CADERNO DE PENAL II AULA 01 - TEORIA DO CRIME 1. Infração penal a. Crime X Contravenção b. Conceito I- Material II- Formal III- Analítico Dentro da ordem dos atos ilícitos existe um gênero que é a infração penal. A infração penal é um gênero de ato ilícito. Não é qualquer ato ilícito que se constitui em infração penal, apenas as mais graves, que ofendem os bens jurídicos mais importantes. O Crime pode ser conceituado do ponto de vista material, formal e analítico. No Brasil existem duas espécies de infração penal formalmente consideradas: I.
os crimes e;
II.
as contravenções penais
Mas qual a diferença entre os dois? Determinar que o crime é mais grave não é critério suficiente para compreender tal diferença. Na realidade essa é uma distinção meramente formal, presente no art. 1º do decreto-lei 3914/41, que afirma: “considera-se Crime a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer combinada com a pena de multa. Contravenção é a infração que a lei comina pena de prisão simples ou multa isoladamente ou ambas, alternativamente ou cumulativamente.
CRIME TIPO DE PENA PRIVATIVA DE Reclusão ou detenção
CONTRAVENÇÃO Prisão simples
LIBERDADE ESPÉCIE DE AÇÃO PENAL
Ação penal públicaAção penal (condicionada ouincondicionada incondicionada) ou ação penal privada
PUNIBILIDADE DA TENTATIVA
É punível
Não é punível
EXTRATERRITORIALIDADE
É admitida
Não é admitida
COMPETÊNCIA
Competência estadual ou federal Competência estadual.
pública
Exceção: foro por prerrogativa de função do contraventor LIMITES DAS PENAS
30 anos
05 anos
PERÍODO DE PROVA NO SURSIS
02 a 04 anos (podendo ser de 04 01 a 06 anos a 06 anos)
Observação: Reclusão admite regime inicial fechado. A detenção não pode começar com regime fechado, mas pode regredir para este. A prisão simples, de forma contrária, somente admite regime aberto ou semiaberto, nunca fechado. As contravenções são necessariamente de menor potencial ofensivo. É importante atentar que a classificação da infração em crime ou contravenção depende da vontade do legislador ao cominar a pena do ato. Observação: Existe algum crime para o qual não se comina pena de reclusão e nem detenção? A Lei de tóxicos nº 11346/06 traz um tratamento diferente para o usuário de droga, para os quais a pena se resume a advertência, prestações de serviços comunitários e comparecimento a palestras que advertem sobre os malefícios da droga.
Do ponto de vista material, crime corresponde ao comportamento humano que representa uma das mais graves formas de violação a um dos bens jurídicos
fundamentais da sociedade. O crime, do ponto de vista analítico, é a conduta típica (precisa estar prevista em lei como crime, se encaixa a um modelo abstrato previsto na norma), antijurídica (contrária ao direito) e culpável (passível de responsabilização pessoal do sujeito). Nesse sentido, uma determinada conduta somente será considerada como infração penal se apresentar esses três requisitos simultaneamente. O crime corresponde sempre a um comportamento comissivo ou omissivo de alguém, ou seja, o crime é um fazer ou um não fazer criminoso. Sempre correspondente à conduta humana. Vale ressaltar, entretanto, que existem condutas típicas que não são antijurídicas, como, por exemplo, o aborto para salvar a vida da gestante ou o estado de necessidade ou ainda a legítima defesa. A conduta ainda pode ser típica e antijurídica, mas não culpável, quando o responsável, por exemplo, é menor de idade, ou ainda quando o mesmo foi coagido a cometer o crime. Repita-se: para ser considerada criminosa uma conduta deve ser típica, antijurídica e culpável. 2. Crime a. Sujeitos i. Ativo o Classificação do crime quanto ao sujeito ativo ▪ Comum ▪ Próprio ➢ Mão própria ii. Passivo b. Objeto Para o direito penal, o sujeito ativo do crime é o autor da infração penal, aquele que realiza a conduta típica, com sua ação ou omissão. No que tange ao sujeito ativo há uma classificação de crimes: o comum, o próprio e o de mão própria. O comum é aquele que pode ser cometido por qualquer pessoa. O próprio, porém, não pode ser cometido por qualquer um, necessita de uma condição especial. Os crimes de bigamia, infanticídio ou peculato, por exemplo, são crimes próprios. Nos crimes próprios é possível ainda que a pessoa se valha de uma interposta pessoa para cometer o crime. Corrupção passiva, por exemplo. Os crimes de mão própria são aqueles em que a lei exige que sejam realizados pessoal e diretamente pelo sujeito ativo, ou seja, ele não pode executar o crime por interposta pessoa. É o caso do art. 338, o reingresso de estrangeiro expulso, ou do art. 342, do falso testemunho. O crime é visto tradicionalmente como um fato individual, então, pessoa jurídica pode praticar crime? Pode ser responsabilizada penalmente? Durante muito tempo prevaleceu
o brocardo penal “societas delinquere non potest (sociedade delinquir não pode)”. Entretanto, percebeu-se que muitas vezes a pessoa física comete um crime para favorecer a pessoa jurídica e não a si própria. Com a CF/88 vieram os arts. 173, parágrafo 5º, e 225, parágrafo 3º. O primeiro traz a possibilidade da responsabilização da pessoa jurídica nos crimes contra a ordem econômica, financeira e contra a economia popular, com as penas coerentes com sua condição. Entretanto, ainda não há lei cominando tais penas, não houve a regulamentação do dispositivo, ou seja, ainda não há responsabilização penal para a pessoa jurídica para tais crimes. O segundo estabeleceu a possibilidade de responsabilidade penal da pessoa jurídica por crimes ambientais, independente de sua reparação. Este dispositivo, diferentemente do primeiro, foi regulamentado pela lei 9605/98, art. 3º, seguindo dois requisitos: O crime ambiental que pode ser imputado à pessoa jurídica tem que ser decidido por alguém que responda pela empresa: o representante legal, o representante contratual ou o órgão colegiado. Sendo o empregado responsável, ele responde, eximindo a
empresa. É importante ressaltar que a responsabilização da empresa não exime a responsabilização da pessoa física. O crime tem que ser cometido em prol, em benefício, da pessoa jurídica em questão. Do ponto de vista formal o sujeito passivo de um crime é sempre o Estado, já que este que tem o direito formal de punir. Mas do ponto de vista material, o sujeito passivo é o titular do bem ou interesse tutelado pela norma. O sujeito passivo pode ser uma coletividade? Sim, existe uma categoria de crime que tem como sujeito passivo uma coletividade destituída de personalidade jurídica: o crime vago. Porte de arma, crimes contra o meio ambiente, dentre outros. Quando se fala do objeto, há o jurídico e o natural. Do ponto de vista natural ou naturalístico, o objeto material do crime é a pessoa ou a coisa sobre a qual recai a conduta. É importante ressaltar que nem todo crime recai sobre um objeto material. O objeto jurídico, por sua vez, é o bem ou interesse jurídico tutelado pela norma. No homicídio, a vida; no peculato, a administração pública; no furto, o patrimônio. 3. Teorias da conduta a. Causalismo b. Finalismo (Welzel) c. Classificação i. Ação ii. Omissão o Omissão imprópria Todo crime corresponde a um comportamento humano. Ainda que seja praticado por intermédio da pessoa jurídica, a pessoa jurídica vai atuar por intermédio da pessoa física. O século XX foi o século das brigas pelas teorias da conduta. Já foi uma discussão muito polêmica, mas hoje já pacificada. A teoria causalista entendia que a conduta seria toda causa voluntária modificativa ou não impeditiva de um resultado no mundo exterior. Em outras palavras, conduta é o controle inicial dos movimentos do seu corpo, que produz resultados no mundo exterior. Tal teoria, que vigeu até o final da segunda guerra mundial, tinha um problema muito sério, motivo pelo qual foi substituída pela teoria finalista, que vige até hoje: se conduta é um comportamento que produz resultados no mundo exterior, como explicar o crime omissivo? Então, a partir da década de 40, Welzel modifica a teoria da conduta do delito com sua teoria finalista. Para tal teoria a vontade do sujeito integra a ação do começo ao fim. Para o causalismo o que importa é a conduta inicial, para o finalismo o que importa é a intenção do resultado. Observação: Existem situações pelas quais não existe crime por ausência de conduta:
coação física (utilização do corpo de alguém como mero instrumento para ferir alguém/ a coação física exclui a conduta e, portanto, a própria tipicidade); ato reflexo (espasmo Muscular involuntário); estados de inconsciência ou de subconsciência provocados por causa fortuita ou força maior independente da ação do agente, como a hipnose ou o sonambulismo. A conduta humana pode ser classificada em ação ou omissão. Daí surge os crimes comissivos e omissivos. O comissivo é aquele que o tipo penal (a lei penal) é caracterizado pela ação do sujeito. O omissivo é aquele no qual você deveria agir e se omite. O mais conhecido é a omissão de socorro, do art. 135 do CP. Os arts. 269 e 319a. são outros exemplos. É possível cometer um crime comissivo por omissão? Às vezes a omissão é tão grave que é equiparada a ação. Uma mãe que não alimenta o seu filho para que ele morra de inanição, responde por homicídio, é o que se chama de omissão imprópria. Art. 13, parágrafo 2: a omissão é penalmente relevante, ou seja, que a omissão é equiparada a uma ação, quando o agente podia e devia agir para impedir o resultado. O dever de agir é incumbido àquele que tem por lei (contrato/verbalmente) obrigação de cuidado, proteção ou vigilância (o garantidor). Também é garantidor a pessoa que de qualquer outra forma assumir a responsabilidade de evitar o resultado ou aquele que com seu comportamento anterior criar o risco de ocorrência do resultado (quem criou o perigo que evite o dano). d. Resultado i. Naturalístico o Materiais o Formais o Mera conduta ii. Normativo Existem duas concepções de resultado para efeitos penais. Uma concepção é aquilo que chamamos de resultado naturalístico. Este consiste na modificação do mundo exterior provocada pela conduta do agente. Exemplo: no caso do homicídio a morte da vítima. É possível que exista um crime que não provoque modificação no mundo exterior? Sim, como a ameaça de morte, por exemplo. Nós podemos fazer uma classificação do crime quanto ao resultado: existem os delitos materiais, formais e de mera conduta. Apesar de existirem autores que não fazem mais a distinção entre os dois últimos conceitos. O crime material ou de resultado é aquele cuja consumação depende da produção de um determinado resultado naturalístico. Exemplo: lesão corporal. Os crimes formais, por sua vez, são crimes de consumação antecipada. Aqueles em que o legislador prevê a conduta e prevê o resultado. Mas sua consumação se dá com a prática da conduta, independentemente da produção do resultado. Exemplo: extorsão, art. 158, diz: constranger alguém mediante violência ou grave ameaça, com intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer ou deixar de fazer algo (ação: constranger; resultado: obtenção de devida vantagem econômica). Mas este crime não exige o resultado para ser consumado, já que é um crime formal.
Outros exemplos: calúnia, difamação ou injúria. Basta que haja a ofensa para o crime estar consumado, não se fazendo necessário provar que houve ofensa à honra objetiva da vítima. Os crimes de falsidade material e ideológica também são crimes formais: basta que se falsifique o documento para o crime ser consumado, sem a necessidade de ser apresentado a outrem ou haver a utilização do documento. Assim como o crime de extorsão mediante sequestro, que está consumado a partir do sequestro da vítima, sem a necessidade de obtenção de vantagem econômica. No crime de mera conduta, diferentemente dos demais, a lesão ao bem jurídico é a própria conduta, independentemente da produção do resultado, é o crime no qual a conduta em si mesmo consiste na lesão ao bem jurídico, a conduta se confunde com o resultado. Exemplo: a desobediência legal a uma ordem de um funcionário público; a violação de domicílio. Observação: a tentativa de um crime não é exemplo de crime material, formal ou mera conduta. Pois estes exemplos consistem em crimes completos e a mera tentativa não se caracteriza desta forma. Resultado normativo parte da ideia de bem jurídico. Consiste na lesão ou no perigo de lesão provocado pela conduta do agente, ou seja, do ponto de vista normativo, o resultado é a lesão ou o perigo de lesão provocado pelo agente. Entretanto, se não há lesão, não existe crime, é crime impossível. Ninguém pode ser responsabilizado pela intenção, mas pela lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico. Todos os crimes, portanto, são de resultado normativo. AULA 02 - RELAÇÃO DE CAUSALIDADE MATERIAL 1. Problema Para que haja um crime é necessário que haja um desvalor de uma ação, ou seja, uma conduta ilícita, ação ou omissão contrária ao direito; e um resultado com lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico. Além disto, é preciso também que haja um elo, um vínculo entre a conduta e o resultado. Alguém só responde por um resultado se deu causa a este resultado, ninguém responde por um resultado ao qual não contribuiu. Observação: Dar causa ao resultado não significa dizer o cometimento de um crime, mas é o primeiro passo para o problema. Nexo causal é o vínculo, elo imprescindível que deve ligar conduta ao resultado. CP, Art. 13 - O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
Conceito de nexo de causalidade É o vínculo entre conduta e resultado. O estudo da causalidade busca concluir se o resultado, como um fato, ocorreu da conduta e se pode ser atribuído, objetivamente, ao sujeito ativo, inserindo-se na sua esfera de autoria por ter sido ele o agente do comportamento.
E o que é causa? Ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. Art. 13 do CP adotou a causalidade simples ou conditio sine qua non.
O art. 13, do CP adotou a causalidade simples, generalizando as condições, é dizer, todas as causas concorrentes estão no mesmo nível de importância, equivalendo-se em seu valor (é a teoria da equivalência dos antecedentes causais ou da conditio sine qua non)
O art. 13 caput revela como causa todas as condutas e efeitos pretéritos sem as quais o resultado não ocorreria como ocorreu = teoria da equivalência dos antecedentes causais. E como saber se o resultado foi determinante para o resultado? À teoria da equivalência dos antecedentes causais SOMA-SE a teoria da eliminação hipotética. Causa efetiva = teoria equivalência dos antecedentes causais + teoria da eliminação hipotética
Ex: morte com emprego de veneno. Teoria da equivalência das condições. O agente compra veneno. Compra suco. Compra bolo. Mistura veneno no bolo. Bebe suco. Serve o bolo com veneno para a vítima. Tem de somar teoria da equivalência dos antecedentes causais com a teoria da eliminação hipotética dos antecedentes causais.
Teoria da eliminação hipotética dos antecedentes causais: no campo mental da suposição ou da cogitação, o aplicador deve proceder à eliminação da conduta do sujeito ativo para concluir pela persistência ou não do resultado. Persistindo o resultado, o comportamento eliminado não é causa; desaparecendo, é causa. No exemplo acima: - se eu eliminar a compra do veneno, a vítima não morreria. A compra do veneno é causa. - a compra do bolo é causa - a mistura do veneno no bolo é causa - beber suco não é causa - servir o bolo é causa Para haver o crime tem de haver dolo ou culpa. Teoria da equivalência + teoria da eliminação hipotética = causa Causa + dolo ou culpa = imputação do crime
Perigo da equivalência dos antecedentes causais: pode regressar ao infinito. Ex: Fernandinho Beira Mar matou uma pessoa. Elimina do mundo o pai e a m ãe de Fernandinho, ele não nasceria. Não nascendo, não mataria ninguém. OBS: É exatamente contra o regresso ao infinito que se insurge a teoria da imputação objetiva.
2. Teorias a. Teoria da equivalência dos antecedentes O art. 13, caput do CP define que o resultado de que depende a existência do crime só é atribuível a quem lhe deu causa. Só pode responder pelo crime aquele que contribuiu para que o crime ocorresse. Mas o que é causa? O que pode ser considerado juridicamente como causa de um resultado? Diz este artigo, caput parte final, que se considera causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. Em outras palavras, o CP adotou a teoria da equivalência dos antecedentes, também chamada de teoria da “conditio sine qua non (condição sem a qual)”. Causa, portanto, é tudo aquilo
que contribuiu para que o resultado tivesse ocorrido como ocorreu, onde ocorreu e quando ocorreu (modo, lugar e tempo). É a relação de causa e efeito. Existe algo chamado processo de eliminação hipotética, desenvolvida por Thyrén, que ajuda a identificar se algo é causa ou não. Você lista todos os antecedentes do resultado, se você suprimir o antecedente e o resultado for o mesmo, o antecedente é causa, caso contrário o antecedente não é causa. Tudo que contribui para o resultado ocorrer daquela forma é causa. Observação: nem toda causa é criminosa. Dar causa é o primeiro passo, um requisito necessário, para que uma pessoa responda por um crime, mas não por si só suficiente. Esta teoria não faz nenhuma distinção entre causa primária ou secundária, principal ou acessória. Uma das críticas que se faz a esta teoria é que ela permite a regressão infinita. O limite em relação a isto se estabelece a partir da interpretação subjetiva. 3. Concausas Circunstâncias que contribuem de maneira paralela ou conjunta com a conduta do agente contribuindo para a produção do resultado. Um fato lesivo, criminoso, não é apenas produto de uma circunstância, podendo ser resultado de uma série de causas. Exemplo: um corte no braço de um hemofílico, causando a sua morte. Do ponto de vista da causalidade foram o corte e a homifilia que produziram o resultado morte. E como estas causas atuam? Pela teoria da equivalência dos antecedentes ambos os fatos são causas, mas como se classificam? a. Preexistente i. Absolutamente independente - produz o resultado com ou sem a conduta do agente. É a causa única do resultado, excluindo a responsabilidade do agente (exclui a imputação). ii. Relativamente independente - aquela que produz o resultado conjuntamente com a conduta do agente. É uma soma de fatores que se unem para produção do resultado. O sujeito responde pelo crime. Circunstância que contribui para o resultado cuja existência é anterior a conduta do agente. Já está presente antes mesmo do agente praticar a conduta. Como é o exemplo da hemofilia. Exemplo 1: corte num hemofílico, levando-o a sua morte. Exemplo 2: o bolso da calça de um sujeito está furado, o dinheiro cai, uma pessoa vê e subtrai o dinheiro para si. Exemplo 3: um sujeito atira numa pessoa que se envenenou anteriormente, sem que com sua conduta tenha alterado as circunstâncias da morte.
Nos primeiro e segundo exemplos, uma causa depende da outra, o resultado não seria o mesmo se retirada alguma das causas. São, portanto, concausas relativamente independentes. No terceiro exemplo, entretanto, a conduta do sujeito que atirou não deu causa ao resultado. Desta forma, ele não responde por homicídio, apenas por tentativa. O envenenamento é causa preexistente absolutamente independente. b. Concomitante i. Absolutamente independentes A causa concomitante absolutamente independente é aquela que se verifica no mesmo momento em que é praticada a conduta do agente, mas que produz o resultado sem qualquer ajuda ou contribuição causal do comportamento do sujeito. Exemplo: duas pessoas atiram concomitantemente em um sujeito, vindo a matá-lo. Uma, porém, atirou com uma bazuca, enquanto a outra atirou com um revólver calibre 22. A que provocou a morte foi a que atirou com bazuca, respondendo esta por homicídio, excluindo a imputação do segundo agente. ii. Relativamente independentes Causas que ocorrem simultaneamente, sendo que cada uma delas, isoladamente é insuficiente para produzir o resultado. No entanto, a soma de seus fatores acaba produzindo o resultado lesivo. Exemplo: dois sujeitos planejam matar uma mulher, colocando cada um, separadamente, o veneno. O veneno que cada um administrou é insuficiente para matar. Entretanto, os dois juntos provocam o resultado morte, sendo concausas relativamente independentes. c. Superveniente i. Absolutamente independente ii. Relativamente independente Causa que ocorre após a conduta do agente. A causa superveniente também pode ser absoluta ou relativamente independente. A absolutamente independente exclui a imputação, enquanto na relativamente independente ambos os agentes respondem. ▪ Superveniência causal (art. 13, § 1º) Art. 13, § 1º do CP: a superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando por si só produziu o resultado. Os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou. É uma exceção a teoria da equivalência dos antecedentes.
Exemplo 1: uma mulher com uma facada no peito entra numa ambulância, que vindo a sofrer um acidente, morre exclusivamente por traumatismo craniano. Esta é uma causa superveniente relativamente independente, já que sem a facada a mulher não estaria na ambulância e não sofreria o acidente. Exclui-se a imputação da responsabilidade porque o acidente da ambulância produziu o resultado por si só. É superveniente relativamente independente porque é causa. Mas o acidente automobilístico por si só provoca a morte. O acidente não é uma decorrência normal e necessária da facada. Sendo assim, o sujeito que deu a facada na mulher não responde por homicídio, apenas pelos atos praticados anteriormente: a tentativa de homicídio ou lesão corporal pela facada. Exemplo 2: uma mulher deu uma facada nas costas de outra, que veio a morrer por ocorrência do tétano que adquiriu com a faca que estava oxidada. O tétano aqui é um desdobramento natural da facada. O tétano, portanto, não produziu resultado por si só, mas como uma extensão da conduta. Quando a causa superveniente relativamente independente é uma extensão, um desdobramento, uma consequência natural da conduta anterior, ela não produz o resultado por si só. E neste caso o sujeito responde como causador do resultado. Exemplo 3: uma pessoa quebra a perna da outra enquanto esta está surfando, vindo então a pessoa a cair no “mar revoltado” e morrer. O afogamento é uma consequência natural, na mesma linha de desdobramento físico da perna quebrada, pode-se dizer então que o agente que provocou o resultado, quebrando a perna do outro, responde pelo crime de homicídio. Exemplo 4: uma pessoa envenena o bolo de aniversário de alguém. Este alguém, ao cortar o bolo, ao invés de comê-lo dá o pedaço a outra pessoa (Lorena). Lorena vai para o hospital, que desabando vem a matá-la. O risco criado pelo envenenamento do bolo não é da mesma linha de um desabamento. O sujeito que envenenou o bolo responde por tentativa. Quem deu o bolo a Lorena não responde por nada desde que tenha desconhecimento do veneno. 4. Causalidade na omissão Como se verifica a causalidade nos crimes omissivos? Não é pela teoria da equivalência dos antecedentes. Na omissão a causalidade é normativa, a partir de um juízo de valor. 5. Teoria da imputação objetiva do resultado Não adotada pelo CP, criada pela doutrina. A teoria da equivalência é criticada por promover a regressão infinita.
A teoria da imputação objetiva visa então estabelecer critérios para atribuir a alguém a responsabilidade por um determinado resultado a partir de critérios normativos, juízo de valor, que visa limitar o alcance da teoria da equivalência dos antecedentes. Existem determinado riscos que são permitidos pelo Estado, ou seja, existem situações que a lei autoriza que uma pessoa se submeta a determinados riscos. Mas por esta teoria não se pode atribuir a alguém um resultado se ele resulta da criação de um risco permitido e autorizado pelo direito. Em outras palavras, se você expõe alguém a um determinado risco tutelado pela ordem jurídica, você não responde pelo resultado provocado. A responsabilidade será atribuída ao acaso. Você não tem nenhum controle sobre o nexo causal. É por isto que o médico não responde pelo que ocorra com seu paciente, desde que observe as regras de imperícia, imprudência e negligência. Você só responde se o dano causado for consequência do risco por você provocado. Em virtude desta ideia do risco permitido existe o princípio da confiança. a. Princípio da confiança Cada um deve atuar cumprindo seu papel social, se comportar dentro dos riscos permitidos, na expectativa de que os outros também cumpram o seu. Exemplo: um médico ao operar uma cirurgia no seu paciente não deve precisar verificar se o bisturi está esterilizado, pois atua na expectativa que os demais profissionais se comportem de acordo com o direito. b. Teoria da diminuição do risco Por esta teoria, não responde pelo resultado o sujeito que tenha diminuído o risco de lesão ao bem jurídico, ainda que tenha para ele contribuído. Exemplo: o Sr. Incrível ao salvar o suicida quebra sua coluna. Responde ele pela lesão corporal? Não, pois diminuiu o risco. c. Âmbito de proteção da norma Se você criou um risco proibido, mas este risco que você criou se concretizou em dano, dano este que não estava dentro do âmbito da norma não constitui crime. Exemplo: na construção civil todos são obrigados a usar capacete. Mas vamos supor que num determinado caso um trabalhador dá uma martelada na cabeça de outro, provocando sua morte. O patrão que não forneceu o capacete responde? Não, pois o risco proibido provocado é da incidência de acidentes de trabalho e não de um homicídio por martelada. d. Autocolocação em perigo O sujeito não pode responder quando a vítima por sua própria vontade se autocoloca em perigo.
Exemplo: você como guia turístico alerta para as pessoas não seguirem por um determinado caminho. Como garantidor tem o dever de alertar, mas se a pessoa seguir pelo caminho ele não responde pelo dano provocado. AULA 03 - TIPO E TIPICIDADE 1. Conceito O crime foi estudado até agora como uma conduta que dá causa ao resultado. Mas, pelo princípio da legalidade, entendemos que a pessoa só será punida pelas normas previstas no ordenamento jurídico. Daí se origina os conceitos de tipo e tipicidade penal. Tipo penal é uma previsão abstrata de conduta a qual, em tese, se comina uma pena. Só é crime a conduta típica. Tipicidade é uma relação de conformidade, de adequação, subsunção, que se estabelece entre o comportamento concreto e o tipo penal em abstrato. E esta relação, pela qual você entende se a ação se amolda ou não ao tipo, pode ser de adequação típica mediata ou imediata. 2. Adequação típica a. Imediata - quando existe uma perfeita correspondência entre a conduta e o tipo sem necessidade de se recorrer a qualquer outra norma. É uma adequação, um juízo direto. b. Mediata - quando não existe uma relação direta entre a conduta e o tipo. Para que a conduta seja típica é preciso recorrer a uma outra norma que funciona como ponte/elo entre a conduta e o tipo. Exemplo 1: Art. 14, inciso 2 do CP. Art. 121 do CP. Ao combiná-las você completa o tipo e enquadra em tentativa de homicídio a conduta. Exemplo 2: ao combinar os arts. 29 e 121 do CP tem-se a responsabilização daquele que manda matar outrem. Exemplo 3: o art. 13, § 2º com o art. 121 do CP constitui responsabilização do garantidor pelo próprio cometimento do crime quando a sua omissão o provoca. 3. Tipicidade formal X material Tipicidade formal é uma mera adequação/conformidade da conduta com a norma prevista na legislação penal. A tipicidade formal é uma adequação avalorativa, meramente objetiva. A tipicidade material consiste na lesão ou no perigo de lesão ao bem jurídico tutelado pela norma. A conduta é formalmente típica quando se adequa a previsão do tipo, e materialmente típica quando atinge/ofende/alcança o bem jurídico tutelado pela norma.
Exemplo: do ponto de vista formal, subtrair uma caneta é furto. Mas haveria aí uma lesão significativa ao patrimônio? Não. São os crimes bagatelares, nos quais incidem o
princípio da insignificância. 4. Tipo simples X qualificado Um tipo qualificado é um tipo derivado do tipo simples, ou seja, o tipo qualificado tem todas as características do tipo simples, acrescido de uma circunstância denominada qualificadora. E o que é uma qualificadora? Uma circunstância de natureza objetiva ou subjetiva, anterior, concomitante ou posterior ao delito, que redefine em abstrato (para mais) a pena cominada para o delito. Uma qualificadora sempre aumentará a pena mínima e máxima do crime. Exemplo1: matar alguém, crime de homicídio, pena de 6 a 20 anos. Entretanto, a pessoa comete o homicídio mediante pagamento. Esta é uma qualificadora. A pena passa a ser então de 12 a 30, crime hediondo. Exemplo 2: o furto, se praticado, por exemplo, por escalada (entrada por via anormal) ou com chave falsa, deixa de ser de 1 a 4 anos de multa e passa a ser de 2 a 8 anos de multa. Exemplo3: estupro é um tipo que prevê pena de reclusão de 6 a 10 anos. Todavia, se do estupro resultar a morte da vítima, por culpa do agente, a pena passará a ser de 12 a 25 anos. 5. Elementos do tipo O tipo penal consiste numa descrição abstrata de conduta. Quando falamos em tipo penal, falamos de uma situação na qual o legislador descreve uma conduta que, em tese, é considerada criminosa. a. Núcleo - o núcleo do tipo é o verbo, é a conduta ali prevista. Observação: não existe nenhum crime cujo núcleo seja verbo intransitivo, ou seja, que defina um crime por si só. ▪ Comissivo ou omissivo - o tipo pode ser comissivo ou omissivo. O tipo comissivo é aquele cujo núcleo descreve uma ação. O tipo omissivo, por sua vez, é aquele cujo núcleo descreve um deixar de agir, uma omissão. ▪ Simples, misto ou complexo O tipo simples é aquele que possui apenas um núcleo, apenas um verbo, ou seja, é aquele tipo que prevê apenas uma conduta. Existem tipos, porém, que possuem mais de uma conduta, são os tipos mistos alternativos (crimes de ação múltipla) ou cumulativos. Os alternativos são aqueles delitos que preveem várias formas de realização do crime, vários verbos como modo de realização de um crime, bastando, todavia, a realização de apenas um deles para configuração do delito. Todavia, se for realizado mais de um verbo num mesmo contexto fático e em relação ao mesmo objeto continuará havendo crime único, pois haverá lesão apenas para um bem jurídico. Existe também o chamado tipo misto cumulativo, aquele que reúne mais de um
tipo no mesmo dispositivo legal. Exemplo: art. 208. Art. 208 - Escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso: Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa. Um crime complexo, em sentido estrito, é aquele delito pluriofensivo, que ofende mais de um bem jurídico, sendo necessária para sua configuração a realização de mais de uma conduta, sendo que cada uma delas de per se (isoladamente) constitui uma infração penal. Crime A + crime B = crime C (complexo). Exemplo: roubo; extorsão mediante sequestro; latrocínio (roubo seguido de morte). Há alguns autores que acreditam existir delito complexo em sentido amplo ou delitos impropriamente complexos. Estes delitos são aqueles realizados por mais de uma conduta, só que pelo menos uma delas não se constitui, isoladamente, em crime. Exemplo: o estupro (constranger alguém mediante violência ou grave ameaça a praticar ato libidinoso) envolve duas ações, então qual a diferença para o roubo? No roubo, a violência é crime em si mesmo, do mesmo jeito que o furto. De forma contrária, no estupro, a violência é crime por si, mas o ato libidinoso não, apenas associado à violência. b. Objetivos - são aqueles elementos perceptíveis sensorialmente, ou seja, aqueles elementos para os quais não é necessário fazer nenhum juízo de valor. São elementos do tipo para os quais não é necessário fazer juízo de valor ou qualquer espécie de avaliação porque eles se explicam por si mesmo. c. Normativos - são elementos que demandam uma avaliação jurídica ou cultural do magistrado no caso concreto para sua verificação. Exemplo: documento público, pois é a lei que determina o que é ou não um documento público. Assim como o que é um funcionário público, que não é um dado da realidade, mas do direito. d. Subjetivos O finalismo de Welzel trouxe uma mudança significativa no entendimento da conduta criminosa. Antes do finalismo, no causalismo, o crime era uma conduta típica, antijurídica e culpável. Entendia-se que o dolo e a culpa eram elementos da culpabilidade sendo que a tipicidade e a ilicitude era puramente objetivo. Só que pela teoria finalista da ação a vontade não é apenas um impulso voluntário da ação, mas sim um impulso voluntário destinado a se alcançar determinado fim, ou seja, a vontade do agente não está apenas no início da conduta, mas integra todo o seu comportamento. Em outras palavras, a vontade é elemento integrante da ação. Todo tipo compreende uma
conduta e toda conduta compreende uma vontade/finalidade, ou seja, todo tipo pressupõe uma finalidade. Para o finalismo, quando se fala em tipicidade, trata-se de tipicidade objetiva (realização dos elementos objetivos do tipo, como matar alguém; a conduta se enquadrando na norma) e tipicidade subjetiva (o elemento subjetivo é aquilo que está na cabeça do agente). O dolo é um elemento subjetivo do tipo, não mais integrando a culpabilidade como determinava a doutrina do século passado. A conduta se torna atípica por falta de elemento subjetivo. A tipicidade subjetiva é a relação anímica do agente com o tipo, o vínculo subjetivo entre o sujeito que pratica a conduta e o tipo penal. Análise de se a realização da conduta, em tese criminosa, corresponde aquilo que o agente queria ou, pelo menos, previa, entendia. ▪ Tipo doloso O elemento subjetivo geral do tipo é o que chamamos de tipo doloso, ou seja, a regra do direito penal é que os crimes sejam praticados em suas formas dolosas. O legislador não precisa dizer expressamente que o crime é doloso, a lei presume o dolo se o legislador nada disser sobre a vontade do agente, art. 18, parágrafo único do CP. O dolo corresponde à vontade ou aceitação de realizar o tipo penal. Deseja ou pelo menos assume o risco de realizar o tipo. 1. Requisitos a. Conduta voluntária - para que haja dolo tem que haver uma conduta voluntária, que tem de ser dirigida a um determinado resultado, que pode ser desejado pelo agente ou apenas aceito por ele. b. Resultado i. Voluntário - art. 18, I. É o dolo direto, em que se adota a chamada teoria da vontade. Ou seja, é quando o agente deseja o resultado, quer lesar e ofender o bem jurídico. ii. Aceito - é o dolo eventual, que diz o art. 18, I, quando o agente assume o risco de produzir o resultado. E o que significa isto? É aquilo que chamamos de teoria do assentimento. Assentir é concordar. Segundo esta teoria, portanto, o sujeito atua com dolo quando pratica determinada conduta sendo indiferente a produção do resultado e pouco se importando se o resultado vai ou não ocorrer. Frank definia assim: no dolo eventual dê no que der, haja o que houver eu vou continuar atuando.
Assumir o risco não é imaginar que possa acontecer, mas sim não se importar com o resultado. A teoria da representação não foi adotada pelo código, pois segundo esta dizse o crime doloso toda vez que o agente representar o resultado, fizer sua previsão. Só o que o dolo é mais do que a previsão no direito brasileiro. c. Consciência - para que haja dolo tem que haver uma conduta voluntária e um resultado voluntário. No entanto o sujeito deve ter consciência, primeiro, do nexo causal. i. Nexo causal - o sujeito tem que ter consciência de que sua conduta provocará aquele resultado. ii. Elementos do tipo - para que haja dolo é preciso que você tenha consciência da tipicidade de sua conduta. Exemplo: estupro de vulnerável, sem que o sujeito tenha consciência da menoridade (menor de 14 anos) da outra pessoa não configura crime. O erro que tange aos elementos do tipo exclui o dolo. iii. Ilicitude? No crime doloso é preciso que o sujeito tenha consciência da ilicitude? No crime doloso é preciso que o sujeito saiba da tipicidade da sua conduta, mas também é necessário saber que sua conduta constitua crime? Até a reforma penal de 1984 existia uma categoria de dolo chamada dolo normativo, no qual para que houvesse dolo o sujeito tinha que saber que estava agindo de maneira contrária ao direito. A consciência da ilicitude integrava o dolo. Hoje não. Atualmente o dolo não mais contém a consciência da ilicitude. Hoje se chama de dolo natural a vontade da realização da conduta típica independentemente da consciência da ilicitude de sua conduta. d. Dolo geral - também chamado de erro sucessivo. O dolo geral é quando o sujeito, supondo ter produzido o resultado visado, realiza nova conduta, com finalidade diversa, sendo que esta é que acaba efetivamente produzindo o evento inicialmente desejado. O erro que tange aoselementos do tipo neste caso não exclui o dolo.
2. Espécies de dolo a. Direto (determinado) - no qual se deseja ofender o bem jurídico, quer-se o resultado. Existe o chamado dolo direto de segundo grau. É quando alguém pretende dolosamente praticar um determinado fato que em razão dos meios utilizados produzirá necessariamente um dano periférico. Para além daquele inicialmente desejado. b. Indireto (eventual) - não quer diretamente o resultado, mas o aceita como risco de sua conduta. c. Alternativo - ainda pode ser encontrado na doutrina. É quando o sujeito deseja produzir lesão ao bem jurídico contentando-se com a produção de um ou outro tipo de ofensa alternativamente. Acredita-se hoje que o dolo alternativo está inserido no eventual, pois nele, no mínimo, o agente assume o risco de causar o resultado. 3. Elemento subjetivo especial - o dolo é o elemento subjetivo geral do tipo. Entretanto, às vezes, o tipo penal exige algo além do dolo para a configuração do delito. Às vezes o tipo exige uma finalidade especial além do dolo para que o tipo se configure. Ou seja, determinados tipos penais requerem algo que transcende o dolo, que vai além do dolo para que haja o crime. Estes tipos que tem o fim determinado de agir são chamados tipos penais incongruentes. Os tipos penais congruentes, de forma contrária, são aqueles que não preveem a finalidade determinada da conduta. Matar alguém, por exemplo, é um tipo congruente, porque pouco importa o propósito do homicídio, a conduta em si configura crime. Extorsão, por outro lado, é um crime incongruente porque tem uma finalidade específica de agir. Exemplo1: o art. 155 do CP define o crime de furto: subtrair coisa alheia móvel para si ou para outrem. Josiene tem um carro e o estaciona no estacionamento da faculdade. Alguém o furta, roda com ele e retorna para o estacionamento, deixando-o de volta, tendo colocado a gasolina gasta. É furto? Não, porque não basta subtrair a coisa, tem que ser para si ou para outrem. Falta aqui o animus furandi, de subtrair para si.
Exemplo2: O art. 159 determina que a extorsão mediante sequestro necessita, além do sequestro e da privação de
liberdade de comoção, o fim de obter vantagem econômica com o preço do resgate. Apenas o cárcere privado configura o tipo previsto no art. 148.
A respeito tem-se o posicionamento de Luiz Regis Prado: “a) Delitos de intenção - São delitos de tendência interna transcendente, no sentido de que o autor busca um resultado compreendido no tipo, mas que não precisa necessariamente alcançar. Faz parte do tipo de injusto uma finalidade transcendente: um especial fim de agir (ex.: para si ou para outrem - art. 155, CP; com o fim de obter - art. 159; para o fim - art. 206, CP; em proveito próprio - art. 180, caput, CP; com o intuito de - art. 26 , § 2º, CP; para fim libidinoso - art. 219, CP). Essa espécie de elemento subjetivo do tipo dá lugar, segundo o caso, aos chamados delitos de resultado cortado e delitos mutilados de dois atos. Os primeiros (delitos de resultado cortado) consistem na realização de um ato visando a produção de um resultado, que fica fora do tipo e sem a intervenção do autor (Ex.: arts. 131, 159, CP). Nos segundos - delitos mutilados de dois atos consuma-se quando o autor realiza o primeiro ato com o objetivo de levar a termo o segundo. O autor quer alcançar, após ter realizado o tipo, o resultado que fica fora dele (ex.; arts. 289, 290, CP).” (in Curso de Direito Penal Brasileiro, Parte Geral, 2ª edição, revista, atualizada e ampliada, Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 227). ▪ Tipo culposo A rigor a culpa não é um elemento subjetivo do tipo, mas normativo, já que demanda um juízo de valor do magistrado. De um modo geral quando alguém atua culposamente não deseja praticar crime nenhum, irá responder por este apenas por falta de cuidado. É um comportamento voluntário, contrário ao dever objetivo de cuidado, que acarreta um resultado involuntário porém previsível, ou seja, que o sujeito tinha possibilidade de prever. Esta é a ideia do crime culposo. O dolo é o elemento subjetivo geral dos crimes. Se o legislador nada disser sobre isto, o dolo se presume no tipo, diferentemente da culpa, que é um instituto excepcional (no sentido de exceção), como determina o art. 18, § único. A culpa requer previsão legal expressa. Não existem mais que trinta crimes culposos no CP. 1. Requisitos a. Conduta voluntária - toda culpa decorre de uma conduta voluntária. b. Violação do dever objetivo de cuidado - o sujeito age de maneira ilícita, sem observar o que o cuidado objetivo exigia. Existem três modalidades de culpa a partir da violação do dever
objetivo de cuidado (art. 18, II): culpa por imprudência (culpa por excesso, aquele que age atuando além daquilo que o cuidado objetivo determinava, ou seja, o imprudente vai acima daquilo que se espera, vai além do que se imaginava que se deveria ir no caso concreto, não observar aquilo que demanda o cuidado, exemplo: dirigir com excesso de velocidade); culpa por negligência (culpa omissiva, culpa daquela pessoa que fica aquém/abaixo daquilo que o cuidado objetivo demandava, o sujeito deixa de tomar os cuidados necessários, exemplo: alguém que deixa de trocar o fluido de freio do carro); culpa por imperícia (culpa profissional, o imperito é aquele que não tem aptidão para exercício de determinada arte, ofício ou profissão, o imperito é alguém que não tem o conhecimento técnico necessário para exercer uma determinada atividade, exemplo: um taxista que trabalha como motorista de caminhão, mesmo sem a habilitação necessária). c. Resultado involuntário - de um modo geral na culpa o resultado não é desejado pelo agente. d. Previsibilidade - o resultado tem que ser previsível, aquele resultado que poderia ter sido previsto. Possibilidade de previsão. É preciso que o sujeito, de acordo com suas condições e discernimento, seja capaz de prever o resultado. Ainda que você viole o dever de cuidado não responderá pelo acaso. Exemplo: uma pessoa que, dirigindo acima da velocidade, atinge alguém que está se jogando de um prédio para se matar. A previsibilidade deve ser analisada numa dupla dimensão: objetiva (um adulto normal, são, preveria essa conduta?) e subjetiva (aquela pessoa, naquelas circunstâncias, poderia prever o resultado). Previsível é diferente de previsão. Previsível é aquilo que pode ser previsto, enquanto que previsão é o ato de prever. Quando o resultado é previsível, mas não foi previsto pelo sujeito, temos uma modalidade de culpa: a culpa inconsciente. 2. Espécies a. Culpa inconsciente e consciente - na culpa inconsciente o sujeito podia prever a conduta, mas não previu, sequer imaginou que o resultado fosse acontecer. Viola o dever de cuidado sem prever a
ocorrência do dano. Na culpa consciente o sujeito prevê o resultado, mas acredita sinceramente que ele não irá ocorrer. O sujeito superestima as suas habilidades ou subestima os riscos decorrentes do seu comportamento. Age com excesso de confiança, acreditando que o resultado não ocorrerá. Muito parecido com o dolo eventual. Mas a diferença é sutil: no dolo eventual o sujeito não se importa se o bem jurídico será atingido ou não, diferentemente da culpa consciente, em que o sujeito apesar de prever não acredita que o resultado se concretizará. b. Culpa própria e imprópria - a culpa propriamente dita é aquela culpa na qual o resultado é involuntário e previsível. É uma violação ao dever de cuidado que provoca um resultado involuntário. A essência da culpa propriamente dita é o não desejar do resultado. A culpa imprópria é aquela decorrente de erro. É a culpa em que o sujeito deseja o resultado só que, por erro, acaba produzindo um resultado diferente do que o que desejava. O sujeito atua com dolo, mas por incidir em erro é acusado por culpa imprópria. Para ser doloso o sujeito tem que ter consciência dos elementos do tipo, quando não tem, incide em erro, tendo a culpa imprópria. Exemplo: um sujeito que atira em alguém que pula o muro de sua casa pensando estar atirando num ladrão, agindo assim em legítima defesa, mas esse alguém é seu amigo tentando lhe fazer uma surpresa. O resultado era querido, mas ocorreu em erro. 3. Concorrência e compensação de culpas - a culpa da vítima não compensa a culpa do autor, a não ser que seja exclusiva. Exemplo: o motorista do Porshe em São Paulo não se exime da responsabilidade de ter matado a mulher por ela ter ultrapassado o sinal vermelho. Se a culpa foi exclusiva da vítima, se a única pessoa que causou o resultado foi a vítima, você não tem por que responder. A culpa de um não compensa a do outro, não elimina. Exemplo: Um motorista atropela uma pessoa, e quando o policial vai resgatá-la, um outro motorista o atropela. O primeiro motorista responde pelo atropelamento do policial? Não. É uma causa superveniente subjetiva que por si só produziu o resultado. A mesma coisa acontece quando uma pessoa empurra a outra e uma terceira pula
para salvá-la. Se as duas morrerem, a pessoa que empurrou só responde pela morte da primeira. ▪ Preterdolo - crime qualificado pelo resultado, um crime que se torna mais grave do que aquele inicialmente desejado. No crime preterdoloso o sujeito pretende dolosamente cometer uma determinada infração penal, só que, por culpa, sobrevém um resultado mais grave do que aquele inicialmente desejado. Exemplo: o sujeito que quer praticar lesão corporal, mas acaba provocando um homicídio.
AULA 04 - ITER CRIMINIS (caminho crime) Ao estudar o iter criminis interessa saber a partir de que momento uma conduta passa a ser penalmente relevante. 1. Conceito Conjunto de etapas pelas quais o crime passa desde sua fase puramente mental até o último momento de sua realização. Etapas que o crime pode ou não passar. 2. Etapas a. Cogitação - é uma fase puramente mental, ou seja, é quando o sujeito planeja/pensa/imagina/concebe internamente a prática do crime. Cria a figura criminosa mentalmente. Cogitar, imaginar a prática de uma infração penal, é comum, é normal. A cogitação não é punível justamente por se tratar de uma fase exclusivamente mental. b. Preparação - aqui o sujeito realiza os chamados atos preparatórios. O que são? Atos preparatórios já são comportamentos externos, já são condutas, deixa de ficar apenas na esfera do pensamento e passa para a esfera da ação. Condutas exteriores pelas quais o sujeito cria condições morais ou materiais para a realização do delito. Os atos preparatórios, via de regra, são impuníveis. Isto porque o ato, via de regra, não está previsto na lei como conduta criminosa. É em si mesmo atípico. Não há aprioristicamente uma ilicitude. Há, porém, duas exceções: i. Os atos preparatórios podem ser puníveis quando considerados tão graves pelo legislador que configuram crime autônomo. É um crime típico, punível como ato executado do crime autônomo. Exemplo: formação de quadrilha, reunião de mais 4 pessoas em quadrilha ou bando (conjunto desorganizado, sem a estrutura apresentada na quadrilha) para fim de cometer crime, e porte ilegal de arma. ii. Há também uma segunda situação: quando sua preparação vem aderir a execução do crime por terceiro, é o chamado concurso de pessoas. Exemplo: uma pessoa que dá uma arma a outra para a execução de um crime também responde por ele.
c. Execução - é a partir do início da execução do crime que a conduta se torna relevante para o direito penal.
b) Teoria Objetiva: os atos executórios dependem do início da realização do tipo penal. É imprescindível a exteriorização dos atos preparatórios, idôneos e inequívocos para a produção do resultado naturalístico. Essa teoria se divide em: à Teoria da hostilidade ao bem jurídico: atos executórios são aqueles que atacam o bem jurídico[1]. à Teoria objetivo-formal ou lógico-formal: ato executório é aquele que se inicia com a realização do verbo contido na conduta criminosa. Exige a penetração no núcleo do tipo penal. É a preferida pela doutrina pátria[2]. à Teoria objetivo-material: atos executórios são aqueles em que se começa a prática do núcleo do tipo e também os imediatamente anteriores ao início da conduta típica, do ponto de visão de uma terceira pessoa, alheia aos fatos[3]. à Teoria objetivo-individual: atos executórios são os relacionados ao início da conduta típica e também os imediatamente anteriores, em conformidade com o plano concreto do autor d. Consumação - do ponto de vista formal, consumação é a realização completa do tipo penal. Em outras palavras, quando você fala de consumação, está tratando de um conceito previsto no art. 14, I do CP: disse o crime consumado quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal. Isto é, o crime está consumado quando estão presentes todos os elementos do tipo, os objetivos e subjetivos. Perfeita compatibilidade entre a conduta e ao tipo. Exemplo: a morte da vítima de homicídio. Quando atinge o objetivo então? Não necessariamente. i. Exaurimento - alguns autores chamam exaurimento de consumação material. O que é exaurimento? É quando o agente atinge/alcança/obtém o objetivo desejado com a prática do crime, obtém aquilo que ele pretendia/desejava com a prática do crime. O exaurimento pode influenciar na pena, mas não integra o iter criminis. Muitas vezes a consumação e o exaurimento se confundem, como no caso de querer que a pessoa desapareça do mundo e a mata. Exemplo: na extorsão mediante sequestro, o crime está consumado desde o momento do pedido do resgate, não sendo necessário o pagamento, que constituiria o exaurimento. Em alguns casos o exaurimento é uma qualificadora, outras vezes não. 3. Crime tentado a. Requisitos
i. Início da execução ii. Não consumação iii. Circunstâncias alheias à vontade do agente O crime tentado é uma realização incompleta do tipo penal, o que significa que ele é incompatível com o crime consumado. O sujeito inicia o crime, mas por algum motivo não o completa. Entretanto, do ponto de vista da censura, o desvalor da ação do crime tentado é o mesmo do crime consumado. b. Punibilidade Para a punição, o CP adota a teoria objetiva, no art. 14, parágrafo único, que diz: salvo disposição em contrário, pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado, diminuída de um terço a dois terços. Quanto mais perto de consumar, maior a pena e menor a redução. c. Infrações que não admitem Quais são os crimes que não admitem tentativa? Existem oito situações: ✓ Não cabe tentativa, inicialmente, no crime culposo. Isto porque, na culpa, ocorre um resultado não desejado. Enquanto que, na tentativa, o agente queria alguma coisa, que acaba não ocorrendo. ✓ Não cabe tentativa de crime preterdoloso (dolo no antecedente e culpa no consequente), porque no preterdolo o resultado é mais grave que o inicialmente desejado, enquanto no crime tentado o resultado é aquém do pretendido inicialmente. ✓ Não cabe tentativa no caso de crime omissivo puro (crime cujo núcleo do tipo é um não fazer, um deixar de agir). Entretanto, nos crimes omissivos impróprios cabe tentativa, pois há a figura do garantidor (quando, por exemplo, uma mãe deixa seu filho em perigo e um terceiro o salva). ✓ Não cabe tentativa de contravenção penal, porque o art. 4º, do decreto-lei 3688/41, determina que a tentativa de contravenção constitui um indiferente penal. ✓ Não cabe tentativa nos crimes habituais. Deve-se distinguir crime permanente, instantâneo e habitual. O crime instantâneo, ao qual cabe tentativa, é aquele crime cuja consumação se verifica no momento pontual e específico no tempo. Exemplo: homicídio, consumado num momento exato no tempo. Só que existem outros crimes cuja consumação se prolonga/prolata no tempo por um tempo juridicamente relevante por vontade do agente. Exemplo: sequestro, formação de quadrilha. Para se referir ao crime instantâneo você utiliza o pretérito perfeito, o crime aconteceu. Para se referir ao crime permanente você utiliza o gerúndio, o crime está acontecendo. Por último, o crime habitual é aquele que não se consuma com a prática de apenas um ato, só se consuma com uma reiteração/repetição de atos no mesmo sentido. São dois casos que o CP conhece: exercício ilegal da medicina, art. 252 do CP; e o rufianismo (cafetão). Não confundir com o crime continuado, em que cada ato constitui crime isolado,
mas por ficção jurídica são reunidos. No crime habitual, um ato isolado não constitui crime. Exemplo: se um estudante de medicina faz apenas um plantão, não comete crime, estando a prática do crime sujeita a sua repetição. Do mesmo jeito que o rufianismo de um ato só não constitui crime. ✓ Não cabe tentativa de crime de atentado. Apesar de na legislação extravagante haver outros, no CP só há um. É um crime em que o legislador equiparada a tentativa à consumação. Art. 352. ✓ Não cabe tentativa de crime unissubsistente. É aquele cuja execução não pode ser fracionada, não admite um fracionamento, o começo da sua execução se confunde com seu fim. Todos os crimes cometidos de forma verbal são unissubsistentes. ✓ Não existe tentativa de participação em suicídio. Só cabe participação em suicídio se a vítima morrer ou sofrer lesão grave. d. Espécies de tentativa i. Perfeita e imperfeita (crime falho) Na tentativa imperfeita há início de execução e esta fica incompleta, é interrompida por circunstâncias alheias a vontade do agente. O sujeito não esgota seu plano executivo, não esgota os atos executórios. No crime tentado, algum fato/circunstância impede que o sujeito prossiga com sua execução. A tentativa perfeita ocorre quando a execução do crime é completa, mas a consumação não, por circunstâncias alheias a vontade do agente. Ocorre quando o sujeito esgota seu plano executório na sua integralidade, só que o resultado por alguma razão, por algum motivo específico, não ocorre. O sujeito tem que fazer aquilo que considerava ser suficiente para consumar o crime desejado, mas sem sucesso. ii. Branca (incruenta) e vermelha (cruenta) A tentativa branca ocorre quando o objeto material (o bem jurídico) não é atingido pelo agente, podendo ser uma tentativa perfeita ou imperfeita. Exemplo: um sujeito atira em alguém sem atingi-lo. Este é um exemplo de tentativa perfeita branca. A tentativa vermelha, que tem origem da palavra no derramamento de sangue, ocorre quando o objeto material é atingido pelo agente. Exemplo: o sujeito atira no braço de alguém e quando vai atirar de novo alguém o interrompe, impedindo-o de continuar. Esta é uma tentativa imperfeita vermelha. 4. Desistência voluntária (art. 15) e arrependimento eficaz (art. 65, III, b) Existe a desistência voluntária quando, iniciada a execução, o agente, voluntariamente, interrompe os atos executórios. Ele, voluntariamente, faz cessar a execução iniciada, mas não terminada. Ou seja, na desistência voluntária existe início de execução, mas, antes que ela se complete, o sujeito, voluntariamente, interrompe os atos executórios. A diferença entre a desistência voluntária e a tentativa imperfeita é o motivo que causou a interrupção, que na desistência voluntária ocorre por vontade do agente. A diferença prática é que na desistência voluntária o sujeito não responde pela tentativa anterior,
mas pelos atos já praticados. O doutrinador Reinhard Frank distingue os dois nas seguintes palavras: na tentativa imperfeita eu quero prosseguir, mas não posso; enquanto que na desistência voluntária eu posso prosseguir, mas não quero. Na desistência voluntária pouco importa se os motivos que fizeram desistir são nobres ou não, basta o fato da desistência. E se um sujeito interrompe os atos executórios por ouvir a sirene da polícia e fugir? A jurisprudência e a doutrina têm entendido que se o sujeito interrompe os atos por presença de autoridade é configurada tentativa e não desistência voluntária. Porque a ideia da desistência voluntária é o agente interromper a execução porque quer, mesmo podendo continuar com ela de forma a sair ileso da situação, de forma a poder terminar os atos executórios. O sujeito pode, entretanto, esgotar os atos executórios. Neste caso, pode haver: a consumação; a consumação pode não ocorrer por motivos alheios a vontade do agente; ou o sujeito pode vir a impedir que o resultado se produza, o que configura o chamado arrependimento eficaz. Este último é parecido com a tentativa perfeita, já que o sujeito esgota os atos executórios, só que na tentativa perfeita o crime não se consuma por circunstância alheia a vontade do agente, enquanto que no arrependimento eficaz há o esgotamento dos atos executórios e o impedimento do resultado pelo agente. O arrependimento eficaz também apaga a tentativa, respondendo o sujeito apenas pelo resultado obtido. Observação: o arrependimento, caso seja eficiente, a pena pode até ser atenuada, mas a tentativa do ato inicial só é excluída se o arrependimento for eficaz de modo a impedir o resultado pretendido inicialmente. Tanto a desistência voluntária quanto o arrependimento eficaz se caracterizam pela não consumação do delito, pela vontade do agente, após iniciada a execução. O que difere ambos os institutos da tentativa é o querer do agente de interromper os atos executórios. De modo geral a desistência voluntária é omissiva, o sujeito para, interrompe a execução. Enquanto que no arrependimento eficaz o sujeito tem que agir para evitar o resultado. Não cabe desistência voluntária nos crimes omissivos puros. Não cabe arrependimento eficaz nos crimes culposos. 5. Arrependimento posterior (art. 16) O arrependimento posterior, como o próprio nome diz, é posterior à consumação. É uma causa de diminuição de pena de crimes consumados. Em alguns delitos, a reparação do dano ou a restituição da coisa pode fazer com que a pena seja reduzida de um terço a dois terços. Para que haja arrependimento posterior são necessários os seguintes requisitos: ✓ Reparação do dano ou restituição da coisa. ✓ O crime tem que ter sido praticado sem violência ou grave ameaça à pessoa, entretanto, cabe arrependimento posterior nos crimes culposos mesmo que haja violência. Pois este é um requisito que pressupõe a falta de violência do agente, e os crimes culposos ocorrem por acidente.
✓ Tem que ocorrer por ato voluntário do agente. ✓ A reparação do ano ou restituição da coisa deve ocorrer até o recebimento da denúncia (petição inicial que dá início ao processo penal na ação penal pública). Se a restituição ocorrer depois é um mero atenuante, de no máximo 1/6 da pena. Existem situações excepcionais na legislação penal que fazem com que haja um tratamento diferente. Situações em que a reparação do dano provocam efeitos diferentes dos citados: Situação 1. A reparação do dano, o acordo entre as partes (o ofendido tem que aceitar), pode representar a extinção do processo e da pena, mesmo que o crime seja doloso e violento. É um caso de extinção de punibilidade, presente no art. 74, parágrafo único da Lei 9099/95, dos juizados especiais cíveis e criminais. Os crimes de menor potencial ofensivo, de competência dos juizados cíveis e criminais, são crimes cuja pena máxima cominada não ultrapassa o limite de dois anos. São exemplos: lesão corporal leve, ameaça e constrangimento ilegal.
Situação 2. Nos crimes tributários, de sonegação fiscal, o pagamento do tributo extingue a punibilidade. O Estado utiliza o direito penal para cobrar tributo. Situação 3. Art. 312, § 3º. A reparação do dano até o trânsito em julgado da sentença extingue a punibilidade no peculato culposo (conduta do funcionário público que é negligente com a coisa pública e permite que um terceiro subtraia-o). Situação 4. A súmula 554 do STF diz que a punibilidade estará extinta no caso da emissão dolosa de cheque sem fundo se o cheque for pago até o recebimento da denúncia. 6. Crime impossível e crime putativo Crime impossível é um instituto relacionado com a tentativa. Existe o chamado crime impossível quando alguém deseja, subjetivamente, praticar uma determinada infração penal e imagina estar executando uma infração penal. Só que, por ineficácia absoluta do meio ou impropriedade absoluta do objeto (quando o objeto não contém o bem jurídico que pretende ser atingido pelo agente), é impossível consumar-se a infração. O crime existe na cabeça do sujeito, mas concretamente o meio ou o objeto não o permite. Aqui não existe perigo e nem ao menos potencial de perigo ao bem jurídico tutelado. Por uma teoria meramente subjetiva, levando em conta o desvalor da ação com o bem jurídico e a intenção do agente, seria possível puni-lo. Entretanto, hoje, com a teoria objetiva, ainda que ação seja criminosa, o sujeito não responderá se não houver perigo ao bem jurídico. Exemplo de impropriedade objeto: matar alguém que já está morto; falsificar uma nota de três reais; tentar furtar dinheiro de um bolso vazio. Exemplo de ineficácia do meio: atirar em alguém para tentar matá-la, com balas de festim, mesmo pensando que sejam de verdade.
Art. 17 do CP: não se pune tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por impropriedade absoluta do objeto, era impossível consumar a infração. Ou seja, o sujeito não responde por nada, porque o bem jurídico não está exposto a perigo nenhum. Adota o CP a teoria objetiva temperada. Segundo a teoria objetiva pura, se o bem jurídico não podia atingir o objeto, trata-se de crime impossível, pouco importando se essa inidoneidade (idoneidade é a capacidade para) é absoluta ou relativa. Para a teoria objetiva temperada só vai haver crime impossível se a inidoneidade for absoluta, ou seja, se o bem jurídico não puder de nenhuma forma ser atingido. Se a inidoneidade for relativa o sujeito responde por tentativa. Súmula 145 do STF: crime impossível por ação do agente provocador (flagrante preparado). Flagrante preparado ocorre quando a polícia induz ou instiga alguém a iniciar a execução de um crime cercando-se a polícia de todos os meios para impedir que o crime venha a se consumar. A polícia não tem legitimidade para fazer teste de honestidade com ninguém. No flagrante preparado a polícia cria o meio para o crime.
Não existe crime quando a preparação do flagrante pela polícia cria meio para impedilo. Observação: não se deve confundir o flagrante preparado com o flagrante esperado, este sim válido. Nele, a polícia sabe que um crime vai acontecer sem ter qualquer relação de causalidade com o crime. Assim como o flagrante retardado também vale. O agente infiltrado é a conduta de um agente policial que entra numa organização criminosa para daí fazer prova de um crime já existente, esperar o melhor momento para a colheita de provas. Por último, o flagrante forjado é quando a polícia “planta” provas falsas para incriminar alguém. É crime da polícia, não é flagrante. Crime putativo vem do latim “putare”, que significa supor, imaginar, ou seja, é um crime suposto, imaginado. Na verdade o crime putativo não é crime. É uma conduta imoral, antiética, que o sujeito pensa ser crime, mas na verdade, tal comportamento não está previsto no ordenamento jurídico como crime. O sujeito pensa que aquele comportamento é proibido pela ordem jurídica, mas não o é. Tal conduta não é, sequer em tese, um tipo penal previsto no ordenamento jurídico. Repita-se, crime putativo não é crime, não há nenhuma hipótese legal que preveja tal conduta. É importante salientar que o sujeito não incide em nenhum tipo de erro quanto à situação, a pessoa ou o objeto, ele quer perpetrar exatamente determinada conduta, que pensa ser uma infração penal, entretanto, tal conduta é infração peal somente na sua cabeça, na sua imaginação. Em suma, no crime putativo, o sujeito pensar estar praticando uma conduta proibida no ordenamento jurídico, porém, tal conduta, sequer em tese, constitui um ilícito penal, a conduta não está tipificada no nosso ordenamento jurídico como um todo. É um crime que ocorre somente na cabeça do sujeito, dentro da sua imaginação.
Exemplo: incesto.
AULA 05 - ILICITUDE/ ANTIJURIDICIDADE 1. Tipicidade e Ilicitude A tipicidade é o primeiro passo para a ilicitude, para que haja a infração penal, necessário, mas não o único. É um elemento que faz presumir a ilicitude de uma conduta, mas não suficiente para definir a ilicitude de uma conduta. A tipicidade faz surgir uma pena, fazendo assim então surgir uma ilicitude formal. A ilicitude é uma relação de contrariedade entre a conduta e a ordem jurídica. Em outras palavras, uma conduta é considerada ilícita quando representa uma violação ilícita ao bem jurídico tutelado pela norma. Quando analisamos se uma conduta é típica estamos vendo se houve ou não uma conduta que ofendeu o bem jurídico tutelado. Na observação da ilicitude nós analisamos se essa ofensa é conforme o direito ou contrária ao direito. E descobrimos isto a partir do juízo de ilicitude. O juízo de tipicidade é um juízo de natureza positiva, de conformidade, verifica-se se houve ou não do ponto de vista subjetivo e objetivo ofensa ao bem jurídico. E, do ponto de vista formal, é uma antijuridicidade formal (cominar uma pena a uma conduta, dizendo, em tese, em abstrato, que ela constitui crime). No juízo de antijuridicidade faz-se, porém, um juízo de valor para analisar a conformidade ou contrariedade da conduta com o direito. Em regra, a conduta típica é antijurídica.
A conduta típica, portanto, só será conforme o direito por via de exceção, como a legítima defesa, por exemplo. O juízo de ilicitude é posterior ao juízo de tipicidade, portanto. Em regra, matar alguém é crime, falsificar moeda é crime, mas, existem no direito penal, causas de exclusão da ilicitude. Ou seja, existem causas que excluem a ilicitude de uma conduta típica, causas que retiram o caráter criminoso de uma conduta típica. ilena Oliveira de Faria
2. Exclusão da ilicitude Existem causas de exclusão de ilicitude que estão na parte geral do CP (art. 23, que valem para todos os crimes), na parte especial do CP (valem para causas específicas) e existem ainda as causas supralegais de exclusão da ilicitude. A parte geral prevê quatro: estado de necessidade (conflito entre bens jurídicos que para salvar um há de se sacrificar o outro), legítima defesa, estrito cumprimento do dever legal e o exercício regular de direito (a atividade do MMA, por exemplo). Na parte especial existem outras causas de exclusão. Por exemplo, no art. 128, exclui-se o crime de aborto nos casos de estupro e risco de morte à mãe.
Exclui-se a violação de domicílio em casos de prestação de socorro, flagrante delito, em caso de desastre, todos em qualquer hora do dia ou da noite, ou apenas durante o dia por ordem judicial. Entre outros vários exemplos. Só que existem algumas causas supralegais de exclusão da ilicitude, que não estão previstas em dispositivo legal algum, decorrem de interpretação e de princípios, como, por exemplo, a analogia in bonan partem, outro é o consentimento do ofendido, do titular do bem jurídico. Quando se fala no consentimento do ofendido, há três possibilidades: pode funcionar como exclusão da tipicidade (quando a ausência de consentimento for elementar do tipo, como no caso da invasão de domicílio ou do estupro, por exemplo); como exclusão da ilicitude (quando o conhecimento for prévio, válido - obtido sem violência, grave ameaça ou fraude - e, por fim, tem que ser disponível, como numa pessoa que pega um bem de outrem com tais requisitos, excluindo o tipo furto); e irrelevante quando o bem jurídico não é ofendido, quando o objeto é indisponível, portanto. As causas de exclusão da ilicitude também são chamadas de tipos permissivos ou causas justificantes ou causas de justificação. Relembrando... O juízo de tipicidade é um juízo positivo, um juízo de adequação, de subsunção. Enquanto que a antijuridicidade é juízo de contrariedade concreta da conduta em relação à ordem jurídica. Se na tipicidade fazemos um juízo de adequação do ato à norma, na ilicitude fazemos um juízo de natureza negativa, uma valoração sobre a contrariedade ou não daquela previsão em relação à ordem jurídica como um todo. Quando falamos de causa de exclusão da ilicitude, existem as causas legais, previstas na parte geral e especial e as supralegais, entre as quais discutimos sobre o consentimento do ofendido.
3. Tipicidade conglobante Quando surgiu a teoria do delito no final do século XIX e início do XX, havia uma divisão bem clara dos institutos jurídicos. Havia a tipicidade (adequação formal entre a conduta e o tipo), a antijuridicidade (contrariedade da conduta com a norma) e a culpabilidade (na época consistia no dolo e na culpa). Posteriormente começaram a surgir teorias e discussões que incluíam a antijuridicidade no conceito de tipo. Nesta época, começou a se dizer que existiam os chamados elementos negativos do tipo. E o que seriam os elementos negativos do tipo?
Para a teoria dos elementos negativos do tipo, ou teoria do neokantismo, que surgiu no século passado, a tipicidade contém a ilicitude. A ilicitude não é algo separado nem dissociado da tipicidade. Segundo esta teoria, toda tipicidade é antijurídica, contrariando
o que estudamos na aula passada, em que a tipicidade é um elemento indiciário da ilicitude, que faz presumir a ilicitude. Enquanto que pela teoria toda tipicidade compreendia a ilicitude. A ilicitude estaria inserida no conceito de tipicidade. Em outras palavras, a conduta típica de matar alguém sempre seria antijurídica, sempre seria contrária ao direito porque toda conduta típica seria contrária ao direito, a não ser que houvesse a presença dos chamados elementos negativos do tipo. Por esta teoria se entendeu que a tipicidade continha a ilicitude, absorvia a ilicitude. E a legítima defesa, o estado de necessidade, o estrito cumprimento do dever legal, o exercício regular de direito eram elementos negativos do tipo. E o que são elementos negativos do tipo? Um elemento negativo é um elemento que, quando presente, nega a natureza de alguma outra coisa. Significa dizer que quando esse instituto está presente retira-se a tipicidade de uma conduta. A legítima defesa seria um elemento negativo do tipo porque quando alguém matasse outra pessoa em legítima defesa, a existência da legítima defesa excluiria a tipicidade da conduta. É como se o tipo dissesse: ‘matar alguém, salvo legítima defesa, estado de necessidade (...)’. Por esta teoria tipicidade e ilicitude eram uma coisa só. Mas esta teoria foi superada com um argumento aparentemente irrespondível. Welzel questionou: matar uma pessoa em legítima defesa é a mesma coisa que matar uma mosca? Pela teoria dos elementos negativos do tipo, matar uma pessoa em legítima defesa é atípico pelo elemento negativo legítima defesa. E matar uma mosca também é atípico. Mas as duas situações são diferentes. Por isto que hoje concebemos que a tipicidade não é a ilicitude, é um juízo indiciário da ilicitude. A ilicitude é algo que vem depois. A priori matar alguém é crime, mas se o sujeito o faz em legítima defesa, por exemplo, a conduta é típica, mas não antijurídica. Zaffaroni cria então a tipicidade conglobante. E o que seria a tipicidade conglobante? Pela tipicidade conglobante, a conduta típica é um elemento indiciário da ilicitude, faz presumir a ilicitude. Mas pela tipicidade conglobante, a conduta típica tem que ser antinormativa. Qual a diferença entre antinormativa e antijurídica? Ofender a saúde ou integridade física de outrem é crime, é tipo penal. Uma cirurgia de ligadura de trompas é lesão corporal, mas a atividade médica a priori é lícita. Zaffaroni quer dizer que para que a conduta seja típica ela tem que ser a priori (juízo que se faz em tese, primariamente) antinormativa, contrária ao direito. O juízo de antinormatividade é ex ante, ou seja, um juízo prévio que se faz em relação à conduta.
Para esta teoria, o estrito cumprimento do dever legal e exercício regular de direito, por exemplo, são causas de exclusão da tipicidade porque as condutas não são antinormativas sequer em tese. Um policial que cumpre uma pessoa em flagrante está cumprindo seu dever, sendo, portanto, a priori, atípica. A diferença da antinormatividade pra antijuridicidade é que a antinormatividade é um juízo a priori, enquanto que a antijuridicidade é um juízo concreto. A priori uma cirurgia não é crime, mas dar um tiro em alguém é. Matar
alguém a priori é antinormativo, mas se praticado em legítima defesa não é antijurídico. No CP, o estrito cumprimento do dever legal e o exercício regular de direito são causas de exclusão da ilicitude, mas para Zaffaroni são causas de exclusão da tipicidade conglobante. Porque a tipicidade conglobante é o juízo de tipicidade que envolve como típicas apenas as condutas que são a priori antinormativas. Para Zaffaroni e a teoria da tipicidade conglobante, só é típica uma conduta que num juízo apriorístico, em tese/em abstrato, seja contrário ao direito. Se será contrário ao direito concretamente, será análise do caso concreto. Para Zaffaroni só vai ser típica uma conduta que é antinormativa. Diferenciando as duas teorias... Para a teoria dos elementos negativos do tipo, todos os quatro excludentes (estado de necessidade, legítima defesa, estrito cumprimento do dever legal e exercício regular de direito) excluem a tipicidade. Enquanto que para a teoria da tipicidade de Zaffaroni apenas o estrito cumprimento do dever legal e o exercício regular de direito excluem a tipicidade, porque para a legítima defesa e o estado de necessidade teria que haver uma análise concreta para verificar a antijuridicidade, excluindo apenas a ilicitude. 4. Estrito cumprimento do dever legal Diz o CP no art. 23, III que não há crime daquele que pratica o fato, em tese, típico, no estrito cumprimento do dever legal. O cumprimento de um dever estabelecido pela lei não pode ser contrário ao direito. É uma questão de lógica. O direito penal é a última ratio. Todo ilícito penal é extrapenal. Se um sujeito pratica um fato cumprindo um dever que a lei manda, como é que pode ser este ato criminoso? Como pode ser considerado ilícito? Não pode. Deve haver um mínimo de coerência, algo não deve ser permitido (legal) e proibido (ilícito) ao mesmo tempo. Como alguém pode cometer um crime fazendo algo que a lei lhe obriga? É uma contradição em termos você praticar seu dever e cometer um ato ilícito ao mesmo tempo. 5. Exercício regular de direito Também não há crime quando uma lei autoriza uma determinada pessoa a exercer um determinado direito. Um direito autorizado pela ordem jurídica não pode ser considerado criminoso. Exemplo: uma luta de MMA; ou o direito de retenção com benfeitorias (um inquilino que realiza benfeitorias necessárias na casa, mesmo que o contrato de locação não trate sobre o assunto, tem direito de ficar no imóvel até ser indenizado). Tanto o estrito cumprimento do dever legal quanto o exercício regular de direito partem do princípio da harmonia do ordenamento jurídico. Exemplo: é crime manter local para fim libidinoso, o que não torna o motel ilícito, pois está no seu exercício regular de direito.
6. Estado de necessidade (art. 24) a. Conceito b. Perigo
c.
d. e. f. g.
i. Real ii. Atual iii. Origem humana/natural/animal iv. Próprio ou de terceiro v. Não provocado pela vontade do agente vi. Inexistência do dever legal de evitar o perigo Sacrifício de outro bem jurídico i. Típico ii. Inevitável iii. Razoável ✓ Teoria unitária ✓ Teoria diferenciadora Requisito subjetivo de justificação Crimes habituais ou permanentes Furto famélico Defensivo ou agressivo
O estado de necessidade consiste num conflito entre dois bens jurídicos lícitos, que legitimamente devem ser preservados. Quando um deles está em situação de perigo tal, de modo que não há alternativa para preservá-lo senão com sacrifício de outro bem jurídico. Em outras palavras, numa situação de perigo você pode destruir outro bem jurídico se não houver alternativa.
E o que é perigo? É uma situação de dano provável. Perigo é aquela situação em que o bem jurídico está prestes a ser lesado. Ressalte-se que o perigo precisa ser real. O estado de necessidade pressupõe um perigo real/concreto. O perigo suposto/imaginado/putativo (putare = supor) não caracteriza estado de necessidade.
Além disso, o perigo precisa ser atual. Não cabe estado de necessidade para um perigo pretérito ou futuro. Perigo atual é a situação em que o dano está prestes a ocorrer. Apesar de Greco chamar o perigo atual de iminente, Bitencourt está certo ao dizer que o perigo é atual e que o dano é que é iminente.
O perigo pode ter como origem conduta humana, algum tipo de força da natureza ou até mesmo ataque animal. O perigo pode ser também a direito próprio ou de terceiro. Cabe estado de necessidade tanto na defesa de direito próprio quanto na defesa de direito de terceiro. O perigo, entretanto, não pode ser provocado pela vontade do agente. Se você provoca dolosamente o perigo (causador voluntário é aquele que provoca dolosamente o resultado pela corrente majoritária) não pode alegar estado de necessidade para matar outra pessoa, por exemplo. Ao provocar o perigo dolosamente você se torna garantidor do terceiro. Há uma corrente minoritária, porém, que diz que se você provoca culposamente o perigo também não pode alegar estado de necessidade. Deve haver também inexistência do dever legal de evitar o perigo. Em outras palavras, não pode alegar estado de necessidade o sujeito que tinha o dever legal de evitar o perigo. Exemplo: o capitão de um navio que está afundando, não pode abandoná-lo. Inexistência desde que a pessoa possa evitar o perigo com razoável possibilidade de êxito.
Para que haja estado de necessidade é preciso que haja o sacrifício de outro bem jurídico. Primeiro, o sacrifício tem que ser típico, tem que configurar uma conduta típica que vai ser justificada pelo estado de necessidade. Senão não haveria motivo para se discutir o assunto no âmbito jurídico. Segundo, o sacrifício tem que ser inevitável.Um bem jurídico vai ser sacrificado para o outro ser preservado, mas os dois tem legitimidade para serem preservados. Logo, você só pode sacrificar o bem jurídico 2 se for inevitável para salvar o bem jurídico 1. Terceiro, o sacrifício deve ser razoável. Existem duas teorias para definir o que é sacrifício razoável. No direito brasileiro adotamos a teoria unitária, em que o estado de necessidade é sempre causa de exclusão da ilicitude. Então, o sacrifício tem que ser de um bem jurídico menor ou de igual valor. Mas define ainda o art. 24, § 2º: ‘embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito ameaçado a pena poderá ser reduzida de um terço a dois terços’. Este artigo diz que a pena será diminuída no caso de haver sacrifício de um bem de maior valor, é o estado de necessidade exculpante, mas não exclui a culpabilidade, apenas a diminui. Observação: em princípio, num conflito de bens jurídicos, é preferível a omissão à agressão. Na Europa, entretanto, adota-se a teoria diferenciadora. Para esta teoria existem duas categorias de estado de necessidade: o justificante que exclui a ilicitude e o exculpante que exclui a culpabilidade. Por esta teoria, o estado de necessidade só é justificante se você sacrifica um bem menor. Se você sacrifica um bem de igual valor exclui-se a culpabilidade. Existe um requisito subjetivo de justificação, ou seja, o sujeito tem que agir sabendo que está salvando, ele tem que ter o conhecimento da situação de perigo (situação justificante) e sacrificar o bem jurídico 2 sabendo que é pra salvar o bem jurídico 1. Não cabe estado de necessidade em crimes habituais ou permanentes, pois o perigo não configura como atual. E furto famélico? Pode ser alegado estado de necessidade desde que seja inevitável e que o objeto do furto seja preciso para matar a fome imediatamente, ou seja, perigo atual e inevitável. O estado de necessidade pode ser defensivo ou agressivo. No estado de necessidade defensivo o agente sacrifica o bem jurídico daquele que causou o perigo. No estado de
necessidade agressivo o sujeito atinge bem jurídico de terceiro estranho ao fato.
7. Legítima defesa a. Conceito A legítima defesa é uma situação em que uma pessoa está sendo vítima de uma agressão atual ou iminente e reage a esta agressão com uma conduta típica, ou seja, reage tipicamente com intuito de repeli-la. Quando falamos em legítima defesa é um pouco instintivo, não se pode esperar que o Estado aja para defender o sujeito. Não se pode tolerar que alguém seja obrigado a tolerar uma agressão jurídica a bem próprio ou de terceiro. Se o bem jurídico está sendo ofendido e você não tem a possibilidade de recorrer ao Estado para que ele defenda seu bem jurídico, você tem o direito
fundamental de se defender da agressão injusta. Legítima defesa é, assim como no estado de necessidade, a defesa de um bem jurídico. No estado de necessidade, porém, há dois bens jurídicos lícitos e legítimos que estão em perigo, subsistindo apenas um. Enquanto que a legítima defesa se trata do conflito entre o lícito e o ilícito, entre o justo e o injusto. b. Requisitos i. Agressão ✓ Real (atual ou iminente) ✓ Humana ✓ Injusta ✓ Comissiva ou omissiva ✓ Direito próprio ou de terceiro A ideia na legítima defesa não é dizer que o bem jurídico está sujeito à perigo, mas sujeito à agressão, diferenciando-se assim do estado de necessidade. O perigo é algo não controlado, não direcionado. Enquanto que na agressão alguém está querendo ofender determinado bem jurídico que pertence a outro. Nessa linha de raciocínio, quando se fala em legítima defesa, se trata de uma situação em que existe uma agressão. O que legitima a legítima defesa é a agressão real, concreta, e não imaginada. Quando for imaginada, será caso de legítima defesa putativa, pois apenas suposta. Este instituto não é tratado no campo da ilicitude, mas no da culpabilidade. Mas não basta que a agressão seja real, a legítima defesa pressupõe uma situação atual ou iminente. Por iminente entende-se a fase final dos atos preparatórios. A agressão iminente é aquela que está prestes a se iniciar, prestes a ocorrer. Não cabe legítima defesa contra agressão futura. Assim como não existe legítima defesa contra uma agressão pretérita. Uma agressão da vítima depois que o agressor já está indo embora não é legítima defesa, mas sim vingança. Se é legítima defesa, trata-se de agressão humana. Não existe legítima defesa para um ataque de animal irracional, de uma máquina, de um acidente, de uma força da natureza. Nestes casos aplica-se estado de necessidade. A agressão praticada em legítima defesa é uma agressão injusta, objetivamente contrária ao direito. Você não pode se defender de uma agressão justa, praticada, por exemplo, por um policial, no seu estrito cumprimento do dever legal, ao prender um sujeito em flagrante delito. Observe-se que a conduta injusta contrária ao direito pode ser praticada por qualquer um, não importa se culpável ou não, menor ou maior de idade, louco ou são. Você pode alegar legítima defesa contra um menor que furtou sua bolsa e correu. A injustiça é analisada concretamente. Cabe ressaltar também que a agressão injusta pode ser tanto dolosa quanto culposa.
A agressão injusta pode ser tanto comissiva quanto omissiva. Exemplo: um carcereiro que se omite de soltar um preso sendo seu dever fazê-lo. Cabe legítima defesa contra essa omissão, contra essa agressão injusta.
Cabe legítima defesa para direito próprio ou de terceiro. Mas pode haver legítima defesa de terceiro sem que este queira? Há situações que o consentimento é presumido, mas há situações em que não. Não se pode agir em legítima defesa de alguém que manifestamente não quer. A única hipótese em que não se pode admitir consentimento é para o bem jurídico vida. Neste caso se torna irrelevante o consentimento do ofendido. Qualquer bem jurídico é passível de legítima defesa? Há uma relativização do bem jurídico honra. Não é permitido a uma pessoa traída agir em legítima defesa contra o traidor. O bem jurídico deve ser defendido com uso moderado dos meios necessários. Não existe mais o fundamento da legítima defesa da honra em que se pode matar o traidor. ii. Repulsa à agressão ✓ Necessidade ✓ Moderação A repulsa à agressão deve ser com o uso moderado dos meios necessários para repelir a agressão. O sujeito deve escolher os meios disponíveis para repelir a agressão e causar o menor dano, pelo menos teoricamente, já que a reação é instintiva, sem poder se analisar todas as opções para saber qual o menor dano. É legítima defesa e não legítima vingança. Além disso, deve haver moderação, caso contrário há excesso. Ainda que o meio seja desnecessário, se houver moderação, configura legítima defesa. Uma pessoa para se defender pode atirar para cima e alegar legítima defesa, por exemplo. Para que haja legítima defesa o sujeito tem que repelir a agressão. É bom deixar claro que a repulsa à agressão tem que ser típica, fato previsto em lei como crime. A legítima defesa é uma circunstância que torna lícita uma conduta típica. A possibilidade de fuga elimina/descaracteriza a legítima defesa? Não. Mesmo que a pessoa tenha possibilidade legítima de fugir, cabe sim legítima defesa. O lícito/justo não deve submeter-se ao ilícito/injusto. A inevitabilidade da repulsa à agressão não é um requisito à legítima defesa. O inevitável é requisito do estado de necessidade e não da legítima defesa. A pessoa tem direito de repelir a agressão mesmo podendo fugir. iii. Elemento subjetivo Para que haja legítima defesa o sujeito tem que saber que está atuando em legítima defesa. É o elemento subjetivo essencial ao instituto da legítima defesa. A pessoa tem que ter consciência do elemento justificante. c. Excesso i. Legítima defesa intensiva e extensiva O sujeito que se exceder nos meios de moderação responde pelo crime. Ou seja, no caso de legítima defesa, caso o sujeito se exceda responderá pelo
crime culposo ou doloso. Pode haver o excesso na legítima defesa quando o sujeito se utiliza de um meio desnecessário, assim como pode haver excesso quando o sujeito se utiliza de imoderação no uso de um meio necessário.
O excesso apaga a legítima defesa anterior? Não. O excesso não ‘apaga’ a legítima defesa. O sujeito responde apenas pelos atos que excederam à legítima defesa. As ações praticadas em legítima defesa são justificadas, o sujeito não responde por elas. O excesso pode ser culpável ou não. Quando culpável o sujeito responde. Ocorre quando a pessoa age por raiva. Quando não culpável, o sujeito não responde. Ocorre quando a pessoa age por susto ou algo do gênero. Na legítima defesa intensiva ocorre quando o sujeito se utiliza de um meio, desde o início, desproporcional. Neste caso o sujeito responde pelo crime na forma dolosa ou culposa (quando decorre de força maior ou causa fortuita). Na legítima defesa extensiva ocorre quando o sujeito continua a agressão depois de repelido o ato injusto do agressor. Aqui o sujeito responde por seu excesso. d. Simultaneidade É possível haver legítima defesa simultânea e recíproca? Não podem ocorrer duas legítimas defesas simultâneas reais. Uma pessoa que age em legítima defesa o faz contra uma agressão injusta, que não pode configurar legítima defesa contra a reação justa. Quando dois inimigos se encontram e um faz menção de pegar uma arma quando na realidade apenas quer pegar seu celular no bolso, fazendo com que o outro atire nele em legítima defesa putativa, pois apenas suposta/imaginada, e o primeiro reage, este o faz em legítima defesa real. O que agiu em legítima defesa real, não responde por nada. O que o faz em legítima defesa putativa responde por culposo se o erro for vencível e não responde por nada se o erro for invencível. e. Sucessividade É possível haver legítima defesa recíproca sucessiva. Ocorre quando uma pessoa agride injustamente outra, e esta outra reage em legítima defesa; no entanto, a partir do momento que esta outra pessoa se exceder, a primeira pode reagir em legítima defesa contra o excesso. f. Ofendículos Ofendículos são defesas predispostas, preordenadas de determinados bens jurídicos, sobretudo a tranquilidade doméstica e o patrimônio. Como exemplos temos os vidros em cima dos muros das casas, os cachorros que o sujeito coloca para que não invadam sua casa, as cercas elétricas, etc.
Mas como se resolve, do ponto de vista jurídico, se estes ofendículos atingem o sujeito injustamente? Os ofendículos, se colocados em local de
difícil/restrito acesso, não precisam ser avisados. A obrigação de avisar a cerca elétrica vem de lei municipal, mas se colocada em local de difícil acesso não se faz necessário o aviso. Entretanto, se colocado em local de fácil acesso, a pessoa é obrigada a avisar senão responde pelo crime. Qual a natureza jurídica dos ofendículos? Corresponde à legítima defesa ou exercício regular de direito? Boa parte da doutrina brasileira ainda afirma que se trata de uma espécie de legítima defesa preordenada, sob o argumento de que no momento que o sujeito coloca o ofendículo não existe agressão, mas no momento que o ofendículo atua há agressão. Esta ideia foi importada da Alemanha, mas isto porque lá não existe a previsão do exercício regular de direito como causa de exclusão da ilicitude. Há quem entenda que o seu uso constitui exercício regular de direito, tendo em vista, principalmente, que, quando os equipamentos, sistemas ou instrumentos de proteção são instalados, ausente se encontra o requisito temporal da legítima defesa, qual seja, a atualidade ou a iminência da agressão (Aníbal Bruno e Julio Fabbrini Mirabete). Fundamentando-se no mesmo argumento, outra parte da doutrina defende que, enquanto não entrarem em ação os meios utilizados para a defesa, deve-se falar em exercício regular de direito; tão logo acionado, inscrever-se-ão nos limites da legítima defesa (Bitencourt). AULA 06 - CONCURSO DE PESSOAS 1. Conceito O concurso de pessoas é a disciplina jurídica que rege a pluralidade de agentes da conduta criminosa. O crime, algumas vezes, resulta de uma conduta individual de um sujeito. É o caso clássico: ‘A’ mata ‘B’. Entretanto, existem situações em que duas ou mais pessoas compartilham suas vontades visando à cooperação para a prática de um crime em comum. Este fenômeno é chamado de concurso de pessoas. Ocorre o concurso de pessoas quando duas ou mais pessoas conjugam suas condutas visando à prática de um delito comum. Então, por qual crime responde cada um? 2. Espécies a. Necessário i. Paralelas ii. Convergentes iii. Contrapostas O crime de concurso necessário é aquele que não pode ser praticado por apenas um sujeito. Exemplo: formação de quadrilha exige a participação de no mínimo três pessoas. Rixa é outro exemplo, é aquela briga generalizada que não se consegue saber quem bate e
quem apanha.
Segundo a doutrina, os crimes de concurso necessário podem ser de condutas paralelas, convergentes ou contrapostas. Condutas paralelas, como no exemplo de quadrilha, ocorrem quando duas ou mais pessoas praticam um crime com condutas no mesmo sentido. Condutas convergentes ocorrem quando duas pessoas praticam condutas uma junto com a outra, a soma de vontades. Condutas contrapostas correspondem ao exemplo de rixa, em que os sujeitos atuam uns contra os outros. b. Eventual Os crimes de concurso eventual são aqueles que podem ser praticados por uma só pessoa. No entanto, eventualmente, estes crimes podem resultar no ajuste/comunhão/conjugação de vontades. 3. Teorias a. Monista ou Unitária No Código Penal existe uma teoria de concurso de pessoas adotada como regra e está prevista no art. 29, caput do CP. Este artigo diz: quem, de qualquer modo, concorre para o crime, incide nas penas a este cominadas na medida da sua culpabilidade. Ou seja, todos aqueles que concorrem para a prática de um crime em comum responderão pelo mesmo crime, pouco importando se sua conduta é moral ou material, principal ou secundária, ou se o sujeito é autor ou partícipe. Basta de qualquer forma ter contribuído para a infração penal. Todos responderão pela mesma infração penal, porém não com a mesma pena. É a teoria monista ou unitária. b. Pluralista Pela teoria pluralista, pessoas que concorrem para um fato comum responderão por tipos penais distintos. No direito brasileiro, adota-se a teoria monista. Mas, há algumas exceções em que se aplica a teoria pluralista. Exceções estas que devem estar explícitas. É exemplo o art. 124 e 126 do CP. O art. 124 trata do aborto consentido e o art. 126 do aborto provocado por terceiro com consentimento. A gestante responde pelo crime do art. 124 e o terceiro responde pelo crime do art. 126. Ou seja, a gestante responde por consentir que terceiro provoque o aborto e o terceiro responde por provocar o aborto. Outro exemplo é o art. 317 e art. 333. O primeiro trata da corrupção passiva e o segundo da corrupção ativa. Corrupção passiva é a conduta do funcionário público que solicita ou recebe vantagem indevida em razão do cargo. A corrupção ativa é a conduta do particular que oferece ou promete vantagem a funcionário público. Mais um exemplo: arts. 342 e 343. O primeiro se refere à testemunha que mente no processo. O segundo se refere a terceiro que corrompe a testemunha para que ela minta. Outro exemplo: arts. 334 e 318. O primeiro trata do contrabando e descaminho
(contrabando consiste na importação ou exportação de mercadoria proibida e
descaminho é não pagar o imposto de entrada da mercadoria) e o segundo trata da facilitação do contrabando e descaminho. Exemplo: 319-A e 349-A. o primeiro se refere ao funcionário público que facilita/permite o ingresso de celulares nos presídios. O segundo se refere à conduta de alguém que faz ingressar no presídio celular para o preso. c. Dualista No direito brasileiro não se aplica a chamada teoria dualista. Pela teoria dualista, para o autor da infração, um crime, e para o partícipe da infração, outro crime. É como se o CP cominasse uma pena para o crime e outra pena para participação do crime. Exemplo: O autor responderia pelo homicídio e o partícipe pela participação no homicídio. 4. Requisitos a. Pluralidade de sujeitos/condutas Deve haver pluralidade de sujeitos e cada uma destas pessoas tem que ter uma conduta comissiva ou omissiva para a prática do crime. b. Nexo causal Para que haja concurso de pessoas é preciso que haja nexo causal entre a conduta e o resultado. O resultado de que depende a existência do crime só é imputável a quem lhe deu causa. Saber que o crime vai ocorrer e nada fazer para impedi-lo é conivência. A mera omissão não gera causalidade, a não ser que a pessoa seja garantidora. Em outras palavras, se você sabe que um crime vai acontecer não se torna partícipe ou co-autor por isto. c. Liame subjetivo Liame é vínculo/elo/laço, algo que une. Para que haja concurso de pessoas deve haver um vínculo subjetivo entre os concorrentes. Ou seja, todos devem buscar a realização de um delito comum atuando com unidade de elemento subjetivo. Ou todos atuam com dolo, ou todos atuam com culpa. Ninguém é partícipe por dolo num crime culposo. Se um agir com dolo e outro com culpa, cada um responde por seu crime. Não é preciso que as pessoas combinem previamente, um prévio ajuste para o crime, basta o ajuste/a adesão de vontades e o conhecimento um do outro. O concurso de pessoas pode surgir no momento. Se apenas um souber do outro e contribuir para o crime, este se torna partícipe do outro, mesmo sem o outro saber da sua ajuda.
Observação: Para haver desistência voluntária o autor deve impedir a consumação do crime e não apenas retirar sua participação. d. Identidade de infração Imaginemos que três pessoas resolvam assaltar uma mercearia. A polícia chega no momento do crime, duas fogem com a mercadoria e uma não consegue escapar. Elas respondem pelo crime consumado ou tentado? Apesar da que não fugiu ter apenas tentado, todas tem a identidade de infração. Todas respondem por crime consumado. Pela teoria monista todos aqueles que concorrem para o crime respondem pela mesma infração penal. Comunicabilidade de circunstâncias (art. 30) - existem dois tipos de circunstâncias no crime: as elementares do crime e as não elementares do crime. Uma circunstância elementar do tipo simples ou qualificado é aquela que integra o tipo penal, sua descrição, sem a qual o crime não existe. As circunstâncias não elementares são aquelas que não interferem no crime, apenas na dosimetria da pena. A condição de médico é uma circunstância elementar do crime de dar atestado médico, por exemplo. Reincidência, porém, não é circunstância elementar de nenhum crime. As circunstâncias elementares ou não elementares se dividem em pessoal e não pessoal. As circunstâncias de caráter pessoal são aquelas que dizem respeito ao sujeito ativo do crime, como o estado civil e a profissão, por exemplo. O modo como se comete o crime, por sua vez, não é pessoal. Se ocorrer a noite ou se você matar alguém com um lança chamas ao invés de uma arma configura circunstância não pessoal. Não se comunicam as circunstâncias de caráter pessoal, salvo se elementares do crime. Ou seja, as circunstâncias elementares de caráter pessoal transferem-se a todos os autores, coautores e partícipes do crime que delas tomarem conhecimento. Se uma pessoa ajuda terceiro casado a se casar, os dois cometem o crime de bigamia. Resumindo... As circunstâncias elementares, de caráter pessoal ou não, se comunicam com todos os participantes do crime. As circunstâncias de caráter pessoal que não integram o tipo, ou seja, não elementares, não se comunicam nunca. Nestas condições, o homem pode ser partícipe no crime de infanticídio, por exemplo. É uma condição elementar pessoal que se transfere. 5.
Autoria
O autor é o protagonista do crime e o partícipe é o coadjuvante. Não pode haver crime sem autor, mas pode haver crime sem partícipe. Pode haver assim autor sem partícipe, mas não partícipe sem autor.
a. Colateral Autoria colateral não é hipótese de concurso de pessoas. Ocorre quando duas ou mais pessoas querem realizar o mesmo crime ao mesmo tempo sem que uma saiba da outra ou a outra saiba da primeira, ou seja, não conhecem a contribuição comum de cada uma delas. Cada um responde por seu crime. b. Imediata Num conceito restritivo de autor, a partir da teoria objetivo formal, autor é o que chamamos de autor imediato. É o executor. É o que realiza formalmente a conduta prevista no núcleo do tipo. Mas existem situações em que o executor do crime não é punível. A pessoa se utiliza de interposta pessoa não punível para execução do crime. O autor, neste caso, é aquele que se utiliza de terceiro para cometer o crime. É a autoria mediata. c. Mediata Autoria mediata ocorre quando o autor se utiliza de um terceiro não culpável ou não punível para executar pessoalmente o delito. Um sujeito que induz um menor ou um louco a cometer um crime responde por autoria mediata. Outras hipóteses são: a obediência hierárquica ou indução de terceiro ao erro ou a coação moral. Observação: no caso de coação física o sujeito responde por autoria imediata porque o corpo do terceiro é mero instrumento, ele mesmo praticou o fato. d. Domínio do fato Nem sempre a pessoa mais importante do crime é aquela que está à frente da execução. Existe o chamado autor intelectual do crime. Welzel desenvolveu assim a teoria do domínio do fato, que afirma que o autor é aquele que tem domínio do fato, ou seja, que tem poderes para decidir quando, onde, como, contra quem, e, sobretudo, se o crime vai acontecer ou não. É aquele que tem poderes decisórios sobre o crime. 6.
Co-autoria
Co-autoria nada mais é que uma autoria compartilhada. 7. Participação a. Conceito O partícipe é um acessório, é um coadjuvante. Sua conduta é uma conduta acessória a conduta do autor. Não existe partícipe sem autor, mas existe autor sem partícipe. O partícipe responde pelo mesmo crime que o autor, segundo a teoria monista.
b. Teoria da acessoriedade Em que medida o delito do autor se comunica/transfere ao partícipe? Para esta pergunta existe a chamada teoria da acessoriedade. Existem quatro: a da acessoriedade mínima, da acessoriedade limitada, da acessoriedade máxima e da hiperacessoriedade. Teoria da acessoriedade mínima: para esta teoria, basta que a conduta do autor seja típica para que o autor responda. Teoria da acessoriedade limitada: Nem sempre é preciso que o autor execute o tipo, mas uma coisa é verdadeira: quem executa o tipo não é o partícipe, sua conduta é acessória e isoladamente não é criminosa. Passa a ser criminosa à medida que é acessória à conduta do autor, à medida que adere à conduta de alguém. Se a conduta do partícipe é isoladamente atípica, significa que a tipicidade da conduta do partícipe decorre da tipicidade da conduta do autor. Para que o partícipe possa ser responsabilizado o autor tem que praticar uma conduta típica e antijurídica, porque a legítima defesa do autor, por exemplo, também se transfere ao partícipe. O acessório segue o principal. Entretanto, a culpabilidade não se transfere para o partícipe como a tipicidade e a antijuridicidade. A culpabilidade é individual, como diz a teoria monista no art. 29 do CP. Esta teoria, adotada pelo Código, é chamada de teoria da acessoriedade limitada, e se resume nas seguintes palavras: a conduta do partícipe será considerada criminosa se houver antijuridicidade e ilicitude na conduta do autor. Teoria da acessoriedade máxima: pela acessoriedade máxima, para que a conduta do partícipe seja típica, a conduta do autor tem que ser típica, antijurídica e culpável. Teoria da hiperacessoriedade: segundo esta teoria a conduta do autor tem que ser típica, antijurídica, culpável e punível. c. Espécies/ Formas de participação i. Moral A participação moral consiste no induzimento ou na instigação. O induzimento ocorre quando o sujeito faz criar na pessoa a ideia do crime. A instigação consiste no reforço de uma ideia já existente. O partícipe moral não tem nenhuma participação física no delito, apenas induz ou instiga a pessoa a cometê-lo. O partícipe moral responde, mas com a pena reduzida.
ii. Material A participação material também é chamada de cumplicidade. O cúmplice é aquele que, sem ter o domínio do fato, contribui para que o crime ocorra daquela maneira. d. Momento O partícipe deve contribuir para que o crime ocorra, ou seja, tem uma contribuição causal. Logo, a participação só pode ocorrer antes da execução do crime ou durante a execução do crime. Ninguém pode ser partícipe depois que o crime foi completamente encerrado, executado e consumado. A participação exclusivamente posterior pode configurar crime autônomo. Exemplos: se o sujeito ajuda o criminoso a ocultar o cadáver, é ocultação de cadáver; se o sujeito ajuda o criminoso a fugir depois de ocorrido o crime e sem participação anterior, é favorecimento pessoal. e. Omissão Pode haver participação por omissão? Depende. De um modo geral, a omissão não é causa de resultado. De um modo geral, se você sabe que um crime vai ocorrer e nada faz para impedi-lo é conivente com ele. De um modo geral você não pode ser partícipe por omissão, salvo se o sujeito ocupar a posição de garantidor. Caso contrário, não responde por nada. E é possível haver participação em crime omissivo? Existem autores que dizem que não, como Luiz Régis Prado, por exemplo. Segundo ele, o que existe em crimes omissivos é autoria colateral, não existiria concurso de pessoas, cada um responderia por sua própria omissão em autoria colateral. Um sujeito pode ser partícipe por ação num crime omissivo, por instigação, por exemplo. f. Crime culposo Cabe concurso de pessoas em crime culposo? A tipicidade culposa é uma tipicidade aberta, ou seja, é um tipo que não minudencia/detalha a forma de execução da conduta criminosa. Os crimes culposos não especificam de que maneira a pessoa comete o crime. Nesta linha de raciocínio, o autor do delito culposo é todo aquele que viola o dever objetivo de cuidado. Assim, todo aquele que viola o dever objetivo de cuidado no crime culposo é autor. Para a doutrina brasileira não existe participação em crime culposo, somente coautoria, porque, se a tipicidade no crime culposo é uma tipicidade aberta, todo aquele que contribuiu para o fato, violou o dever objetivo de cuidado. E a violação do dever objetivo de cuidado é o requisito para a autoria no crime culposo. É o autor no crime culposo que viola o dever de cuidado, e se todo aquele que contribui para o crime culposo viola o dever objetivo de cuidado,
todo aquele que contribui para o crime culposo é autor. A doutrina
espanhola, porém, discorda, acreditando que aquele que instiga não é autor, é partícipe. O que não existe no crime culposo é a autoria mediata ou a autoria do domínio do fato. 8. Participação de menor importância O art. 29, § 1º do CP reza que se a participação for de menor importância a pena poderá ser reduzida de um sexto a um terço. O co-autor não tem este benefício. O art. 62 do CP prevê circunstâncias agravantes no concurso de pessoas para o coautor.
Art. 62 - A pena será ainda agravada em relação ao agente que: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
I - promove, ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
II - coage ou induz outrem à execução material do crime; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
III - instiga ou determina a cometer o crime alguém sujeito à sua autoridade ou nãopunível em virtude de condição ou qualidade pessoal; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
IV - executa o crime, ou nele participa, mediante paga ou promessa de recompensa. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
9. Cooperação dolosamente distinta Também chamada de desvio subjetivo de conduta, a cooperação dolosamente distinta ocorre quando, no concurso de pessoas, um dos concorrentes se excede e pratica um crime mais grave do que aquele desejado por outros concorrentes. Neste caso, o concorrente que quis participar de crime menos grave responderá na medida de sua culpabilidade, isto é, responderá pelas penas do crime que ele desejava praticar, que poderá, entretanto, ser aumentada da metade, caso o crime mais grave
seja previsível. Mas se o sujeito assumir o risco da ocorrência do resultado mais grave, o sujeito responde por concurso de pessoas. Exemplo: o motorista que leva os assaltantes de um banco ao local do crime e ajudará posteriormente com a fuga, assume o risco da possibilidade de um dos assaltantes matar alguém no banco. AULA 07 - CULPABILIDADE 1. Conceito Culpabilidade talvez seja um dos conceitos mais complexos que o Direito Penal possui. Esta expressão vem com uma tríplice concepção. A estudada em Direito Penal I é a culpabilidade enquanto princípio, princípio este que veda a responsabilidade objetiva, solidária e pelo fato de outrem. Ninguém pode responder por crime alheio, a não ser que para ele tenha contribuído. Ninguém pode responder se não tiver dado causa ao resultado com dolo ou culpa. A culpabilidade estudada em penal II é aquela como fundamento da pena, o último dos elementos do delito típico, jurídico e culpável, que fundamenta a imposição da pena ao indivíduo concreto. Sua origem alemã vem da palavra ‘shuld’, que significa dívida. É como se a culpabilidade significasse fazer uma pessoa devedora, a ponto de pagar sua dívida com
a sociedade. Isto num conceito antigo. Hoje se entende a culpabilidade como a união dos requisitos pelos quais pode se atribuir a alguém a responsabilidade pessoal e subjetiva pela prática de um injusto penal. Primeiro se analisa se a conduta é típica, depois antijurídica e, em seguida, se o sujeito é culpável. É a responsabilidade pessoal do sujeito que praticou o crime. Até o século XIX, não existia ilicitude e culpabilidade como coisas distintas. Hoje, a ilicitude é a contrariedade da ordem jurídica. E a culpabilidade é a atribuição da ilicitude a um determinado sujeito e responsabilizá-lo por isso. O CP, apesar de não apresentar um conceito de culpabilidade, adotou para esta a teoria normativa pura. 2. Teorias a. Psicológica Surgida no fim do século XIX e já superada. Pela teoria psicológica da culpabilidade, que tinha Liszt como defensor, a culpabilidade era uma relação psicológica do autor com o fato, formada por dolo e culpa. O dolo e a culpa eram espécies de culpabilidade. Para a teoria psicológica o crime era composto do tipo penal objetivo, do ilícito penal também objetivo e a culpabilidade subjetiva. No juízo de tipicidade, se a conduta se adequa ou não ao tipo, e de ilicitude, se a conduta é contrária ou não ao direito, não se fazia nenhuma consideração sobre a intenção do agente. Esta teoria não vingou mais do que 20 anos, embora seu autor seja um dos maiores penalista alemães. Se pensada a culpabilidade como uma interação subjetiva do autor com o fato, como encontrá-la na culpa inconsciente? Como pensar que existe uma relação subjetiva do autor com o fato se não houve, na culpa inconsciente, previsão, consciência ou vontade do fato criminoso. Hoje, a culpa é normativa. Quando se fala em algo subjetivo, é algo que diz respeito à consciência e à vontade do autor do fato, é imediatamente percebido pelos sentidos sem qualquer necessidade de juízo de valor. Quando algo é normativo, entretanto, depende de uma valoração do magistrado no caso concreto. Ao falar de dolo, falamos de um elemento subjetivo, de consciência e de vontade. Mas a culpa não. O magistrado deve verificar se a conduta era previsível ou não, por exemplo. Outra crítica possível consiste na afirmação de que a tipicidade e a ilicitude são meramente objetivas. A tipicidade não é formada de elementos puramente objetivos, existem elementos subjetivos do tipo, como a finalidade no furto, por exemplo, de ser necessário subtrair o bem para si ou para outrem.
b. Psicológica normativa Frank, autor alemão, disse, a partir do caso do cocheiro condenado por lesão corporal na Alemanha, que havia algo além do dolo e da culpa, que para o sujeito ser culpável deveria agir em normalidade de circunstâncias. Entendeu-se que não se poderia responsabilizar alguém se não pudesse exigir deste sujeito um comportamento diferente. Então Frank, Goldschmidt e Freudenthal criaram um conceito normativo de culpabilidade, que envolve três elementos: imputabilidade, exigibilidade de conduta adversa e o dolo e a culpa como elementos subjetivos. A teoria é psicológica normativa porque a imputabilidade e a exigibilidade são elementos normativos, enquanto que o dolo e a culpa são elementos subjetivos. O dolo incluía a consciência da ilicitude como elemento subjetivo, que hoje é entendido como elemento normativo. Imputabilidade corresponde à sanidade e à maturidade mental. O sujeito tem de ter condições de compreender o que está fazendo e determinar sua vontade de acordo com este entendimento, ou seja, capacidade de entender e querer. Análise normativa, portanto, que necessita de um juízo de valor do magistrado. Só é culpável aquele de quem se pode exigir um comportamento diferente, conforme o direito. c. Normativa pura i. Formal ii. Material Com Welzel surge a teoria normativa pura da culpabilidade. Segundo esta teoria, do ponto de vista formal, o dolo e a culpa saem da culpabilidade e passam a ser elementos do tipo penal. Assim surge o conceito formal de culpabilidade, adotado pelo CP. Existe assim: a tipicidade, que inclui o dolo natural e a culpa; a ilicitude; e a culpabilidade, que inclui a imputabilidade, a potencial consciência da ilicitude (o sujeito deve ter possibilidade de compreender que sua conduta é contrária ao direito), e a exigibilidade de conduta adversa. Estes elementos são cumulativos. E qual o fundamento material da culpabilidade? Poder agir de outro modo. Diz Welzel que o homem é livre, e ele será culpável quando ele dirigir sua vontade para a conduta criminosa quando podia agir em conformidade com o direito. A pergunta central para entender se o sujeito é culpável é: ele podia agir conforme o direito? O fundamento material está por trás dos elementos três formais.
d. Funcionalista Existe a chamada teoria funcionalista de Claus Roxin. Roxin não adota um conceito autônomo de culpabilidade, para ele o conceito é de responsabilidade. E a responsabilidade é formada pela culpabilidade, cujo fundamento é a capacidade de ser motivado pela norma; e pela a necessidade preventiva da pena. Ou seja, só é responsável aquele que agiu de forma culpável e que haja necessidade social de imputar pena ao sujeito. Este é um conceito muito vago, por isto muito criticado. 3. Imputabilidade a. Conceito Imputabilidade consiste num conjunto de condições pessoais que faz presumir que o sujeito tem capacidade de compreender o caráter ilícito de um fato e de determinar sua vontade de acordo com este entendimento. Ou seja, o imputável é aquele que tem sanidade e maturidade mental para compreender, distinguir se um comportamento é criminoso ou não, e maturidade para determinar sua vontade de acordo com este entendimento. Inteligência e vontade maduras e saudáveis para poder dirigir sua conduta. b. Critérios O Código Penal não define quem é imputável, porque a imputabilidade é a regra, mas quem é inimputável. Existem para tanto três critérios. i. Biológico É inimputável quem tem alguma causa orgânica, de modo que o juiz presuma que a partir dela o sujeito é inteiramente incapaz de entender e querer. A CF/88, em seu art. 228, define que é inimputável os menores de 18 anos. Definição posta no CP no art. 27. É uma presunção absoluta. Presume-se que o menor de 18 anos não tem capacidade, maturidade para entender o fato, ainda que seja emancipado, pois a capacidade civil não produz efeitos penais. O menor de 18 anos não comete crime, os fatos que ele praticar serão chamados de ato infracional, e responderá na forma do ECA, que prevê o máximo de três anos de internação. Ao menor de idade não se impõe pena, mas sim a medida socioeducativa prevista na Lei 8069/90, o Estatuto da Criança e do Adolescente. Observação: no direito penal a menor unidade de tempo é o dia. Não importa a hora do nascimento, o sujeito passa a ser imputável no dia que comemora seu aniversário de 18 anos.
De certa forma é um critério injusto, porque as pessoas evoluem e amadurecem de modo diferente, em tempos diferentes. Mas talvez seja o critério mais seguro. ii. Psicológico O critério puramente psicológico, não adotado no Brasil, define que o sujeito é inimputável se, no momento da prática da conduta, é inteiramente incapaz de entender e querer, independente de sua causa. Este critério, porém, não nos dá segurança jurídica, razão pela qual não foi adotado no Brasil. O art. 28, I do CP define que não excluem a imputabilidade penal a emoção e a paixão. No máximo, quando provocado por ato injusto da vítima, pode diminuir a pena, como previsto no art. 65, III, c. iii. Biopsicológico Critério utilizado pelo CP para definir quem é o inimputável adulto. O art. 26 do CP diz que é isento de pena o agente que, por doença mental, desenvolvimento mental incompleto ou desenvolvimento mental retardado, era, ao tempo da ação ou omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou determinar-se segundo esse entendimento. Ou seja, o adulto é inimputável se possui uma destas três características. Sem causa orgânica biológica não pode o adulto ser considerado inimputável. Um adulto inimputável não é condenado, é absolvido, pois não culpável. O sujeito sofre sentença absolutória imprópria, que impõe uma medida de segurança, fazendo com que o réu fique internado ou faça tratamento ambulatorial. Ou seja, o imputável sofre pena, o inimputável sofre medida de segurança. É o que se chama de sistema vicariante. c. Inimputáveis (acumulação dos três requisitos, necessariamente) i. Critério biológico ✓ Doença mental Como esquizofrenia, bipolaridade, por exemplo. A embriaguez patológica, que inclui a dependência química, é considerada pela OMS como doença mental. Nestes casos é aplicada a medida de segurança. Mas no caso de dependência química, o sujeito não é tratado num manicômio, como os demais.
✓ Desenvolvimento mental incompleto
É aquele que ainda não se concluiu, abrangendo, além dos menores (para os quais se adota o sistema biológico), os surdos-mudos e os silvícolas inadaptados (que recebem o tratamento do sistema biopsicológico); na hipótese destes últimos a psicopatologia forense determinará, em cada caso concreto, se a anormalidade produz a incapacidade referida na lei. ✓ Desenvolvimento mental retardado Compreende a oligofrenia, em suas formas tradicionais idiota, imbecilidade e debilidade mental.
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ii. Incapacidade Mas não basta o critério biológico, o sujeito tem que ser inteiramente incapaz de compreender e querer, de determinar sua vontade. Esta inteira incapacidade de entender e querer se dá por um intermédio de análise médica no hospital de custódia após o incidente. iii. Tempo O sujeito tem que ser inteiramente incapaz ao tempo da ação ou omissão. d. Semi-imputáveis Os semi-imputáveis (também chamados de boderline, é o limite entre a sanidade e a insanidade) são pessoas que tem uma capacidade reduzida de entender e querer. O art. 26, parágrafo único define o semi-imputável. Um portador de síndrome de down, por exemplo, pode ser, a depender do grau da doença, plenamente imputável, plenamente inimputável ou até mesmo semi-imputável. O semi-imputável é considerado culpado, e responde, em princípio, com pena reduzida de um a dois terços. Mas, se o juiz entender que o semiimputável necessita de especial tratamento curativo, pode substituir a pena por medida de segurança. e. Embriaguez Embriaguez é uma intoxicação aguda e passageira provocada pelo álcool ou substâncias de efeitos análogos. Em outras palavras, quando alguém fica embriagado, fica intoxicado por uma substância que altera sua percepção de compreender e querer.
A fase de embriaguez incompleta, de perda dos freios sociais e da timidez, para o direito penal, é irrelevante, faz o sujeito responder plenamente. A fase de embriaguez completa começa na fase de depressão e termina na fase comatosa, e, para tratamento do direito penal, depende da origem: Embriaguez pré-ordenada: consiste naquele que se embriaga para criar coragem de cometer o crime. É uma circunstância agravante previsto no art. 61, II, l. Embriaguez voluntária: conduta do sujeito que ser se embriagar, mas não quer cometer nenhum crime. O art. 28, II do CP diz que não excluem a imputabilidade penal a embriaguez voluntária ou culposa, provocada pelo álcool ou substância de efeito análogo. Ninguém pode alegar que estava bêbado para eximir-se da imputabilidade penal para cometer crime se na sua origem está uma conduta culposa ou voluntária. Se o sujeito quis se embriagar, se torna ‘garantidor de si mesmo’. É a teoria da actio libera in causa (ação livre na causa). O sujeito responde pelo crime como se estivesse sóbrio. Observação: a embriaguez voluntária pode resultar num crime tanto culposo quanto doloso. Assim como na embriaguez culposa. Embriaguez culposa: a mesma regra da actio libera in causa se aplica no caso da embriaguez culposa. É a embriaguez daquele que não quer se embriagar, mas acaba o fazendo por descuido, deixa-se embriagar. Responde pelo crime como se sóbrio estivesse, assim como na voluntária, o sujeito é ‘garantidor de si mesmo’. Embriaguez decorrente de causa fortuita ou causa maior: o art. 28, § 1º diz que é isento de pena, ou seja, é considerado inimputável, aquele que, por embriaguez completa, decorrente de caso fortuito ou força maior, era, ao tempo da conduta, inteiramente incapaz de entender e querer. Observação: o sujeito que coloca substância na bebida de outrem para este cometer crime, responde pelo crime por ele praticado, autoria mediata. Observação: Tem se questionado a constitucionalidade da actio libera em causa dizendo que representa uma violação ao princípio da responsabilidade penal objetiva. Ou seja, seria uma responsabilidade penal por algo que é imprevisível. Não seria decorrente nem de dolo nem de culpa e o sujeito deveria ser inimputável. Mas, a despeito destas afirmações, o STF continua considerando-a válida. 4. Causas de exclusão da culpabilidade por inexigibilidade de conduta adversa Trata-se de situações em que não se pode exigir de alguém, apesar de sua plena
capacidade de entender e querer, conduta diversa daquela por ela realizada. A teoria adotada pelo Código diz que só pode ser censurado aquele agiu de forma contrária ao
direito quando podia agir em conformidade com o direito. O CP explicita duas causas de exclusão da culpabilidade por inexigibilidade de conduta adversa, ambas previstas no art. 22: coação moral irresistível e obediência hierárquica. a. Coação moral irresistível i. Conceito Na coação moral irresistível, o sujeito é coagido mediante violência ou grave ameaça a praticar um ilícito penal. E esta violência é tão grave e seria para o coagido que não se pode exigir dele outro comportamento senão a prática desta conduta, determinada pelo coator. A coação moral irresistível é de autoria mediata, porque a culpabilidade é do coator, apesar de ser o coagido a praticar a ação no caso concreto. Apesar de a conduta ser típica e antijurídica, não é culpável.
Art. 62 - A pena será ainda agravada em relação ao agente que: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
II - coage ou induz outrem à execução material do crime; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
ii. Coação física versus moral Na coação física (vis absoluta) o sujeito se utiliza do corpo de outra pessoa como se fosse um mero instrumento/objeto. O movimento corpóreo do coagido não é direcionado por sua vontade. O sujeito age porque outra pessoa está mecanicamente a movendo. A coação física exclui a tipicidade por ausência de conduta. Quem pratica o fato sob coação física não tem sua conduta enquadrada no tipo. Na coação moral há conduta, mas a vontade é viciada por coação. A coação moral exclui a culpabilidade por inexigibilidade de conduta adversa. iii. Envolvidos ✓ Coator De um modo geral, na coação moral irresistível, são três as pessoas envolvidas. A primeira é a figura do coator. O coator
é uma ou mais de uma pessoa física determinada, ainda que o coagido não conheça a sua identidade. Se a conduta do coator vicia a conduta do coagido, a culpabilidade é para ele transferida, precisando que ele seja pessoa física. Ninguém pode alegar que foi coagido pela sociedade ou pelo Estado brasileiro, por exemplo. As pessoas jurídicas só podem ser responsabilizadas por crimes ambientais. O crime realizado por pessoa física que representa pessoa jurídica, para ela beneficiar, imputa responsabilidade penal para a pessoa física, sendo a pessoa jurídica responsabilizada, no máximo, civilmente. ✓ Coagido ou coacto
O coator obriga alguém, chamado de coagido. O coator é culpável e o coagido não. ✓ Vítima O coator utiliza de violência ou grave ameaça para forçar o coagido a praticar um crime, que pode ser contra o próprio coagido ou uma terceira pessoa. Esta é a vítima. Existem crimes, porém, que não têm vítima determinada, são os chamados crimes vagos. Um sujeito pode ser coator e vítima? Não. O coator não pode ser vítima porque o coagido a praticar um crime contra o coator age em legítima defesa. A conduta não é sequer ilícita. iv. Meios empregados ✓ Irresistibilidade É um crime praticado sob violência física ou grave ameaça (promessa de um mal grave, sério e crível a ponto de violentar a vontade da vítima). A coação deve ser irresistível. E a irresistibilidade deve ser tomada em duas dimensões/acepções: irresistível é primeiramente insuperável, aquela que o sujeito não tem como impedir/evitar que ela ocorra; e o mal praticado deve ser de uma dimensão tal que justifique a prática de uma conduta criminosa que guarde uma certa proporcionalidade para evitar o mal que o coagido vai sofrer. O mal cometido será dimensionado no caso concreto. A coação, quando resistível, serve como atenuante prevista no art. 65, III, c. v. Concurso de crimes O coator comete dois crimes, um contra a vítima e outro contra o coagido, ou apenas um? Parte da doutrina acha que o coator só responde pelo mal praticado à vítima, estando absorvido o crime de ameaça contra o coagido. Entretanto, prevalece hoje que o crime de tortura, que obriga o sujeito a agir de forma diversa de sua vontade, absorve a ameaça, pois é mais grave. O coator responde por tortura contra o coagido, de forma imediata, e pelo crime cometido contra a vítima, de forma mediata, num concurso de crimes. b. Obediência hierárquica
Na obediência hierárquica, assim como na coação moral irresistível, nós temos um superior, um subordinado e uma vítima. O superior dá uma ordem
ao subordinado para que este pratique uma infração penal, sem este saber que o faz. A ilegalidade não é flagrante, causando o desconhecimento do subordinado de que sua conduta resultaria numa infração penal. i. Requisitos ✓ Direito público Alguém só se beneficia da obediência hierárquica se for subordinado numa relação de direito público. Não existe obediência hierárquica, por exemplo, quando houver um temor reverencial. Nas relações de emprego privadas o que pode haver é coação moral irresistível, mas não obediência hierárquica, como no caso de um patrão que obriga seu empregado a praticar o crime de sonegação fiscal, ao não entregar cupom fiscal ao cliente, sob pena de ser demitido. ✓ Ordem Deve haver o dever de obedecer. A ordem pode ser legal ou ilegal. A ordem legal é aquela conforme a lei. Exemplo: o juiz manda cumprir um mandado de prisão determinado pelo STJ ao policial, subordinado. Quem obedece uma ordem legal age em estrito cumprimento do dever legal, causa de exclusão da ilicitude. Entretanto, a ordem dada pelo superior pode ser ilegal, de forma manifesta ou não manifesta. Uma ordem manifestamente ilegal é aquela cuja ilegalidade é flagrante. Neste caso o subordinado não fica obrigado ao ato, sendo ele responsabilizado penalmente em coautoria com o superior. Mas existem ordens cuja ilegalidade não é flagrante. O ato administrativo, por exemplo, goza de uma presunção de legalidade, não precisando o subordinado fazer uma investigação para analisar a legalidade do mandado que recebeu, ele presume sua legalidade. Quem responde pelo crime nestes casos é o superior que deu a ordem. Não é culpável, por inexigibilidade de conduta adversa, quem cumpre ordem ilegal de seu superior, desde que a ilegalidade da ordem não seja manifesta e a obediência seja estrita, isto é, a obediência deve ocorrer nos limites da ordem dada, estando o subordinado sujeito a penalidade por excesso. 5. Potencial consciência da ilicitude O erro de proibição consiste numa situação que pode ser confundida, mas não equivale
ao desconhecimento da lei. Ninguém pode descumprir a lei alegando que não a conhece. O art. 21 do CP deixa claro que o desconhecimento da lei é inescusável. O que pode levar à exclusão da culpabilidade é o erro de proibição, que corresponde à falta de
potencial consciência da ilicitude de uma conduta. Muitas vezes se sabe que uma conduta é proibida, mas não se conhece a lei que o define. Em outras, não se sabe que aquela conduta é proibida e nem tem como o saber. O erro de proibição não é o desconhecimento formal da lei, mas o fato de o sujeito não conhecer a ilicitude e nem ter como dela ter conhecimento. 6. Causas supralegais de exclusão da culpabilidade a. Objeção de consciência b. Excesso astênico de legítima defesa c. Desobediência civil d. Erro de permissão culturalmente condicionado Existem situações nas quais a jurisprudência reconhece a inexigibilidade de conduta adversa. Ou seja, existem situações nas quais alguém não é culpável por causas não previstas em lei. Objeção de consciência ocorre quando a pessoa tem uma determinada formação de natureza moral, cultural ou religiosa que a impede de realizar determinada conduta. De modo que, em determinadas situações, não se pode culpar alguém que pratica determinada conduta por motivos de consciência. Exemplo: as testemunhas de Jeová são completamente contrárias à transfusão de sangue. Um sujeito sofre um acidente e tem uma grave hemorragia, precisando de transfusão, mas a mulher impede o médico de fazê-la por ser testemunha de Jeová. A conduta da mulher é ilícita, pois impede que alguém tenha sua vida salva. Porém, em determinadas circunstâncias ela pode ter sua culpabilidade excluída por objeção de consciência. Mas isto só cabe em relação à pessoa maior e capaz. Os espíritas se opõem ao aborto. Um médico espírita trabalha num hospital público e chega as suas mãos uma gestante com todos os requisitos legais que autorizam o aborto pelo feto ser anencefálico. Qualquer funcionário público que deixa de praticar seu dever de ofício por sentimento pessoal comete crime de prevaricação. Na circunstância de ser um respeito a sua religião não se pode culpá-lo. O excesso astênico ocorre quando alguém reage em legítima defesa e se excede por medo/susto/pânico. O excesso estênico, em que a pessoa se excede por vingança ou raiva, não exclui a culpabilidade. Na desobediência civil, por exemplo, não há como punir toda uma multidão que, em tumulto, promoveu um quebra-quebra e provocou danos. Só se pune o instigador da situação. Existem situações em que o sujeito se vê envolvido em determinada cultura de tal forma que não se faz necessidade a punição. É o caso do erro de permissão culturalmente condicionado. O padrão deve ser auferido pela ideia de ausência de culpabilidade. Segundo Sebástian, o culpado é aquele que não é vulnerável a ponto de poder cumprir a
norma, o não culpável é aquele vulnerável. Exemplo: infanticídio ritual.
7. Co-culpabilidade É uma co-responsabilidade do Estado pela prática de determinados crimes na medida em que ele marginaliza determinadas pessoas. Existem pessoas que praticam determinadas infrações não porque querem, mas porque são socialmente levadas a isso, sobretudo pela omissão do Estado em assegurar determinados direitos fundamentais. Esta é uma tese desenvolvida por Eugênio Raul Zaffaroni, não acolhida pela doutrina majoritária brasileira, mas defendido por Nilo Batista. Este jurista defende que, em algumas situações, o sujeito deveria ser absolvido em face da co-culpabilidade do Estado, quando este não oferecesse as condições mínimas de dignidade para sua existência. Às vezes a ausência do Estado é um fenômeno criminógeno e desta forma ele não pode exercer um controle punitivo sem ter prestado um controle social anteriormente. No direito brasileiro tem se entendido que a co-culpabilidade pode atenuar a pena do sujeito. Ou seja, quando o sujeito não obteve direitos fundamentais por intermédio do Estado, se entende que a pena do sujeito pode ser atenuada em virtude disto. O STF já admitiu que, em algumas situações, a pessoa tenha pena alternativa, como no caso do sujeito que serviu como mula de cocaína para Portugal para salvar sua filha que tinha leucemia. Deve-se perceber, por outro lado, que isto não significa colocar a sociedade a mercê destas pessoas. AULA 08 - ERRO O erro é uma percepção equivocada acerca de algo. Ignorância, por sua vez, é a ausência de percepção. No direito, porém, ambas as figuras tem tratamento jurídico semelhante. No direito civil, fala-se em erro de fato e erro de direito, enquanto que no direito penal há duas grandes categorias de erro: o erro de tipo e o erro de proibição. 1. Erro de tipo O erro de tipo, presente no art. 20 do CP, consiste numa percepção equivocada ou na ignorância de alguma das elementares da figura típica. O erro de tipo, chamado de erro de tipo essencial, consiste no desconhecimento sobre a existência de um dos elementos do tipo. O sujeito desconhece a tipicidade do seu crime por ignorar um dos elementos. Ocorre quando o sujeito pratica a conduta típica sem saber que a está praticando, por desconhecer a existência de uma das elementares integrantes do crime. No erro de tipo o sujeito realiza o tipo objetivo do crime, por realizar todos os seus elementos, mas subjetivamente, ele desconhece a existência de algum elemento que faz sua conduta se tornar típica. É o caso do sujeito que tem relação sexual com uma menor de 14 anos desconhecendo sua idade. Ou do sujeito que furta objeto de outrem por ser igual ao seu, desconhecendo este fato. O erro sobre elemento constitutivo legal de crime exclui o dolo, já que este exige a consciência de todos os elementos do tipo; mas permite a punição por crime culposo se previsto em lei. O erro de tipo é o contrário do crime impossível, porque neste o crime existe na cabeça do agente, mas não na realidade,
existe o tipo subjetivo, mas não o objetivo; enquanto que no erro de tipo o crime existe na realidade, mas não existe na cabeça do agente, existe o elemento objetivo, mas o subjetivo.
a. Modalidades i. Erro de tipo inevitável/invencível/escusável É o erro que o sujeito não tinha como superar. Ele errou como qualquer outro sujeito naquela situação erraria. Erro que não tinha como ser superado por um sujeito diligente/prudente. É o erro culposo. E por estas razões, perdoável. Exemplo: É o que ocorre com um estudante de medicina que, ao pensar atuar sobre um cadáver, acaba ferindo uma pessoa viva, diante de circunstâncias que assim o permitam pensar. ii. Erro de tipo evitável/vencível/inescusável O sujeito incide em erro podendo evitá-lo. O erro evitável exclui o dolo, mas não a culpa. iii. Erro de tipo acidental Difere dos anteriores por ser acidental, enquanto os demais são essenciais. O erro de tipo essencial retira a consciência do agente quanto à tipicidade de sua conduta, fazendo com que o sujeito pratique o fato descrito como crime não dolosamente. O erro de tipo acidental, por sua vez, recai sobre elementos secundários do tipo delituoso. Não retira o dolo do agente, recai sobre aspectos secundários, ou seja, o agente quer cometer um crime, só que, por erro, acaba cometendo um crime um pouco diferente do que ele queria realizar. O erro de tipo acidental não retira a consciência da tipicidade da conduta do agente, recai sobre circunstâncias secundárias. O erro de tipo acidental pode recair sobre o objeto, sobre a pessoa, sobre a execução ou sobre o resultado. ✓ Quanto ao objeto Ocorre quando o sujeito deseja praticar um crime sobre um objeto e acaba atingindo outro. Quando o agente, por exemplo, deseja furtar um quilo de farinha e acaba furtando um quilo de açúcar. Ou quando pensa estar subtraindo um objeto de valor que na verdade não é significativo, ou viceversa. O erro quanto ao objeto é irrelevante. O sujeito responde pelo que efetivamente praticou.
✓ Quanto à pessoa (art. 20, § 3º) É um erro de representação da realidade. O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta de pena, não se consideram nesse caso as condições ou qualidades da vítima, senão as da pessoa contra a qual o agente queria praticar o crime. Ou seja, o agente responde pelo crime pelo qual queria cometer. Existem três sujeitos: o autor, a vítima efetivamente atingida e a vítima atingida. O autor A atira em C, por exemplo, pensando que C é B. Ou seja, o autor está atingindo a vítima efetiva, pensando que ela é a vítima desejada. É o caso de uma mãe que, achando que está cometendo infanticídio, mata o filho de outra. Ou de um sujeito que quer matar sua vizinha, mas acaba matando sua filha quando esta sai da casa da vítima desejada. ✓ Quanto à execução ou aberratio ictus (art. 73) A aberratio ictus é a aberração no golpe ou, em outras palavras, o golpe mal dado. Quanto aos efeitos, se iguala ao erro quanto à pessoa. A diferença consiste no erro de representação. No erro quanto à pessoa o agente confunde as pessoas, atingindo outro por pensar ser quem desejava. No erro quanto à execução, por outro lado, o sujeito identifica a vítima desejada direcionando seu golpe a ela, mas acaba, por erro na execução, atingindo outra. Ocorre quando A quer atingir B, dirigindo o golpe contra ele, mas, no momento de atirar, erra o tiro, acertando em C. E se o agente acaba acertando os dois? É caso de concurso de crimes. ✓ Quanto ao resultado ou aberratio criminis ou aberratio
delicti (art. 74)
RESULTADO DIVERSO DO PRETENDIDO
Art. 74 - Fora dos casos do artigo anterior, quando, por acidente ou erro na execução do crime, sobrevém resultado diverso do pretendido, o agente responde por culpa, se o fato é previsto como crime culposo; se ocorre também o resultado pretendido,
aplica-se a regra do art. 70 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) Diferentemente do aberratio ictus, que envolve pessoapessoa, o aberratio criminis é um erro que envolve coisapessoa ou pessoa-coisa. Ocorre quando se quer atingir uma coisa e acaba por atingir uma pessoa ou quando se quer atingir uma pessoa e acaba por atingir uma coisa. Quando, por exemplo, o sujeito arremessa uma pedra para atingir a faculdade e acaba por atingir alguém que está saindo no momento. Neste caso, o sujeito responde pelo crime contra a pessoa na forma culposa. Quando ocorre o inverso, errando a pessoa e atingindo a coisa, não responde pelo crime contra a coisa, mas contra a pessoa na forma de tentativa. Ou seja,
quando houver um conflito coisa versus pessoa, o crime contra a pessoa se sobressai em relação à coisa. O sujeito responde criminalmente apenas pelo crime contra a pessoa. 2. Erro de proibição (esfera da culpabilidade) O erro de proibição consiste numa situação que pode ser confundida, mas não equivale ao desconhecimento da lei. Ninguém pode descumprir a lei alegando que não a conhece. O art. 21 do CP deixa claro que o desconhecimento da lei é inescusável. O que pode levar à exclusão da culpabilidade é o erro de proibição, que corresponde à falta de potencial consciência da ilicitude de uma conduta. Muitas vezes se sabe que uma conduta é proibida, mas não se conhece a lei que o define. Em outras, não se sabe que é proibido e nem tem como o saber. O erro de proibição não é o desconhecimento formal da lei, mas o fato de o sujeito não conhecer a ilicitude e nem ter como dela ter conhecimento. O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena. Ou seja, é uma causa que exclui a culpabilidade. Se evitável, porém, a culpabilidade é diminuída, podendo reduzir a pena de 1/6 a 1/3. Exemplo: Um sujeito que vê um vulto descendo as escadas de sua casa correndo e, pensando ser um ladrão, mata-o. Ele não morava sozinho. Este erro é evitável. Todo erro de tipo é também erro de proibição, mas não se analisa ambos, porque o erro de tipo prevalece. Um advogado, por exemplo, que toma conhecimento de um segredo de seu cliente no exercício de sua profissão, viola o sigilo profissional se o revelar. Mesmo pensando que seja justa causa, o que excluiria o crime, se não for o caso, o sujeito incide em erro de tipo. Fazer justiça com as próprias mãos, art. 345, impede, por exemplo, que uma pessoa entre na casa de seu inquilino que não paga o aluguel para retirar suas coisas, pois isto é proibido. A única forma de despejar alguém é entrando com uma ação de despejo. Isto é erro de proibição, pois o sujeito não sabia que seu ato era ilícito. Basicamente, a diferença se resume neste exemplo: se uma pessoa planta um pé de maconha em casa sem saber que se tratava desta substância, incide em erro de tipo; se, porém, planta pensando que a lei não proíbe a conduta, incide em erro de proibição. O erro de proibição também pode ser classificado como direto ou indireto (erro de permissão). No erro de proibição direto, o sujeito desconhece a relação de contrariedade que existe entre a conduta e a ordem jurídica. No erro de proibição indireto, o sujeito se equivoca sobre o alcance jurídico de uma causa de justificação. Ou seja, o sujeito pensa/imagina que uma causa de exclusão da ilicitude é maior, mais ampla do que ela se verifica na realidade. Ele acha que está agindo em sua defesa. Exemplo: um sujeito subtraiu a carteira do bolso de um sujeito e saiu correndo, seguido por um policial que atira nele pelas costas, matando-o, sem qualquer tiro de advertência ou outro aviso. Um cuspe no rosto também não justifica que o ofendido atire no sujeito. Um homem traído, que se acha no direito de matar a mulher em nome de sua honra,
incide em erro de proibição indireto. Ou uma cerca elétrica capaz de matar.
3. Descriminantes putativas/ Erro de tipo permissivo (art. 20, § 1º do CP) Descriminante significa causa de exclusão da ilicitude (legítima defesa, estrito cumprimento do dever legal, exercício regular de direito e estado de necessidade). A expressão putativa, que vem do latim putare, significa suposto. Ou seja, é o sujeito que incide em erro sobre uma situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. O erro não recai sobre a tipicidade da conduta, mas sim sobre a existência de uma causa de justificação. O sujeito se equivoca sobre a existência fática de causa de exclusão da ilicitude. Exemplo: a legítima defesa putativa, de um sujeito que atira em outro, que o jurou de morte, por achar que ele puxava uma arma do bolso, que na verdade era um celular. Ou um policial que prende o gêmeo do suspeito ao invés do próprio. É isento de pena quem, por erro plenamente justificável pelas circunstâncias (erro inevitável), supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Entretanto, se o erro for evitável, o sujeito responderá por culpa, se o crime for previsto como culposo. Não há isenção de pena quando o erro é evitável.
Inevitável
Erro de tipo
Erro de proibição
Exclui o dolo e a culpa
Exclui a culpabilidade
Exclui o dolo, mas não a culpa
A culpabilidade é diminuída, reduzindo a pena de 1/6 a 1/3
Evitável
Descriminantes putativas Exclui a culpabilidade, isenta de pena Responde na forma culposa
Tanto o erro de tipo permissivo quanto o erro de permissão são erros que recaem sobre causa de exclusão da ilicitude. No entanto, o erro de tipo permissivo é um erro que recai sobre alguma circunstância de fato, não é um erro de interpretação da norma, mas sobre uma situação de fato. Como o caso da Fonte Nova, em que 20 pessoas morreram, porque a multidão entrou em pânico achando que estava agindo em estado de necessidade ao imaginar que a estrutura estava desabando. No erro de proibição indireto o sujeito tem plena consciência da situação de fato. Seu erro recai sobre o alcance jurídico da norma permissiva. A pessoa acha que a exclusão da ilicitude é mais ampla do que é na realidade. Para Bitencourt, não seria exagero afirmar que “o erro de tipo permissivo” constitui uma terceira espécie de erro. Seria um misto de erro de tipo e erro de proibição indireto. Para o autor, trata-se de um erro sui generis. Entretanto, Sebastian diz que fazem parte de categorias diferentes, além da diferença do tipo de erro (representação da realidade versus alcance da causa de exclusão) há a diferença quanto as consequências, enquanto o erro de tipo permissivo, se inevitável, exclui a culpabilidade e, se evitável, faz o
sujeito responder pelo crime na forma culposa; o erro de proibição indireto, se inevitável, exclui a culpabilidade e, se evitável, diminui a culpabilidade, reduzindo a pena.
4. Erro mandamental O erro mandamental é um erro que se refere ao dever de agir do agente nos crimes omissivos. O sujeito desconhece a sua condição de garantidor e acha que não tem o dever de evitar o resultado. Se o sujeito se equivoca quanto a sua condição de garantidor incide num erro mandamental, num erro de tipo. Um médico que acredita não ter obrigação de atender emergência (risco de morte) num hospital privado incide em erro mandamental. De regra, o erro mandamental é um erro de tipo. O doutrinador, Rogério Greco, discorda desta afirmação. 4. Erros inescusáveis: Aqueles que não poder ser escusáveis, porque equivalem à verdadeira ignorantia legis, eis que incidem sobre a lei, e não sobre a ilicitude. 4.1 Erros de Eficácia: aqueles que versam sobre a não aceitação da legitimidade de determinado preceito legal, supondo que contraria outro preceito; 4.2 Erros de Vigência: quando o agente ignora a existência de um preceito legal, ou ainda não teve tempo de conhecer uma lei; 4.3 Erros de Subsunção: quando o erro faz com que o agente equivoque-se sobre o enquadramento legal da conduta; 4.4 Erros de Punibilidade: quando o agente sabe ou podia saber que faz algo proibido, mas imagina que não há punição para essa conduta.