DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP
RESOLUÇÃO DE HIPÓTESES PRÁTICAS – PROFESSOR FRANCISCO BARONA
CONTRATOS COMERCIAIS CASO 1 António tem uma empresa que se dedica à instalação de painéis solares e conseguiu obter a representação de uma importante fábrica nacional, através de contrato que assinou recentemente. Para poder responder cabalmente às exigências do novo contrato, encomendou a feitura da página de internet da sua empresa a Bernardo, tomou de arrendamento uma loja e contraiu junto de um Banco um financiamento de curto prazo, tendo para o efeito subscrito uma livrança. Como qualificaria o contrato celebrado entre António e a empresa fabricante? No presente caso estamos face a uma situação em que António se dedica à instalação de painéis solares e que recentemente conseguir obter a representação de uma importante fábrica nacional através da celebração de um contrato. De acordo com estes dados estamos face a um contrato de distribuição que se caracteriza pelo facto de disciplinar as relações jurídicas entre o produtor e o distribuidor ‘’lato sensu’’ com vista à comercialização dos bens e serviços do primeiro. Importa salientar que a distribuição comercial pode assentar em duas modalidades:
Por um lado, pode ser uma distribuição comercial directa, ou seja é o produtor que se encarrega da colação dos seus próprios produtos no mercado.
Por outro lado, pode ser uma distribuição comercial indirecta, sendo que nesta ocorre a concentração exclusivamente na função produtiva e a renúncia à tarefa de comercialização, confiando esta a empresários ou intermediários autónomos especializados. Esta modalidade de distribuição pode ainda assumir duas formas:
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Simples, que se caracteriza pela ausência de coordenação entre a produção e a distribuição, concedendo o produtor uma grande autonomia aos seus distribuidores no exercício da respectiva actividade empresarial distributiva
Integrada, em que existe a coordenação entre a produção e a distribuição, sendo que o distribuidor surge aos olhos do público como um empresário integrado no âmbito da estratégia e da rede de distribuição concebida pelo produtor pelo que se sujeita, em maior ou menor grau, às orientações e fiscalizações genéricas deste último. Este caso de distribuição comercial indirecta integrada consubstancia os casos dos agentes, concessionários e franquiados ou distribuidores selectivos.
No presente caso, António através da instalação dos painéis solares irá distribuir tais pelo que existe um contrato de distribuição em que a Fábrica é a produtora dos referidos e António o distribuidor. Verificado que estamos face a um contrato de distribuição é necessário verificar entre os contratos de distribuição estudados nesta disciplina aquele que se aplica ao caso concreto. Como contratos de distribuição podemos estar face a um contrato de agência, a um contrato de concessão comercial e um contrato de franquia. CONTRATO DE AGÊNCIA Elementos Essenciais
Elementos Não Essenciais
Promoção da Celebração do Contrato Actuação por Conta e no Interesse do Principal
Atribuição ao Agente de Certa Zona ou Determinado Círculo de Clientes
Estabilidade
Exclusividade Recíproca da Relação de Agência
Autonomia Onerosidade
CONTRATO DE CONCESSÃO COMERCIAL Obrigação de Venda e de Compra par Revenda Actuação do Concessionário em Nome e por Conta Própria Autonomia Estabilidade
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CONTRATO DE FRANQUIA Elementos Essenciais
Elementos Não Essenciais
Fruição da Imagem Empresarial do Franquiador
Cláusula de Exclusividade Aquisição de Stocks Mínimos
Transmissão do Know-How e Assistência Técnica
Assistência Financeira e Contabilística
Controlo e Fiscalização do Franquiado
Cláusula de Não Concorrência
Onerosidade
No presente caso, António adquire os painéis através de uma fábrica nacional sendo que posteriormente os irá instalar. Ora tal exclui a possibilidade de estarmos face a um contrato de concessão comercial uma vez que não se verifica a característica deste que assenta na obrigação de venda (do concedente ao concessionário) e de compra para revenda (do concessionário a terceiros). Quanto António instala os painéis solares não está a revende-los. No presente caso, António encomendou a feitura da página de internet da sua empresa a Bernardo. Ora aqui se exclui a possibilidade de estarmos face a um contrato de franquia uma vez que não se verifica a atribuição ao franquiado do privilégio de fruição da imagem empresarial do franquiador, ou seja não foi concedido nenhum direito de utilizar a marca da fábrica ou qualquer direito privativo de propriedade industrial (logótipos, modelos publicitários, etc.). O Contrato de Franquia constitui um veículo negocial sobre o qual assenta a criação e organização distributiva do franquiador no mercado, uma vez que a unidade da imagem empresarial externa do franquiado e do franquiador, aos olhos do público, é um pressuposto da integração do primeiro nessa rede. Tal unidade não existe no caso: uma coisa é a fábrica nacional que produz os painéis solares, outra é a empresa de António que instala tais painéis. Deste modo, parte-se do princípio que se estará face a um contrato de agência. Nos termos do art. 2º do Diploma Legal que regula o Contrato de Agência (DL 178/86, de 3 de Julho) o agente, por força de disposição contratual expressa, está autorizado a celebrar contratos na qualidade de representante do principal. É exactamente o que sucede neste caso: António representa a fabrica nacional.
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP CASO 2 Responda às questões seguintes: a) Pode haver indemnização de clientela nos contratos de concessão e de franquia? Justifique. Nos termos do art. 33º do DL 178/86, de 3 de Julho, a indemnização de clientela consiste numa indemnização devida pelo principal ao agente, cumulável com outras indemnizações a que haja direito (indemnização por denúncia sem aviso prévio ou sem pré aviso suficiente; indemnização por incumprimento), que assenta no facto de, cessando o contrato de agência, ser justo compensar o agente pelo enriquecimento assim proporcionado à outra parte desde que observados os seguintes requisitos:
Cessação do contrato de agência
Que o agente tenha angariado novos clientes para a outra parte ou tenha aumentado substancialmente o volume de negócios com a clientela já existente, desde que tal se deva a um esforço sério por parte do agente
Que o principal venha a beneficiar consideravelmente, após a cessação do contrato, da actividade desenvolvida pelo agente
Que o agente deixe de receber qualquer retribuição por contratos negociados ou concluídos após a cessação da agência com os clientes angariados ou cujos negócios tenham sido aumentados
Importa salientar que a indemnização de clientela não é uma verdadeira indemnização, porque não visa reparar danos, mas antes uma compensação devida ao agente, após ter cessado o contrato – desde que não imputável ao agente – como contrapartida dos benefícios que o principal vai auferir com a clientela angariada ou aumentada por aquele. Quanto ao Contrato de Concessão Comercial, a doutrina e a jurisprudência têm defendido que as normas sobre a indemnização de clientela na agência não têm aplicação automática a este contrato, havendo sempre que ponderar os requisitos e a analogia. Ou seja, segundo o Prof. Pinto Monteiro será necessário averiguar, em cada caso, se a norma que se pretende aplicar permite uma aplicabilidade analógica, o que implica ponderar se a sua ratio se adequa a um concessionário. Um dos fundamentos invocados para a aplicabilidade analógica da norma constante do art. 33º assenta no facto de existir um incremento da clientela, que reverte a favor do concedente, enquanto o concessionário perde a retribuição que poderia auferir daquela clientela se o contrato não tivesse terminado.
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP Quanto ao Contrato de Franquia, tal consubstancia uma grande querela doutrinal:
Prof. Pinto Monteiro: defende que a indemnização de clientela será aplicável também aos franquiados sempre que a analogia se verifique. O que importa começar por averiguar é se em cada caso concreto o franquiado, pese embora juridicamente actue por conta própria, desempenhou funções, cumpriu tarefas e prestou serviços semelhantes aos de um agente, em termos de ele próprio dever considerar-se, pela actividade que exerceu, como um relevante factor de atracção de clientela. A realidade pode demonstrar, com efeito, a existência de uma clientela especialmente ligada à pessoa ou aos serviços do franquiado, apesar de a este serem fornecidas as ferramentas básicas, o sucesso da empresa depende muito da sua atitude empenhada e capaz que pode desempenhar papel na angariação de clientela.
Prof. Menezes Cordeiro: defende que a indemnização de clientela não será aplicada ao contrato de franquia, uma vez que a clientela é angariada pela marca, para o franquiado, sendo as (des) vantagens que tudo isso acarreta como integrantes dos riscos próprios do negocio.
Prof. Menezes Leitão: defende que a indemnização de clientela, por principio, não será aplicada ao contrato de franquia, uma vez que os clientes angariados pelo franquiado não são na verdade clientes dele, mas antes clientes gerais do sistema de franquia que nele permanecem apos a extinção do contrato. Apenas admite a aplicação analógica em certos casos de franquia de distribuição de produtos, em que o franquiado é obrigado a adquirir os produtos ao franquiador e pode conquistar para ele uma clientela própria e desde que se verifique a aquisição da clientela pelo franquiador com a extinção do contrato.
Deste modo, conclui-se, que quanto ao contrato de franquia, será de exigir ao franquiado a alegação e prova da sua contribuição determinante para o notório aumento do negócio e clientela do franquiador e que este venha a beneficiar dessa melhor qualidade comercial para além do termo do franchising. O aumento e a fidelização da clientela obtidos à custa da actividade pessoal do franquiado são factos a apurar caso a caso, cujo ónus de alegação e prova a este incumbe, NOTA1: quer o concessionário quer o franquiado encontram-se obrigados a informar quer o concedente quer o franqueador dos clientes angariados NOTA2: no contrato de agência em regra quem detém a carteira de clientes é o principal, uma vez que os clientes são clientes deste. Na Concessão e na Franquia os clientes são clientes do concessionário e do franquiado uma vez que este suportam o risco do negócio, ao contrário do que sucede na agência em que o risco corre por conta do principal. Deste modo, tanto o concessionário como franquiado estão na mesma posição que o principal. É aqui que existe a analogia: existe uma analogia com a posição do principal. Deste modo se se verificarem os requisitos da indemnização de clientela tal aplica-se analogicamente ao contrato de concessão comercial e de franquia.
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP b) Refira-se à contratação mitigada no campo comercial e apresente as suas principais manifestações e consequências. O Professor não resolveu. CASO 3 Diana está convicta de ter descoberto a pólvora. Uma pequena pastelaria em Chaves faz umas deliciosas empadas de perdiz, totalmente desconhecidas em Lisboa. Diana comprometeu-se perante a Empada Transmontana, Lda (“ET”) a encontrar restaurantes e pastelarias em Lisboa, assim como boas charcutarias que comprem as deliciosas empadas. Em contrapartida, a ET partilhará com Diana 10% do valor facturado em Lisboa. Mal Diana começou a sua actividade, o sucesso foi estrondoso. Ao ponto de, duas semanas volvidas, a ET deixar de atender os telefonemas de Diana, ou fornecer dados precisos sobre os transportes de empadas. A ET tinha contratado uma outra entidade, com mais recursos humanos e técnicos, para conquistar os mercados nacionais e internacionais e não quer saber mais da nossa amiga. Diana está desolada. Não formara ainda uma clientela estável para a ET, mas investira muito nesta nova actividade: um arrendamento no centro de Lisboa, um computador, cartões de visita, entre outros dispêndios. Menos mal que continua a conduzir o belíssimo carro que a ET lhe emprestara, para visitar clientes. Quid iuris? No presente caso estamos no âmbito do Contrato de Agência uma vez que Diana representa a pastelaria ET através da procura de restaurantes e pastelarias em Lisboa que comprem as empadas realizadas pela referida pastelaria. Tendo em consideração que a pastelaria ET deixou de atender os telefonemas a Diana, após o estrondoso sucesso da referida pastelaria alcançado por esta, e contratou outra entidade com mais recursos humanos para conquistar os mercados nacionais e internacionais é necessário averiguar se o contrato de agência cessou. Nos termos do art. 24º e ss do DL 178/86, de 3 de Julho consagram-se as formas de cessação do contrato de agência
Acordo das Partes (art. 24º al. a) e art. 25º) – não existe nenhum acordo escrito assinado por ambas as partes em que elas fazem cessar o contrato de agência
Caducidade (art. 24º al. b) e art. 26º): o presente caso não se insere em nenhum dos casos geradores de caducidade consagrados nas várias alienas do art. 26º
Denúncia (art. 24º al. c) e art. 28º): esta consagra um acto unilateral, por qualquer das partes, onde não necessita de ser invocado qualquer fundamento, apenas podendo ser admitida em contratos celebrados por tempo indeterminado (verifica-se, uma vez que a pastelaria ET e Diana nada convencionaram quanto ao prazo de duração do contrato pelo que se aplica o regime do art. 27º), desde que exista aviso prévio com respeito pelos prazos consagrados nas varias alienas do art. 28º/1. Ora, no presente caso não existiu aviso prévio, até porque o contrato durava apenas há duas semanas, e não houve nenhuma comunicação por escrita a Diana por parte da pastelaria ET em que esta fizesse cessar o contrato por denúncia.
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Resolução (art. 24º al. d) e art. 30º e 31º): pode ser de cariz subjectivo (al. a) do art. 30º) ou de cariz objectivo (al. b) do art. 30º), tendo de ser fundamentada, contudo é sempre necessário que seja comunicada à contraparte por escrito.
Analisadas as várias formas de cessação do contrato de agência conclui-se que no presente caso, o contrato celebrado entre a Pastelaria ET e Diana não cessou. Coloca-se agora a questão de saber o que Diana pode fazer a fim de reagir contra esta situação, uma vez que existe uma atitude da ET que frusta a actividade de Diana, nomeadamente através da remuneração, pelo que existe uma violação grave e reiterada não sendo exigível a Diana que ela continue a actividade, podendo resolver o mesmo nos termos do art. 30º al. a). Deste modo, Diana terá direito a uma indemnização nos termos do art. 32º (que é uma verdadeira indemnização pois visa reparar os danos que Diana sofreu com o não cumprimento das obrigações por parte da ET). Poderia questionar-se a possibilidade de Diana ter ainda direito a uma indemnização de clientela (que não é uma verdadeira indemnização, uma vez que não visa a reparação de danos, mas sim uma compensação) mas observando os requisitos de que depende a verificação de tal instituto tais não parecem estar verificados, nomeadamente porque Diana ainda não tinha angariado uma clientela estável. No termo do contrato, cada contraente deve restituir os objectos, valores e demais elementos que pertençam ao outro (neste caso, o carro pertente à ET) nos termos do art. 36º. O agente goza, todavia, sobre eles, do direito de retenção pelos créditos resultantes da sua actividade nos termos do art. 35º. Ou seja, enquanto a ET não indemnizar Diana pelos danos por esta sofridos, Diana gozara de direito de retenção sobre o carro. NOTA: o legislador ao consagrar o art. 13º visa garantir a remuneração do agente. Esta, embora possa ser fixada em alguns casos através de um valor absoluta, a regra é que a remuneração depende do volume de negócios celebrados em cuja origem na realização foi causa aquele agente. Trata-se de uma violação que irá comprometer a continuação do negócio.
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP CASO 4 A António Cardoso – Comércio de Vestuário, S.A., celebrou com o Banco Top Crédito, SA, um contrato, por virtude do qual este último se obrigava a adquirir todos os créditos de que a António Cardoso – Comércio de Vestuário, S.A. fosse titular sobre os seus 10 principais clientes, no valor total de €1.000.000,00. Para o efeito, o Banco Top Crédito pagou de imediato €750.000,00. Passados dois meses, o Banco Top Crédito vem exigir à António Cardoso – Comércio de Vestuário, S.A., o pagamento de €1.000.000,00., com o argumento de que nenhum dos 10 clientes procedeu ao pagamento dos valores em dívida. Quid iuris? O Contrato de Factoring ou de Cessão Financeira constitui um contrato pelo qual uma das partes (o facturizado) cede ou obriga a ceder à outra parte (o factor) a totalidade ou parte dos seus créditos comerciais de curto prazo decorrentes dos contratos já celebrados ou a celebrar com certos terceiros (alguns ou mesmo a totalidade dos clientes do cedente), para que este ultimo (o factor) os administre e cobre na data do seu vencimento e eventualmente nos termos fixados nesse negocio lhe conceda adiantamentos calculados sobre o valor nominal desses créditos e/ou também garanta o cumprimento ou a solvência dos devedores cedidos. Pelo serviço de gestão e cobrança dos créditos o facturizado paga uma comissão (comissão de cobrança), em contrapartida do adiantamento quando concedido, o que é muito frequente: pagas juros e pela garantia paga igualmente uma comissão (comissão de garantia) (DL 171/95, de 18 de Julho – art. 2º/1) Sendo que a transferência de créditos ocorre com a aceitação expressa dos créditos tal poderá assumir diversas modalidades, nomeadamente entre o contrato de factoring celebrado com cláusula de recurso ou sem cláusula de recurso. Sem cláusula de recurso Nestes casos o factor (Banco) assume o risco del credere, sendo apenas admissível quando os créditos cedidos são objecto de aprovação. O cliente (António) fornece ao Banco a lista de clientes de onde irão imergir os crédidos. De seguida, o factor (Banco) irá realizar uma análise económico financeira. O banco irá realizar um acordo com o potencial cedente (António) em que se consagra quais os créditos que irá aceitar, podendo o cliente (António) propor-se a assumir o risco de todos ou de apenas alguns dos créditos. Ocorrida a aprovação pelo factor, é fixada uma provisão financeira e um plafond dentro do qual o factor assume todos os créditos. Esgotado o plafond, o factor (Banco) pode aceitar os créditos mas com inversão do risco de crédito que passa a correr por conta do cliente (António): O Contrato de Factoring sem cláusula de recurso depende da solicitação destas, de acordo com as condições particulares de cada contrato. Não tendo sido feita antecipação, na data da cobrança do crédito, o factor (Banco) entrega ao cedente o valor do mesmo, deduzido da comissão da garantia e do contrato de factoring. Deste modo, não existindo cláusula de recurso o Banco assumiu o risco de crédito pelo que terá de ser ele a suportar tal situação.
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP Com cláusula de recurso Nestes casos, o cedente não solicita ao factor a assunção do risco del credere, relativamente a todos ou alguns dos devedores do cedente. Contudo, o factor também analisa os devedores, fixando para cada um deles um plafond. Nestes casos, os limites de crédito têm uma acepção diferente dos fixados para as cessões sem recurso, referindo-se ao montante máximo de adiantamentos que o factor poderá conceder ao cedente, relativamente aos créditos cedidos sobre determinado devedor (≠ risco). O factor negocia com o cliente um plafond máximo de adiantamentos, face aos créditos que este último lhe venha a transmitir sobre os devedores indicados em lista anexa ao contrato, resultante da análise económicofinanceira do cedente. No caso de serem concedidos adiantamentos e o devedor não cumprir, o factor debita o montante juntamente com a comissão de factoring na conta-corrente do cedente, mantendo-o em cobrança, por um determinado período de tempo, após o qual realizará o débito. Neste caso, sendo o contrato de factoring com cláusula de recurso, o factorizado (António) tem de restituir a quantia que lhe foi mutuada e com essa restituição o factor (Banco) terá de retransmitir os créditos, para que depois a empresa factorizada possa ir junto dos devedores tentar restituir os créditos que lhe são devidos. Trata-se de uma antecipação de fundos. NOTA1: na cessão de créditos, além da transmissão do crédito transmitem-se ainda as garantias e acessórios (se o credito estiver vencido a possibilidade de exigir o crédito judicialmente, o direito à anulação, etc.) daquele. As garantias que existissem para assegurar aquele crédito e qualquer acessório do crédito transmitem-se com a cessão de créditos. O mesmo se passa no contrato de cessão financeira em que ocorrendo a cessão de créditos também ocorre a transmissão da garantia e acessórios do credito. NOTA2: um comerciante quando tem necessidades de pagar créditos poderá pedir uma letra a um Banco – antecipação de fundos. NOTA3: Enquanto no direito de regresso parte-se do pressuposto que há dois ou mais obrigados ao pagamento de determinada dívida, na cessão de créditos quando o cessionário/factor tem direito de recurso em relação ao cedente não há partida nenhuma dupla obrigação. NOTA4: A regra geral no contrato de cessão financeira é que este é sem recurso, porque parte-se do pressuposto que quando as pessoas celebram um contrato de factoring uma das vantagens é que o risco seja transmitido para o factor. Deste modo no silêncio das partes o risco será transmitido para o factor pelo que será sem recurso. NOTA5: Na grande maioria dos casos, a maioria dos bancos só aceita fazer factoring com base numa relação de clientes previamente estabelecida. O banco terá de verificar qual o risco de crédito: se for baixo, a probabilidade de cobrança do crédito é elevada não se importante se consistir um factoring sem recurso; se o banco verificar que o risco de cobrança de créditos é baixa ou não se consegue determinar irá celebrar um factoring com recurso.
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP CASO 5 A Mais Construção, SA, celebrou um contrato com o Banco Compre a Crédito, SA, com vista a aquisição por este último de três gruas metálicas, ficando a Mais Construção, S.A., com o gozo das mesmas por um período de 36 meses, mediante o pagamento de uma quantia mensal de €200.000,00. Pergunta-se: a)
Findo os 36 meses, quem é o proprietário das gruas?
No presente caso estamos face a um caso de locação financeira em que uma das partes (o locador) se obriga, mediante remuneração, a ceder à outra parte (locatário) o gozo temporário de uma coisa, móvel ou imóvel, adquirida para o efeito pelo primeiro (locador) a um terceiro (fornecedor) ficando o último investido no direito de a adquirir em prazo e por preço determinados (DL 149/95, de 24 de Junho – art. 1º). Nos termos do art. 9º/1 al. c) e 10º/2 al. e) o locatário tem a possibilidade de findo o contrato de comprar a coisa pelo respectivo preço residual no termo do contrato. Deste modo, se a Mais Construção exercer esta opção de compra a propriedade das gruas será sua; se não exercer a propriedade das gruas será do Banco Compre a Crédito. NOTA1: No leasing há um contrato de compra e venda entre o fornecedor e o locador, sendo que este é celebrado consoante as indicações dadas pelo futuro locatário ou cliente do banco. O dono do bem (locador) vai locar a coisa ao cliente (locatário). O contrato de locação so vai ser celebrado se o locatário der indicações ao locador de que o bem que ele tinha escolhido e que agora vai ser entregue pelo fornecedor directamente ao locatário estiver em condições ou não de ser redireccionado. O locatário fica logo com a detenção da coisa, mas so a recebe verificadas as qualidades da coisa que recebe (recepção e qualidades). Neste momento a entidade de locação financeira paga o valor ao fornecedor e debita ao locatário a primeira renda do contrato (essa renda varia consoante a analise financeira que o banco faça). Deste modo, diz-se que na locação financeira há uma relação tripartida. NOTA2: No lease back o cliente vende um bem ao banco e depois o banco loca esse bem a esse mesmo cliente. Problema: o cliente, precisa de financiamento, esta a alienar a propriedade de um bem que era seu ao banco, e em troca o banco faz um contrato de locação com o cliente e este fica a pagar uma renda. Tal nada difere da hipoteca. Em caso de incumprimento do devedor, o credor hipotecado apenas pode vender em hasta publica o bem hipotecada mas não pode fazer sua a coisa hipotecada. Ora no lease back se o locatário deixar de pagar as rendas o banco fica com a propriedade do bem na sequencia do incumprimento, pelo que tal consubstancia um pacto sucessório que é proibido. Mas no leasing em geral se decorrido o prazo do leasing e pagas as rendas, o locatário tem o direito a comprar a coisa, contudo a chamada opção de venda é apenas um contrato promessa unilateral de venda (o banco obriga-se a vender a coisa ao locatário mas só se este quiser comprar tal).
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP b)
Caso a Mais Construção, SA deixe de pagar a quantia mensal ao fim de 24 meses, que direitos assistem ao Banco Compre a Crédito, SA?
O Contrato de Locação Financeira pode extinguir-se ou por caducidade (não é o caso, uma vez que ainda só decorreram 24meses) ou por resolução. Em caso de resolução com fundamento em incumprimento do locatário (a Mais Construção deixa de pagar a quantia mensal (renda) ao fim de 24meses) existe um dever de restituição do bem locado (devolução das gruas ao Banco Compre a Crédito), a obrigação de pagamento das rendas vencidas até à efectiva restituição e a obrigação de pagamento de 20% do valor das rendas vincendas. NOTA: A jurisprudência não admitia de todo que o banco pudesse formular a resolução do contrato com o pagamento das rendas vincendas. Contudo, actualmente em determinados casos, para o cliente não ficar em vantagem podem ser fixadas cláusulas penais que consagram que numa situação de incumprimento o banco poderá exigir uma percentagem das rendas vincendas (20%). Contudo, numa situação de incumprimento o banco nunca poderá receber mais do que receberia numa situação de cumprimento (limite). c)
Se, no fim do contrato, o Banco Compre a Crédito, SA ficar com as gruas, pode o banco alugá-las a um terceiro?
No contrato de renting uma das partes proporciona à outra o gozo temporário e retribuído de uma coisa (standardizada), tendo em vista um fim específico. Do ponto de vista daquele que cede o gozo da coisa, ele adquiriu-a, em momento prévio, ao seu fabricante ou ao seu produtor; dispõe antecipadamente de um conjunto variado de bens que lhe pertencem. Por sua vez, o utilizador apenas pretende o uso da coisa de modo transitório e circunstancial, sendo as suas necessidades pontuais, esporádicas e visam tarefas definidas e certas. Na vigência do contrato cabe ao locador suportar os custos de conservação e de reparação da coisa, sem prejuízo da sua substituição, caso se mostre necessário. Deste modo, nos termos do art. 7º o Banco ficando com as gruas poderá alugá-las a um terceiro. NOTA1: o renting é uma forma de locação em que surge agregada a a tal uma serie de serviços associados a essa locação que fazem correr o risco da perda ou deterioração do bem sobre o locador. Na situação dos automóveis há de facto uma locação do bem e associada a tal a prestação de serviços. As rendas englobam o gozo do bem e os serviços associados à locação NOTA2: O renting pode ter associado uma opção de compra mas, normalmente, o valor é muitíssimo elevado, visando evitar que o cliente compre o bem (assim o cliente irá celebrar outro contrato de renting).
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP ACTOS. QUALIFICAÇÃO. ESTATUTO DO COMERCIANTE Matéria Aula Prática Análise do art. 2º C.COM
I parte – actos objectivos absolutos, ou seja actos previstos no código comer comercial ou em legislação avulsa com natureza comercial
II parte – actos comerciais subjectivos, porque praticados por um comerciante presumem-se comerciais
Nos termos do art. 13º refere-se aquele que é comerciante, sendo que só se adquire tal caracteristica com a pratica de actos de comércios? É necessário conjugar com o art. 2º I parte com o art. 13º. O art. 2º II parte respeita aos actos conexos com a actividade profissional mas que não se encontram inseridos na sua actividade principal, embora se encontrem com ela relacionados. TEORIA DOS ACTOS DE COMÉRCIO
Art. 2º I parte – actos comerciais, independentemente do sujeito que os pratica Art. 2º II parte – qualquer acto que um comerciante pratique no âmbito da sua actividade comercial presume-se acto comercial. Excepções: actos pessoais e patrimoniais mas com finalidade diferente da sua actividade comercial
Nota: o art. 230º para esta teoria é um acto objectivo absoluto. TEORIA JURÍDICA DE EMPRESA: é necessário analisar o art. 230º para saber a noção de empresa. A empresa assenta no risco de capital. O art. 230º é uma norma qualificadora central. O art. 2º I parte só se aplica aos actos ocasionais, ou seja, os que são praticados por não comerciantes. O art. 230º assenta no seguinte:
Alarga o Direito Comercial a outras áreas que não só o comercio em sentido economico integração. Fala-se agora em comércio em sentido jurídico
É uma norma de alargamento. Entende que as actividades de integração são comerciais por natureza (compra para revenda, por exemplo)
As empresas são comerciais porque assumiram um risco de capital.
Do âmbito do art. 230º excluem-se (1) os profissionais liberais, (2) as empresas agrícolas; (3) empresas acessórias das agrícolas (exemplo: empresa transportadora) Note-se que tanto os profissionais liberais como as empresas agrícolas são reguladas pelo Direito Civil. Coloca-se a questão de saber quanto às empresas acessórias das agricolas como é que se distinguem das verdadeiramente comerciais? Qual o seu critério de distinção?
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP Risco: na empresa acessória da agrícola o seu risco provém da terra. As pequenas empresas tambem são excluídas porque o rseu risco é pessoal; assentam no exercicio direito da actividade do seu titular. O art. 230º além de qualificar como comercial as actividades também o faz em relação aos sujeitos que as praticam: ‘’empresa singular ou colectiva’’ qualifica o sujeito num momento diferente do que aquele que ocorre na Teoria dos Actos de Comércio. Há toda uma preparatória antes de começar a actividade comercial – nesta fase ainda não era comerciante. Com a Teoria da Empresa antecipa-se a qualificação como comerciante – já o é antes de iniciar a actividade comercial. Os seus actos prepatórios já são comerciais. Conjugação do art. 230º e do art. 2º: a norma central é o art. 230º. Mas se o comerciante praticar um acto, fora da sua actividade principal, mas que está com ela relacionado (exemplo: actos preparatórios, financiamento) são actos comerciais, de acordo com o art. 2º II parte (actos conexos). Os actos ocasionais praticados por não comerciantes encontram-se no art. 2º I parte. CASO 1 António, empresário taxista, celebra com os seus clientes contratos de transporte. Esses contratos são comerciais? Justifique. Tendo em consideração o exposto anterior é necessário distinguir:
TEORIA DOS ACTOS DE COMÉRCIO: art. 2º I parte e art. 366º TEORIA JURÍDICA DA EMPRESA: art. 230º, art. 366º (se tiver uma empresa comercial) e art. 2º II parte
a) António comprou os livros necessários à sua exploração mercantil. Comprou também dois táxis e contratou um financiamento bancário para financiar essa aquisição. Esses actos são comerciais? Justifique. TEORIA DOS ACTOS DE COMÉRCIO Conjugado o art. 2º I parte com o art. 13º define-se quem é comerciante (requisito1). Os actos são conexos? É necessário partir de uma presunção: não é um acto exclusivamente civil (requisito2) e das circunstâncias que rodearam a prática do acto não resulta que o mesmo se destina à sua vida pessoal e familiar (requisito3). Note-se que a presunção só funciona se estiverem demonstrados os requisitos enunciados. TEORIA JURÍDICA DA EMPRESA É necessário conjugar o art. 230º com o art. 2º II parte
O art. 230º só se aplicaria a este caso se estivéssemos a falar da actividade comercial do comercial
O art. 2º II parte aplica-se às actividades conexas, sendo que no caso, a actividade principal do taxista são os contratos de transporte. Ou seja, estamos face a actividades conexas.
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP NOTA: No Direito Comercial, a compra e venda não é uma figura global, sendo que se divide os actos. O mesmo acontece no contrato de mútuo. No Direito Civil acontece exactamente o oposto. Podemos chegar à conclusão de que um acto é, para uma parte, civil, e para outra parte comercial. No Direito Comercial unem-se os actos num contrato. É a técnica usada pelo código comercial (exemplo: não há compra e venda – há actos de compra e ha actos comerciais) b) Suponha que António, num local distante do seu negócio e sem aludir à qualidade de empresário, celebrou um contrato de arrendamento de um andar, por um mês , durante o período normal de férias. É necessário conjugar o art. 2º II parte com o art. 13º. Nos termos da primeira norma falta um requisito para que exista a presunção de comercialidade. Uma vez que a falta desse requisito se encontra relacionada com a sua vida pessoal e familiar é um acto civil. Na TEORIA JURÍDICA DA EMPRESA é exactamente o mesmo: o art. 230º conjugado com o art. 2º II parte volta a conduzir a que não esteja reunido um dos requisitos e aus actividade principal não é o arrendamento, pelo que se assim não fosse o acto seria conexo. c) Suponha agora que António, sem aludir à qualidade de comerciante mas perante quem sabia que ele era comerciante, encomendou pelo telefone um computador. O acto é comercial? Justifique. Em todos os casos duvidosos aplica-se o art. 2º II parte. Mais do que uma presunção, esta norma é qualificadora. Afere-se a demonstração ou não dos pressupostos. Tal é igual quanto à TEORIA JURÍDICA DA EMPRESA. CASO 2 António, comerciante de eletrodomésticos, comprou cinco torradeiras e uma carrinha de transporte de mercadorias. a) Os negócios celebrados por António são comerciais? Quanto às Torradeiras:
TEORIA DOS ACTOS DE COMÉRCIO: art. 2º I parte TEORIA JURÍDICA DA EMPRESA: nos termos do art. 230º a compra para revenda (torradeiras) está implícito (‘’Haver-se-ão por comerciais..’’ – para além da compra para revenda o disposto no artigo é comercial)
Quanto à Carrinha: nos termos do art. 2º II encontram-se reunidos os pressupostos pelo que é uma actividade conexa à principal. b) Suponha que Bernardo, cliente da loja de António, comprou uma torradeira para a sua casa nova. O acto praticado por Bernardo é comercial? Justifique. Nos termos do art. 464º desqualifica-se a compra como comercial. Aplica-se a lei civil. Mesmo que a coisa venha a ser revendida, mais tarde, continua a aplicar-se a lei civil. No momento da compra não havia intenção de revenda.
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP CASO 3 Carlos, comerciante de artigos desportivos, comprou 100 camisolas do Benfica, 50 porta-chaves do Sporting, tendo ainda encomendado ao mesmo fornecedor 1000 patins em linha com o símbolo do Futebol Clube do Porto. a) Os negócios celebrados por Carlos são comerciais? Remete-se para a al. a) do Caso 1 (são comerciais). b) Se o preço não for pago na data devida qual o valor dos juros? No presente caso é necessário proceder à analise do art. 230º:
Taxa de juro: 8% A taxa de juro é definido por duas portarias/ano Porque é que existe uma taxa de juro mínima? Nas dívidas comerciais a taxa não pode ser inferior à do BCE, uma vez que este é de regulação do mercado. Caso assim não fosse, haveria um incentivo ao não cumprimento. Se não se cumprisse pagava-se uma taxa de juro mais baixa do que se cumprissem o pagamento à Banca.
Coloca-se a questão de saber em que casos é que se aplicam taxas de juro moratórias comerciais? Quando ao credor comerciante e ao crédito comercial aplica-se a taxa de juro comercial. Mas do outro lado da relação pode estar um comerciante ou um particular. Em 2003 surgiu um novo DL que estabelece medidas de atraso nas transacções comerciais. Aplica-se às relações de transacções entre comerciantes. No seu art. 2º al. a) consagra-se que estão excluídos os contratos com os consumidores. Este diploma alterou o art. 54º. Sendo crédito sobre consumidores colocava-se a questão de saber se se aplicava a taxa civil ou comercial, mas este diploma veio limitar a aplicação do art. 102º aos comerciantes. Nos termos do art. 99º, este diploma não transforma actos civis em comerciais, mas faz com que se aplique o regime comercial, com excepção de actos a que não se deva aplicar. Que-se saber qual a taxa de juro a aplicar, quais as soluções? A DOUTRINA tem dúvidas se em dívidas comerciais detidas por comerciantes sob consumidores se deva aplicar o juro comercial. A JURISPRUDÊNCIA afirma que, no diploma de 2003, não se aplica o juro comercial as dívidas entre comerciantes e consumidores, pelo que terá de se aplicar o regime normal constante do art. 102º. O art. 102º não se preocupa em saber quem está do outro lado, basta saber que a dívida é comercial e que está é detida por um comerciante. CASO 4 António, empresário mercantil, e Carlos, agricultor, compraram a um particular (Bernardo) uma carrinha por 50 000 euros. Duarte ficou fiador de António. Se nada for pago, quanto pode Bernardo exigir de cada um? No presente caso estamos no âmbito das obrigações plurais, art. 100º, em que a regra é a solidariedade, ou seja aplica-se aos co-obrigados se forem comerciantes. O agricultor nos termos do art. 230º não é comerciante. A solidariedade não é solidária com António (art. 100º) e quanto a Carlos aplica-se o regime civil (obrigação conjunta). O credor pode pedir tudo a António, mas só pode pedir metade a Carlos.
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP Note-se que Duarte é fiador de António. O Fiador ainda que não seja comerciante mas se garantir uma obrigação comercial tem direito ao benefício da escusão prévia (não pode ser demandado enquanto todo o património do devedor não tiver esgotado, ou seja não tiver mais bens no seu património). Mas tal benefício não se aplica porque o fiador responde ao lado. Não existe uma regra supletiva, mas as partes podem acordar a existência do benefício de execução prévia. Nesse caso, o fiador responde solidariamente com António até cinquenta mil euros. CASO 5 António, comerciante de automóveis usados, casado sob o regime da comunhão de adquiridos com Berta, contraiu um empréstimo bancário no valor de 100 000 euros para ampliar as instalações do seu estabelecimento. Não tendo sido pago o empréstimo, qual a garantia patrimonial do crédito do banco?
DOUTRINA MAIS ESCLARECIDA: Nos termos do art. 1691º al. b) e d) CC se os conjuges estiverem casados em regime de separação de bens não funciona a presunção, mas existe responsabilidade solidária se o credor fizer prova do proveito comum. JURISPRUDÊNCIA E RESTANTE DOUTRINA: Caso os cônjuges estejam casados em regime de separação de bens não funciona a presunção, não havendo responsabilidade solidária. No caso: aplica-se o regime específico das dívidas de direito comercial? Só se estivermos face um acto comercial. E estamos face a um acto comercial?
TEORIA DOS ACTOS DE COMÉRCIO: art. 2º I parte e art. 463º
TEORIA JURÍDICA DA EMPRESA: art. 230º, implicitamente
Nos termos do art. 1691º al. d) CC estabelece-se que as dívidas de comércio são da responsabilidade de ambos os cônjuges, salvo (1) se se provar que não foram contraídas em proveito comum do casal; (2) vigorar o regime de separação de bens. Nos termos do art. 15º CCOM consagra-se uma presunção de que as dívidas contraídas pelo conjuge comerciante são contraidas no exercício do seu comércio, logo, para ilidir esta presunçao o conjuge terá de demonstrar que não houve proveito comum do casa ou demonstrar que a dívida não foi contraída no exercício da sua actividade comercial. Ratio: havendo regime de comunhão, os proveitos do exercício da actividade comercial aproveitam a ambos os cônjuges. Nos termos do art. 1695º CC consagra-se quais os bens que vão respondem por estas dívidas: (1) bens comuns do casal; (2) na falta ou insuficiência, solidariamente, respondem os bens proprios de cada um dos conjuges. Assim sendo, as dívidas comerciais do cônjuge comerciante casado em regime de comunhão de bens presumem-se contraídas no exercício da sua actividade comercial e sendo contraidas no exercicio da mesma, presumem-se contraidas em proveito comum do casal. Logo, a garantia seria o patrimonio de ambos os conjuges.
Matéria Aula Prática
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP ESTABELECIMENTO COMERCIAL Matéria Aula Prática Análise do art. 230º C.Com: alarga-se o âmbito do comércio para outras áreas (produção, industria e prestação de serviços). O Direito Comercial abrange o comércio em sentido jurídico (actividades de intermediação, actividades de produção e industriais e actividades de prestação de serviços). Pressupõe, sendo uma norma de alagamento, que a compra e venda para revenda, sendo uma actividade de intermediação, já é uma actividade comercial. No primeiro parágrafo deste artigo excluem-se determinadas áreas do âmbito do Direito Comercial (profissionais liberais, empresas agrícolas, empresas acessórias das agrícolas). Nas empresas comerciais existe o risco de capital. EMPRESAS ACESSÓRIAS DAS AGRÍCOLAS
EMPRESAS (VERDADEIRAMENTE) COMERCIAIS
Critério de distinção: risco É uma empresa transformadora que se exclui do âmbito comercial, sendo deste modo integrante do âmbito civil. Existem duas empresas: uma agrícola e uma transformadora. Existe o risco da terra, sendo que o sucesso ou insucesso da empresa é ditado não pelo capital mas sim pela terra: se a empresa agrícola não tiver uma boa colheita devido à seca, por exemplo, a empresa acessória da agrícola não produz.
Pequenas Empresas o risco em que assentam é um risco pessoal, risco que decorre directamente da profissão (pode existir risco de capital mas não é isso que conta).
O principal risco é o de capital, ou seja o risco da sua actividade assenta no risco de capital.
EMPRESAS COMERCIAIS Risco de Capital
Nos termos do art. 230º, além de as empresas serem comerciais também o são os comerciantes: os sujeitos que praticam as actividades comerciais são os comerciantes. Basta que um sujeito se proponha no mercado ao exercício de uma determinada actividade para que passem a ser considerados comerciantes ocorrendo uma antecipação do momento em que ocorre a qualificação daquele sujeito como comerciante (≠ Teoria dos Actos do Comércio).
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP Conjugação do art. 230º e do art. 2º2ª parte:Se o comerciante praticar algum acto que não se insira na sua actividade principal mas se encontra com ela relacionada será qualificado como comercial nos termos do art. 2º 2ºparte (acto comercial subjectivo). O art. 2º2ª parte refere-se aos actos conexos da actividade principal. Teoria dos Actos do Comércio: é comerciante quem praticar actos de comércio profissionalmente. A actividade principal, neste caso, é a hospedagem. Inserindo-se os actos no âmbito profissional do comerciante aplica-se o art. 2º, 1ª parte. O art. 230º no 1ª paragrafo exclui as pequenas empresas. Deste modo sendo um pequeno motel poderia ser uma pequena empresa? Então e não se aplicando o art. 230º o estabelecimento não seria comercial. Nos termos do art. 1112º quando se refere a industria tal significa trabalho, ou seja quando para aquelas actividades que não tem caracter intelectual mas manual, assentando no esforço do próprio, são abrangidos pela figura do trespasse (cabeleireiro, sapateiro, pasteleiro fora do DComercial enquanto pequenas empresas mas que o legislador quis abranger pela figura do trespasse. Razão de ser deste regime do trespasse (estabelecimentos comerciais, estabelecimentos cujos titulares são profissionais liberais e estabelecimentos civis) ideia de permitir a continuação da actividade económica, independentemente de ser de natureza civil ou comercial, não sendo prejudicadas pela transmissão de um estabelecimento. Para permitir esta continuidade o legislador abarcou no âmbito do trespasse todos os estabelecimentos que tivessem natureza civil ou comercial. Deste modo a figura do trespasse pode ter como objecto qualquer estabelecimento. Embora a interpretação do art. 1112º não seja pacifica visto que alguma jurisprudência interpreta que o trespasse so existe relativamente a estabelecimentos comerciais com fundamento que na noção de comercio em sentido económico (actividade de intermediação) e olhava para este artigo e interpretava que quando o legislador falava em estabelecimentos comerciais eram estabelecimentos comerciais em sentido económico enquanto que industria seria comercio em sentido jurídico com base no art. 230º CCom. As actividades civis estariam excluídas do âmbito do trespasse todos os estabelecimentos sem natureza comercial estariam fora do regime do trespasse, pelo que o negocio atarves do qual o titular o alienasse a terceiro não benefeceria do regime do trespasse nem a transmissão da posição forçada do arrendatoria PROF. FRANCISCO BARONA – CRÍTICA: desde que surgiram as leis de 1910, a ideia que presidiu sempre ao trespasse foi permitir a continuidade das actividades económicas, independentemente da sua natureza. Deste modo justifica-se que o trespasse tenha sempre figurado do ponto de vista sistemática na parte do arrendamento porque o objectivo do trespasse é a continuidade da actividade económica. O nº5 indica que o trespasse se aplica ao exercício de profissionais liberais. Admitindo a existência de um trespasse como distingue-se este da cessão para exploração? Trespasse enquanto transmissão da titularidade definitiva; a cessão de exploração não transmite a propriedade havendo apenas uma locação do estabelecimento ou seja a cessão temporária do gozo mediante uma retribuição (locação do estabelecimento)
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP Caso I A, titular de um pequeno motel, com 8 empregados, situado em local de que C é o locador, vendeu-a a B, com todo o activo e passivo, por 20 000 euros, apesar de a situação líquida ser ligeiramente negativa. C, notificado do negócio, propôs acção de despejo contra B, alegando que o negócio fora simulado, e deduziu como pedido subsidiário a entrega do imóvel, por se considerar titular de um direito de preferência. Quid iuris? No presente caso tendo em consideração o exposto anteriormente existe um trespasse a título de venda. O problema coloca-se quanto ao facto de a situação liquida do estabelecimento ser negativa (passivo superior ao activo estabelecimento com exploração que dava prejuízo; pagamento do preço pode justificar-se pela dimensão de mercado (localização do hotel). O preço em estabelecimentos cuja situação liquida é negativa justifica-se não porque se quer aceder à posição de arrendatário mas sim pela dimensão de mercado. O art. 1112º/2 consagra dois requisitos, pelo que se tais não se verificarem o legislador considera que o negocio tem indícios de simulação. As partes não quiseram efectivamente realizar um trespasse mas sim fazer uma cessão não autorizada da transmissão da posição do arrendatário (contratual). E se a actividade passado um determinado tempo deixasse de ser de restauração e passasse para vestuário? Ou seja pode-se mudar a actividade? É necessário que no momento do trespasse fique demonstrado que era intenção do trespassado de vir a exercer uma actividade diferente daquela que vinha sendo exercida. Se o senhorio mostrar que foi no momento do trespasse com existiu o intuito de mudar o ramo de actividade não pode. Importa ainda referir o âmbito da cláusula genérica: todo activo e passivo transmite-se pelo trespasse. Existe a responsabilidade solidaria do antigo e do novo devedor numa transmissão singular de dividas quando não é ratificada pelo credor nem lhe seja pedido o consentimento (visa que o credor não saia prejudicado). Além do mais, quanto às posições contratuais tem de haver acordo do devedor cedido sob pena de se tal não acontecer será invalidade NOTA1: O Estabelecimento é uma universalidade, pelo que será composto por vários elementos. NOTA2: Nos termos do art. 230º CCom. Define-se a noção de empresa. Contudo tal é sinónimo de estabelecimento? A resposta afirmativa conduziria a resultados nefastos. Exemplo: pequeno sapateiro quer vender a sua loja. Nos termos do art. 230º exclui-se os pequenos empresários. Logo, não era um contrato de trespasse. NOTA3:Existe alguma diferença entre um estabelecimento e uma loja aberta ao público? Uma coisa é o estabelecimento e outra é o local onde se está a exercer a actividade. A loja pode ser apenas um dos locais em que assenta aquele estabelecimento. Em estabelecimentos comerciais com uma maior dimensão o empresário pode ter uma rede própria através de lojas espalhadas por todo o país – mas todas elas compõem o estabelecimento. Tanto se pode ter a actividade assente numa rede própria como numa rede de distribuição e tudo isso compõe o estabelecimento (não há quantos estabelecimentos como quantas lojas).
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP Uma linha de vendas na internet – o site de vendas é um dos elementos que compõe o estabelecimento. Ou seja, não se pode confundir o local onde se exerce a actividade e o estabelecimento. O estabelecimento é uma realidade jurídica mais ampla que a realidade física da loja aberta ao publico, seja esta uma rede de lojas ou uma rede de distribuição. NOTA4: Quando se fala em estabelecimento, este é composto por:
Elementos Corpóreos: imóveis, bens de equipamento, activo circulante do estabelecimento (fornecimento, própria caixa onde é depositado o dinheiro)
Há ou não um direito ao local, ou seja uma vez que o estabelecimento tanto pode estar a funcionar num local próprio (da titularidade do dono do estabelecimento) ou pode ser arrendado? O Estabelecimento como universalidade que é é algo que pode ser objecto de relações jurídicas autónomas. O direito a permanecer naquele local também se transmite com a transmissão do estabelecimento?
Nos termos do art. 1612º CC, quando o estabelecimento funcionar em local arrendando, havendo trespasse, ocorre também uma transmissão forçada da posição do arrendatário por força do trespasse. Historicamente, os grandes conflitos surgiam nos casos em que o estabelecimento funcionava em locais arrendados. O senhorio tinha todo o interesse em fazer cessar aquele arrendamento devido ao facto de as rendas serem baixas. O legislador criou o seguinte sistema: com o trespasse dá-se à transmissão forçada da posição de arrendatário, mas o senhorio tem um direito de preferência sobre tal.
Quando os estabelecimentos funcionam em locais próprios, se o proprietário vender o estabelecimento mas não vender a propriedade do imóvel o que sucede? Na grande maioria das vezes o local não é um elemento conatural do estabelecimento comercial (exemplo: o campo de golf é um estabelecimento comercial – situação em que o local é um elemento conatural do estabelecimento; mas e quanto à pastelaria dos pasteis de Belém?). Tem ou não direito ao local e a que título? A propriedade do estabelecimento é transmitida mas e a propriedade do imóvel pertence a quem? Sendo o objecto do negócio a transmissão do estabelecimento, quanto ao imóvel qual a posição do novo adquirente? Proprietário não é, e arrendatário? Existe uma situação de co titularidade – existe apenas o direito de gozar aquele local, mas não tem a titularidade do mesmo. Tendo o gozo o único titulo jurídico que lhe permite tal é o arrendamento. Ou seja, ele fica com direito ao arrendamento mas em que termos? De facto tem o direito a ter um contrato de arrendamento, mas se as partes não se entendem quanto aos termos do arrendamento, quem decide tal? O Tribunal (define as condições mínimas do arrendamento com base no mercado actual). A lei só trata do estabelecimento quanto ao arrendamento.
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Elementos Incorpóreos: relacionam-se com todos os direitos e obrigações nos quais esta assente a actividade daquele comerciante (dividas a fornecedores, créditos sobre clientes, marcas, patentes, know-how, direitos emergentes de contratos de trabalho, etc.)
NOTA5:O estabelecimento para além dos elementos corpóreos e incorpóreos também engloba a clientela? Ou seja, o estabelecimento também tem uma dimensão de mercado? Exemplo: Professor dono de um estabelecimento. Vende-o. Amanhã abre ao lado outro estabelecimento exactamente igual. Pode?
Partes podem convencionar este aspecto – questão resolvida
Se as partes não convencionarem nada, em regra não se transmite a clientela (não se pode obrigar as pessoas após a transmissão do estabelecimento, a continuarem a ir lá. Nem de forma jurídica nem de forma material). Quando se vende o estabelecimento não se obriga a nenhuma obrigação de resultado quanto à clientela, mas apenas uma obrigação de meios (obrigação de não adoptar actos que prejudicam o exercício da actividade daquele estabelecimento).
NOTA6: entende-se por Aviamento Subjectivo – relaciona-se com o comerciante que vende o estabelecimento NOTA7: entende-se por passivo de exploração o crédito que os fornecedores dão aquele estabelecimento. É um dos elementos positivos avaliados num estabelecimento, na medida em que traduz em números a actividade daquele estabelecimento. Tal traduz a dimensão de mercado do estabelecimento (conjuntamente com a transmissão ou não da marca, do know-how etc.). A dimensão do mercado é apurada em função de vários indicadores, e em relação a ela, o que transmite apenas se compromete a uma obrigação de meios (não praticar actos que impeçam ou prejudiquem o normal funcionamento do estabelecimento comercial). NOTA8: O trepasse é um figura contratual em que na sua base pode estar qualquer negócio jurídico (negócio pluricausal). O trespasse surgiu, inicialmente, porque não existia nenhuma figura que unificasse, que permitisse transmitir de forma definitiva, o estabelecimento como um todo. Não havendo trespasse, as pessoas teriam de fazer uma compra e venda de todos os elementos corpóreos e incorpóreos – tantos negócios como quantos elementos que estivessem naquele estabelecimento. Tal levantava problemas complexos, mas o trespasse também levanta quando se trata de créditos e débitos que compõem o estabelecimento. Com o trespasse também são transmitidos posições em contratos e dívidas do estabelecimento a terceiro e créditos do estabelecimento sobre determinados clientes?
Doutrina e Jurisprudência maioritária: no caso dos créditos, das posições contratuais e das dívidas par além de se realizar o contrato de trespasse é necessário realizar todas as formalidades para a cessão de créditos, transmissão de dívidas e cessão da posição contratual.
Outra parte da doutrina diz que tal esvazia em grande medida o trespasse, uma vez que a observação de tais formalidades complica muito o trespasse.
Outros autores: Créditos e dívidas com o exercício da actividade transmitem-se com o trespasse.
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP Caso II Alberto, casado com Berta, industrial de sumos e refrigerantes, adquiriu em 31 de Julho de 2008 a Carlos, agricultor e fornecedor de matérias-primas, 100 toneladas de frutas para a produção de sumos naturais, pelo preço de € 50.000,00, que o adquirente ficou de pagar em cinco prestações iguais. Para garantia do pagamento das duas últimas prestações, a vencerem-se, respectivamente, em 31 de Dezembro de 2008 e 31 de Janeiro de 2009, Alberto aceita uma letra sacada em favor de uma sociedade de rações credora de Carlos, a “Douro Valor – Rações, SA”, e saca um cheque em branco, que deverá ser preenchido com a data de 5 de Fevereiro de 2009, se a última quantia não fosse pontualmente paga, em 31 de Janeiro de 2009. Entretanto, e para distribuição dos seus sumos, Alberto celebra com Etelvino, dono de uma pequena mercearia, situada num imóvel pertencente a Felisberta, um contrato pelo qual Etelvino lhe cede o gozo da loja (incluindo o respectivo activo e passivo), a título definitivo, mediante o pagamento de € 100.000,00. a. Suponha que Felisberta pretende intentar uma acção de despejo contra Alberto, invocando que houve uma cessão não autorizada da posição de arrendatário. Quid Iuris? No presente caso é necessário apurar se estamos face a uma cessão de exploração ou a um trespasse. Nos casos de cessão de exploração permite-se o gozo da coisa a outrem, com caracter temporário, mediante o pagamento de uma renda periódica. No caso, aparentemente as partes teriam celebrado um trespasse e não uma cessão de exploração, uma vez que faltam os requisitos da alienação temporária mediante o pagamento de uma renda. A causa do negócio é a venda. Deste modo, uma vez que nos termos do art. 1112º estamos face a um trespasse Felisberta não tem qualquer fundamento para intentar uma acção. b. Caso Irene tivesse um crédito contra Etelvino resultante de um fornecimento de bebidas que não foi pago, contra quem poderá Irene fazer valer agora o seu crédito? O trespassante vai pagar aos credores e, nas relações internas, uma vez que houve a transmissão do estabelecimento exige-se essa quantia ao novo titular. Pode-se exigir a qualquer um deles.
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP Caso III A, titular de uma papelaria na cidade de Braga, relativamente conhecida mas já com certo aspecto «fora de moda» - chamada «papelaria da arcada» -, vendeu-a a B, com todo o activo e passivo, por 100 000 euros. No momento da venda, da contabilidade constava um activo de 30 000 euros e um passivo de 20 000. Passados dois meses, foi aberta pela sociedade C, a 100 metros do local, uma outra papelaria, designada «papelaria moderna». A sociedade pertence maioritariamente a A. Quid iuris ? A resposta seria diferente se a segunda papelaria tivesse sido aberta pelo próprio A? E pelo cônjuge? E se fosse o cônjuge o sócio maioritário da sociedade? No caso a diferença entre o activo e o passivo era apenas de 10 mil. Contudo, o negócio foi celebrado pelo valor de 100 mil o que conduz a que existam 90 mil euros que não se explicam: ou o negócio foi simulado ou existe dimensão de mercado. Se o estabelecimento tiver uma dimensão de mercado e as partes ao celebrar o trespasse quiseram transmitir tal dimensão isso significa que as partes mesmo que o negocio já tenha sido cumprido não podem praticar actos que frustrem tal fim. Quando a lei diz que as partes devem entregar tudo o que estiver acordado quanto ao estabelecimento tal significa que se deve assegurar por parte do trespassante o gozo pacifico do estabelecimento, sob pena de se frustrar o fim contratual previsto. Isso significa que do contrato de trespasse pode resultar uma obrigação de não concorrência a cargo do trespassante. Mas este também tem uma certa liberdade económica. Problema: como se concilia a obrigação de não concorrência com este principio da livre iniciativa económica? Nem faz sentido dizer que o sujeito fica impedido de exercer aquela actividade ad eternum ou em qualquer local. A obrigação de não concorrência a existir tem de ter limites:
Temporal: no âmbito do contrato de agencia o prazo é de 2anos (art. 9º/2). Contudo, estes dois anos é para um período máximo. Noutros ordenamentos jurídicos a obrigação de não concorrência é de 5anos. Jurisprudência do tribunal de justiça das comunidades vai no sentido de estabelecer no limite 5anos. Em Portugal, o limite temporal varia entre os dois e cinco anos.
Espaço: há estabelecimentos com uma área de irradiação limitada (rua, quarteirão – mercearia de barrio) ou seja o âmbito de irradiação geográfica esta determinado a uma zona limitada; outros tem uma área de irradiação maior atepode ser nacional. A clientela ou a dimensão de mercado do corte ingles pode ser nacional (toda a gente vai la, seja lisboeta ou não). Deste modo, quanto ao El Cort Inglês não se pode estabelecer depois da venda logo noutro sitio. Se se vendesse todos os Pingo Doce’s, o Jerónimo Martins poderia abrir passado 3meses o ‘’pingo amargo’’? Não. Mas é necessário ver caso a caso podendo a irradiçao geográfica ser maior ou menor.
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP No caso, a sociedade aberta perentece maioritariamente a A mas ele não é o dono. Qual é o âmbito da vinculação à não concorrência? Muitas vezes, sucede que o dono do estabelecimento é uma sociedade e os sócios não tem um especial conhecimento qualificado sobre as actividades exercidas, tendo tal o gestor da sociedade. Os gestores, membro de um órgão social, também estao obrigados a não concorrência? Ou o dono vende e a mulher poderá abrir outro estabelecimento? Há certas pessoas que pela relação de proximidade que tem com o antigo titular tem um conhecimento especial sobre o negocio pelo que ao abrir um novo estabelecimento poderiam estar a exercer a concorrência. A obrigação de não concorrência abrange quer o titular antigo, como todos os que com ele estão numa relação de proximidade (familiar, fucnional ou societária), ou seja todos aqueles que têm um conhecimento especial sobre a actividade de exercício (âmbito subjecto do direito de não concorrência). Em caso de incumprimento da obrigação de não concorrência: responsabilidade civil
Indemnização, mas o estabelecimento continuaria a funcionar Analogia com o art. 829º/1
Trata-se de uma analogia de prestação de facto negativo DOUTRINA: o art. 829º pode ser aplicado às prestações de facto negativo e não só quando estejam em causa obras – pode-se pedir o simples encerramento do estabelecimento.
NOTA: Prof. Menezes Cordeiro funda-se na ideia da pós eficácia das obrigações/eficácia póstuma das obrigações. O Estabelecimento tem uma dimensão técnico produtivo, mas não faria parte do estabelecimento a dimensão de mercado. Caso IV A, titular de um estabelecimento a funcionar em local arrendado, vendeu-o por €50.000, assumindo, ainda, um passivo líquido de €20.000. Executado o negócio e notificado do mesmo, o senhorio propôs uma acção de despejo, invocando que, como os próprios valores indicavam, o contrato era simulado; apenas haveria a transmissão da posição de arrendatário, encoberta por certos bens sem valor económico apreciável. Quid iuris? E se, em vez da simulação, tivesse havido mudança de ramo (compreendida no âmbito abstractamente definida pelo contrato de arrendamento)? Nos termos do art. 1112º/1 al. a) com o trespasse ocorre a cessão forçada da posição contratual, ou seja com este transmite-se a posição de arrendatário. No presente caso é necessário saber qual a motivação de aquisição por parte do trespassário: para beneficiar da renda mais baixa ou devido à dimensão de mercado?
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP Nos termos do art. 112º/2 al. a) ocorre a inversão do ónus da prova, cabendo ao trespassante e ao trespassário. Se o senhorio demonstrar que os valores em causa são exagerados face ao estabelecimento não existe trespasse (senhorio tem o indicio de que existiu um negócio simulado). Ao trespassário cabe demonstrar que o negócio não foi simulado e que portanto existiu um verdadeiro trespasse. Como é que se pode provar que existiu trespasse (o senhorio argumenta que o negócio foi simulado com base no art. 1112º/2 al. a) e devido ao preço)? Atraves do valor da facturação, do crédito que fornecedores dão ao estabelecimento e da clientela (normalmente é ocasional sendo dificil encontrar uma lista de clientes). É preciso averiguar-se, se no momento do trespasse, a intenção era a de continuar no mesmo ramo de actividade ou mudar. Se a intenção fosse mudar, logo no momento do trespasse, o senhoria podia resolver o contrato e propor acção de despejo. Caso V A, marceneiro com estabelecimento aberto ao público em local arrendado e exercendo directamente a profissão, vendeu-o, em 2010, a B, tendo notificado da transmissão o senhorio. Este pretendeu exercer o direito de preferência, mas foi-lhe dito que tal direito não existia. Quid iuris ? No presente caso não estamos face a um acto comercial objectivo nos termos do art. 2º I parte. Nos termos do art. 230º estamos face a uma pequena empresa, pelo que se coloca a questão de se saber se é aplicável o regime comercial. A situação em causa enquadra-se no art. 1112º quando este se refere a industrial? Se a resposta for afirmativa aplica-se o regime desta norma, nomeadamente o seu nº4. Nos termos do art. 1112º/4 o senhorio tinha direito de preferência na venda, mas existia a possibilidade de tal ser por ele exercido? Ele terá de exercer o direito de preferência nas mesmas condições que são oferecidas pelo terceiro interessado. Exercendo a preferência, a titularidade do estabelecimento e a titularidade do imóvel juntam-se no mesmo e o arrendamento extingue-se por confusão. Caso VI Carlos é docente liceal e está casado com Dora, que trabalha como “caixa” num supermercado. Insatisfeitos com o que auferem decidiram abrir um restaurante. Um amigo, Ernesto, que tem uma pequena quinta, fornece-lhes os legumes frescos. O negócio estava a correr bem até que foram surpreendidos com a abertura de uma cantina da Paróquia nas imediações, a praticar preços sociais. Confrontados com dificuldades de crédito e com o protesto de letras que Carlos entregara (não completamente preenchidas) a um fornecedor, optaram por se desfazer do negócio, vendendo-o a Fernando. a. O senhorio pode exercer o direito de preferência para ficar com o restaurante? No presente caso estamos face a um contrato de restauração que consubstancia um contrato de prestação de serviços.
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP O restaurante é um estabelecimento? Note-se que os estabelecimentos podem ser civis ou comerciais. Para existir um estabelecimento é necessário que exista uma ligação funcional dos elementos a um determinado fim, havendo uma certa indiferenciação entre os elementos. No estabelecimento o que faz com que o restaurante seja qualificado como tal são: os elementos corpóreos (cadeiras, mesas, cozinha, utensílios, matérias primas – tudo o que é essencial ao exercício da actividade) e os elementos incorpóreos (créditos, obrigações que tenham face a terceiros, direitos inerentes aos contratos de trabalho). Tal consubstância a dimensão técnico produtiva do estabelecimento. Além de tal o estabelecimento tem a dimensão de mercada (volume de vendas, clientes habituais ou contratos com determinadas empresas, localização às vezes, etc.). Deste modo, aplicando o art. 1112º/4 o senhorio poderia exercer o direito de preferência. b. Suponha que o contrato de arrendamento fora celebrado no ano 2000. A venda do negócio tem algum efeito a nível do regime do arrendamento? Art. 26º NRAU art. 1101º
INSOLVÊNCIA Matéria da Aula Prática Nos termos do art. 3º CIRE consagram-se as situações em que existe insolvência:
Análise do nº1:
Devedor tem de estar impossibilitado de cumprir por qualquer causa as suas dividas que já se venceram
Devedor deve ter a generalidade das suas dividas vencidas (não é todas nem uma) não se adoptou um critério quantitativo mas sim qualitativo que tem de ser apreciado caso a caso – o devedor pode ter apenas um divida vencida mas que pela sua grandeza faz concluir que o devedor não irá cumprir as restantes obrigações. O critério de partida para se considerar que um sujeito esta insolvente é à partida a impossibilidade de cumprir as suas obrigações mas depois há factos que indiciem uma situação de insolvência (o legislador equipara a insolvência iminente à insolvência actual).
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Análise do nº2 (pessoas colectivas e patrimónios autónomos)
Para alem de essas entidades estarem impossibilitadas de cumprir a generalidade das suas obrigações vencidas é preciso que o seu passivo seja manifestamente superior ao activo. Como é que avalia se uma empresa tem um passivo manifestamente superior ao activo? Para demonstrar que se esta na iminência de cumprir as obrigações vencidas é necessário atender se aquela entidade apesar de ter uma situação deficitária terá de se mostrar a impossibilidade de tal cumprir as obrigações passivas: não gera receita suficiente para pagar as obrigações vencidas.
Pode ocorrer existir uma entidade em que o passivo não é manifestamente superior ao activo mas é superior, mas ela não gera receitas suficientes para pagar as dividas vencidas está ou não insolvente? Tem um activo que é avaliado contabilisticamente em montante superior ao seu passivo mas não gera receitas para pagar as dividas que se encontram vencidas. Apesar de ser controverso considera-se que encontra-se insolvente é sempre necessário avaliar a capacidade de gerar receita e ver qual o activo e o passivo. Mesmo que o ativo seja superior ao passivo mas não tenha capacidade para gerar receita então estará insolvente
Breve Análise do CIRE O Processo de Insolvência desencadeia-se de uma de duas maneiras:
ou o próprio apresenta-se à insolvência Ou são os credores que a requerem
Quando são os credores a requerer a insolvência do devedor inicia-se o processo judicial em que o devedor é citado para contestar; existe um período de instrução (testemunhas ou peritos) e este processo culmina com uma decisão judicial. Tal decisão judicial pode ser de ou não declaraçao de insolvência. Quando se trata de uma declaração de insolvência abre-se uma nova etapa processual, uma vez que a sentença terá de transitar em julgado para se abrir a segunda fase. Na segunda fase em que o sujeito já foi declarado insolvente aos demais credores que ainda não intervieram no processo é lhes dado conhecimento que o sujeito foi declarado insolvente e para virem ao processo de insolvência reclaramerem os seus créditos processo de insolvência é um processo de execução universal ou seja todos os credores que pretendam exercer os seus direitos contra aquele sujeito têm de o fazer obrigatoriamente no processo de insolvência. Todos os processos em cursos suspendem-se e são apensos ao processo de insolvência que visa garantir a eficiacia processual e a igualdade entre os credores – todos os credores devem ser tratados de uma forma igualitária mas tal depende do credor em questão (comuns, garantidos/privilegiados, subordinados), ou seja da sua classe: os credores da mesma classe devem ser tratados de forma igualitária.
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP Os credores são chamados ao processo para virem reclamar os seus créditos e posteriormente abre-se o reconhecimento dos créditos reclamados/triagem dos créditos e ver aqueles que estao em condições se serem reconhecidos totalmente e parcialmente. Depois de tal, os credores são convocados para uma assembleia em que se toma uma de duas decisões:
aprovam a liquidação do devedor se chegarem à conclusão que este não tem viabilidade para a continuação da sua actividade;
aprovam um plano e nesse plano irão ser previstas as medidas que tem de ser implementadas no sentido de assegurar a continuidade da actividade do insolvente.
solução mista: alguns bens são liquidados e outros aproveitam-se pelo plano. O CIRE parte do pressuposto que os proprietários económicos do património do insolvente são os credores uma vez que são os verdadeiros interessados na satisfação dos seus créditos; os credores são livres para decidir e até podem impor perdões de credito ou seja, determina-se que os credores de uma determinada categoria so sejam pagos em 60% 70% do valor dos seus créditos, ocorrendo uma extinção parcial de créditos.
Deste modo o processo de insolvência so termina quando os credores forem pagos ou quando se considerar que não existem mais bens a liquidar. Pode haver aqui uma segunda sentença: sentença quanto à qualificação da insolvência, uma vez que esta pode ter sido originada por caso furtuito ou pode ser culposa (dolo ou negligencia). O tribunal pode ter que fazer uma segunda sentença para qualificar tal insolvência. Se for culposa tal tem efeitos importantes naqueles que foram culpados da situação de insolvência: do ponto de vista de eventuais créditos que se extinguem; do ponto de vista profissional podendo decretar-se uma inibição para o exercício da actividade profissional ate 10 anos; consequências criminais. Pode ainda suceder que determinados actos praticados no passado possam vir a considerar-se extintos e o valor de tais regressa à massa insolvente. Existe um período suspeito que assenta nos dois anos anteriores à data da declaração de insolvência.
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP Caso 1 António, Bernardo e Carlos, gerentes da sociedade “Devedores e companhia Lda.”, foram interpelados por Dionísio, trabalhador da referida empresa, para procederem ao pagamento de salários em atraso há mais de 6 meses de 50 trabalhadores da sociedade. Nessa data, Carlos constatou que: I.
Bernardo, que tinha o pelouro financeiro da sociedade, não procedia ao pagamento dos impostos da sociedade há mais de um ano e havia fugido para Espanha com a sua mulher, levando boa parte dos saldos das contas bancárias;
No presente caso é necessário analisar se estamos face a uma situação de insolvência. Uma vez que estamos face a uma pessoa colectiva, aplicando o art. 3º/2, sendo o passivo superior ao activo estamos face a uma situação de insolvência. Nos termos do art. 18º, Carlos tinha o dever de se apresentar à insolvência. Nos termos do art. 20º quando existam dívidas, nomeadamente de natureza tributária, com a segurança social, emergentes de contratos de trabalho e de natureza fiscal se perdurarem há mais de três meses presume-se inilidivelmente que o devedor insolvente conhecia aquela situação. Uma vez que Carlos não se apresentou à insolvencia é necessário saber quais as consequências que daí decorrem. Nos termos do art. 186º/3 al. d) consagra-se que a insolvência será culposa se o devedor conhecia a situação há mais de tres meses e não se apresentou à insolvência (Carlos estaria numa situação de insolvência culposa se conhecia a situação há mais de 3meses; se não conhecia encontrava-se apenas numa situação de insolvência). Nos termos do art. 20º os credores das dívidas que existem há mais de 6 meses podem requer a declaração de insolvência uma vez que tais dívidas indiciam o incumprimento generalizado. O ónus de demonstrar o contrário pertence ao devedor, ou seja, a este cabe fazer prova que os indicios do art. 20º apesar de verificados não conduzem a que a situação de insolvência se venha a materializar.
Trata-se de dividas que indiciam o incumprimento generalizado. Para os credores as dividas há mais de 6meses é suficiente para requerer a declaraçao de insolvência – art. 20 II.
António tinha escondido num armazém de uma propriedade sua no Alentejo grande parte da maquinaria que deveria estar nas instalações fabris da sociedade;
Tanto António como Bernardo encontram-se numa situação de insolvência culposa: o primeiro em virtude do art. 186º/2 al. a) e o segundo em virtude do art. 186º/2 al. h). A consequência de ambos se encontrarem numa situação de insolvência culposa, nos termos do art. 189º, conduz a que a responsabilidade seja solidária
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP NOTA: Antigamente o art. 189º consagrava a possibilidade d ena sentença de de declaração de insolvência se decretar a inabilitação de tais pessoas de 2 a 10 anos. O Tribunal Constitucional declarou tal inconstitucional. Uma coisa é declarar-se uma inibição, outra coisa é a inabilitação em que eles passam a ser considerados incapazes (violação do direito liberdade e garantia que assenta em que alguém sendo capaz fosse declarado incapaz por razões profissionais). III.
O passivo da empresa há muito que havia superado o activo.
Pergunta-se: a. O que poderá ou deverá fazer Carlos perante aquela situação? b. Bernardo e António poderão vir a sofrer pessoalmente pelos factos que praticaram? c. Suponha que Bernardo, dois anos antes, havia alienado parte substancial do património da empresa a dois sobrinhos, ao primo e à sogra. O que poderá suceder a estes negócios?
Existem certas situações de resolução em benefício da massa que dependem da verificação de certos pressupostos nos termos do art. 121º. Os pressupostos para a resolução em benefício da massa são:
Actos prejudiciais à massa Actos praticados até ao limite temporal de há dois anos atrás Má fé do terceiro
Art. 120º/5 alineas Art. 120º/4: presunção de má fé (pessoas especialmente relacionadas com o insolvente – art. 49º)
Embora Bernardo fosse gerente, nos termos do art. 49º, a sogra, o primeiro e os sobrinhso não se incluem no seu âmbito. Neste caso é necessário analisar se esta situação se insere em algum dos casos de resolução incondicional. Nos termos do art. 121º consagram-se várias hipoteses em que se admite que possam ser resolvidos em beneficio da massa desde que se verifique algum dos actos. O facto de Bernardo ter alienado uma parte substancial do património cairá na al. b) ou na al. h), consoante o acto de alienação tenha sido gratuito ou oneroso respectivamente. Tal acarreta efeitos retroactivos. Nos termos do art. 46º, existindo resolução em benefício da massa, os bens outrora alienados regressam à massa insolvente. NOTA: o art. 49º possui duas funções – (1) casos de resolução em benefício da massa; (2) classificar os créditos (tais créditos consideram-se subordinados nos termos do art. 48º).
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP Caso 2 A sociedade comercial Granja Amarela, S.A. (“GA”) já viveu melhores dias. O empréstimo hipotecário a 20 anos que contratou com o Banco Hércules (“BH”) faz sentir mensalmente o seu peso, bem como a pressão dos fornecedores, face ao constante atraso nos pagamentos. O seu único activo é a herdade amarela, cujo potencial agrícola diminuiu muitíssimo, após a construção de uma incineradora gigantesca, no terreno vizinho. Há quem sugira que a herdade agrícola deixou de ter valor comercial… Podem os credores da GA requerer a declaração de insolvência? Qual a ordem de satisfação dos seguintes créditos: o crédito do BH; os honorários do Dr. Coelho, que foi nomeado administrador da insolvência; o crédito da Sementes Ilíada, S.A. (“SI”), pela venda de sementes de girassol à GA? No presente caso nos termos do art. 20º al. b) a situação em causa é fundamento de declaração de insolvência. Quanto às dívidas da sociedade é necessário proceder à seguinte distinção:
Dívidas da Massa (contraídas no momento posterior à declaração de insolvência, sendo pagas em primeiro lugar)
Art. 172º - créditos sobre a massa Art. 51º - noção de dívidas da massa (honorários do Dr. Coelho)
Dívidas da Insolvência (contraídas antes da declaração de insolvência)
Os créditos que se encontrem garantidos são pagos em primeiro lugar. Nos termos do art. 48º, os créditos subordinados serão os últimos a ser pagos (note-se que o art. 604º CC é uma regra geral: o que o CIRE trás d enovo é que quando existe uma problema de eficácia externa das obrigações tal é o único caso em que se permite que por acordo se estabeleça um contrato com eficácia erga omnes). O art. 48º al. c) permite a eficácia externa o que tem uma enorme importância, não para os casos de simples mútuo mas sim para outro tipo de operações, ou seja quanto ao nível societário, as emissões de títulos de divida, sendo que estes representam empréstimos que os subscritores de tais fazem à sociedade (muitas vez, em vez de todos os obrigacionistas serem pagos em igualdade de circunstâncias, pode suceder que uns sejam pagos primeiro lugar, outros em segundo lugar, etc – cria-se uma sobordinação entre dois credores). A ideia de subordinação permitiu flexibilizar a gestão das sociedades permitindo que as sociedades possam muitas vezes graduar credores entre si, mas devido à amplitude da norma tal vale para qualquer crédito (os outros credores podem invocar o acordo de subordinação para dizer que o credor que a invocou será pago depois de todos os outros mas tal acarreta o problema dos terceiros, ou seja de invocarem este acordo face aquele credor só ser pago depois dos outros – caso de criação de direitos com eficácia erga omnes por mero acordo das partes). No presente caso a ordem de pagamento das dívidas seria: 1. Honorários do Dr. Coelho (dívidas da massa) 2. Banco – Hipoteca (crédito garantido) 3. Sementes (crédito comum)
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP TÍTULOS DE CRÉDITO Matéria Aula Prática LETRA DE CÂMBIO: o sacador dá ao sacado uma ordem de pagamento. Sendo o saque um acto unilateral (da exclusiva responsabilidade do sacador), o sacado fica obrigado ao pagamento da letra se a aceitar (posição da assinatura do sacado na letra assinatura do sacado equivale a aceitar). Nos termos do art. 1º da LULL consagram-se os elementos essenciais da letra, nomeadamente: (1) encontrar-se escrita a palavra letra; (2) ordem de pagamento; (3) nome do sacado; (4) nome a quem deve pagar – beneficiário; (4) nome do sacado (aquele que deve pagar), ou seja se o sacado não assinar a letra é apenas sacado. Note-se que enquanto na cessão de créditos é necessário notificar o devedor da transmissão de créditos o mesmo não sucede na letra de câmbio. A função da letra é circular e circula atraves de uma operação especial que se designa de endosso (sacador transmite a letra a alguém que passa a ser o endossado (C) e depois este transmite a letra a outro endossado (D) que transmite a outro endossado (E), etc.). Em cada uma das operações cambiárias existe uma relação jurídica subjacente (entre o sacador e C existe uma relação de mútuo; entre C e D uma relação de compra e venda, etc.). Enquanto a letra vai circulando, quem transmite a letra vai realizando o seu respectivo valor. Quando o E (endossado) apresenta a letra ao sacado aceitante como é que este sabe que paga bem a E, uma vez que é alheio a todas as relações subjacentes? O E vai ser considerado portador legitimo da letra, justificando o seu direito de a exigir com base numa cadeira interrupta de aceitantes. O sacado aceitante consegue verificar tal cadeira interrupta sendo E, então, considerado portador legítimo pelo que paga bem. Na costa da letra da letra, com o intuito de se realizar um endosso, deve-se indicar o nome dos sacados. Contudo, pode suceder que exista uma assinatura do sacador e depois um endosso a dizer que se deve pagar a D, estando tal assinado por C. No primeiro endosso existe aquilo que se designa como endosso em branco, uma vez que o sacador não indica a favor de quem é dirigido o endosso. Nos termos do art. 16º LULL, quando existe um endosso em branco, tendo por base o exemplo anterior, presume-se que C terá adquirido a letra por força do endosso que o sacador lhe tinha feito mas que se encontra em branco. Se o sacado aceitante aceitar pagar a letra na data no seu vencimento irá exigir que lhe seja entregue o título. O que sucede se à data do vencimento, E apresentar a letra a pagamento ao sacado aceitante e este se recusar a pagá-la? O notário irá atestar perante uma letra que lhe é apresentada. Tendo sido a letra preenchida, o notário irá análisá-la e irá analisar também os seus elementos. Não tendo sido a letra paga na data do seu vencimento, continuando o portador na posse da letra, o notário irá lavrar o protesto e atestar que a letra foi apresentada pelo portador legítimo da mesma. Se E não realizar o protesto só terá direito de acção contra o aceitante, sendo que neste caso estamos face a uma acção executiva uma vez que a letra consubstancia um título executivo.
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP Só se E tiver lavrado protesto é que poderá exigir o cumprimento da letra ao sacador, aos endossados e aos co-obrigados. Ou seja, se E lavrar o protesto, além de continuar a ter direito de acção contra o sacado aceitante, terá ainda direito de agir contra todos os endossados anteriores (E pode accionar D, D acciona C e C acciona o sacador). Note-se que pode ainda ocorrer o regresso pre salto, ou seja E em vez de accionar D poderá exigir o pagamento da letra a qualquer outro que se encontre atras de si (problema: a partir daqui a letra só anda para trás). Todos os que se encontrem na cadeia de endosso são solidariamente responsáveis pelo pagamento da letra. Note-se que o prazo de protesto é de dois dias (englobando já os dois dias subsequentes ao dia em que era suposto pagar-se a letra ou só depois destes?), e se não for realizado só existe direito de acção face ao sacado. No limite quem sofre o prejuizo da letra é o sacador na medida em que foi ele quem a criou. Pode ainda suceder que surja o avalista (garante), sendo que o aval tem de ser sempre dado pelo valor de alguém (se não se identicar a favor de quem se faz o aval este presume-se feito pelo sacador). Note-se que se dá o aval por honra do aceitante ou por honra do endossado, mas nin guém dá o aval à letra na sua globalidade. Existe uma querela doutrina que assenta em saber se é ou não necessário realizar protesto para accionar o avalista? Parte da doutrina defende a desnecessidade de protesto, contudo a posição defendida pela regente é em sentido contrário. FUNÇÃO DO PROTESTO: poder-se-ia pensar que a sua função assenta em pagar-se a letra quando o sacado aceitante não o faz, mas tal consubstancia um mero efeito. Na verdade assenta em fazer prova de que não foi paga a letra, sendo o único meio de prova que a LULL admite. Ou seja, uma parte da doutrina reconduz o aval a uma fiança, sendo neste caso uma garantia meramente acessória do crédito; por outro lado, outra parte da doutrina reconduz o aval a uma garantia autónoma, não sofrendo as vicissitudes da obrigação garantida. Enquanto que o aval fiança irá sofrer as vicissitudes próprias da obrigação avaliazadas, no aval garantia autónoma tal não sucede. Embora a letra seja em si mesmo um título abstracto, ou seja abstrai-se da causa, o avalista não é o único garante que surge na letra: o sacador e os endossantes são igualmentes garantes do pagamento. Em suma:
Se o aval for configurado como uma garantia autónoma, e não acessória do crédito:
É necessário protesto O avalista do aceitante não pode invocar as excepções que o avalizado pode invocar nos termos do art. 17º LULL A Teoria da Acessoriedade prescinde do protesto, mas em contrapartida permite ao avalista do aceitante que ele recorra ao art. 17º LULL
A doutrina maioritária defende que o avalista do aceitante pode ser sempre accionado sem necessidade de protesto
A doutrina minoritária defende que é necessário protesto
PROF. FRANCISCO BARONA: A doutrina maioritária não é coerente. Da mesma forma que diz que não é necessário protesto com base na interpretação literal do art. 32º I LULL (aval segue o regime da fiança) afirma de seguida que no tocante à invocação
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP das excepções constantes do art. 17º LULL o avalista do aceitante não poderá recorrer a tais. O art. 17º LULL distingue relações imediatas de mediatas, não se olhando para as posições cambiárias mas sim para as relações subjacentes. No dominio das relações imediatas todas as excepções são oponíveis. Para quem entende que o aval consubstancia uma relação autónoma, o avalista encontra-se numa relação imediata com o sacador. LETRA EM BRANCO: letra que não se encontra preenchida em algum(ns) do(s) seu(s) elemento(s), mas existe um acordo entre as partes (pacto de preenchimento). Ou seja, quando se dá a letra a pagamento está terá de ser acompanhada do referido pacto nos termos do art. 10º LULL. A inoberservância dos pactos de preenchimento não é oponível ao portador, a não ser que este tenha agido de má fé ou cometido falta grave. É sempre necessário cumprir deveres de cuidado. Coloca o problema do risco do preenchimento abusivo. LETRA INCOMPLETA: a letra não se encontra preenchida em algum(ns) do(s) seu(s) elemento(s), mas por uma razão desconhecida cái em circulação. Em principio, cada subscritor cambiário só responde pelo valor da letra na medida que tenha realizado o seu valor. Se alguém é furtado da sua letra incompleta e vem a ser accionado em via de regresso poder-se-á opor dizendo que não realizou o valor daquela letra. Mas só e apenas ele. Caso 1 Bernardo vendeu um conjunto de mobílias a António por 1000 euros, com a entrega dos bens daí a 15 dias e com o pagamento do preço a 90 dias. Em representação da operação, Bernardo sacou sobre António uma letra de câmbio pagável a 90 dias da data. A letra foi aceite e descontada depois de Carlos ter prestado o seu aval por honra do aceitante. Em virtude da não entrega das mobílias a letra não foi paga no vencimento. Quais os direitos do portador da letra? No presente caso estamos face a uma letra de câmbio, que constitui um título de crédito. A relação subjacente assenta no contrato de compra e venda celebrado entre Bernardo e António e a relação cartular ou cambiária em Bernardo sacar uma letra de câmbito sobre António, que este aceite. Intervenientes no presente caso:
Sacador – Bernardo Sacado Aceitante – António Avalista – Carlos Portador – Banco (‘’a letra foi aceite e descontada’’ – para fazer o desconto teve de lhe ser endossada)
Uma vez que nada nos é dito em sentido contrário, presume-se que os requisitos formais constantes do art. 1º LULL se encontrem preenchidos. Nos termos do art. 33º LULL consagram-se os tipos de vencimento da letra, sendo que no presente caso a letra vencia-se em 90 dias (se não tivesse sido indicado prazo a letra seria à vista podendo ser apresentada a todo o tempo).
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP Não sendo paga a letra (em virtude da não entrega das mobilias) é necessário saber quais são os direitos que assitem ao banco (portador da letra). Em primeiro lugar o Banco poderia (e deveria) protestar. Neste caso, teria dois dias para o fazer a contar da data do vencimento do título de crédito. É necessário lavrar o protesto para se poder abrir a cadeia de regresso, ou seja, accionar Bernardo (sacador endossante será responsável de regresso) e Carlos (avalista). Quanto a este último coloca-se a questão da (des)necessidade de protesto. Poderia o sacado aceitante, ou seja António, recusar-se a pagar a letra? Estando o sacado aceitante numa relação mediata com o banco não poderia invocar excepções a menos que se encontre consagrado no art. 17º LULL. NOTA: Existe uma situação em que é possível accionar qualquer subscritor cambiário sem necessidade de protesto. Tal situação encontra-se consagrada no art. 46º LULL e refere-se à cláusula sem despesa que abrange e só beneficia todos os subscritores se tiver sido aposta no título pelo sacado no momento do saque; só vincula aqueles que tiverem recebido o título com aquela cláusula incerta. Caso 2 António, casado com Berta no regime da comunhão de adquiridos, comprou a Carlos e Duarte a casa de saúde Aurora Matias, que estes haviam herdado da falecida mãe há dois anos e explorado, entretanto, em conjunto. O preço ajustado foi de 80 000 euros, dos quais 50 000 euros seriam pagos em prestações e ficaram representados por cinco letras sem data de vencimento e com o valor nominal de 10 000 euros cada. As letras foram aceites. Eduardo e Filipe, os filhos do casal, deram o seu aval por honra do aceitante. De acordo com o contrato de compra e venda, o não pagamento pontual de uma prestação acarretaria o imediato vencimento das restantes. Os títulos foram descontados. No respectivo vencimento, o primeiro deles não foi pago.O portador apresentou então também os demais a pagamento e, perante a recusa do sacado em pagar, fê-los protestar. a. Faça um esquema que retrate sinteticamente a relação cartular com os respectivos negócios e intervenientes, bem como as relações subjacentes. b. Responda ordenada e sinteticamente às seguintes questões, justificando legalmente a sua resposta. I.
Quem é o portador da letra? O Portador da Letra é o Banco, sendo que a relação subjacente que existe para com este é de desconto: contrato em que o valor da letra é descontado com as comissões do Banco.
II.
As letras eram pagáveis à vista? As letras à vista encontram-se consagradas no art. 2º II LULL, mas no presente caso estamos face a uma letra em branco, em que embora a data de vencimento se encontre em branco a letra encontra-se preenchida quanto ao valor. Estamos face a uma letra em branco uma vez que na relação subjacente encontra-se um contrato de compra e venda a prestações, em que cada letra tinha o valor de dez mil euros, sendo cinco letras no total, pelo que cada uma pagava uma prestação. Conclui-se que as partes realizaram uma pacto de preenchimento. Se estivessemos face a uma letra à vista as partes nao
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP teriam acordado o momento do pagamento, ao contrário do que sucede no caso: a data de pagamento é quando cada uma das letras se vence. III.
Podia o portador apresentar a pagamento todas as letras em causa? Só podria apresentar as demais letras se por falta de pagamento de uma das prestações se tivessem vencido as demais. Se assim não fosse, só poderia apresentar uma a uma na respectiva data do seu vencimento.
IV.
Perante a recusa de pagamento ocorrida, que direitos tem o portador da letra? Se o Banco lavrar protesto existirá direito de regresso face ao sacador, endossantes que se encontrem atrás de si na cadeira de regresso e os avalistas do aceitante, neste caso. Caso 3
António tem uma empresa que se dedica à instalação de painéis solares e conseguiu obter a representação de uma importante fábrica nacional, através de contrato que assinou recentemente. Para poder responder cabalmente às exigências do novo contrato, encomendou a feitura da página de internet da sua empresa a Bernardo, tomou de arrendamento uma loja e contraiu junto de um Banco, um financiamento de curto prazo, tendo para o efeito subscrito uma livrança. Como se caracteriza a livrança e qual é a sua função neste contexto? No presente caso estamos face a uma livrança que consubstancia uma promessa de pagamento feita pelo subscritor. A livrança, embora se distinga da letra de câmbio pelo facto de ser uma promessa de pagamento enquanto que a segunda é uma ordem de pagamentom segue o mesmo regime jurídico do que esta. É necessário atender ao disposto no art. 77º e ss LULL. A livrança consubstancia um título executivo e desempenha uma função de garantia da operação (caução da operação). A caução é uma garantia, não necessariamente pecuniária, que pode revestir qualquer tipo (de garantia). Inicialmente a caução era utilizada enquanto forma de garantia de determinados metais preciosos. Trata-se de um negócio pluricausal (tal como a cessão de créditos). Caso 4 Comente a seguinte frase: “o emitente de uma letra não está obrigado pela mesma quando demonstre que o título é de favor”. LETRA DE FAVOR/TÍTULO DE CRÉDITO DE FAVOR: se alguém se dirgir ao banco e pedir um empréstimo, se o banco pedir uma garantia pessoal vamos falar com a mãe ou com o pai e pedimos que seja fiador. Não há nenhuma relação jurídica entre o garante e o garantido que não seja de favor. Não é obrigacional. O aval numa fiança deve ser a relação de favor que se tem com o outro. Neste caso coloca-se a questão de saber como é que se poderá opor ao portador uma vez que se encontra apenas numa relação de facor. Poder-se-á opor apenas nas relações imediatas, sendo de todo improcedente fazer o mesmo nas relações mediatas a menos que o terceiro tenha recebido a livrança com o intuito de prejudicar o devedor.
Maria Luísa Lobo – 2012/2013
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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP EXCEPÇÃO DE FAVOR: tal excepção surge nos casos em que quem subscreve a letra ou a livrança apenas tem uma relação de amizade ou de favor. Durante algum tempo entendeu-se que era oponivel contra qualquer portador da letra, independentemente do tipo de relação. Havendo uma mera relação de amizade tal não é subjacente pelo que não se enquadra nos termos do art. 17º LULL. NOTA: a letra considera-se juridicamente existente e vinculativa com o seu mero preenchimento ou é necessário para que a letra vincule o sacador e os demais intervenientes que tenha sido criada pelo proprio sacador e colocada por ele voluntariamente em circulação? Ou seja se o sacador criar uma letra, guardá-la na gaveta de sua casa e se posteriormente a mesma for furtada coloca-se a questão de saber se a letra já existe ou não. A regra é a de que a letra para vincular o sacador terá de ser voluntariamente colocada por ele em circulação. Tal consubstancia a Teoria da Emissão (preencher a letra e entregar a alguém). Tendo sido involuntariamente colocada em circulação, o sacador não é obrigado cambiário podendo se exigida podendo se opor, deduzindo qualquer outra excepção ou invocando que a letra lhe foi furtada. Caso 5 Carlos é professor e está casado com Dália, que trabalha como empregada de escritório. Insatisfeitos com os rendimentos que auferem decidiram abrir um restaurante. Um amigo, Edgar, que tem uma pequena produção agrícola, fornece-lhes os legumes e fruta fresca. Entretanto foram surpreendidos com a abertura de um restaurante de fast food a praticar preços mais baixos. Confrontados com dificuldades de crédito e com o protesto de letras que Carlos entregara (ainda não completamente preenchidas) a um fornecedor, optaram por se desfazer do negócio, vendendo-o a Filomena. Carlos poderá alegar perante Guiomar, portadora actual da letra, que a mesma foi apresentada antes do tempo e preenchida abusivamente? No presente caso é necessário distinguir duas situações: se o endossado sabia dos acordos e os preencheus tais são lhe oponiveis; se desconhecia ou foram transmitidos, ele poderá ter usado a diligência necessária para se certificar que se tratava de um título legítimo pelo que não lhe seria oponível. É necessário analisar a questão do preenchimento abusivo: uma vez que foram preenchidos por ele, mas não na sua totalidade, tal conduz a que tenha de pagar uma vez que assumiu o risco ao não preencher. Tal conduz a uma situação de responsabilidade contratual. Carlos não poderá alegar face a Guiomar a apresentação antecipada e o preenchimento abusivo (problema das letras em branco). Não existe contradição uma vez que se tiver existido violação do pacto de preenchimento, Carlos poderá tentar responsabilizar o fornecedor em sede extra cartular. Contudo, as vicissitudes da relação subjacente à emissão da letra não são oponíveis nas relações mediatas a terceiros portadores de boa fé. Guiomar não é parte na convenção executiva com Carlos, é terceiro.
Maria Luísa Lobo – 2012/2013
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