Capítulo
14 Hidrologia Estatística
s variáveis hidrológicas como chuva e vazão têm como característica básica uma grande variabilidade no tempo. Para analisar a vazão de um rio ou a precipitação em um local ou região, incluindo a sua variabilidade temporal, é necessário utilizar alguns valores estatísticos que resumem, em grande parte, o comportamento hidrológico do rio ou da bacia. Entre as estatísticas mais importantes estão a média, a média mensal, a variância, os mínimos e máximos.
A média A vazão vazão ou precipita precipitação ção média média é a média de toda a série série de vazões vazões ou precipi precipitaçõ tações es registradas, e é muito importante na avaliação da disponibilidade hídrica total de uma bacia. n
∑ x x =
i
i =1
n
A vazão média média especí específic ficaa é a vazão média média dividi dividida da pela área de drenagem da bacia. As vazões vazões médias médias mensais mensais represent representam am o valor valor médio médio da vazão para cada mês do ano, e são importantes para analisar a sazonalidade de um rio. A figura ao lado apresenta um gráfico das vazões médias mensais do rio Cuiabá na seção da cidade de Cuiabá, com base nos dados de 1967 a 1999. Figura 14. 1 : Vazões médias por mês do ano no rio Cuiabá, em Cuiabá.
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Observa-se nesta figura que há uma sazonalidade marcada, com estiagem no inverno e vazões vazões altas altas no verão. As maiore maioress vazões vazões mensais mensais médias médias ocorrem ocorrem em Fevere Fevereiro iro e as menores em Agosto, o que é conseqüência direta da sazonalidade das chuvas, que ocorrem de forma concentrada no período de verão.
A mediana A median medianaa é o valor valor que que é supera superado do em 50% dos pontos pontos da amostr amostra. a. A média média e a mediana podem ter valores relativamente próximos, porém não iguais. A mediana mediana pode pode ser obtida obtida organi organizand zandoo os n valore valoress xi da amostra em ordem crescente. Sendo x k com k = 1 a n, os valores de x organizados em ordem decrescente, a mediana é obtida por: Mediana = x p
e Mediana =
com p =
x p + x p +1
2
n −1
2
+1
se n for ímpar;
se n for par.
O desvio padrão O desvio padrão é uma medida de dispersão dos valores de uma amostra em torno da média. O desvio padrão é dado por: n
∑ ( x s=
i
− x
)
2
i =1
n −1
o quadrado do desvio padrão s2 é chamada variância da amostra.
O coeficiente de variação O coeficiente de variação é uma relação entre o desvio padrão e a média. O coeficiente de variação é uma medida da variabilidade dos valores em torno da média, relativamente à própria média.
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cv =
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s x
EXEMPLO
1) O seguinte conjunto de valores apresenta a chuva anual ocorrida em uma cidade ao longo de 30 anos. Calcule a média, o desvio padrão e o coeficiente de variação destes dados. ano 1954 1955 1956 1957 1958 1959 1960 1961 1962 1963
P (mm) 1671 1485 1766 1565 2082 1370 1926 2042 1691 1491
ano 1964 1965 1966 1967 1968 1969 1970 1971 1972 1973
P (mm) 2024 1305 1644 1908 1913 1485 1693 1313 1567 1493
ano 1974 1975 1976 1977 1978 1979 1980 1981 1982 1983
P (mm) 1357 2023 1390 1641 1585 1526 1962 1672 1404 1352
A média média é de 1645 1645,1 ,1 mm mm por por ano, ano, o desvio desvio padrão padrão é de 241,9 241,9 mm por por ano ano e o coefi coeficien ciente te de variaçã variaçãoo é de 0,15.
O coeficiente de assimetria O coeficiente de assimetria é um valor que caracteriza o quanto uma amostra de dados é assimétrica com relação à média. Uma amostra é simétrica com relação à média se o histograma dos dados revela o mesmo comportamento de ambos os lados da média. n
∑ ( x G=
3
i
− x )
i =1
n⋅s
3
A assi assimet metria ria é chamada chamada positiva positiva quando quando o valor valor de G é positiv positivoo e a ass assimet imetria ria é negativa quando o valor de G é negativo. Algumas variáveis importantes na hidrologia, como as vazões máximas anuais em rios, apresentam uma assimetria positiva.
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Assimetria
Valor de G
Nula
0 ou próximo de zero
Positiva
G>0
Negativa
G<0
Exemplo de histograma
O cálculo da assimetria de uma amostra é um pouco mais complexo do que o da média e do desvio padrão. A maior parte das calculadoras simples não permite calcular diretamente o coeficiente de assimetria. No programa Excel a função chamada “Distorção” permite calcular o coeficiente de assimetria.
Quartis e quantis Quantis separam a amostra de forma semelhante à mediana, porém em intervalos diferentes. Enquanto a mediana separa a amostra em dois grupos, com 50% dos dados com valores inferiores e 50% dos dados com valores superiores à mediana, os quartis e os quantis divdem a amostra em grupos de tamanhos diferentes. O primeiro Quartil é o valor que separa a amostra em dois grupos em que 25% dos pontos tem valor inferior ao quartil e 75% tem valor superior ao quartil. O terceiro Quartil é o valor que separa a amostra em dois grupos em que 75% dos pontos tem valor inferior ao quartil e 25% tem valor superior ao quartil. Já o segundo quartil é a própria mediana. Além dos três quartis, que separam a amostra em quatro, podem ser definidos quantis arbitrários, que dividem a amostra arbitrariamente em frações diferentes. Por exemplo,
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o quantil 90 % divide a amostra em dois grupos. O primeiro (90% dos dados) tem valores inferiores ao quantil 90% e o segundo (10% dos dados) tem valores superiores ao quantil 90%. No programa Excel é possível obter os quantis desejados usando uma função denominada Percentil.
A curva de permanência A curva de permanência é equivalente a um histograma de freqüências acumuladas relativas das vazões de um rio em um determinado local. A elaboração da curva de permanência é uma das análises estatísticas mais simples e mais importantes na hidrologia. A curva de permanência auxilia na análise dos dados de vazão com relação a perguntas como as destacadas a seguir. •
O rio tem uma vazão aproximadamente constante ou extremamente variável entre os extremos máximo e mínimo?
•
Qual é a porcentagem do tempo em que o rio apresenta vazões em determinada faixa?
•
Qual é a porcentagem do tempo em que um rio tem vazão suficiente para atender determinada demanda?
A curva de permanência expressa a relação entre a vazão e a freqüência com que esta vazão é superada ou igualada. A curva de permanência pode ser elaborada a partir de dados diários ou dados mensais de vazão. Na prática, a curva de permanência é relativamente fácil de obter, desde que existam dados de vazão. Usando a planilha de cálculo Excel, por exemplo, a curva de permanência pode ser gerada calculando os valores dos quantis de 1% a 99%, usando a função Percentil. O percentil 1% corresponde à vazão que é superada 99% do tempo, o percentil 10% corresponde à vazão que é superada em 90% do tempo. A Figura 14. 2 apresenta o hidrograma de vazões diárias do rio Taquari, em Muçum (RS), e a curva de permanência que corresponde aos mesmos dados apresentados no hidrograma. Observa-se que a vazão de 1000 m3.s-1 é igualada ou superada em menos de 10% do tempo. Apesar de apresentar picos de cheias com 7000 m3.s-1 ou mais, na maior parte do tempo as vazões do rio Taquari neste local são bastante inferiores a 500 m3.s-1. Para destacar mais a faixa de vazões mais baixas a curva de permanência é apresentada com eixo vertical logarítmico, como mostra a Figura 14. 3.
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Figura 14. 2: Hidrograma de vazões diárias do rio Taquari em Muçum (RS) e a curva de permanência correspondente.
Figura 14. 3: Curva de permanência do rio Taquari em Muçum com eixo das vazões logarítmico para dar destaque à faixa de vazões mais baixas.
Alguns pontos da curva de permanência recebem atenção especial: •
A vazão que é superada em 50% do tempo (mediana das vazões) é a chamada Q50.
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•
A vazão que é superada em 90% do tempo é chamada de Q90 e é utilizada como referência para legislação na área de Meio Ambiente e de Recursos Hídricos em muitos Estados do Brasil.
•
A vazão que é superada em 95% do tempo é chamada de Q95 e é utilizada para definir a Energia Assegurada de uma usina hidrelétrica.
EXEMPLO
2) Os dados de vazão do rio Descoberto em Santo Antônio do Descoberto (GO) foram organizados na forma de uma curva de permanência, como mostra a figura abaixo. Um empreendedor solicita outorga de 2,5 m3.s-1 num ponto próximo no mesmo rio. Considerando que a legislação permite outorgar apenas 20% da Q90 a cada solicitante, responda: é possível atender a solicitação?
Observa-se na curva de permanência que a vazão Q90 é de 7 m 3.s ,- 1 aproximadamente. Portanto a máxima vazão que pode ser outorgada para um usuário individual neste ponto corresponde a: Qmax = 0 ,2 ⋅ 7 = 1 ,4 m 3 ⋅ s
−1
Como o empreendedor solicitou 2,5 m 3.s ,- 1 não é possível atender sua solicitação.
A curva de permanência também é útil para diferenciar o comportamento de rios e para avaliar o efeito de modificações como desmatamento, reflorestamento, construção de reservatórios e extração de água para uso consuntivo.
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A Figura 14. 4 apresenta as curvas de permanência dos rios Cuiabá, em Cuiabá (MT), e Taquari, em Coxim (MS), baseadas nos dados de vazão diária de 1980 a 1984. As duas bacias tem áreas de drenagem de tamanho semelhante. A bacia do rio Cuiabá tem, aproximadamente, 22.000 km2, e a do rio Taquari cerca de 27.000 km2. O relevo e a precipitação média anual são semelhantes. A vazão média do rio Cuiabá é de 438 m3.s-1 neste período, enquanto a vazão média do rio Taquari é de 436 m 3.s-1, ou seja, são praticamente idênticas. Entretanto, observa-se que as vazões mínimas são mais altas no rio Taquari do que no rio Cuiabá e as vazões máximas são maiores no rio Cuiabá. O rio Cuiabá apresenta maior variabilidade das vazões, que se alternam rapidamente entre situações de baixa e de alta vazão, enquanto o rio Taquari permanece mais tempo com vazões próximas da média. Esta diferença ocorre basicamente porque a geologia da bacia do rio Taquari favorece mais a infiltração da água no solo, e esta água chega ao rio apenas após um longo período em que fica armazenada no subsolo. A vazão do rio Taquari é naturalmente regularizada pelos aqüíferos existentes na bacia, enquanto que na bacia do rio Cuiabá este efeito não é tão importante.
Figura 14. 4: Comparação entre as curvas de permanência dos rios Taquari (MS) e Cuiabá (MT).
A Figura 14. 5 apresenta as curvas de permanência de vazão afluente (entrada) e efluente (saída) do reservatório de Três Marias, no rio São Francisco (MG). Este reservatório tem um grande volume e uma grande capacidade de regularização, permitindo reter grande parte das vazões altas que ocorrem durante o período do verão, aumentando a disponibilidade de água no período de estiagem. Como resultado observa-se que a vazão Q90 é alterada de 148 m3.s-1 para 379 m3.s-1 pelo efeito de regularização do reservatório, enquanto a vazão Q95 é alterada de 120 m3.s-1 para 335 m3.s-1.
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Figura 14. 5: Curvas de permanência de vazão afluente e efluente do reservatório de Três Marias, no rio São Francisco (MG).
Portanto o efeito da regularização da vazão sobre a curva de permanência é torná-la mais horizontal, com valores mais próximos da mediana durante a maior parte do tempo.
Séries temporais A vazão de um rio é uma variável que se modifica de forma contínua no tempo, e pode ser representada em um hidrograma, que é o gráfico que relaciona os valores de vazão com o tempo, como na Figura 14. 6. Diversas análises estatísticas de dados hidrológicos são realizadas de forma mais conveniente sobre valores discretos no tempo, ao contrário das seqüências contínuas. A partir de uma seqüência contínua de vazões é possível identificar séries temporais de valores discretos, como, por exemplo, as vazões médias anuais, as vazões máximas anuais e as vazões mínimas anuais, conforme representado na Figura 14. 7 e na Tabela 14. 1. As séries discretas que são obtidas a partir da observação de alguns anos de dados de vazão são tratadas como amostras do comportamento de um rio ou de uma bacia. A população, neste caso, seriam todos os anos de existência de um rio. A vazão é considerada uma variável aleatória porque depende de fenômenos climáticos complexos e de difícil previsibilidade a partir de um certo horizonte.
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Figura 14. 6: As vazões variam continuamente no tempo (linha) mas a partir dos dados de vazão é possível gerar séries temporais discretas, como as médias, máximas (triângulos) e mínimas (círculos) anuais (adaptado de Dingman, 2002).
Figura 14. 7: Gráfico das séries discretas de médias, mínimas e máximas anuais.
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Tabela 14. 1: Valores das séries temporais discretas de vazões médias, mínimas e máximas anuais relativos à figura anterior. Ano
Vazão média anual 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996
95 93 72 86 56 73 96
Vazão mí nim a anual Vazão m áx im a anual 57 132 69 126 48 100 60 113 29 80 53 88 68 132
Risco, probabilidade e tempo de retorno Séries temporais discretas são convenientes para avaliar riscos em hidrologia. Risco é muitas vezes entendido como um sinônimo de probabilidade, mas em hidrologia é mais adequado considerar o risco como a probabilidade de ocorrência de um evento multiplicada pelos prejuízos que se espera da ocorrência deste evento. Projetos de estruturas hidráulicas sempre são elaborados admitindo probabilidades de falha. Por exemplo, as pontes de uma estrada são projetadas com uma altura tal que a probabilidade de ocorrência de uma cheia que atinja a ponte seja de apenas 1% num ano qualquer. Isto ocorre porque é muito caro dimensionar as pontes para a maior vazão possível, por isso admite-se uma probabilidade, ou risco, de que a estrutura falhe. Isto significa que podem ocorrer vazões maiores do que a vazão adotada no dimensionamento. A probabilidade admitida pode ser maior ou menor, dependendo do tipo de estrutura. A probabilidade admitida para a falha de uma estrutura hidráulica é menor se a falha desta estrutura provocar grandes prejuízos econômicos ou mortes de pessoas. Assim, a probabilidade de falha admitida para um dique de proteção de uma cidade é a probabilidade de que ocorra uma cheia em que o nível da água supere o nível de proteção do dique. Diques que protegem grandes cidades deveriam ser construídos admitindo uma probabilidade menor de falha do que diques de proteção de pequenas áreas agrícolas. A Tabela 14. 2 apresenta o tempo de retorno em anos adotado, normalmente, para diferentes tipos de estrutura.
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Tabela 14. 2: Tempo de retorno adotado para diferentes estruturas, de acordo com o risco associado.
Estrutura TR (anos) Bueiros de estradas pouco movimentadas 5 a 10 Bueiros de estradas muito movimentadas 50 a 100 Pontes 50 a 100 Diques de proteção de cidades 50 a 200 Drenagem pluvial 2 a 10 Grandes barragens (vertedor) 10.000 Pequenas barragens 100 O risco também pode estar relacionado a situações de vazões mínimas. Por exemplo, considere uma cidade que utilize a água de um rio para abastecimento da população. Dependendo do tamanho da população e das características do rio, existe um sério risco de que, num ano qualquer, ocorram alguns dias em que a vazão do rio é inferior à vazão necessária para abastecer a população. No caso da análise de vazões máximas, são úteis os conceitos de probabilidade de excedência e de tempo de retorno de uma dada vazão. A probabilidade anual de excedência de uma determinada vazão é a probabilidade que esta vazão venha a ser igualada ou superada num ano qualquer. O tempo de retorno desta vazão é o intervalo médio de tempo, em anos, que decorre entre duas ocorrências subseqüentes de uma vazão maior ou igual. O tempo de retorno é o inverso da probabilidade de excedência como expresso na seguinte equação: TR =
1
(14.1)
P
onde TR é o tempo de retorno em anos e P é a probabilidade de ocorrer um evento igual ou superior em um ano qualquer. No caso de vazões mínimas, P refere-se à probabilidade de ocorrer um evento com vazão igual ou inferior. A equação acima indica que a probabilidade de ocorrência de uma cheia de 10 anos de tempo de retorno, ou mais, num ano qualquer é de 0,1 (ou 10%). A vazão máxima de 10 anos de tempo de retorno (TR = 10 anos) é excedida em média 1 vez a cada dez anos. Isto não significa que 2 cheias de TR = 10 anos não possam ocorrem em 2 anos seguidos. Também não significa que não possam ocorrer 20 anos seguidos sem vazões iguais ou maiores do que a cheia de TR=10 anos. Existem duas formas de atribuir probabilidades e tempos de retorno às vazões máximas e mínimas: métodos empíricos e métodos analíticos.
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Probabilidades empíricas podem ser estimadas a partir da observação das variáveis aleatórias. Por exemplo, a probabilidade de que uma moeda caia com a face “cara” virada para cima é de 50%. Esta probabilidade pode ser estimada empiricamente lançando a moeda 100 vezes e contando quantas vezes cada uma das faces fica voltada para cima. O problema das probabilidades empíricas é que quando o tamanho da amostra é pequeno, a estimativa tende a ser muito incerta. Suponha, por exemplo, que apenas 6 lançamentos sejam feitos para estimar a probabilidade de que uma moeda caia com a face “cara” voltada para cima. É possível que seja estimada uma probabilidade muito diferente de 50%. Para contornar este problema é comum supor que os dados hidrológicos sejam aleatórios e que sigam uma determinada distribuição de probabilidade analítica, como a distribuição normal, por exemplo. Esta metodologia analítica permite explorar melhor as amostras relativamente pequenas de dados hidrológicos, como se descreve na seqüência deste capítulo.
Chuvas anuais e a distribuição normal O total de chuva que cai ao longo de um ano pode ser considerado uma variável aleatória com distribuição aproximadamente normal. Esta suposição permite explorar melhor amostras relativamente pequenas, com apenas 20 anos, por exemplo. A distribuição normal é descrita em qualquer livro introdutório de estatística e se aplica a muitos tipos de informações da natureza. Um gráfico da função densidade de probabilidade da distribuição normal tem uma forma de sino e é simétrica com relação à média, que é o valor central. A forma em sino indica que existe uma probabilidade maior de ocorrerem valores próximos à média do que nos extremos mínimo e máximo. A função densidade de probabilidade (PDF) da distribuição normal é uma expressão que depende de dois parâmetros: a média e o desvio padrão da população, conforme a equação seguinte: 1 x − µ 2 x ⋅ exp − ⋅ f x ( x ) = 2 ⋅ π ⋅ σ x 2 σ x 1
(14.2)
onde µx é a média da população e σx é o desvio padrão da população. Para o caso mais simples, em que a média da população é zero e o desvio padrão igual a 1, a expressão acima fica simplifcada:
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z 2 ⋅ exp− f z ( z ) = 2 ⋅ π 2 1
(14.3)
onde z é uma variável aleatória com média zero e desvio padrão igual a 1. O gráfico desta última é apresentado na Figura 14. 8. A área total sob a curva é igual a 1. A área hachurada representa a probabilidade de ocorrência de um valor maior do que z (figura de cima) ou menor do que z (figura de baixo). A área sob a curva pode ser calculada por integração analítica, mas resulta numa série infinita. Por este motivo, as aplicações práticas são mais comuns na forma de tabelas que relacionam o valor de z com a probabilidade de ocorrer um valor maior do que z ou menor do que z. Existem, também, tabelas que fornecem valores da área entre 0 e z, ou de –z a z. No final do capítulo é apresentada uma tabela de probabilidades da distribuição normal. No programa Excel é possível obter os valores das probabilidades utilizando a função DIST.NORMP(z), que dá a probabilidade de ocorrer um valor inferior a z. Lembrando a relação entre probabilidades e tempos de retorno, é interessante saber os valores de z que correspondem a alguns valores específicos de probabilidade, como 0,1 0,01 e 0,001. Estes valores correspondem aos tempos de retorno de 10, 100 e 1000 anos. No final do capítulo é apresentada uma tabela de probabilidades da distribuição normal, indicando os valores de z correspondentes aos tempos de retorno de 2 a 10000 anos.
Figura 14. 8: Gráfico da distribuição normal (na figura superior é indicada a área hachurada que representa a probabilidade de ocorrer um valor maior do que z; e na figura inferior é indicada a área hachurada que representa a probabilidade de ocorrer um valor menor do que z).
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Uma variável aleatória x com média µx e desvio padrão σx pode ser transformada em uma variável aleatória z, com média zero e desvio padrão igual a 1 pela transformação abaixo: z =
x − µ x
(14.4)
σ x
Esta transformação pode ser utilizada para estimar a probabilidade associada a um determinado evento hidrológico em que a variável segue uma distribuição normal. Considere, por exemplo, a chuva anual em um determinado local. Anos com chuva próxima da média são relativamente freqüentes, enquanto anos muito chuvosos ou muito secos são menos freqüentes. Em muitos locais as chuvas anuais seguem, aproximadamente uma distribuição normal, como mostra a Figura 14. 9.
Figura 14. 9: Histograma de freqüências de chuvas anuais no posto pluviométrico localizado em Lamounier, MG.
A probabilidade de ocorrência de chuvas anuais superiores a 2000 mm, por exemplo, pode ser estimada a partir da análise dos dados de n anos, e da suposição de que os dados seguem uma distribuição normal.
EXEMPLOS
3) As chuvas anuais no posto pluviométrico localizado em Lamounier, em Minas Gerais (Código 02045005) seguem, aproximadamente, uma distribuição
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normal, com média igual a 1433 mm e desvio padrão igual a 299 mm. Qual é a probabilidade de ocorrer um ano com chuva total superior a 2000 mm? Considerando que a média e o desvio padrão da amostra disponível sejam boas aproximações da média e do desvio padrão da população, pode se estimar o valor da variável reduzida z para o valor de 2000 mm: z =
x − µ x
σ x
≅
x − x s
=
2000 − 1433 299
= 1,896
de acordo com a Tabela A, no final do capítulo, a probabilidade de ocorrência de um valor maior do que z=1,896 é de aproximadamente 0,0287 (valor correspondente a z=1,9). Portanto, a probabilidade de ocorrer um ano com chuva total superior a 2000 mm é de, aproximadamente, 2,87%. O tempo de retorno correspondente é de pouco menos de 35 anos. Isto significa que, em média, um ano a cada 35 apresenta chuva total superior a 2000 mm neste local.
4) As chuvas anuais no posto pluviométrico localizado em Lamounier, em Minas Gerais (Código 02045005) seguem, aproximadamente, uma distribuição normal, com média igual a 1433 mm e desvio padrão igual a 299 mm. Qual é a probabilidade de ocorrer um ano com chuva total inferior a 550 mm? A distribuição normal é simétrica. A probabilidade de ocorrer um valor superior a z é igual à probabilidade de ocorrer um valor inferior a –z. Assim, z =
x − µ x
σ x
≅
x − x s
=
550 − 1433 299
= −2,95
de acordo com a Tabela A, no final do capítulo, a probabilidade de ocorrência de um valor maior do que z=2,95está entre 0,0012 e 0,0019. Portanto, a probabilidade de ocorrer um ano com chuva total superior a 2000 mm é de, aproximadamente, 0,15%. O tempo de retorno correspondente é de pouco menos de 666 anos. Isto significa que, em média, um ano a cada 666 apresenta chuva total inferior a 550 mm neste local.
Vazões máximas Selecionando apenas as vazões máximas de cada ano em um determinado local, é obtida a série de vazões máximas deste local e é possível realizar análises estatísticas relacionando vazão com probabilidade. As séries de vazões disponíveis na maior parte dos locais (postos fluviométricos) são relativamente curtas, não superando algumas dezenas de anos.
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Distribuição empírica
Analisando as vazões do rio Cuiabá no período de 1984 a 1992, por exemplo, podemos selecionar de cada ano apenas o valor da maior vazão, e analisar apenas as vazões máximas (Tabela 14. 3). Reorganizando as vazões máximas para uma ordem decrescente, podemos atribuir uma probabilidade de excedência empírica a cada uma das vazões máximas da série, utilizando a fórmula de Weibull: P=
m
(14.5)
N + 1
onde N é o tamanho da amostra (número de anos); e m é a ordem da vazão (para a maior vazão m=1 e para a menor vazão m=N). O resultado é apresentado na Tabela 14. 4.
Figura 14. 10: Série de vazões do rio Cuiabá em Cuiabá, de 1984 ao final de 1991, evidenciando a vazão máxima de cada ano.
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Tabela 14. 3: Vazões máximas anuais entre 1984 e 1991.
Ano 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991
Q máx 1796.8 1492.0 1565.0 1812.0 2218.0 2190.0 1445.0 1747.0
Tabela 14. 4: Vazões máximas reorganizadas em ordem decrescente, com ordem e probabilidade empírica associada.
Ano 1988 1989 1987 1984 1991 1986 1985 1990
Vazão (m3/s) 2218.0 2190.0 1812.0 1796.8 1747.0 1565.0 1492.0 1445.0
Ordem 1 2 3 4 5 6 7 8
Probabilidade 0.11 0.22 0.33 0.44 0.56 0.67 0.78 0.89
TR (anos) 9.0 4.5 3.0 2.3 1.8 1.5 1.3 1.1
O problema da estimativa empírica de probabilidades é que não é possível extrapolar a estimativa para tempos de retorno maiores. Por exemplo, se é necessário estimar a vazão máxima de 100 anos de tempo de retorno, mas existem apenas 18 anos de dados observados, as probabilidades empíricas permitem estimar vazões máximas de TR próximo de 18 anos. Distribuição normal
Para extrapolar as estimativas de vazão máxima é necessário supor que as vazões máximas anuais seguem uma distribuição de probabilidades conhecida, como no caso das chuvas anuais. Vazões máximas segundo uma distribuição normal podem ser estimadas por: (14.6)
x = x + K ⋅ s
onde x é a vazão máxima para uma dada probabilidade; x é a média das vazões máximas anuais; e s é o desvio padrão das vazões máximas anuais. O valor de K é obtido de tabelas de distribuição normal (equivalente ao z nas tabelas A e B ao final do capítulo).
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Infelizmente, porém, as vazões máximas não seguem a distribuição normal. Histogramas de vazões máximas anuais tendem a apresentar uma forte assimetria positiva (longa cauda na direção dos maiores valores), o que invalida o uso da distribuição normal (Figura 14. 11).
Figura 14. 11: Comparação entre um histograma de vazões máximas observadas do rio Cuiabá em Cuiabá entre 1967 e 1999 e a distribuição normal.
Para superar este problema existem outras distribuições de probabilidade que são, normalmente, utilizadas para a análise de vazões máximas. A mais simples destas distribuições é a denominada log-normal. Nesta distribuição a suposição é que os logaritmos das vazões seguem uma distribuição normal. Distribuição log-normal
A distribuição normal parte da equação: log( x ) = log( x ) + K ⋅ slog x
(14.7)
onde log(x) é o logaritmo da vazão máxima; log( x ) é a média dos logaritmos das vazões máximas anuais observadas; slogx é o desvio padrão dos logaritmos das vazões máximas anuais observadas. O valor de K é obtido das tabelas A e B do final do capítulo (K é equivalente a z dado nas tabelas). Se o objetivo da análise é determinar a vazão de 100 anos de tempo de retorno em um determinado local, por exemplo, a seqüência de etapas para a estimativa supondo que os dados correspondem a uma distribuição log-normal é a seguinte: •
Obter vazões máximas de N anos
189
W . C O L L I S C H O N N
–
I P H - U F R G S
•
Calcular os logaritmos das vazões máximas
•
Calcular a média e o desvio padrão dos logaritmos das vazões máximas
•
Obter o valor de z para a probabilidade correspondente ao tempo de retorno de 100 anos
•
Obter o valor do logaritmo da vazão de tempo de retorno de 100 anos a partir da equação 14.7.
•
Obter o valor da vazão através da função inversa do logaritmo.
Esta seqüência de etapas fica mais clara na aplicação em um exemplo.
EXEMPLO
5) As vazões máximas anuais do rio Guaporé no posto fluviométrico Linha Colombo são apresentadas na tabela abaixo. Utilize a distribuição log-normal para estimar a vazão máxima com 100 anos de tempo de retorno. ANO MAXIMA 1940 953 1941 1171 1942 723 1943 267 1944 646 1945 365 1946 1359 1947 411 1948 480 1949 365
ANO MAXIMA 1950 1192 1951 356 1952 246 1953 1093 1954 840 1955 622 1956 falha 1957 598 1958 646 1959 953
ANO MAXIMA 1960 falha 1961 718 1962 503 1963 falha 1964 457 1965 915 1966 742 1967 840 1968 331 1969 320
ANO MAXIMA 1970 365 1971 671 1972 1785 1973 726 1974 397 1975 480 1976 falha 1977 673 1978 760 1979 780
ANO MAXIMA 1980 653 1981 537 1982 945 1983 1650 1984 1165 1985 888 1986 728 1987 809 1988 945 1989 1380
ANO MAXIMA 1990 falha 1991 falha 1992 falha 1993 1115 1995 639
Este exemplo apresenta uma situação muito comum na análise de dados hidrológicos: as falhas. As falhas são períodos em que não houve observação. As falhas são desconsideradas na análise, assim o tamanho da amostra é N=48. Utilizando logaritmos de base decimal, a média dos logaritmos das vazoes máximas é 2,831 e o desvio padrão é 0,206. Para o tempo de retorno de 100 anos a probabilidade de excedência é igual a 0,01. Na tabela B, ao final do capítulo, pode-se obter o valor de z correspondente (z=2,326). A vazão máxima de TR=100 anos é obtida por: z ≅
x − x s
2,326 ≅
x − 2,831
0,206
x = 2,326 ⋅ 0,206 + 2,831 = 3,31
190
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3, 31 = 2041 Q = 10
Portanto, a vazão máxima de 100 anos de tempo de retorno é 2041 m3/s. Este procedimento pode ser repetido para outros valores de TR, e o resultado pode ser apresentado na forma de um gráfico, relacionando vazão com tempo de retorno, como na figura a seguir. Nesta figura fica claro, também, que a suposição de uma distribuição log-normal é muito mais adequada do que a suposição de uma distribuição normal.
As vazões máximas estimadas com as probabilidades empíricas são mostradas pelos pontos, a distribuioção normal é apresentada como a linha pontilhada e a linha contínua mostra vazões máximas estimadas com a distribuição log-normal. Distribuição Log-Pearson Tipo III
A distribuição Log-Pearson Tipo III pode ser descrita por três parâmetros: a média, o desvio padrão e o coeficiente de assimetria. A equação utilizada para estimar a vazão máxima é igual à utilizada na distribuição LogNormal, entretanto o valor de K é obtido de outra tabela. log( x ) = log( x ) + K ⋅ slog x
191
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–
I P H - U F R G S
onde K depende do coeficiente de assimetria dos dados e pode ser obtido na tabela C, no final do capítulo.
Distribuição de Gumbel
A probabilidade de que uma determinada vazão venha a ser igualada ou excedida em um ano qualquer pode ser estimada usando a distribuição de Gumbel, de acordo com a equação: P = 1− e
−e
−b
(14.8)
onde P é a probabilidade; e é a base dos logaritmos naturais e b é dado por: b=
1 0,7797 ⋅ s
⋅ ( x − x + 0,45 ⋅ s )
(14.9)
onde x é a vazão máxima; x é a média das vazões máximas anuais; e s é o desvio padrão das vazões máximas anuais. A distribuição de Gumbel é também chamada de Distribuição de Valores Extremos do tipo 1, e é amplamente utilizada em análise estatística de eventos extremos. Uma vantagem desta distribuição é que não é necessário utilizar tabelas de probabilidades. A vazão para um dado tempo de retorno TR (em anos) pode ser obtida por uma forma inversa da equação 14.8:
TR TR − 1
x = x − s ⋅ 0,45 + 0,7797 ⋅ ln ln
Vazões mínimas A análise de vazões mínimas é semelhante à análise de vazões máximas, exceto pelo fato que no caso das vazões mínimas o interesse é pela probabilidade de ocorrência de vazões iguais ou menores do que um determinado limite. No caso da análise utilizando probabilidades empíricas, esta diferença implica em que os valores de vazão devem ser organizados em ordem crescente, ao contrário da ordem decrescente utilizada no caso das vazões máximas. Normalmente, as análises estatísticas de vazões mínimas são realizadas sobre as vazões mínimas de 7 dias, 15 dias ou 30 dias de duração. Neste caso, para cada ano do registro
192
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histórico encontra-se a vazão mínima média de D dias (médias móveis de D dias). O restante do procedimento de análise é semelhante ao apresentado aqui. Uma vazão mínima obtida por análise estatística muito utilizada como vazão de referência mínima é a Q7,10, ou 7Q10, que vem a ser a vazão média de 7 dias de duração com tempo de retorno de 10 anos. Distribuição normal
A aplicação da análise estatística usando a distribuição normal para vazões mínimas é analisada através de um exemplo. EXEMPLO
6) A tabela abaixo apresenta as vazões mínimas anuais observadas no rio Piquiri, no município de Iporã (PR). Considerando que os dados seguem uma distribuição normal, determine a vazão mínima de 5 anos de tempo de retorno. A distribuição normal se ajusta bem aos dados observados? Vazão mínima
ano 1980
202
1981
128.6
1982
111.4
1983
269
1984
158.2
1985
77.5
1986
77.5
1987
166
1988
70
1989
219.6
1990
221.8
1991
111.4
1992
204.2
1993
196
1994
172
1995
130.4
1996
121.6
1997
198
1998
320.6
1999
101.2
2000
118.2
2001
213
Os valores de vazão mínima são reorganizados em ordem crescente e a probabilidade empírica para cada valor é calculada. A seguir é calculada a média e o desvio padrão do conjunto de dados.
193
W . C O L L I S C H O N N
ano
ordem
–
I P H - U F R G S
probabilidade
TR empírico
Vazão mínima
1988
1
0.04
23.0
70
1985
2
0.09
11.5
77.5
1986
3
0.13
7.7
77.5
1999
4
0.17
5.8
101.2
1982
5
0.22
4.6
111.4
1991
6
0.26
3.8
111.4
2000
7
0.30
3.3
118.2
1996
8
0.35
2.9
121.6
1981
9
0.39
2.6
128.6
1995
10
0.43
2.3
130.4
1984
11
0.48
2.1
158.2
1987
12
0.52
1.9
166
1994
13
0.57
1.8
172
1993
14
0.61
1.6
196
1997
15
0.65
1.5
198
1980
16
0.70
1.4
202
1992
17
0.74
1.4
204.2
2001
18
0.78
1.3
213
1989
19
0.83
1.2
219.6
1990
20
0.87
1.2
221.8
1983
21
0.91
1.1
269
1998
22
0.96
1.0
320.6
Média = 163 Desvio padrão = 65.2 Os valores da vazão para diferentes tempos de retorno são calculados por: Q = Q − S Q ⋅ K
Onde K é o valor da tabela da distribuição normal para as probabilidades (veja tabela B ao final do capítulo). Tempo de retorno
2 5 10 50 100
K
Q
0 0.842 1.282 2.054 2.326
163.1 108.2 79.5 29.2 11.5
Na figura abaixo vê-se que o ajuste da distribuição normal não é muito bom para estes dados. A vazão mínima com tempo de retorno de 5 anos é estimada em 108 m3/s.
194
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350 300 .
250 ) s / 3 m200 ( a m i n 150 í m o ã z a 100 V
50 0 1.0
10.0
100.0
Tempo de retorno (anos)
Distribuição Weibull
Uma distribuição de freqüências teórica mais adequada para a estimativa de vazões mínimas de alto tempo de retorno é a distribuição de Weibull (veja em Naghettini e Pinto, 2007). Na análise de vazões mínimas usando a distribuição de Weibull é usada a mesma equação: (14.10)
x = x + K ⋅ S
e o valor de K é obtido por: 1 λ 1 K = A(λ ) + B (λ ) ⋅ − ln 1 − − 1 T
(14.11)
onde T é o tempo de retorno em anos e
A(λ ) = 1 − Γ 1 +
195
1
⋅ B(λ )
λ
(14.12)
W . C O L L I S C H O N N
–
I P H - U F R G S
e
B(λ ) = Γ 1 +
−1
1 2 − Γ 2 1 + λ λ 2
(14.13)
onde λ =
1 H 0 + H 1 ⋅ G + H 2 ⋅ G 2 + H 3 ⋅ G 3 + H 4 ⋅ G 4
para − 1,0 ≤ G ≤ 2
(14.14)
onde H0 = 0,2777757913 H1 = 0,3132617714 H2 = 0,0575670910 H3 = -0,0013038566 H4 = -0,0081523408 e onde G é o coeficiente de assimetria; e onde Γ (.) é a função Gama, que é uma generalização da função fatorial para números reais não inteiros. Uma dificuldade da aplicação da distribuição de Weibul é a necessidade de calcular o valor da função Gama. O valor da função Gama é dada por: ∞
∫
Γ (w) = x
w −1
x
⋅ e − dx
0
O programa Excel permite calcular o valor do logaritmo da função gama através da função LnGama(x).
EXEMPLO
7) Refaça o exemplo anterior usando a distribuição de Weibull. Os valores da média e desvio padrão são os mesmos calculados antes: Média = 163
196
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Desvio padrão = 65.2 Além disso é calculado o coeficiente de assimetria. Usando a função do Excel (Distorção(x)) o valor encontrado é G=0,5662 A partir destes dados é calculado o valor de λ = 2,116 Usando a função do Excel LnGama(x) são calculados os valores de B( λ ) e A( λ ). B( λ )=2,2726 A( λ )=0,2599 E com estes valores são calculados os termos K para cada tempo de retorno T em anos, conforme a tabela abaixo: TR 2
Kt -0.10153
Vazão Weibull 156.5
5
-0.89405
104.8
10
-1.22803
83.0
25
-1.51140
64.6
50 100
-1.65317 -1.75422
55.3 48.7
A figura a seguir mostra os resultados comparados à distribuição empírica e à distribuição normal. Observa-se que a distribuição de Weibull se adequa mais para a estimativa de vazões mínimas do que a distribuição normal, especialmente para tempos de retorno altos, quando a distribuição normal tende a valores negativos, o que é fisicamente impossível, já que as vazões mínimas são limitadas a valores maiores do que zero.
197
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A distribuição binomial A distribuição de probabilidades binomial é adequada para avaliar o número (x) de ocorrências de um dado evento em N tentativas. As seguintes condições devem existir para que seja válida a distribuição binomial: 1) são realizadas N tentativas; 2) em cada tentativa o evento pode ocorrer ou não, sendo que a probabilidade de que o evento ocorra é dada por P enquanto a probabilidade de que o evento não ocorra é dada por 1-P ; 3) a probabilidade de ocorrência do evento numa tentativa qualquer é constante e as tentativas são independentes, isto é, a ocorrência ou não do evento na tentativa anterior não altera a probabilidade de ocorrência atual. Estas propriedades ficam mais claras considerando o exemplo de um dado de seis faces. A probabilidade de obter um “seis” num lançamento qualquer é de 1/6. A probabilidade de não obter um “seis” num lançamento qualquer é de 5/6. Se um dado é lançado uma vez, resultando em um “seis”, isto não altera a probabilidade de obter um “seis” no lançamento seguinte. De acordo com a probabilidade binomial, a probabilidade de que um evento ocorra x vezes em N tentativas, é dada pela equação 14.15. P x ( X = x) =
N !
N − x
⋅ P ⋅ (1 − P ) x
x!⋅( N − x )!
(14.15)
Nesta equação Px(X=x) é a probabilidade de que o evento ocorra x vezes em N tentativas. P é a probabilidade que o evento ocorra numa tentativa qualquer e (1-P) é a probabilidade que o evento não ocorra numa tentativa qualquer.
EXEMPLOS
8) Calcule a probabilidade de obter exatamente 5 “coroas” em 10 lançamentos de uma moeda. Neste caso x =5 e N=10. A probabilidade de obter “coroa” num lançamento qualquer é de 50%, ou 1/2. A probabilidade de obter exatamente 5 “coroas” pode ser calculada pela equação 14.15. 5
1 1 ⋅ ⋅ 1 − P x ( X = 5) = 5!⋅(10 − 5)! 2 2 10!
10 − 5
= 0,246
198
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Portanto, a probabilidade de obter exatamente 5 “coroas” em 10 lançamentos é de 24,6%.
9) A probabilidade da vazão de 10 anos de tempo de retorno seja igualada ou excedida num ano qualquer é de 10%. Qual é a probabilidade que ocorram duas cheias iguais ou superiores à cheia de TR = 10 anos em dois anos seguidos? Neste caso x =2 e N=2. A probabilidade de ocorrer a cheia num ano qualquer é de 10%, ou 1/10. A probabilidade de ocorrer exatamente 2 cheias em 2 anos pode ser calculada pela equação 14.15. 2
1 1 ⋅ ⋅ 1 − P x ( X = 2) = 2!⋅(2 − 2)! 10 10 2!
2 −2
2
1 = = 0,01 10
Portanto, a probabilidade de ocorrerem exatamente 2 cheias em 2 anos é 1%.
10) A probabilidade da vazão de 10 anos de tempo de retorno seja igualada ou excedida num ano qualquer é de 10%. Qual é a probabilidade que ocorra pelo menos uma cheia desta magnitude (ou superior) ao longo de um período de 5 anos? Este problema poderia ser resolvido somando a probabilidade de ocorrência de 1 única vazão com estas características ao longo dos 5 anos com a probabilidade de ocorrência de 2 vazões, e assim por diante para 3, 4 e 5 casos. Porém, neste caso, a melhor forma de resolver o problema é pensar qual é a probabilidade de que não ocorra nenhuma vazão igual ou superior ao longo dos 5 anos, que poderá ser chamada de P(x=0). A probabilidade de que ocorra pelo menos uma cheia será dada por 1-P(x=0). Sendo assim, calculamos primeiramente a probabilidade com x =0 e N=5. 0
1 1 ⋅ ⋅ 1 − P x ( X = 0) = 0!⋅(5 − 0)! 10 10 5!
5− 0
5
9 P x ( X = 0) = 1 ⋅ = 0,59 10 Portanto, a probabilidade de não ocorrer nenhuma vazão igual ou superior a vazão com TR=10 anos ao longo de 5 anos é de 59%. Isto significa que a probabilidade de ocorrer pelo menos uma vazão assim é de 41%.
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Tabelas de distribuições de probabilidades Tabela A: Probabilidade de ocorrer um valor maior do que Z, considerando uma distribuição normal com média zero e desvio padrão igual a 1.
Z
Probabilidade 0.0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6 0.7 0.8 0.9 1.0 1.1 1.2 1.3 1.4 1.5 1.6 1.7 1.8 1.9 2.0 2.1 2.2 2.3 2.4 2.5 2.6 2.7 2.8 2.9 3.0
0.5000 0.4602 0.4207 0.3821 0.3446 0.3085 0.2743 0.2420 0.2119 0.1841 0.1587 0.1357 0.1151 0.0968 0.0808 0.0668 0.0548 0.0446 0.0359 0.0287 0.0228 0.0179 0.0139 0.0107 0.0082 0.0062 0.0047 0.0035 0.0026 0.0019 0.0013
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Tabela B: Probabilidade de ocorrer um valor maior do que z, considerando uma distribuição normal com média zero e desvio padrão igual a 1.
z 0.000 0.842 1.282 1.751 2.054 2.326 2.878 3.090 3.719
Probabilidade 0.5 0.2 0.1 0.04 0.02 0.01 0.002 0.001 0.0001
TR 2 5 10 25 50 100 500 1000 10000
Tabela C: Valores de K para estimativa de vazões máximas usando a distribuição Log-Pearson Tipo III (os valores do coeficiente de assimetria estão na primeira coluna e os valores de K estão na região cinza escuro da tabela).
Tempo de retorno / Probabilidade 2 5 10 25 50 Coeficiente de assimetria 0,5 0,2 0,1 0,04 0,02 1,4 -0,225 0,705 1,337 2,128 2,706 1,0 -0,164 0,758 1,340 2,043 2,542 0,6 -0,099 0,800 1,328 1,939 2,359 0,2 -0,033 0,830 1,301 1,818 2,159 0,0 0,000 0,842 1,282 1,751 2,054 -0,2 0,033 0,850 1,258 1,680 1,945 -0,6 0,099 0,857 1,200 1,528 1,720 -1,0 0,164 0,852 1,128 1,366 1,492 -1,4 0,225 0,832 1,041 1,198 1,270
100 0,01 3,271 3,022 2,755 2,472 2,326 2,178 1,880 1,588 1,318
Leituras adicionais Os métodos de estimativa de vazões máximas apresentados neste texto são relativamente simples e a forma de apresentação é resumida. Para realizar análises de vazões máximas mais rigorosas normalmente é necessário testar três ou mais distribuições de probabilidade teóricas, e avaliar qual é a distribuição que melhor se adequa aos dados. Livros sobre hidrologia estatística existem em grande número, principalmente em língua inglesa. Um livro dedicado exclusivamente a este tema em língua portuguesa, denominado Hidrologia Estatística, foi lançado recentemente no
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Brasil, e pode ser obtido gratuitamente através da Companhia de Pesquisas de Recursos Minerais (CPRM), impresso ou em formato pdf ( http://www.cprm.gov.br ). A leitura deste livro permitirá ao leitor aprofundar o conhecimento introduzido neste capítulo.
Exercícios 1) Uma análise de 40 anos de dados revelou que a chuva média anual em um local na bacia do rio Uruguai é de 1800 mm e o desvio padrão é de 350 mm. Considerando que a chuva anual neste local tem uma distribuição normal, qual é a chuva anual de um ano muito seco, com tempo de retorno de 10 anos? 2) O que é a curva de permanência? 3) Qual é a porcentagem do tempo em que é superada ou igualada a vazão Q90? 4) Se um rio intermitente passa mais da metade do tempo completamente seco, qual é a sua Q80? 5) É correto afirmar que a vazão Q90 é sempre inferior a Q95 em qualquer ponto de qualquer rio? E o inverso? 6) É correto dizer que a vazão Q95 é igual à soma das vazões Q40 e Q55? Explique. 7) Qual é o efeito de um reservatório sobre a curva de permanência de vazões de um rio? 8) Considerando a idéia de risco como a probabilidade de ocorrência de um evento associada aos prejuízos potenciais decorrentes deste evento, avalie qual é a pior situação: a. Uma cidade protegida por um dique dimensionado para a cheia de 100 anos de tempo retorno. Caso a cheia supere o dique, serão inundados 2 bairros, com prejuízo total estimado em 800 milhões de reais. b. Uma ponte dimensionada para a cheia de 25 anos de tempo de retorno. Caso a cheia atinja a ponte esta será destruída. A construção de uma nova ponte e a interrupção temporária do tráfego totalizam um prejuízo de 75 milhões de reais. 9) A tabela abaixo apresenta as vazões máximas do rio Xingu, em Altamira (PA), de 1971 a 1990. Estime a vazão máxima de 50 anos de tempo de retorno considerando válida a distribuição log-normal. Compare as estimativas usando a distribuição de Gumbel e a distribuição Log-Pearson tipo III.
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Ano 1971 1972 1973 1974 1975 1976 1977 1978 1979 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990
H I D R O L O G I A
Vazão máxima (m3/s) 15633 19116 22121 30160 22969 16773 21520 28655 24994 32330 17794 31210 19056 22422 26338 23718 20198 21881 23970 24354
10) Calcule a vazão Q7,10 do rio Xingu em Altamira (PA) usando os dados da tabela abaixo. Use a distribuição de Weibull e compare com a estimativa usando a distribuição empírica. Ano 1971 1972 1973 1974 1975 1976 1977 1978 1979 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988
Mínimas 7 dias (m3/s) 554 608 1048 1106 663 646 1017 1317 1229 1008 904 1244 1001 1249 1181 1348 964 994
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