spa sp a ç o p a r a se p e n sar sa r , se ag a g i r e se o r g a n i z a r ? Esta Esta questão já foi levantada na Igreja primitiva, primitiva, qu e d e fato não fala falava va de pluralism o, mas que p ara ar a ex pressar pre ssar sua idéia da sínte se entre unidade e diversidade em vigor no íntimo da comuni dade eclesiástica cunhou o conceito de “sinfonia”. Entre os Pa dres da Igreja, enquanto consigo ver, o conceito de sinfonia movimenta-se em quatro planos, descrevendo assim com muita am plitude a variada es trutu ra d a u nida de in intr traa-ec ecle lesi sial al:: 1) Ele serve para expressar a unidade do Antigo e do No vo Testamento Testam ento - a unidad unid adee de Lei e Evangelho, Evangelho, de profetas e apóstolos, apóstolos, mas tam ta m bém bé m a un idad id adee dos diferentes escrit escritos os neotestaneotestamentários mentári os entre ent re si, si,s. Trata-se aqui da forma form a básica básica da proclam pro clamação ação da verd ade na Igreja, que se base baseia ia em uma e stru tura muito cheia cheia de tensões. A verdade da fé vem ao nosso encontro não como monofonia, mas sim sim como sinfo sinfonia, nia, não como um som homófo no, mas sim sim polifô polifônic nico, o, construído tam bém po r muitos sons sons apa ren re n temente teme nte opostos no confron to de lei, lei, profetas profetas,, evangelhos e após tolos. A omissão de um dos elementos temáticos desta sinfonia simplifica a apresentação, mas é rejeitada como heresia, isto é, como escolha simplificadora, pelos Santos Padres, porque a ver dade se enco ntra apenas 110 todo e na tensão do todo. 2) A palavra pala vra sinfonia de signa sign a a uni da de dos cristãos cristãos en tre tr e si, si, a forma forma da u nid ad e da Igreja, que assi assim m també m não é simple simples s mente homofonia, mas reflete a estrutura da proclamação da verd ade, ade , sobre a qual rep ou sa a unid ade . Por is isso se diz diz que n e nh um fator empírico é suf sufici icient entee como razão razão da uni dade da de da Ig re ja j a , m as q u e e s t a sinf si nfon onii a, q u e é a Igr Ig r e j a , só p o d e s e r c o m p o s t a po p o r u m a r e a l i d a d e e x t r a m u n d a n a - o E s p í rit ri t o S a n t o 9 . 8. Cf. Ciem. Al. Strom. 6, 15 CCS 2, 495, p. 6 [Sinfonia cia Lei e dos profetas]. • Methodius Olym pus . De libero arbítrio 1 GCS (ed. Bonw etsch ), 146, p. p. 19 [Sinfonia de His tóriaa Ecle E clesiás siástica tica , 6, 31, 3 MG 20, p. 592 A [Sinfo profetas e apóstolos]. apóstolos]. • E usébio. Históri nia dos evan gelistas entre si]. si]. Ires adversas Arianos, Arian os, 3, 23 MG 26, p. 372 A [o Espírito Santo, 9. Cf. Atanásio. Orationes Ires fundam ento da un idade mútua entre os cris cristã tãos os:: da mesm a forma que o Pai Pai e o Fil Filho, ho, assim também nós nos tornamos um no único sentir e na sinfonia do Espírito Santo]. 72
Joseph Ratzinger
3) Mas a fé busca uma unidade ainda maior. Ela não quer apenas trazer soci social aliz izaç ação ão para um determ de term inado ina do g rupo, rupo , mas pr o duzir du zir tam bém a verd adeira ad eira socia sociali liza zaçã çãoo dos homens, que consis te na comunhão com o divino. Também a unidade dos homens com Deus, que realiza ao mesmo tempo a unidade entre si, a unidade com toda a criação, e assim a unidade entre criador e criação, criação, é de signa sig nada da como co mo sinfonia sinf onia110. 4) Também o pró pri o Ho m em é um ser plu ral11 ral11. O H om em não é composto ape nas de d e corp o e alma; ele ele semp re traz em seu pe p e i t o mais ma is d e d u a s a lma lm a s, e sof so f re c o m esta es ta divi di visã sãoo inte in terr ior io r . Ele pr p r o c u r a sua su a i d e n t i d a d e , b u s c a u m a iden id entitiff icaç ic ação ão,, q u e s e r i a a i n tegração das forças opostas do seu eu, e com isto a salvação. O ser um consi consigo go mesmo, que o H om em não po de alcançar alcançar por si si, mas mas apenas receb er de fora - daquele qu e lhe é mai maiss íntimo do que ele ele pró prio també m é designado como sinf sinfon onia ia,, que não extin gue a multiplici multiplicidade dade das dimensões dimensões da existê existênci nciaa hum an a, mas mas as as transforma de luta em u nidade. Um trata me nto p ro fun do desta questão, questão, que não se se restrinja restrinja a algum pragmatismo superficial, exigiria que estes diferentes pl p l a n o s foss fo ssem em a n a l isa is a d o s , e q u e a p a r t i r d e les le s foss fo ssem em e scla sc larr eci ec i dos os problemas práticos. Isto, entretanto, nos levaria muito além do tema que está sendo considerado aqui. Limito-me, por isso, a apresentar algumas pistas para dois problemas parciais, que o cupam hoje hoje o prim eiro plano das aten atençõe ções. s. Ao Ao nos nos oc up ar mos com eles, no entanto, não devemos perder de vista o con texto maior, que desejo lembrar pelo menos quando faço refe rência à visão que os Santos Padres têm de nossa questão. a) I g r e j a u n i v e r s a l e i g r e j a s p a r t i c u l a r e s
A partir do Concilio Vaticano II voltou-se a ter uma cons ciênci ciênciaa muito mu ito clara clara de q ue a Igreja não é como um Estado, com com 10. Esta idéia é desenvolvida, por exemplo, por Atanásio: EpisL de synodis Arimini et Seleuciae (48 MG 26, p. 780 A), em uma polêmica versão contra idéias arianizantes que tentam descrever a unidade trinitária com o modelo da “sinfonia”. Contra isto ele conclui que o específico da unidad e trinitá trinitária ria não é abrangido por este m odelo, pois também os santos e anjos estão em unidade “sinfônica” com Deus. 11. Cf. p. ex. Theodorus Heraclensis. Fragm. in Joa , 14, p. 27 (ed. J. Reuss, TU 89). Berlim, 1966. O motivo da sinfonia sinfonia da verdad e é retom ado em II.U. von Baltha Balthasar sar.. Die Wahr Wa hrhei heitt ist symphon symp honisch isch - Aspek te des christlichen Pluralismus. Pluralismus. Einsiede ln, 1972.
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ii m gove rno central, cen tral, onde on de todas as províncias não são são mais do que subdivisõe subdivisõess de um único organis org anismo mo administrativo. a dministrativo. A ecles eclesiol iologi ogiaa eucarí eucarísti stica, ca, que re to m ou à consci consciênci ênciaa cat catól ólic icaa a pa rtir da teolo gia ortodoxa, tornou claro que a Igreja não é constituída por um govern gov ernoo - nesse caso caso ela ela seria um a espécie de estado estad o ou de associ associ ação, ação, como co mo outro ou tross estados e assoc associaç iaçõe ões. s. El Elaa é constituída const ituída p o r Cristo, isto é, é formada a partir do sacramento, e por isso é ela própria sacramento. A Eucaristia, como presença e como sacramento de Cristo, constrói a Igreja. Por isso ela está em toda parte onde Ele está, isto é, onde a Eucaristia é retamente celebrada. Assim como Cristo Cristo não está está pre sente sen te pela metade, metad e, mas está está presen pre sente te p or intei ro, assim também a Igreja encontra-se por inteiro onde Ele se encontra. Por isso as igrejas locais são Igreja por inteiro, e não uma parcela retirada de um corpo maior. Mas com a descoberta de que Cristo só pode estar presente por inteiro não se pode es quecer o outro lado, que Ele também só pode ser um, e que por isso só só o podem os ter p o r inteiro q uand ua ndoo o temos com os outros, outros, qua ndo o temos temos na unidade . A uni dad e da Igreja universa universall é nes te sentido um fator interno da igreja local, assim como, inversa mente, a diversidade e a peculiaridade das igrejas locais fazem pa p a r t e d a essê es sênc ncia ia d a u n i d a d e d a I g reja re ja.. C o n s t itu it u c i o n a lme lm e n t e isto se expressa n a relação entre p rim ado ad o e episcopado. episcopado. Na reta convi convi vência de ambos, a sinfonia sinfonia da única ú nica Igreja está nas muitas igreja igrejas. s. Os contornos do problema são tão variados que não é possível desc descrev revêê-lo loss aqui, aqui, nem mesmo de forma apenas a proxima da. Por isso limito-me a duas observações a respeito deste tema12. a) O relacionamen to en tre episcopado e prim ado esconde esconde um princípio da constituição da Igreja ainda mais profundo: a pr p r e s e n ç a s i m u l t â n e a d e p r i n c í p i o p e s s o a l e p r i n c í p i o c o m u n i tário. Monocracia, domínio exclusivo de uma pessoa, sempre constitu constituii um perigo. Mesmo qu an do esta esta pessoa pessoa age com eleva eleva da responsabilidade moral, ela pode perder-se ou fixar-se em unilateralismos. Por is isso, de m an eir a geral a evolução constitu cional cional m od er na sem pre esteve esteve voltada voltada p ara os órgãos col coleg egia iais is e seu mútuo controle. Mas quanto mais experiências nós faze mos com tais estruturas constitucionais, tanto mais claros tor 12. 12. Cf. o docum ento sobre alguns aspectos da com preensão da Igreja Igreja como Communio , publicado em 1992. Ta m bém J. Ratzinger. 7u r Gerneimchaftge Gerneimchaftgerufen. rufen. Freiburg, 1991. 74
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nam-se os seus riscos e limites. A responsabilidade degenera em a non ima to. No fim fim ni ng ué m mais mais resp on de pelo pelo <| <|iie acon teceu, teceu, po rqu e qu em decidiu decidiu fo foi o gru po , e ningu ém se con side ra totalmente identificado com o grupo. O grupo nivela o alie na as decisões. As maiorias resultam do acaso, e não podem fun cion ar como fonte últim a do direito. Por isso a constitu irão da Igreja conhece um a interação interação entr e princípio comun itário e responsabilidade pessoal em todos os níveis, se bem que de qua lidade jur ídi ca mu ito d iferente. iferente. O páro co está está ligado ligado à sua sua comunidade; o bispo ao seu presbitério e aos outros bispos; o pa p a p a à c o m u n i d a d e d o s b isp is p os. os . Mas Ma s ao m e s m o t e m p o e x i s te uma responsabilidade pessoal última, intransferível e in substituí substituível, vel, que n ão se dilui dilui em n en h u m colet coletivo ivo - ao níve nívell da pa p a r ó q u i a , a o níve ní vell d o b i s p a d o , ao n ível ív el d a I g r e j a u n i v e r s a l . Se antes se gostava de considerar como estrutura constitucional da Ig reja o episco pado mo nárq uico , m elh or seria qu e se fala falass ssee disto como o princípio da resp onsa bilida de pessoal pessoal na Igreja. A Igreja concretiza-se e torna-se responsável nas pessoas. Estas não podem decidir arbitrariamente, mas devem fazê-lo a par tir ci cio seu comp rom isso de consciência com a fé de to da a I g re ja j a . A I g r e j a , c o m o c o m u n i d a d e b a s e a d a s o b r e a c o n s c i ê n c i a , po p o d e d a r - s e a o l u x o d e i n c l u i r a c o n s c i ê n c i a e m s u a c o n s t i t u i ção, e de sobre ela estabelecer o elo entre a comunidade e as pe p e s s o a s 13. O p r i m a d o d o p a p a d e i x a d e s e r rea re a l e c o n c r e t o se não existir existir algo algo corre sp on de nte nos níve níveis is que o antecede m - a responsab ilidade pessoal pessoal do bispo p ara concretizar sua liga ligaçã çãoo com o todo, que ele ele não p od e tran sferir pa ra u ma conferência, conferência, po p o r mais ma is i m p o r t a n t e q u e ela el a seja se ja.. E vi v i ce-v ce -ver ersa sa,, o p r i n c í p i o e p i s copal ca cai no vaz vazio io qu an do em seu significa significado do p ara a igreja p a r cial não existir existir algo algo cor resp on de nte ao níve nívell da Igreja u niv er sal. E precisamente este personalismo do direito e das respon sabilidades que produz um pluralismo vivo e colorido. O colé gio episcopal é um corpo composto por aqueles que assumem um a respon sabilidade p ró pr ia e última pela igreja igreja parcial parcial,, que 1?). Este assunto é tratado mais ampla me nte e m m eu artigo “Gewissen “Gewissen und Waln Waln h cii” [Consciência e verdad e]. In: M. Kessle Kessler, r, W. Pann enb erg e H.J. H.J. Poltmev er (cds.). (cds.). Fides quaerens intellectum - Beitriige zur Eun dam enta ltheolo gie Eeslschi Eeslschi ili íiir íiir Max Seckler zuni (35. Geburtstag, 1992, p. 293-309.
Na N a t u r e z a e m i s s ã o da t e o l o g i a
é da mesma Igreja por inteiro, e na qual eles põem em prática a respo nsab ilidade ilida de d a Ig reja universa l. Só assim assim o colégio colégio epis copal passa passa a ser um gr u po cheio de força e de vida, reflexo da multiplicidade do espírito na única Igreja. b) Mas exis ex iste te aí t a m b é m u m a s i n g u l a r opos op osiç ição ão d e m o v i m e n tos. Pois de início o papado aparece como penhor da unidade, como garan tia de que q ue toda tod a igreja igreja parcial parcial é também a Igreja única. única. Porém, Porém , do p on to de vista vista histórico, histórico, a coexistência de igrejas parci ais ais e Igreja universal univer sal em todas as dioceses dioceses comprovo comp rovou-se u-se precisa precisa mente me nte como a força força que movim enta e que impulsiona o pluralis pluralis mo. mo. Exemplo clás clássi sico co disto disto é a disputa das ordens orde ns m endicantes endic antes do século 13. O monaquismo tradicional, entrementes, havia-se inte grado tranqüilamente na ordem episcopal da Igreja, porque os diversos mosteiros restringiam-se basicamente ao seu território, não se envolvendo no verdadeiro trabalho apostólico da cura de almas almas.. Mas de repe re pe nte surgiram agora ago ra movimentos pastorais, pastorais, que a partir de u m a central atuavam atuavam dinam icamente sobre sobre todo o con tinente, tinente , e que com c om a pregação, prega ção, a confis confissão são e o culto divino concor conc or riam diretamente com a cura de almas normal. A luta do clero secular contra con tra as as ordens ord ens mendicante men dicantess nas universidades é apenas a parte part e mais mais vis visív íveel da disputa d isputa que qu e manifestou-se então, e qu e de de rest restoo é apenas apenas um a irrupção da ord em feudal feudal nas nas form formas as m ode r nas e mais flexíveis da vida econômica, e neste sentido um con fronto e ntre ntr e épocas histór histórica icass diferentes. diferentes. Nesta disputa nã o se pode po de sem mais nem menos dar razão às ordens mendicantes. Mas é certo que de nt ntro ro de um sistem sistemaa que estava estava se torn ando an do rígido ela elass criaram um novo dinamismo de anúncio do Evangelh Evangelho; o; que com elas elas a Igreja universal pô de tornar-se torna r-se perceptível como tal, tal, e atu at u ante nas diversas igrejas locais, que só com este instrumento a Igreja universal univ ersal pô de como tal fazer-se fazer-se concreta con creta e atuante atua nte,, e assim assim voltar a ser missionária. () pluralismo e dinamismo da atuação apostólica a partir de um movimento da Igreja universal, como segunda força ao lado da cura de almas nativa da igreja local, se comprov com provou ou como fecu nd o14 o14. Mas esta atividade da d a Igreja Igre ja unive uni ver r eu e Volk Gottes. 14. 14. Sobre as questõe s históricas abordad as aqui, cf. cf. J. Ratzinger. Das n eue Díisseldorf, Díisseldorf, 1969, p. 49-71. • Y. Congar. Aspects Aspects ecclésiologiques de la la querelle en tre men diant s et séculiers d ans la sec on de mo itié du XII P‘ siècle et le début du XI Ve. Ve. In: A H D , 28, 1961, p. 35-151.
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sal na igreja loc local al,, como fator de um a pastoral pluralista e no e n tanto tan to em e m últim ú ltimaa análise única, só foi foi poss possíve ívell po p o r causa da ligação ligação a um órgão concreto e teologicamente fundamentado da Igreja universal, ao ofício petrino. Até hoje parece que se percebeu e se refletiu muito pouco que os dois grandes impulsos a partir dos quais a doutrin do utrin a do prim ado evoluiu pa ra sua plena estatura não surgiram pr op riam ente en te do interes interesse se unitário mas sim sim do dinam is mo das exigências pluralistas. Temos aí, em primeiro lugar, a luta pe p e la l i b e r d a d e d a I g r e j a ocid oc iden enta tal,l, isto ist o é, p e la dist di stin inçã çãoo e n t r e Es tado e Igreja em sua substancial não-identidade15; temos aí, por outro lado, o impulso dos “movimentos de base” (como podería mos chamá-los) da Igreja universal, nos quais o dinamismo do apostolado da Igreja universal fecunda e completa a cura de al mas local. Estes dois fatos constituem algo de uma verificação do ofício petrino a partir da prática da história da Igreja e de sua experiênc experiência. ia. Q ue ambos continuam sendo de extre ma atualidade não tem necessidade de ser provado. Só a Igreja universal pode garan ga ran tir a distinção distinção en tre igreja igreja parcial parcial e Estado ou sociedade. Da mesma forma exp erimen tamo s hoje também mais um a vez vez o fe fe nômeno de movimentos apostólicos supralocais provenientes “de ba b a i x o ”, on d e s u r g e m n ovo ov o s car c aris isma mass q u e d ã o vida vi da à cu c u r a d e alm al m a s loccal. Também lo Tam bém hoje estes estes movimentos, movimentos, que não p od em rem on tar ao princípio episcopal, encontram apoio teológico e prático no pr p r i m a d o , q u e assi as sim m c o n t i n u a s e n d o o f a t o r d e u m vivo e fe f ecundo pl p l u r a l i s m o n a Igre Ig reja ja,, p r e c i s a m e n t e p e lo fato fa to d e faze fa zerr d e sua su a u n i dad e u ma realidade realidade concre concreta ta.. b) Te Teol olog ogia ia e t e o l o g i a s
As questões referentes à estrutura da Igreja, que ficaram es clarecidas a partir do nosso tema, nos remetem àquilo para o que qu e esta estass estru tura s existem. Até Até há po uco este este tema pare cia es tar claramente circunscrito pelas profissões de fé, pelas decisões 15 15.. Faço referência aqui à temática básica básica da reform a gregori ana , mas que re tom a e concretiza apenas um tema básico enraizado na plena tradição do primado. Cf. a esse respeito o material apresentado em H. Rahner. Kirche Kirche und Staat im friih en Christentum. Munique, 1961. Esta problemática é analisada em profundidade na im portante obra de E. von Ivánka. Rh om aene ae neic ichh u nd Gottesvolk. Gottes volk. Freiburg/Munique 1968. Ivánka desenvolve a partir daqui a diferença entre desenvolvimento oriental e oci dental de Igreja e cultura.
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conciliares e pelos dogmas. Hoje até mesmo este núcleo central pa p a sso ss o u a e s t a r e n v o lvi lv i d o n a disc di scus ussã são. o. E v e r d a d e q u e o d o g m a , em geral, não é contestado formalmente. Mas gosta-se de cha mar atenção para o caráter condicional de toda linguagem hu mana. A fé não pode ser transmitida em fórmulas definitivas, mas, para que possa ser transmitida, o mesmo conteúdo precisa sempre de novo ser verbalizado em novos termos. Surge com naturalidade esta pergunta: Que dizer então da Sagrada Escri tura? Será que ela ela precisa precisa ser constan temente tem ente reescrita reescrita?? Ou não seria seria mai maiss corre to reinte rpretá-la semp re d e novo, novo, desta forma reconhecendo-a assim como ela é, em sua própria exigência e inesgotabilidade? inesgotabilidade? E quem have riam de ser os os espíri espíritos tos ilumina dos capazes de ver qual é o conteúdo permanente por trás da linguagem, se a própria linguagem não possui continuidade? Existiriam duas espécies de cristãos: um pequeno número de iluminados, que vêem por trás da linguagem, e os muito ingê nuos que se atêm à linguagem e a quem por isso são apresenta dos semp re novos revestimentos, revestimentos, e cuja cuja ligaçã ligaçãoo com o que a nte cede não lhes diz respeito, pois não a haveriam de entender? Mas não chamou o Senhor bem-aventurados precisamente os simpl simples, es, que co m pree pr ee nd em os misté mistérios rios melho r do que os os inté r pr p r e t e s i n s t r u í d o s , os q uais ua is p o r t rás rá s das da s p a lav la v r a s p r o c u r a m seu se u pr p r ó p r i o m u n d o ? (cf. (cf. Lc 10,2 ls). ls ). N ã o e xist xi stee m u i t a lógi ló gica ca ness ne ssas as teorias, pois ou não existe possibilidade de se compreender a linguagem com o passar do tempo , e então então também ningu ém é capaz de criar novas novas fórmulas a dequ adas , ou essa essa possibil possibilidade idade existe, e então é suficiente a interpretação, mas uma interpreta ção ção que assume a palavra dad a e que reto rna a ela ela,, em lug ar de abandoná-la16. Gostaria de mais mais u m a vez dar a palavra ao psicólo psicólogo go Albert Gõrres, que fala fala de u m a “hind uizaçã o” do cristiani cristianismo, smo, “em que já j á n ã o i m p o r t a m os d o g m a s d e fé, m a s sim si m o ser se r t o c a d o p o r u m a atmosfera atmosfera espiritual espiritual que lev levaa o Ho me m para além de tudo que se pode po de d esc rev er” 17. Frente Fre nte a isso isso,, Gõrre G õrre s enfatiza cla ram ente en te a fisionomia fisionomia histórica do cristianismo, cristianismo, q ua nd o diz: iz: “A resposta respo sta que q ue 16. Um pouco mais amplamente eu desenvolvi estas questões discutindo-as com K. Rahncr em minh a doutrina dos princípios princípios teológicos. teológicos. Munique, 1982, p. 127-139. 127-139. 17. Gõrres. L.c., p. 129 [ver nota 5, acima]. 78
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íoi mantida em todas as épocas é um pouco diferente. Ela diz: Nã N ã o exis ex iste te cris cr istitian anii smo sm o sem se m a ‘t e n d ê n c i a à conc co ncis isão ão’’. N ã o exis ex iste te uma doutrina de Jesus sem um esqueleto, sem um princípio dogmático. Jesus não que q ueria ria provoc pro vocar ar comoção sem sem conte co nte údo úd o [...] Sua mensagem é um a mensagem m ensagem bem determ det erm inada ina da [...]. Ele não dá razão a qual qu alqq u er um [...] [...]”I ”IH H. “Os cristãos católico católicoss acre ac redi dita tam m [...] ..] que existe algo assim assim como u m cont co ntor orno no vita ital e necessário d a fé, sem a qual ela não teria sentido. [...] Acreditam que a Igreja po p o d e e d eve ev e c u i d a r d e q u e esses c o n t o r n o s seja se jam m ‘cató ca tólilico cos’ s’ n o sentido literal da palavra, portanto que eles sempre mostrem de forma form a irrestrita e inequívoca o todo da d a reve r evelaç lação ão [.. J ”19 ”19. De fato, o que qu e n a fé signif signific icaa cura cu ra e salva salvaçã çãoo consiste consiste em que qu e ela faz faz surgir surgi r no no Ho mem me m o conhecimento - conhecimento verdadeiro, verdadeiro, pois pois do con trário não seria conhecimento. Ela diz-lhe o que ele talvez imagi ne de longe, mas que nenhum ser humano lhe pode garantir: a verdad ver dad e sobre sua pró p ria ri a razão razão e sobre o destino do seu ser ser. DáDálhe o conhecimen to que qu e confere sentido a todos os os outros outro s co nhe nh e ciment cimentos. os. Retirar R etirar da fé a exigênci exigênciaa da v erdade, da verdad ver dad e decla decla rad a e compreensível, é aquela fals falsaa modéstia mod éstia que qu e constitui o con trário trário da hu mildad e - o não-ac não-aceit eitar ar a condi condição ção hu m an a mas re nunciar a ela, porque é renunciar à dignidade do Homem, que eng randec ran dec e seus sofrimentos e os to torn rnaa suportáveis2 supo rtáveis200. 18 .Ibid.
19. Ibid., p. 130. 20. A importância da obra de R. Guardini, a partir partir da visão atual, atual, pare ce-m e consistir essencialmente na decisão com que a todos os historicismos historicismos e pragmatismos ele op õe a capacidade do H om em para a verda de e a relação da da filosofi filosofiaa e da teologia para para com a verdade. Seu pensamento e seus desejos estão de certa forma resumidos em duas frases de um apontamento do seu diário, de 28/02/54: “A verdade possui um poder tão claro claro e tranqüilo. tranqüilo. E o qu e pe ns o fazer com me u trabalho past pastora oral: l: ajudar através através da verdade” (Wahrheit des Denkens and Wahrheit des Tuns . Ed. por J. Messers chmid. Pad erb orn ,:í ,:í 1980, p. 85). O último pron uncia me nto público de Guardini, a alocução por ocasião de seu 80- aniversário, é mais uma vez de forma impressionante dedica do ao tema da verdade, e poderia ser considerado como uma espécie de testamento espiritual. A partir de Platão é desenvolvido o conhecimento em torno da incomensurabiliclade do Homem para com a verdade, que a rigor não pode deixar de parecer a si próprio ridículo quando tenta falar da verdade, e que não obstante recon hece ndo seu ridículo - precisa manter essa essa ousadia. ousadia. Só qu ando as duas coisas coisas estão presentes: presentes: a coragem para a verdade e a humi ldad e para para aceitar aceitar a própria con dição ridícula, é que o Homem se encontra na reta medida entre um cinismo que despreza a verdade e u m auto-suficiente auto-suficiente fanatismo. fanatismo. Este texto importante encontra-se em R. Guardini. Stationen u nd Rückblicke. Rückblicke. Würzburg, 1965, p. 41-50. ✓
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Admitindo-se isto, significa que a fé toma como referência po p o n t o s e c o n t e ú d o s q u e p o d e m s e r e n u m e r a d o s . Si Sign gnif ific icaa t a m bé b é m q u e os s imp im p l es - e talv ta lvez ez p r e c i s a m e n t e eles el es - p o d e m c r e r retam ente, ente , e isto isto em todos os tempos. Q ua n do for necessário necessário se se po p o d e r m o s t r a r “sem “s em d e f o r m a ç ã o ” o esse es senc ncia iall d a fé, s e r á p r ecis ec isoo que exista um a instância capaz capaz de fazê fazê-l -lo. o. Então a pr óp ria Igreja pre p reci cisa sa t e r voz; p r e c i s a es e s t a r em e m con co n d i çõe çõ e s d e m ani an i fes fe s t arar - se com co m o Igreja e de distinguir a falsa da verdadeira fé. Isto significa que fé e teologia teologia não n ão são a mesm a coisa coisa,, qu e cada cad a um a possui po ssui sua voz pr p r ó p r i a , m as q u e a voz d a t eol eo l o g i a é d e p e n d e n t e d a voz vo z d a fé, e está relacionada com ela. Teologia é interpretação, e tem que continuar sendo interpretação. Mas quando ela deixa de inter pr p r e t a r p a r a , p o r assi as sim m dizer di zer,, a t a c a r e mo m o d i f i c a r a sub su b stân st ânci ciaa , p a r a da r a si si p ró p ria um novo texto, entã o ela deixa de subsis subsistir tir como teologia. teologia. Pois j á não in terp te rp reta re ta mais mais coisa coisa algu ma, e sim sim fala fala por si pró pria. pr ia. Isto po de ser s er cham ch am ado ad o de filoso filosofia fia da religião, religião, e como tal tal pode ser interessa nte, mas não possui mais mais razão nem au to tori ri dad e p ara além da p ró pr ia reflexão de que m fala fala.. Fé e teolo teologia gia são tão diferentes quanto texto e interpretação. A unidade baseia-se na fé, o campo da variedade é a teologia. Neste sentido, pr p r e c i s a m e n t e o a d e r i r à fé c o m o p o n t o d e r e f e r ê n c i a c o m u m torn to rn a possí possíve vell a plura lidad lid adee n a teologi teologia. a. Precisamos determinar ainda um pouco melhor os dois la dos desta questão. questão. Verif Verific icam amos os que faz faz parte da fé um con teúd o determinado, e que o ser determinado significa poder ser ex pr p r e s s o e m p a l a v r a s , e q u e isto is to e x i g e e n t ã o u m a i n s t â n c i a decl de claaratória. Concluímos daí que a Igreja, como Igreja, também não po p o d e s e r m u d a , m a s t e m q u e t e r o d o m d a p a l a v r a , isto is to é, a po p o s s i b i l i d ade ad e d e d e c l a r a r o q u e p a r a ela el a é esse es senc ncia ial.l. C o m isto ist o chegamos a um ponto muito importante do ato de fé. A fé da Igreja não existe como como u m conjun con junto to de d e textos, textos, mas os os textos textos - as pa p a l a v r a s - e x i s t e m p o r q u e exis ex istt e u m suje su jeii to c o r r e s p o n d e n t e n o qual ele eles enc on tram tra m su a razão de ser e sua conexão conex ão interior. Do po p o n t o d e vist vi staa em e m p í r i c o , a p r e g a ç ã o dos do s apó ap ó sto st o l o s c r i o u a I g r e j a como uma espécie de unidade histórica do sujeito. Alguém se torn a mais mais crente qu and o se une a esta esta com unid ade d e tradição, tradição, de pensamento e de vida, quando vive a partir de sua própria conexão históric históricaa de vida vida,, chega ndo então a participar tam bém 80
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de sua maneira de entender, de sua linguagem e de seu pensa mento. men to. Para o crente, pore m, não se trata d e um sujeito sujeito soci socioló oló gico qualquer, mas sim de um sujeito verdadeiramente novo, pr p r o v o c a d o p e l o E s p í r i t o S ant an t o , q u e p r e c i s a m e n t e p o r isso iss o r o m pe p e os i n s u p e r á v e i s limi li mite tess d a s u b j e t i v i d a d e h u m a n a , d a n d o ao H om em o contato com a base base da pr ó pr ia realidad reali dad e21 e21. A fé é po r natu reza um crer ju n tam en te com toda a Igreja. Igreja. O “eu “eu creio” da pro p roff i ssã ss ã o d e fé n ã o r e m e t e a n e n h u m e u p a r t i c u l a r , m as sim si m ao eu comum da Igreja. A fé torna-se possível na medida em que torno-me um com este eu comum, que não suspende meu pró pr p r i o e u , m as o a m p l i a , só assi as sim m f a z e n d o - o s er i n t e i r a m e n t e ele el e mesmo. Esta é uma constatação importante, porque nos leva para além de todas as palavras e fórmulas, para o que antecede e o que qu e está acima acima de to da palavra. As As palavras palavras h um anas ana s em que a fé fé é enunciada enunciada nunca apreen dem por inteir inteiroo aquele aquele conteúdo conteúdo que chega até à eternidade - é este o verdadeiro núcleo daquelas teorias que no pior dos caso casoss resultam n um a “hindu ização” ização ” da fé cris cristã tã.. A linguagem da fé não é um a linguagem matemática - a única a ter um significado único. Quanto mais profundamente pe p e n e t r a m n a r e a l i d a d e , t a n t o mais ma is as pa p alavras h u m a n a s t o r n a m se insuficientes. Tudo isso se tornaria ainda mais claro se pudés semos voltar-nos para o resultado concreto da linguagem da fé, em que dois dois fato fatoss cham am nossa nossa atenção: atenção: é um a lin guag em cju cjue muitas veze vezess expressa-se p or meio d e imagens, e não d e concei tos; to s; e além além di diss ssoo é oferecida nu m a seqüência de declarações declarações em que a tensão bás básic icaa de Antigo e Novo Testamento já mo stra como só na relação do todo consigo mesmo, e não em fórmulas isola das, a verdade da fé torna-se lingüisticamente acessível. Cance lando-se aqui o contexto de um sujeito que perpassa organica mente toda a história e que ao mesmo tempo permanece uno L a f o i chrét ch rétien ienne ne - Essa 21. Cf. H. de Lubac. La Essaii sur la la structure du Symbole des Apôtres. In tern rnat atio iona nale le Theolo The ologen genkom kommis mission sion - Pluralis Paris, ~1970. • Inte Pluralismus, mus, p. 36-42. Qu e para para poder subsistir em si mesma a teologia pressupõe o sujeito comum, que já foi apre sentado programaticamente em 1922 por R. Guardini em sua preleção experimen tal de Bonn, “Anselm “Anselm von Canterbury und das Wesen der T hè olog ie”, publicada em de m Wege - Versuche. Mainz, 1923. Muito esclarecedor seu volume de ensaios A u f dem ti e rd u théolog thé ologien ien - Entretiens avec G. Daix. nesta questão é também L. Bouyer. Le m é tie Da s H an dw erk er k des Theol Th eolog ogen. en. Einsiedeln, 1979]. Paris, 1979 [em alemão: Das
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ei 11 suas suas modific modificaçõ ações, es, não restarão mais do qu e fragm entos lin güísticos contraditórios, que não poderão posteriormente ser levados a constituir contexto algum. A tendência a por trás do ocorrido oco rrido p ro cu ra r o que é mais mais antigo e mais mais original é a conse qüência lóg lógic icaa da p erd a do que u ne a histó história ria em suas suas contrad i ções ções,, e que a m an tém unida . A teologia teologia passa a ser arqueologia, que p or trás do cristianismo rea l e vis visív ível el esca escava va o ideal e o p ró pr p r i o . Mas Ma s tal ta l c r i sti st i a n i s m o r e c o n s t r u í d o s e m p r e é t a m b é m u m cristianismo de escolha, onde perderam-se a tensão e a riqueza do todo. Em vez vez da plura lidad e interio int erio r da sinfonia sinfonia da fé surge o pl p l u r a l i s m o s e m rel re l a ç õ e s d o s c rist ri stii a n i smo sm o s d e esc es c olha ol ha,, d e c a r á t e r subjetivo. Devemo Devemos, s, port anto, ant o, dizer: dizer: o pluralismo da desintegração sur ge quando deixamos de sentir-nos à altura da grande tensão interior do conjunto da fé. Ele sempre pressupõe um estreita mento e empobrecimento, que não diminui com a proliferação dos cristi cristianismo anismoss parciais parciais que se manifestam um ao lado do o u tro e um após o outro; pelo contrário, só dessa dessa mane ira é que se manifesta manife sta plen pl enam am en te a pobrez pob rezaa das tentativas isola isoladas das.. Ao Ao invés invés disso, quando se consegue referir a multiplicidade das manifes tações históricas da fé a uma unidade que não extingue essa di versidade, versidade, mas a reconhece como est rut ura orgânica orgânica da ve rdade que super a o Ho m em , manifest manifesta-s a-see um fecun do pluralismo pluralismo teo lógico. Hoje, é verdade, também entre teólogos de mentalidade inte iram ente ent e ecles eclesia iall existe a suspeita suspeita de que um a teologia ort o doxa estaria estaria co nd en ad a a simplesmente simplesmente re petir decisõ decisões es do utr i nárias e fórmulas tradicionais. Com esta confusão, o espaço de pe p e n s a m e n t o d e i x a a i m p r e s s ã o d e e s t a r chei ch eioo d e a n t i g a s e nova no vass decisõ decisões es com que inevitavelmente nos dep aram ara m os a cada pass passo, o, de tal maneira que já não encontramos ar para respirar. Para nos tornarmos “criativos” parece que não há outro meio senão jo j o g a r f ora or a o an a n t i g o e n t u l h o e p a s s a r co c o nscien tem en te à c o n tra d i ção aberta. Mas qual a segurança de onde esta criatividade ainda pode pa p a r t i r ? S e r á q u e a a p r o v a ç ã o pess pe ssoa oall e a c o n c o r d â n c i a c o m u m a pa p a r t e d o espí es píri rito to d o t e m p o co c o n s tit ti t u e m r e a l m e n t e u m f u n d a m e n t o seguro seguro?? Q uan do um médico médico erra e em lugar de adaptar-se paci paci entem en tem ente en te às le leis da anatom ana tom ia e da vida aplica aplica um a idéia “criati “criati
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va”, logo as conseqüências se manifestam. No caso do teólogo o pr p r e j u í z o n ã o é p e r c e b i d o t ã o d i r e t a m e n t e . Mas n a v e r d a d e m u i ta coisa coisa está cm cm jo jogo go para que ele ele possa confia r simplesm simpl esmente ente em sua evidência momentânea, quando se trata do Homem e do futuro da humanidade, onde qualquer int i nterv ervenç enção ão errônea pro voca suas conseqüências. Certamente é mais fácil tirar do cami nho a pesada mobília do dogma e entregar-se à plausibilidade do que fica ficarr parad o diante de um a realidade trabalhosa e exp os to às suas exigências. exigências. Aqui Aqui po de rá ser útil útil que se lance um olh ar pa p a r a a ciê c iênc ncia ia d a n a t u r e z a , cujo cu joss g r a n d e s suce su cess ssos os f o r a m o b tid ti d o s não por uma criatividade arbitrária, mas sim por uma estrita ligação a seu objeto. Evidentemente, sempre de novo ela tem que envolver seu objeto com hipóteses, buscar novas maneiras de abordá-lo com perguntas, forçando-o a responder. Mas ne nhuma das respostas encontradas antes pode simplesmente ser descartada. Pelo Pelo contrário, quan to mais mais numero sas forem, tanto mais numerosas as novas possibilidades de interrogação que se abrem, tanto mais espaço concreto ganha a verdadeira criativi dade, que não avança no vazio mas que consegue relacionar os caminhos uns com os outro s e a part ir daí fazer fazer novas novas descob er tas. Na teologia não é diferente. Precisamente a riqueza das for mas de fé na unidade de Antigo e Novo Testamento, de Novo Testam ento e dog m a da Ig reja Antiga, Antiga, c de tudo tu do isto isto em con c on jun to com o avanço da vida de fé, fé, faz faz com qu e as pergu ntas torne tor nem mse sempre sem pre mais mais interessantes e mais mais rica ricas. s. Buscar a uni dade da de inte rior e a plenitude da verdade na grande e complexa estrutura da história da fé é de certo mais estimulante estimu lante e mais mais prod utiv o do do que destruir o nó, dizendo que esta unidade não existe. Ao ser confrontado com as palavras mais antigas, na aparência muito distantes de nós, o presente torna-se também mais rico do que quando simplesmente permanece em si mesmo. Naturalmente, tam bém entre ent re os teólogos teólogos que aceitam aceitam a ortod oxia existem m ui ui tos espíritos pequenos, que apenas repetem o passado. Estes se enco ntram em toda parte; o lixo da literatur a cresc cresceu eu de m ane i ra particularmente rápida quando passou-se a falar muito em criati criativid vidade ade.. Por muito tempo eu p róp rio também tiv tive a impre s são são de qu e a rigor os ass assim im chamad os herege he regess seriam mais inte ressantes do que os teólogos da Igreja, pelo menos nos tempos
N a t u r e z a e m i s s ã o d a t e o 1o g i a
mais mais recente recentes. s. Mas quan qu an do conside ro ago ra os os gra ndes nd es mestres m estres
III A p l i c a ç õ e s
a
“I
n s t r u ç ã o
s o b r e n a
a
I
v o c a ç ã o
g r e ja
d o
t e ó l o g o
”
o b s e r v a ç ã o p r e l i m i n a r
Em 24 cie maio de 1990 a Congregação para a Doutrina da Fé publicou uma “Instrução” sobre a vocação eclesial do teólo go, go, que tornou-se tornou-se o ponto de p artida para um debate inesp era damente quente. No que segue será mais uma vez impresso o texto com que então apresentei a Instrução à imprensa; penso que, ind epe nd ente m en te de toda polêmic polêmica, a, ist isto continua sendo apro priad o p ara explicar explicar a estru tura e a intenção intenção do do cu m en to. Numa segunda parte tento responder a algumas das objeções ções mai maiss imp ortantes, pa ra dessa dessa forma retom ar o diálogo diálogo,, que - apesar de quase sem pre de um a form a negati negativa va - teve teve in iníc ício io com a publicação da Instrução.
1. Apresentação A importânc ia do teólog teólogoo e da teologia teologia pa ra to da a com un i dade dos crentes passou a ser visível de uma maneira nova no Concilio Vaticano II. Antes a teologia era vista como ocupação de um pequeno círculo de clérigos, como um assunto elitista e abstrato, que quase não conseguia despertar nenhum interes se para a opinião pública na Igreja. A nova maneira de ver e de expressar a fé, que se impôs no concilio, foi fruto do drama, anteriormente pouco percebido, de uma reorientação teológica iniciada após a Prim eira G u erra er ra Mundial, associ associada ada a novas novas cor rentes rent es do espírito. espírito. A tend ênc ia liber liberal al dom inante ina nte,, com seu ingê nuo otimismo do progresso, havia-se tornado frágil nos horro res da guerra, e com ela também o modernismo teológico, que tentara adaptar a fé à visão liberal do mundo. O movimento litúrgico, o movimento bíblico e ecumênico, e por último um intenso movimento mariano criaram um novo clima espiritual,
N a t u r e z a c m i s s ã o d a t e o l o g i a
d o <11lal nasceu também uma teologia que no Concilio Vaticano 11 torn ou-se ou- se fecun fec un da pa ra tod t odaa a Igreja. Os próp rio s bispos bispos fo fo ram surpreendidos por uma teologia que em parte ainda lhes era pouco famili familiar ar,, e de boa von tade deixaram-se co nduzir nd uzir pelo peloss teólogos, como seus mestres em um terreno que eles até então desconheciam, em bo ra as últimas decis decisões ões sobre sobre o que p odia ser apresentado como afirmação do concilio, e com isso da Igreja, também tam bém continuasse confiada aos aos Padres. Padres. O dinamism d inamism o desta evolução evolução teve teve contin uidade uid ade após o conci conci lio; os teólogos passaram a sentir-se mais e mais como os verda deiros mestres da Igreja, os mestres inclusive dos bispos. A par tir do concilio eles foram descobertos também pelos meios de comunicação, pa ra os quais quais passaram a ser ser interessantes. interessantes. O m a gistério da Santa Sé passou a ser visivelmente consid con sidera erado do como o último resquício de u m fracassado fracassado autoritarismo. A impressão era que, com a insist insistênc ência ia sobre a auto ridad e p or p arte de um a instância extracientífica, se pretendia controlar o pensamento, em bora o caminho do conhecim ento não pudesse ser esta estabe bele leci ci do pela autoridade, mas dependesse unicamente da força dos argumentos. Tornou-se dessa forma necessária uma nova cons ciência da posição da teologia e do teólogo, bem como de sua relaçã relaçãoo com com o magist magistéri ério, o, que tenta en ten de r um a e ou tra a pa r tir de sua lógica interna, com isso servindo não apenas à paz na Igreja mas mas sobre tudo também a um a reta forma de liga ligaçã çãoo entre fé e razão. E a esta esta tarefa que q ue a In stru ção tenta ten ta servi servir. r. Em últim ú ltim a análise análise trata-se de um problema antropológico. Quando religião e ra zão zão não conseguem retam ente encontrar-se, a vida vida espiritual espiritual do H om em se desfaz desfaz,, seja seja em u m acan ac an ha do racionalismo racio nalismo tecnici tecnicista sta,, seja em um sombrio irracionalismo. A onda de esoterismo que observamos hoje mostra que no racionalismo positivista domi nan te as as camadas mai maiss profun das d a condição condição hu m an a não con seguem mais ser integradas, e por isso as formas atávicas da su pe p e r s t i ç ã o v o l tam ta m a g a n h a r a s c e n d ê n c i a s o b r e o H o m e m . O p o s i tivi tivism smoo nega a capacidade do H om em para a verdade; o conhe cimento humano estaria limitado ao que pode ser feito e com pr p r o v a d o ; q u a n d o se d e i x a d e l a d o o t e r r e n o d o q u e é fact f actív ível el,, o irracional assume assume as as rédeas. rédeas. Apare A parentem ntem ente livr livree, o H om em passa passa /
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a scr escravo de poderes imperscrutáveis. Por isso a Instrução coloc colocaa o tema da teologia teologia dentro den tro do gr an de horizonte horiz onte da capaci dade do Ho me m par a a verdade e de sua verdadeira liberdade. liberdade. A fé cristã cristã não é ne nh u m passatem po, n em a Igreja um clube ao lado de outros clubes semelhantes, ou mesmo diferentes. Pelo contrário, a fé fé resp on de à per gu nta p rimor dial pela pela origem e o destino do Hom Ho m em. em . El Elaa refere-se aos aos problem prob lemas as básic básicos os que Kant Kan t considerava como o pon to central d a filo filoso sofi fia: a: Que Qu e é que e u p os so saber? Que devo fazer, que posso esperar? Que é o Homem? No N o u t r a s pala pa lavr vraa s: a íe tem te m q u e v e r c o m a v e r d a d e , e só se o H o mem for capaz de conhecer a verdade é que se pode dizer que ele é chamado a ser livre. No N o ABC d a fé, o pr p r i m e i r o l u g a r é oc o c u p a d o p o r est e staa afir af irm m ação aç ão:: No p r inc in c í p i o e r a o Logos. A fé nos mostra que a eterna razão é o fundamento de todas as coisas, ou que as coisas são desde a ori gem razoáveis. A fé não pretende oferecer ao Homem nenhuma espécie de psicoterapia, sua psicoterapia é a verdade verd ade.. Por isso isso ela é universal e essencialmente missionária. Por isso também, como dizem os os Padres, a fé a part ir de d en tro é quaerens intellectum, está em busca de compreender. O compreender, ou seja, o ocuparse racionalmente com a palavra que nos é dada, é um elemento constitutivo da d a fé cristã. cristã. Pro P rodu duzz necess nec essari ariam amente ente teologia; teologia; isto isto,, aliá aliás, s, do ponto po nto de vista vista da história das religiõe religiões, s, distingue dis tingue a fé cristã de todas as demais religiões. A teologia é um fenômeno especifica men te crist cristão ão,, que resulta da e strutu ra da fé. fé. Mas Mas em que é que a teologia teologia se distingu disti nguee d a filos filosof ofia ia da reli gião e da ciência profana da religião? Exatamente pelo fato de a razão h um an a saber que não fic ficou ou entr egue eg ue a si si mesma. A razão é antecedida por uma palavra que na verdade é lógica e razoá vel, mas que não procede dela mesma, que lhe foi dada e que po p o r t a n t o s e m p r e a s u p e r a . Esta Es ta p a l a v r a c o n t i n u a s e n d o u m a t a refa que em nossa nossa história nós nós nun ca pode p ode m os esgota esgotar. r. Teologia Teologia é reflexão do que nos fo foi dito dito po r Deus, do qu e foi foi pen sad o p or Deus. Quando abandona essa base sólida, ela dissolve-se como teologia, teologia, e então torna-se torn a-se inevitável inevitável a qu ed a no n o ceticis ceticismo, mo, a divi divi são da existência em racionalismo e irracionalismo. Mas Mas voltemos voltemos à nossa Instrução. Instruçã o. El Elaa se se ocupa ocu pa com a tarefa do teólogo teólogo den tro desta gran de mo ldura, com isto isto torn and o vis visível
N a t u r e z a e m i s s ã o d a t e o l o g i a
,i grande gra nde za da missão missão do teólogo. teólogo. Em sua estr utu ra ch am a atenção (]iie ]iie o princípio princ ípio não está no magistério, magistério , mas sim na apr esenese nlação lação da ve rdad e como 11111 dom de Deus a seu povo. povo. A verd ade da fé não é dada ao indivíduo isolado, mas com ela Deus quis estabelecer história e comunidade. Ela tem seu lugar 110 sujeito comu nitário do povo de Deus Deus,, a Igreja. Igreja. Em seguida é apr ese nta da a vocação do teólogo. Só então é que vem o magistério e a relação m út ua en tre os dois. dois. Isto signif significa ica duas dua s cois coisas as:: a) A teologia não é pura e simplesmente uma função auxiliar do magistério; magistério; ela não se limita limita a re un ir argum ar gum entos ent os pa ra o que é apre ap rese sent ntad adoo pelo magistério. Pois Pois nesse caso caso magistério e teologia estariam pró ximos xim os da ideologia ideologia,, on de se trata trat a apenas de conquis tar e de manter o poder. A teologia possui sua origem própria; ba b a s e a n d o - se e m São Sã o B o a v e n t u r a , o d o c u m e n t o m e n c i o n a d u a s raízes da teologia na Igreja: por um lado o dinamismo voltado pa p a r a a v e r d a d e e a c o m p r e e n s ã o , q u e se e n c o n t r a 11a fé; e por outro também o dinamismo do amor, que deseja conhecer me lhor a quem ama. Correspondem a isto duas linhas da teologia, mas duas linhas que se interpenetram mutuamente: uma mais voltada par a fora, que se em pe nh a pelo diálogo com todas as as bus cas racionais da verdade no mundo; e outra mais voltada para den tro, que deseja deseja fun dam da m en tar a lógi lógica ca e a pro fundid fun didade ade da fé fé. b) O d o c u m e n t o se o c u p a c o m a q u e s t ã o d a miss mi ssão ão eclesi ecl esial al do teólogo, não 110 dualismo magistério-teologia, mas sim nesta relação triangular: o Povo de Deus como portador do senso da fé e como lugar comum de toda a fé, de todo o magistério e teolog teologia. ia. A evolução dogmát dog mática ica dos últimos 150 150 anos ap on ta com clareza para esta ligação. Os dogmas de 1854, 1870 e 1950 tor naram -se possí possíve veis is p o r te rem sido sido enc ontrado ont rado s pelo senso da fé fé, po p o r o m a g i s t é r i o e a t eol eo l o g ia t e r e m sido si do g u i a d o s p o r eles, ele s, t e n tando aos poucos alcançá-lo. Com isto já se afirma também a substancial eclesialidade da teolog teologia. ia. Teologia Teologia nu nc a se confu co nfu nde nd e simplesm ente com a idéi idéiaa pa p a r t i c u l a r d e u m t eól eó l ogo. og o. C o m o tal n ã o p o d e r i a t e r g r a n d e i m po p o r t â n c i a ; l o g o p e r d e r i a o sign si gnif ific icad ado. o. Pelo Pe lo c o n t r á r i o , o esp es p aço aç o vital vital do teólogo é a Igreja, como sujeito viv vivoo e que pe rm an ece ec e ao longo das transform ações açõe s histó histórica ricas; s; nela são são preservad preser vadas as as ex pe 90
J o s e p h R a t z i n g e r
riências riências de fé feita feitass com Deus. Deus. A teologia só pode po de m ante an terr sua im po p o r t â n c i a his h istó tóri rica ca q u a n d o r e c o n h e c e este es te seu se u espa es paço ço vital, nele ne le se integra, e aclquire participação nele a partir de dentro. Por isso, pa p a r a o teól te ólog ogoo a I g r e j a n ã o é n e n h u m a orga or gann izaç iz ação ão e x t e r i o r e estranha. estranha . Como sujeito sujeito comum , que ultrapassa ultrap assa a estreit estreiteza eza indivi indivi dual, ela garante a possibilidade de a teologia atuar com eficiên cia. Compreende-se, assim, que para o teólogo duas coisas sejam essen essenci ciai ais; s; po r um lado o rigor rig or metódico, q ue faz parte pa rte da ativida de cient científi ífica ca;; o doc um ento, ent o, então, apo a pont ntaa par p ar a a filo filoso sofi fiaa e para pa ra as ciências ciências históricas históricas e hu m anas an as como c omo parceir par ceiros os privilegiados ci cio teó te ó logo. Mas por outro lado ele necessita também de participação inter int erior ior na n a vida da Igreja; da fé, fé, que é oração, meditação, vida. É só dentr o deste conjunto conjun to que existe teolo teologi gia. a. Também pode resultar daí uma compreensão orgânica do magistério. Da teologia faz faz parte pa rte a Igreja I greja,, dissemos. dissemos. Mas Mas a Igreja Igre ja só será mais mais do que u m a organização organização ex ter na dos crentes se pos suir voz própria. A fé vem antes da teologia; ela é a busca de com pre end er a palavra palavra que não foi foi inventada p or nós, nós, que desa fia nosso pensar, mas nunca submerge nele. Esta palavra que antecede a pesquisa teológica é a medida da teologia; ela neces sita sita de seu órgão pr óprio óp rio,, o magistério, magistério, que Cristo Cristo entre go u aos aos apóstolos e através deles a seus sucessores. Não quero aqui en trar em detalhes como o documento desenvolve a relação entre magistério e teologia. Sob o título de “colaboração mútua” ele apres enta a tarefa próp ria d e ambos e as formas formas de sua reta con vivê vi vênc ncia ia.. A super su per iorida ior ida de da fé, fé, que confere ao magistério magistério a au au toridade e o direi direito to último de de decis decisão ão,, não anula a ind ep en dê n cia cia da pesquisa teológ teológica ica;; pelo contrá rio, é ela ela que con fere vigor à sua base. O documento não deixa de mencionar que mesmo no caso mais favorável podem existir tensões, mas que, quando de ambos am bos os os lados lados se insist insistee no reco r econh nhecim ecim ento ent o das relações ínti mas de suas funções, elas são fecundas. O texto apresenta tam bé b é m as d i f e r e n t e s f o r m a s d e liga li gaçã çãoo q u e r e s u l t a m dos do s vár vá r ios io s n í veis eis do magistério. El Elee diz diz - de certo pela p rim eira eir a vez vez com toda t oda essa essa clarez clarezaa - que existem decisõ decisões es do magistério magistério que não po dem, como tais tais,, ser a última última palavra no assunto, mas que, a pesar pes ar de basicamente fundamentadas, são também um sinal da pru dência pastoral, pastoral, u ma espécie espécie de disposiç disposição ão tempor ária. Seu n ú
Na N a t u r e z a e mi s s ã o d a t e o l o g i a
cleo cleo perm ane ce válido, válido, mas os detalhes dec orrente orr ente s das circuns tância tânciass pod em necessitar necessitar de correções. correções. Podem ser lembr adas aqui as manifestações dos papas do século passado sobre a liberdade religiosa, ou as decisões antimodernistas do início deste século, sobre so bre tudo tud o as decisões decisões da Comissão Bíbl Bíblic icaa de então. entã o. Estas Estas man i fest festaç açõe õess pe rm ane cem plen am ente justif justificad icadas as como ad ver tên cias contra adaptações apressadas e superficiais; ninguém me nos do que J o h a n n Baptist Met Metz, z, po r exem plo, disse disse que as deci deci sões antimodernistas da Igreja prestaram o grande serviço de evitar que ela afundasse no mundo burguês-liberal. Em seus detalhes, no entanto, os conteúdos dessas determinações foram superados depois de haverem cumprido o serviço pastoral na situação em que surgiram. Na N a s e g u n d a p a r t e d o ú l tim ti m o c a p í tul tu l o , c o n t r a s t a n d o c o m es es tas formas sadias de tensão, é tratada, sob o título de “Dissenso”, uma forma falha, onde a Instrução se ocupa com um assunto surgido nos Estados Unidos nos anos 1960. Quando a teologia se organiza pelo princ ípio da m aioria e cria um magistério opos to que oferec e aos aos fiéi fiéiss formas de ação alternativas, de ixa de re a lizar o que para ela é essencial. Passa a ser um fator político, manifestamanifesta-se se em e stru tura s de po de r e insi insist stee no m odelo políti político co da maioria. Ao separar-se do m agistério ela ela perde per de o chão deb ai xo dos dos pés, pés, e qu an do se afast afastaa do terre no do p ensam ento pa ra o jogo jo go d o p o d e r falsif fal sifica ica t a m b é m s u a n a t u r e z a cie c ient ntíf ífic ica, a, des de s s a f o r ma perdendo as duas bases de sua existência. A Instruçã Ins truçã o foi foi publicada com a esperanç espe rançaa de q ue disting uir entre formas sensatas de tensão e uma oposição errônea e ina ceit ceitáv ável el entr e teologia teologia e magistério magistério pod e ser úti útill p ara d esanuviar esan uviar o clima na Igreja. Igre ja. A Igreja pr ecisa de d e um a sã teolog teologia. ia. A teologia teologia pr p r e c isa is a d a voz viva vi va d o m agis ag isté térr io. io . A I n s t r u ç ã o d e s e ja c o n t r i b u i r pa p a r a u m d i á l o g o r e n o v a d o e n t r e m a g i s t é r i o e teo t eolo logi gia, a, p a r a com co m isso prestar um serviço à Igreja no final do segundo milênio, e com ele um serviço à humanidade na luta pela verdade e pela liberdade. 2 . Pontos da discussão do texto A Instrução que acabamos de apresentar aqui rapidamente pr p r o v o c o u u m a p o l ê m i c a q u e e m p a r t e a s s u m iu ton to n s viol vi olen ento tos. s. O
Joseph Ratzinger
sentido que se pretendeu dar, corno foi mostrado, era realçar a importância pró pria da teologi teologiaa na Igreja, Igreja, e com com ela ela também a responsabilidade própria do teólogo. Mas teólogos sobretudo do universo de língua alemã, assim como um grupo de teólogos latino-americanos, pretenderam ver no texto exatamente o con trário - um estrangulamento do trabalho do teólogo, com o que se estaria pondo em risco a verdadeira natureza da teologia. A declaração do “Grupo de Trabalho cios teólogos católicos de dogmática e teologia fundamental no universo de língua ale mã” [Arbeitsgemeinschaft katholischer Dogmatiker und Fundamentaltheologen im deutschen deutschen Sprachraum] manteve um tom tranqüilo, tendo-se empenhado também por fazer uma avalia ção objeti objetiva va dos dos problemas; o mesmo se pod e dizer a respeito do po p o s i c i o n a m e n t o dos do s teó t eólo logo goss aus a ustr tría íaco cos. s. Já J á a lgu lg u n s teól te ólog ogos os indi in divi vi duais, duais, como P. P. H ü n e rm an n e D. D. Mieth, Mieth, manifestaram-se de form a pol p olêê m i c a e vio vi o l e n ta1. ta 1. T a m b é m u m c o m e n t á r i o a ssi ss i nad na d o p o r cerc ce rcaa de cem teólogo teólogoss latino-americanos latino-americanos não é pro priam pr iam ente en te cauteloso cauteloso em suas suas ava avalia liaçõ ções es,, qua q uand nd o cond c ondena ena o texto como com o “incriminatório” “incriminatór io” e “intelectu “intelectualista” alista”.. A Congregaç Cong regaç ão estaria reje itando itand o o que qu e Rom a já t eria er ia r e j e i tad ta d o n o sécu sé culo lo 19: o povo po vo,, a d e m o c rac ra c i a, a o p i n i ã o públ pú blic ica, a, o u e sta st a ria ri a m e s m o l a n ç a n d o susp su spei eita tass sobr so bree os dire di reititos os humanos, o direito à liberdade de opinião e de palavra2. Não é possíve poss ívell faze fa zerr-se se a q u i u m a disc di scus ussã sãoo mais ma is a m p l a dessa des sass reaç re açõe ões; s; espera-se que aos poucos cheguem também a pronunciar-se 110 diálogo teológico vozes vozes corretivas, sobrepo sobr epondo ndo-se -se às polêmicas polêmicas m o mentâneas e contribuindo para um diálogo fecundo3. 1. Cf. a coletânea editada por P. Hünermann e 1). Mieth. Streitgespràch um Theologie und Lehramt - Die Instrukti Instruktion on iiber iiber die kirch kirchlic liclie lie Berufu ng des T he olo gen in der Diskussion. Frankfu Frankfurt/ rt/M M ai n, 1991. O posicio nam ento da Arb eitsgemeinschaft der Dogmatiker und Fundamentaltheologen é citado aqui de acordo com o Schweizer Kirchenzeitung, 47/1990, p. 673. É assinado por D. Wiederkehr. O posicionamento dos representantes das faculdades de teologia da Áustria não foi publicado. Para D onum um verita ve ritatis tis - U n melhor compreender a Instrução é útil consultar R. Tremblay. Don document qui donne à penser. In: N R T h , 114, 1992, p. 391-411. 2. A missão eclesi eclesial al de teólo go - Subsídios de leitura leitura e eleme ntos para para um diálogo em torno à “Instrução sobre a vocação eclesial do teólogo”. In: Revista Eclesiástica Bra sileira, ano 50, fase. 200, dez./1990, p. 771-807. 3. N o m encionado livro livro de Hünerm ann-Mieth, o artigo nesse sentido de M. Seckler, Seckler, Der Dialog Dialog zwischen zwischen dem Lehramt und den T heo loge n. Além disso, disso, o artigo artigo de R. Tremblay, mencionado na nota 1, e ainda A. Rauscher. Stãndige Kritik tõtet die Freude am Glauben. In: Forum kath. Theol. , 6, 1990, p. 277-281. ✓
Na N a t u r e z a e m i s s ã o d a t e o l o g i a
(instaria de ocupar-me agora rapidamente com três grupos de problemas que exigem melhor reflexão; antes, no entanto, é prec pr ecis isoo c h a m a r a t e n ç ã o p a r a a l g u n s cla cl a ros ro s m a l - e n t e n d i d o s n a declaração do Grupo de Trabalho de língua alemã. Quando os teólogo teólogoss alemães, alemães, ap res entan en tan do suas suas objeç objeções ões,, dizem que a Ins trução vê no teólogo unicamente um delegado do magistério, isto simplesmente não é verdade. Pois o número 22 do docu mento, ali mencionado como prova, quer ressaltar o que carac teriza a “missão canônica”, ou a “autorização para ensinar”, que não é a mesma coisa que a natureza da teologia como tal, mas mostra um a form a jurídic a concreta de se pôr a serv serviç içoo da d ou trina trin a da fé. fé. Q ue a teologia teologia como tal não nã o é um a simples derivação do magistéri magistérioo está está claramente exposto na segunda p arte da Ins trução ao descrever-se a missão do teólogo. E vice-versa, para qualquer um que pense imparcialmente, é claro que a aceitação de um a missão missão ecle eclesi sial al sign signif ific icaa assum ir u m a ligaçã ligaçãoo jur ídica ídi ca com a Igreja docente. Do ponto de vista estrutural não se trata aqui de nada que seja específico da Igreja. Afinal de contas, a aceita ção ção de um a cátedra cáted ra estatal estatal também tam bém estabelec estabelecee um com promisso prom isso de lealdade par a com o Estado. Estado. Gostaria Gostaria de lem bra r neste con texto o curioso fenômeno de que nenhum teólogo alemão, até agora, considerou o juramento feito à constituição do Estado como significando uma restrição à liberdade científica, nem que esse esse ju ra m en to seria seria incompatí incompatível vel com um a consciên consciência cia fun da mentada no Sermão da Montanha. Mas que no terreno eclesial o mesmo processo ultrapasse todos os limites do suportável, eu pel p eloo m e n o s n ã o con co n sig si g o en e n t e n d e r . De m a n e i r a gera ge rall c h a m a a t e n ção a simpatia dos teólogos alemães em relação ao Estado; eles, man ifestam ente, vêem o Estado como o refúgio da liberdad liberdad e, ao mesmo tempo que na Igreja sentem-se ameaçados; por exem plo, pl o, q u a n d o se diz di z q u e p a r a os p r o f e s s o r e s n o m e a d o s p e lo Esta Es ta do o ju ra m en to de fidelidade fidelidade à Igreja na Alemanha só po de ria ser intro duzido du zido de com um acordo acor do com o Estado4. A história história 4. Assim se expressa o canonista 11. Schmitz, de Munique, citado segundo R. Frieling. Instrumentalisierte Freiheit der Theologie? In: ZT 135ss. Bastante tranqüilo Z T h K , 1991, p. 135ss. e objetivo, objetivo, o artigo artigo de Frieling Frieling tra trazz alguns pontos que mere cem ser considerad os, mas também manifesta a clara tendência de frente à teologia desqualificar a Igreja como “inst instânc ância ia não -ci en tífic aa o mesmo tempo que de bom grado submetesubmete-se se ao Esta Estado do.. Com o tem po este cam inho teria teria que rebaixar o cristianismo cristianismo na Alem anha a uma mera risco precisamente a liberdade cie cie fé. fé. religião religião civil civi l, com o qu e haveria de p ôr em risco
Joseph Ratzinger
deveria advertir contra tais aproximações ao Estado; torna-se urgente uma reflexão a respeito dos limites da ligação entre a teologia e o Estado, como se tornou manifesto na época do lití gio com a Ig reja evangélica3. evang élica3. Na N a d e c l a r a ç ã o d o G r u p o d e T r a b a l h o a l e m ã o t a m b é m n ã o é correta corr eta a oposição oposição feita feita entre en tre o discurso do pa pa em Altõtting e a Instrução. Aqui a Instrução atém-se quase que literalmente à pa p a l a v r a d o p a p a , q u a n d o diz di z q u e nas na s t e n s õ e s e n t r e m a g i s t é r i o e teologia, teologia, se a questão ques tão da fé, como tal, não estiver em jo jogo go , deve ser preserv ada a “un “un id idad ad e no am or ”6. A Instru ção vai mais mais lon lon ge ainda do que foi dito em Altõtting, quando afirma que as tensões são de certa forma inevitáveis, e que elas podem consti tuir um certo dinamism o; podem po dem servir servir de estímulo ao magisté rio e à teologia para que percebam as tarefas de um e de outro, inclusive em seu diálogo mútuo7. Também parece um tanto es tran ho ressa ressalta ltar-s r-see que a possibil possibilida idade de de erro , como p or exe m pl p l o d e u m a visão vi são i n c o m p l e t a d o p r o b l e m a , só é a d m i t i d a p e l a Instrução com referência ao pass passado. ado. Tratando-se d e constata ção dos fatos fatos,, certa m ente en te não n ão se po de falar a não ser do passado; mencionar isso significa que também se admite que esses casos po p o d e m se rep re p eti et i r. a) A u t o r i d a d e só em ca s o d e d e f i n i ç ã o i n f a l í v e l ?
Ocupem Ocu pemo-nos o-nos agora com as as questões que necessita necessitam m de um a consideração mais aprofundada. Um primeiro problema que pass pa ssaa c a d a vez mais ma is a o c u p a r o p r i m e i r o p l a n o d o d i á l o g o p o d e ser vis visto to na afirmação do G rup o de Trabalho, que aceit aceitaa “todas “todas aquelas declaraç declarações ões do magistério magistério que se dão sob a prerro gativa gat iva da infalibilidade, dada à Igreja como um presente de Cristo”. Em todos os demais julgamentos a decisão dependeria da força dos argumentos. De início isto deixa a impressão de ser muito R G G III, p. 1443-1453. Interessant 5. Cf. Cf. E. E. Wolf. Wolf. K irchen kam pf. In: In: RG Interessantes es mençõ es nas Z u Gast a u f einem ein em schô sc hône ne n Ster St ern. n. Hamburgo, 1984. sobre memórias de H. Thielicke. Zu tudo p. 88-138. • H. Schlier. Die Beurteilung des Staates irn Neuen Testament. In: Ze it der d er Kirc K irche he.. Fre ibur g,21958 H. Schilier. Die Zeit g,21958 [texto pela primeira primeira vez vez impresso em 1932]. Cf. nesse volume o artigo “Vom geistlichen Grund und vom kirchlichen Ort der Theologie”, p. 39ss [ver acima], 6. Instrução, n. 26. 7. Instrução, n. 25.
Na N a t u r e z a e m i s s ã o d a t e o l o g i a
plau pl ausí síve vel,l, m a s a u m e x a m e mais ma is a p u r a d o rev re v elael a-se se c o m o b ast as t anan le questionável. Pois significa, na prática, que só pode haver de cisõe isõess magisteri magisteriais ais qua nd o a Ig reja p u d er apela r p ar a a infa infali libi bi lidade; fora desse terreno, a única coisa que conta seria o argu mento, portanto uma certeza comum da Igreja tornar-se-ia im poss po ssív ível el.. P a r e c e q u e n os d e p a r a m o s a q u i com co m u m a r e s t r i ç ã o e um juridicismo tipicamente ocidental, capazes de radicalizar desenvolvimen tos unilaterais que se configura conf iguram m desde d esde a Alta Alta Ida de Média. Um para lelo po de esclarecer o problema. Lá pelo sé sé culo 13 começa a sobrepo sob repo r-se a tud o a questão d o que qu e é necessá necessá rio pa ra a valid ade dos sacram entos. Visivelmente, Visivelmente, o que qu e passa a contar agora é exclusivamente a alternativa válido ou inválido. O que não afeta a validade validade aparece, em última análise análise,, como não tend o gra nd e importância, e como po de nd o ser substitu substituído. ído. Na Eucaris Eucaristia, tia, po r exempl ex emplo, o, chega-se dessa dessa forma a um a fixaç fixação ão sem pr p r e mais ma is r í g i d a n a s p a l a v r a s d a c o n s a g r a ç ã o ; o q u e r e a l m e n t e é constitutivo constitutivo p ara ar a a validade t orna-se c ada vez vez mais mais restrito. Com isso vai-se perdendo cada vez mais a visão para a estrutura viva do serviço divino. Fora as palavras da consagração, tudo mais termina sendo considerado apenas como cerimônia, que assu miu essa essa forma, mas que em princ ípio tam bém po deria der ia não exis tir. Deixa-se Deixa-se de ver a natu reza p ró p ria ri a e o sentido insubstituível insubstituível pa p a r a a l i t u r g i a, p o r q u e o p e n s a m e n t o c o n c e n t r o u - s e s o b r e u m minimalismo juridicamente circunscrito. Mas primeiro foi ne cess cessár ário io se se rea p re n d er que este jur idic am en te necessá necessário rio só só con serva o sentido quando inserido na totalidade viva do serviço divino. divino. Uma Um a part e im po rta nt ntee da crise crise litúrgica litúrgica da época da Re forma baseou-se nessas restrições, e também a crise litúrgica do pr p r e s e n t e só p o d e s e r e n t e n d i d a a p a r t i r d a q u i . Q u a n d o h o j e t o d a a liturgia passou a ser para muitas pessoas o terreno de uma “criatividade” criatividade” privada, po de nd o manifest manifestar-s ar-see da ma neir a como se achar melhor, contanto que as palavras da consagração per maneçam, né>s continuamos diante da mesma restrição surgida de um desenvolvimento errôneo tipicamente ocidental, que na Igreja oriental seria totalmente impensável. Deixemos este exemplo e retornemos mais uma vez à nossa questão. questão. O conceito do infal infalív ível el,, rigidam rigi dam ente ent e delimitado delim itado do p onto on to cie vi vist staa jurídico jur ídico , com o ficou ficou dem on strad str ad o na d isputa ispu ta em torno torn o
J o s e p h R a t z i n g e r
de Küng, só chegou a formar-se com toda esta clareza na Idade Media. Mas isto não quer dizer que antes tudo dependesse do “argumento”, isto é, que permanecesse entregue à disputa dos sábi sábios os.. Não se ju lg ou necessário necessário red uz ir a estr ut utur ur a vi viva va da fé ao esqueleto do infalível, mas o essencial foi visto precisamente na figura figu ra viv viva, assim assim como estava descrita na r eg ra d e fé e na profis profi s são são de fé fé. Tanto Tanto na d ou trin a qua nto n a liturgia liturgia o mai maiss im po rta n te fica perdido, quando se julga que deve-se ficar restrito a um mínimo juríd ico e deixa r tud o o mais mais entre gu e ao arbítr arbítrio. io. Tam bé b é m a q u i d e v e r í a m o s o l h a r mais ma is l o n g e, p a r a alé al é m d o p e n s a m e n to ocidental, e mais uma vez tentar entender a visão original, que qu e em amp la esca escala la ficou ficou conse rvada n o Oriente. Or iente. Não se pod e, decerto, nem se deve abdicar do conhecimento de que, dentro de condições espec especiai iais, s, foi foi dad o à Ig reja o dom da palavra infalí infalí vel. Mas isto só tem sentido quando a fixação de um limite, que se tornou necessária no caso particular, permanece protegida po p o r u m limi li mite te n a e s t r u t u r a viva viv a d a c e r t e z a c o m u m d a fé. Mais Mai s impor im portant tante, e, po rtan to, do d o que o conceito conceito da infalibi infalibilidade lidade,, é o da autoridade, que efetivamente desapareceu quase que por com pl p l e t o d o n osso os so p e n s a m e n t o . Mas d e fato fa to e m p a r t e a l g u m a ele el e po p o d e e s t a r i n t e i r a m e n t e a u s e n t e , poi po i s r e p r e s e n t a u m a c o n d i ç ã o bási bá sica ca d a vida vi da c o m u n i t á r i a . C o m o h a v e r i a d e ser se r se n o E s t a d o só se considerasse como norma obrigatória para todos aquilo que foss fossee con siderad sid erad o com o solução solução infa infalíve lívell de um a questão? O q ue aconteceria se na economia se exigisse o mesmo? E na escola? E na família? A crise de nosso corpo social certamente depende também do fato fato de esta estass tendências tendências persistirem e de se en ten de r a democracia como sendo o constante questionamento de tu do po r p arte de todos. Se os Estados Estados contin uam a existir existir e a ter condições de serem govern go vern ados, ado s, isto só só é possív possível el po rq ue as leis leis continuam a ser vistas como vinculantes (embora podendo ser revistas) quando promulgadas pela competente autoridade. A comparação, comparação, evidentemente, pode clau claudi dica car, r, porq ue na d ou tri na comu co mu m da Ig reja nã o se trata trata da m esm a coi coisa sa que na legisla legisla ção ção do Estado. Estado. Mas Mas de qu alq uer fo rma rm a ela ela mostra qu e a autorida de não pode reduzir-se à infalibilidade. Para uma comunidade que se baseia baseia substancialmen te na convicçã convicçãoo comum, comu m, n ão se pod e pr p r e s c i n d i r d a autoridade no tocante tocante ao ao conteúdo, sobretudo qu an 97
N a t u r e z a e m i s s ã o d a t e o l o g i a
do se l rata de um a auto rida de cuja cuja palavra pode con tinu ar cres cendo e se purificando num desenvolvimento vital. ( iuardem os isto isto como resulta resultado: do: a obrigatoriedade n ão po de ser atribuída unicamente ao que é “infalível”; ela está presente no conjunto da estrutura viva da fé, que como tal deve sempre de novo po de r ser proclamada, par a que não desapareça na con fusão fusão de sem pre novas hipóte hipóteses ses.. Que Qu e a autorida autor idade de conhece graus muito diferentes, isto é claramente afirmado no documento da Congregação para a Doutrina da Fé, e para a teologia isto a ri gor não deveria ser considerado um empecilho, mas sim um es tímulo. tímulo. Mas Mas o fato de u m grau não ser igua iguall ao out ro não signi fica que a auto rida de que se considere m en or não seja seja au tor ida de nenhuma, ou que possa ser considerada apenas como uma hipótese entre outras. Aqui haveria necessidade de mais uma vez ser formada uma consciência nova e mais diferenciada, e esta esta foi foi a con tribu ição que a Ins truç ão quis quis oferecer. oferecer. b) M a g i s t é r i o , u n i v e r s i d a d e e m e i o s d e c o m u n i c a ç ã o
Pass Passem emos os a um a seg und a p ergu nta, que envolve envolve dois dois aspec aspec tos. to s. Trata-se, Trata-se, p o r um lado, do l ugar ug ar cia teologia teologia na uni versid ade, e por outro da maneira como pode ser enfrentada a fecunda tensão entre magistério e teologia, com que se ocupa a Instru ção. Já lembrei acima a tendência extremamente duvidosa de jo j o g a r - s e o Es E s t a d o c o n t r a a I g r e j a , r e c o r r e n d o - s e a ele e le c o m o r e f ú gioo de um a liberd ade su postam ente am eaçada pela Igreja. gi Igreja. Esta Esta tendência, qu e à luz luz da história história deve ser ser considerada como fr an camente absurda, costuma estar associada ao argumento mais suti sutill de que a naturez a da universidade não pod e harmonizar-se com as exigências do magistério; o lugar tradicional da teologia na “casa casa da ciência” ciênci a” estaria am eaçado eaç ado pelas exigências do magis tério, diz o G ru po de Trabalho dos teólogos teólogos dogmáticos e fu nd a mentais de língua alemã8. Ora, a presença da teologia na uni versidade, a meu ver, é uma preciosa herança, que precisa ser defend ida. O fato de a teologia teologia ter um lug ar e um a voz voz na “ca “casa sa da ciência” ciência” é imp ortan or tan te p ar a ambos os lados - pa ra a teologia teologia e pa p a r a as de d e m a i s ciên ci ênci cias as.. A po p o s s i b i l i d a d e d e p e s q u i s a r e fa f alar aqui 8. L.c., p. 674.
Joseph Ratzinger
com a seriedade e a liberdade que convêm ao esforço científico deve ser considerada por todos como de grande importância. Mas Mas por q uan to tem po o lug ar da teologi teologiaa na universidade ain da po derá ser ser defendido, num a soci sociedad edadee que sempre mais mais pr e tend e defini definir-s r-see como declara dam ente agnóst agnóstica ica,, é um a questão cuja serieda de não po dem os ignorar. ignorar. Pois Pois a perm pe rm anê ncia nci a da teo logia logia na uni versida de pressu p ressu põe qu e a sociedade, sociedade, apesar de basi camente neutra do ponto de vista ideológico, confere à íê cristã um valor todo especi especial al par a sua pró pr ia solide solidezz intelectual, intelectual, não a colocando, por conseguinte, no mesmo plano que qualquer ou tra religião religião ou ideolo ideologia gia.. Q uan to tem po isto isto há de d urar, nós não sabemos. Mas o que qu e deve ser discutido aqui não é esta questão, sob re a qual a teologia deve refletir com seriedade em toda parte onde está inserida nas universidades estatais. O que aqui me interessa é um problema mais profundo, a saber, como deve a teologia de term te rm in inar ar seu lug ar na ciên ciênci cia, a, e com isto isto seu seu lugar lu gar institucio nal. Que a teologia não é uma disciplina qualquer como as ou tras já ficou claro desde o início, e mesmo hoje isto não deve cair no esquecimento com a enganosa aparência de u m carát er cien tífico, que de qualquer modo não existe como grandeza única. Qu and o historiad historiadores ores do peso peso de um T h. Mommsen, um Jacob Bu rckh ardt e um Golo Golo Mann lembram que a histó história ria não p ode pr p r o p r i a m e n t e s e r u m a ciên ci ênci cia, a, p o r n ã o t e r p o r o bjet bj etoo o rep r epet etíí v e l , mas sim o irrepetível9, também para os teólogos isso teria que ser um a oca ocasiã siãoo de refletirem sobre a pecu liaridade liarid ade de sua ciên cia e de terem coragem de apresentá-la como como possu idora de u m caráter próp rio. Em bora deva ser ser defe ndid o o lugar da teologia teologia na “cas “casaa da ciência”, ela não p od e esq uecer uec er que q ue está em casa em mais de uma moradia. Sob esse ponto de vista merece atenção um artigo publicado recentemente por G. Alberigo sobre o de senvolvimento e as peculiaridades da teologia como ciência10. Alberigo mostra como no final do século 12, num movimento um tanto brusco, a teologia transfere-se dos lugares que havia ••
9. Cf. J. Fest. Wege zur Geschichie - Uber Th. Mo mm sen, J. Burckhardt u.G. u.G. M ann. Zurique, 1992; p. ex. p. 35, 81, 130. 10. G. Alberigo. Sviluppo e caratteri delia teologia come scienza. In: Cmlianesimo nella storia, storia, 11, 1990, p. 257-274. 99
N a t u r e z a e m i s s ã o
da
t . e o 1o g i a
ocupado até então - a casa do bispo, o mosteiro e o convento dos clérigos regulares - para a universidade, um novo lugar eclesialmente neutro, com isto provocando uma modificação ra dical tanto do ponto de vista institucional quanto espiritual e científico. Alberigo mostra também com clareza como, em face do cansaço da teologia patrística e monástica, este processo era inevitável. E bem destacado o ganho que a teologia obteve com este processo, e que não em último lugar consistiu na “maior liberdade da pesquisa teológica”. Mas o notável historiador es clare clarece ce também a outra face face desta “mu dan ça de lu gar ” da d ou trina (e da pesquisa), que a afasta dos “centros mais vitais da Igreja”, diocese e mosteiro, com isto acarretando seu distancia me nto da pasto ral e da espiritu alidade alida de d a igreja lo local. O fato fato de a teologia teologia voltar-s voltar-see p ar a 11111 estatuto científico deu início a uma tendência de separação entre a teologia e a vida da Igreja; formou-se u m “hiato “hiato cada vez vez mais forte en tre a com unida un ida de cris cristã tã e a instituição instituiç ão eclesiás eclesiástica tica,, p o r 11111 lado, e a corpo ração dos teólo gos, por outro. O fato de o novo lugar da pesquisa e do ensino teológ teológico ico passar a ser a univers idade sem dúv ida alg uma um a fez fez com com que seu seu dina mismo mis mo ecle eclesi sial al se empobrecesse, além de se pa rar a teologia do con c onta tato to vivo vivo com as experi exp eriên ência ciass espirit esp irituai uais”1 s”111. E mais um a conseqüê ncia im porta po rtante nte passa a ser vis visív íveel: a inten sidad e da mu dan ça realizada afa afast stou ou drasticamente o pensam ento cris cris tão da forma por ele apresentada no primeiro milênio, como também da cultura grega e oriental. “A teologia científica rapi dam da m ente en te passo u a ver-s ver-see como u m a teologia latina latina e ocidental, o que esteve longe de ser uma escolha consciente”12. A teologia que só qu er ser s er univers uni versitária itária e “científica”, “científica”, 110 sentido sentido da univ er sidade moderna, distancia-se de seus grandes contextos históri cos, torna-se eclesialmente estéril. Ne N e ste st e c o n t e x t o , n ã o se p o d e d e i x a r d e a b o r d a r t a m b é m a questão de como as tensões tensões po derão der ão ser suportad as com sentido. sentido. O fato de a Ins truç ão rejeitar o apelo aos aos meios meios de comunicação como caminho pa ra o diálogo diálogo entre magistério magistério e teologi teologiaa d ep a rou-se com decidida oposiçã oposição. o. Pode-se Pode-se com pree pr ee nd er qu e os mei meios os de comunicação comunicaç ão tenham-s tenha m-see irritado irrita do com esta esta passagem. Mas Mas nem 11. L.c., p. 272. 12. Ibid., p. 272s. 100
J o s e p h Ra t z i n g e r
mesmo os teólogos, manifestamente, querem renunciar a esta arma. En quanto o documento do Grup o de Trabalho Trabalho de língua língua alemã se expressa com bastante cuidado, os teólogos austríacos dizem aber tam ente en te que, diante das das eventuais med idas canônicas canônicas com que o magistério tenta “im po r a próp pr óp ria linha ”, seria “inevi “inevi táve távell u m a pressão co ntrá ria através dos meios meios de c omunicaç om unicação”. ão”. Nã N ã o d e s e j o d i s c u t ir c o m m a i o r p r o f u n d i d a d e a es e s t r a n h a idé id é i a d e magistério, de pressão e contrapressão, que se manifesta aqui. Sobre este assunto deve-se dizer que os números 29-31 da Ins trução, quando separados de seu contexto, principalmente dos pa p a r á g r a f o s 25 e 26, 26 , p o d e r ã o s e r m a l e n t e n d i d o s . Pois p o d e r i a surgir a impressão de que só secretamente o teólogo poderia apresentar suas convicções contrárias às autoridades do magis tério, e que qu e não nã o obt o bten en do êxito ele ele teria qu e sofrer em e m silêncio13 silêncio13. Mas Mas de tod o o contexto, que se ocupa ocu pa com as tensões tensões prod utivas utiva s e seu valor, resulta claramente que não se trata aqui de comuni caçõ cações es “secretas” “secretas”,, mas sim de um diálogo diálogo qu e se m antém an tém no p la no eclesial e científico, evitando as deformações provocadas pe loss meios lo meios de comunicação. comunic ação. Se isto isto é “secreto “secr eto”, ”, então ent ão tam t am bé m toda to da ciênci ciênciaa deve ser con siderad side radaa como “secreta”. Na realid ade o que aqui importa é o convencer, não através de “pressão”, e sim dos argumentos. E se os teólogos acusam o magistério de desconfi ança (onde (on de é que a encon tram ?), fica fica dif difíc ícil il evitar-se evitar-se a impressão impre ssão de qu e eles eles não acredita m q ue se possa causa r impressão sobre o magistério po r meio de razões; razões; que p ar a consegui-l consegui-loo seria neces neces sário sário de m on stra r forç força. a. Arr egim entar o po de r da mídia con tra o magistério eclesiástico é hoje muito fácil; mas não consigo imagi na r como alguém possa possa admitir que desta form a se se este esteja ja servin do à verdade e à unidade na Igreja. Pois pode-se admitir que nestas questões de uma leal discrepância trata-se de problemas que pressupõem um conhecimento da ciência teológica e uma atitude de fé e de confianç confiançaa par a com a Igreja. Igreja. Um a e ou tra não são questões para os meios de comunicação, que neste caso cer tamente não servirão ao aprofundamento da discussão mas an tes tes ao ao ard or das contr contradiç adições. ões. Na sociedade sociedade m od ern a do m inad a 13. 13. É assim assim que o texto é enten did o por W. Gross. Gross. Prop het gcg en Institution im alten Israe Israel? l? Wa rnun g vor vermeintlichen Gegen sãtzen. In: In: Theol. Q ua rta lsch r 171, 1 71, 1991, p. 15-30; ver sobre isso p. 21 nota 19.
Na N a t u r e z a e mi s s ã o d a t e o l o g i a
pel p eloo s m eios ei os d e c o m u n i c a ç ã o , o d i r e i t o ecles ecl esiá iást stic ico, o, vist vi stoo c o m o tão perigos perigoso, o, e o perigoso po de r de Roma apare cem antes como o jovem Davi frente ao gigante Golias. Quando os titulares dos cargos cargos apos apostól tólic icos os ousam hoje assumir a autorid ade da d ou trina que lhes foi confiada, é quase inevitável que venham a cair na existência apostólica descrita por Paulo com estas palavras: “Tornamo-nos até agora como o lixo do mundo, como a escória de todos” tod os” (1 (1 Co r 4,13). 4,13). Em nossa sociedade a au to rid ad e eclesiá eclesiás s tica tica só pod e co nt ntin inua ua r a ser ser exercid a sob o signo signo da contradição; é precisamente assi assim m que ela reassume sua verdad eira natureza. c) T r a d i ç ã o p r o f é t i c a c o n t r a t r a d i ç ã o e p i s c o p a l ?
Por último último gostaria gostaria de fazer fazer pelo meno s u ma menção ao já p o r vári vá rias as veze ve zess m e n c i o n a d o t e x t o d e t eól eó l o g o s l a t i n o - a m e r i c a nos, sob retudo retu do brasilei brasileiros. ros. Discutir seus seus argu m ento s históric históricos os e sua vis visão ão da teologia nos levaria levaria pa ra muito além do âmbito des sas considerações. Existem aqui, sem dúvida alguma, aspectos interessantes, que merecem ser considerados. Gostaria apenas de ocu par-m e brevem ente com um a idéia bási básica ca.. Apelando p ara Ef 2,20 2,20,, e fazendo menção a uma palavra do Ca rdeal N ewman, os autores vêem na Igreja duas correntes de tradição: a linha episcopal e a linha profética, pois a Igreja estaria con stru ída so br b r e o f u n d a m e n t o d o s a p ó s t o l o s e d o s p r o f e t a s 14. Essas Es sas d u a s t r a diçõ di ções es também parecem fun dam entad as na oposiç oposição ão e conviv convivên ên cia dos apóstolos Pedro e Paulo, um representando a preserva ção e outro o progresso; um que representa a tradição judeucristã, o outro que é o porta-voz do novo cristianismo proveni ente dos pagãos15. A estas diferentes correntes correspondem também , se gu nd o o texto, diferenças na ênfase da cris cristolo tologia gia.. O cristia cristianismo nismo da linha episcop episcopal al privilegiaria privilegiaria um a leitura juríd ica do Jesus histórico e do colégio apostólico; a tradição profética teria como base sobretudo o Cristo ressuscitado e glorificado, que através através do Espírito seri seriaa enco ntra do na história história,, e sobre tu do nos oprimidos, em seu apelo por vicia e liberdade. Os Doze seriam aqui entendidos substancialmente como comunidade messiânica, como união simbólica do novo Israel e de todos os 14. L.c., p. / /4 [ver nota 2, acima]. 15. Ibid., p. 777. 102
Joseph Ratzinger
po p o b r e s . N e sta st a li l i n h a d e t r a d i ç ã o p r o c u r a - s e o u v i r o Es E s p í rit ri t o - C r isis to,, mais to mais ou m enos no sentido d e Jo 16,1 16,13: 3: “Qu an do vier o Espí rito da verd ade, ade , ele ele vos vos ensinará toda a ver da de ”16 ”16. Certa me nte é verd ade que a tradição tradição cris cristã tã conhece diferen tes acentos, e que a tentação de uma concepção unilateralmente ju j u r í d i c a e i n s t i t u c i o n a l d a I g r e j a t e m n e c e s s i d a d e d e s e m p r e d e novo abrir-se e ampliar-se por uma visão da dimensão pneumatológica. Mas dividir os diversos vultos entre duas linhas tra dicionais, a episcopal e a profética, é questionável. E muito de desejar que se chegue a uma discussão mais profunda sobre o que significa a categoria profética e o que ela não significa. W. Gross Gross resum e o resultado de um cuidadoso estudo dos achados veterotestamentários com as seguintes palavras: “[...] Não obs tante, mesmo que nos limitemos aos profetas da Escritura, de Amós a Ezequiel, dentro de um povo que basicamente funcione como povo de YH WH , ou que pelo meno s este esteja ja aberto às refor ref or mas, nada se confirma da difundida idéia de que aos profetas caberia substancialmente a função de, como opositores dos de tentore s dos cargos, cargos, pr eservar eser var através da crítica crítica radical a neces sária tensão e nt re carisma e cargo”17 cargo”17. A p ar tir ti r daí Gross conclui: conclui: “O profetismo, como categoria total, não esclarece, mas antes obscure obs curece”1 ce”188. Os clic clichês hês,, hoje com uns, uns , o nd e se gosta de ap rese re se n tar as força forçass de prot esto como p ortad or tad oras or as d a profecia fren te aos aos detentores dos cargos, são insustentáveis. Seria necessário que pa p a r a além al ém dess de ssas as idéi id éias as g r o s s eir ei r as se foss fo ssee atr at r ás d o r e t o s e n t i d o e das das verd adeiras adeir as exigências exigências do profetismo. Se na gr an de varie v arie dade de formas do profetismo nos for lícito interrogar por sua natureza mais profunda, só poderemos enxergá-la no fato de o profeta estar em uma missão direta de Deus, e de em última análise ele ele só po d er basear-se nesta missão d ire ta1 ta 19. Mas Mas isto isto como o mostr ou W. W. Gross - inclui inclui tam bém bé m que q ue o profeti smo “só existe à custa do falso profetismo”20. Em última análise, só re trospectivamente é que se esclarece quem de fato era profeta. 16. Ibicl., p. 781. 17. L.c.,p. 29. 18. Ibicl., p. 23. 19. Cf. Gross. L.c., p. 26. 20. Ibicl., p. 30.
N a t u r e z a e m i s s ã o d a t e o l o g i a
Nã N ã o res re s t a d ú v i d a q u e s e m p r e d e n o v o t a m b é m f o r a m d a d o s à Igreja vultos proféticos, quer pensemos em Hildegarda de Bingen, em Francisco de Assis, em Catarina de Sena, em Santa Brígida da Suécia ou em Santo Inácio de Loyola, para citar ape nas uns poucos exemplos. Não resta dúvida, também, que os ofíc ofício ioss na Ig reja c o rre m o ris risco co de de ixa r de lado as voze vozess pro fé ticas, porque elas incomodam. Neste sentido, sempre de novo devemos deixar-nos interrogar por esses apelos e permanecer abertos para a presença do Espírito, que pode perfeitamente incomodar. incomodar. O discernime nto dos espír espírito itos, s, como como diante d a pr o bl b l e m á t ica ic a d o s p r o f e t a s e p r o f e c i a s d e e n t ã o , é e x i g i d o n a P r i m e i ra Epístola aos Tessalonicenses (5,9ss), continua sendo nossa ta refa constante. Faz pa rte disto disto tanto ta nto o aceitar a críti crítica ca justificada ou os novos caminhos que se abrem à Igreja quanto o proteger os fiéi fiéiss das falsif falsificaç icações ões do Evange Eva ngelho lho,, de d e u m a diluição dilu ição da d a fé pelo espírito espírito do lem po, q ue tenta apresen tar-se como o Espíri Espírito to San to. Só numa profunda unidade interior com Cristo, só numa obediência à Palavra de Deus sempre de novo vivida, e só num enraizamento interior na Igreja viva de todos os lugares e de todos os tempos, é que p ode rem os a p re n d er este este discernimento. discernimento. Mas Mas do pe rdã o e da correção, nós se mp re temos necess necessidade idade..
Comoafésignificaumcompromissoúltimo com com Deus Deus, , com com a verdade verdade, , ela elade de fatoforneceao fatoforneceao homem homem normas normas para para sua suaaçã ação oso soci cial al concre concreta. ta. Mas Mas opontodeuniãodacomunidadedoscrentesnão está está na prátic prática asoc social ial ou polític política, a, e si sim munic unicament amente e no compromisso compromisso propriament propriamente edi ditocom tocom a verdade verdade.. Quandoessecompromissoédesfeito,surgemem lugardelenovoslaços. “Averdadeliberta.”Ocompromissocoma verdadeeqüivale verdadeeqüivalea a liberta libertara ra polític política ado dos s compromiss compromissos os com comosagra osagrado. do. Neste Neste sentidoo sentidoo pluralis pluralismo mo nãoapenas nãoapenaspodeestarlig podeestarligado ado com coma a fé, fé, maslheéadequado,eemcertamedida necessário.
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