O Livro Tibetano dos Mortos Bardo
Thodöl (em tibetano: ; transliteração Wylie: bar-do thos-grol ; IPA: [pʰàrdo tʰǿɖøl], onde bardo é "liminaridade" e thodol é “libertação”)[1] é denominado também de A Grande Libertação Pela Auscultação Durante os Estados Intermediários ou Liberação Através da Escuta . No Ocidente é chamado de O Livro Tibetano dos Mortos ,
como referência ao Livro dos Mortos do Antigo Egito. É um texto sagrado do Tibete cuja intenção é guiar a consciência de uma pessoa através de experiências a serem vividas por ela após sua Morte – intervalo este, segundo o budismo tântrico, compreendido entre a morte e o próximo renascimento. Além disso, o texto cont ém capítulos que abordam os sinais da morte e os rituais a serem realizados para o funeral do Seudas conteúdo é fundamental para os processos de corpo. iniciação escolas budistas tibetanas. Pertencendo à literatura Nyingma do Tibete, é ti do como o texto tibetano mais célebre e difundido internacionalmente.[2] A tradição do tantrismo considera este texto como um dos maiores “tesouros da terra” ( gter ma ), cuja compilação, datada do séc. VIII d.c., se atribui ao grande mestre Padma Sambhava. Acredita-se que o livro foi escondido por ordem de Padma Sambhava para que no futuro fosse encontrado. Em meados do séc. XIV, como almejado, o tertön (que, em tibetano, significa “descobridor de tesouros da prática budista”), Karma Lingpa, o encontrou no interior de uma gruta próximo ao Himalaia. No Ocidente foi dado a conhecer, pela primeira vez, em 1927, através da tradução para o inglês realizada por W.Y. Evans-Wentz.
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Ilustração tradicional tibetana sobre o vislumbre das Divindades Pacíficas no plano do pós-morte, segundo o Livro Tibetano dos Mortos, Bardo Thodöl.
ciência de si e da compreensão da realidade. Na tradição tibetana, o livro é lido por um monge a um moribundo, geralmente em voz alta, e continua a ser recitado por 49 dias (7 semanas) mesmo após seu falecimento. Os tibetanos acreditam que, ainda após a morte, a consciência permanece em contato com o local de falecimento e ainda pode assimilar as mensagens transmitidas pelo monge. Dessa forma, acredita-se que uma pessoa que passe pela grande “cirurgia da morte” com conhecimento sobre “o outro lado da vida” pode, como indica o livro, saber como se conduzir nos diferentes estados de consciência do planopós-morte.
História
Não se sabe ao certo há quantos séculos ou milênios surgiu o conteúdo do Bardo Thodöl. Tratar-se de uma tradição secreta, transmitida ao longo do tempo, não existindo, com isso, registros de sua srcem. Oriunda da antiga religião Bön, acredita-se que sua compilação remonte ao séc. VIII d.c., cuja supervisão esteve a cargo do grande mestre budista e Guru Rinpoche, Padma Shambava, o primeiro lama, tido pela sociedade tibetana como a segunda encarnação de Sidarta Gautama, o Buda.
Nesse sentido, o Livro dos Mortos do Antigo Egito possui intenção semelhante: auxiliar o moribundo na passagem pelo limiar da morte e servir como guia para a vida da alma.
O Livro Tibetano dos Mortos afirma não apenas que a O livro foi revelado ao ocidente pelo Dr. T. W. Evansconsciência persista após a morte, mas que é possível Wentz, pesquisador da Univesidade de Oxford, que tramorrer de modo que seja atingido o despertar da cons- duziu e examinou seu conteúdo, lançando-o em 1927, e 1
2 CONTEÚDO DO LIVRO
2 alcunhando-o de “Livro Tibetano dos Mortos”. Em uma de suas edições, C. G. Jung escreve um prefácio analisando o texto a partir de um ponto de vista psicológico. Jung declara ter sido um leitor assíduo do livro, devendo a ele muitas de suas ideias fundamentais. Ele escreve: “Todo leitor sério forçosamente irá perguntar-se se estes antigos sábios lamas, afinal de contas, não poderiam ter vislumbrado outras dimensões, arrancando assim o véu de um dos maiores mistérios da vida.” [3]
sempre que as visões são apenas a projeção e emanação de sua própria consciência. O livro insiste que a pessoa deve compreender que a primeira visão que lhe acometer, a percepção da irradiante Clara Luz Primordial, é a visão do mergulho da consciência sobre teu próprio ser - um vislumbre do esplendor que emana de sua própria essencialidade, a energia propulsora que habita o vazio do coração (ao qual, pela última vez, acabara de bater). Assim, o livro intenta ao moribundo a não se abalar com tal vislumbre, preparando-o para a apreensão das visões subsequentes.
Segundo a tradição tântrica, a única verdade é a Clara Luz, ou seja, a própria manifestação do vazio - de formas e substâncias -, pura consciência irradiante. 2 Conteúdo do livro Concentrando-se na Luz e deixado de lado todos os afeO texto, tido como uma das quintessências da filosofia tos, o morto poderá atingir o estado de consciência sutântrica, é um guia para a consciência do moribundo atra- pramundana universal, a iluminação do Nirvana. Caso vessar os cambiantes fenômenos dos reinos do pós-morte: através da leitura, o espírito não tenha atingido a plena os estados de consciência que continuam por, no mínimo, compreensão do processo, a alma acabará por cair nova49 dias após a morte, seguindo até a próxima encarnação. mente no mundo fenomênico e retornará ao ciclo samsáSegundo observação de Evans-Wentz, o Bardo Thödol é rico de renascimentos. um processo de iniciação acujo propósito restaurar, espírito do desencarnado, divindade queéele perdeu no ao nascer. O livro, em linguagem ricamente alegórica, além de alertar o espírito a guiar-se pelo grande caminho da libertação (do sofrimento), o prepara para uma descida rumo à existência física - ao renascimento. O livro declara que, após a morte, o ser desencarnado se confronta com várias cenas, visões, aparições, etc. Em cada um destes bardos ocorrerão experiências e visões distintas e, por vezes, aterradoras. Assim, a leitura ritualística aconselha ao moribundo a atravessar todo o processo do pós-morte com total tranqüilidade e consciência desperta. Segundo o comentário de Sua Santidade, o 14º Dalai-Lama: "o importante não é somente a preparação para um renascimento futuro mais elevado, mas também, e num sentido ainda mais fundamental, a preparação pessoal do indivíduo para usar sua própria morte e os estados a ela subsequentes como meios para alcançar a libertação da consciência."[4]
Yantra. O yantra místico é tido como a representação simbólica do aspecto de uma divindade.
Segundo o texto, o conteúdo da mente projetado e tornado visível dependerá das crenças e criações mentais Para tanto, o livro indica que é necessário obter a seguinte anteriores. Assim cada pessoa obterá experiências totalcompreensão: após a morte, tudo o que o se vê e ex- mente diferentes umas das outras. periencia lhe parecerá real, embora se trate tão somente As formas e imagens descritas no livro são adaptadas à do conteúdo de sua própria mente projetado e tornado cultura tibetana, que possui uma visão própria do que perceptível tal como se fosse realidade - ou seja, tudo o ocorrerá após a morte. Por isso, o texto considera que
formasque vivenciar é outraa coisa que suas o tibetanoMas teráoexperiências típicaspode de seus costumes repensamento , ounão melhor, experiência de próprias si mesmo. As- ligiosos. que está descrito variar de pessoa sim, no plano do pós-morte, a consciência experiencia a para pessoa, de cultura para cultura, dependendo das exvida a qual acabara de viver, mas sob uma nova perspec- pectativas dos recém-desencarnados. Dessa forma, os tiva: em lugar de experienciar a realidade a partir de si, a cristãos ortodoxos, por exemplo, poderão ter visões soconsciência experiencia a si a partir da própria realidade bre o purgatório, o inferno ou mesmo o paraíso. Tudo ao qual experienciou. Ao longo da leitura, o texto adverte isso varia de acordo com a experiência de vida, as cren-
3 ças, memórias, pensamentos, sentimentos e expectativas de cada um.
logo após a morte, ao qual pode ser compreendido como a fase do surgimento das “ilusões kármicas”.
O livro tem como objetivo último anular a queda do ser que, alienado de si pelo egoísmo, perambula no caminho da ignorância por efeito daheresia da separatividade, reestabelecendo na consciência a reconciliação com a unicidade cósmica, o Macrobios, Deus, a Realidade Fundamental que sustenta o todo do universo.
3. O Sidpa Bardo ou "bardo do renascimento"ː se refere aos impulsos de renascimento e aos estados psicológicos pré-natais.
livro tambémdemenciona trêsno outros intermediários consciência planobardos, da vidaːou estados Essas indicações do Bardo Thodöl assemelham-se sig- O nificativamente às recentes pesquisas de Terapia de Vidas assadas. Na TVP, acredita-se que a alma se depara 1. O Rang bzhin Bardo – bardoda" Vida", ouo estado com suas criações mentais e expectativas e percebe aquilo de consciência desperta comum; mesmo que espera que aconteça. Acredita-se também que há semelhanças entre o conteúdo do Bardo Todhöl e as pesquisas sobre a ação das moléculas de DMT na glândula pineal, bem como a relação das descrições do texto com as experiências deêxtase divino, uso de substâncias enteógenas, transe ritualístico, projeção da consciência, etc.
2. O Bsam gtan Bardo –bardodo "Dhyana", ou estado de meditação (ou de concentração meditativa); 3. O Rmi-lam Bardo – bardo do " Sonho", o estado de sonho durante o sono normal.
"Ó nobre filho, ouve atentamente sem distrair-te. estadosdurante de Bardo, que são: o estadoExistem naturalseis do Bardo a vida; o Bardo do estado onírico (durante o sono); o Bardo do equilíbrio extático (da profunda meditação); o Bardo do momento da morte (Chikhai Bardo); o Bardo da experiência da Realidade (Chönyid Bardo); o Bardo do processo inverso da existência sangsárica (ou o bardo do renascimento, Sidpa Bardo)... Ó nobre filho, é chegado o momento daquilo que denominam “morte”... Não te apegues mais a esta vida por fraqueza ou covardia... Não sejas fraco, não te apegues... Lembra-te que a preciosa verdade, agora, a ti se revelará...” [3] [p 71/72] Cópia dos manuscritos srcinais do Livro Tibetano dos Mortos
3 2.1
Os seis bardos
O Bardo Thodöl distingue seis bardos. Em cada um dos bardos, a experiência consciente do ser senciente tem qualidades próprias. Segundo a tradição tântrica, existem técnicas de meditação específicas, que correspondem a cada uma dessas qualidades, para conduzir o ser à realização da consciência sobre a natureza suprema da mente e seus fenômenos.[4] Os três bardos do estados intermediários de consciência no plano pós-morte sãoː
Fundamentos
O livro aborda os seguintes fundamentosː
3.0.1
1) A eternidade da consciência
A eternidade da consciência: a consciência que perfaz a realidade para si mesma, revelando a persistência da vida após a morte. Essa ideia é abordada em todo o livro onde enfatiza claramente que a verdade não pode ser encontrada na rede de ilusões do mundo, mas ape-
1. O Chikhai Bardo ou “bardo do momento da morte” ː nas no esplendor da percepção dos planos superiores é o bardo dos acontecimentos psíquicos no mo- ou seja, no despertar da plena consciência de si. Tanto o Budismo, quanto o Hinduísmo, afirmam que a rede de mento da morte, a experimentação da Clara Luz Priilusões é gerada pelos infinitos e sedutores tentáculos da mordial, essencialidade do ser. deusa Mahamaya, no qual constitui Brahman dos Rishis, 2. O Chönyid Bardo ou " bardo da experimentação da o Sonhador de Maya, o Tecelão da Teia das Aparências, realidade"ː trata do estado de sonho que começa pura ilusão do ciclo de nascimentose mortes – o Samsara.
3 FUNDAMENTOS
4 3.0.2
2) Planos de existência
A existência de outros planos de realidade além do plano físico. O Bardo Thodöl descreve os diversos estágios ou níveis de percepção da ascensão da consciência. 3.0.3
3) A Clara Luz Primordial
A existência da luz essencial, ou divina, da qual o livro chama de a Clara Luz Primordial – a “luz no fim do túnel” que relatam algumas experiências de pós-morte. “O teu ego e teu nome estão em fins de acabar. Estás pondote em frente à maravilhosa Clara Luz Primordial.” [5] A Clara Luz é o despertar do ser para a compreensão de sua verdadeira natureza, a essencialidade de si. Através de seu esplendor, o espírito obtem a plena clareza e consciência sobre a realidade. O livro fala da existência da Clara Luz, mas vai além: diz que existem três níveis dessa luminosidade, em cada um dos três bardos. 3.0.4
4) A experimentação da verdade
A sensação de transcendência e unidade conferida pelo contato com a Clara Luz. “Quando o corpo e a mente Pintura tradicional tibetana ilustrando a Roda da Vida e os reise separam, experimentas uma rápida visão da Verdade nos do Samsara. pura, sutil, radiante, brilhante, vibrante, gloriosa.”[3] 3.0.5
5) A compreensão da realidade
consciência. Desta maneira podes obter conhecimento próprio e libertar-te. No retorno ao plano dos nascimentos e mortes, a alma aguarda sua libertação”[7].
O princípio da compreensão da realidade, do vazio supracósmico: ausência de formas, objetos, tempo e espaço. “Não-pensamento, não-visão, não-cor. É vazio”. “Esse 3.0.7 7) O renascimento vazio não é o nada” [6], afirma o liv ro. Mas é pleno de consciência e realidade. “O intelecto brilhante é silenci- O Livro Tibetano dos Mortos declara – assim como a oso, inabalável e cheio de felicidade. Este é o estado da TVP (Terapia de Vidas Passadas) – que é possível preperfeita iluminação”. ver a personalidade da próxima vida, segundo o fluxo kármico do espírito. O Bardo Thodöl não dá detalhes sobre isso, mas afirma: “É chegado o tempo de retornar. 3.0.6 6) A perda do ego Faça a seleção de tua futura personalidade de acordo com os melhores ensinamentos. Escuta bem: os sinais e caracHá três estados de perda dos invólucros ou camadas da consciência (o que para o Espiritísmo se denomina, terísticas do nível de existência a vir aparecerão ante a ti perispírito), ou seja, três diferentes formas de expressar a em sinais premonitórios. Reconheça-os”. individualidade no plano objetivo: etérico, astral e mental. “Agora vais experimentar três bardos. Três esta3.0.8 8) A união com um feto dos de perda do ego.” O que o livro chama de “jogos de alucinações fantasticamente variados” são as formas percebidas por aqueles que acabaram de morrer, isto é, Pouco antes do nascimento, o futuro encarnado é compea visão das formas-pensamentos vividas e experimenta- lido a unir-se a um feto. Nesse sentido, o Livro Tibetano das em sua última vida. Segundo o livro, vemos aquilo dos Mortos faz a seguinte afirmação: “Teu estado mental que criamos mentalmente ao longo são da vida. “Para agora afetará posterior nível deeser.” Isso pode desuficiente saber que estas aparições as formas detiteué monstrar que, seu antes do nascimento na fase intrauterina, próprio pensamento.” Em outra parte, o livro ressalta que o estado mental, nossas reações ao que ocorre no meio a libertação do jogo ilusório da existência é possível atra- e nossa predisposição psíquica podem influenciar a gevés da observação das formas psicológicas que atraves- ração do feto, o nascimento e as tendências futuras. É sam nossa mente: “Medita calmamente sobre o conheci- notório observar as semelhanças com as atuais pesquisas mento de que estas visões são emanações de tua própria psicológicas sobre regressão à fase intrauterina.
5
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Referências
[1] Fremantle (2001: p.21): “Liberation is synonymous with the Sanskrit word bodhi, which means awakening, understanding, or enlightenment, and with nirvana, which means blowing out or extinction: the extinction of illusion.” [2] Dorje, Gyurme. “The Tibetan Book of the Dead.”, A Brief Literary History of the Tibetan Book of the Dead. (Penguin Classics Deluxe Edition, 2007). Traduzido para o inglês por Gyurme Dorje.ISBN 978-0-14-310494-0. [3] WENTZ, Evans. O Livro Tibetano dos Mortos . [S.l.]: Pensamento. [4] Coleman, Graham. O Livro Tibetano dos Mortos . São Paulo: Martins Fontes, 2010. [5] WENTZ, EVANS. O Livro Tibetano dos Mortos. [S.l.]: Pensamento, 2008. [6] WENTZ, Evans. O Livro Tibetano dos Mortos. [S.l.: s.n.]. [7] WENTZ, Evans. O Livro Tibetano dos Mortos. [S.l.: s.n.].
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Ligações externas •
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Bardo Thodol - versão (PDF) em domínio público (em inglês) The Tibetan Book of the Dead - Ebook (em inglês)
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Fontes dos textos e imagens, contribuidores e licenças
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Texto O Livro Tibetano dos MortosFonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/O_Livro_Tibetano_dos_Mortos?oldid=46630663
Contribuidores:
RafaAzevedo, Ripchip Bot, KLBot2, Caçador de Palavras, Gato Preto, Guilherme Minoti e Anónimo: 8
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