Sessão de Cinema
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Tropa de Elite
Tropa de Elite “Homens de preto, qual é sua missão? / Entrar pela favela e deixar corpos no chão” (Da trilha de Tropa de Elite)
“Podemos imaginar que seguramente acontecerá muita coisa nos próximos anos. E de tudo quanto é tipo, revoluções, mas também, sem sombra de dúvida, umas merdas do tipo fascismo e companhia. E daí, o que é que se deve fazer?” (Félix Guattari, Revolução molecular: pulsações políticas do desejo, 1977)
A
cidental ou não, a forma inédita como o filme foi divulgado contribuiu para torná-lo um sucesso sem precedentes: antes da estréia nacional, em 5 de outubro último, Tropa de
Elite já
circulava em cópias piratas (em versão anterior à edição final) por todo o país, havendo alcançado, segundo estimativas, a marca de 1 milhão de DVDs vendidos. Concomitantemente, em todas as calçadas, achavam-se à venda outros DVDs piratas, os quais, com títulos como Tropa de Elite 3, Tropa de Elite 4 e assim sucessivamente, ofereciam cenas reais de brutalidade policial aos espectadores que porventura não se houvessem saciado com o repasto original. Aclamado Aclam ado pelo pelo público, público, que em em larga larga medida medida passou a idolatrar idolatrar seu truculento protagonista (houve mesmo quem sugerisse sua canComunicação&política, v.25, nº3, p.227-244
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didatura ao Planalto...), o longa-metragem de José Padilha tornouse tema incontornável de conversação, fustigando debates sobre segurança pública marcados, muitas vezes, por apaixonada exaltação. O que, afinal, singulariza este blockbuster tupiniquim? Não é, certamente, o apuro técnico que nada deixa a dever à média dos filmes de ação hollywoodianos – este feito já fôra alcançado anteriormente por representantes da nova geração de realizadores. Tropa de Elite se destaca porque, diferentemente de obras como Pra frente, Brasil Brasil (1982) ou Batismo de sangue (2007) – para citar apenas dois exemplos – adota o ponto de vista do agente da repressão, e não o daqueles que se opõem à ação totalitária. É uma obra, portanto, que fala ao coração de um público ultraconservador, amedrontado e disposto a abraçar saídas autoritárias. Em mais de uma ocasião, como o leitor verá no dossiê que segue, fascist istaa, carapuça que seus realizadores reo filme foi adjetivado de fasc cusaram-se a vestir. Alegam eles, e alegam muitos comentadores, que é preciso estabelecer uma distinção entre as intenções dos realizadores e o discurso do Capitão Nascimento. O roteirista Bráulio Montavani, por exemplo, sustenta que “Nascimento é um policial linha-dura, com princípios morais e éticos rígidos, mas absurdos” . Há quem afirme, ainda, ser preciso deixar de lado as elocubrações políticas (o “sociologuês”, diria uma autoridade fluminense), e analisar Tropa de Elite pelo que é de fato, um longa-metragem de ficção. Afinal de contas, diriam, um filme não é uma tese. Entendemos que a intencionalidade de um material audiovisual, como a de um texto, deve ser buscada em suas estratégias discursivas, e nesse sentido parece-nos evidente que Tropa de Elite consiste num filme de tese – e não, por exemplo, um retrato multifacetado do drama da insegurança pública no Brasil contemporâneo, aberto a múltiplas interpretações. Construído a partir de uma perspecti va, a do narrador-pro narrador-protago tagonista, nista, o filme filme exibe imagen imagenss que se apro ximam do docum documentári entário, o, do jornali jornalismo smo televis televisivo, ivo, ou seja, imag imagens ens ‘realistas’. Artifício em que o real se funde com o discurso do Capi1
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Cf. Correio Braziliense, 29/10/2007.
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tão Nascimento, de modo que a perspectiva deste aparece como a perspectiva verdadeira, a única possível. Reforça esse artifício o fato de Nascimento e seus pupilos Neto e Matias serem os únicos personagens da trama dotados de alguma complexidade – os demais são unidimensionais, reduzem-se a tipos: o policial corrupto, o burguês alienado, o bandido. Assim, portanto, de modo simplório mas eficaz, constrói-se o engenho Tropa de Elite , este filme-tese: numa perspectiva realista – ou seja, na realidade –, o caos em que vivemos, a situação de violência urbana fora de controle, tem como causa a ação de elementos daninhos da própria sociedade (o policial corrupto, o universitário maconheiro ); diante dessa crise catastrófica, não há saída racional possível, a única solução é a violência comandada por um líder heróico (o Capitão Nascimento), que tem por objetivo eliminar os elementos desviantes e restaurar a vida pacífica (familiar). Trata-se, pois, de um tipo de racionalização da violência que freqüenta amiude o ideário conservador – do soerguimento alemão sob o Nazismo à Doutrina Bush de terror preventivo – e é de fácil aplicabilidade no mundo contemporâneo, tendo em vista que o sistema do capital pressupõe a sobrevivência em condições precárias da maior parte da população mundial, e que nesse contexto é crescente a necessidade do recurso à violência estatal para a manutenção da normalidade , isto é, de um ambiente favorável aos negócios. O que, por sua vez, exige uma justificativa ideológica igualmente eficaz. Argumenta-se que o filme possibilitaria um distanciamento em relação ao Capitão e seu discurso, ao mostrar aspectos negativos do caminho por ele escolhido, como os problemas de saúde e os conflitos conjugais. Ora, parece-nos que isso se presta justamente a reforçar a identificação do público com o protagonista, na medida em que contribui para humanizá-lo. Demais disso, a cota de 2
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O tema da descriminalização das drogas, por sinal, recorrente nas declarações dos realizadores à imprensa, está ausente do filme, assim como a não-tematização das causas e conseqüências da violência, o que evidentemente contribui para a eficácia do esquema proposto.
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sacrifício é elemento indispensável da caracterização do herói (a mitologia contemporânea registra que o Super-Homem e o Homem-Aranha, por exemplo, renunciam à felicidade conjugal para combater o Mal). Embora seu esquematismo tenda ao enfadonho, ao maniqueista (João Paulo Cuenca bem observa que o filme por vezes parece um vídeo institucional do BOPE...), não se pode negar a este marco da cinematografia brasileira méritos como o já mencionado apuro técnico (embora possamos questionar a pertinência de uma emulacão do padrão hollywoodiano de filmes de ação) e a atuação impecável de Wagner Moura, além deste, relacionado menos à sua realização que à sua recepção, qual seja: o mérito de fazer emergir em todo o seu esplendor os desejos – latentes ou não – de uma sociedade pouco apegada aos princípios que regem o Estado de direito democrático. A essa mesma platéia que o saúda em frenesi, no entanto, o próprio filme oferece o que poderíamos interpretar como um alerta, na cena em que, ao espocar de um tiro, o sangue jorra na tela, isto é, no lugar do espectador, e sobretudo naquela em que o aspirante aponta sua arma para a câmera antes de executar o malfeitor. O tiro que elimina o traficante parece também atingir o espectador. A tropa de elite, afinal, “Pega um, pega geral / Também vai pegar você”. Pedro Amaral (Colaborou Pedro Caldas)
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Tropa de Elite é fascista?’* Pelos gritos de ‘caveira’ na estréia e os urros sensuais da platéia, sei não... Arnaldo Bloch
Há algo de muito, muito hipócrita, no reino de euforia que cercou a estréia do filme mais celebrado da história do cinema brasileiro. A começar pelo discurso do diretor José Padilha, que perguntou à platéia que jorrava das fileiras do Odeon, quem já tinha visto o filme, “só por curiosidade”. Quatro honrados gatos pingados le vantaram as mãos, confessando-se piratas. O restante, em ato de alta covardia coletiva, emudeceu, e fezse um silêncio sepulcral no palácio cinematográfico na Cinelândia. Com a maior credulidade do mundo, sem qualquer signo de ironia, Padilha, herói de todo um Brasil de honestidade, retribuiu: - Que bom! Uma platéia virgem! Risadas, festa, alegria, quel esprit ! Sentado no balcão lá atrás, bem malocado (o termo é proposital) dos holofotes, não resisti e gritei a plenos pulmões, ou o que resta deles, maltratados que foram no tempo remoto em que fumava (tabaco, é claro, imaginem!): - Bando de mentirosos! Claro que, afora aqueles dois otários (coitados, pensaram que iam ser maioria...), ninguém dos 800 vultos que
hiperlotavam o cinema, apertando-se nas escadas e no chão, ia ser besta de assumir o ato de contravenção, ainda mais que estava lá o Secretário de Segurança, outro que emudeceu. Se assumissem, como é que iam depois ter cara para gritar “caveira” em corinho (quase vomitei o pastel de cordeiro, delicioso, que comi antes) à medida que o capitão Nascimento, o nosso Rambo do Bope (magistralmente interpretado por Wagner Moura) ia se sagrando herói da noite, libertador de todos os medos e de todas as culpas, vingador natural de todos os corações desprotegidos, resultante transcendente de todo o bem e todo o mal ? Não foi à toa que parte do público sentiu-se à vontade para gritar o lema da tropa corrupta e matadora. Afinal, ao optar pelo capitão Nascimento como narrador do filme, Padilha assumiu, de maneira sistemática, acrítica e quase pedagógica - e justificou para a média reacionária da sofrida sociedade espectadora - o discurso e o ponto de vista do que há de pior na corporação, o discurso da pseudorazão enlouquecida dentro da loucu-
* http://oglobo.globo.com/blogs/arnaldo, 25/09/2007.
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ra institucional, o discurso do ‘não referente a teses modernas, como a há saída, tem mesmo é que matar.’ liberação do consumo de drogas, Tudo no filme que não é o discurso hoje altamente aceitas, ao menos do Capitão Nascimento soa ridícu- como tema de debate, em qualquer lo, risível, até porque os demais per- foro, mas não na sala de aula retratasonagens são extratos estereotipados da por Padilha, onde só há viciados numa narrativa que se quer natura- alienados, com exceção do policial lista, mas crivada de cortes que de Matias, que conhece a realidade. abrangentes nada têm. A preocupação obsessiva de Padilha Assim, no filme de Padilha, só a clas- é com o baseado que a galera queise média-alta universitária de Zona ma, reforçando a tese surrada de que Sul consome maconha e cocaína. Esta os maiores culpados pela violência classe média-alta (a ‘galera’), para do tráfico são os usuários (todos, fazê-lo, necessariamente, e até com naturalmente, burgueses). A cada uma certa boa disposição de espíri- menção desta abobalhada burguesia to, trava as melhores relações com o com “consciência social” (as aspas comando do tráfico, descarregando são do cineasta), gritinhos histéricos sua culpa burguesa em ongs-fantasia eram ouvidos em redutos da plateia, que nada mais são que organismos- reforçados por palmas tímidas que títeres da alta bandidagem. logo se ocultavam ante a não-aderênCurioso que, num filme tão up-to- cia (felizmente!) da massa presente. date , tão distribuído por tantas majors E ao final, quando o aspirante Matias (aliás, quando apareceu Universal se transformou num “policial de verPictures na tela, teve gente quase es- dade” (leia-se: quando abandona seus vaindo de gozo), as várias discussões princípios e aceita a tortura a crianças sociológicas que se travam sobre a como método válido para seus noquestão da violência policial (no bres fins de vingança contra el capo) âmbito da universidade onde estu- uma ovação aliviada consagrou Troda a bandidagem burguesa, no caso, pa de Elite como porta-voz de nossas a PUC) não há uma sílaba sequer inquietações. E dá-lhe “caveira”! ARNALDO BLOCH é colunista d’O Globo.
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Tropa de Elite não é fascista* Wagner Moura
Escrevo instigado pelo bom texto do importante em épocas de crise: o de Arnaldo Bloch sobre a sessão de es- bate (inimigo do fascismo). O filme tréia de Tropa de Elite . E respondo traz um ponto de vista fundamental categórico à sua pergunta: Não, Tro- para se entender e discutir seguranpa de Elite não é fascista. Não é pos- ça pública, o olhar do policial. Eu, sível que alguém que tenha visto particularmente, discordo do capitão Ônibus 174 , um dos filmes mais Nascimento em quase tudo, mas não humanistas dos últimos tempos, pos- posso deixar de ver a importância de sa achar que o Zé Padilha (o diretor) entender seu pensamento como funtenha feito um filme fascista. Mas damental para o debate sobre violêntambém fico preocupado quando cia no Brasil, já que é ele, assim como vejo o capitão Nascimento ser trata- os traficantes e os moradores de fado como herói. Fico pensando como vela, quem vive diretamente essa reagiria ao filme uma platéia sueca. guerra particular, como nos ensinou, Não creio que pensariam naqueles não por acaso, o capitão Rodrigo policiais torturadores como heróis, Pimentel, roteirista do Tropa de Elite , assim como muita gente que vê o fil- no seminal Notícias de uma guerra parme aqui também não pensa. Talvez ticular , de João Moreira Salles. os suecos não precisem de heróis. Acho que o Tropa, além dos méritos Talvez, aí sim uma tragédia, fascistas artísticos que tem, talvez já seja o filestejamos nos tornando nós, brasi- me pós-retomada que mais suscitou leiros, cidadãos carentes de uma po- debates, a começar pela questão da lítica de segurança pública qualquer, pirataria, exaustivamente discutida. que vemos naqueles policiais hones- E não vejo, no Brasil de hoje, debate tos, bem treinados, mas desres- mais importante do que violência e peitadores dos direitos humanos segurança pública. Segurança públimais elementares, a solução para o ca não tem mais a ver só com a tragécaos em que estamos metidos. Com- dia das vidas que se vão por conta da partilhei contigo, Arnaldo, a vonta- guerra polícia-tráfico-com-moradode de vomitar o pastel de cordeiro res-no-meio. Tem a ver, por exemno Odeon. Mas, na minha opinião, plo, com aumento de verbas para a Tropa de Elite contribui com o mais Previdência e para a Saúde. E, quan*
O Globo,
24/09/2007.
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do falo de violência urbana, quero debates do núcleo PUC do filme, lembrar que se para nós, moradores onde o Zé Padilha estudou. E acho da Zona Sul, maioria na sessão do que já passou da hora mesmo de disOdeon, a chapa já tá quente há mui- cutir esse assunto com honestidade. to tempo, imaginem para quem não Capitão Nascimento põe sua vida em pode sair de sua casa por ordem de risco todos os dias para lutar uma um traficante, quem tem que passar guerra inútil contra o tráfico e resa noite no chão com medo de bala ponsabiliza os consumidores pela sua perdida, quem é esculachado e des- tragédia pessoal. Essa tem sido inclurespeitado pela polícia, quem não sive uma bandeira defendida por órpode falar com o parente da comu- gãos oficiais de combate às drogas. É nidade vizinha por ordem do poder lógico que há uma responsabilidade oficial, ocupante do vácuo deixado individual nisso, e eu conheço muita pelo poder instituído que, por sua gente que deixou de fumar maconha vez, vem historicamente negligenci- para não alimentar o tráfico. Mas não ando essas pessoas. Isso é um fato: as creio que essa campanha seja mais efimaiores vítimas da violência urbana caz do que a legalização do consumo. no Brasil são os moradores das fave- O uso de drogas existe desde que o las, e o filme mostra isso. Estou con- mundo é mundo e não vai ser a re victo: não há armas mais poderosas pressão que vai acabar com o consude combate à violência do que edu- mo. Mas a legalização pode acabar cação, cultura, lazer, esporte, bem- com o tráfico. Eu vejo o consumidor estar social e geração de emprego. É como o elo mais fraco da cadeia. assim que o capitão Storani, oficial Combatê-lo é contraproducente. O do Bope reformado que nos auxiliou abuso e o vício devem ser tratados no treinamento para o filme, tem como problemas de saúde pública. tentado combater a violência em sua O tráfico é que é questão de segurangestão como secretário de Seguran- ça pública. É o tráfico que arrasta os ça num município da Baixada. E, jovens de periferia para a morte e mais uma vez, recorro ao capitão tenho certeza de que morre muito Pimentel, na maravilhosa entrevista mais gente na guerra do tráfico do a João Moreira: “Enquanto o único que de overdose. De que forma fabraço do poder público que sobe a zer, eu não sei, mas acho que já pasfavela for a polícia, não haverá solu- sou mesmo da hora de discutir o que ção.” me parece óbvio e acredito que o filPimentel foi também o primeiro po- me contribui com isso. Só mais um licial que eu vi defender a legaliza- dado: sabe de quem partiu a idéia de ção do consumo de drogas, que o legalizar as drogas na Holanda? Da Arnaldo reclamou não constar nos polícia, parceiro. WAGNER MOURA é ator, protagonista do filme Tropa de Elite. 234
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Tropa de Elite: osso duro de roer* João Paulo Cuenca
Se precisasse definir o Brasil numa frase, diria que é o país do perdão. O país da anistia ampla, geral e irrestrita. Anistia que, em lei apro vada pelo governo Figueiredo, não somente livrou a cara dos perseguidos pela ditadura entre 1964 e 1979, mas que também abriu as asas da liberdade aos perseguidores e criminosos ‘oficiais’. Neste país de consciência livre, estupradores, torturadores e assassinos hoje jogam peteca na praia de Copacabana e curtem sua tranqüila aposentadoria. Depois de encher os bolsos, mandar bater e lotear estatais por duas décadas com sobrinhos com dificuldade de aprendizado, os milicos têm a vida que pediram à Opus Dei. O Brasil, e isso costuma chocar mais nossos companheiros latino-americanos do que a nós mesmos, é o país mais atrasado do continente quando se fala em punir os responsáveis pelos abusos cometidos pelo regime militar. Para o bem da ‘paz e harmonia nacionais’, o governo e a sociedade preguiçosa abaixam as orelhas e deixam pra lá. No país da anistia, tudo é perdoado com esquecimento. O que aconteceu deixa de ter acontecido, como se a roda da história se alimentasse de si mesma,
num processo autofágico e irreversível. O custo dessa amnésia tão simpática e conveniente é alto. Esse déficit moral faz com que o brasileiro aceite a idéia de tortura e violência policial como quem come um pastel de carne moída. *** Escrevo esses parágrafos, como vocês devem imaginar, movido pela experiência de assistir à pré-estréia de Tropa de Elite , na última quinta-feira, no Odeon. Além da equipe do filme e usuais papagaios de pirata, a sessão contou com a presença, in loco, de Harvey Weinstein, criador da Miramax, vencedor de 45 oscars, produtor de blockbusters como Pulp Fiction e Senhor dos Anéis e, claro, co-produtor de Tropa de Elite . Weinstein, segundo perfil publicado pela New Yorker , é conhecido como ‘Harvey mãos de tesoura’ pelo seu hábito de interferir na montagem dos filmes que produz. Imagino que não tenha sido o caso. Poderia entrar no mérito exclusivo do filme e dizer que é impecável no que se propõe e que, apesar (e por causa) da pirataria, será um sucesso
* http://oglobo.globo.com/blogs/cuenca, 25/09/2007.
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de bilheteria estrondoso. Ainda po- pública faz uma leitura do filme que deria escrever que Tropa de Elite na corrobora esses métodos e valores. E maior parte do tempo parece um aí, Tropa de Elite pode perigosamente institucional nauseante do BOPE – entrar para a história como o filme no final, só faltou o ‘Aliste-se já!’. Ape- da geração Cansei. O público torce sar disso, levanta algumas lebres, dá pelo herói torturador e mata com ele, um par de tiros certeiros e deixa pelo tortura com ele, em repetidas cenas à menos uma cena na memória – aque- la Abu Ghraib – ou “Guantánamo no la do policial Matias invadindo uma Rio de Janeiro”, como disse meu amipasseata pela paz na PUC. go Daniel Alarcón. As celebridades Ao mesmo tempo, o filme é de um enfiadas em black-tie aplaudem cada reacionarismo que talvez não tenha porrada, num frisson de adrenalina, paralelos na história do cinema naci- e todos se convertem instantaneaonal. O texto é claro como pó de már- mente em perfumados torturadores more: o tráfico de drogas é um de gabinete. câncer, a elite branca é hipócrita, a Depois, é claro, sabe-se que vem o PM é corrupta, e o BOPE é incorrup- perdão, nossa querida e mui conhetível. Só o BOPE, através de seus cida anistia, para o torturador assasimaculados princípios, nos salvará sino justiceiro e para nós, apêndices das trevas. E para isso, tem certas li- conexos dessa violência, como diz a cenças nada poéticas – a tortura é a lei número 6.683. Porque, para o principal delas. Eles, que são puros, bem da ‘paz e harmonia nacionais’, fazem o serviço sujo que nós, hipó- os fins justificarão os meios até o critas de classe média, não encara- (nosso) fim. Enquanto isso, o pastel mos. A lógica do discurso policial que de carne moída segue descendo bem Tropa de Elite reproduz é cristalina. pela goela de todos. O uísquinho serO problema começa quando esse vido em coquetéis de estréia como a monstro disforme chamado opinião de Tropa de Elite pode ajudar. JOÃO PAULO CUENCA é escritor, colunista d’O Globo.
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O chocante é a platéia* Artur Xexéo
Acabou a lua-de-mel. Enquanto de to Tropa de Elite faz tanto sentido um lado ficavam os piratas comer- quanto acusar Francis Ford Coppola cializando cópias ilegais de um filme de ligações com a máfia por ter diridestinado ao sucesso e do outro, os gido O poderoso chefão. Os formadoconsumidores que não tinham paci- res de opinião que já viram o filme – ência para esperar o filme chegar aos pois é, a gente tem que acreditar que cinemas e ainda contavam com a van- a quase totalidade da platéia do tagem de o produto encontrado nas Odeon que assistiu a seu lançamenruas ser mais barato, ninguém tinha to no festival não conhecia a versão dúvida: Tropa de Elite , seu diretor, seu em DVD pirata – confundem protaelenco, seus produtores eram os gonista com herói. Se o capitão Nasmocinhos. Os bandidos eram os con- cimento, personagem principal, sumidores sem consciência que cola- mata, tortura, faz justiça com as próboravam com a teia de sonegação fis- prias mãos, o filme leva o público a cal. Agora que o filme chegou aos apoiar seu comportamento. Não é cinemas como principal atração de bem assim. Há várias seqüências em um festival ao qual não faltam gran- Tropa de Elite que põem em dúvida o des atrações, a história é outra: mo- caráter do capitão Nascimento. Dicinhos são os espectadores indigna- ferentemente de Jack Bauer, por dos com uma suposta exaltação à exemplo, só para citar outro protatortura, com a heroicização de um gonista polêmico, que usa a tortura policial que combate o crime com e o homicídio para defender a segutécnicas pouco humanistas. Bastou rança dos Estados Unidos no seriauma única sessão de cinema, na do 24 horas, Nascimento não tem um abertura do Festival do Rio, para comportamento exemplar com a faTropa de Elite passar de mocinho a mília. Bate na mulher e mal conhece bandido. o filho. E não dá para dizer que ele A crítica que o filme vem recebendo ganha a simpatia da platéia quando, parte de uma premissa equivocada: numa reunião para escolher os próconfunde argumento com intenção ximos recrutas do Batalhão, debocha do diretor. Acreditar que José Padilha de um ex-candidato que ficou surdo apóia as práticas do Bope por ter fei- durante o treinamento comandado
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O Globo,
26/09/2007.
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por ele. “Foi um acidente”, justifica com ironia. É esse o herói criado por José Padilha? As críticas têm se referido ao papel negativo desempenhado no filme por estudantes da PUC que vendem maconha no campus. Vem cá, eu sou o único ex-universitário que sabia quem eram os colegas que, na faculdade, vendiam... hummm... ácido lisérgico? (pois é, sou mesmo de outros tempos). Isso não quer dizer que minha faculdade era um antro de viciados ou de traficantes. Tropa de Elite põe na roda integrantes da guerra do Rio que não costumam aparecer: estudantes e ONGs que atuam em favelas, principalmente. Qual é o problema? Contrariando Caetano Veloso, desta vez, Narciso acha feio o que é espelho. O que vem realmente chocando nas primeiras exibições públicas de Tropa de Elite é o comportamento da platéia. Independentemente das intenções de José Padilha, o capitão Nascimento realmente virou um herói. Já foi indicado para presidente da República por um espectador entrevistado aqui no Segundo Caderno. Tropa de Elite vem sendo defendido por sua equipe como um filme que apresenta o ponto de vista da polícia. É verdade. Mas isso não é muito diferente do que João Moreira Salles fez, ao dar voz ao capitão Rodrigo Pimentel, no documentário Notícias de uma guerra particular . A diferença aqui é a rea-
ção do público. O público é que aplaude cada tortura em traficante, cada morte de bandido em Tropa de Elite . É mais ou menos o que a gente lê todos os dias nas seções de cartas de leitores dos grandes jornais. Só que, agora, quem aplaude não está distante como o remetente de uma carta, mas na poltrona ao lado na sala de cinema. É difícil de aceitar. Mas Tropa de Elite está fazendo vir à tona um comportamento até agora silencioso. Não é o filme que faz a classe média apoiar métodos radicais para combater a bandidagem. Talvez o filme ajude a catarse. Melhor do que criticá-lo é refletir sobre o que nos transformou em gente assim. Há outra coisa que vem ajudando os críticos a encontrarem defeitos ideológicos em Tropa de Elite . Veja bem, são 400 filmes no Festival do Rio. Mas todo mundo só fala no filme de José Padilha. Torcer pelo capitão Nascimento não é muito diferente do que torcer por Bebel nesta reta final de Paraíso tropical. Ok, Bebel não tortura ninguém, pelo menos fisicamente. Mas poucas vezes um personagem de novela foi tão mau-caráter e se deu bem durante tanto tempo. Não conheço ninguém que queira ver Bebel na cadeia, no cemitério ou num hospício – os finais tradicionais para vilões em folhetins eletrônicos. Acredite: a culpa não é de Gilberto Braga.
ARTUR XEXÉO é colunista d’O Globo.
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Aplausos à violência?* Luiz Eduardo Soares
Como têm reagido as platéias ao fil- ção de, respectivamente, 30% e 28% me Tropa de Elite , que exibe a coreo- da população”. grafia e os bastidores da brutalidade Portanto, não é de se espantar que policial? Ainda é cedo para saber. haja quem aplauda a tortura e as exeMas há indícios reveladores. É preci- cuções. Esses não foram convencidos so avançar com cuidado nesse terre- pelo filme de que torturar é bom, no, ou correremos o risco de fazer executar é bacana. Eles se identificacom a sociedade o que alguns críti- ram com personagens que encarnam cos fizeram com o filme: simplificar seus valores e expressam suas emotodo um universo complexíssimo ções. Não se identificaram com ‘o filcom um rótulo fácil. Há os que riem me’, mas encontraram no filme pondiante da tortura. Mas será que rir tos de fixação e ali ancoraram seu expressa adesão ou algum profundo ressentimento e suas crenças. Dificildesconforto? Alguns gritam ‘caveira’ mente um filme mudaria a cabeça de e aplaudem o Bope (Batalhão de um terço da população que já se inOperações Policiais Especiais da clina para a aprovação de posturas PMRJ) nas ruas. Sim, é verdade, mas, arbitrárias. Entretanto, mesmo para nesse caso, não nos precipitemos em esses, alguma tensão talvez tenha generalizações. Vejamos o que nos sido provocada. O narrador, como diz uma pesquisa recente, publicada veremos a seguir, é um personagem por Alberto Carlos de Almeida, em imerso no mundo que o filme retraseu livro A cabeça do brasileiro (edito- ta. O que ele diz coincide com a senra Record): “Quase 40% da popula- sibilidade e as idéias dessa parte da ção brasileira acham certo que al- população, mas as dimensões não guém condenado por estupro seja verbais, simbólicas e inconscientes vítima do mesmo crime na cadeia”. do filme desestabilizam essa sensibi“Pouco mais de um terço da popula- lidade e essas idéias, de um modo ção considera correto que a polícia que parece ter precipitado um curiobata nos presos para obter confissões so efeito de júbilo e insatisfação. Por de supostos crimes”. Práticas como isso, a reação predominante desses “... a polícia matar assaltantes e la- que se identificam com a ideologiadrões e a população linchar suspei- caveira parece estar sendo a de ver tos de crimes, contam com a aprova- várias vezes o filme. Como se algo *
O Estado de SP ,
07/10/2007.
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estivesse fora do lugar e precisasse ser operações inconseqüentes, pratica identificado, processado e reposto toda sorte de atrocidades para cumem seu lugar original. Reagem como pri-las, torturando e executando susse estivessem diante de uma assime- peitos nas favelas cariocas. Conduzido tria, que exigisse sucessivos movimen- ao paroxismo da angústia, ante o abtos de reacomodação. Tudo parece surdo de sua tarefa, o capitão decide estar em seu lugar e soa certo, mas procurar um substituto para afastar-se algo escapa e cobra o esforço de reor- do Bope. A ansiedade se intensifica: ganização. O filme não sacia os que pânico, suor e tremores, desequilíbrio pensam encontrar ali o alimento para em casa, hesitação nas incursões. Casuas convicções autoritárias. A equa- pitão Nascimento vê as duas pontas ção não se resolve, a conta não fecha. do processo aproximarem-se: seus Seja como for, há um fenômeno ain- pares convencionais, corrompidos, da por compreender, que a pirataria confundem-se mais e mais com os critornou possível, mas não explica: o minosos, vendendo armas e negocifilme mobilizou o imaginário coleti- ando com o crime. Por isso, seu bata vo, sem limites de classe, cor, sexo, lhão os mata. Mas as práticas que ele idade ou gênero. Minha hipótese: agencia o tornam fonte da violência e nele, o que se ostenta é forte e o que instrumento de sua reprodução: seus se oculta mais forte ainda. O que se atos confundem-se, crescentemente, exibe é conhecido, mas nunca foi ex- com a selvageria dos traficantes. posto por esse ângulo – e o contraste Onde estão as instituições, as Leis, o entre familiaridade e estranhamento Estado democrático de direito, os vesinquieta e seduz. O que se oculta, ou tígios da civilização? O que distingue melhor, trafega sob a epiderme da nar- bandidos e polícia, se a violência arrativa, é o desencaixe entre, por um bitrária é a linguagem comum que os lado, a visão de mundo autoritária e identifica? Convertem-se em extenaparentemente auto-suficiente do po- sões, um do outro. A máquina que relicial-narrador e, por outro, seu sofri- produz a brutalidade está em marcha. mento, sua hesitação não verbalizada, Já não se conhecem princípio (nem sua incapacidade de tornar humana a princípios) e fim (nem finalidades). vida que vive. Quem viu o filme e sa- Nesse continuum, capitão Nascimenboreou a violência, aderindo à cruel- to sufoca, tenta esticar a cabeça para dade, pode ter sido inoculado, sem o respirar, sente a carótida pulsar, apersaber, com o veneno de um descon- ta as têmporas com as mãos, se entoforto perturbador, que talvez possa pe de remédios tarja-preta. desestabilizar certezas e abrir novas Para sair do batalhão, não basta que claves de sensibilidade e valor. Para Nascimento procure um substituto. que se entenda esse ponto crucial, su- Ele tem de criá-lo e o faz no ritual de giro a seguinte interpretação do filme. passagem para ingresso no Bope. Um capitão do Bope, instado a co- Convertidos a uma nova identidade, mandar sua tropa em uma série de corpo e espírito do neófito retornam 240
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à sociedade sob ‘nova direção’. O es- mundo que corresponde à limitada colhido e adestrado para substituir consciência de um agente social que Nascimento é um rapaz pobre e ne- reproduz dinâmicas históricas cuja gro, de nobres intenções, policial que lógica ignora. Eis um exemplo: ele diz se horroriza com a corrupção dos que só há três alternativas para um convencionais, e que experimentará policial, no Rio de Janeiro: corromao longo de toda a narrativa uma per-se, resignar-se ou ir à guerra. Cladualidade exasperante: à noite ro que essas três opções são as úniincursiona em favelas; pela manhã, cas apenas se a regra do jogo da junta-se a seus colegas da elite, no cur- criminalização das drogas existe, se so de Direito. À noite, caça quem ven- a polícia é o que se sabe etc... Fosde drogas aos colegas da faculdade, sem outras as regras do jogo, as opcom os quais é obrigado a conviver ções que se ofereceriam à consciêndurante o dia. A dupla fidelidade ar- cia do policial seriam diferentes. ruinará seus propósitos elevados, tais Portanto, Nascimento proclama uma como ele os entendia, originalmen- visão de mundo que não passa de te. A ponte entre os dois mundos se auto-engano, mas que se quer férrea, romperá. Entretanto, ao rebelar-se inabalável. Simultaneamente, sua contra os colegas ‘burgueses’ e vestir linguagem corporal e as imagens dia farda negra, de corpo e alma, André zem o contrário. As convicções de Matias continuará reproduzindo a Nascimento desmancham no ar. A lógica da ‘guerra’, em cujo âmbito es- performance de Wagner Moura e a ses mesmos colegas esbanjam prerro- direção de José Padilha são impresgativas. Assim como Nascimento, sionantes porque focalizam jus André encontra-se com seu contrário. tamente esse ponto delicado de As contradições entrelaçadas são in- (des)equilíbrio: contra as palavras e tegradas por uma fricção sintética e a ideologia que elas professam, a ansuperior, que abrange os atritos en- gústia e a hesitação no corpo, e a sitre as linhas de força até aqui identi- nuosidade vacilante das imagens. ficadas. Refiro-me ao choque entre a Nascimento não é morto para que a linguagem visual do filme e as con- justiça prevaleça. Nem vai ao psica vicções autoritárias de Nascimento, nalista para explicar ao espectador narrador que não enxerga um palmo seu drama. Essas seriam soluções trialém da lógica a que o submetem as viais e redundantes, incompatíveis regras do jogo jurídicas e políticas em com a riqueza simbólica. Sua percep vigor. Os enquadramentos e as se- ção autoritária e seu comportamenqüências ecoam o descentramento, as to inaceitável são desconstruídos, em hesitações, a ansiedade, a respiração sua matriz, pelo sistema – filme – essa tensa do narrador. Nas palavras de constelação de significados que a Nascimento, proclama-se a visão de obra põe em movimento. LUIZ EDUARDO SOARES é cientista político, ex-secretário nacional de segurança pública, autor (com André Batista e Rodrigo Pimentel) de Elite da tropa. Comunicação&política, v.25, nº3, p.227-244
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Polícia: espelho da sociedade? Ilona Szabó de Carvalho
Frente às dificuldades que a socieda- tuição de segurança pública, quais de brasileira vem enfrentando em são os direitos e deveres dos policiais. relação aos desafios que trazem as Quais são os limites que devem ser altas taxas de violência armada, o que impostos pelo Estado sobre o uso da mais assusta e angustia é ver como força e qual é o código de conduta os valores mais básicos desta socie- obrigatório a ser cumprido por uma dade se invertem e os referenciais do força policial em um país democrátique é certo e errado se perdem. co, que em norma e prática precisa A calorosa discussão provocada pelo respeitar os direitos humanos. filme Tropa de Elite , mesmo sendo so- Uso o termo direitos humanos, já bre velhos temas, gera debates polê- sabendo que as interpretações sobre micos e diferentes opiniões até mes- o mesmo também estão distorcidas mo dentro de organizações onde esses e mal-compreendidas. Uma parte da temas fazem parte do cotidiano, como população, ao invés de cobrar do Espor exemplo, o Viva Rio. Como novi- tado a preservação dos seus direitos, dade, a discussão traz o envolvimento está apoiando o desrespeito, a arbicada vez maior da sociedade, e de- trariedade e o abuso de poder dos monstra o que o medo e a desespe- agentes que são pagos por seus imrança podem fazer com pessoas co- postos, e que são pagos para nos promuns, de boa índole e educação, em teger. Desta forma não temos saída. um país por tantos anos refém de seus Só nos resta chorar nossos mortos, próprios erros e negligências. ou ficar reféns do medo e da inseguNeste país onde a crença em Deus rança que nos priva de tantos direipredomina, independente da opção tos fundamentais. religiosa de cada um, perdeu-se a fé Segurança e direitos humanos são na justiça divina. O que vale agora é termos que estão intrinsecamente lio ‘olho-por-olho e dente-por-dente’. gados. Não existe um sem o outro. Onde está o respeito à vida humana, Enquanto polícia e sociedade não nosso bem mais caro? Quem está compreenderem essa interdependêndelegando hoje o poder de tornar a cia e não implementarem essa intequem quer que seja um ‘justiceiro’ gração no seu dia-a-dia, continuaredo dia para a noite? De que justiça mos a contar as tristes histórias de estamos falando? vidas perdidas, de famílias dilaceraPergunto-me se a população brasilei- das, de medo e desespero, que dera sabe qual é o papel de uma insti- turpam os conceitos, a moral e des242
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troem o tecido social de um Estado. especializadas e aos estudiosos do O policial-herói não é o que agride, tema, a população não conhece seus tortura e executa, este é ainda mais fundamentos. bandido que o bandido. Pois não só Assim como os nossos policiais preestá cometendo desrespeitos gravís- cisam ter uma melhor capacitação e simos ao seu código de conduta, mas receber treinamento continuado traindo a sociedade e o Estado com a para que sempre possam atuar de inversão do cumprimento do seu maneira correta em contextos dinâdever, se juntando ao outro lado. micos, a população também precisa Não podemos aceitar e muito menos ser educada para desenvolver seu aprovar que o policial empregue os senso crítico. Precisa ser constantemesmos métodos dos que vivem fora mente atualizada, informada e preda lei. Essa não pode ser a vocação, parada para cumprir seus deveres e muito menos a virtude que buscamos exigir seus direitos. Esse papel precinos agentes de segurança pública. Ao sa ser melhor desempenhado por contrário, esta conduta precisa ser nossas escolas e por nossos meios de punida, não da mesma maneira com comunicação. que esses maus policiais punem seus Vamos resgatar o significado da painimigos, mas sim, dentro da lei, se- lavra Cidadania, discuti-la, ensiná-la guindo-a, respeitando-a, e sobretudo e lutar para que ela seja implemencumprindo-a! tada em todas as camadas de nossa O Brasil tem excelentes especialistas sociedade partida. Precisamos entene formuladores de políticas públicas der que não existe dicotomia entre sena área de segurança pública. Inúme- gurança e direitos humanos, mas que ros diagnósticos já foram realizados só vamos vencer a luta pela redução e planos para melhorar a segurança da violência armada, quando todos pública desenhados. Porque não os priorizarmos a Segurança Humana. implementamos? Continuamos in- Sejamos corajosos, e não covardes a sistindo nos erros de tantos anos, que ponto de nos apoiarmos nas armas de se não revertidos em pouco tempo, fogo como nossa única saída. Libermarcarão para sempre nossa trajetó- temo-nos do medo e do egoísmo que ria enquanto sociedade violenta, que desumaniza nossa sociedade e impemarginaliza, exclui e mata. de que políticas públicas mais eficaComo o debate sobre segurança pú- zes, que integrem segurança e desenblica até pouco não era um debate volvimento sejam implementadas. público, mas restrito às suas forças Precisamos crer que ainda há tempo. ILONA SZABÓ DE CARVALHO é coordenadora do Programa de Segurança Humana do Viva Rio.
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Tropa de Elite Ano de Lançamento (Brasil): 2007 Site oficial: www.tropadeeliteofilme.com.br Estúdio: Zazen Produções Distribuição: Universal Pictures do Brasil / The Weinstein Company Direção: José Padilha Roteiro: Rodrigo Pimentel, Bráulio Mantovani e José Padilha Produção: José Padilha e Marcos Prado Música: Pedro Bromfman Fotografia: Lula Carvalho Desenho de produção: Tulé Peak Figurino: Cláudia Kopke Edição: Daniel Rezende Elenco
Wagner Moura (Capitão Nascimento) Caio Junqueira (Neto) André Ramiro (André Matias) Milhem Cortaz (Capitão Fábio) Fernanda de Freitas (Roberta) Fernanda Machado (Maria) Thelmo Fernandes (Sargento Alves) Maria Ribeiro (Rosane) Emerson Gomes (Xaveco) Fábio Lago (Baiano) Paulo Vilela (Edu) André Mauro (Rodrigues) Marcelo Valle (Capitão Oliveira) Erick Oliveira (Marcinho) Ricardo Sodré (Cabo Bocão) André Santinho (Tenente Renan) Luiz Gonzaga de Almeida Bruno Delia (Capitão Azevedo) Alexandre Mofatti (Sub-Comandante Carvalho) Daniel Lentini
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Aquí se queda la clara, La entrañable transparencia, De tu querida presencia Comandante Che Guevara. Tu amor revolucionario Te conduce a nueva empresa Donde esperan la firmeza De tu brazo libertario. Aquí se queda la clara, La entrañable transparencia, De tu querida presencia Comandante Che Guevara. Seguiremos adelante Como junto a ti seguimos Y con Fidel te decimos: Hasta siempre comandante. Aquí se queda la clara, La entrañable transparencia, De tu querida presencia Comandante Che Guevara.
Carlos Puebla (Cuba, 1965)
Comunicação&política, v.25, nº3, p.227-244
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