VI ENCONTRO TECNOLÓGICO DA ENGENHARIA CIVIL E ARQUITETURA ENTECA 2007
O MONADNOCK BUILDING E A ALVENARIA ESTRUTURAL João Dirceu Nogueira Carvalho.1 Humberto Ramos Roman2
RESUMO O Monadnock Building é um edifício comercial construído nos Estados Unidos, em Chicago, Illinois, em 1889. Esse edifício é muito citado em trabalhos na área da alvenaria estrutural, aliás, é difícil uma dissertação de mestrado, ou tese de doutorado, em que, ao apresentar um histórico da alvenaria não o cite e, até mesmo apresente uma imagem mostrando-o. Porém, são citações rápidas, algumas poucas linhas sobre a sua importância histórica e, sempre enfatizando que suas paredes, ao nível do solo, têm 1,80 m de espessura. Neste texto pretende-se ampliar um pouco as informações sobre este edifício, pontuando alguns aspectos relativos ao seu contexto histórico, à sua construção, à sua importância para a alvenaria estrutural e enfatizar alguns conceitos entre as estruturas em alvenaria daquela época, a “alvenaria das paredes estruturais” e a alvenaria estrutural atual.
Palavras-chave: Alvenaria estrutural. Edifícios históricos. Monadnock.
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Prof. Dr., Universidade Estadual de Maringá - Departamento de Engenharia Civil. E-mail:
[email protected] Prof. Ph.D., Universidade Federal de Santa Catarina – Departamento de Engenharia Civil. E-mail:
[email protected]
VI ENCONTRO TECNOLÓGICO DA ENGENHARIA CIVIL E ARQUITETURA ENTECA 2007
O MONADNOCK BUILDING E A ALVENARIA ESTRUTURAL 1 O EDIFÍCIO MONADNOCK Antes dos anos 1870, os americanos já viam a transformação de seu país em uma nação industrial e urbana, e Chicago (Illinois), mais que qualquer outra cidade, representava esta transformação. Chicago nasceu como um obscuro posto comercial no começo do século, em 1837 ao receber o título de cidade tinha pouco menos de 5.000 habitantes, em 1850 aproximadamente 30.000 e, à época do grande incêndio, em 1871, já era um grande entroncamento ferroviário e um importante centro comercial (o segundo maior dos Estados Unidos) com pouco mais de 330.000 habitantes, ultrapassando St. Louis e se tornando a quarta maior cidade no país (SMITH; McCORMICK, 1996). Em 8 de outubro de 1871, às nove horas da noite de um domingo teve início um incêndio de grandes proporções que devastou a cidade (Figura 1). Alguns fatores como a predominância das construções em madeira, as calçadas das ruas em pranchas de madeira, os materiais inflamáveis usados nas construções em alvenaria e os ventos elevados fizeram com que o fogo se espalhasse rapidamente. As tentativas de debelar o incêndio foram prejudicadas também pela falta de água, pois os reservatórios estavam com os níveis muito baixos devido a um período de seca e, ainda, poucas horas após iniciado o incêndio o telhado da estação de bombeamento desmoronou fazendo com que todos os esforços dos bombeiros se tornassem inúteis. Após mais de trinta horas, na manhã de terça-feira, a chuva começou a cair, e o incêndio foi finalmente debelado, porém, com mais de 300 vítimas fatais, uma área aproximada de 8 km² (um pouco acima de 6 quilômetros de comprimento por 1 quilômetro de largura) arrasada e em torno de 100.000 desabrigados. Foram destruídos mais de 120 quilômetros de estradas, 190 quilômetros de calçadas, 2.000 postes de ruas, 17.500 edifícios, e $222 milhões de dólares em propriedades, aproximadamente um terço do valor da cidade à época (WIKIPEDIA, 2007).
a)
b)
Figura 1: Imagens do grande incêndio de Chicago.
c)
Fontes: a) ILLINOIS STATE MUSEUM (2007); b) CITY OF CHICAGO DEPARTMENT OF PLANNING AND DEVELOPMENT (2007), c) NORTHWESTERN UNIVERSITY (2007)
Uma grande manifestação de caridade e solidariedade se formou no pais e ao redor do mundo para ajudar a cidade e, seus habitantes deram início a uma notável reconstrução. Doações de dinheiro, de alimentos, de roupas e de materiais chegaram rapidamente de toda a nação. A primeira carga da madeira serrada para a reconstrução foi entregue no dia em que se apagou o fogo do último edifício em chamas e, assim, no período de um ano a maioria dos sinais visíveis da destruição tinham sido apagados. O grande incêndio tornou-se um ponto de inflexão da história de Chicago, a cidade expandiu com a sua reconstrução, consolidou a reputação de uma metrópole próspera, como o lugar da oportunidade, da renovação, e da promessa de um futuro promissor. Apenas 22 anos mais tarde, 2
VI ENCONTRO TECNOLÓGICO DA ENGENHARIA CIVIL E ARQUITETURA ENTECA 2007 Chicago recebeu mais de 21 milhões de visitantes durante a World's Columbian Exposition (WIKIPEDIA, 2007). Foi neste contexto que os irmãos Peter e Shepherd Brooks, investidores da cidade de Boston, contrataram o advogado Owen F. Aldis como seu representante em Chicago e começaram a investir na construção de prédios na cidade. No início da década de 1880 realizaram mais um investimento: compraram um terreno que ocupava todo a quadra entre as ruas South Dearborn Street, South Federal Street, West Jackson Boulevard e West Van Buren Street (Figura 2), na vizinhança do Loop3, na região central de Chicago. Era um terreno comprido e estreito com aproximadamente 128 m (420 pés) na frente para a South Dearborn Street e 21,5 m (70 pés) na frente para a West Jackson Boulevard. Decididos pela construção de um edifício comercial, mesmo sabendo que este seria um edifício alto e estreito, os irmãos Brooks entregaram projeto e a execução aos arquitetos Burnham & Root4.
Figura 2: Mapa parcial da cidade de Chicago – localização do Monadnock Building. Fonte: (INTERATIVE…, 2007)
A empresa de Burnham e Root era um dos principais escritórios de arquitetura de Chicago à época da Escola de Chicago5 e já tinham feito anteriormente dois outros projetos comerciais para os irmãos Brooks: o Montauk Building em 1882 e o Rookery Building em 1886. Root e Burnham, além de uma grande amizade desde 1872, tinham uma relação profissional muito boa onde cada um complementava as habilidades individuais do outro. Root era um arquiteto talentoso e prolífico, de grande habilidade e competência, como também um engenheiro inventivo, responsável pelos projetos do escritório, enquanto Burnham era um homem de negócios, um executivo capaz e, um vendedor quase irresistível, era o encarregado da administração da firma, dos projetos, do contato com os clientes, e foi o grande responsável pelo rápido crescimento da empresa (COMMISSION ON..., 2007). Desde 1884 Peter Brooks e seu representante Owen Aldis já discutiam os planos iniciais para a metade norte do terreno. Peter Brooks tinha dúvidas em relação ao local, tão distante ao sul do centro comercial da cidade, mas sua decisão pela construção foi acertada, pois em seguida foram construídos outros arranha-céus em blocos adjacentes. Os projetos de execução foram completados por Burnham e Root no verão de 1889 (COMMISSION ON..., 2007). 3
Conhecido como o centro histórico da cidade, o Loop é a segunda maior zona comercial de centro de cidade nos Estados Unidos, depois do centro de Manhattan. 4 Arquitetos Daniel Burnham e John Wellborn Root. 5 Um movimento criado por um grupo de arquitetos de Chicago no final do século XIX, muito influentes, incluindo Adler e Sullivan, Burnham e Root, William LeBaron Jenney, cuja filosofia central era que o projeto arquitetônico deveria ser atual. Os princípios desta escola foram aplicados inicialmente nos edifícios e residências, mas sua maior e mais durável influência foi no projeto dos edifícios, e suas maiores realizações foram no projeto estrutural.
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VI ENCONTRO TECNOLÓGICO DA ENGENHARIA CIVIL E ARQUITETURA ENTECA 2007 Uma das principais características dos projetos de Root era a ornamentação elaborada das fachadas de seus edifícios. No início dos trabalhos considerou um tema egípcio, usando uma lótus estilizada como seu motivo decorativo, porém Brook insistiu na simplicidade, em alternativas sem ornamentos exteriores. Estabelecida esta premissa, Root priorizou a forma da edificação para dar força ao projeto e examinou as possibilidades do tijolo e granito como materiais, com a introdução de variações sutis de cores. Assim a metade norte do Monadnock emerge como uma estrutura totalmente sem adornos, sem precedentes nos trabalhos da escola de Chicago (COMMISSION ON..., 2007). Os dezesseis andares do Monadnock mostraram, técnica e economicamente, ser a maior altura possível para um sistema estrutural em alvenaria. O peso próprio já era extremamente elevado e uma construção mais alta teria necessitado uma área desproporcional para as fundações e, a espessura das paredes teriam sido muito maiores que os 1,80 m (seis pés) usados nas paredes do andar térreo reduzindo, ainda mais, a área útil dedicada às lojas. Mas a opção pelos 16 pavimentos foi proveniente de uma decisão comercial. Os esboços iniciais mostram uma elevação do edifício com apenas doze pisos. A influência de Aldis foi muito importante neste ponto. A cidade de Chicago estava analisando uma regulamentação que limitaria a altura de edifícios comerciais à largura da rua de paramento e esta restrição da altura traria resultados desastrosos na renda potencial do empreendimento. Dessa forma tentaram obter uma licença para pelo menos dezesseis pavimentos antes que fosse muito tarde, embora, nas palavras de Aldis, “o comissário de edifícios estivesse chocado pelos dezesseis pavimentos”. A licença foi obtida no dia 3 de junho de 1889. As janelas envidraçadas ressaltadas (em sacadas) devem-se também ao êxito da argumentação de Aldis em relação às objeções de Brooks quanto às projeções da fachada. O projeto original de Roots não incorporava sacadas com janelas, mas Aldis mostrou a Brooks o ganho financeiro que seria obtido com o espaço adicional proveniente das sacadas (COMMISSION ON..., 2007). A Figura 3 mostra imagens da fachada norte. As Figuras 3 (a) e (c) mostram a fachada norte (West Jackson Boulevard) e a lateral (South Dearborn Street) sendo a primeira uma foto do início do século e a segunda mais recente. A Figura 3.b mostra as duas colunas de janelas em sacadas. A Figura 4.a) mostra a entrada e o detalhe das paredes do Monadnock, onde a alvenaria desenvolve uma concavidade à altura do segundo pavimento, para então elevar-se retilínea até o topo do prédio e a 4.b) apresenta desenhos esquemáticos da elevação, corte e plantas. Mas, já é o momento de se fazer uma correção. Nos parágrafos acima comete-se, propositalmente, um erro bastante comum ao se falar do Monadnock. Na realidade foram projetados e construídos quatro edifícios independentes, projetados de forma que pudessem operar como quatro edifícios comerciais separados, cada um estava em seu próprio terreno, tinha sua própria entrada, elevadores, sistema de aquecimento e nome próprio. Uma das entradas, a da West Jackson Boulevard, ganhou a preferência popular e, dessa forma, o conjunto dos quatro edifícios como um todo, passou a ser conhecido internacionalmente pelo nome de um dos quatro edifícios: Monadnock. Normalmente, tendo por referencia a fachada lateral norte/sul, estes edifícios são citados como “metade sul” e metade norte” do Monadnock, sendo que o edifício Monadnock é um dos dois edifícios da metade norte. Quanto aos nomes dos edifícios, Peter Brooks tinha a preferência por nomes indígenas, inicialmente pensou no nome do edifício como "Quamquisset", mas depois optou por nomes de montanhas de New Hampshire, seu estado natal, e o substituiu por “Mt. Monadnock”. Finalmente estes edifícios receberam os nomes (de norte para sul) de Monadnock, Kearsarge, Katahdin, e Wachusett. No caso específico do Monadnock, este nome tem sua origem em um termo geológico que indica uma montanha isolada cercada por uma planície. O Monte Monadnock, é um pico de 965 m no sudoeste 4
VI ENCONTRO TECNOLÓGICO DA ENGENHARIA CIVIL E ARQUITETURA ENTECA 2007 de New Hampshire, que ainda hoje, é um ponto turístico e chama a atenção por seu relativo isolamento de outras montanhas (UNIVERSITY OF ILLINOIS, 2007).
a)
b)
Figura 3: Monadnock Building – Fachada norte.
c)
Fonte: a) UNIVERSITY OF OKLAHOMA (2207), b) MONADNOCK BUILDING (2007a) e c) STAUB, (2005).
a)
b)
Figura 4: Monadnock Building – a) Entrada principal e b) Corte, elevação e plantas. Fonte: a) UNIVERSITY OF OKLAHOMA (2007), b) MONADNOCK BUILDING (2007b) e c) ARCHINFORM (2007).
Observa-se que alguns textos atribuem os nomes dos edifícios a nomes de navios da armada norte americana da época da guerra civil [MONADNOCK BUILDING (2007b)]. Vários navios foram batizados com estes nomes. Na Figura 5 mostra-se dois navios de guerra USS Monadnock.
Figura 5: Navios de guerra norte americanos – USS Monadnock de 1864 e de 1883. Fonte: a) THE CALIFORNIA STATE MILITARY MUSEUM (2007), b) NAVAL HISTORICAL CENTER (2007).
Os edifícios não foram construídos simultaneamente. A construção começou com a metade norte (o Monadnock e o Kearsarge) e, após a sua execução em 1891 iniciou-se a metade sul (o Katahdin e o 5
VI ENCONTRO TECNOLÓGICO DA ENGENHARIA CIVIL E ARQUITETURA ENTECA 2007 Wachusett). Mas a metade sul não teve a participação de Root e Burnham. John Wellborn Root morreu de pneumonia em janeiro de 1891 aos 41 anos, enquanto a metade norte ainda estava em construção. Nesta época Root e Burnham estavam desenvolvendo o projeto e execução do World's Columbian Exposition 6 e a morte de Root forçou Burnham a concentrar suas energias no projeto da exposição, impossibilitando o desenvolvimento do projeto da metade sul. Para o projeto da metade sul do Monadnock, os incorporadores decidiram por outro escritório de projeto: a Holabird e Roche, a segunda maior firma de arquitetura da Cidade. William Holabird, o mais desenvolto, e atuava como engenheiro e sócio empresarial enquanto Martin Roche era o projetista principal. A metade sul foi iniciada em 1891 e concluída em 1893 (COMMISSION ON..., 2007). Holabird e Roche mantiveram algumas características da metade norte, como a escala, a cor e a textura da fachada, mas, com outro estilo arquitetônico. Enquanto a metade norte é chamada freqüentemente de “a origem da arquitetura moderna” por causa da ausência total de ornamentos externos, a metade sul do edifício, ornamentada exteriormente, é uma aplicação precisa dos princípios arquitetônicos clássicos aplicados nos projetos de edifícios altos naquela época. Outras modificações feitas pelos arquitetos diferenciam bastante a metade sul da norte. Por exemplo, o tratamento arquitetônico dado aos três andares inferiores (Figura 6) e, as janelas em sacadas, onde optaram por apenas uma coluna central, enquanto a fachada norte tinha duas colunas de janelas em sacadas. Mas a grande diferença entre as duas metades do edifício foi outra, e radical. A metade sul do edifício foi construída com a mais avançada tecnologia (para a época) em estruturas metálicas. Não são conhecidas as razões para esta mudança, mas é possível imaginar: o novo sistema estrutural possibilitou colunas mais esbeltas e janelas mais largas, com maiores áreas envidraçadas, permitiu a ampliação do espaço das lojas e escritórios e, a possibilidade da construção muito mais rápida, reduzindo os custos de construção (COMMISSION ON..., 2007). Na Figura 6 apresenta-se um esquema da elevação da fachada lateral leste (South Dearborn Street) onde se pode visualizar as metades norte (a direita) e sul, e algumas das modificações feitas por Holabird e Roche no projeto da metade sul.
Figura 6: Monadnock Building – esquema da elevação da fachada leste. Fonte: (MONADNOCK BUILDING, 2007b).
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Ocorreu em 1893 em homenagem aos 400 anos da viajem de Colombo
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VI ENCONTRO TECNOLÓGICO DA ENGENHARIA CIVIL E ARQUITETURA ENTECA 2007 A Figura 7 mostra imagens da fachada sul (West Van Buren Street) e a lateral (South Dearborn Street), sendo que, 7 (a) e (b) são fotos antigas, a primeira de 1893 ao final da construção, e a segunda, uma foto do início do século com o prédio já em uso e, a foto 7.c) é uma foto relativamente recente.
a)
b)
Figura 7: “Monadnock Building” – Fachada Sul.
c)
Fonte: a) HOLABIRD E ROCHE (1893); b) MONADNOCK BUILDING (2007b), c) LORENTZ (2007).
A Figura 8 mostra alguns detalhes que diferenciam as metades norte e sul. Em 8.a) pode-se observar na junção dos dois edifícios que a metade sul tem o térreo um pouco menor, não tem as paredes côncavas no segundo pavimento e tem, acima deste, uma pequena platibanda. Em 8.b) o detalhe das cornijas no topo do prédio da metade sul (Figura 7) que individualizam as metades norte e sul.
a)
c)
Figura 8: Detalhes que individualizam as metades norte e sul. Fonte: a) BRAINSNACK (2007), b) CRANE (2007).
O edifício Monadnock, com seus16 pavimentos, 65 metros de altura, e suas paredes, na base, com 1,83 metros de espessura, foi um marco na história da alvenaria; mas, se por um lado significou o apogeu da utilização desta técnica construtiva, por outro, marcou o início de seu declínio. Assim, o Monadnock é o símbolo de uma transição histórica no desenvolvimento dos sistemas estruturais, como o término de um sistema construtivo tradicional de construção e o início de outro. Seu projeto e execução delinearam os limites para a construção em alvenaria na época, justamente quando 7
VI ENCONTRO TECNOLÓGICO DA ENGENHARIA CIVIL E ARQUITETURA ENTECA 2007 novos materiais, o aço (usado pela primeira vez em edifícios em 1885, na construção do Home Insurance Building, Chicago) e o concreto armado, rapidamente conquistavam seu espaço. Em 1758, o inglês Smeaton desenvolveu um material de alta resistência através da calcinação de calcários moles e argilosos. Em 1818, o francês Vicat (considerado o inventor do cimento artificial) através da mistura de materiais argilosos e calcários obteve resultados semelhantes aos de Smeaton e, em 1824, o químico inglês Joseph Aspdin fabrica o cimento em bases científicas e obtém a patente do "Cimento Portland", outorgada pelo Rei Jorge IV (CIMENTO WEB, 2007). Em 1849, Lambot construiu um barco em concreto, armado com redes metálicas. Em pouco tempo verificou-se que este novo material tinha uma boa resistência à compressão, porém, uma baixa resistência à tração, o que motivou a adição de aço a esta pasta de concreto, originando o concreto armado. Logo se percebeu que o potencial deste novo material era muito grande, e aos poucos, diminuiu-se o empirismo que dominou o início do concreto armado, passando-se a estudá-lo de forma mais racional. Em pouco tempo o concreto teve um desenvolvimento vertiginoso. Na virada do século XIX para o XX pesquisadores de diferentes paises, entre os quais Mörsch e Koenen da Alemanha, Christophe da Bélgica, Coignet e Tedesco da França, publicaram textos estabelecendo a forma de cálculo em concreto armado e, ainda na primeira década do século XX, surgiram em vários países as primeiras instruções ou normas regulamentando o projeto e a execução de obras de concreto armado (Alemanha em 1904, França em 1906 e Suíça em 1909). O desenvolvimento do concreto deve-se, sem dúvida, à sua facilidade de conformação. O uso do concreto armado passou a ter uma utilização mais racional, fundamentada em estudos teóricos e experimentais, o que era inovador para a época. O desenvolvimento desses estudos levou a um aprimoramento contínuo desse material e a construção de grandes estruturas em concreto e/ou aço a partir do início do século 20, mais leves, mais esbeltas, mais resistentes e melhor compreendidas tecnicamente, tornaram esses materiais os mais utilizados nas estruturas em todo o mundo e, a alvenaria, passa a ser usada apenas nas obras de pequeno porte ou como elementos de vedação nas grandes estruturas de concreto e/ou aço, marcando seu fim como material estrutural para obras de grande porte.
2 A ALVENARIA ESTRUTURAL Embora a alvenaria tenha deixado de ser usada como sistema estrutural para edifícios altos e tenha sido relegado ao uso em obras de pequeno porte ou como material de vedação nos edifícios de concreto e/ou aço, a sua utilização como material estrutural continuou sendo objeto de estudos e pesquisas em diversos centros de pesquisas ao redor do mundo. Os blocos cerâmicos já haviam sido desenvolvidos na Europa em 1870, em 1875 já eram produzidos nos Estados Unidos. Os primeiros ensaios de resistência de tijolos foram executados na Inglaterra e em 1876 foram feitas as primeiras tentativas de normalização dos ensaios. Nos Estados Unidos, entre 1882 e 1906 foram ensaiados no “Watertown Arsenal”, cerca de 173 pilares de alvenaria. No período compreendido entre 1910 e 1928, no National Bureaul of Standards (NBS), Estados Unidos, foram desenvolvidas várias pesquisas com paredes axialmente carregadas. Em 1918 A. Brebner publica os resultados de seus estudos teóricos e experimentais. Os ensaios em prismas surgiram, pela primeira vez em 1929, abrindo a possibilidade de se estimar, satisfatoriamente, a resistência à compressão de paredes de alvenaria mediante ensaios nesse tipo de corpo de prova.
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VI ENCONTRO TECNOLÓGICO DA ENGENHARIA CIVIL E ARQUITETURA ENTECA 2007 O conhecimento da alvenaria executada desde a antiguidade até o Monadnock, empírico, sem um embasamento científico, teórico e/ou experimental onde, os poucos conceitos estruturais eram muito mais voltados à mecânica das estruturas do que para as características e propriedades do material, começa a se modificar, começa a se embasar cientificamente fundamentando-se em pesquisas teóricas e experimentais. Esta tendência, enfatizada com o concreto e o aço, passa a determinar, a partir do final do século 19, os novos rumos da engenharia e o futuro da alvenaria. Estabelece-se uma nova concepção para a alvenaria. O empirismo predominante até então cedeu lugar ao estudo racional e científico de como construir em alvenaria; os fabricantes de tijolos reuniram-se em associações buscando o desenvolvimento e a divulgação do material; pesquisadores vinculados a estas associações ou às universidades iniciam o estudo racional da alvenaria. Estudo racional porque era baseado em metodologias teóricas e experimentais, tanto para os materiais quanto para as técnicas e processos construtivos envolvidos. Esta nova forma de se trabalhar com a alvenaria originou o que hoje se denomina ALVENARIA ESTRUTURAL. Paul Haller, engenheiro Suíço, após uma série de pesquisas com a alvenaria, projetou e construiu, em 1951, em Zurique, aquele que é considerado o primeiro edifício em alvenaria estrutural (Figura 9). Seus edifícios de 13 pavimentos tinham paredes internas com 15 cm de espessura e externas com 37,5 cm. A partir desse edifício, a alvenaria estrutural volta a ser considerada uma alternativa viável como sistema estrutural. No final da década de 50, intensificam-se as pesquisas em alvenaria estrutural, com a criação ou revisão das normas técnicas em vários países, assim como a disseminação desse conhecimento dentro das universidades norte-americanas, européias e asiáticas.
Figura 9: Edifício de apartamentos – Suíça, 1951. Fonte: SAHLIN (1971), p. 265. 3 A ALVENARIA DE “PAREDES ESTRUTURAIS” E A ALVENARIA ESTRUTURAL A alvenaria executada até a época do Monadnock pode ser chamada de “alvenaria de paredes estruturais”, pois, a ação do vento era aplicada na fachada normal à ação (Figura 10) e resistida por ela, apenas por ela, e consequentemente, as grandes, as imensas espessuras dessas paredes externas dos edifícios construídos até o século XIX (no caso do Monadnock, 1,83 metros na base e 0,30 metros no topo). O cálculo era feito através de regras empíricas, por exemplo, “A espessura mínima de parede [...] deve ser 30 cm para uma edificação de 1 pavimento, e deve-se adicionar 10 cm à espessura da parede para cada andar adicional” (BUSSAB; CURY, 1990, p.37). Na alvenaria estrutural (de 1950 para cá), a ação do vento é aplicada nas lajes (Figura 11), sendo que cada piso é solicitado por uma carga equivalente ao produto da ação do vento (kN/m 2) pela sua 9
VI ENCONTRO TECNOLÓGICO DA ENGENHARIA CIVIL E ARQUITETURA ENTECA 2007 área de influência (largura da fachada normal à direção do vento pela metade da distância entre os planos médios das lajes) acrescido da somatória das ações de vento sobre os pavimentos acima. wi wi W
a) Planta – parede externa
b) Corte longitudinal – parede externa
Figura 10: Alvenaria de paredes estruturais - ação do vento na parede externa.
Considera-se a laje como um diafragma de rigidez axial infinita e, dessa forma, a resultante da ação do vento em cada laje é distribuída proporcionalmente nas paredes sob a laje,conforme a rigidez de cada parede. Na Figura 11, mostra-se à esquerda, o esquema da elevação de um edifício, com a fachada sob a ação do vento e a sua distribuição em cada laje e, à direita, o as paredes sob a laje que irão resistir esta ação. Observa-se na figura à direita a necessidade de se dispor paredes orientadas em ambas as direções, pois, a rigidez das paredes é considerada em relação à orientação do vento. wi W1 W2 Wn-3 WB,i
Wn-2 Wn-1 WA,i
Wn a) Elevação – ação do vento
b) Planta – ação do vento resistida pelas paredes
Figura 11: Alvenaria estrutural - ação do vento nas paredes do pavimento.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Em 1938, o Monadnock Building, metades norte e sul, foi completamente restaurado e, 116 anos após sua construção, continua sendo usado como um dos mais tradicionais e belos edifícios comerciais de Chicago. Grandes corporações, bancos, e profissionais liberais estão instalados em seus mais de 1600 escritórios.
5 REFERÊNCIAS ARCHINFORM - International Architecture Database. Disponível em:
. Acesso em: 19 jun. 2007
BUSSAB, S; CURY, F. J . Arquitetura. In: Manual técnico de Alvenaria. ABCI - Associação Brasileira da Construção Industrializada. São Paulo: ABCI, 1990.
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VI ENCONTRO TECNOLÓGICO DA ENGENHARIA CIVIL E ARQUITETURA ENTECA 2007 BRAINSNACK Photo Gallery. Division between the North and the South. Disponível em: . Acesso em: 19 jun. 2007
CIMENTO WEB, Disponível em: < http://www.cimento.com.br/historia.htm >. Acesso em: 11 abr 2007 COMMISSION ON Chicago Historical and Architectural Landmarks. Disponível em: . Acesso em: 19 jun. 2007
CITY OF CHICAGO DEPARTMENT OF PLANNING AND DEVELOPMENT , Landmarks Division, Fire ruins, 1871. Disponível em: .
Acesso em: 19 jun. 2007
CRANE, B. Cornice Detail, South Half . Disponível em: . Acesso em: 19 jun. 2007
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