No início da Ja Conferência, Voegelin introduz "o problema almão central do nosso tempo: a ascensão de Hitler ao poder". Como foi possível? E que conseqüências tem hoje? A sua resposta ao longo deste livro gira em torno do "princípio antropológico"; uma sociedade é um ser humano "em ponto grande" e a sua qualidadeestá determinada pelo caráter moral dos seus membros. Ora, a Alemanha dos anos 30revelava uma profuda defiiência espiritual, intelectual e moral. Como escreveu Hermann Broch, Broch, existia uma misteriosa cumplicidade no mal dos que não parciam ser maus.3 Como Karl Kraus e Thomas Mano escreveram, uma população tornara-se "populaça"ao esquecera capacidade humanade procurara verdade acerca da existência e
de viver segundo essa verdade. Havia falta de humanidade, "estupidez radical, "falta de reflxão", segundo Hannah Arendt. Esta explicação antropológica do nazismo é conforme à Filosofi política clássica e conduz Voegelin a rejeitar as explicações de Carl J. Friedrich, Zbigniew K. Brzezinski e Hannah Arendt sobre o "totalitarismo". Apresentar o indivíduo como indefeso perante os mecanismos de manipulação e intimidai ntimidação é determinismo sociológico. E, por isso, na recensão sobre "As origens do totalitarismo", escreve Voegelin que " . . .as situações e as mudanças exigem, mas não determinam, uma resposta"(. ..) "O caráter humano, a escala e a intensidade das suas paixões, os controles exercidos pelas suas virtudes, e a sua liberdade espiritual, constituem determinantes". Voegelin também não aceita o determinismo histórico. Não há uma fatalidade na cultura alemã que conduza ao hitlerismo e ao Holocausto. O hitlerismofoi umaescolh perversa, nãofoi um destino imposto pela estrutura culural. No ensaio de 194 "Nietzsche, a crise e a guerra", Voegelin defende Nietzsche da acusação de ser culturalmente responsável pelo advento do nacional-socialismo. O fiósofo niilista diagnosticara com pre cisão o núcleo doentio da cultura européia; segundo Voegelin, a terapêutica alternativa ao suicídio cultural da Europa do fi de século deveria ser uma conversão espiritual inspirada pela periagoge platônica, senão mesmo mesmo pela metanoia cristã. A personalidade moral do indivíduo não é determinada pelas estruturas sociais em que se insere, mas a mediocridade do caráter pessoal facilita a corrupção das estruturas sociais.
As componentes pessoais, sociais e históricas do povo alemão na década de 1930 tiveram o seu papel no hillerismo, mas o resultado fial foi determinado pela falta de caráter moral e espiritual da população e dos líderes. O que faltou na Alemanhados anos 20 e 30 foram pessoasresponsáveis com o sentido da busca daverdade. O que sobrou foram fanáticos fundamentalistas, convictos da "sua" verdade. É neste contexto que Eric Voegelin nos legou umparágrafo célebre sobre Adolf Hitler, cujas
defiiências es?irituais, morais e culurais iam a par com o gênio das oportunidades políticas. Ele tinha "...a combinação de uma personalidade forte e de uma inteligência enérgica com uma defiiência de estatura moral e espiritual; de consciência messiânica com o nível cultural de um cidadão da era de Haeckel; de nediocridade intelectual unida à auto-estima de um soba pro'lnciano; e do fascínio que uma tal personalidade poderia exercer num momento crítico sobre pessoas de espíritoprovinciano e com mentalidade de súditos". "Internacional da Estupidez" -, Eric Voegeli mostra-nos Hitlr corn nem mais nem menos que o homem da rua, o "Zé Ninguém" de Wilhlm Reich, mas capaz de intoxicar um povo coma grandeza intramundana. Que um homem assim se tenha tornado o representante do povo alemão só mostra que o declínio e a ascensão espirituais são caminhos sempre em abertna História. Só assim se poderá recuperar a força teórica e espiritual com que a consciência se robustece e que teria impedido a ascensão de Hitler ao poder. Mas intelectais alemães como o cardea Faulhaber, o bispo Neuhãusler, o pas torNiemõllere RudolfBultmann falharam em comunicar esse realismo espiritual. Na ausência de fis transcendentes para a existência, o apocalipse intramundano tomou conta do povo almão - como sucedera na revolução russa - e a "humanidade transformou-se em sinônimo de internados de um campo de concentração apocalíptico".
O nazismo nem sequer ti nha a reivindicação de universalidade; era a ideologia de uma nacionalidade que tinha a "atração luciferina" de uma ordem ideológica em que o povo alemão purifiado se considerava
como uma sociedade perfeita intramundana, fechada a outros povos e "raças".11 A vigilância contra o nazismo como fenô meno político continua a ser importante na Europa. Os parti dos da extrema-direita européia que se assentam no ódio aos imigrantes são considerados r esiduais na atualidade; mas as suas brasas dispersas podem repentinamente ser reacesas por uma calamidadeque provoque um incêndio. Jas per s diferenciou quatro caegorias de culpa - peal, política moral e metafísica -, nenhuma delas podendo constimir uma culpa coletiva. Para ele, a cula sempre permanece ligaa a um indivíduo, e someme da culpa política poderi ser obtida uma "responsabilidade coletiva" no setido de que o povo alemão teve de, coletivamente, suportar as conseqüências política dos crimes alemães durante o passado nazsta.
Mesmo que o desenraizamento e o deslocamento de milhões de pessoas no começo da guerra tenham permiti do que muitos dos criminosos e apoiadores do regime de terror assumissem novas identidades, escapando, assim, da responsabilidade por envolvimento pessoal nos crimes, ao menos no contexto local todos conheciam quem tinham sido os "nazistas cem por cento convictos", os informantes e os colaboradores. E, no entanto, em vez de descobri-los e entregá-los aos aliados, ou, mais tarde, às autoridades ale mãs - o que poderia ter levantado questões críticas acerca do próprio comportamento sob a ditadura -, uma atitude de silêncio coletivo dominou a maneira de os alemães lidarem com o passado nazista decada um. a preocupação com a própria sobrevivência no transe do pós-guerra; o repentino desmascaramento das culpas por ações aprovadas pelo Estado, cometidas muito tempo antes, e suas terríveis conseqüências; a desilusão, o medo do futu ro e a determinação de trabalhar por um futuro melhor; ou, mais tarde, a frustração com a má vontade das autoridades alemãs em agir contra os antigos ofiiais nazistas e sua recolocação nas antigas posições. Todas essas razões levaram muitos alemães, nos "anos de brita", nos quais o "domínio do presente" era um problema físico, não espiritual, a adotar uma atitude apolítica e a evitar qualquer discussão pública da questão da culpa individual pelos crimes nazistas.
ILENCIO Agressivo...