SRI RAMAKRISHNA O GRANDE MESTRE
Por Swami Saradananda
(Um discípulo direto de Sri Ramakrishna) Original em Bengali
Traduzido para o inglês por Swami Jagadananda
Traduzido do inglês por Leda Marina Bevilacqua Leal
VOLUME I
1999
“Trans “Transla lated ted from from Sri Ramakr Ramakrish ishna, na, The Great Great Maste Master, r, as transl translate ated d into into Engli English sh by Swami Swami Jagadananda Jagadananda and published published by the President, Sri Ramakrishna Math, Madras, Copyright Copyright 1952.”
ÍNDICE PARTE I CENÁRIO DE FUNDO E A PRIMEIRA PARTE DA VIDA Capitulo
Página
Nota do Editor à 1ª Edição ..............................................................................................03 O Livro e seu Autor..........................................................................................................04 Prefácio pelo Autor...........................................................................................................13 Introdução........................................................................................................................13 I ------A Necessidade da Época........................................................................................16 II -----Terra Natal de Sri Ramakrishna e Ancestrais.........................................................19 III ----A Santificada Família em Kamarpukur....................................................................23 IV ----As Estranhas Experiências de Chandradev............................................................28 V ----Nasce uma Grande Alma........................................................................................31 VI ----A Infância de Gadadhar e Morte de seu Pai...........................................................32 VII - -A Meninice de Gadadhar.......................................................................................37 VIII - -No Limiar da Juventude.........................................................................................42
PARTE II COMO ASPIRANTE ESPIRITUAL Prefácio – O Que Esta Parte Contém..............................................................................47 Introdução: A Encarnação Divina como Sadhaka ...........................................................47 I ------Sadhaka e Sadhana – O Aspirante e a Disciplina Espiritual...................................52 II -----A Atitude de um Sadhaka na Vida - da Encarnação de Deus................................56 III ----A Primeira Manifestação da Atitude de um Sadhaka.............................................64 IV ----O Templo de Kali em Dakshineswar.......................................................................67 V ----Assumindo o Cargo de Sacerdote..........................................................................73 VI ----A Angústia da Alma e a Primeira Visão..................................................................78 VII ---Sadhana e a Intoxicação Divina.............................................................................82 VIII --Última Parte da História dos Primeiros Quatro Anos de Sadhana..........................87 IX ----Casamento e Retorno a Dakshineswar...................................................................98 X ----A Chegada da Bhairavi Brahmani...........................................................................102 XI ----Sadhana Tântrica....................................................................................................106 XII ---O Sadhu de Cabelo Emaranhado e a Sadhana do Mestre de Vatsalya Bhava.......113 XIII --A Essência do Madhura Bhava...............................................................................119 XIV --A Sadhana de Madhura Bhava do Mestre.............................................................127 XV - -A Sadhana do Mestre de acordo com a Vedanta....................................................132 XVI --Epílogo da Sadhana de Vedanta do Mestre: sua Prática do Islamismo..................139 XVII A Visita do Mestre ao Vilarejo Natal........................................................................143 XVIII A Peregrinação do Mestre e a História de Hridayaram...........................................147 XIX --A Morte de Pessoas Ligadas ao Mestre ao Mestre................................................151 XX - -A Adoração de Shodasi..........................................................................................154 XXI --Epílogo à História das Sadhanas do Mestre...........................................................159 XXII -Os Principais Acontecimentos desde a Adoração de Shodasi................................164
É com grande satisfação que apresentamos aos leitores a tradução para o português da edição de 1983 do "Sri Ramakrishna, the Great Master", traduzido do bengali para o inglês, por Swami Jagadananda. Desejamos expressar nossa imensa gratidão ao Presidente do Sri Ramakrishna Math, Madras, por sua autorização formal para a tradução dessa obra magnífica que retrata a vida do grande Ser que foi Sri Ramakrishna. Leda Primeira edição em português NOTA DO EDITOR À PRIMEIRA EDIÇÃO Temos muito prazer em apresentar ao público, Sri Ramakrishna, o Grande Mestre - a mais ampla, autêntica e crítica avaliação da vida, Sadhana e ensinamentos do Bhagavan Sri Ramakrishna. Sessenta e seis anos fizeram rolar a corrente do tempo desde que Sri Ramakrishna deixou a envoltura mortal, mas a onda de espiritualidade levantada por sua vida, tocou até mesmo as praias distantes de ambos os hemisférios e ainda está ressurgindo com toda potência nativa nos pensamentos dos diferentes países do mundo civilizado de hoje. Na Índia seu nome tornou-se uma palavra do lar, um símbolo de esperança e um Mantra sagrado para ser invocado. Seus pronunciamentos inspirados trouxeram luz onde antes prevalecia total escuridão, alívio para muitas almas sofredoras e paz a muitas mentes abstraídas. A vida que pode ter tido essa influência maravilhosa dentro de um período tão curto, é desnecessário dizer, foi dotada de um poder sem precedente, cuja profundidade plena e significado levarão anos para serem revelados à humanidade. Descrições dessa vida maravilhosa foram dadas ao mundo por seus diversos discípulos e admiradores, de tempos em tempos, em diversos idiomas, desde seu desaparecimento da terra. Mas nenhuma delas representou uma narrativa detalhada dessa personalidade ímpar. Srimat Swami Saradanandaji Maharaj, discípulo direto de Sri Ramakrishna e Secretário Geral do Ramakrishna Math and Mission desde seu começo, até seu passamento em 1927, sentindo a necessidade dessa biografia, trouxe-a a público, em cinco volumes, em bengali, sob o título Sri Ramakrishna LilaPrasanga contendo muitos detalhes da vida do Mestre, não publicados e que pode sinceramente ser considerada um tratamento exaustivo do assunto. O Swami queria escrever uma versão em inglês de seu trabalho em bengali e, de fato, traduziu alguns capítulos que apareceram em duas revistas da Missão, Vedanta Kesari e Prabuddha Bharata, mas devido à sua doença e a vários outros motivos, não pôde completá-la. A ansiedade do público em geral fora de Bengala para conhecer maiores detalhes da vida maravilhosa do Mestre estava sendo sentida veementemente e pensamos que estaríamos prestando algum serviço aos nossos leitores ansiosos, se não a toda humanidade, se pudéssemos presenteá-los com uma tradução fiel e literal da bela biografia em bengali. Srimat Swami Jagadanandaji, um veterano e erudito monge de nossa Ordem, aceitou, a nosso pedido, essa tarefa hercúlea de traduzir os cinco volumes para o inglês, deixando-nos em profunda dívida de gratidão. Foi lamentável que ele tenha falecido em dezembro passado, antes que essa obra notável de sua devoção pudesse ser vista à luz do dia. Ele assumiu a tradução quando beirava os setenta anos, mas acabou a obra num incrível curto prazo, entregando-a aos editores. Sendo um discípulo da Santa Mãe, conheceu intimamente o reverenciado Swami Saradanandaji Maharaj e muitos outros discípulos de Sri Ramakrishna. Swami Jagadananda é conhecido de muitos leitores e estudantes de Vedanta como um instrutor das Escrituras, editor anônimo de muitos livros religiosos e tradutor de textos vedânticos como o Upadesha-Sahasri de Sri Sankaracharya. Suas aulas iluminadoras eram uma alegria para todos, jovens e velhos, leitores leigos e monásticos na Uttarakhand. Nele notava-se sempre, uma feliz mas rara combinação de Jnana e Bhakti. Incansável no trabalho, sem comprometer-se em sua adesão aos Siddhantas (conclusões) da Vedanta, foi notável por sua grande devoção ao Mestre e à Santa Mãe. Swami Nirvedananda, o erudito escritor de "Sri Ramakrishna e o Renascimento Espiritual" (na "Herança Cultural da Índia", vol. II) e outros livros, escreveu uma curta mas bonita vida de Srimat Swami Saradanandaji Maharaj. Isso dará ao leitor uma idéia da verdadeira personalidade do autor do livro e servirá em parte, como introdução. Nós lhe somos devedores por tão valioso acréscimo a esse trabalho. O Prof. K. Subramanyam, M.A.,L.T., Vice-Diretor do Vivekananda College, Madras, gentilmente leu o manuscrito inteiro e editou com competência para nós. Merece nossos cordiais agradecimentos por tão nobre trabalho. O Dr. Nandalal Bose, o famoso artista de Santiniketan (Visva-bharati), gentilmente
desenhou a capa (Panchavati em Dakshineswar), como um trabalho de amor. Oferecemos-lhe nossos sinceros agradecimentos. Ao trazer à publicação uma obra tão gigantesca, recebemos ajuda substancial de maneiras diferentes de amigos leigos e monásticos, que preferem manter-se desconhecidos. Oferecemo-lhes nossos sinceros agradecimentos. Sinais diacríticos não foram usados no corpo do livro, mas foram explicados e a pronúncia de importantes palavras hindus foi mostrada com diacríticos no índex. Uma palavra a respeito do próprio livro: Sri Ramakrishna Lila-Prasanga ocupa um lugar único na hagiografia. A história da vida de uma personalidade divina, adorada por milhões como Encarnação de Deus, nunca havia sido escrita dessa forma por qualquer de seus apóstolos. Contudo o leitor notará como o autor tornou o livro tão confiável e interessante, ao dar-lhe um toque moderno, utilizando o método científico em todo ele. O livro não é apenas simples biografia da mais recente Encarnação da época moderna, mas combina uma biografia com um estudo lúcido dos diversos cultos de religião, misticismo e filosofia conseguidos na Índia e em outros lugares, desde os tempos pré-históricos até a era moderna. A matéria principal, a vida de Sri Ramakrishna, não é menos do que uma enciclopédia de religião e filosofia. Não será fora de propósito fazer menção aos Tantras, a sagrada literatura dos shaktas de Bengala e outros lugares. Sir John Woodroffe, sob o cognome de Arthur Avalon, e seus colaboradores indianos tornaram os Tantras disponíveis em parte para o público leitor de língua inglesa. Como usaram o método científico, seus estudos dos Tantras têm grande apelo à mente moderna. Sri Ramakrishna praticou todas as disciplinas contidas nos sessenta e quatro Tantras principais, sob a direção de um bom instrutor. Algumas práticas dos Tantras, conhecidas como de "esquerda", que não foram completamente descartadas por Sri Ramakrishna, foram, na verdade, reorientadas por ele. Muitos dos ensinamentos científicos modernos são consonantes com o ideal fundamental dos Tantras. Coisas ou práticas que parecem repulsivas à mente moderna, realmente não o são. Leitores, dotados de uma visão exaltada e de espírito moderno de pesquisa da verdade, serão capazes de compreender que as práticas dos aspirantes tântricos envolvendo contato com o que é chamado de baixo, ruim, feio e vulgar, ajudaram-nos a sublimar esses sentimentos até o ponto de fazê-los realizar o poder divino, que é sempre elevado, verdadeiro, bom e belo. Contamos com a capacidade de pensar dos leitores em seu estudo do capítulo tântrico da Sadhana de Sri Ramakrishna visto que não sacrificamos a beleza e a substância desse episódio para satisfazer os reclamos do gosto "moderno". Uma atitude correta é, também, necessária para penetrar no espírito da Sadhana de Sri Ramakrishna de acordo com o aspecto de Madhura Bhava da Escola Vaishnava. Esperamos que nossos leitores jamais deixem de tê-la. "Quando você não souber compreender, aprenda a confiar", é um adágio que pode ser muito útil aqui. Nada há de excêntrico ou estranho nos vôos do gênio de um dos maiores instrutores místicos do mundo como foi Sri Ramakrishna. Que possa a leitura séria deste livro inspirar a humanidade a dar um passo à frente em sua marcha em direção à Verdade. Editor Sri Ramakrishna Math Mylapore - Madras - 4 Outubro de 1952 NOTA DO EDITOR À QUINTA EDIÇÃO A quinta edição do Sri Ramakrishna, o Grande Mestre está aparecendo em dois volumes. Tanto o leitor como o comprador acharão essa divisão conveniente. O índex e a Vida do Autor, Swami Saradananda, foram passados para a segunda parte, para facilitar a divisão do livro em duas partes iguais. Essa nova edição foi também revista cuidadosamente a fim de torná-la mais fácil de ser lida. Editor O LIVRO E SEU AUTOR Essa é a primeira tradução para o português da primeira versão completa, em inglês, do Sri Ramakrishna Lila-Prasanga, relato fiel e exposição em bengali, dos diversos aspectos da vida de Sri Ramakrishna (1836-86), que o erudito francês, Romain Rolland, apresentou ao Ocidente como o "Messias de Bengala". Certamente a vida de Sri Ramakrishna foi um significante acontecimento espiritual do
último século. Seu discípulo principal, Swami Vivekananda, declarou, "Sua (a de Ramakrishna) vida foi mil vezes mais importante do que seus ensinamentos, um comentário vivo dos textos dos Upanishads, não, ele foi o espírito dos Upanishads sob forma humana. Em nenhum outro lugar nesse mundo existe essa perfeição sem par, essa maravilhosa bondade com todos que não pára para se justificar, essa imensa simpatia pelo homem em escravidão. Viveu para extinguir qualquer distinção entre homem e mulher, rico e pobre, erudito e iletrado, Brahmanas e Chandalas. Veio para motivar a síntese das civilizações oriental e ocidental. Certamente, por muitos séculos a Índia não produziu um tão grande e tão maravilhoso instrutor de síntese religiosa. A nova revelação da época é a fonte de grande bem para o mundo inteiro, especialmente para a Índia; e o inspirador dessa renovação, Sri Bhagavan Ramakrishna, é a manifestação reformada e remodelada de todos os grandes fazedores de época em religião do passado". Uma vida assim pode ser apresentada e interpretada somente por uma mente totalmente racional, dotada de elevada ordem de percepção intuitiva e de um conhecimento quase enciclopédico do campo espiritual. Sri Ramakrishna Lila-Prasanga, a biografia de Sri Ramakrishna originalmente escrita em bengali, está baseada na observação de primeira mão, na coleta cuidadosa de materiais de fontes diferentes, no exame paciente de evidência devido a um esforço sincero de exatidão auxiliado por uma interpretação lúcida de todos os relevantes e intricados problemas relacionados com teorias e práticas religiosas, podendo ser facilmente classificada como um dos melhores espécimens da literatura hagiográfica. O livro foi publicado, em série, em cinco volumes em bengali. Os primeiros dois volumes (Partes III & IV) contém uma exposição elucidante da maneira de explicar e ilustrar o aspecto de Sri Ramakrishna como Guru (guia espiritual). Seus primeiros dias e suas práticas espirituais vigorosas na juventude estão delineados nos dois volumes seguintes (Partes I & II) respectivamente. A última parte (Parte IV) descreve a manifestação da Divindade na vida e através da vida de Sri Ramakrishna. Infelizmente, o livro estava incompleto. Não cobriu os últimos poucos meses de vida de Sri Ramakrishna. Romain Rolland, contudo, foi perfeitamente justificado ao afirmar, "Embora a obra permaneça incompleta, ela é excelente em seu tema." No que diz respeito ao autor, o erudito francês convincentemente observa que ele "é uma autoridade, tanto quanto filósofo, como historiador. Seus livros são ricos em ensaios metafísicos, que colocam o aparecimento espiritual de Sri Ramakrishna exatamente em seu lugar, na rica procissão do pensamento hindu". Realmente o tratamento magistral do assunto dá um vislumbre da capacidade maravilhosa do autor. Sua larga experiência, sua vasta erudição, seu espírito de pesquisa racional e acima de tudo, suas realizações espirituais de longo alcance, podem ser percebidas até por um leitor casual do livro. O conhecimento de alguns detalhes da vida do autor pode ser interessante e de ajuda para os leitores da presente publicação, pois permitirá que eles apreciem seu valor como relato autêntico e compreensivo de um fenômeno espiritual que marcou época, a sagrada vida de Sri Ramakrishna. Daí o seguinte resumo: O autor foi Swami Saradananda. Antes de ingressar na vida monástica seu nome era Sarat Chandra Chakravarty. Nasceu em dezembro de 1865, de uma abastada família Brahmin que residia no centro de Calcutá. No início de sua vida apresentava sinais evidentes de um santo em preparação. Sereno e bemeducado, por natureza, tinha um físico robusto, um intelecto agudo e um coração altamente compassivo. Facilmente o melhor aluno de sua classe, Sarat Chandra deixou sua marca também na sociedade de debates de sua escola, embora não lhe fosse possível ferir os sentimentos de uma pessoa com uma palavra áspera ou um sarcasmo cáustico. Seu coração amoroso invariavelmente o levava a servir qualquer pessoa doente, fosse ela da família, amigo ou inferior - mesmo se a doença fosse infecciosa. Para coroar tudo, um aspecto notável da estrutura mental de Sarat Chandra era sua inclinação precoce para a religião. Ainda menino demonstrava um desejo instintivo para os ritos religiosos. Sua brincadeira predileta era a adoração mímica. À medida que crescia, essa brincadeira transformou-se gradualmente na busca mais séria de sua vida. Nascido de uma família Brahmin ortodoxa, herdou uma reverência profunda pela religião hindu tradicional. No final dos dias escolares, sua fé estava razoavelmente firmada em bases racionais, ao entrar em contato com a forma sofisticada do hinduísmo através do New Dispensation Movement do Brahmo Samaj. Seu ardor pelo crescimento espiritual recebeu novo estímulo quando, no St. Xavier's College, tomou conhecimento da Bíblia Sagrada e tornou-se inspirado pela vida e ensinamentos de Jesus. Por fim foi durante seus dias de colégio que ele se apoiou num guia espiritual elevado que solucionou todas suas possíveis dúvidas relativas à verdade por trás de todas as
religiões e, devido a seu crescente poder espiritual, o curso da vida de Sarat Chandra transformouse completamente. Seu guia espiritual foi Sri Ramakrishna, então conhecido como o Santo de Dakshineswar, subúrbio ao norte de Calcutá. A notícia sobre uma personalidade espiritual muito elevada, residindo no templo de Kali naquele subúrbio, vinha sendo espalhada há alguns anos entre o público de Calcutá através de vários jornais, particularmente sob os auspícios do Brahmo Samaj. Isso estava atraindo uma corrente de visitantes piedosos, jovens e velhos de Calcutá, para encontrar o santo. Sarat Chandra e seu primo Sashi (futuro Ramakrishnananda) foram apanhados na corrente. Ambos eram então estudantes e estavam na adolescência quando um dia de outubro de 1883, foram prestar reverência ao santo. Sri Ramakrishna, parecia estar esperando por essas almas jovens e piedosas. Logo que as encontrou, saudou-as com alegria e tornou-as íntimas com suas conversas ternas e edificantes. Através de palavras doces e simples, ele imprimia profundamente em suas mentes a necessidade imperiosa de renunciar aos prazeres dos sentidos para realizar Deus. Sentiam instintivamente que em Sri Ramakrishna haviam encontrado um guia de valor no caminho espiritual. Depois dessa primeira visita, Sarat Chandra fez como ponto de honra ir sozinho visitar o santo todas as quintas-feiras, dia feriado em sua escola. A fascinação do incomparável puro e inegoísta amor de Sri Ramakrishna caiu sobre ele e no decorrer dos dias, começou a sentir uma atração irresistível por aquele santo. Com o repetido contato com ele, as idéias de Sarat Chandra a respeito de religião prática tornaram-se cada vez mais claras e ele avançou, passo a passo, no caminho espiritual, segundo a orientação de Sri Ramakrishna. Mesmo no início de sua juventude, as aspirações de Sarat Chandra estavam colocadas muito altas. Ele não buscava sentimentos sem vigor, nem mesmo visões. Deus sob qualquer forma particular, não era sua busca. Queria vê-lo manifestado em todas as criaturas. Embora alertado por Sri Ramakrishna que esta era a realização espiritual final e não podia ser facilmente alcançada, Sarat Chandra disse que nada mais podia satisfazê-lo e que estava determinado a obter aquele estado abençoado, quaisquer que fossem as dificuldades que pudessem surgir no caminho. Evidentemente Sri Ramakrishna ficou satisfeito em encontrar essa qualidade mental prodigiosa do jovem aspirante e sugeriu que ele fizesse amizade com Narendranath (mais tarde Swami Vivekananda), um gigante espiritual em potencial. Um ano após sua primeira visita ao santo, Sarat Chandra veio unir-se a Narendranath pelo elo de íntima amizade. Um dia, em outubro de 1884, ouvindo de Narendranath a respeito de suas experiências místicas maravilhosas com Sri Ramakrishna, a idéia de Sarat Chandra sobre o santo de Dakshineswar mudou radicalmente. Percebeu que Sri Ramakrishna não era simplesmente um santo, mas um personagem espiritual ao nível dos Profetas e Encarnações, sobre os quais havia ouvido falar. Naturalmente depois do incidente acima, o amor e a estima de Sarat Chandra elevou-se à adoração espontânea da Divindade sob a roupagem de um santo. Com fé inquebrantável, submeteu-se ao cuidado amoroso e guia do santo como seu Guru e dedicou-se, de coração e alma, à prática espiritual, até onde os limites de sua casa e a carreira universitária permitiam. Sri Ramakrishna, de sua parte, reconhecendo em Sarat uma alma aspirante da mais elevada ordem, com um brilhante passado, despejou suas graças ilimitadas no jovem discípulo e vitalizou seu gênio espiritual florescente. As coisas correram docemente até o meio de 1885, quando Sri Ramakrishna foi tomado por um sério problema na garganta (câncer) e levado para uma casa alugada na parte norte de Calcutá, para o necessário tratamento. As notícias alarmantes chegaram até Sarat Chandra como um raio. O terrível choque que recebeu, contudo, serviu eventualmente como incentivo para o progresso espiritual. As amarras de sua vida mundana imediatamente pareceram ceder. Com uma preocupação ansiosa pela saúde de seu amado Guru, precipitou-se para a beira de seu leito, negligenciando o lar e despedindo-se do Calcutá Medical College ao qual recentemente havia se filiado. Logo começou a conviver dia e noite com Sri Ramakrishna, seguindo-o quando ele foi removido mais ou menos quatro meses mais tarde para a chácara de Kassipur, subúrbio ao norte de Calcutá. Com espetacular zelo para tratar de doentes, Sarat Chandra manteve-se atendendo o Mestre até seu último momento de vida na terra. A doença de Sri Ramakrishna, durante mais ou menos um ano, provou ser um sinal, por assim dizer, para que seus selecionados jovens discípulos cortassem os laços de suas vidas familiares e juntarem-se numa incipiente fraternidade santa sob seu proeminente líder Narendranath. Vieram obviamente para cuidar de seu querido Guru, mas permaneceram e foram sendo instruídos na vida monástica. Foi na chácara de Kassipur que um dia Sarat
Chandra, com a maioria de seus companheiros, recebeu de Sri Ramakrishna a roupa ocre, a roupa própria de um monge hindu. Foi então que, sob a orientação e encorajamento do Mestre, aprenderam a mendigar a comida como sannyasins, a fim de praticarem completa resignação à Providência, bem como purificarem suas mentes das tendências egoístas profundamente enraizadas. Assim, inspirados por seu Guru com os ideais espirituais mais elevados e introduzidos simbolicamente no monasticismo, esqueceram-se de todas as outras preocupações, exceto o serviço de seu amado Mestre e intensa devoção à prática espiritual. A elevada meta de realizar Deus enraizou-se profundamente em suas mentes. O mundo e seus pungentes chamados não ofereciam qualquer atração e esse estado mental tornou-se mais intenso após a morte do Mestre, em agosto de 1886. Logo após, um mosteiro foi instalado, numa casa alugada em Baranagar, não muito longe da chácara de Kassipur. Ainda que durante certo tempo tenha Sarat Chandra voltado para casa com relutância, logo que o mosteiro começou a funcionar passou a visitá-lo de vez em quando, passando longas horas com seus companheiros, absorvidos em práticas espirituais ou conversas sobre a vida e ensinamentos do Mestre. Suspeitando que o filho mais velho, Sarat, desejava ser recluso e decidido a mudar sua mente em direção à vida mundana com argumentos, o pai de Sarat, Girish Chandra, deu o passo extremo de cortar todos os contatos do filho com seus companheiros discípulos, fechando-o num aposento. Imperturbável, Sarat Chandra aceitou o confinamento solitário inevitável em sua própria casa e utilizou integralmente a solidão, dirigindo a mente a seu objetivo espiritual. Contudo, certo dia, quando um dos seus simpáticos irmãos mais jovens furtivamente destrancou o quarto, Sarat Chandra silenciosamente saiu da casa e foi diretamente para o mosteiro de Baranagar. Depois disso, ele e alguns discípulos irmãos reuniram-se na casa de Baburam (mais tarde Swami Premananda) e ali, inspirados pela exortação de seu líder, Narendranath, durante uma longa noite em volta do fogo sagrado, tomaram o voto de Sannyasa, ou monasticismo, para vida inteira. Passo a passo, sem qualquer alarde, Sarat Chandra avançava no caminho marcado para os monges hindus. Seguiu-se um período de austera vida monástica no mosteiro de Baranagar. Sem prestar qualquer atenção à magra pensão de alimento e de roupa que os precários recursos do mosteiro proviam, esses jovens de classe média, educados, concentraram-se na árdua tarefa de realizar o Divino. Nenhuma outra preocupação podia apresentar-se no caminho de seu esforço, dirigido totalmente à vida espiritual. Meditação, hinos, orações, estudo das escrituras e discussão de tópicos religiosos era tudo o que absorvia a maior parte de seu tempo e de sua energia. Assim os jovens aspirantes espirituais mantinham-se ocupados e não estavam dispostos a descansar enquanto não atingissem seu objetivo. Num auspicioso dia, no mosteiro de Baranagar, fizeram o ritual sagrado conhecido como Viraja Homa, e assim, através de uma cerimônia, juntaramse à tradicional ordem monástica hindu. Embora sua vida monástica tenha virtualmente começado com Sri Ramakrishna, em seus últimos dias, na chácara de Kasipur e tenha sido reforçada por seus votos solenes na casa de Baburam, sob a inspiração de Narendranath, foi a partir desse dia que iniciou nova vida de acordo com os textos religiosos hindus. Eliminando todas as impressões anteriores a respeito de suas castas e posições sociais relacionadas com as famílias em que nasceram, descartaram até seus antigos nomes e títulos. A partir daquele dia, Sarat Chandra passou a ser conhecido como Swami Saradananda. Logo, Saradananda, como a maioria dos ocupantes do mosteiro de Baranagar, foi tomado pela paixão de levar a vida solitária de monge errante (Parivrajaka). Até a companhia de seus irmãos e também, a vida segura, dentro do mosteiro, mexiam com seus nervos, como um grilhão insuportável. Sentia uma necessidade incontrolável de andar de um lugar para outro como alma livre, à procura de seu objetivo espiritual, dependendo somente de Deus para comida e abrigo. As cidades sagradas, as margens de rios e retiros no Himalaia, ricos de associações espirituais acumuladas por santos e sábios, durante centenas de séculos, fizeram um apelo irresistível à sua mente pura. Sua primeira permanência fora do mosteiro de Baranagar foi em Puri, cidade sagrada de Jaganath, à beira-mar. Depois de algum tempo voltou, saindo novamente para passar bastante tempo em vários lugares sagrados ao norte da Índia. De Banaras e Ayodhya prosseguiu até Hrishikesh onde, absorvido em prática espiritual, permaneceu alguns meses levando a vida tradicional dos monges hindus. No verão de 1890 subiu os Himalaias para visitar Kedarnath, Tunganath e Badrinarayan e, em julho, desceu para Almora onde, dentro de um mês, encontrou Swami Vivekananda, com quem foi novamente a Hrishikesh, através do Estado de Garhwal. Então, depois de passar algum tempo em Meerut e Delhi com Swami Vivekananda, desceu para Banaras, visitando pelo caminho, lugares sagrados como Mathura, Vrindavan e Prayag (Allahabad). Depois de um outro período de intensa pratica espiritual na cidade sagrada de Banaras, teve um ataque de
desinteria com sangue, que o trouxe de volta ao mosteiro de Baranagar, em setembro de 1891. Ao recuperar-se foi a Jayrambati para apresentar seus respeitos à consorte espiritual de Sri Ramakrishna conhecida pelos devotos como Santa Mãe. O itinerário de um monge errante como Swami Saradananda pode ser seguido em detalhe e o caminho percorrido por sua mente, acelerada pelas experiências espirituais, não pode ser traçado. Como, quando e por quais estágios seu gênio espiritual desabrochou completamente, não pode ser dito com precisão. Assim, o conteúdo mais interessante e substancial de sua vida permaneceu como um livro selado no coração do sábio. Em 1892, o mosteiro foi transferido de Baranagar para Alambazar, lugar mais perto do templo de Dakshineswar. Por um período razoavelmente longo, antes e depois dessa mudança, a irmandade não teve conhecimento do paradeiro de seu líder, Narendranath, até que ficaram emocionados ao saber que seu irmão errante havia atravessado os mares e explodido na sociedade americana, na véspera, no Parlamento das Religiões em Chicago, como Swami Vivekananda, o Monge Ciclônico da Índia. A partir de março de 1894 esse último manteve-se em contato com os irmãos do mosteiro de Alambazar através de correspondência regular e continuou inspirando-os a sair da reclusão monástica tradicional para inaugurar uma nova Ordem de Monges Hindus, que aceitava o ideal de salvação individual com o serviço da humanidade endeusada. Dois anos depois ele chamou Swami Saradananda para ajudá-lo no seu movimento de Vedanta no Ocidente. Por isso, no dia 1° de abril de 1896, Swami Saradananda chegou a Londres onde mais ou menos um mês mais tarde Swami Vivekananda também chegou pela segunda vez, vindo da América. Depois de fazer alguns discursos em Londres, Swami Saradananda teve que passar pelos Estados Unidos e reunir-se à Vedanta Society que acabava de ser inaugurada por Swami Vivekananda em Nova Iorque. Ali começou um trabalho sólido através de suas interessantes conferências sobre a Vedanta e idéias e ideais dos hindus, bem como aulas edificantes sobre o sistema de Yoga. Fez preciosas contribuições à Conferência de Greenacre de Religiões Comparadas, à Associação Ética de Brooklyn e à elite interessada de Boston e Nova Iorque, apresentando a visão hindu da vida, ao público da América. Suas palestras, saindo do fundo do seu coração, tiveram efeito marcante no público. Além disso, seu comportamento calmo, maneiras dignas e gentis, sua visão católica e seu amor universais, conquistaram-lhe muitos amigos e admiradores ali. Sob seu cuidado vigilante, a Sociedade de Vedanta em Nova Iorque estava sendo colocada numa posição perfeita, quando um chamado de seu líder cortou seu trabalho no Ocidente e o fez partir para a Índia, via Europa, no dia 12 de janeiro de 1898. Swami Vivekananda, o líder, havia regressado à Índia em janeiro de 1897 e no meio de um período febril de difusão de sua mensagem, praticamente em toda a Índia, de Colombo a Almora, havia começado a trabalhar incessantemente para a fundação da Ordem Ramakrishna de Monges e a Missão Ramakrishna. No dia 1° de maio do mesmo ano, inaugurou a Missão Ramakrishna e uma Associação de membros leigos e monásticos para a realização de trabalho espiritual e humanitário. Dentro de um ano após sua chegada, o mosteiro de Alambazar foi transferido temporariamente para a chácara de Nilambar Mukherjee em Belur, onde, bem perto, na margem ocidental do Ganga, foi comprado o terreno para a construção do mosteiro permanente da irmandade. Por essa época foi solicitado o serviço de Swami Saradananda para dirigir a Missão Ramakrishna, como seu secretário e também para o gerenciamento do mosteiro. Swami Saradananda chegou ao mosteiro, na casa acima mencionada, logo em fevereiro de 1898 e assumiu os deveres que lhe haviam sido confiados. No começo do ano seguinte, o mosteiro foi transferido para um lugar permanente, atualmente conhecido como Belur Math. Alguns anos mais tarde, Swami Vivekananda colocou a organização monástica numa base legal estável, executando um Edito de Confiança e incorporando nessa organização as idéias, os ideais e as atividades para os quais a Associação da Missão Ramakrishna havia sido criada. Nesse novo cenário, Swami Saradananda também foi escolhido pelo líder, para atuar como Secretário. Pode-se mencionar que mais tarde, por considerações práticas, o Ramakrishna Math e a Missão foram separadas em duas organizações paralelas, o Swami continuou a dirigir ambos como Secretário. Com a dedicação de um seguidor fiel, Swami Saradananda continuou no posto até o final de sua vida, considerando-o um encargo sagrado, a ele confiado por Swami Vivekananda. Contudo, Swami Saradananda, com a experiência recente dos métodos ocidentais de organização, logo colocou os negócios internos do mosteiro em perfeita ordem. Sob seu cuidado e guia, uma rotina de vida dividida entre prática espiritual, estudo das escrituras e obrigações domésticas foi mantida com absoluta regularidade dentro do mosteiro. Além disso, com o
conhecimento das necessidades e temperamentos ocidentais, aplicou-se com dedicação a treinar pregadores para o Ocidente entre os monges merecedores desse encargo. Além de tudo, tinha que atender a um grande número de obrigações ocasionais, a chamado do líder. Depois de alguns meses de sua chegada da América, tomou parte ativa na conclusão do trabalho da Ramakrishna Mission em Calcutá, de socorro às vítimas das pragas; muitos meses depois atuou como guia para alguns discípulos ocidentais de Swami Vivekananda em sua viagem por numerosos lugares históricos da Índia. No ano seguinte, imediatamente depois que o mosteiro havia sido mudado para seu local permanente, teve que coletar fundos para Belur Math, durante uma viagem de conferências através dos importantes estados de Rajasthan e Sourashtra, a noroeste da Índia. Voltando para Belur Math, pouco antes de Swami Vivekananda partir para sua segunda visita ao Ocidente, dedicou-se, com o zelo habitual, às obrigações normais dentro do mosteiro. No final daquele ano, visitou algumas cidades importantes de Bengala Oriental e levantou o fervor espiritual das pessoas interessadas com conversas e instruções inspiradoras. Swami Vivekananda voltou de sua segunda viagem ao Ocidente no final de 1900; colocou em execução o Acordo de Confiabilidade de Belur Math em janeiro de 1901 e faleceu em julho de 1902, deixando o Ramakrishna Math e Missão aos cuidados de Swami Brahmananda e Swami Saradananda que ocupavam os postos chaves de Presidente e Secretário, respectivamente. Apesar do duro choque com a separação de seu amado e querido líder, Swami Saradananda continuou arcando com a responsabilidade onerosa da administração, dia a dia, do Math e da Missão, sob a direção inspiradora do Presidente, Swami Brahmananda, filho espiritual de Sri Ramakrishna. Logo Swami Saradananda tomou para si a tarefa adicional de administrar e editar a revista mensal, Udbodhan, que havia começado aproximadamente três meses antes, sob a direção de Swami Vivekananda e estava sendo habilmente conduzida por um de seus brilhantes companheiros, Swami Trigunatitananda. Como esse último tinha que deixar a Índia para reunir-se a um dos centros de pregação da Missão nos Estados Unidos, a revista estava a ponto de fechar por falta de um organizador capaz, quando Swami Saradananda entrou. Sob seu cuidado eficiente e perseverante, a Udbodhan continuou ganhando popularidade, como havia sido desejado pelo líder que havia partido e sua condição financeira levantou-se gradualmente. Depois de diversos anos de luta intensa e trabalho duro, tornou-se possível para o Swami mudar o escritório da Udbodhan para uma casa permanente de sua propriedade. Foi para encontrar uma residência permanente em Calcutá para a Santa Mãe que fez o Swami sentir a necessidade de construir um prédio o mais rápido possível, mesmo incorrendo num empréstimo de sua própria responsabilidade. O andar superior foi reservado para residência dela quando de sua permanência em Calcutá para abençoar os monges e noviços da Ordem de Ramakrishna, bem como centenas de devotos de todas as partes. Ela agraciou a casa com a primeira visita em 23 de maio de 1909. Naturalmente o objetivo adicional da casa era instalar o escritório da Udbodhan que rapidamente se desenvolvia com a tarefa de publicar principalmente livros bengalis ligados ao que é conhecido como literatura Ramakrishna-Vivekananda. O andar térreo foi reservado para essa finalidade. Por isso até hoje a casa é conhecida pelos devotos como a casa da Mãe e para o público em geral como Escritório do Udbodhan. Contudo foi para pagar o empréstimo que Swami Saradananda teve a idéia de escrever e publicar uma biografia autêntica de Sri Ramakrishna. Com supremo entusiasmo dedicou-se a terminar o trabalho, carregando o tempo todo o fardo de dirigir os negócios do Ramakrishna Math e Missão. Vigorosamente aplicou-se a coletar todos os dados e examiná-los cuidadosamente. Com cuidado escrupuloso a fim de trazer à luz a descrição correta da vida do Mestre tanto quanto possível, confiando somente em evidências indubitáveis. Dia a dia, ano após ano, o Swami permanecia absorvido nesse trabalho, diante de uma pequena escrivaninha num quarto pequeno, embora distraído de vez em quando pelos visitantes ou pelos trabalhos prementes relacionados com o Math e a Missão. Essa foi a gênese da brilhante produção bengali, Sri Ramakrishna LilaPraSanga, que foi publicada primeiro em série, como artigos, na Udbohan, desde 1909 depois, em cinco volumes, entre os anos de 1911 e 1918. Em 1909 a Ramakrishna Mission foi organizada como um corpo separado, para exercer atividades filantrópicas e educacionais para todas as camadas da população, independente de casta, credo e cor. Filiais da Ramakrishna Mission, bem como do Ramakrishna Math foram abertas uma após outra, em diferentes partes de Índia e em alguns países estrangeiros e elas continuaram multiplicando-se à medida que os anos se passavam. Além disso trabalhos ocasionais de socorro durante calamidades devidas a enchentes, fome, terremotos ou epidemias
nesse país tinham que ser organizados e dirigidos de tempos em tempos. Naturalmente a tarefa de conduzir tudo, como Secretário tanto do Math como da Missão, tornou-se cada vez mais dura à medida que os anos se passavam, mas Swami Saradananda era sempre o mesmo em todas as ocasiões. Com sua calma habitual, silenciosamente e sem ostentação dirigia os negócios, encontrando às vezes situações embaraçosas e resolvendo muitos problemas complicados que surgiam. Foi por seu manejo ousado e sagaz que alguns pretensos políticos aspirando a vida espiritual, puderam juntar-se à Ordem Ramakrishna e colocar-se em serviço valioso sem serem molestados pelo Governo. Quando as autoridades políticas olhavam com desconfiança até para organizações de serviço, foi através de seus esforços, que a Missão Ramakrishna pode levar avante suas atividades livres de qualquer medida governamental. Por trás das intensas e variadas atividades do Swami Saradananda, pode-se perceber as feições supernormais de sua vida interior. É através das respostas ao mundo exterior de um vidente, que se pode possivelmente ter uma chave para a fonte de sua inspiração e energia. Os incidentes seguintes da vida de Swami Saradananda obviamente dão essa chave. No final de 1898, quando viajava numa carroça de Rawalpindi para Srinagar, no Kashmir, para se encontrar com Swami Vivekananda e sua comitiva, deu prova convincente de sua maravilhosa equanimidade diante de uma situação perigosa. Aconteceu que de súbito, o cavalo assustou-se e precipitou-se, desgovernado, com o veículo numa velocidade perigosa. Felizmente sua corrida maluca foi detida, no lado íngreme da colina, por uma grande árvore, quando Swami Saradananda calmamente saiu da carruagem. Naquele mesmo momento uma pesada pedra rolou de cima e poupando sua pessoa por algumas polegadas, caiu sobre o cavalo, matando-o imediatamente. Absolutamente calmo durante o incidente que muito poderia ter-lhe custado a vida, o Swami permaneceu uma testemunha desinteressada de toda a cena como um verdadeiro Sthiprajna, aquele cuja consciência está fixa no Ser Supremo. A extraordinária serenidade de uma alma liberada diante de uma situação perigosa foi também demonstrada através de outros incidentes emocionantes de sua vida. Durante sua viagem a Londres em 1896, quando o navio foi surpreendido por um ciclone, no Mediterrâneo, o Swami permaneceu imóvel, observando imparcialmente a corrida das pessoas em pânico e gritos desesperados, à sua volta. Noutra ocasião, mais tarde em sua vida, enquanto atravessava o Ganga num barco que estava prestes a soçobrar devido à violenta tempestade, o Swami permaneceu imperturbável, como se nada sério houvesse em sua volta. Sua atitude absolutamente despreocupada chegou ao ponto de fazer com que seu companheiro em pânico tivesse um gesto rude. O comportamento do companheiro apavorado provocou um sorriso cordial do Swami. Outro incidente, de natureza diferente, tem um significado peculiar recordando uma das visões de Sri Ramakrishna a respeito da vida anterior do Swami Saradananda como companheiro (apóstolo) de Jesus. Em sua viagem para a Índia, quando visitava a Catedral de São Pedro em Roma, sua mente de repente foi puxada para um plano superconsciente e ele entrou em profundo transe místico (Samadhi). O que realmente viu e sentiu naquele momento, permaneceu um segredo de sua vida, hermeticamente guardado. Pode-se supor, razoavelmente, que a Catedral sagrada associada à memória santa dos apóstolos de Jesus tenha despertado uma lembrança vívida de sua vida anterior, como foi visualizada pelo Mestre e afogou durante aquele momento a consciência de sua imediata circunvizinhança. A sublimidade espiritual de Swami Saradananda através desses incidentes significativos em sua vida, foi constatada por alusões feitas por ele em algumas ocasiões raras. Nas páginas de seu diário pessoal encontramos repetida menção à sua comunhão direta com a Mãe Divina. Também a admissão explícita seguinte, ao dedicar seu iluminado livro em bengali Bharater Shakti-Puja (Culto da Mãe Divina na Índia) pode ser citada como um exemplo nesse sentido: "O livro é dedicado com grande devoção àqueles por cuja graça o autor foi abençoado com a realização da Mãe Divina em cada mulher na terra." Isso mostra a que alturas da experiência espiritual sua mente foi elevada. Realmente essa realização é a verdadeira meta do Culto da Mãe (Tantrika Sadhana). Incidentalmente, pode-se mencionar que o Swami Saradananda sofreu a influência desse tipo de prática espiritual mais ou menos dois anos após sua volta do ocidente. Mais tarde em sua vida, em resposta às constantes e sinceras perguntas de um atendente monástico, relativas à realização espiritual de Swami Saradananda uma significante frase desapercebida dos lábios fechados do Swami: "Nada além de minha experiência espiritual foi relatada no livro, Sri Ramakrishna Lila-Prasanga." E esse livro está repleto de realizações espirituais de vários tipos, inclusive o mais elevado da unidade transcendental no Nirvikalpa Samadhi. Essa frase representa a essência de sua vida interior como a de uma alma liberada um vidente das verdades últimas da vida e da existência.
Contudo, além e acima de todas as atividades de Swami Saradananda ligadas ao Math e à Missão, bem como à composição e publicação da biografia do Mestre, sua primeira preocupação parecia ser o conforto, bem-estar e saúde da Santa Mãe. Ele a considerava a Mãe Divina encarnada e colocou-se completamente a seu serviço. Quer ela estivesse em sua casa de campo em Jayrambati ou na cidade, o Swami era todo atenção para com ela. A casa de Calcutá foi construída, como vimos, principalmente para facilitar sua estadia confortável na cidade. E para concretizar isso o mais rápido possível, ele não se importou de endividar-se; nem se preocupou em empreender um trabalho extenuante durante nove anos, de uma só tirada, na produção e na publicação de Sri Ramakrishna Lila-Prasanga a fim de saldar aquele débito. Realmente sua devoção à Santa Mãe não pode ser sondada. Sentado numa pequena sala no andar térreo da casa de Calcutá, era encontrado controlando a torrente de visitantes exatamente como um porteiro. Às vezes de brincadeira, apresentava-se aos estranhos como o porteiro da Mãe. Pode-se saber desse fato, que era uma glória e privilégio servir a Santa Mãe mesmo daquela maneira. Em toda sua última permanência na casa de Calcutá durante sua doença fatal em 1920, com que cuidado ansioso o Swami entrava em detalhes minuciosos relativos a seu tratamento médico e enfermagem, não poupando cuidados, mesmo que em vão, para que ela se recuperasse. Três anos mais tarde, em abril de 1923, o Swami teve a satisfação de perpetuar a sagrada memória da Santa Mãe, construindo um templo dedicado a ela em sua terra natal, Jayrambati. Durante a cerimônia de consagração, o estado benigno da Santa Mãe pareceu tomar conta da mente do Swami que agia da mesma forma que ela, agraciando com iniciação espiritual todos os tipos de pessoas que dele se aproximavam naquela ocasião. Podia-se sentir o fervor espiritual que irradiava do Swami nos dias festivos relacionados com a cerimônia. A consagração do Templo da Santa Mãe foi talvez a última oblação oferecida pelo Swami Saradananda, a fim de completar sua obra em vida, que foi um longo rito contínuo de sacrifícios. Depois da saída sucessiva de alguns fundadores da irmandade, a morte da Santa Mãe em 1920, seguida dois anos depois por Swami Brahmananda, o primeiro Abade e guia da Ordem, chocaram até o impassível Swami. Essas perdas pareciam arrefecer o gosto do Swami para o trabalho. Foi por essa razão que, depois de ver a construção e consagração do templo da Santa Mãe, o Swami praticamente desapegou-se do trabalho ativo e continuou a passar longas horas em meditação. Desistiu de escrever e nunca mais teve ânimo para terminar sua magnum opus, Sri Ramakrishna Lila-Prasanga. A única coisa que o preocupava naquele momento era injetar nos membros jovens da Ordem, a fé inquebrantável nas idéias e ideais deixados pelo seu fundador, Swami Vivekananda e também, treinar um grupo de jovens monges para dividir o fardo da direção da organização que ele vinha carregando nos seus próprios ombros. Com esse objetivo, em 1926, convocou uma Convenção de representantes de todos os Maths e centros de Missão e no discurso inaugural avaliou diante deles o crescimento do movimento Ramakrishna que caminhava nessa época a toda velocidade, prevenindo-os contra possíveis ciladas no caminho e exortando-os enfaticamente a se manterem firmes aos ideais, de maneira que pudessem andar para frente, vencendo os obstáculos do caminho. Na abertura da Convenção o Swami estabeleceu uma Comissão de Trabalhos para pôr o Secretário do Math e da Missão a par de praticamente todos os problemas administrativos. Como os velhos remanescentes estavam a ponto de sair de cena, o contexto das coisas indicava que um vigoroso grupo de jovens monges deveria ser treinado para substituí-los. Esse projeto da Comissão de Trabalhos inaugurada por Swami Saradananda servia não somente ao propósito daquele momento, mas também provou ser um elo administrativo permanente e útil do Math e da Missão. Assim, entusiasmando os jovens membros da Ordem ao manter bem alto as idéias e ideais pelos quais deveriam lutar e criando meios e maneiras para colocá-los em prática por gerações sucessivas, Swami Saradananda complacentemente entregou o cargo a ele confiado há três décadas por seu amado líder Swami Vivekananda e placidamente entrou em Mahasamadhi no dia 19 de agosto de 1927. Uma alma iluminada, completamente livre de todos os tipos de grilhões, não é limitada por nenhum código prescrito de vida. Até a idéia de dever deixa de ter qualquer significado para quem viu através do universo e realizou a Unidade que tudo penetra, como sua essência. Contudo, essa alma liberada, quando comissionada pela Vontade Divina para trabalhar pela elevação da humanidade, mostra traços de caráter adequados ao papel que vai desempenhar. O papel de Swami Saradananda foi o de demonstrar, por sua vida, qual o modelo ideal de Karmayogi. Com perfeito desapego e autocontrole, continuou escrupulosamente cumprindo os deveres que se apresentaram, dando a mesma atenção tanto aos menores como aos maiores. Nem desagrado, nem favor, nem
quaisquer dificuldades desviaram-no de seu caminho reto e estrito. Realmente apresentou-se como modelo de trabalhador ideal, como desejado por Swami Vivekananda. Sua mente racional, seu coração compassivo, sua mente pura e perfeitamente equilibrada, sua energia indomável e sua rara habilidade para organizar, combinaram-se para erigir um tal modelo. "Paciência infinita e perseverança infinita", como Swami Vivekananda queria ver, estavam em seu sangue. Vivekananda comentou, "O sangue de Sarat é frio como o de um peixe, nada pode inflamá-lo". Seu coração era "profundo como o oceano, amplo como o céu infinito", como Swami Vivekananda o teria. Swami Saradananda via divindade potencial mesmo no pior pecador e tentava, até o fim, trabalhá-lo com amor profundo e simpatia. Pessoas más e rebeldes, abandonadas por seus companheiros, encontravam refúgio sob seu cuidado complacente e naturalmente reuniam-se à sua volta. Na verdade ele era uma ilustração viva da veracidade da afirmação de Swami Vivekananda, "O homem de renúncia vê a todos com equanimidade e dedica-se ao serviço de todos." Sem qualquer ar de superioridade, tratava todos da mesma maneira. Jamais importou-se com o bem-estar e conforto pessoais. Dificilmente aceitava qualquer serviço, mesmo de seus próprios discípulos, mas estava sempre pronto a enfrentar qualquer dificuldade, ou até arriscar a vida para ajudar os outros em perigo. Ao atravessar uma ravina nos Himalaias a caminho do templo de Badrimarayan, deu sua bengala para um dos peregrinos, uma velha senhora, desconhecida, sem pensar sequer um momento que risco seria para ele passar o lado íngreme da colina sem qualquer vara como apoio. Era encontrado à beira do leito de pacientes sofrendo de doenças contagiosas fatais, com quem parentes não ousavam ter contato. Suas palavras de consolo deram alívio a muitas pessoas que sofriam de agonias mentais. A marca distintiva de sua personalidade estava estampada em sua conduta geral. Era o exemplo objetivo de boas maneiras. Mesmo aqueles meticulosos em etiqueta eram conquistados por suas maneiras cativantes. A paciência que usualmente demonstrava enquanto ouvia e respondia, até mesmo a perguntas tolas de jovens, era certamente maravilhosa. Sua voz doce e calma muitas vezes tirava a força de qualquer palavra rude que poderia ter proferido a fim de repreender um ofensor. Soava como a reprimenda de mãe para o filho que errou. Contudo sua voz maternal era contrabalançada por uma seriedade reverente e estas, efetivamente combinadas, produziam o efeito desejado na consciência do culpado. Swami Saradananda foi um exemplo de trabalho metódico, lento, firme e regular em seus movimentos, olhava para uma coisa com muita atenção quando ela merecia. Qualquer empreendimento, grande ou pequeno era, para sua mente ampla, igualmente sagrado, como se fosse um ato de adoração. Sempre frio em seu julgamento, raramente era visto precipitandose em tomar qualquer decisão se tivesse elementos suficientes ou não confiáveis. Era perfeitamente racional, atencioso e psicológico em seus métodos, quando se tratava dos homens e de seus negócios. Finalmente, o amor pela ordem era uma virtude inata nele. Embora bastante simples em suas necessidades, verificava escrupulosamente que tudo à sua volta fosse mantido limpo e arrumado. Possivelmente esse traço foi reforçado pelo exemplo de seu Mestre. Sri Ramakrishna, que havia sido inigualável em simplicidade com ordem. Do resumo acima pode-se ter idéia do papel que o autor de Sri Ramakrishna LilaPrasanga, Swami Saradananda teve como um dos principais organizadores do Ramakrishna Math e Missão. Sempre permanecerá como modelo perfeito para ser imitado por todos os que têm como objetivo de vida a salvação pessoal e o bem-estar do mundo. Swami Nirvedananda
SRI RAMAKRISHNA O GRANDE MESTRE PARTE I BALYABHAVA OU CENÁRIO DE FUNDO E A PRIMEIRA PARTE DA VIDA
PREFACIO PELO AUTOR Pela graça de Deus, a primeira parte do Sri Ramakrishna, o Grande Mestre, foi agora publicada. Contém uma exposição detalhada dos primeiros anos da vida de Sri Ramakrishna e o objetivo de sua vinda. Foi aqui feita uma tentativa para apresentar ao leitor um imagem mental que formamos ao ouvir de várias pessoas muitos incidentes relatados, da vida do Mestre naquela época. Embora pessoas como Hridayram Mukhopadhyaya, Ramlal Chattopadhyaya e outros deram a ajuda que podiam, ao acertar as datas corretas de certos eventos, contudo ainda persistem dúvidas sobre alguns pontos. Não puderam dar os horóscopos do pai, mãe, irmão mais velho e outros parentes próximos de Sri Ramakrishna; mas deram, em lugar disso, certas datas aproximadas de eventos ligados à vida do Mestre, dizendo por exemplo: "Por ocasião do nascimento de Sri Ramakrishna, seu pai tinha sessenta e um ou sessenta e dois anos.", "Ramkumar, seu irmão primogênito era mais velho aproximadamente trinta e um ou trinta e dois anos", e assim por diante. Contudo o leitor ficará convencido, ao ler o Capítulo V desta parte, "Nasce uma Grande Alma", que não há dúvida quanto à data de nascimento de Sri Ramakrishna como foi relatada aqui. Ficamos assegurados a esse respeito e a muitos outros acontecimentos deste livro, pelas próprias palavras do Mestre, algumas das quais foram ouvidas pelo autor. É ao Mestre, portanto, que devemos nos ligar a respeito desta informação. Quando no início nos dispusemos a descrever certos períodos de sua vida, parecia-nos impossível narrar os acontecimentos de sua infância e juventude de um modo tão detalhado e interligado. Compreendemos, portanto, que é pela graça de Deus, que "faz o mudo eloqüente e o aleijado capaz de subir uma montanha", que isso se tornou possível e inclinamo-nos ante Ele repetidamente. Pode também ser dito, para concluir, que se o leitor, depois de terminar essa parte do livro, percorrer as outras partes, a saber, "Como Aspirante Espiritual" e "Como Instrutor Espiritual" (I e II), encontrará a história da vida do Mestre relatada cronologicamente desde a data de seu nascimento até o ano de 1881 1. (1 Mais tarde um outro volume, “O Mestre em Estado Divino e NarendraNath” foi acrescentado para completar sua Vida até 1886.)
I N T R O D U Ç Ã O ASSUNTOS: 1. A espiritualidade é o centro da vida na Índia. 2. Nascimento de grandes almas é a sua causa. 3. A religião da Índia está fundamentada na realização. 4. Desenvolvimento da idéia de Encarnação Divina. 5. O Deus Pessoal durante a era de devoção. 6. A adoração do instrutor espiritual (Guru). 7. A doutrina de Deus Encarnado está fundamentada nos Vedas e na experiência de Samadhi. 8. A compaixão de Deus e a idéia de Deus Encarnado. 9. Os Sastras sobre a natureza divina das Encarnações . 10. Memória contínua da Encarnação . 11. As Encarnações dão uma nova feição à religião. 12. Quando as Encarnações vêm? 13. O advento das Encarnações na era moderna.
1. Ao fazermos o estudo comparativo dos ideais e das tradições espirituais da Índia nos assuntos espirituais com aqueles dos outros países do mundo, notamos grande diferença entre eles. Desde os tempos remotos, a Índia aceitou as entidades espirituais além dos sentidos, como Deus, alma, o próximo mundo, como reais, cuja existência poderia ser realizada e verificada mesmo aqui em nossa vida terrena e tem como conseqüência, formulado meios de vida para o homem, tanto individual como coletivo, que conduzem à conquista desse objetivo. A vida do país tem sido, portanto, caracterizada por intensa espiritualidade através dos tempos. 2. Ao pesquisarmos a causa desse interesse absorvente da mente indiana em assuntos
espirituais, encontramos que foi devido ao nascimento freqüente, neste país, de seres divinos possuidores do conhecimento direto dessas entidades espirituais. Devido às freqüentes oportunidades de testemunhar a vida e as experiências desses personagens e fazer um estudo sistemático, desenvolveu-se na mente indiana profundo interesse e fé nas experiências espirituais além dos sentidos, das visões e das manifestações de poder espiritual. A vida nacional da Índia foi assim estabelecida desde tempos imemoriais, no sólido fundamento da espiritualidade. Mantendo seus olhos firmemente fixos nesses ideais espirituais, este país desenvolveu uma sociedade baseada no conjunto de costumes e práticas especiais, que permitiram a seus membros atingirem o objetivo de realização de Deus de maneira muito natural, através da execução de seus deveres diários, de acordo com seus gostos e qualificações próprias. Como essas regras e esses regulamentos vêm sendo seguidos, de geração em geração, os ideais espirituais da Índia permaneceram vivos e vigorosos. Como conseqüência, homens e mulheres, mesmo hoje em dia têm forte convicção que, com a ajuda de austeridade, autocontrole e intensa aspiração, todos poderão ter a experiência direta de Deus, a fonte deste mundo mutável e obter a união com Ele. 3. Que a religião da Índia está fundamentada na visão de Deus torna-se claro ao refletirmos no significado das palavras e expressões como Rishi (vidente), Apta (aquele que atingiu o objetivo da vida), Adhikarika (aquele que possui autoridade), Prakritilina Purusha (uma pessoa mergulhada na causa do universo) etc. Esses nomes vêm sendo empregados desde os tempos védicos para descrever os instrutores que chegaram para restabelecer a religião. Está além de qualquer dúvida que tais homens foram designados por esses nomes, porque haviam dado prova de seus poderes únicos, conquistados como resultado do conhecimento direto da realidade além dos sentidos. Esta afirmação vale no caso de cada um deles, desde os Rishis do período védico até às divinas Encarnações da Época Purânica (Épica). 4. É evidente que certos Rishis do Período Védico vieram a ser reconhecidos, no Período Purânico, como Encarnações. No Período Védico compreendeu-se que certas pessoas tinham o poder de perceber a realidade além dos sentidos, mas o fato que a intensidade desse poder tinha variações nos indivíduos não era reconhecida. As pessoas contentavam-se em chamá-los "Rishis" como uma classe. No decorrer do tempo, entretanto, com o crescimento de um pensamento mais refinado e percepção interior filosófica, compreenderam que nem todos os Rishis eram dotados do mesmo grau de poder ou capacidade de iluminação espiritual. Assim, alguns deles brilhavam como o sol, alguns como a lua. Alguns, também, como estrelas brilhantes e outros como vagalumes comuns. Então os filósofos começaram a classificar os Rishis de acordo com a capacidade de espiritualidade que revelavam. Assim, na Idade Filosófica, alguns Rishis vieram a ser conhecidos como Adhikarika-Purushas (pessoas de autoridade especial). Até Kapila, o fundador da filosofia Samkhya, que era cético em relação à existência de Deus, teve de aceitar a existência desses Rishis, porque não podia duvidar do que realmente via. Em seu sistema de filosofia esses Adhikarika-Purushas foram incluídos na classe dos seres emancipados, conhecidos como "mergulhados em Prakriti". Procurando a causa do advento dessas pessoas singularmente poderosas, os filósofos Samkhya chegaram à conclusão de que, dotadas de boas qualidades, tais como pureza, autocontrole etc., elas haviam adquirido conhecimento infinito, mas que um desejo ardente de fazer bem às pessoas as havia impedido, durante certo tempo, de mergulharem na natureza verdadeira do Ser de glória infinita. Identificadas na toda-poderosa Prakriti, vieram a considerar-se dotadas desses poderes e tornaram-se os centros de sua manifestação. Possuindo assim poderes especiais, fizeram bem aos homens de um número infinito de maneiras, durante um ciclo e por fim tornaram-se completamente identificadas com o Ser. 5. Os instrutores Samkhya haviam também dividido as "pessoas mergulhadas em Prakriti", de acordo com a diferença de seus poderes, em duas classes: "Kalpaniyamaka Isvara" (ou regulador de um ciclo) e "Isvarakotis" (ou satélites do primeiro.) Depois da Idade Filosófica veio o período em que o amor pelo divino foi desenvolvido de maneira especial. Nesse período, pela influência dominadora da Vedanta veio a se crer em Isvara, uma Pessoa que tudo penetra, o agregado de todos os seres. Adquiriram, também, intensa fé de que o Conhecimento e o Yoga poderiam atingir o grau mais elevado pela meditação n'Ele, com devoção integral. Depois vieram a crer que o Isvara, descrito no sistema Samkhya como regulador de um ciclo, era uma manifestação, ou parcial ou completa do Isvara Pessoal que tudo penetra, que é por natureza eternamente puro, eternamente desperto e eternamente livre. Assim a crença na doutrina de Deus Encarnado surgiu na Idade Purânica e aqueles Rishis da Idade Védica, que possuíam qualidades únicas e extraordinárias, começaram a ser conhecidos como Encarnações. Foi o advento de seres dotados de tais qualidades que fizeram as pessoas gradualmente acreditar na existência das Encarnações. Baseado nas visões e experiências além dos sentidos dessas pessoas, o
edifício inabalável da religião gradualmente elevou-se como os Himalaias cobertos de neve, para atingir o céu. Porque essas pessoas haviam alcançado o objetivo mais elevado da vida, foram também, chamados "Aptas" e suas palavras, expressando o conhecimento mais elevado, vieram a ser conhecidas como Vedas. 6. Outra razão para aceitar certos Rishis como Encarnações, foi a prática de adorar o instrutor espiritual (Guru). Na Índia, desde a época dos Vedas e dos Upanishads, homens e mulheres adoravam o instrutor, o doador de conhecimento espiritual, com grande reverência. Essa adoração, combinada com meditação, convenceu-os, ao longo do tempo, que ninguém poderia ocupar a posição de instrutor espiritual até que o poder divino, além dos sentidos, se manifestasse nele. A princípio consideraram e adoraram o Guru como pertencente a uma classe diferente e mais elevada da humanidade, porque achavam que, em contraste com o egoísmo das pessoas comuns, o instrutor verdadeiro faz bem às pessoas por pura compaixão e sem qualquer motivo egoísta. Mais tarde, pela fé, reverência e devoção, perceberam diretamente no Guru a manifestação do poder divino e isto convenceu-os cada vez mais de seus atributos divinos. Oraram ao misericordioso Senhor para isso, implorando-Lhe "protegê-los com Sua face compassiva" (Rudra yat te dakshinam mukham, tena mam pani nityarn)1 (1 Svetavatara Upanishad 4.21 ) sua oração foi por fim atendida. A compaixão do Senhor revelou-se diante deles na pessoa do Guru. 7. Quando os homens tiverem avançado tanto na adoração do Guru, não leva muito tempo para que se identifiquem com ele - através de quem a Lila (jogo) especial do poder divino se tem manifestado - com a doação do Conhecimento e do aspecto benigno do Senhor. Parece assim, que a adoração contínua do Guru fortaleceu a idéia do Deus encarnado. Como já foi mencionado, a doutrina da encarnação, na realidade, data da Época Purânica, mas a idéia propriamente originou-se na Idade Védica. As experiências variadas dos atributos, funções e natureza do Isvara, na época dos Vedas, dos Upanishads e Darsanas (sistemas filosóficos) parecem ter gradualmente assumido a forma mais definida e então, deram crescimento à crença na doutrina de Deus Encarnado. Pode ser também que, na era dos Upanishads, os Rishis, descendo pelo processo oposto, do estado de Samadhi, que eles haviam atingido pelo caminho de "Isto não", "Isto não", com autocontrole, austeridades etc., realizaram que o universo inteiro era em verdade, a manifestação de Brahman não-qualificado (Nirguna). Foi somente então talvez, que eles atingiram devoção ao Brahman que tudo penetra com atributos (Saguna), chamado Isvara, e começaram a adorá-Lo. Tendo assim obtido uma idéia clara das qualidades, atos, natureza etc., de Isvara, eles puderam ser convencidos da possibilidade d'Ele ser manifestado de maneira especial. 8. Foi na Idade Purânica, portanto, que a crença na existência das Encarnações desenvolveu-se de forma especial. Apesar dos vários defeitos no desenvolvimento da espiritualidade naquela era, a fé na glória de Deus encarnado tornou-se realmente grande. Essa crença na existência da Encarnação também possibilitou aos homens a compreenderem o jogo eterno do Saguna Brahman. Como conseqüência realizaram que Deus, a causa do universo, era seu único guia no mundo espiritual e estavam convencidos de que a infinita compaixão do Senhor nunca permitiria que eles fossem condenados, por mais réprobos que pudessem ser, mas que Ele tomaria, em qualquer época, a forma de uma Encarnação, descobriria novos caminhos adequados à natureza do homem e tornaria fácil para ele a Auto-Realização. 9. Não está fora de propósito dar aqui um breve resumo das idéias essenciais relatadas nos Smritis e nos Puranas sobre nascimento, atos etc. da Encarnação Divina que é, por natureza, eternamente puro, desperto e livre. Ao contrário do Jiva (ser mortal), a Encarnação jamais fica emaranhada ou presa por ações, pois, estabelecida na felicidade do Atman desde seu nascimento, nenhuma idéia egoísta de prazer mundano aparece em sua mente, como ocorre com o Jiva. Sua vida inteira é dedicada ao bem dos outros. Sendo sempre livre das malhas de Maya, retém a recordação de suas vidas anteriores. 10. Pode-se perguntar: Será que ele tem esta recordação contínua desde a infância? Os Puranas respondem: Embora latente nele, nem sempre se manifesta em sua infância, mas logo que o corpo e a mente amadurecem, torna-se consciente dela com pouco ou nenhum esforço. Isto se aplica a todas as ações. Desde que toma um corpo humano deve comportar-se em todos os aspectos como ser humano. 11. À medida que o corpo e a mente da Encarnação desenvolvem-se completamente, é-lhe revelado o objetivo de sua vida. Compreende então, que o único propósito de sua vinda é restabelecer a religião e quaisquer ajudas para atingir esse propósito vêm-lhe por si mesmas de forma inexplicável. Anda na luz onde outros tateiam na escuridão. Ela mesma, sem temor, atinge seu objetivo e acena aos homens para seguirem seus passos. Caminhos não trilhados conduzindo à realização de Brahman, além de Maya e de Isvara, a causa do universo, são descobertos por Ela, de
época em época, repetidas vezes. 12. Os autores dos Puranas não limitaram o estudo das Encarnações a uma mera análise de Suas ações e características; chegaram, também, a conclusões definitivas, com respeito à época de Sua vinda ao mundo. É o veredicto da história, que ao longo do tempo o Sanatana Dharma (Religião Eterna) tem tendência a periodicamente, decair e declinar. Em tais ocasiões os homens, iludidos pelo poder inescrutável de Maya, começam a considerar o mundo e seus prazeres como o que mais importa. Verdades eternas como o Ser, Isvara, liberação etc., são consideradas imaginação utópica de sonhadores e poetas de uma época passada, mergulhados na ilusão e na obscuridade. Mas quando afinal, os homens descobrem que nenhuma riqueza ou nenhum prazer mundano obtidos por meios honestos ou ilícitos podem encher o vazio de seus corações e, quando as ondas de um mar escuro de desespero, sem praia, caem sobre eles, gritam por liberdade, na angústia de seus corações. É então que por Sua inata compaixão pela frágil humanidade, Deus encarnaSe e liberta das incrustações acumuladas durante épocas, a Religião Eterna, restaurando-A a seu estado de pureza luminosa como a lua libertada da boca de Rahu2 (2 Um demônio na Mitologia hindu que causa o eclipse engolindo o Sol ou a Lua. ) depois de um eclipse. O homem é então trazido de volta ao caminho do Dharma pelo poder divino. Todo acontecimento nesse mundo tem uma causa e de acordo com essa lei, o Senhor também toma um corpo em Sua Lua somente quando existe uma necessidade universal. Só quando essa necessidade torna-se totalmente sentida em cada parcela da sociedade, é que a misericórdia infinita do Senhor se cristaliza por assim dizer e Ele aparece como instrutor espiritual do mundo. É esta a conclusão a que os autores dos Puranas chegaram depois de testemunharem os repetidos aparecimentos das Encarnações. 13. É a necessidade da época, portanto, que invoca uma Encarnação de Deus, o instrutor do mundo que tudo conhece, aquela que faz jorrar nova luz sobre a religião. A Índia, que sempre foi o berço da religião e da espiritualidade, tornou-se santa e santificada pelas marcas das Encarnações, muitas e muitas vezes, através dos tempos. Encarnações, de grandeza transcendente apareceram na Índia até na época atual, sempre que a necessidade delas surgiu. É bem conhecido agora, há pouco mais de quatrocentos anos atrás, o brilhante exemplo do Bhagavan Sri Chaitanya que fez as pessoas se perderem em êxtase ao cantarem nome de Hari. Será que essa época voltou? Será que na Índia, despida de sua glória e reduzida a um objeto de desespero pelos estrangeiros, mais uma vez levantasse a misericórdia do Senhor, para que Ele Próprio Se encarnasse? Que isto tenha acontecido ficará claro na leitura da história da vida da Grande Alma, dotada da necessidade infinita de fazer o bem, que aqui é relatada. A Índia outra vez, em resposta à necessidade da época atual, foi abençoada com a vinda d'Aquele que, encarnando-Se como Sri Rama, como Sri Krishna e como outras Encarnações do passado, renovou muitas e muitas vezes a Religião Eterna ao longo do tempo. CAPÍTULO I A NECESSIDADE DA ÉPOCA ASSUNTOS: 1. Poder e progresso do homem nos tempos modernos. 2. Sua expansão do Ocidente para o Oriente. 3. Conseqüentemente os modos de vida ocidentais tornaram-se o modelo de progresso. 4. A causa e o curso do progresso no Ocidente. 5. Feição não espiritual resulta em falta de satisfação. 6. Egoísmo e sensualidade: as conseqüências do "progresso" no sentido ocidental. 7. Religião: o fundamento da antiga vida nacional da Índia. 8. A Índia nunca fez dos prazeres mundanos seu ideal. 9. A ocupação da Índia pelo Ocidente e seu resultado. 10. Perigos da revitalização na Índia pela imitação do Ocidente. 11. A vida nacional da Índia: seus méritos e deméritos. 12. O pensamento ocidental é a causa do atual declínio da religião. 13. Deus encarna-Se novamente para deter o declínio da religião.
1. Mesmo uma pessoa comum pode ver que com a ajuda de conhecimento, riqueza e esforço pessoal, a humanidade vem progredindo em todos os campos. É como se o homem se recusasse a pôr um limite em seu avanço em todas as atividades da vida. Não satisfeito em viajar por terra e por água, inventou uma nova máquina para voar no céu; satisfez sua curiosidade descendo ao fundo do mar e explorando novos vulcões; escalou montanhas cobertas de neves eternas, cruzou os mares e observou profundamente os mistérios das várias regiões do mundo; descobriu sinais de vida semelhantes à sua, pulsando em trepadeiras, plantas e árvores. Ampliou seu conhecimento ao submeter todos os seres à sua observação e experimentação. Obtendo controle sobre os cinco elementos - terra, água, fogo, ar e éter - familiarizou-se com inúmeros fatos relacionados com nossa terra. Ainda insatisfeito, é ávido por descobrir os segredos das estrelas e planetas distantes em que já foi bem sucedido até um certo limite. Também não há falta de esforço de sua parte para
investigar as leis da vida interior. Pela experiência e pesquisa ele continuamente descobre novas verdades nesse campo. Chegou à conclusão que uma espécie de seres evolui numa outra e que a mente consiste simplesmente de matéria sutil e por isso tem começo e fim. Está agora assegurado que assim como é o exterior, assim é o mundo interior e que cada acontecimento é regulado por uma lei inviolável; e que atualmente está familiarizado com as leis sutis que governam os impulsos mentais irracionais como a necessidade de cometer suicídio. Assim também, embora não tenha nenhuma evidência positiva com respeito à sobrevivência do indivíduo, o estudo da história convenceu-o de que a vida nacional não somente continua como também evolui. Então, descobrindo o preenchimento da vida individual na vida da nação, ele declara guerra perpétua à ignorância com a ajuda da ciência e dos empreendimentos cooperativos para obter sucesso. Imaginando que através de uma luta infindável ele pode descobrir as regiões mais recônditas dos mundos exterior e interior e atingir eterno progresso, lançou o barco de sua vida numa corrente de desejos infindáveis. 2. Essa concepção materialista de vida, baseada na multiplicação de desejos, originou-se principalmente no Ocidente mas uma boa parte de sua influência é observada na Índia e outros países orientais, também. Como a ciência diariamente aproxima o Oriente do Ocidente, a feição oriental de vida gradualmente sofre uma mudança aproximando-se cada vez mais do modelo ocidental. Isso torna-se claro a partir do estudo da história da Pérsia, China, Japão, Índia e outros países orientais. Para bem ou mal, o pensamento ocidental está, sem qualquer dúvida, exercendo grande influência no Oriente. Parece que o mundo inteiro será invadido, ao longo do tempo, pelas idéias ocidentais. 3. Quanto a uma resposta à pergunta se essa concepção de vida trouxe resultados bons ou maus, devemos ir particularmente ao Ocidente, onde também, descobriremos sua fonte e natureza. Essa investigação nos mostrará o quanto as primeiras idéias do Ocidente progrediram ou se deterioraram e se houve perda ou ganho na felicidade do homem. Quando isto for determinado com respeito ao indivíduo e à nação, no Ocidente, o mesmo processo pode sem dificuldade ser estendido a outros países, considerando também o tempo em que elas estiveram sob a influência moderna. 4. A história vem registrando com palavras bem claras que desde tempos imemoriais o frio intenso predominante nos países ocidentais tornou os homens profundamente conscientes do corpo. Isto os fez egoístas. Ao mesmo tempo compreenderam que seus interesses egoístas eram melhor administrados com esforço unido, o que por sua vez tornou-os patrióticos. Este autointeresse e patriotismo levaram-nos, no curso do tempo, a declarar guerra às nações vizinhas e a se apropriar de suas terras e de suas riquezas. Com a melhoria das condições de vida e conseqüente diminuição da avidez de luta pela sobrevivência, os homens adquiriram a capacidade de olhar para dentro de si mesmos, procurar conhecimento e cultivar virtudes. Sentiram-se cada vez mais atraídos por essas buscas mais elevadas acima da simples luta pela existência, mas agora encontraram obstáculos. As crenças religiosas e a instituição de sacerdotes beatos ficaram no caminho de um progresso mais avançado na investigação dos segredos da natureza. Os sacerdotes não somente ameaçaram os homens, condenando-os ao inferno se adquirissem tal conhecimento, mas foram além e realmente empregaram a fraude, a força e o estratagema para impedi-los de continuarem seu caminho. Os ocidentais, contudo, acostumados a perseguir seus próprios interesses, não levaram muito tempo para descobrirem como vencer a oposição dos sacerdotes. Pressionaram, removendo os sacerdotes de seu caminho. Rejeitando as escrituras e denunciando tanto a religião como os sacerdotes, começaram a guiar suas vidas ao longo de um novo caminho e estabeleceram, como princípio, não acreditar ou aceitar nada que não pudesse ser aceito pelos sentidos. Afirmando que a verdade só pode ser provada pela evidência direta dos sentidos, espaldada pelo raciocínio, dedução etc., o Ocidente doravante começou a cultuar a matéria objetiva. Pensando que o assunto, percebido como "consciência do eu", pertencia à categoria de matéria, continuaram os cientistas ocidentais a investigar a natureza daquela consciência também pelos métodos de investigação objetiva adotada no estudo dos fenômenos materiais. Assim, nos últimos quatrocentos anos, os homens do Ocidente vêm aceitando a realidade somente do que pode ser investigado através dos cinco sentidos. Dentro desse período, a ciência física superou os erros e limitações de sua infância e entrou em sua juventude, caracterizada por confiança em seus métodos e orgulho de seus feitos. 5. Apesar de ser capaz de alcançar grande progresso na ciência física, o procedimento mencionado não pôde levar os homens ao conhecimento do Atman, porque a única maneira de atingir tal conhecimento é através do autocontrole, inegoísmo e introspecção e o único instrumento para alcançá-lo é a mente, com todas as suas funções sob controle. Por
conseguinte, não causa surpresa que, atraído pelos objetos externos, o Ocidente abandonasse o caminho do Auto-conhecimento e mergulhasse no materialismo baseado na identificação do homem com o corpo. É por isso que consideram o prazer mundano muito importante e esforçam-se de maneira especial para obtê-lo. O conhecimento dos fenômenos materiais, adquirido através da ciência, tem sido aplicado principalmente para aquele fim e os tem tornado cada vez mais egoístas e ambiciosos, trazendo à existência um sistema social baseado na riqueza. A manufatura das armas de destruição, o descontentamento profundamente enraizado devido à pobreza, lado a lado com a prosperidade abundante, a sede insaciável de riqueza e a ocupação e a opressão de outros países são algumas conseqüências da filosofia materialista de vida. A busca dos valores sórdidos somente traz desassossego e insatisfação ao espírito humano. Mesmo a agradável teoria de que, embora o indivíduo morra, a nação continua a viver e a se beneficiar de seus sacrifícios, não pode trazer nenhum consolo à geração vivente. Depois de pensar com cuidado, certas pessoas do Ocidente, chegaram por fim a compreender que o conhecimento obtido por meio dos sentidos não os capacitará a descobrirem a Realidade além do tempo e do espaço. A ciência lhes dá a indicação fugaz de sua existência e nada mais, porque a Realidade está além de seu alcance e compreensão. Um sentimento de total desesperança abateu-se sobre os homens e há um medo crescente em seus corações pelo colapso da crença de Deus, a fonte de toda força, alegria e prosperidade do homem. 6. Assim o estudo da História mostra que a civilização ocidental está fundamentada no amor a si própria, no desejo de posses mundanas e na ausência de fé na religião. Outros povos também, que fundamentam sua vida nesses valores materialistas, colherão os mesmos frutos que os povos ocidentais. Um exemplo é encontrado no Japão e outros países orientais que modelaram sua vida nacional inteiramente segundo o Ocidente. Vemos que apesar de suas grandes virtudes, como o patriotismo, ficaram sujeitos aos males da civilização materialista. Este é o resultado infeliz de ser inspirado pelos ideais ocidentais, como ficará claro pelo estudo da vida depois de entrar em contato com o Ocidente. 7. A primeira pergunta é se a Índia alguma vez teve qualquer vida nacional antes de entrar em contato com o Ocidente. A resposta é que, ainda que ela não estivesse ali em teoria, sem dúvida existia de fato pois, mesmo naqueles dias o povo da Índia, como um todo, venerava o Guru, o Ganga, o Gayatri e o Gita; e o "Go" (vaca) evocava os sentimentos mais ternos e reverentes do povo indiano, em todos os lugares. As idéias do Ramayana, Mahabharata e outros livros religiosos inspiravam e guiavam a vida de cada homem, mulher e criança; e o sânscrito, a "língua dos deuses", era o meio comum de expressão dos eruditos. Havia outros fatores similares de unidade e não há dúvida de que as idéias e a prática religiosas constituíam a rocha daquela unidade. 8. Base da vida nacional na Índia, a religião tornou ímpar sua civilização. A principal característica dessa civilização é o autocontrole que regula tanto a conduta individual como a da nação. "Por meio do prazer, além do prazer" é a máxima de cada hindu e a vida aqui neste mundo é considerada somente preparação para aquela que virá. Lembrado deste ideal elevado em cada estágio da vida individual ou nacional, o hindu não podia perdê-lo de vista. Era forçado, por assim dizer, a manter-se sempre orientado na direção desse grande objetivo. Por esta razão seu sistema de casta ou classe não criou durante muito tempo qualquer conflito de interesses, nem levou insatisfação à sociedade pois, quando atingido o conhecimento supremo ou liberação através da prática inegoísta de seus deveres de casta ou classe, sem contar com o nascimento, seja ele em classe elevada ou não, qual seria possivelmente a causa de descontentamento? Ao contrário do que sucede na sociedade ocidental, que é baseada no direito de oportunidades iguais para serem aproveitadas, não havia descontentamento nos grupos sociais da antiga sociedade indiana, baseada como estava, nos direitos e oportunidades iguais para se alcançar o mais elevado ideal: o Conhecimento Supremo ou Liberação. As mudanças ocorridas na vida nacional da Índia desde então e como resultado de seu contato com o Ocidente, são discutidas abaixo. 9. Era natural e inevitável que a ocupação da Índia pelo Ocidente deveria trazer muitas mudanças na distribuição da riqueza nacional do país, mas a influência do Ocidente foi além. Produziu uma mudança radical nas convicções profundamente enraizadas que haviam conduzido homens e mulheres desde tempos imemoriais. Como resultado, cresceu a impressão de que a doutrina, "desfrutar para renunciar"- indicando que o objetivo do prazer é somente renunciar tudo, em termos finais - era uma história vazia inventada por sacerdotes buscadores do Eu, que a idéia de sobrevivência depois da morte era apenas uma quimera de poeta; e que nenhuma lei podia ser mais injusta e irracional do que aquela em que um homem deveria ser condenado a permanecer toda a sua vida na camada social em que nasceu. Caindo cada vez mais sob a magia do Ocidente, a Índia rejeitou o ideal de renúncia e autocontrole e começou a correr atrás dos prazeres mundanos. Essa atitude trouxe consigo o declínio do antigo sistema de educação e treinamento e então
surgiram o ateísmo, o amor à imitação e a falta de autoconfiança. Assim a nação perdeu sua espinha dorsal. As pessoas começaram a acreditar que suas crenças e práticas, há tanto tempo abraçadas, estavam erradas e sentiram que talvez suas tradições eram cruéis e semi-civilizadas, como declarou o Ocidente, com seu maravilhoso conhecimento científico. Cega pelo desejo de desfrutar, a Índia esqueceu suas antigas cultura e glória. A perda dessa memória trouxe confusão ao seu entendimento e à própria existência nacional ficou em risco. Descobrindo que mesmo para o prazer mundano, ela dependia dos outros, a Índia foi tomada por um sentimento de frustração. Tendo perdido assim o caminho tanto do prazer, como da liberação, e contudo, sempre inclinada a imitar os outros, a nação estava agora golpeada pelas ondas do desejo, como um barco sem timoneiro, indo à deriva. 10. Levantou-se um clamor em todos os lados de que nunca havia existido uma vida nacional na Índia; que mesmo assim, graças ao Ocidente, havia agora por fim algum sinal dela, apesar de muitos obstáculos para seu pleno crescimento. Disseram que as crenças religiosas profundamente enraizadas haviam-na reprimido. A idolatria - a adoração do supremo Ser em inúmeros aspectos como deuses e deusas - foi também, acusada de tê-la submergido por tanto tempo. "Fora com a idolatria", gritava o povo, "acabem com ela, somente então os homens e mulheres do país terão vida nova instilada neles". O cristianismo começou a ser pregado e, à sua imitação, o monoteísmo ocidental. A Índia, prostrada, teve de ouvir conferências - feitas em reuniões públicas à moda ocidental - sobre política, sociologia, liberdade das mulheres e casamento das viúvas. O sentimento de frustração e desespero, contudo, em vez de diminuir, tornou-se mais forte. A estrada-de-ferro, o telégrafo e outros produtos da civilização ocidental passaram a ser utilizados; mas estes não corrigiram a situação, porque todas essas inovações não podiam nem tocar nem estimular os ideais sobre os quais a vida do país dependiam. Uma vez que o remédio adequado não era aplicado, a doença não podia ser curada. Como podia a Índia, cuja alma era a religião, voltar à vida, se sua religião não fosse ressuscitada? A influência do Ocidente havia trazido sua queda. Não seria fútil, então, confiar no Ocidente ateísta para sua ressurreição? Mesmo imperfeito, como o Ocidente poderia tornar uma outra parte do mundo perfeita? 11. Não se pode dizer que não houvesse defeitos na vida nacional da Índia antes da chegada dos ocidentais, mas a nação sendo então, cheia de vida e vigor, esforçava-se constantemente para remover quaisquer defeitos. Agora que à nação e à sociedade faltava este esforço, a expansão das idéias e ideais ocidentais, em vez de curar a doença estava a ponto de matar o paciente. 12. Está claro que o declínio da religião no Ocidente também afetou a Índia. Fica-se surpreso ao ver o quanto este declínio da religião espalhou-se por todo o mundo na época atual. A religião, como um corpo de verdades a serem realizadas em vida, pela graça de Deus, quase desapareceu totalmente na idade moderna, mergulhados como estão os homens na busca dos prazeres sensuais. A ciência, também, embora tenha enriquecido a vida ao dar aos homens novos meios de se divertir, fracassou em dar-lhes paz. Quem estenderá o homem sua mão para ajudá-lo nesta trágica situação? Não há nenhum poder espiritual por trás do universo que poderia se comover com esta agonia e desassossego da alma do homem por uma religião adequada à época e capaz de salvá-lo das garras dos prazeres? Que força reverterá o curso dos valores espirituais para baixo tanto no Oriente como no Ocidente e mais uma vez ensinará os homens a seguirem o caminho da paz? O Senhor prometeu no Gita que, por Sua Maya, Ele assumiria um corpo humano e Se manifestaria no mundo sempre que a religião declinasse e ajudaria os homens a obter em paz. A necessidade da época não levantaria Sua compaixão? A falta de ajuda e o desespero do homem não obrigariam Deus e tomar um corpo? 13. A necessidade das épocas, Ó leitor, fez com que isto realmente acontecesse; porque o Senhor, na verdade, mais uma vez nasceu como Instrutor espiritual do mundo. Ouçam com fé Sua misericordiosa mensagem: "Tantas fés, tantos caminhos", e "Realizarão o Senhor por qualquer prática espiritual feita com um coração sincero". Vamos nos estabelecer na admiração da renúncia e austeridades jamais conhecidas, praticadas por Ele, a fim de trazer de volta aquela consciência do Espírito Supremo para a mente do homem. Venham, vamos discutir e meditar naquela vida santa, livre do mais leve traço de luxúria e assim, purificar-nos! CAPÍTULO II TERRA NATAL DE SRI RAMAKRISHNA (KAMARPUKUR) E SEUS ANCESTRAIS ASSUNTOS: 1. Porque uma Encarnação nasce numa família pobre. 2. Kamarpukur, terra natal de Sri Ramakrishna. 3. Kamarpukur de então e de agora. 4. O culto do Dharma. 5. O reservatório Haldar de
Uchalan. 6. Manikraja de Bhursubo. 7. O forte de Mandaran. 8. O grande reservatório de Uchalan e o campo de batalha de Mogalmari . 9. Ramananda Roy, o proprietário do vilarejo de Dere. 10. Manikram Chattopadhyaya de Dere. 11. O filho de Manikram, Kshudiram. 12. Chandradevi, esposa de Kshudiram. 13. O litígio de Kshudiram com o proprietário. 14. Kshudiram forçado a deixar Dere. 15. Sua migração para Kamarpukur.
1. À exceção de Sri Ramachandra e do Senhor Buda, todas as Encarnações divinas nasceram na pobreza e na dificuldade. Consideremos, por exemplo, a vida de Bhagavan Sri Krishna, glória da raça dos príncipes Kshatriyas. Nasceu numa prisão e passou sua infância longe dos parentes, numa comunidade de humildes pastores; ou a vida de Jesus que, embora tenha nascido num estábulo tendo uma manjedoura como berço, trouxe glória a seus humildes pais; ou a de Bhagavan Sankara, nascido após a morte de seu pai, filho de uma pobre viúva1; (1 Isto segundo a edição de Calcutá do Sankara-dig-vijaya de Anantanandagiri, mas segundo o Sankara-dig-vijaya de Madhava o pai de Sankara, Sivaguru, viveu até o terceiro ano de seu filho. ) ou Bhagavan Sri Chaitanya, de pais comuns e finalmente, a do Profeta
Maomé, fundador do islamismo, que nasceu de família pobre. Apesar disso, nenhum deles nasceu numa família onde o contentamento não reinasse soberano entre a necessidade e a pobreza; onde o calor do amor e do inegoísmo não prevalecesse sobre o frio da penúria; ou onde os corações dos pais não fossem adornados de renúncia e pureza, firmeza adamantina e austeridade bem equilibrados com os sentimentos de caridade e de bondade. Se pensarmos profundamente, vemos que há uma sutil conexão entre a condição de pobreza e o curso futuro das vidas das Encarnações, pois se desde os primeiros anos não tivessem conhecido e simpatizado com a sorte dos pobres, oprimidos e miseráveis, como teriam podido, anos mais tarde, secar as lágrimas dessas pessoas, trazendo-lhes consolo? Contudo, isso não é tudo o que as Encarnações almejavam realizar. Já vimos que elas vieram ao mundo para deter o declínio da religião. Para cumprir esse objetivo tiveram que obter conhecimento íntimo dos princípios da religião refletidos nas vidas das pessoas, no passado, compreender as causas de seu declínio, trazer formas novas e aperfeiçoadas de religião, adequadas a épocas e a lugares cambiantes. Foi nas cabanas dos humildes e não, nos palácios dos ricos, que esse conhecimento íntimo pôde ser alcançado, porque é o pobre, privado dos prazeres do mundo, que se aferra a Deus e à Sua dispensação como o apoio mais importante. Por conseguinte, embora a religião decline em todos os lugares, um pouco de brilho dos antigos ensinamentos ainda ilumina a choupana do pobre. É por esta razão que essas grandes almas, instrutores do mundo, nascem na cabana do pobre. Assim foi com o grande Mestre cuja vida vamos começar a descrever. 2. Na província de Bengala, não longe do lugar em que a parte noroeste do distrito de Hooghly une os distritos de Bankura e Medinipur, há um agrupamento de três vilarejos, formando um triângulo. Embora conhecidos pelos aldeões locais como Sripur, Kamarpukur e Mukundapur, esses três vilarejos estão tão próximos uns dos outros que aparecem ao viajante como bairros diferentes do mesmo vilarejo. Os habitantes dos povoados vizinhos chamavam todos os três de Kamarpukur, provavelmente porque os proprietários locais viveram naquela vila por muitas gerações. Na época da qual estamos falando, Kamarpukur constituía parte de uma propriedade livre de cobrança, pertencente à família do instrutor espiritual do Maharaja de Burdwan. Os descendentes dessa família, Gopilal Goswami, Sukhlal Goswami e outros viviam ali 2. (2 Hridayram Mukhopadhyaya falava de um Anupama Goswami em lugar de Sukhal; mas essa afirmação é duvidosa, porque os donos da vila, os Lahas, disseram que o referido nome de Goswami era Sukhal e que haviam comprado, há aproximadamente cinquenta e cinco anos atrás, a maior parte das terras de Kamarpukur de seu filho Krishnalal Goswami. Há também, a tradição na vila que Gopilal Goswami instalara o grande Sivalinga chamado Gopeswara. O referido Gopilal Goswami pode, por conseguinte, ter sido um ancestral de Sukhal ou pode ser que um outro nome de Sukhal tenha sido Gopilal. )
A cidade de Burdwan está situada aproximadamente a trinta e duas milhas ao norte de Kamarpukur. Uma estrada-de-ferro, marginando Kamarpukur, vai dali a Puri no sudoeste. Muitos peregrinos pobres e Sadhus caminham por essa estrada até Puri para adorar Sri Jagannath, o Senhor do Universo, voltando pela mesma estrada. O famoso templo de Tarakeswar Mahadeva situa-se a cerca de dezenove ou vinte milhas ao norte de Kamarpukur. Uma estrada atravessando Jahanabad também conhecida como Arambag, às margens do rio Dwarakeswar, une aquele lugar a Kamarpukur. Além disso duas estradas-de-ferro -uma de Ghata, dezoito milhas ao sul e outra de Vanavishnupur, vinte e seis milhas a oeste - entram em Kamarpukur. 3. Não há palavras para expressar a atmosfera de paz que penetrava nos principais vilarejos agrícolas de Bengala, antes de terem sido devastados pela malária em 1867. Cercados por campos extensos, esses pequenos vilarejos do distrito Hooghly pareciam ilhas flutuando num vasto mar verde. As pessoas eram fisicamente fortes e saudáveis e mentalmente felizes e contentes pois levavam vida ao ar livre e tinham fartura de comida, sendo o solo extremamente fértil. Os vilarejos eram densamente povoados e os aldeões, além de cultivarem seus campos, ocupavam-se
de várias pequenas indústrias. Kamarpukur ainda é famosa nessa região do país por seus Jilepis e Nabats (doces) e seus habitantes ainda hoje levam uma vida honesta com a fabricação de cachimbos (hookah) de ébano, vendendo-os em Calcutá. Numa certa época foi famosa pela produção de linhas, Dhotis (vestimentas), toalhas e outros artesanatos. Conhecidos negociantes de roupas como Vishnu Chapdi e outros viviam nesse vilarejo fazendo bons negócios em Calcutá. Uma feira acontece no vilarejo ainda hoje em dia às terças-feiras e sábados e os habitantes dos povoados vizinhos (Tarahat, Badanganj, Sihar, Desra etc.) trazem artigos de uso diário para vender como Unhas, Dhotis, toalhas, panelas, jarros, cestas, esteiras rústicas e velas etc., ao lado de produtos agrícolas. Numerosos festivais ainda são realizados. Até o dia de hoje no mês de Chaitra, Kamarpukur vibra com canções em louvor à deusa Manasa, bem como com o Gajan (garjana), canção em louvor a Siva; e no mês de Vaisakha ou Jyaishtha, com canções sobre Hari que continuam ininterruptamente durante três dias. Além disso todas as cerimônias para ocasiões especiais (Pai Parvana) 3 (3 Ligados aos dias lunares especialmente o oitavo, o décimo quarto, à lua cheia e à lua nova. ) são realizadas durante o ano inteiro na casa do proprietário de terras, enquanto cultos diários e especiais são feitos nos templos. A pobreza da vila agora terminou com muitas outras festividades similares. 4. Numa determinada época, o culto de Dharma, que originalmente foi uma das três principais 'gemas' dos budistas, era celebrado anualmente com grande pompa e esplendor. Essa prática, contudo, passou. Sri Dharma é agora considerado Kurma (a segunda das dez importantes Encarnações de Vishnu) e recebe adoração normal aqui e nos vilarejos adjacentes. Até os Brahmanas são, às vezes, vistos adorando a imagem dessa divindade. Ouvem-se diversos nomes para Sri Dharma nos vários povoados. Assim o Dharma de Kamarpukur é chamado Rajadhiraja; o Dharma instalado em Sripur é chamado Yatrasiddiraja; e o da vila Madhuvati, perto de Mukundapur, é conhecido como Sannyasiraja. A procissão da carruagem (Ratha Yatra) do Dharma de Kamarpukur costumava ser celebrada com muito mais pompa. O grande carro do deus, com seus nove pináculos, pode ser visto próximo do templo; mas depois de se ter quebrado, não foi mais consertado. O templo também está caindo aos pedaços por falta de reparos e o sacerdote, Yajnesvara, levou a divindade para sua casa. 5. Vivem em Kamarpukur pessoas de diversas castas, altas e baixas, como a dos Brahmanas, Kayasthas, tecelões, leiteiros, ferreiros, ceramistas, pescadores e Dom (uma casta inferior). Na vila há três ou quatro reservatórios sendo o maior o de Haldarpukur. Existem diversos lagos pequenos, alguns deles cheios de lótus de cem pétalas e lírios d'água brancos. Há ainda na vila muitas casas de tijolos e túmulos, embora nos tempos antigos seu número fosse bem maior. O templo em ruínas de Ramananda Sankhari, a plataforma Rasa dilapidada do Fakir Datta, pilhas de tijolos recobertos pela vegetação da floresta e santuários abandonados em diversos lugares são evidências da antiga prosperidade do povoado. Há dois ghats de cremação, chamados Budhui Moral e Bhutir Khal, um a noroeste e outro a nordeste. Para o oeste de Bhutir Khal estão o pasto, o mangueiral público, plantado por Manikraja e o rio Amodar. O riacho Bhuti corre na direção do sul e une-se a este rio, não longe do vilarejo. 6. Uma milha ao norte de Kamarpukur está uma vila chamada Bhursubo. Um homem muito rico, chamado Manik Chandra Badyopadhyaya, vulgarmente conhecido como Manikraja pelos habitantes dos povoados vizinho, morava ali. Além do pomar de mangueiras, há pouco mencionado, os reservatórios de Sukhasayar e Hatisayar ainda nos fazem recordá-lo. Diz-se que em numerosas ocasiões cerca de um "lakh" de Brahmanas 4 (4 Alimentar um "lakh" (um milhar) de Brahmanas, repositórios de conhecimento e de santidade, era considerado um ato raro e único de piedade. ) foram convidados ao seu palácio. 7. Na vila de Madaran, sudeste de Kamarpukur, havia um forte intransponível para proteger os habitantes dos vilarejos vizinhos dos ataques de inimigos. O curso do riacho vizinho, Amodar, foi habilmente desviado para servir de fosso para o forte. 8. As ruínas do portão, da torre e do fosso do forte e o templo de Siva, chamado Saileswar, não longe dali, existem ainda hoje em dia. Indicam a importância dessa parte do país durante o domínio Pathan. Pelo forte de Mandaran passa a estrada que leva a Burdwan. Em ambos os lados dessa estrada há muitos reservatórios grandes, o maior num local chamado Uchalan, dezoito milhas ao norte do forte. Nessa estrada há também um estábulo de elefantes em ruínas, o que mostra claramente que a estrada foi construída para ser utilizada durante guerras e distúrbios. A existência do campo de batalha de Mogalmari perto dessa estrada também atesta esse fato. 9. Duas milhas a oeste de Kamarpukur estão três vilarejos chamados Satbere, Narayanpur e Dere - situados um ao lado do outro. A antiga prosperidade desses três vilarejos pode ser
constatada por diversos sinais, como o reservatório na vila de Dere e o templo próximo. Na época da qual estamos falando, os três vilarejos faziam parte de propriedades diferentes e Ramananda Roy, o senhor de Dere, vivia no povoado de Satbere. Esse senhor de terras embora não muito rico, foi um grande tirano. Quando se aborrecia com um de seus arrendatários não hesitava em destituí-lo de todas suas posses. Nenhum de seus filhos ou filhas sobreviveu. Dizia-se que ele não podia deixar descendência por oprimir os arrendatários. Após sua morte todas as propriedades caíram em mãos alheias. 10. Há aproximadamente cento e cinqüenta anos vivia no vilarejo de Dere, uma família religiosa Brahmana de recursos moderados. Eram de descendência nobre, observavam os costumes dos hindus piedosos e adoravam Sri Ramachandra. O templo de Siva e o reservatório próximo, conhecido como reservatório Chaturjee, ainda celebram sua memória. Sri Manikram Chattopadhyaya, o chefe dessa família, tinha três filhos e uma filha nessa época. O mais velho, Kshudiram nasceu provavelmente em 1775. Em seguida nasceram a filha Ramsila e os outros filhos, Nidhiram e Kanairam. 11. Não se sabe se Kshudiram tenha tido sucesso sem qualquer empreendimento que lhe trouxesse dinheiro, mas o Senhor o havia abençoado com veracidade, contentamento, perdão, renúncia e outras qualidades nobres consideradas pelos Sastras como a marca de um bom Brahmana. Era alto e forte, de pele clara e de aparência agradável. Kshudiram mostrava profunda devoção a Sri Ramachandra, que era adorado em sua família, de geração a geração. Tinha o hábito de fazer Sandhya, juntamente com suas práticas diárias, depois das quais apanhava flores para o culto de Raghuvir (Ramachandra). Não comia nada enquanto não terminasse sua prática. Jamais aceitou presentes de seus inferiores e até recusou convites de Brahmanas que oficiavam atos religiosos para eles. Não bebia água tocada por Brahmanas que recebiam dinheiro ao darem suas filhas em casamento. Era muito amado e respeitado pelos aldeões por sua fiel observância dos costumes piedosos. 12. Kshudiram assumiu a direção da propriedade ancestral com a morte de seu pai. Executava seu trabalho da melhor maneira possível, mas ao mesmo tempo, permanecia firme no caminho da religião. Pouco tempo antes havia se casado, mas sua esposa morrera jovem. Ao atingir vinte e cinco anos casou-se pela segunda vez. Sua noiva chamava-se Chandramani, mas em família era conhecida simplesmente por 'Chandra'. A casa de seu pai ficava na vila de Saratimayapur. Chandra era uma pessoa de coração simples, boa aparência e dedicada ao serviço dos deuses e santos, mas suas qualidades marcantes eram profunda fé religiosa e uma natureza amorosa e afetiva, o que a tornava amada por todos. Nascida provavelmente em 1791, ela deveria ter somente oito anos em 1799, por ocasião de seu casamento. O seu primeiro filho, Ramkumar, deve ter nascido em 1805. Uma filha, Katyayani, nasceu cinco anos mais tarde e ela alegrou-se novamente com o nascimento de seu segundo filho, Rameswar, em 1826. 13. Não levou muito tempo para Kshudiram descobrir como era difícil atender aos negócios mundanos sem se desviar do caminho da retidão. Provavelmente algum tempo depois que sua filha Katyayani nasceu, teve que passar por uma prova muito severa. Já falamos de Ramananda Roy, o opressor proprietário de terras do vilarejo. Aborrecido com um certo homem de Derepur, Ramananda moveu uma falsa ação contra ele e como fosse necessário alguém de reputação ilibada como testemunha, pediu a Kshudiram para depor a seu favor. O íntegro Kshudiram sempre temeu litígios, cortes e coisas semelhantes, sem recorrer a eles contra qualquer pessoa, mesmo tratando-se de uma causa justa. O pedido, portanto, caiu sobre ele como um golpe. Embora sabendo com certeza que incorreria na amarga inimizade de Ramananda se não desse falso testemunho, jamais concordou com tal procedimento. Aconteceu o inevitável. O senhor das terras entrou com falsa petição contra ele também, ganhou a causa e tomou posse de toda a propriedade ancestral de Kshudiram através de leilão. Em conseqüência Kshudiram não teve uma polegada quadrada de terra deixada em Derepur. Embora todos na vila sentissem muita simpatia por ele nesse infortúnio não ousaram ajudá-lo de modo algum com medo do dono das terras. 14. Quando essa calamidade abateu-se sobre ele, Kshudiram tinha aproximadamente quarenta anos. A propriedade5 (5 Hridayram Mukhopadhyaya disse-nos que Kshudiram tinha cerca de cento e cinquenta bighas de terras em Derepur (3 1 /2 Bighas = 1 acre). ) herdada de seus ancestrais juntamente com o que ele adquirira durante muitos anos, desaparecera como nuvem dispersada pelo vento. Essa calamidade, contudo, não afetou absolutamente sua conduta íntegra. Tomou refúgio nos sagrados pés de Raghuvir, refletiu com serenidade sobre o que deveria fazer para escapar do malvado proprietário e por fim deu adeus, para sempre, à sua propriedade ancestral e ao seu vilarejo. 15. Já mencionamos o nome de Sukhlal Goswami, de Kamarpukur. Ele e Kshudiram possuíam o mesmo temperamento e eram velhos e íntimos amigos. Sukhlal ficou muito comovido
ao saber do infortúnio de Kshudiram e, vagando algumas cabanas de sua propriedade, convidou-o a ir morar ali para sempre. Assim Kshudiram encontrou refúgio. Aceitou o convite considerando-o como o incompreensível jogo (Lila) do Senhor e com o coração cheio de gratidão, foi para Kamarpukur onde viveu até o fim de seus dias. Sukhlal, que gostava muito de seu amigo, feliz com sua chegada, fez uma doação permanente ao virtuoso Kshudiram, de uma Bigha e dez Chataks6 (6 16 Chataks = 1 Katra; 20 Katras = 1 Bigha. ) de terra, para sua manutenção futura. CAPÍTULO III A SANTIFICADA FAMÍLIA EM KAMARPUKUR ASSUNTOS: 1. A austera vida de Kshudiram em Kamarpukur. 2. A obtenção misteriosa da Salagrama de Raghuvir. 3. Sua dependência de Deus. 4. O campo de arroz em Lakshmijala . 5. Progresso na devoção de Kshudiram. 6. Como os vizinhos respeitavam Chandradevi. 7. Ramsila, a irmã de Kshudiram. 8. Seus dois irmãos. 9. O sobrinho, Ramchand. 10. O incidente mostrando a devoção de Kshudiram a Deus .1 1. Casamentos de Ramkumar e de Katyayani . 12. A morte de Sukhlal Goswami e outros acontecimentos. 13. A peregrinação de Kshudiram a Setubandha e o nascimento de seu filho Rameswar. 14. O poder sobrenatural de Ramkumar . 15. Uma ilustração daquele poder. 16. Um incidente relativo à família de Ramkumar. 17. A feição distintiva da família de Kshudiram . 18. A visão espiritual de Chandradevi. 19. O desejo de Kshudiram de fazer peregrinação a Gaya . 20. A história de Hriday a esse respeito. 21. Sonho divino de Kshudiram em Gaya . 22. Volta de Kshudiram a Kamarpukur.
1. É difícil imaginar os pensamentos que passaram pela mente de Kshudiram e de sua esposa ao chegarem a Kamarpukur com Ramkumar de dez anos e Katyayani, a filha de quatro, e instalaram-se na casa que lhes foi doada. O mundo, cheio de inveja e de ódio, deve ter-lhe parecido um terrível lugar de mortos envoltos em total escuridão. Pensamentos de afeto, amor, bondade e justiça sem dúvida derramavam ali ocasionalmente, uma luz muito débil, levantando nos corações sedentos alguma esperança de felicidade que logo seria abatida nos momentos seguintes, deixando atrás de si profunda depressão. É natural que muitos desses pensamentos tivessem passado por suas mentes ao compararem sua antiga condição com a atual. Somente quando a miséria e a calamidade chegam, os homens compreendem a transitoriedade e a inutilidade deste mundo. Por isso não é de todo surpreendente que Kshudiram se sentisse agora desapegado do mundo e que sua mente profundamente religiosa estivesse cheia de devoção e confiança em Deus. Porque ele não podia esquecer quão inesperado e não solicitado era o abrigo a eles dado. Será então estranho que indiferente aos prospectos mundanos, ele uma vez mais tenha dedicado seu tempo ao serviço e adoração ao Senhor, entregando-se totalmente a Raghuvir? A partir desse instante ele vivia no mundo, mas como os Vanaprasthas dos tempos antigos, não era do mundo. 2. O incidente ocorrido nessa época intensificou ainda mais a fé de Kshudiram em Deus. Um dia foi a um outro vilarejo a negócios. Na volta, cansado, repousou debaixo de uma árvore. O vasto e solitário campo e uma suave brisa trouxeram paz à sua mente perturbada e a seu corpo cansado. Sentiu um forte desejo de deitar-se e mal o fez, foi logo tomado pelo sono. Teve então um sonho no qual viu à sua frente seu Ideal Escolhido, Bhagavan Sri Ramachandra, sob o disfarce de um Divino Menino, o corpo verde como as tenras folhas da grama Durva. Apontando para um determinado lugar, o Menino disse, "Estou aqui há muito tempo sem comida e sem ninguém para tomar conta de mim. Leve-me para sua casa. Desejo ardentemente que você me sirva." Kshudiram foi tomado de emoção e disse prestando homenagem ao Senhor, repetidamente: "Ó Senhor, sou sem devoção e muito pobre. O serviço que lhe é adequado não é possível em minha cabana e perderei toda graça, se ocorrer qualquer falha. Então por que o Senhor me faz um pedido tão difícil?" A isto, o Menino Ramachandra confortou-o e disse ternamente: "Não tenha medo. Não ficarei ofendido com qualquer falha. Leve-me com você." Incapaz de conter a emoção diante dessa graça inesperada do Senhor, Kshudiram caiu em pranto. Foi então que seu sonho terminou. Ao acordar, Kshudiram começou a cogitar a respeito sonho e pensou, "Ah! Se ao menos esta boa sorte fosse minha!" Subitamente seus olhos caíram sobre o arrozal próximo e imediatamente reconheceu o mesmo lugar que havia visto no sonho. Por curiosidade aproximou-se e viu uma linda pedra Salagrama e uma serpente com o capuz expandido, guardando-a. Ansioso por possuir a pedra precipitou-se para ela. Ao alcançá-la, viu que a serpente havia desaparecido e que a Salagrama estava na entrada do buraco da serpente. Vendo que o sonho havia se concretizado seu coração pulou de alegria e não sentiu medo da serpente, convencido de que a havia recebido com mandato de Deus. Gritando, "Glória a Raghuvir!" Kshudiram apanhou a pedra. Cuidadosamente examinou suas marcas e pelo seu conhecimento dos Sastras, viu que se tratava de Raghuvir Sila (Salagrama). Fora de si de
alegria e admiração voltou para casa, fez a cerimônia purificatória da Salagrama de acordo com os Sastras e tendo instalado a pedra como a divindade familiar, passou a adorá-la diariamente. Mesmo antes de ter encontrado a Salagrama de maneira tão inusitada, Kshudiram já vinha adorando diariamente Sri Ramachandra, sua Divindade Escolhida. Também adorava todos os dias a deusa Sitala, invocando-A num jarro consagrado cheio de água. 3. Suas dificuldades continuaram, mas Kshudiram suportou com alegria todos os tipos de infortúnios, observando estritamente como sempre as prescrições religiosas. Em certos dias quando não havia nada na casa para comer, sua dedicada esposa, Chandradevi, ficava ansiosa e lhe falava sobre o assunto. Entretanto, sem se perturbar, Kshudiram confortava-a, dizendo: "Não se preocupe. Se Raghuvir escolheu jejuar, por que nós também não o faremos?" Então Chandra que tinha o coração puro como o de seu marido, entregava-se a Raghuvir e continuava suas tarefas diárias e de algum modo chegava comida suficiente para o dia. 4. Kshudiram não sofreu por muito tempo essa incerteza sobre comida, porque pela graça de Raghuvir, a Bigha e os dez Chataks de terra em Lakshmijala que lhe havia dado o amigo Sukhlal Goswami, começavam agora a produzir tanto arroz que não só havia o suficiente para as necessidades anuais da pequena família, mas algum ainda sobrava para aumentar hóspedes e estranhos. Kshudiram contratou homens para arar o campo e quando os pés de arroz estavam prontos, ele mesmo transplantava alguns, tomando o nome de Raghuvir e deixava que os homens terminassem o trabalho. 5. Assim decorreram dois ou três anos. Kshudiram confiava inteiramente em Raghuvir e no que lhe acontecia, mas não faltavam comida simples e vestuário. Portanto os duros golpes desses dois ou três anos, em vez de desencorajá-lo, encheram seu coração de um sentimento de confiança em Deus e um fluxo contínuo de paz e contentamento que só alguns podem experimentar. Daí por diante era natural que ele sempre fosse visto voltado para seu interior e em conseqüência, de tempos em tempos experimentasse várias visões divinas. Todas as manhãs e tardes, em suas orações, repetia o Mantra de meditação, descrevendo o Gayatri com uma devoção tão profunda e tanta concentração mental, que seu peito ficava vermelho e lágrimas de amor escorriam de seus olhos fechados. Bem cedo pela manhã ia com uma cesta apanhar flores para o culto e a deusa Sitala, que recebia sua adoração diária, aparecia diante dele sob a forma de uma menina de oito anos, vestida de vermelho e usando muitos ornamentos. Ela acompanhava-o, sorrindo, ajudando-o a apanhar flores, abaixando os galhos floridos. Essas visões enchiam seu coração de alegria. Sua fé inabalável e sua profunda devoção refletiam-se em seu rosto e mantinham-no sempre num elevado plano espiritual. Vendo seu rosto sereno e pacífico os aldeões, instintivamente, sentiam sua espiritualidade e começavam a venerá-lo com o amor e a devoção devidos a um Rishi. Sempre que o viam aproximar-se, paravam de conversar, levantavam-se e saudavam-no com respeito. Hesitavam entrar no reservatório enquanto ele se banhava e esperavam com reverência que terminasse. Como confiavam plenamente nele, aproximavam-se para receber suas bênçãos. 6. A natureza pura e amorosa de Chandradevi cativava os vizinhos, fazendo com que a considerassem sua mãe. De nenhuma outra pessoa recebiam simpatia tão cordial em seus momentos de alegria ou tristeza. Os pobres sabiam que sempre que fossem a Chandradevi receberiam não somente comida, mas também boas-vindas e afeto sinceros, que enchiam seus corações de alegria inexprimível. Para os homens santos que viviam de esmolas, sua porta estava sempre aberta. Não havia nada que as crianças não pudessem conseguir de Chandradevi. Assim qualquer um, jovem ou velho, era bem vindo a qualquer momento na cabana de Kshudiram que, apesar da pobreza e sofrimento, irradiava sempre paz e alegria maravilhosas. 7. Como já foi mencionado, Kshudiram tinha uma irmã chamada Ramsila e dois irmãos mais jovens, Nidhiram e Kanairam, este último também chamado Ramkanai. Na época em que perdeu a propriedade na disputa com o senhor de Derepur, sua irmã contava trinta e cinco anos e seus irmãos, trinta e vinte cinco respectivamente. Nessa época, todos os três haviam se casado e constituído suas próprias famílias. Ramsila era casada com Bhagavat Bandyopadhyaya que vivia em Silimpur, um povoado a mais ou menos doze milhas a oeste de Kamarpukur. Tinha um filho, Ramchand e uma filha, Hemangini. Na época do infortúnio de Kshudiram, Hemangini estava com dezesseis anos e Ramchand, que então havia começado a praticar como Muktiar (advogado), estava mais ou menos com vinte e um anos. Nascida na casa dos tios maternos, em Derepur, Hemangini era mais querida do que seu irmão. Kshudiram criou-a como sua própria filha e quando ela atingiu a idade adequada, deu-a em casamento a Krishnachandra Mukhopadhya de Sihar, vila a cinco milhas do noroeste de Kamarpukur. Ao longo do tempo tornou-se mãe de quatro filhos: Raghava, Ramaratan, Hridayram e Rajaram. 8. Não pudemos saber se Nidhiram teve filhos, mas Kanairam teve dois, Ramtarak (também
conhecido como Haladhari) e Kalidas. Kanairam possuía natureza devocional e contemplativa. Certa vez foi assistir a um drama (Yatra) que retratava o exílio de Sri Ramachandra para a floresta. A interpretação pareceu-lhe tão real que tomou o enredo e a execução tão seriamente que esteve a ponto de quase agredir o ator que fazia o papel principal. Parece que com a perda da propriedade ancestral, Nidhiram e Kanairam estabeleceram-se nas aldeias de seus sogros. 9. Já dissemos que Ramachandra Bandyopadhyaya, filho de Ramsila, era advogado. Sua prática na cidade de Medinipur assegurava-lhe boa renda. Considerando extremadas as circunstâncias da vida de seus tios maternos, enviava quinze rupias por mês para ajudar Kshudiram e dez rupias para Nidhiram e Kanairam respectivamente. Se Kshudiram não recebesse notícias de seu sobrinho, por algum tempo, ficava muito inquieto e apressava-se a ir vê-lo em Medinipur. Fomos informados de um estranho incidente que ocorreu quando Kshudiram certa vez se dirigia a Medinipur. Vamos relatá-lo seguir como exemplo de sua profunda devoção a Deus. Medinipur está situada a mais ou menos quarenta milhas a sudoeste de Kamarpukur. Não recebendo notícias de Ramachandra e de sua família por muito tempo, Kshudiram dispôs-se certo dia a ir vê-lo. Era provavelmente o mês de Magh ou Phalgun (janeiro-março), quando caem as folhas das árvores vilwa, o que torna difícil o culto a Siva1,( 1 As folhas de vilwa são necessárias para o culto de Siva. ) até que novas folhas apareçam. Kshudiram vinha tendo essa dificuldade há algum tempo. Saiu bem cedo e andou sem parar até chegar a uma certa vila mais ou menos às dez horas da manhã. Vendo que as árvores vilwa ainda estavam com folhas, seu coração bateu de alegria e qualquer pensamento de prosseguir até Medinipur abandonou sua mente. Comprou uma cesta nova e uma roupa e lavou-as bem num pequeno lago da redondeza. Depois encheu a cesta com folhas novas de vilwa, cobriu-se com a roupa úmida e voltou para casa, ali chegando mais ou menos às três da tarde. Ao chegar, muito feliz, banhou-se e por longo tempo, prestou com essas folhas frescas, adoração ao grande Deus Siva e à Sitala, a Mãe Divina. Enquanto não terminou a adoração não sentou-se para comer. Chandradevi pensou que essa era a melhor hora para lhe perguntar porque não havia ido a Medinipur. Quando ele lhe contou tudo, ela ficou admirada em saber que ele havia voltado de tão longe somente por causa de sua ansiedade em adorar Siva com as folhas. Kshudiram partiu novamente para Medinipur na manhã seguinte, bem cedo. Assim Kshudiram passou seis anos em Kamarpukur. Seu filho Ramkumar estava agora com dezesseis anos e sua filha Katyayani, onze. Quando sua filha atingiu a idade adequada deu-a em casamento a Kenaram Bandyopadhyaya, que vivia em Anur, vilarejo a duas milhas de Kamarpukur, enquanto Ramkumar casou-se com a irmã de Kenaram. Ramkumar por essa época havia terminado seus estudos de Vyakarana (gramática) e Sahitya (literatura), numa escola de sânscrito perto da vila e agora estudava Smriti (leis que governam a sociedade e a religião hindus). 12. Passaram-se mais três ou quatro anos. Pela graça de Sri Raghuvir, Kshudiram estava mais próspero do que antes e livre de ansiedade, podendo dedicar todo o seu tempo a Deus. Nessa época Ramkumar terminou os estudos de Smriti dedicando-se com mais esforço a melhorar a situação econômica da família. Foi quando Sukhlal Goswami, o grande amigo de Kshudiram, morreu. Essa morte provocou grande pesar em Kshudiram. 13. Depois de terminar os estudos, Ramkumar, agora um rapaz, tomou para si a responsabilidade de manter a família. Kshudiram ficou livre para se dedicar a outras atividades. Tinha um grande desejo de ir em peregrinação a Setubandha-Rameswar onde anteriormente, provavelmente em 1824, fora a pé. Suas visitas aos lugares de peregrinação no sul da Índia levaram um ano, quando então, voltou para casa. Trouxe consigo de Setubandha um Banalinga (um símbolo de Siva) que começou a adorar diariamente. Esse Banalinga, chamado Rameswar, pode ser visto ainda hoje ao lado da pedra Salagrama de Raghuvir e do jarro de água simbolizando a deusa Sitala. Muito depois do nascimento de seu segundo filho, Chandradevi deu à luz outro filho, em 1826. Em lembrança de sua recente peregrinação, Kshudiram deu ao novo filho o nome de Rameswar. 14. Os oito anos seguintes apresentaram pouca mudança no curso de vida daquela pobre família em Kamarpukur. Ramkumar ganhava agora dinheiro aconselhando as pessoas sobre assuntos religiosos, baseado na autoridade dos Smritis e fazendo várias cerimônias religiosas. Por isso a família estava numa situação financeira melhor do que antes. Tornou-se um versado conhecedor daqueles ritos e diz-se que obteve o poder sobrenatural para torná-los efetivos. O estudo das escrituras lhe havia conferido fé no culto de Sakti, o Poder Divino primordial personificado, em cujo Mantra ele havia sido iniciado por um instrutor qualificado. Certo dia teve uma visão maravilhosa enquanto adorava essa Deusa, que se havia tornado sua Divindade Escolhida. Sentiu como se Ela estivesse marcando as letras de algum Mantra com Seus próprios
dedos, na ponta de sua língua. Essa experiência tornou-o perfeito em astrologia. Daí em diante tudo o que afirmava tornava-se realidade. Só em olhar um paciente podia saber se ele ficaria curado ou não. Alcançou alguma fama naqueles lugares ao predizer acontecimentos futuros. Vendo alguém sofrendo uma doença severa, começava a fazer ritos propiciatórios por seu restabelecimento, dizendo enfaticamente: "Assim que os grãos que agora estou espalhando no recinto do culto começarem a brotar, essa pessoa se recuperará." E o que ele dizia tornava-se verdadeiro. Seu sobrinho, Sivaram Chattopadhyaya relatou-nos a seguinte história, como ilustração de seu poder: 15. Estando em Calcutá a negócios, Ramkumar banhava-se no Ganga certa manhã, quando um homem rico e sua família também chegaram para tomar banho. A esposa estava sentada num palanquim, levado ao rio para que ela pudesse tomar banho lá dentro. Vindo de um vilarejo, Ramkumar jamais havia visto uma mulher banhar-se daquela maneira, protegida do público. Olhando com espanto para o palanquim, viu o rosto da mulher por um momento. Instantaneamente soube por seu poder sobrenatural que ela morreria no dia seguinte e ficou tão tomado por esse pensamento que não pode deixar de sussurrar tristemente a si mesmo: "Meu Deus, o corpo que hoje está sendo banhado com tal formalidade será amanhã jogado ao Ganga como cadáver e exposto aos olhos de todos!" O homem rico tomou conhecimento desse fato e, para testar a verdade dessas palavras, exigiu que Ramkumar fosse à sua casa. Sua verdadeira intenção era dar-lhe uma lição, caso sua predição fosse falsa. A jovem estava em perfeita saúde e não havia nenhuma indicação no momento de tal infortúnio. Logo aconteceu o que Ramkumar havia predito e o homem deixou-o ir em paz. 16. Certa vez, olhando para o futuro de sua esposa, Ramkumar fez uma triste predição que mais tarde veio a se confirmar. Dizia-se que ela tinha sinais auspiciosos. Desde o dia em que ele se casou e a trouxe para casa, a roda da fortuna tornou uma direção favorável. Ela estava, então, com sete anos de idade e o casamento teve lugar provavelmente no ano de 1820. Foi a partir dessa época que começou uma melhora na vida de seu pai, pois justamente foi quando a ajuda mensal de seu sobrinho, Ramachandra de Medinipur, começou a chegar. Naturalmente, qualquer nora que traz tanta sorte a uma família ao se tornar seu membro, é considerada com amor e respeito. Além disso, já que a esposa de Ramkumar era então a única nora da família, não é surpreendente que todos lhe dessem muita importância. Fomos informados que apesar de suas boas qualidades, o excesso de indulgência e de atenção tornaram-na voluntariosa e obstinada. Mas apesar desses defeitos, notados por todos, ninguém se aventurava a mencioná-los ou a corrigi-los; porque ninguém levava em conta seus pequenos defeitos, recordando-se que ela havia trazido prosperidade à família desde o dia de sua chegada. Quando ela cresceu, Ramkumar certa vez olhou-a prevendo que ela, embora tivesse sinais auspiciosos, morreria se algum dia concebesse. Quando ele viu, contudo, que ela não havia concebido por muitos anos, pensou que fosse estéril e sentiu-se aliviado. Com a idade de trinta e cinco anos, porém, ela ficou grávida e no ano seguinte, 1849, morreu depois de dar à luz a um menino muito bonito que foi chamado de Akshay. Esse incidente vem bem mais tarde, mas nós o narramos aqui por conveniência. 17. Uma característica especial de natureza sutil e divina foi compartilhada por cada um dos membros da santificada família de Kshudiram. Pela predominância dessa característica em Kshudiram e em sua esposa, ela foi transmitida a seus filhos. Já que mencionamos vários exemplos relativos a Kshudiram, não ficará fora de lugar se relatarmos aqui um acontecimento semelhante relativo a Chandramani. Isso mostrará como Chandramani também, como seu marido, tinha visões divinas de vez em quando. O acontecimento ocorreu pouco antes de Ramkumar se casar. O rapaz com quinze anos, estudava numa escola de sânscrito e ao mesmo tempo tentava ajudar a família, fazendo o culto em diversas casas. 18. Uma vez no mês de Asvin, Ramkumar havia ido a uma casa em Bhursubo para fazer o culto vespertino de Lakshmi. Como seu filho ainda não houvesse voltado para casa, embora já fosse mais de meia noite, Chandra ficou muito inquieta e saindo da casa esperou por ele ansiosamente. Enquanto olhava para a direção de onde deveria chegar, viu uma figura solitária aproximando-se da estrada que liga Bhursubo a Kamarpukur. Pensando tratar-se de seu filho deu alguns passos naquela direção, com grande alegria por encontrá-lo. Quando a pessoa aproximou-se viu que não era Ramkumar, mas uma linda moça, enfeitada com muitos adornos. Como Chandra estivesse muito ansiosa pela segurança de seu filho, a visão de uma moça respeitável andando daquela maneira na calada da noite não lhe pareceu estranho. Apenas dirigiu-se em sua direção e disse: "De onde você veio, minha filha?" A moça respondeu: "De Bhursubo". Chandra então perguntou-lhe ansiosamente: "Você viu meu filho Ramkumar? Ele está vindo?" Não passou por sua mente nem por um momento, que uma pessoa totalmente estranha como aquela moça, pudesse conhecer seu
filho. A moça respondeu, confortando-a: "Vim da própria casa em que seu filho foi fazer o culto. Não se preocupe, ele voltará logo." Ouvindo isso Chandra sentiu-se aliviada e ficou mais atenta. Reparando a acentuada beleza da moça, sua voz melodiosa, seu vestido atraente e seus enfeites exóticos, ela disse: "Você é tão jovem! Onde vai a essa hora da noite, usando lindos enfeites e roupa fina? E que estranho adorno é esse em suas orelhas?" Com um sorriso a moça disse: "É chamado Kundala", e acrescentou, "tenho ainda de andar uma longa distância." Pensando que ela estivesse em apuros, Chandra disse carinhosamente, "Venha, minha filha, descanse esta noite em nossa casa. Amanhã você pode ir à vontade". "Não, mãe", respondeu a moça, "Devo ir agora. Voltarei à sua casa outro dia." Despedindo-se dela, foi em direção aos grandes depósitos de arroz dos Lahas, bem próximos. Surpresa em vê-la ir na direção da casa dos Lahas, ao invés de seguir o caminho comum, Chandra pensou que ela estivesse perdida. Foi atrás dela, mas não pode achá-la, embora a procurasse em todas as direções. Então, lembrando-se do que a moça dissera, subitamente teve a sensação que havia visto a deusa Lakshmi! Correu para o marido e em grande agitação, contou-lhe tudo, do começo ao fim, com detalhes. Ao ouvir o relato Kshudiram assegurou-lhe que não havia qualquer dúvida que a deusa Lakshmi havia graciosamente Se revelado a ela. Logo depois Ramkumar voltou para casa e ouvindo o que havia acontecido, foi tomado de admiração. 19. O tempo passou e estamos agora em 1835. Sentindo mais uma vez uma forte necessidade de sair em peregrinação, Kshudiram decidiu ir a Gaya fazer ritos para a satisfação dos espíritos de seus antepassados. Estava com sessenta anos. Mesmo assim isto não o impediu de prosseguir a pé, à sagrada morada de Vishnu. Hriday, filho da sobrinha de Kshudiram, Hemangini, relatou-nos um estranho acontecimento que o fez empreender essa viagem a Gaya. 20. Certa vez, sabendo que sua filha Katyayani estava seriamente doente, Kshudiram foi a Anur vê-la. Ela estava então com vinte e cinco anos. Observando seus gestos e maneira de falar ficou convencido de que ela estava possuída por um espírito. Concentrando a mente em Deus, dirigiu-se àquele espírito: "Deus ou semi-deus, o que quer que você seja, por que perturba minha filha? Deixe-a imediatamente e siga seu caminho." Com isso o espírito ficou amedrontado e disse com voz suplicante por meio de Katyayani: "Deixarei o corpo de sua filha imediatamente se me prometer fazer culto para mim em Gaya e assim, pôr fim à minha condição miserável. Faço uma solene promessa de que no momento em que o senhor sair de casa com essa intenção ela será libertada de todos seus problemas." Tocado pelo sofrimento do espírito Kshudiram imediatamente disse: "Irei a Gaya, a morada de Vishnu assim que puder e satisfarei seu desejo, mas ficaria muito feliz se pudesse ter alguma prova de que realmente conseguiu libertar-se depois da adoração ter sido oferecida." O espírito respondeu: "Eu lhe asseguro que como prova de minha libertação, quebrarei o galho mais largo da árvore Neem, que está ali, quando o senhor estiver saindo." Segundo Hriday foi esse incidente que fez Kshudiram ir a Gaya. Como algum tempo mais tarde o galho da árvore Neem subitamente quebrouse não houve mais dúvida de que o espírito havia conseguido a libertação. O pesar também deixou Katyayani. Não podemos jurar pela veracidade desta história mas não há dúvida que foi por essa época que Kshudiram foi a Gaya. 21. No inverno de 1835, Kshudiram visitou Varanasi2 (2 Alguns dizem que Kshudiram visitou Varanasi muito antes, quando partiu de Derepur em peregrinação para Vrindavan e Ayodhya. Quando pouco tempo depois nasceu-lhe um filho e em seguida, uma filha, recordou-se dessa peregrinação e deu-lhes os nomes de Gadadhar e Katyayani. Durante a peregrinação acima mencionada, alguns sustentam que ele visitou somente Gaya. ) e Gaya. Foi
no começo do Chaitra (meio de março) que ele chegou a Gaya depois de adoração a Visvanatha (o Senhor do Universo) em Varanasi. Veio a Gaya nessa época do ano, provavelmente porque sabia que os espíritos de seus ancestrais teriam a maior satisfação se a adoração fosse feita naquele lugar sagrado, durante a primavera, no mês Chaitra. Viveu ali mais ou menos um mês, fez todas as cerimônias segundo as escrituras e por fim, ofereceu adoração aos pés de lótus de Gadadhara (Vishnu). Por sua grande fé, Kshudiram experimentou uma paz e satisfação inexplicáveis, ao fazer os ritos obsequiais prescritos em honra de seus antepassados. Tendo cumprido, ao máximo de sua capacidade, as obrigações para com seus ancestrais ele agora estava livre de toda ansiedade. Ao pensar que o Senhor havia tornado possível a uma pessoa insignificante como ele realizar tudo isso, seu coração, agradecido, transbordou com um sentimento de humildade e amor que ele não havia experimentado antes. Paz e alegria estiveram com ele dia e noite. Mal havia adormecido teve um sonho. Viu-se no templo sagrado, no ato de oferecer adoração a seus antepassados, aos pés divinos de Gadadhar. Até viu seus ancestrais em luminosos corpos celestiais, alegremente aceitando os Findas e abençoando-o. Não pode controlar a emoção ao vê-los depois do que lhe parecia muito tempo. Com lágrimas nos olhos e o coração transbordante de devoção, inclinou-se profundamente ante eles e tocou seus pés. No momento seguinte viu que o templo estava todo
tomado tomado por uma uma luz luz divina divina como jamais vira antes. Seus antepassados estavam de pé no templo, te mplo, em ambos ambos os lados lados numa numa atitu atitude de revere reverente nte,, de mãos mãos post postas as,, adora adorand ndo o um Ser Ser Divi Divino no maravilhoso sentado alegremente num lindo trono. Tinha um corpo luminoso, verde como a grama Durva. Olhando para Kshudiram com os olhos afetuosos e benignos, Ele fez sinal para que ele se aproxima aproximasse. sse. Pouco Pouco consci conscient entee do que estava estava fazend fazendo o Kshudi Kshudiram ram aproxi aproximou mou-se -se e chei cheio o de devoção, prosternou-se a Seus pés, em adoração, cantando hinos em Seu louvor. Satisfeito com sua sua adoraç adoração, ão, aquele aquele Ser Divino Divino dirigi dirigiu-s u-see a ele com um voz doce: "Kshud "Kshudira iram, m, sua devo devoçã ção o extraordinária fez-me muito feliz. Abenço-o e nascerei como seu filho e receberei seu carinho." Ouvi Ouvind ndo o essa essass palavr palavras as,, estranha estranhass mesmo mesmo para um sonho, sonho, a alegria alegria de Kshudiram Kshudiram não teve teve limite limites. s. Mas nesse nesse mesmo mesmo momento momento passou passou-lh -lhee pela pela cabeç cabeçaa como ele, sendo tão pobre, poderia alimentar e dar abrigo a um Ser tão elevado. Isso entristeceu-o muito e com voz embargada pelas lágrimas, disse: "Não, não, Senhor, não sou digno dessa bênção. Não será suficiente que Tu me tenhas abençoado graciosamente, revelando-Te a mim e desejando nascer como meu filho? Se Tu quiseres realmente nascer como meu filho, que serviço pode prestar um pobre homem como eu?" Ouvindo essas palavras cheias de emoção, aquele Ser Celestial parecia ficar ainda mais bondoso do que antes e disse: "Não temas, Kshudiram. Tudo o que me deres para comer eu aceitarei. Que se cumpra cumpra meu desejo." desejo." Kshudiram Kshudiram não teve coragem de dizer dizer "Não". "Não". Emoçõe Emoçõess confli conflitan tantes tes,, como como alegria e tristeza assaltaram-no com tanta força que ele mal pode se conter e perdeu a consciência. Isso interrompeu seu sonho. 22. Durante muito tempo, depois de despertar, Kshudiram não sabia onde estava. A realidade do sonho o havia dominado. Gradualmente retomou a consciência do mundo exterior, levantou-se da cama e recordando-se dos detalhes de seu estranho sonho, enfocou-o de diferentes ângulos. Seu coração confiante estava por fim convencido convencido de que como um sonho divino deve realizar-s realizar-se, e, alguma grande alma brevemente brevemente deveria deveria nascer nascer em sua casa. casa. Ele estava destinado destinado mesmo naquela naquela idade avan avançad çada, a, a ver novament novamentee o rosto rosto de uma criança criança.. Decidi Decidiu u então então não falar falar desse importante importante sonho a ninguém até que realmente se tornasse realidade. Poucos dias mais tarde despediu-se de Gaya, a morada de Vishnu, e voltou para Kamarpukur. Era então o mês de abril de 1835. CAPÍTULO IV AS ESTRANHAS EXPERIÊNCIAS DE CHANDRADEVI ASSUNTOS: 1. Experiências espirituais pré-natais dos pais das Encarnações. 2. A razão por trás dessa afirmação. 3. Valor e relevância das visões. 4. Kshudiram observou mudança na condição mental de Chandradevi. 5. Sua afeição maternal encontrou um âmbito mais amplo. 6. A ansiedade de Kshudiram por ela. 7. O estranho sonho de Chandradevi. 8. Sua experiência no templo de Siva. 9. Kshudiram alerta Chandradevi. 10. Visões de Chandradevi durante a gravidez.
1. As experiências espirituais ímpares e as visões dos pais das grandes almas que santificam a terra com seu nascimento, estão relatadas nos livros religiosos de todas as raças. Por Por exem exempl plo, o, foi foi este este o caso caso dos dos pais pais de pers person onag agen enss divi divino noss como como os glor glorio ioso soss Sri Sri Ramachan Ramachandra, dra, Bhagavan Bhagavan Sri Krishna, Krishna, Buda, Buda, o filh filho o de Ma Maya yadev devi, i, Jesus Jesus,, o filh filho o de Ma Maria ria,, Bhagavan Sri Sankara, Sri Chaitanya, o grande Senhor, e outros que desde seu nascimento, têm recebido a adoração e a reverência dos devotos. Será suficiente darmos ao leitor somente alguns exemplos. Segundo o Ramayana sabe-se que as mães de Sri Ramachandra e de seus três meio irmãos conceberam ao comer pudim de leite, deixado na travessa sacrificial. É também aí relatado mais uma vez que elas elas vieram a saber saber antes e após após o nascimento nascimento dos filhos, que essas e ssas crianças, cri anças, dotadas do tadas de poderes espiritua espirituais, is, eram eram verda verdadei deiram rament entee parte partess de Vish Vishnu, nu, o Senho Senhorr e Preser Preserva vador dor do Universo. Os pais de Sri Krishna sabiam tanto por ocasião de sua entrada no ventre de sua mãe, como imediatamente imediatamente após o nascim nasciment ento, o, que Ele era Deus encarnado encarnado,, dotado dotado dos seis poderes divinos. Além disso tanto os Puranas Pu ranas como o Bhagavata B hagavata narram narram estra estranho nhoss incide incidente ntess em sua vida vida diária desde o momento em que Krishna nasceu. Quando Buda veio ao mundo, Mayadevi viu numa visão visão um Ser elevado elevado em seu ventre, ventre, sob a forma forma de um brilhan brilhante te elefant elefantee branc branco o e todos todos os deuses, inclusive Indra, prestando homenagem a ela por sua boa sorte. Antes de Jesus nascer, sua mãe Maria sentiu que estava grávida sem conhecer seu marido José. Tomada de esplendor espiritual nunca antes visto, ela soube que havia concebido. A mãe do Bhagavan Sankara sabia que havia concebido quando o Deus dos deuses, Mahadeva, apareceu-lhe numa visão e concedeu-lhe uma graça. Lemos no Sri Chaitanya Charitamrita e outros livros que Sachidevi, a mãe de Bhagavan Sri Chaitanya também teve experiências espirituais semelhantes.
Todas as religiões - hinduísmo, budismo, cristianismo etc. - têm mostrado que a adoração a Deus Deus com com amor amor inte intens nso o é a maneira maneira mais fácil fácil de se obter obter Sua graça. graça. Uma vez que todos asseguram isso, a questão que naturalmente surge na mente de um investigador imparcial, é que se há qualquer verdade por trás dessa afirmação e, se assim for, o que deve ser aceito ou rejeitado das experiências acima relatadas. 2. Mesmo a razão razão sugere sugere que afinal afinal deve haver alguma alguma verdad verdadee no que foi dito, dito, pois pois a ciência moderna aceita que somente pais possuidores de grandes virtudes pode gerar filhos de caráter elevado. Assim não pode ser negado que os pais de Krishna, Buda, Jesus e outros como eles eles,, eram eram dotado dotadoss das das mais mais nobres nobres qualida qualidade. de. É claro, claro, também, também, que quando quando essas essas criança criançass extraordinárias nasceram os pais estavam em planos exaltados de consciência além do alcance dos seres comuns. Foi isso que os tornou aptos a essas visões e experiências impares. 3. Embo Embora ra os Pura Purana nass rela relate tem m muit muitos os exem exempl plos os dess dessas as experi experiênc ências ias,, que não são são contrária contráriass à razão, razão, a mente humana não as pode pode aceita aceitarr complet completame amente nte.. Coloca Colocando ndo sua fé somente no conhecimento obtido pelos sentidos o homem moderno não pode crer totalmente na existência de entidades como o Ser e Deus, Deus, estados estados como como Liberação Liberação,, vida futura futura e coisas coisas assim assim exceto através da realização direta. Apesar disso um investigador imparcial não pode desprezar nenhuma experiência, somente por ser rara ou incomum. Tem que ser paciente o suficiente para coletar as evidências pró e contra e parar de julgar até que tenha agido assim. Seja como for, soubemos através de fontes confiáveis confiáveis que os pais do grande personagem, pe rsonagem, cuja cuja vida vida estam estamos os escr escreve evend ndo, o, tive tivera ram m por por ocas ocasiã ião o de seu seu nasc nascim imen ento to,, vári várias as visõ visões es e experiências espirituais. Portanto não temos outra alternativa senão relatar aqueles fatos. No capítulo anterior contamos ao leitor alguns exemplos de Kshudiram. Agora faremos o mesmo com respeito a Chandradevi. 4. De volta ao lar, Kshudiram não falou com ninguém sobre o estranho sonho que havia tido em Gaya mas esperou esperou para ver o que acontece aconteceria ria.. A primeira primeira coisa coisa que observo observou u foi a mudança maravilhosa que havia ocorrido em Chandradevi. A seus olhos ela não mais era uma mulher comum, mas uma verdadeira deusa. Um amor que tudo abarca, brotando de alguma fonte desconhecida, desconhecida, enchia seu coração, coração, elevando-a a um plano superior, superior, acima de todos os desejos mundanos. Ela agora estava mais preocupada com as necessidades de seus vizinhos do que com as suas próprias. Entre suas obrigações domésticas ia de vez em quando atender às necessidades deles. Sem ser vista, tirava as provisões e outros artigos de uso de sua dispensa para levá-los aos necessitados. Depois de terminar o serviço de Raghuvir, servia comida a seu mari marido do e a seus seus filhos filhos;; em seguid seguida, a, embora embora fosse fosse tarde, tarde, ia antes antes de comer, comer, ver se seus seus vizinhos vizinhos tinham tinham se aliment alimentado. ado. Se acontece acontecesse sse encontrar encontrar alguém alguém que por qualquer qualquer razão tivesse ficado sem comida, insistia em levá-lo para casa e alimentá-lo com sua própria porção de comida cozida. Só depois ela própria comia o pouco que havia sobrado e passava o dia muito contente. 5. Kshudiram descobriu que Chandra, que sempre amou as crianças da vizinhança como suas, agora sentia amor maternal também para com os deuses. Ela realmente considerava Raghuvir Raghuvir,, a divindade divindade familiar, familiar, como seu próprio próprio filho filho e também também olhav olhavaa a deusa deusa Sitala Sitala e a divin divindad dadee Ra Rames meswar war,, repres represent entad adaa pelo pelo emblem emblemaa Salagra Salagrama, ma, como como seus seus próprios próprios filhos filhos.. Anteriormente seu coração costumava estar sempre cheio de temor por ocasião do serviço e da adoração dessas divindades; mas agora um sentimento poderoso de amor havia substituído completamente aquela sensação. Qualquer idéia de medo ou de hesitação ao aproximar-se aproximar-se dos deuses desapareceu e ela nada tinha para esconder deles ou para lhes pedir. Ao invés disso sentia a segurança de que os deuses estavam mais próximos do que seus próprios filhos e nasceu nela um intenso desejo de sacrificar tudo para fazê-los felizes felizes e um sentimento extático extático de estar ligada a eles numa relação eterna de amor. 6. Kshudiram reparou que como resultado de sua devoção irrestrita aos deuses e a alegria de seu relacio relacionam nament ento o íntimo íntimo com eles, a simplória simplória Chandra Chandra havia havia se tomado mais confiante confiante do que nunca. Não mais podia suspeitar de ninguém nem considerar outra pessoa como estranha. Ele pensou: pensou: "O mundo egoísta nunca apreciará essa pureza. Pelo contrário ela será chamada de tola ou de maluca ou qualquer coisa assim." Por isso ele esperou uma oportunidade oportunidade para aconselhá-la. 7. Não demorou muito para que essa oportunidade chegasse. Chandra, tão simples, não podia ocultar de seu marido um pensamento sequer. Ela muitas vezes confidenciava seus pensamentos até às suas amigas. Como então poderia mantê-los ocultos daquele a quem Deus havia colocado mais próximo próximo dela do que qualqu qualquer er outra pessoa pessoa no mundo? mundo? Por isso depois depois que Kshudiram voltou de Gaya, Chandradevi, durante dias seguidos, aproveitou toda oportunidade para contar-lhe tudo o que havia visto e experimentado durante sua ausência. Um dia ela lhe disse: "Quando você estava
ausente tive um sonho estranho no qual vi um Ser luminoso deitado na minha cama. A princípio pensei que fosse você, mas logo compreendi que nenhum ser humano poderia ser assim. Acordei, mas o pensamento que o Ser luminoso ainda estava na cama continuou. Em seguida, um outro pensame pensamento nto me assalt assaltou: ou: 'Será que um deus deus sempre sempre aparece aparece a uma pessoa dessa maneira?' maneira?' Então ocorreu-me que alguma pessoa mal intencionada poderia ter entrado no quarto com um mal propósito e que talvez o barulho de suas passadas pudessem ter ocasionado meu sonho. Então tomada de grande medo, levantei-me apressadamente para acender o lampião mas descobri que ninguém estava no quarto e a porta estava e stava trancada por dentro. Mas o medo mantev manteve-me e-me acordada acordada o resto da noite. Pensei: 'Será possível que alguém tenha entrado no quarto tirando o cadeado e ao me ver acordada acordada,, tenha tenha fugido fugido depois de recolo recolocácá-lo lo de modo modo misterio misterioso?' so?' Logo que amanhece amanheceu u mandei chamar Dhani e Prasanna e depois de lhes ter contado tudo perguntei: 'Vocês acham que entrou alguém alguém em meu quarto? Não estou brigada com ninguém no vilarejo. Somente Somente outro dia tive uma pequena discussão com Madhu Jugi sobre um assunto sem importância. Será que ele com raiva tenha entrado em meu quarto?' Ambas riram e repreenderam-me, dizendo: 'Que tola! Será que a idade afetou o seu cérebro? Por que fala dessa maneira sobre seu sonho? Pense no que os outros outros dirão dirão quando quando souber souberem. em. Haverá Haverá um escâ escânda ndalo lo e você será ridiculariza ridicularizada da se falar disso a qualquer pessoa novamente'. Ouvindo o que diziam, pensei: 'Ó, então foi realmente um sonho! Nada falei a ninguém, a não ser a você quando voltou'. 8. "Out "Outra ra vez, vez, quan quando do esta estava va fala falando ndo com com Dhan Dhanii defro defront ntee ao temp templo lo dos Jugi Jugis, s, subitamente vi um Brilho Divino saindo da imagem sagrada do Grande Deus Siva, enchendo o templo e precipitando-se em ondas sobre mim. Tomada de surpresa já estava a ponto de contar a Dhan Dhanii a esse esse respei respeito, to, quan quando do de repente a Luz me envolveu envolveu e rapidamente rapidamente entrou em meu corpo. Maravilhada e com medo, cai inconsciente. Mais tarde, quando Dhani ajudou a me recuperar contei-lhe tudo. A princípio, ela ficou muito surpresa; depois disse: 'Você teve um ataque epilético.' Mas tive a sensação de que a Luz, desde então está em meu ventre e que estou grávida. Contei também a Dhani e Prasanna mas elas me repreenderam chamando-me de boba, maluca e não sei mais o que. Segundo elas, o que experimentei foi motivado por desilusão ou mal-estar no corpo. Tentando de diversas maneiras fazer-me entender isso, elas aconselharam-me a não falar sobre o ocorrid ocorrido. o. Determi Determinad nadaa a não divulg divulgar ar a ningué ninguém, m, exceto exceto a você, você, tenho tenho manti mantido do desde desde então, então, silênc silêncio. io. Bem, Bem, o que você pensa? Foi a graça de Deus que fez isso ou pode ter sido some soment ntee devido a uma possível doença? Até hoje tenho a sensação de que estou grávida." 9. Enquanto ouvia o que Chandra dizia, Kshudiram lembrava-se de seu sonho em Gaya. Então, tranquilizando-a de várias maneiras, disse: "De agora em diante você não vai falar a respeito dessas experiências e visões a ninguém exceto a mim. Fique livre de qualquer ansiedade e tenha tenha como como certo que o que quer que Raghuvi Raghuvirr mostre, mostre, por Sua graça, graça, é para o nosso nosso bem. Durante minha visita a Gaya, Gadadhara revelou-me, de uma maneira sobrenatural, que um filho nasceria de nós." Estas palavras de seu marido, que tinha uma natureza semelhante a Deus, acalmou a mente de Chandradevi; e obedecendo-o ela passou a depender unicamente unicamente de Raghuvir. Passados três ou quatro meses dessa conversa entre Kshudiram e sua esposa, tornou-se claro a todos que Chandradevi, embora já tivesse passado de quarenta e cinco anos, estava grávida de novo. Diz-se que as mulheres ganham meiguice e graça quando estão grávidas. Isso também foi notado em Chandradevi e Dhani e as outras mulheres da vila costumavam observar que ela parecia mais adorável nessa época do que antes. À medida que a novidade se espalhou, algumas delas começaram a cochichar entre si: "Imaginem uma mulher conceber nessa idade e parecendo tão doce. doce . Pode P ode até morrer por por ocasião ocasião do parto." parto." 10. Dia Dia após após dia dia desde desde que que havi haviaa conc concebi ebido, do, as visõ visões es e experi experiênc ências ias espiri espiritua tuais is de Chandr Chandradev adevii tornara tornaram-s m-see mais mais freqüen freqüentes. tes. Dizi Diziaa-se se que que entã então o as visõ visões es ocor ocorri riam am-l -lhe he quas quasee diariamente. Às vezes sentia um perfume purificador saindo dos corpos daqueles seres sagrados, perfume perfume que se espalha espalhava va pela casa toda; toda; ou então então ouvia ouvia vozes celestia celestiais is e ficava ficava tomada tomada de espanto. Dizia-se também que nessa época seu coração transbordava de amor por todos os deuses e deusas. Quase todo o dia contava a seu marido essas visões e experiências e perguntava porque lhe aconteciam. Kshudiram dava-lhe conforto de diversas maneiras e dizia-lhe para não se perturbar. Vamos relatar a seguir um episódio desse período. Soubemos que Chandra assim descreveu-o a seu marido, marido, com um sentimento sentimento de espanto: espanto: 'Ó muito reverenciado senhor, não há fim ao número de deuses e deusas que se apresentam a mim de vez em quando, desde o dia em que vi a luz em frente ao templo de Siva. Muitos deles eu jamais vira antes nem mesmo em quadros. Hoje vi um deus chegan chegando, do, montado montado num cisne. cisne. A principio principio fiquei fiquei assustad assustada; a; mas depois, sentindo sentindo pena pena dele dele porque seu rosto estava vermelho com o calor do sol, chamei-o e disse-lhe: 'O querido pequeno deus montado num cisne, seu rosto parece queimado pelo p elo sol. Tenho em casa um pouco pouco de de arroz arroz
frio, que preparei ontem. Venha, coma um pouco e refresque-se antes de ir-se embora'. Ele ouviu-me e sorriu, mas logo desapareceu e não pude vê-lo mais. Vejo muitas formas assim. Não as adoro nem medito nelas, mas vejo-as a qualquer hora do dia ou da noite. Às vezes, vem sob a forma humana e depois dissolvem-se no ar. Pode dizer-me por que vejo tudo isso? Será doença? Às vezes imagino se não estou possuída pelo espírito de Gosain." 1 (1 Depois da morte de Sukhal Goswami, vários fatos sobrenaturais haviam ocorrido e isto deu aos aldeões a idéia de que ele ou alguma outra pessoa morta na família havia se tornado um fantasma e vivia na árvore bakul em frente à casa. Sob a influência dessa crença, os aldeões costumavam dizer que, quando uma pessoa tinha uma experiência sobrenatural, estava possuída pelo espírito de Gosain. Chandradevi pensava assim.) Kshudiram a fez recordar-se novamente do sonho que tivera em Gaya e mostrou
quão feliz ela era de realmente levar em seu seio o Senhor Supremo cuja influência purificadora somente dava lugar às suas visões espirituais. Devido à sua fé absoluta nas palavras do marido, a explicação dele da situação encheram o coração de Chandra com devoção suprema. Fortificada assim ela tornou-se livre de ansiedade. O tempo rolava. Entregando-se completamente a Raghuvir, Kshudiram e sua virtuosa esposa passavam seus dias na expectativa de contemplar, na forma de seu filho, o Ser Divino cuja presença auspiciosa já havia preenchido suas vidas de profunda devoção. CAPÍTULO V NASCE UMA GRANDE ALMA ASSUNTOS: 1. Desfeita pelo marido a apreensão de Chandradevi. 2. O nascimento de Gadadhar. 3. Sinais astrológicos por ocasião do nascimento. 4. Seu nome.
1. O outono foi seguido pela 'estação do orvalho' e pelo inverno. A primavera, a 'rainha das estações' chegou. Havia uma suavidade agradável no ar e toda a criação pulsava com vida nova. O adorável mês de Phalgun - nem quente nem frio - contava somente seis dias. Havia uma grande onda de amor na natureza, que se manifestava em sua beleza - como dizem as escrituras - uma partícula da felicidade de Brahman latente em todas as coisas. De todas as estações a primavera foi recebida com um pouco mais daquela radiante felicidade divina, pois despejava muita alegria sobre o mundo. Aproximava-se o tempo de Chandradevi dar à luz e seu coração ficava cheio de alegria celestial quando preparava a oferenda diária de comida para Raghuvir. Mas em seu corpo havia um sentimento de grande lassitude. Então subitamente veio-lhe o pensamento de que algo poderia acontecer a qualquer momento e que, se ela desse à luz, não haveria ninguém em casa para preparar as oferendas. O que devia fazer? Alarmada, comunicou seus pensamentos a seu marido. Kshudiram sossegou-a, dizendo, "Não tema. Certamente Aquele que está agora em seu ventre, na hora de nascer não será obstáculo à adoração e ao serviço de Raghuvir. Não fique ansiosa; você será capaz de fazer o serviço de Raghuvir hoje. Já tomei providências para o serviço de amanhã e foi pedido a Dhani para dormir aqui a partir desta noite." Com isto Chandra sentiu uma nova força em seu corpo e alegremente continuou suas obrigações domésticas. Aconteceu exatamente como Kshudiram dissera. As oferendas do meio-dia e da tarde a Raghuvir e outros serviços dedicados a Ele terminaram sem qualquer problema. Kshudiram e Ramkumar deitaram-se depois da refeição da noite; Dhani veio e deitou-se no mesmo aposento com Chandradevi. Além do santuário de Raghuvir havia dois dormitórios com telhado de sapé e uma cozinha. Em outro aposento pequeno estava, de um lado, a máquina de descascar e no outro, um fogão para ferver o arroz. Por falta de um lugar melhor esse aposento, também com telhado de sapé, foi reservado para o parto de Chandra. 2. Faltavam doze minutos para a madrugada quando Chandradevi sentiu as primeiras dores do parto. Dhani ajudou-a a deitar-se no local escolhido e ali, quase imediatamente, ela deu à luz a um menino. Depois de ajudar a mãe, voltando sua atenção para o bebê, ficou surpresa ao ver que ele havia desaparecido do lugar onde ela o havia colocado. Alarmada, pegou o lampião para procurar a criança e descobriu que ela havia escorregado para o chão, coberta de sangue e muco, junto ao fogão e ali estava deitado com seu pequeno corpo recoberto de cinzas, ainda sem chorar! Dhani ternamente pegou a criança, lavou-a e olhando-a na luz, ficou maravilhada com sua beleza e tamanho. Parecia uma criança de seis meses! As amigas de Chandradevi, Prasanna e outras mulheres da família Lahas foram chamadas. Logo que chegaram Dhani contou-lhes o que havia acontecido. Na solene hora sagrada antes do sol nascer, o som da concha encheu a humilde choupana onde Kshudiram levava sua vida piedosa e austera e proclamou ao mundo a chegada de uma grande alma. Verificando os signos do zodíaco sob os quais a criança havia nascido, bem
versado na astrologia, Kshudiram viu que o menino havia vindo ao mundo num momento especialmente auspicioso. 3. Segundo o calendário hindu, que calcula o dia do nascer do sol de um dia até o nascer do sol do outro, era quarta-feira, sexto dia do Phalgun, ano de 1242 da Era bengali ou 1757 do ano Saka, ou quinta-feira, ou 18 de fevereiro de 1836, de acordo com o calendário gregoriano. A criança nascera doze minutos antes do sol nascer. O auspicioso segundo dia lunar da quinzena brilhante e o vigésimo dia das constelações lunares (Purvabhadrapada) haviam se combinado para ocasionar a feliz conjunção astrológica chamada Siddhiyoga. Sol, Lua e Mercúrio haviam se juntado no signo do zodíaco sob o qual o menino havia nascido. Saturno havia então alcançado o ponto mais alto do zodíaco, indicando que o menino teria uma vida especial. Os cálculos feitos de acordo com o método do grande sábio Parasara mostravam que os 'planetas' Rahu e Ketu ocupavam o ponto mais alto do zodíaco e estavam no ascendente. Finalmente Júpiter, que estava começando a subir, também exerceu uma forte e auspiciosa influência no destino da criança. 4. Mais tarde astrólogos bem conhecidos também disseram a hora do nascimento 1 (1 A descrição detalhada do horóscopo de Sri Ramakrishna que aparece nesse capítulo, foi transferida para o Apêndice, ao final do terceiro volume.) que veio sob um signo muito auspicioso do zodíaco (Lagna ou Rasi), que indicava, sem
qualquer dúvida, que a pessoa em questão "seria virtuosa e respeitada e sempre faria boas ações. Cercado de muitos discípulos, viveria num templo; fundaria uma nova instituição para ensinar religião geração após geração; e que seria universalmente reverenciada como uma grande alma, nascida de um aspecto de Narayana." Ao ouvir isso, a mente de Kshudiram ficou tomada de admiração e seu coração grato sentiu que o divino sonho em Gaya havia realmente se tornado verdadeiro. Fez então a cerimônia do nascimento e chamou o menino de Subhuchandra segundo o signo zodíaco sob o qual ele havia nascido; mas em memória de seu notável sonho, decidiu chamá-lo Gadadhar por cujo nome foi depois conhecido. Olhando para o rosto de sua linda criança e certos de seu destino único, Kshudiram e Chandradevi consideraram-se abençoados. Fizeram a cerimônia de levar a criança fora da casa pela primeira vez e dando-lhe nome, resolveram educá-la com a maior atenção. CAPÍTULO VI A INFÂNCIA DE GADADHAR E MORTE DE SEU PAI ASSUNTOS: 1. Presente de uma vaca dada por Ramachandra. 2. Encantos de Gadadhar. 3. As visões divinas de Chandradevi. 4. Gadadhar parece bem maior. 5. Sarvamangala, a irmã mais nova de Gadadhar. 6. Preparação de Gadadhar para a escola. 7. A escola dos Lahas. 8. Temperamento especial de Gadadhar. 9. Um incidente indicativo. 10. O progresso e o alcance da educação de Gadadhar. 11. Sua coragem. 12. Sua habilidade para fazer amigos. 13. Seu poder de imaginação. 14. O festival de Durga na casa de Ramachandra. 15. Kshudiram assiste ao festival. 16. Doença e morte de Kshudiram.
1. Segundo as escrituras, os pais das Encarnações como Rama, Krishna e outras, sabiam através de visões tidas antes e depois do nascimento que seus filhos estavam sob proteção especial da Providência. Contudo, a afeição paternal sempre os tornava esquecidos desse fato e enchia suas mentes de pensamentos ansiosos sobre o bem-estar de seus filhos. Isso também se aplica a Kshudiram e Chandradevi. Por isso o rosto de lótus de sua adorável criança os fez muitas vezes esquecer o sonho divino em Gaya e a visão celestial perto do templo de Siva e eles começaram a imaginar várias maneiras para seu cuidado e sua alimentação. A notícia do nascimento foi levada a Ramachandra, o próspero sobrinho de Kshudiram em Medinipur. Temendo que não houvesse leite suficiente na família de seu pobre tio, enviou-lhe uma vaca leiteira, tirando assim a ansiedade de Kshudiram. Embora todo o necessário para o recém-nascido viesse de maneira inesperada de diferentes lugares, não havia fim para a ansiedade dos pais. O tempo continuava a passar. 2. À medida que os dias passavam, os encantos do bebê começaram cada vez mais a atrair as pessoas. Cativava os corações não somente de seus pais e de cada membro da família, mas também das mulheres do vilarejo. Sempre que elas tinham tempo livre, corriam para Chandra e se ela lhes perguntava porque haviam vindo, respondiam: "O que vamos fazer? Nossa saudade de ver seu bebê traz-nos aqui todos os dias." Dali em diante as mulheres das famílias dos vilarejos vizinhos também começaram a ir à humilde cabana de Kshudiram com mais freqüência do que antes. Crescendo sem necessidades e cercado de amor e carinho o recém-nascido gradualmente passou seu quinto mês e o tempo da primeira cerimônia do arroz havia chegado. A princípio Kshudiram decidiu fazer a cerimônia de maneira simples, de acordo com suas posses. Sua idéia era limitar as cerimônias ao mínimo de exigências das escrituras, restringir os
convites a poucos parentes próximos e acabar a cerimônia aumentando a criança com o arroz normalmente oferecido a Raghuvir. Mas, na realidade, as coisas tomaram um curso diferente. Ao pedido sigiloso do grande amigo de Kshudiram, Dharmadas Laha, proprietário da vila, os antigos Brahmanas e outros principais homens do vilarejo foram a Kshudiram e para sua grande surpresa, insistiram que ele deveria alimentar todos, naquele dia auspicioso. Kshudiram estava numa posição difícil porque, já que todos os aldeões o respeitavam e o amavam muito, ele não podia decidir quem convidaria ou não. Ao mesmo tempo, convidar todos estava fora de cogitação, devido a seus escassos recursos. Convencido, no fundo do seu coração, que Raghuvir lhe mostraria o caminho, buscou o conselho de seu amigo Dharmadas. Logo que veio a saber que Dharmadas desejava tomar para si a responsabilidade de dirigir a cerimônia, Kshudiram deixoulhe todo o encargo e voltou para casa. Dharmadas com muita alegria fez todos os preparativos para a cerimônia, quase que totalmente às suas expensas e a festividade decorreu tranquilamente. Soubemos que pessoas de todas as castas do vilarejo vieram à choupana de Kshudiram para a cerimônia e divertiram-se, comendo a oferenda de Raghuvir. Muitos mendigos também tiveram sua porção naquele dia e todos despediram-se abençoando o filho de Kshudiram. 3. Com o passar do tempo cada pequena ação de Gadadhar parecia mais doce e enchia o coração de Chandradevi de alegria. Ela, contudo, não estava totalmente livre de temor. Antes do nascimento da criança, jamais havia pedido qualquer favor aos deuses, mas agora, movida pelo amor maternal, seu coração despejava orações por seu filho mil vezes por dia, consciente ou inconscientemente. Contudo não podia evitar a ansiedade completamente. O pensamento do cuidado e do bem-estar do filho enchia sua mente por completo, o que obstruía até suas visões espirituais. Elas entretanto, vinham-lhe de vez em quando e enchiam-na de espanto, às vezes com o pressentimento de algum mal. Vamos relatar a seguir um exemplo como foi ouvido de uma fonte confiável. 4. Certa manhã Gadadhar já com sete ou oito meses, dormiu no colo de sua mãe. Chandra colocou-o dentro do mosquiteiro e saiu para atender seus afazeres domésticos. Pouco tempo depois ao voltar ao aposento, viu que ao invés da criança, uma estranha pessoa, alta, estava deitada debaixo do mosquiteiro, ocupando a cama inteira. Muito alarmada Chandra saiu correndo e chamou seu marido. Logo que ele chegou, contou-lhe o que havia visto, mas ao examinarem ninguém foi encontrado, a não ser a criança, dormindo como antes. Mesmo assim os temores de Chandra não diminuíram. Ela continuava repetindo, "Estou certa de que foi um espírito que fez isso. Vi claramente uma pessoa alta deitada na cama onde nosso filho está. Não foi certamente uma ilusão. Como pode ser? Chame imediatamente um exorcista experiente para examinar a criança, senão algum mal pode cair sobre ela." Kshudiram consolou-a dizendo, "Nada há de estranho que você tenha essas visões sobre nosso filho mesmo agora; porque fomos abençoados com elas antes de seu nascimento. Então tire a idéia de que isso foi feito por um espírito. Com Raghuvir em casa será possível que os espíritos venham aqui fazer mal à criança? Portanto fique sossegada e nada fale com ninguém. Fique certa que Raghuvir sempre o protege". Apesar de tranquilizada pelas palavras do marido, o temor de que algum mal sobreviesse à criança ainda assaltava a mente de Chandra como uma sombra. Durante muito tempo, naquele dia, de mãos postas, verteu sobre Raghuvir toda a angústia de seu coração. 5. Assim passaram-se os anos trazendo para os pais de Gadadhar alegria e tristeza, exaltação e ansiedade. A alegre atração, que desde o início o menino exercia sobre eles e sobre os outros, aumentava a cada dia. Gradualmente quatro ou cinco anos se passaram. Durante esse período, nasceu o último filho de Kshudiram, uma menina chamada Sarvamangala. 6. À medida que Gadadhar crescia, Kshudiram enchia-se de admiração e alegria vendo o desenvolvimento da extraordinária memória e inteligência do menino. Às vezes tomava em seu colo a travessa criança e lhe repetia uma longa lista dos nomes de seus ancestrais, pequenos hinos a deuses e deusas e as diversas maneiras de homenageá-los, ou as maravilhosas histórias do Ramayana e Mahabharata. Viu que Gadadhar conseguia aprender e recordar-se somente ouvindo uma vez, a maior parte do que lhe era contado e que quando lhe era pedido para repeti-los, fazia-o sem cometer falha. Ao mesmo tempo, descobriu que, assim como o menino aprendia e recordava algumas coisas com muita avidez e também mantinha-se indiferente a outras que não lhe atraíam, apesar de todos os esforços feitos para despertar seu interesse. Reparou isso quando tentava ensinarlhe aritmética, especialmente a tabuada de multiplicação e pensou ser desnecessário forçar o impaciente jovem, ainda tão novo, a aprender aquelas lições. Descobrindo contudo, que o menino se tornava cada vez mais inquieto, mandou-o a uma escola depois da cerimônia usual. Gadadhar tinha então cinco anos. Ficou muito feliz em conhecer meninos de sua idade e seus modos encantadores tornaram-no querido deles e do professor.
7. A escola ocupava o espaçoso vestíbulo do teatro defronte à casa dos Lahas, senhores da terra do vilarejo. O professor pago principalmente por ele ensinava seus próprios filhos e as crianças da vizinhança. De fato foram os Lahas os principais responsáveis pelo estabelecimento da escola. Não era longe da casa de Kshudiram e ocorria em dois turnos diários, um pela manhã e, outro pela tarde. As crianças tinham aulas de duas a três horas pela manhã e então, voltavam para casa para tomar banho e comer. Regressavam novamente às três ou quatro da tarde onde permaneciam até o pôr do sol. Meninos pequenos como Gadadhar não tinham, naturalmente, que estudar durante um período tão longo, mas deveriam permanecer na escola. Depois de terminar suas lições, os pequeninos ficavam em seus lugares ou, às vezes, iam brincar. Os mais velhos ajudavam os recém-chegados em suas lições e também, acompanhavam-nos a repassá-las. Assim, embora a escola contasse somente com um professor o trabalho desenvolvia-se suavemente. Um senhor chamado Jadunath Sarkar era o encarregado quando Gadadhar entrou para a escola, mas aposentou-se logo depois por diversas razões e um outro professor chamado Rajendranath Sarkar ficou em seu lugar. 8. Os maravilhosos sonhos e visões que anunciaram o grande destino espiritual de Gadadhar mesmo antes de seu nascimento, ocasionaram uma impressão duradoura na mente de Kshudiram. Assim, sempre que encontrava o menino fazendo alguma travessura, como qualquer criança levada, jamais era severo com ela. Pelo contrário, gentilmente pedia ao menino para não fazê-lo novamente. De vez em quando notava sinais de teimosia em Gadadhar, mas não estava certo se isso era devido à excessiva atenção que todo o mundo lhe dava, ou se era a natureza do menino. Ao invés de ir à escola, o voluntarioso menino ia brincar com seus amigos fora do vilarejo; ou sem se importar de dizer a alguém, ia uma representação ao ar livre chamada Yatra em algum lugar na vizinhança. Kshudiram não o repreendia por ser voluntarioso, como outros pais teriam feito; porque agora, ele estava convencido de que isto era o que finalmente ajudaria o menino a ser grande. Havia uma boa razão para que ele assim pensasse, já que invariavelmente descobria que Gadadhar não sossegaria enquanto não terminasse o que havia empreendido; que ele jamais tentaria esconder qualquer ato dizendo uma mentira e que, acima de tudo, jamais pensaria em fazer mal a alguém. Mas havia uma coisa que realmente preocupava Kshudiram. Quando pediam ao menino ou lhe proibiam fazer algo, deliberadamente ele contrariava a instrução até que lhe fosse mostrada uma razão que falasse a seu coração e entendimento. Kshudiram compreendeu que realmente isso mostrava o desejo do menino de saber o "porquê" e "para que" de tudo. Compreendeu também que as pessoas não tolerariam esse tipo de comportamento nem teriam o trabalho de satisfazer a curiosidade do menino, mostrando-lhe a razão de tudo. Como resultado, pensou que seria possível que o menino ocasionalmente fosse conduzido a ignorar as regras convencionais de boa conduta. Foi a ocorrência naquela época, de um pequeno incidente que deu origem a essa apreensão de Kshudiram, o que também tornou compreendido o trabalho da mente do menino e ele começou, cuidadosamente, a orientá-lo. 9. Há um grande reservatório conhecido como Haldarpukur, próximo à casa de Kshudiram. Todos os aldeões utilizavam aquelas águas puras e claras para tomar banho, beber, cozinhar, etc. Havia dois ghats de banho, um para homens, outro para mulheres. Jovens como Gadadhar costumavam utilizar o ghat reservado para mulheres. Certo dia, chegando para tomar banho com alguns meninos de sua idade, Gadadhar começou a pular e nadar na água, tornando-se um transtorno para as mulheres que estavam se banhando ali. As senhoras de mais idade, ocupadas com suas orações e devoções diárias, viram que de vez em quando um pouco de água respingava nelas. Por isso pediram aos meninos para pararem, mas eles não as ouviram. Aborrecida, uma das mulheres os repreendeu, dizendo: "Por que vocês vêm aqui? Não podem ir ao ghat de homens? Aqui as mulheres lavam as roupas depois do banho. Vocês devem saber que as mulheres não devem ser vistas despidas." Gadadhar perguntou: "Por que não?" Ao invés de fazê-lo compreender, ela começou a repreendê-lo ainda mais. Vendo que as mulheres estavam aborrecidas temendo que fossem queixar-se a seus pais, os meninos melhoraram seu comportamento. Gadadhar, todavia, imaginou um plano. Durante dois ou três dias escondeu-se atrás de uma árvore perto do reservatório e espiava as mulheres enquanto tomavam banho. Quando mais tarde ele encontrou a senhora idosa que havia brigado com ele, disse-lhe: "Anteontem vi quatro mulheres tomando banho, ontem seis e hoje, oito. Mas vi que nada me aconteceu!" Ela foi a Chandra e contou-lhe, rindo, o que o menino havia dito. Num momento oportuno Chandra falou gentilmente com Gadadhar, mas de uma maneira convincente: "É verdade que nada lhe acontecerá quando você fizer isto; mas as mulheres se sentirão insultadas. Elas de modo algum são diferentes de mim; se você as insultar será o mesmo que me insultar. No futuro não faça nada que fira o sentido de honra delas. É correto ferir seus sentimentos, que é a mesma coisa que me ferir?" O menino entendeu e jamais
veio a se comportar daquela maneira outra vez. 10. Para resumir, o progresso de Gadadhar não era mau. Dentro de pouco tempo já podia ler e escrever palavras e frases simples. Mas sua aversão à aritmética continuava. Por outro lado tornava-se cada vez mais hábil na mímica, mostrando sua originalidade de diversas maneiras. Vendo os ceramistas do vilarejo fazendo imagens de deuses e deusas, passou a visitá-los e aprendendo sua arte, começou a praticá-la em casa, o que veio a constituir um de seus passatempos. De maneira semelhante começou a se relacionar com pessoas que pintavam e ele mesmo começou a pintar. Sempre que sabia que alguém estava lendo ou explicando os Puranas no vilarejo ou que um drama religioso estava sendo representado, ia para lá e começou assim a conhecer as histórias das escrituras. Ao mesmo tempo observava minuciosamente a maneira de apresentação que atraía mais a audiência. Sua memória maravilhosa e sua aguda percepção interior foram de grande valia nesses assuntos. Desde tenra idade seu notável poder de imitação e seu inerente senso de graça, ajudaram o esperto menino a imitar os gestos peculiares de homens e mulheres. Ao mesmo tempo, o exemplo diário de seus pais ajudou a desabrochar sua pureza inata e seu amor a Deus. Em sua maturidade recordava-se disso e costumava reconhecer com o coração grato com dívida para com seus pais. As seguintes palavras que nos dirigiu nos últimos dias em Dakshineswar ajudarão o leitor a entender esse ponto: "Minha mãe era a personificação da simplicidade. Nada compreendia a respeito de assuntos mundanos e não podia contar dinheiro. Não compreendendo o perigo de dizer tudo a todas as pessoas, falava a qualquer um o que lhe vinha à cabeça. Por isso as pessoas chamavam-na 'tola'. Também gostava de alimentar a todos. Meu pai jamais aceitou presentes de pessoas inferiores. Passava a maior parte do dia em adoração, Japa e meditação. Durante as orações diárias, enquanto recitava a adoração do Gayatri, dizendo: 'Ó Brilhante, Ó doador de graças, venha,' etc., seu peito estufava, tornava-se entumescido e ele ficava banhado em lágrimas. Quando não estava ocupado com a adoração ou outras práticas religiosas, passava seu tempo fazendo grinaldas de flores com linha e agulha para adornar Raghuvir. Sua relutância em dar falso testemunho o fez abandonar a propriedade ancestral. Os aldeões prestavam-lhe o respeito e a reverência devidos a um sábio." 11. A medida que os dias passavam a espetacular coragem do menino também começou a se manifestar de diversas maneiras. Sem a mínima relutância ia a lugares onde até pessoas mais velhas não ousavam ir, com medo de fantasmas, duendes e seres semelhantes. A irmã de seu pai, Ramsila, às vezes era tomada pelo espírito da deusa Sitala. Tornava-se então outra pessoa. Certa vez por essa época, quando estava hospedada na casa de seu irmão em Kamarpukur, uma dessas transformações periódicas ocorreu-lhe e todos na casa olhavam-na com medo e devoção. Gadadhar observou sua tia naquele estado, sem dúvida com respeito, mas sem qualquer medo. Permaneceu perto dela e observou minuciosamente a mudança que lhe ocorria. Depois de certo tempo, disse: "Seria esplêndido se o espírito que tomou posse de minha tia me possuísse." 12. O leitor já está familiarizado com Manikraja, o dono das terras do vilarejo de Bhursubo, conhecido por sua caridade e devoção. Atraído pela natureza piedosa de Kshudiram, tornou-se seu amigo íntimo. Um dia, Gadadhar, então com seis anos, foi com seu pai à casa de Manikraja. Ele comportou-se em relação a todos da casa como se fossem seus velhos amigos; parecia tão natural e doce com eles que, a partir daquele dia, tornou-se querido de todos. O irmão de Manikraja, Ramjay, ficou tão encantado, que disse a Kshudiram: "Amigo, esse seu filho não é uma criança comum. Parece-me que possui qualidades divinas num grau elevado. Sempre que vier aqui traga-o com você. Sinto-me tão feliz quando o vejo." Por diversas razões Kshudiram não pôde voltar à casa de Manikraja por algum tempo e por isso Manikraja enviou uma das senhoras de sua família para saber a razão e se possível, trazer Gadadhar para uma pequena visita a Bhursubo. Quando seu pai perguntou-lhe se queria ir, o menino ficou feliz e saiu com a senhora. Regressou a Kamarpukur antes do anoitecer com presentes de muitos doces e enfeites. Gadadhar tornou-se tão querido daquela família Brahmana, que eles costumavam buscá-lo sempre que Kshudiram não podia ir a Bhursubo por alguns dias. 13. Gradualmente passou-se um ano e Gadadhar tinha agora sete anos. À medida que a natureza doce da criança se desenvolvia, todos o amavam cada vez mais. Sempre que as mulheres do vilarejo preparavam qualquer guloseima em suas casas, seu primeiro pensamento era guardar-lhe um pedaço. Seus companheiros não se sentiam felizes enquanto não repartissem a comida com ele. Tinha modos tão encantadores, falava e cantava com tanta doçura, que os vizinhos alegremente aguentavam suas travessuras. Por essa época ocorreu um incidente que tornou os pais e amigos de Gadadhar muito ansiosos pelo menino. Pela graça do Senhor, Gadadhar havia nascido com uma constituição forte e robusta e até aquele dia não havia sofrido qualquer doença. Era maravilhosamente cheio de vida e alegre como uma ave livre. Médicos renomados dizem que a
ausência da consciência do corpo é sinal de saúde. Era dessa espécie de saúde que o menino gozava desde seu nascimento. Como por natureza fosse dotado de grande poder de concentração, ficava tão identificado com o objeto no qual punha sua mente, que parecia ter perdido inteiramente a consciência exterior. A visão encantadora de vastos campos verdes tocados pela suave brisa, o fluxo incessante do rio, os cantos melodiosos dos pássaros e acima de tudo, a magia das nuvens sempre cambiantes no profundo céu azul, às vezes revelavam seu mistério e sua glória à visão interior do menino e o tornavam enfeitiçado. Então ele se perdia completamente e entrava no desconhecido, distante e solitário domínio do espírito. A experiência que relataremos teve sua origem na tendência do menino para a contemplação espiritual da beleza. Um dia, quando andava à vontade nos campos, Gadadhar olhou para o céu e viu uma escura nuvem que acabara de se formar e contra ela o movimento ordenado de um bando de patos selvagens em pleno vôo, com as asas brancas abertas. O menino ficou tão absorvido nessa beleza que a consciência de seu corpo e de todo o ambiente em volta dele desapareceu completamente e ele caiu inconsciente (vide II-2). Seus amigos, encontrando-o naquele estado, ficaram alarmados e aflitos. Mandaram avisar os pais e o menino foi levado do campo para casa. Logo que retomou a consciência, voltou novamente a ser o que era antes. Naturalmente esse incidente causou muita preocupação a Kshudiram e a Chandradevi, que pensaram em diversas maneiras de impedir que esse fato ocorresse novamente. Pensaram que pudesse ser um começo de desmaios e procuraram arranjar remédios como por exemplo, ritos propiciatórios. Gadadhar disse-lhes repetidamente que o que lhe ocorrera tinha sido o fato de estar mergulhado num sentimento jamais experimentado antes e que, embora tivesse sido encontrado exteriormente inconsciente, em verdade estava internamente consciente e havia experimentado uma felicidade ímpar. Contudo, como isso não voltasse a se repetir, a saúde do menino foi considerada satisfatória. Kshudiram entretanto, sentiu que ele estava sujeito a ataques e Chandra ficou convencida de que estivera à mercê de maus olhares. Por causa dessas incertezas, sua freqüência à escola foi suspensa por algum tempo. Assim, livre para ir onde quisesse no vilarejo, o menino entregou-se a brincadeiras, à alegria, mais do que nunca. 14. Gadadhar tinha mais ou menos sete anos e meio por ocasião do grande festival de outono de Bengala, em 1843. O leitor já conhece Ramchandra Bandyopadhyaya, o próspero sobrinho de Kshudkam. Ele costumava passar a maior parte de seu tempo em Medinipur, por necessidade de sua profissão de advogado, até que sua família veio morar na casa ancestral de Selampur. Todos os anos Ramchandra celebrava, com grandes gastos, o grande festival de outono em sua vila natal. Ouvimos de Hriday que durante os oito dias de adoração, a casa de Selampur costumava vibrar com música e cantos. A família experimentava um fluxo contínuo de alegria, ao alimentar Brahmanas, oferecendo presentes aos Pundits, aumentando e dando roupas aos pobres. Nessas ocasiões Ramchandra costumava levar o querido tio à sua casa para passar alguns dias com ele. Naquele ano, também, Kshudiram e sua família foram cordialmente convidados ao chegar o tempo daquela festa. 15. Kshudiram estava com quase sessenta e oito anos e havia perdido o antigo vigor devido à dispepsia e disenteria sofridas diversas vezes nos últimos anos. Por isso, apesar do desejo de ir, hesitou em aceitar o amável convite de seu querido sobrinho. Começava a sentir uma inexplicável mas forte vontade de não deixar sua humilde cabana, sua família e especialmente Gadadhar mesmo por alguns dias. Então pensou: "Se eu não for este ano, quem sabe se com a fraqueza que aumenta a cada dia, serei capaz de ir novamente?" Primero quis levar Gadadhar, mas lembrou-se que isso tornaria Chandra muito ansiosa. Como não podia levar Gadadhar decidiu ir com o filho mais velho Ramkumar, passar alguns dias em adoração com Ramchandra, para voltar em seguida. Prestou homenagem a Raghuvir, deu adeus a todos, beijou Gadadhar e partiu para Selampur poucos dias antes do começo do festival. Ramchandra ficou muito feliz com a chegada de seu querido tio e do primo Ramkumar. 16. Kshudiram teve reincidência de seu antigo mal, a disenteria, logo que chegou a Selampur e ficou sob tratamento. Isso, entretanto, não interferiu em seu estado de alegria no qual o sexto, o sétimo e o oitavo dia da quinzena brilhante eram passados. No nono dia, porém, a doença de Kshudiram tomou um rumo fatal e ocasionou grande ansiedade naquele ambiente de alegria. Ramchandra chamou médicos eficientes e cuidou de seu tio com a ajuda da irmã, Hemangini e do primo, Ramkumar. O estado de Kshudiram não melhorou. O nono dia passou mais ou menos, mas logo chegou o décimo dia (Vijaya), especialmente sagrado para os hindus como tempo de reconciliação. Naquele dia Kshudiram estava tão fraco que lhe era extremamente difícil falar. Logo que a cerimônia de imersão da imagem de Durga terminou à tarde, Ramchandra apressou-se a voltar junto ao leito do tio. Viu que seu último momento se aproximava. Perguntando, soube que Kshudiram estivera deitado silencioso naquele mesmo estado por muito tempo. Então Ramchandra
disse-lhe com lágrimas: "Tio, o senhor sempre toma o nome de Raghuvir. Por que não o faz agora?" O som daquele nome imediatamente ergueu Kshudiram que, com voz trêmula, hesitante, disse: "É você, Ramchandra? Você chegou depois de mergulhar a imagem? Então ajude-me a sentar." Quando Ramchandra, Hemangini e Ramkumar o ajudaram, com muito cuidado, a se sentar na cama, Kshudiram em tom solene pronunciou três vezes o nome de Raghuvir e deixou o corpo. A gota d'água misturou-se assim com o oceano. O Senhor Raghuvir uniu o sopro de vida do devoto com Sua vida infinita e abençoou-o com a imortalidade e a paz duradoura. Altas horas da noite os cantos em louvor ao Senhor repercutiram por todo o vilarejo. O corpo de Kshudiram foi levado às margens do rio e incinerado, sendo consagrado no fogo. As notícias chegaram a Kamarpukur no dia seguinte e encheram de tristeza o lar até então feliz. Quando o período de luto passou, Ramkumar fez a cerimônia de Sraddha, como está prescrita nas escrituras e aumentou muitos Brahmanas, concluindo assim, os últimos ritos em homenagem a seu pai. Diz-se que Ramchandra deu uma grande soma de dinheiro para as despesas da cerimônia feita em honra do tio falecido. CAPÍTULO VII A MENINICE DE GADADHAR ASSUNTOS: 1. O impacto da morte de Kshudiram na família. 2. Seu efeito na mente de Gadadhar. 3. Comportamento de Gadadhar para com a mãe. 4. Gadadhar mantém companhia com os santos. 5. Bhavasamadhi de Gadadhar. 6 . 7 . Seu amigo do peito Gayavishnu. 8. Seu Upanayana. 9. Sua solução para um ponto de discussão na reunião de eruditos. 10. Seu Bhavasamadhi pela terceira vez. 11. Bhavasamadhis repetidos. 12. As causas da aversão de Gadadhar em ir à escola. 13. Progresso da educação de Gadadhar. 14. Casamento de Rameswar e de Sarvamangala . 15. A mudança no comportamento da esposa de Ramkumar. 16. A mudança na condição financeira de Ramkumar . 17. A morte da esposa de Ramkumar.
1. Com a morte de Kshudiram a vida da família foi afetada de diversas maneiras. Ele havia sido o companheiro de Chandra nos momentos bons e maus durante quarenta e quatro longos anos. Era pois natural que agora ela achasse o mundo vazio sem ele e a cada momento sentisse sua falta. Durante muito tempo ela havia se acostumado a se refugiar aos pés de lótus de Raghuvir e agora o mundo não mais a atraía, sua mente estava integralmente dirigida para aquela direção. Mas o mundo não a liberaria até que o tempo estivesse maduro. Gradualmente jogou-a novamente nas alegrias e tristezas do quotidiano, por causa das preocupações com seu Gadadhar de sete anos e sua filha de quatro, Sarvamangala. Assim Chandra, com o coração partido, dedicava seus dias ao serviço de Raghuvir e à educação dos filhos mais novos. Após a morte de Kshudiram, toda a responsabilidade de manter a família ficou nos ombros de seu filho mais velho, Ramkumar. Ora, como ele não podia perder o tempo com a tristeza, sua mente e energia foram empregadas para que não faltasse nada à sua desolada mãe e a seus irmãozinhos menores. Esperava-se que seu irmão mais novo Rameswar, agora com dezoito anos, ajudasse a família ganhando dinheiro assim que terminasse os estudos de Smriti e Jyotisha; até Ramkumar teve que tentar melhorar a condição da família com sua própria renda. Sua competente esposa, vendo que Chandradevi não aguentava todo o serviço, tomou para si a maior parte da tarefa de cozinhar e dos outros serviços domésticos. 2. É de experiência geral que nada torna a vida tão vazia como a perda da mãe na meninice, a morte do pai na infância e a perda da esposa na juventude. Sendo totalmente dependentes do carinho e do amor da mãe, a criança não sente a perda do pai mesmo que ele morra, mas ao crescer e chegado o despertar de sua inteligência, fica consciente da afeição especial do pai. O coração da criança começa a ser atraído para o pai assim que descobre que somente ele pode satisfazer certos desejos que sua querida mãe não pode. Seu sentimento de perda é por essa razão muito forte, se o pai morre nessa época. Gadadhar também sentiu-se assim quando Kshudiram morreu. Muitas pequenas coisas recordavam-lhe diariamente o pai e uma profunda tristeza permanecia em seu coração. Mas sendo mais refletido e disciplinado do que os outros de sua idade, Gadadhar jamais demonstrava abertamente seu pesar, por consideração aos sentimentos da mãe. Para todos o menino continuava cheio de alegria e de jovialidade. Embora fosse às vezes visto vagueando sozinho no campo de cremação de Bhutir Ghal, no pomar de Manikraja e em outros lugares solitários, ninguém imaginava que pudesse haver outra razão para isso a não ser uma inquietude natural. Mas, na verdade, Gadadhar tornava-se mais introspectivo e amante da solidão Estudava também os diversos modos das pessoas e a todos observava minuciosamente. 3. Aqueles que sofreram e sentiram a mesma perda, aproximam-se uns dos outros.
Talvez tenha sido essa a razão pela qual Gadadhar sentia-se agora especialmente voltado para sua mãe. Ficava a seu lado muito mais tempo do que antes e sentia-se feliz em ajudá-la o quanto podia no serviço dos deuses e nas tarefas domésticas. Não levou muito tempo para que ele percebesse que quando estava com ela, sua mãe quase se esquecia da perda sofrida. A atitude do menino em relação à mãe também apresentou uma mudança. Depois da morte de seu pai jamais pediu-lhe qualquer coisa com a mesma insistência de antes, pois compreendeu que o sentimento de pesar afloraria no coração dela e que ela ficaria muito infeliz se não pudesse satisfazer qualquer um de seus desejos. Em resumo, um estranho desejo de proteger a mãe de todas as maneiras desabrochou no coração de Gadadhar. 4. Gadadhar voltou a frequentar a escola. Embora se esperasse que ele assistisse regularmente às aulas, seu interesse real agora era recitar os Puranas e fazer imagens de argila de deuses e deusas. Talvez sentisse que sua absorção nessas ocupações o ajudaria a esquecer a perda do pai. Nessa época também, encontrou um novo interesse, compatível com seu temperamento. Para conforto dos peregrinos, os Lahas abriram mão de uma casa situada na esquina sudeste do vilarejo, na estrada de Puri. Homens religiosos, desapegados das coisas mundanas, abrigavam-se naquela casa em seu caminho para Puri, a fim de adorar o senhor Jagannath e também em seu caminho para casa. Enquanto ali hospedados, vinham ao vilarejo pedir esmolas em diversas casas. Gadadhar sabia através dos Puranas que os monges, depois de conseguirem desapego, renunciam a esse mundo transitório e dedicam-se inteiramente à realização do Senhor. O sentimento do menino a respeito da transitoriedade do mundo havia se fortalecido desde a morte do pai. Ouvira também que a associação com santos conduz à bênção da paz suprema. Por isso ele agora começou a visitar aquela casa de peregrinação sempre que podia, para se familiarizar com os monges. Ali viu como de manhã e à tarde eles queimavam o Dhuni (fogo sagrado) e sentavam-se à sua volta, absorvidos em meditação; como ofereciam o alimento simples que conseguiam através de esmolas às suas Divindades Escolhidas e dividiam-no entre si com satisfação; como, com absoluta dependência de Deus, procuravam suportar com paciência até doenças graves e como evitavam perturbar quem quer que fosse para atender às suas necessidades urgentes. Descobriu, porém, como em suas fileiras haviam também hipócritas vestidos de monges, vivendo somente para fins egoístas desrespeitando todos os pontos essenciais de uma conduta reta. Gradualmente, passou a misturar-se intimamente com os monges autênticos, ajudando-os em pequenas tarefas, como pegar lenha ou carregar água para beber. Eles, por sua vez, começaram a gostar daquele menino de boa aparência, maneiras doces e ensinaram-no a orar e a cantar louvores ao Senhor. Também instruiram-no sobre vários assuntos religiosos e sentiam-se felizes em dividir com ele a comida obtida com as esmolas. Naturalmente Gadadhar podia misturar-se assim, somente com aqueles monges que, por uma razão ou outra, passavam considerável tempo na casa dos peregrinos. 5. Quando o menino estava com oito anos, alguns monges ficaram na casa dos peregrinos durante muitos dias para descansar, depois de longa e difícil viagem ou por qualquer outra razão similar. Gadadhar reuniu-se a eles como sempre e logo tornou-se querido por todos. No início, ninguém mais sabia nada a esse respeito, mas quando o relacionamento do menino com os monges tornou-se íntimo e ele começou a passar ali muito tempo, as pessoas começaram a notar. Certos dias comia tanto com os monges que quando chegava em casa não tinha mais fome. Quando Chandradevi perguntava-lhe a razão, dizia-lhe qualquer coisa. No início, a mãe não se incomodou. Pelo contrário, o fato de ter conquistado os corações dos monges parecia-lhe uma bênção e ela começou a enviar-lhes, pelo menino, comida e outros artigos necessários, mas depois aconteceu que o menino começou a voltar para casa às vezes com o corpo coberto de cinzas sagradas ou com emblemas na testa e outras vezes usando, como os monges, um 'Kaupina' ou tanga feita rasgando a própria roupa. Ele então dizia, "Olhe mãe como os homens santos me enfeitaram!" Tais fatos incomodaram muito Chandra, porque ela temia que um dia os monges pudessem persuadir o menino a ir embora com eles. Expressou seu temor a Gadadhar e começou a chorar. Apesar de todos os esforços para dissipar seu temor, o menino não pode acalmá-la. Decidiu então não mais ficar com os monges e a fez sabedora dessa resolução. Isso finalmente acalmou a ansiedade de Chandra. Gadadhar foi então até os monges para dar-lhes adeus para sempre. Quando lhe perguntaram a razão, falou-lhes da apreensão de sua mãe. Ouvindo-os os monges foram até Chandradevi e asseguraram-lhe que o pensamento de levar Gadadhar com eles jamais havia passado por suas mentes; porque carregar um menino de pouca idade sem a permissão dos pais, disseram, seria um roubo, uma ofensa indigna de qualquer religioso. A isso, qualquer sombra de apreensão abandonou Chandradevi e ela prontamente concordou em deixar o menino visitá-los como antes.
6. Outro incidente nessa época causou grande ansiedade a Chandra por causa de Gadadhar. Embora todos tivessem considerado como ocorrência casual, foi na verdade o resultado da tendência crescente do menino para a contemplação espiritual e pensamento profundo. Certo dia, a caminho do conhecido templo da deusa Visalakshi em Anur, um vilarejo a duas milhas ao norte de Kamarpukur, ele subitamente perdeu por completo a consciência exterior. Prasannamayi, a piedosa irmã de Dharmadas Laha, uma de suas companheiras, compreendeu que havia sido a consciência espiritual do menino que ocasionara a inconsciência. (Vide II, 2). Mas quando Chandradevi soube, ficou ansiosa pensando que se tratava de uma doença física. Também nessa ocasião Gadadhar insistiu que estivera naquele estado porque sua mente havia se unido à deusa, enquanto ele a contemplava. 7. Passaram-se dois anos e gradualmente, os altos e baixos da vida fizeram o menino esquecer a perda do pai. Já mencionamos o amigo de Kshudiram, Dharmadas Laha. Nessa época Gadadhar tornou-se amigo íntimo do filho de Dharmadas, Gayavishnu. Os dois meninos atrairam-se mutuamente nas aulas e nos passeios. Começaram a se chamar 'pai' (companheiros) e costumavam diariamente passar muito tempo juntos. Gadadhar sempre levava o amigo quando convidado e alimentado pelas mulheres do vilarejo. Não comia doces e outras guloseimas preparadas por sua antiga babá Dhani, enquanto não tivesse dado um pedaço a Gayavishnu. Os responsáveis dos Dharmadas e de Gadadhar ficaram felizes com a amizade dos dois meninos. 8. Quando Ramkumar viu que Gadadhar em breve completaria nove anos, começou a fazer os preparativos para sua investidura com o cordão sagrado (Upanayana). Muito tempo antes, Dhani, que pertencia à casta dos ferreiros, havia dito ao menino que ela se consideraria abençoada se, por ocasião de sua investidura, ele aceitasse esmolas dela e a chamasse 'mãe'. O menino ficou tão tocado por aquela afeição sincera, que prometeu atender seu desejo. Confiando na promessa do menino, a mulher começou a juntar dinheiro e outros requisitos, da melhor maneira possível e ansiosamente esperou aquele acontecimento. No momento propício Gadadhar mencionou a promessa a seu irmão mais velho mas Ramkumar objetou porque tal quebra no costume usual vinha contra a tradição da família. O menino, por sua parte, insistiu em manter sua promessa e argumentou que se ele cedesse à objeção, seria culpado por quebrar sua promessa e que uma pessoa não veraz não estava preparada para usar o cordão sagrado. À medida que a época da investidura se aproximava tudo foi organizado. Mas temia-se que haveria problema com a execução da cerimônia, pela insistência de Gadadhar. Quando as notícias chegaram a seus ouvidos, Dharmadas tentou resolver a divergência. Disse a Ramkumar: "Embora até hoje isso não tenha acontecido em sua família, já foi feita em muitas famílias Brahmanas boas em outros lugares. Por isso em nenhuma falta incorrem aqueles que o permitem. Você deve, também, considerar a questão de satisfazer a consciência de Gadadhar e sua paz de espírito". A essas palavras do amigo de seu pai, o velho sábio Dharmadas, Ramkumar e outros evitaram levantar maiores objeções. Gadadhar então, com o coração cheio de alegria, colocou o cordão sagrado segundo as prescrições das escrituras e dedicou sua mente a fazer o Sandhya, a adoração, etc., como é apropriado a um Brahmana. Dali em diante, Dhani também considerou sua vida abençoada por causa de seu novo relacionamento com o menino, que a chamou de 'mãe' e aceitou sua Bhiksha. Pouco tempo depois o menino entrava em seu décimo aniversário. 9. Nessa ocasião, os aldeões ficaram maravilhados com um acontecimento que mostrou o gênio celestial ímpar de Gadadhar (Vide III.4). Uma grande reunião de eruditos ocorreu na casa dos Lahas durante uma cerimônia Sraddha. Nessa reunião levantou-se uma controvérsia relativa a uma questão teológica complicada e os eruditos não puderam chegar a uma solução correta do ponto em questão. Gadadhar, que estava presente, resolveu o problema de tal maneira que, depois de ouvir o que ele disse, os eruditos efusivamente louvaram-no e abençoaram-no do fundo do coração. 10. Depois de colocar o cordão sagrado, Gadadhar, com sua tendência espiritual inata, ficou muito feliz em ter uma oportunidade de fazer algo de acordo com seu coração. O menino havia ouvido sobre como o símbolo vivo de Raghuvir havia se revelado a seu pai num sonho e fora trazido para a casa; que desde o auspicioso dia da chegada do Deus, o pequeno pedaço de terra começou a dar arroz em grande abundância, em quantidade suficiente não somente para as necessidades da família, mas também para uma sobra que permitisse a bondosa Chandradevi atender os pobres que vinham a ela. Desde então o menino olhou para essa divindade da família com grande devoção e reverência. Agora que ele tinha o privilégio de tocá-La e adorá-La, seu coração ficou cheio de novo ardor de devoção. Muito tempo ele passava diariamente em adoração e em meditação, depois de terminar as costumeiras orações diárias e outras obrigações. Servia Raghuvir com especial constância e devoção, para que a divindade pudesse conceder-lhe a graça como havia feito a seu pai, abençoando-o com suas visões e dando-lhe ordens de vez em quando. O Deus
Rameswar Siva e a Deusa Sitala também eram servidos. Não tardou que sua intensa devoção desse fruto. O coração puro do menino tornou-se tão absorvido na adoração, que ele experimentou o estado de Bhavasamadhi, também conhecido como Savikalpa-Samadhi. Depois dessa experiência, várias visões espirituais vinham-lhe de tempos em tempos. Esse tipo de Samadhi e visões ocorreram por ocasião do Sivaratri, naquele ano. (Vide II.2). Naquele dia o menino havia jejuado e adorado com muita devoção, o grande Deus Siva, origem de todos os deuses. Seu amigo Gayavishnu e outros meninos de sua idade também haviam jejuado e decidiram manter-se em vigília aquela noite, assistindo a um drama exortando a glória de Siva. Aquele drama devia ser encenado na casa de seu vizinho Sitanah Pyne. Depois de terminar a adoração do primeiro quarto da noite, Gadadhar estava imerso em meditação de Siva, quando subitamente seus amigos chegaram e disseram-lhe que ele teria de fazer o papel de Siva e falar algumas palavras da peça na casa dos Pynes; porque explicaram, a pessoa que sempre representava aquele papel havia adoecido e estava impossibilitada de participar. Gadadhar a princípio negou-se dizendo que seria interferir com sua adoração; mas eles puseram de lado todas as objeções, argumentando que se ele fizesse o papel de Siva, pensaria n'Ele o tempo todo, o que era tão valioso quanto a adoração. Além do mais sua recusa privaria muitas pessoas de entretenimento; eles também haviam jejuado e decidido ficar em vigília a noite toda assistindo ao drama. Vencido por tais argumentos, Gadadhar finalmente concordou e apareceu no palco no papel de Siva. Com sua maquiagem, de cabelo encaracolado, contas de rudraksha e cinzas, ficou tão absorvido no pensamento de Siva que perdeu totalmente a consciência exterior. Como ele continuasse naquele estado por longo período, a apresentação teve que ser interrompida naquela noite. 11. Gadadhar, entretanto, continuava naquele estado de êxtase que sobrevinha de vez em quando. Esquecia-se de si mesmo e do que o rodeava enquanto meditava ou ouvia canções, música etc. em louvor aos deuses e deusas. Então sua mente permanecia dentro de si mesma por um certo tempo - curto ou longo - durante o qual não reagia a qualquer estímulo externo. Às vezes, quando sua absorção se aprofundava mais, parecia uma estátua viva. Saindo daqueles estados dizia que havia experimentado uma alegria maravilhosa acompanhada de visões, enquanto meditava em alguns deuses e deusas ou ouvindo canções glorificando-os. Tudo isso, durante muito tempo, alarmou Chandra e outros membros da família, mas a ansiedade deles acalmou-se quando viram que a saúde do menino não estava de nenhum modo afetada e que ele permanecia sempre alegre, ativo e eficiente. Gadadhar entrava então naquele estado com muita freqüência, o que gradualmente o fez acostumar-se com ele e não podia controlálo como desejava. Isso ajudava-o a compreender os assuntos sutis e várias verdades a respeito de deuses e deusas. Ficava muito feliz e sem medo. Suas tendências espirituais tornaram-se especialmente fortes e começou a participar de todo coração das diversas funções religiosas do vilarejo, quer em honra de Hari ou de Siva ou de Manasa ou de Dharma. Sua abertura mental não somente o fez inteiramente livre de qualquer má vontade contra os devotos de diferentes deuses e deusas, mas manteve-o numa amizade positiva com todos. A tradição estabelecida do vilarejo sem dúvida alguma ajudou-o nesse assunto, porque em contraste com outros vilarejos, pessoas de todas as crenças em Kamarpukur - adoradores de Vishnu ou devotos de Siva ou de Dharma - não se hostilizavam mas viviam em paz e amizade. 12. Embora como já vimos tivesse havido um considerável progresso espiritual, Gadadhar não desenvolveu amor por seus estudos. Quando sentiu o desejo ardente dos eruditos por riqueza e pelos prazeres mundanos, tornou-se avesso em adquirir conhecimento como eles, porque sua visão interior aguda fazia-lhe em primeiro lugar, ver os motivos que estavam por trás de todas as ações para depois, julgar seu valor de acordo com o modelo das boas qualidades de seu pai como, desapego do mundo, devoção a Deus, veracidade, retidão de conduta, etc. A comparação revelou para sua surpresa, que o objetivo da maior parte dos eruditos era completamente diferente daquele de seu pai, mas sentiu-se mais triste do que surpreso ao ver que as pessoas estavam iludidas, pois consideravam o mundo transitório como permanente. Deve-se então saber se, como resultado daquela descoberta, tenha surgido em sua mente o desejo de conduzir a vida de forma diferente. Depois de ouvir tudo isso o leitor talvez pergunte: "É possível para um menino de onze ou doze anos ter essa profunda visão interior e discriminação?" A resposta é que Gadadhar não era um menino comum. Nasceu com qualidades geniais, memória e tendências espirituais extraordinárias. Em seu caso, portanto, a posse desses poderes não era surpreendente embora fosse tão jovem. Mas isto à parte, devemos para o bem da verdade, narrar todos os fatos que nossa investigação trouxe à luz, sem considerar o que se possa pensar deles. 13. Embora a aversão de Gadadhar pelo tipo de educação prevalecente tenha gradualmente aumentado, ele continuou indo à escola. Tornou-se hábil na leitura de livros escritos em seu
idioma natal e em escrever naquela língua. Agora lia o Ramayana e o Mahabharata e outros livros religiosos com tal devoção e com voz tão doce que as pessoas ficavam encantadas ao ouvi-lo. Os aldeões de coração simples, iletrados, mostravam grande desejo de ouvi-lo na leitura desses livros e Gadadhar ficava sempre feliz em atendê-los. Sitanath Pyne, Madhu Jugi e outros convidavam-no a suas casas e homens e mulheres cheias de devoção, ouviam-no ler a vida de Prahlada, a história de Dhruva ou outras narrativas do Ramayana, do Mahabharata e de outros textos semelhantes. Além do Ramayana, Mahabharata etc. ainda existem em Kamarpukur anotações das histórias de deuses e deusas escritas em versões simples pelos poetas do vilarejo, bem conhecidos nesses lugares. As narrativas sobre as revelações do grande deus Tarakesvar, a composição musical relativa à Yogadya e às canções de Madaranohan de Vanavishnupur descrevendo deuses e deusas, revelando sua verdadeira natureza aos homens santos e devotos e fazendo atos sobrenaturais tudo isso chegava, de tempos e tempos, aos ouvidos de Gadadhar. Com a ajuda de sua extraordinária memória, o menino aprendia de cor muitas dessas composições poéticas, somente ouvindo-as e, às vezes, as copiava de manuscritos ou de livros. Tomamos conhecimento disso quando encontramos na casa de Kamarpukur, um manuscrito de Ramakrishnayana, composições musicais sobre Yogadya e Sabahu, compiladas pelo próprio Gadadhar. Está também fora de dúvidas, que muitas vezes o menino lia ou recitava essas narrativas para os homens e mulheres de coração simples do vilarejo, sempre que lhe pediam. Já falamos da indiferença de Gadadhar pela aritmética, mas depois de estar certo tempo na escola, fez algum progresso nesse sentido também. Fomos informados que ele decorou as tabuadas, até mesmo as de medida de terra, chamadas Katha, no Livro das Tabuadas e que progrediu da simples soma até as de multiplicação e divisão, mas quando atingiu dez anos e começou a experimentar êxtases, seu irmão mais velho Ramkumar deixou-o livre para ir à escola sempre que quisesse e aprender quaisquer matérias que gostasse. Porque ele tinha medo que Gadadhar tivesse tendência a alguma doença. Seu professor também não o pressionava quando descobria que não progredia no estudo de determinada matéria. Portanto, é desnecessário acrescentar que houve um pequeno progresso geral nos estudos de Gadadhar. 14. Passaram-se dois anos. Gadadhar completou seu décimo segundo aniversário. Seu segundo irmão, Rameswar, e sua irmã mais nova, Sarvamangala, estavam agora com vinte e dois e nove anos respectivamente. Vendo que Rameswar havia atingido a idade apropriada, Ramkumar arranjou seu casamento com a irmã de Ramsaday Bandyopadhyaya, da vila de Gaurhati, perto de Kamarpukur. Ficou também resolvido que o próprio Ramsaday se casaria com a irmã de Rameswar. Como ambos casamentos haviam sido assim combinados, Ramkumar não teve qualquer preocupação com o pagamento do dote, para a outra parte. Um outro incidente relativo à família de Ramkumar ocorreu nessa época. Como sua esposa nunca havia concebido, embora não fosse mais jovem, todos estavam certos de que era estéril. Quando a viram grávida ficaram muito contentes, mas também apreensivos, porque alguns haviam ouvido Ramkumar predizer que ela morreria se algum dia concebesse. 15. Uma mudança radical ocorreu nos negócios de Ramkumar desde o momento em que sua esposa ficou grávida. Sua renda decrescia. Sua saúde definhava e ele não mais podia manter seus antigos hábitos ativos. O comportamento de sua esposa também sofreu completa transformação. Havia uma norma na família, desde o tempo de seu querido pai, que ninguém (exceto os meninos ainda não investidos com o cordão sagrado e os doentes) poderiam comer ou beber água antes de terminar a adoração a Raghuvir. Agora, a esposa de Ramkumar quebrou a regra e fez ouvidos surdos às objeções dos outros membros da família, temerosos de que um mal pudesse cair sobre eles. Ela discutia com todos os membros da família sobre assuntos banais, criando assim mal-estar e continuou com essa conduta, apesar dos protestos do marido e de Chandradevi. Lembrando-se, contudo, que uma mudança muitas vezes ocorre nas mulheres durante a gravidez, eles deixaram-na em paz. Contudo, em vez de paz habitual naquela família santificada de Kamarpukur, havia agora contínua desarmonia. 16. O irmão de Ramkumar, Rameswar, embora possuísse boa cultura, não tinha muita habilidade para ganhar dinheiro. Assim, à medida que o número de pessoas na família aumentava, havia um declínio na renda, ameaçando a anterior existência confortável. Ramkumar ficou preocupado, mas apesar de seus esforços, não encontrava solução. Parecia como se um poder invisível obstruísse todos os seus planos, fazendo-os dar em nada. Uma sucessão de preocupações tornou sua vida um fardo. À medida que os dias e os meses passavam e a época do parto de sua esposa aproximava-se, tornava-se cada vez mais desanimado, recordando-se de sua antiga previsão sobre o destino dela.
17. Por fim ela deu à luz a um lindo menino, em algum momento de 1849 e enquanto olhava o seu rosto, faleceu. Uma cortina de pesar caiu sobre a pobre família. CAPÍTULO VIII NO LIMIAR DA JUVENTUDE ASSUNTOS: 1. Ramkumar inaugura uma escola de sânscrito (Tol) em Calcutá. 2. Efeito da morte da esposa de Ramkumar sobre a família. 3. A história de Rameswar. 4. Projetos de Ramkumar para Gadadhar. 5. Atitude e comportamento de Gadadhar. 6. A leitura e os cantos devocionais de Gadadhar. 7. Devoção das mulheres do vilarejo por ele. 8. Gadadhar vestido de mulher. 9. Gadadhar e a família de Sitanah Pyne. 10. Um golpe no orgulho de Durgadas Pyne. 11. As mulheres do bairro de negociantes. 12. Rukmini a respeito de Gadadhar. 13. Todos os aldeões amavam Gadadhar. 14. A aversão de Gadadhar pela educação para ganhar pão. 15. A necessidade do coração de Gadadhar. 16. Gadadhar deixa a escola e representa dramas. 17. Seu progresso nas belas-artes. 18. Ramkumar leva Gadadhar para Calcutá.
1. A má sorte de Ramkumar continuou mesmo após a morte de sua esposa e cada dia que passava ficava mais pobre. A renda proveniente de doações das pessoas que o convidavam para cerimônias religiosas, decrescia. Ainda que crescesse arroz suficiente no pedaço de terra em Lakshmijala, tornava-se cada vez mais difícil conseguir roupas e outros artigos diários. Também era preciso leite para sua velha mãe e para Akshay, o bebê órfão de mãe. Tomando dinheiro emprestado, Ramkumar fez dívidas que foram se acumulando dia após dia. Ele não podia impedir que isso ocorresse apesar de tentar. Pensando conseguir mais dinheiro em qualquer outro lugar, fez os preparativos para deixar Kamarpukur, aconselhado por seus amigos. Sua perda recente tornoulhe fácil dar esse passo porque pensou que conseguiria paz de espírito se deixasse a casa cheia de recordações de sua companheira de trinta anos. Houve muita discussão, se Calcutá ou Burdwan ofereciam melhores perspectivas para ganhar dinheiro. Finalmente decidiu-se por Calcutá, porque seus amigos fizeram-no ver que Maheshchandra Chattopadhyaya de Sihar, Ramdhan Ghosh de Desra e outros conhecidos tinham ido para lá, onde encontraram boas oportunidades de ganhar dinheiro e melhorar suas condições, embora fossem inferiores a Ramkumar em erudição, inteligência e caráter. Assim, Ramkumar, entregando a incumbência dos negócios a Rameswar, foi para Calcutá logo após a morte da esposa. Inaugurou uma escola de sânscrito no bairro de Jhamapukur e começou a ensinar alguns rapazes. 2. Muitas mudanças aconteceram na vida da família em Kamarpukur, com a morte da esposa de Ramkumar. Chandradevi era agora obrigada a carregar o fardo de todas as obrigações domésticas, incluindo o cuidado do bebê de Ramkumar, Akshay. A esposa de Rameswar tentava ajudar tanto quanto possível mas, ainda sendo muito jovem, não era de muito auxílio. Chandradevi tinha, pois, que fazer praticamente tudo sozinha - o serviço de Raghuvir, cuidar de Akshay, cozinhar e outros serviços domésticos, o que lhe tomava o dia inteiro e ela não tinha mais um minuto de descanso. Era muito difícil, a uma mulher de cinquenta e oito anos, 1 (1 Chandradevi nasceu em 1791 e morreu em 1876 com a idade de oitenta e cinco anos. Diz-se que ela morreu no dia do aniversário de Sri RamaKrishna. ) cuidar de todos os afazeres domésticos, mas sabendo que essa era a vontade de Raghuvir, trabalhava sem uma palavra de queixa. 3. Rameswar tinha de tomar conta da renda e das despesas da família e pensava como poderia fazer as duas coisas e manter a família com conforto. Sua erudição, contudo, jamais o ajudou a ganhar dinheiro. Por outro lado, passava muito tempo conversando com os monges errantes e com religiosos, sempre que os encontrava e não hesitava em lhes suprir as necessidades. Por isso, embora ganhasse um pouco mais do que antes, não podia pagar as dívidas da família e sua renda era suficiente somente para atender às necessidades mínimas. Portanto não podia economizar e estava sempre necessitado. Às vezes gastava mais do que ganhava e vivia despreocupado, consolando-se com o pensamento de que Raghuvir proverá a família de algum jeito. 4. Rameswar, sem dúvida, amava ternamente seu irmão mais novo Gadadhar, mas nunca importou-se em saber se ele fazia progressos nos estudos. Além de ser temperamentalmente incapaz de dar essa atenção, não tinha tempo, já que devia ir a vários lugares à procura de trabalho remunerado. Assim não tinha nem inclinação nem tempo para vigiar a educação do irmão. Tinha também a firme convicção de que a mente altamente disciplinada de Gadadhar o impediria sempre de se desencaminhar porque já havia visto nele notável desenvolvimento das tendências religiosas, mesmo naquela tenra idade. Essa convicção tornou-se mais forte quando viu homens e mulheres do vilarejo colocarem plena confiança no menino e amarem-no afetuosamente.
Estava certo que ninguém poderia ganhar os corações e ser louvado por todos, a não ser que tivesse valor inerente e nobreza de caráter. Assim Rameswar antevia, com alegria, o futuro glorioso do irmão mais jovem e não tinha qualquer preocupação a seu respeito. Gadadhar tinha então treze anos quando Ramkumar foi para Calcutá. Dali em diante não teve mais qualquer responsabilidade e portanto, era dono de si mesmo, livre para conduzir-se da maneira que quisesse. 5. Como já mencionamos, a aguda visão interior de Gadadhar permitiu que mesmo com tenra idade, percebesse os motivos das ações dos outros. Não levou muito tempo para compreender que o único objetivo de estudarem ou se distinguirem em seus estudos era o de possibilitar ganharem dinheiro, ou como ele mesmo dizia, "juntar arroz e plântano." Compreendeu também que aquele que houvesse gasto toda energia na busca de prazeres mundanos não poderia, como seu pai, dedicar-se à verdade ou a adquirir força de caráter e realizar Deus. Cegas por interesse egoísta, algumas famílias do vilarejo disputavam a terra e outras propriedades, dando lugar a litígio. Então dividiam suas casas, suas terras etc., com trenas, declarando: "Esse lado é meu e aquele é seu." Mas mal haviam desfrutado seus quinhões por alguns dias, a morte os levou! Gadadhar às vezes via essas coisas acontecendo diante de seus olhos e chegava à conclusão de que o dinheiro e o desejo de desfrutar prazeres eram a raiz de toda infelicidade da vida humana. Não foi, portanto, surpresa que se tenha tornado cada vez mais avesso à erudição conquistada com o objetivo de ganhar dinheiro. Por outro lado, considerava a conquista do amor a Deus como a meta principal da vida e contentava-se, como seu pai, com a satisfação das necessidades diárias, a saber, 'comida e roupa simples'. Contudo ia à escola quase diariamente, mas isso era devido à sua atração pela companhia de meninos de sua idade. Passava agora a maior parte do tempo na adoração de Raghuvir e aliviando o fardo da mãe, ajudando-a no trabalho doméstico e por causa de todas estas atividades tinha que permanecer em casa a maior parte do dia. 6. Já que Gadadhar passava muito tempo em casa, as mulheres do vilarejo tiveram oportunidade em vê-lo. Ao terminarem as obrigações domésticas, muitas delas iam até Chandradevi e se encontrassem o menino em casa pediam-lhe para cantar ou ler textos religiosos. Gadadhar as atendia sempre que podia. Se o encontrassem ajudando a mãe, elas mesmas terminavam o trabalho para que ele lesse os Puranas ou cantasse. Isso tornou-se quase uma rotina diária. As mulheres gostavam tanto, que procuravam acabar as obrigações diárias o mais cedo possível para poderem ouvir as canções e leituras de Gadadhar por mais tempo. Além de ler os Puranas Gadadhar entretinha as mulheres de várias maneiras. Havia na vila três grupos de atores Yatra, um de menestréis (Bauls) e um ou dois de poetas (Kavis). Também muitos aldeões eram Vaishnavas e costumavam ficar em suas casas lendo todas as noites, o Bhagavata, ou cantando as loas do Senhor. Sua memória privilegiada permitia a Gadadhar lembrar-se das muitas composições musicais, peças, cantos e hinos a Deus, que havia ouvido desde a infância. Como entretenimento especial, um dia ele começava um drama, no outro cantava as canções dos Bauls ou Kavis, ou então, as loas do Senhor. Quando encenava uma peça, ele próprio representava vários papéis, mudando a voz de acordo com cada personagem. Se, em qualquer ocasião, visse a mãe ou qualquer mulher triste, começava a representar uma farsa ou imitava tão bem os modos e gestos de alguém da vila conhecido de todos, que as pessoas caíam na gargalhada. 7. Assim Gadadhar exercia grande influência sobre as aldeãs. Elas já haviam sabido do estranho sonho e das visões espirituais que os pais do menino haviam tido por ocasião de seu nascimento e também haviam visto com seus próprios olhos a mudança extraordinária que ocorria na mente e no corpo dele sempre que entrava em contato com o espírito dos deuses e deusas. Por conseguinte, era muito natural que sua intensa devoção a Deus, sua absorção ao ler os Puranas, seu canto doce e seu não convencional comportamento para com todas elas, levantassem naquelas mulheres uma devoção e uma afeição ímpares por ele. Disseram-nos que Prasannamayi e outras senhoras idosas viam em Gadadhar a manifestação do Divino Menino (Gopala) e amavam-no mais do que a seus próprios filhos. As mais jovens, crendo que ele nascera como parte do Bhagavan Sri Krishna, consideravam-no seu amor espiritual e amigo. Muitas delas haviam nascido em famílias Vaihnavas e uma fé poética simples era a base de sua religião. Não é de se estranhar que realmente tivessem acreditado que esse menino de conduta e caráter nobres fosse o Próprio Deus. Devido a essa crença contavam-lhe, sem qualquer reserva seus pensamentos mais íntimos e procuravam seu conselho, tentando segui-lo. Em tais ocasiões, Gadadhar também se comportava com elas como se fosse uma delas. 2 (2Será visto dos fatos registrados no II.14 o estranho desejo que Gadadhar tinha, na época ali referida, de ser completamente igual uma mulher.)
8. Às vezes representava papéis de mulheres bem conhecidas vestindo roupa e adornos femininos. Isso ocorria, quando a pedido de suas amigas, fazia o papel de Radharani ou de sua companheira íntima, Vrinda. Parecia-se então exatamente como uma mulher, nos gestos, voz e movimentos. As aldeães diziam que ninguém poderia reconhecê-lo. Isso mostra quão minuciosamente o menino havia observado os diversos modos das mulheres. Gostando de pilheriar, muitas vezes passou com esse disfarce diante dos homens, com um jarro debaixo do braço, para pegar água em Haldapukur; ninguém poderia jamais suspeitar que ele não era uma mulher! 9. Já falamos de Sitanah Pyne, um homem do vilarejo. Tinha sete filhos e oito filhas, que viviam todos juntos na casa de Sitanah, mesmo após o casamento. Diz-se que diariamente era necessária grande quantidade de especiarias para cozinhar sua comida e que dez pedras eram necessárias para moê-las e fazer uma pasta. Muitos parentes distantes de Sitanah haviam também construído suas casas nas proximidades. Portanto essa parte de Kamarpukur era conhecida como o bairro dos negociantes. Como essas casas eram localizadas perto da de Kshudiram, muitas mulheres desse bairro - especialmente a esposa e as filhas de Sitanah - costumavam ir à casa de Chandradevi nas horas livres e assim vieram a conhecer Gadadhar intimamente. Muitas vezes levavam-no para suas casas e pediam-lhe para representar o papel de personalidades dramáticas ou fazer certos papéis de mulheres com roupas femininas. Muitas das mulheres da família de Sitanah estavam proibidas de ir a qualquer lugar fora de casa e portanto, não tinham a boa sorte de ouvir as leituras e as canções de Gadadhar na casa de Chandradevi. Talvez seja por isso que a esposa de Sitanah e suas filhas convidavam-no para ir à sua casa. Foi assim que muitas mulheres do bairro dos comerciantes não podendo ir à casa de Chandradevi viram Gadadhar e amaram-no. Sempre que sabiam que ele estava na casa de Sitanah iam para lá e desfrutavam de suas leituras, suas representações ou imitações. O dono da casa, Sitanah, gostava muito de Gadadhar e os outros homens do bairro conheciam o belo caráter do menino e por isso não se importavam que suas mulheres ouvissem o menino cantar os louvores a Deus. A única pessoa no bairro dos comerciantes que levantou objeção, foi Durgadas Pyne. Ele também tinha Gadadhar em alta conta e amava-o, mas em nenhuma circunstância permitiria o relaxamento do sistema purdah estrito observado por suas mulheres. Vangloriava-se com Sitanah e com os outros parentes, de que ninguém jamais havia visto as mulheres de sua casa nem sabia qualquer coisa a respeito dos apartamentos internos em que elas viviam. Olhava mesmo com desprezo para Sitanah e outros que não davam força, como ele, ao purdah. 10. Um dia estava Durgadas vangloriando-se diante de um parente, quando Gadadhar chegou. Ouvindo isso, o menino disse: "Podem as mulheres serem protegidas pelo purdah? Podem ser protegidas somente por uma boa educação moral e devoção a Deus. Posso ver todas as pessoas e conhecer tudo dos apartamentos interiores de sua casa se quiser." A isso Durgadas vangloriou-se ainda mais e disse: "Bem, vamos ver como você vai fazê-lo." "Ora, veremos", disse Gadadhar, aceitando o desafio e saindo. Algum tempo depois numa tarde, sem dizer qualquer palavra a ninguém, o menino disfarçou-se de uma pobre tecelã, colocando um sari sujo e ordinário e entre outros enfeites, um cinto de contas de prata em sua cintura. Chegou um pouco antes do anoitecer na casa de Durgadas, vindo do mercado com uma cesta debaixo do braço e um véu cobrindo o rosto. Durgadas estava sentado com uns amigos na sala de visitas de sua casa. Gadadhar apresentou-se como tecelã que havia chegado do mercado para vender linha, mas teve a infelicidade de ser deixada para trás por suas companheiras. Por isso ela estava pedindo abrigo por uma noite. Durgadas fez perguntas a seu respeito e satisfeito com suas respostas, disse: "Muito bem, vá ter com as mulheres dos cômodos interiores e peça-lhes para que a recebam:" Gadadhar inclinou-se em gratidão e entrou. Repetiu a história para as mulheres e divertiu-se com suas tagarelices. Vendo-a tão jovem e encantadora com suas palavras doces, as mulheres permitiram que ela ficasse. Mostraram-lhe um lugar para descansar e deram-lhe alguma coisa para comer, arroz empapado sem casca e adocicado. Gadadhar sentou-se no lugar indicado e enquanto comia, observava minuciosamente cada cômodo e cada uma das mulheres. Não somente ouvia a conversa que elas estavam tendo como tomou parte e às vezes fazia perguntas. A tarde toda foi passada dessa maneira. Como Gadadhar ainda não havia voltado para casa embora fosse muito tarde, Chandradevi mandou Rameswar à sua procura no bairro dos comerciantes aonde sabia que ele ia com freqüência. Rameswar primeiro foi à casa de Sitanah mas foi informado que o menino não estava lá. Aproximando-se da casa de Durgadas chamou-o pelo nome em voz alta. Quando Gadadhar ouviu a voz do irmão, percebeu que já era tarde e gritou lá de dentro: "Estou indo, irmão" e correu para encontrar Rameswar. Foi então que a verdade apareceu a Durgadas. A princípio ficou um pouco embaraçado e aborrecido, pensando que Gadadhar o havia feito e à sua família de tolos; mas logo
começou a rir observando quão bem o menino havia feito seu papel. Quando na manhã seguinte souberam do incidente, Sitanah e outros parentes ficaram contentes por Gadadhar ter dado um golpe no orgulho de Durgadas. Dali em diante as mulheres da família de Durgadas também começaram a freqüentar a casa de Sitanah sempre que Gadadhar estava ali. 11. As mulheres da família de Sitanah e do bairro dos comerciantes começaram a amá-lo tanto que o mandavam buscar se não o vissem por alguns dias. Às vezes o menino entrava em êxtase enquanto lia ou cantava na casa de Sitanah; e quando elas o viam naquele estado, sua devoção não conhecia limites. Disseram-nos que muitas delas adoravam o menino quando ele estava em êxtase como a Encarnação de Sri Gauranga ou de Sri Krishna. Elas tinham uma flauta de ouro e várias roupas de personagens masculinas e femininas, para as encenações. 12. De tempos em tempos tivemos a oportunidade de ouvir algumas dessas mulheres falarem da influência que Gadadhar, de múltiplas facetas, exercia sobre elas. Quando alguns de nós, incluindo Swami Ramakrishnananda, fomos a Kamarpukur em 1893, encontramos a filha de Sitanah Pyne, Rukmini, que tinha mais ou menos sessenta anos. O leitor fará uma boa idéia da influência de Gadadhar quando relatarmos o que ela nos falou. Apontando para o norte, Rukmini disse: "Nossa antiga casa ficava mais longe, para lá. Está agora dilapidada já que não sobrou quase nenhum de nós, mas quando eu tinha dezessete ou dezoito anos era a casa de uma família próspera. Sitanah Pyne era meu pai e éramos dezessete ou dezoito irmãs e primas, incluindo as filhas do irmão mais velho e do irmão mais novo de meu pai. Embora houvesse pequena diferença de idade entre nós, éramos todas mocinhas naquela época. Desde sua infância, Gadadhar costumava brincar conosco e éramos grandes amigos. Embora ele fosse já rapazola, continuou a freqüentar nossa casa mesmo quando não éramos mais crianças. Tinha livre acesso aos nossos cômodos internos. Papai amava-o muito. Considerava-o sua Divindade Escolhida e tinha grande devoção e respeito por ele, mas alguns de nossos vizinhos faziam objeção a isso dizendo: 'Há tantas moças em sua casa e Gadadhar é agora um rapaz. Por que você permite que ele entre nos cômodos internos?' Ele respondeu: 'Não se preocupem, conheço Gadadhar muito bem' e eles não ousavam dizer mais nada. Ah, quantas histórias dos Puranas Gadadhar costumava nos contar e como nos divertíamos! Costumávamos fazer nossas obrigações domésticas enquanto ouvíamos aquelas histórias quase diariamente. Como posso exprimir com palavras a grande alegria que todos sentíamos quando ele estava conosco? Se ocorresse dele não vir um dia, ficávamos ansiosas, pensando que estivesse doente. Não ficávamos sossegados enquanto uma de nós não fosse até a 'Brahmani' (Chandra) sob pretexto de trazer água ou fazer qualquer outra coisa e trouxesse notícias de Gadadhar. Cada palavra de Gadadhar era um néctar para nós. Quando não vinha à nossa casa passávamos o dia inteiro conversando sobre ele." 13. A popularidade de Gadadhar não estava restrita ao círculo das mulheres do vilarejo. Seu gênio, de diversidade e maneiras graciosas, faziam dele notícias para todas as pessoas do vilarejo, fossem homens, mulheres ou crianças. Freqüentava os lugares onde aldeões, jovens ou velhos reuniam-se para ouvir a leitura dos Puranas e das canções em louvor a Deus. Havia grande alegria sempre e onde o menino estava presente; somente ele podia ler tão bem ou expor as verdades religiosas com tanta seriedade. Não tinha rival em fervor espiritual quando cantava as glórias de Deus e no seu poder de elevar os sentimentos espirituais. Ninguém tinha voz doce como a sua nem podia dançar como ele. Em momentos de alegria superava a todos em sua habilidade de representar papéis cômicos e na imitação de todas as espécies de afetações de homens e mulheres. Também ninguém contava tão bem histórias novas ou cantava hinos de acordo com a ocasião. Assim, todos, jovens e velhos, afeiçoavam-se a ele e ansiosamente esperavam sua chegada a cada tarde. Gadadhar também ficava feliz em encontrar e entreter os aldeões, ora num lugar, ora no outro. Como com tão pouca idade o menino tivesse um julgamento correto, muitos aldeões aceitavam seu conselho na solução de seus problemas mundanos. Atraídos por seu caráter puro e vendo que entrava em êxtase quando pronunciava o nome de Deus ou cantava Suas glórias, as pessoas religiosas procuravam seu conselho na escolha de seus ideais de disciplina espiritual.3 (3 Dizem que naquela época Srinivas Sankhari e alguns outros jovens adoravam-no como manifestação especial de Deus. ) Somente os hipócritas e mal intencionados tentavam evitá-lo, pois a aguda visão interior de Gadadhar atravessava seus decepcionantes exteriores e detectava seus objetivos secretos. O veraz e franco menino às vezes frustava essas pessoas, expondo-as diante de todos. Seu gosto pelas brincadeiras ocasionalmente fazia com que imitasse os modos hipócritas daquelas pessoas na presença de todos. Apesar disso torná-los zangados, nada podiam, porque todos ficariam do lado de Gadadhar. Sua única salvação era apelar para a natureza bondosa do menino porque sabiam que ele sempre era generoso com aqueles que apelassem para sua compreensão.
14. Como já mencionamos antes, Gadadhar continuou indo à escola durante algum tempo por sua amizade pelos meninos de sua idade. Com quatorze anos, porém, sua devoção e seu desejo de contemplação espiritual aumentaram de tal maneira que ele se convenceu que não havia utilidade para ele, na educação para ganhar pão, conforme dada na escola. Então sentiu que sua vida tinha um significado maior e que deveria dirigir todas suas energias para a realização de Deus. Uma imagem fraca daquele objetivo muitas vezes surgia diante de sua visão mental, mas os detalhes não lhe pareciam claros e ele não era capaz de captar seu significado ou compreender seu propósito. Sempre que se via face ao problema de tomar uma decisão sobre o caminho futuro de sua vida, o ideal de renúncia e de total dependência de Deus surgia diante de sua mente discriminativa. Sua imaginação desenhava-lhe os vários símbolos e a parafernália de uma vida de renúncia - a roupa ocre, o fogo sagrado, as esmolas e o andar de lugar em lugar sem qualquer apego. Logo em seguida, entretanto, seu coração cheio de amor, recordava-lhe a condição de sua mãe, irmão e outros membros da família e o fazia desistir de trilhar aquele caminho. Ao contrário, era necessário que ele os ajudasse da melhor maneira que pudesse permanecendo no mundo, confiando em Deus, como seu pai havia feito. Sempre que sua cabeça e seu coração apontavam para direções opostas, ele esperava a orientação de Deus, dependendo inteiramente do que Raghuvir pudesse ordenar; com o coração cheio de amor por aquela Divindade, o menino sempre a considerava completamente sua. Confiante, portanto em que Raghuvir resolveria seus problemas na época adequada, acalmava sua mente. Sempre que havia um conflito entre sua cabeça e seu coração, era o coração que vencia e então ele fazia tudo sob aquela influência. 15. Por essa época um novo sentimento começou a brotar de vez em quando no coração puro de Gadadhar, tão cheio de rara simpatia. Existia um relacionamento muito íntimo entre ele e as pessoas do vilarejo e ele as considerava seus amigos queridos e plenamente compartilhava de suas alegrias e tristezas. Por isso logo que a idéia de renunciar ao mundo surgiu em sua mente, seu coração o fez lembrar-se daqueles aldeões de coração simples e afetuoso e sua confiança irrestrita nele. Sabia que seu caminho era conduzir a própria vida de tal maneira que tomando-o como modelo, eles poderiam realizar elevados ideais e transformar seu relacionamento atual em parentesco espiritual. Livre do mais leve traço de egoísmo, o coração do menino dizia: " É egoísmo renunciar ao mundo somente para a própria salvação. Faça algo que seja bom para os outros também." 16. Com relação a seus estudos na escola e mais tarde na escola de sânscrito, a cabeça e o coração de Gadadhar estavam de pleno acordo. Mesmo assim ele não abandonava completamente a escola pois sabia que seus colegas sentiriam muito a sua falta. Todos os meninos de sua idade, Gayavishnu e outros amavam-no ternamente e consideravam-no seu líder por sua grande inteligência e coragem. Por fim Gadadhar encontrou a oportunidade favorável para deixar a escola. Certo dia, alguns amigos que conheciam seu talento dramático propuseram-lhe formar um grupo de artistas Yatra e pediram-lhe para encarregar-se do treinamento. Gadadhar concordou. Mas sabendo que seus responsáveis fariam objeções, os meninos preocuparam-se em primeiro lugar em conseguir um lugar para os ensaios. O inteligente Gadadhar finalmente escolheu o pomar de mangas de Manikraja e ficou combinado que diariamente alguns deles se ausentariam da escola para se encontrarem na hora marcada. O plano foi imediatamente posto em ação. Sob a orientação de Gadadhar os meninos aprenderam de cor seus papéis e canções e o pomar de mangas tornou-se o alegre lugar de representação das peças que narravam as vidas de Sri Ramachandra e de Sri Krishna. Todos os detalhes de cada representação foram organizados por Gadadhar com a ajuda de sua imaginação e ele mesmo fazia os papéis principais. Os meninos, contudo, ficaram muito contentes vendo o pequeno grupo trabalhando em perfeita harmonia. Diz-se que Gadadhar, de vez em quando, entrava em êxtase, durante essas representações. 17. A habilidade do menino para pintar não podia agora ter muitas oportunidades de afirmar-se, visto que a maior parte do tempo era gasto com cantos religiosos ou com a representação das peças. Mas um dia, numa visita à sua irmã mais nova Sarvamangala, em Gaurhati, ele a viu, feliz, servindo seu marido. Pouco tempo depois pintou um quadro mostrando o casal naquele estado de felicidade e todos da família ficaram surpresos em ver que o quadro parecia ter vida. Gadadhar tornou-se muito competente em modelar imagens de deuses e deusas. Suas inclinações religiosas levavam-no a fazê-las com freqüência e ele e os amigos adoravam as imagens na maneira prescrita pelas escrituras. Deixando a escola Gadadhar seguiu os ditames de seu coração e empenhou-se naquelas atividades além de ajudar Chandradevi nos afazeres domésticos.
Afeiçoou-se muito a Akshay, filho órfão de mãe de seu irmão, que muitas vezes o mantinha ocupado. Para permitir que Chandradevi tivesse tempo para seus afazeres, tornou-se parte de sua rotina diária pegar a criança no colo e entretê-la de diversas maneiras. Três anos assim se passaram e Gadadhar chegou a seu décimo sétimo aniversário. Pelo esforço de Ramkumar o número de estudantes da escola de Calcutá havia aumentado nesse período e agora ele ganhava mais dinheiro do que antes. 18. Embora passasse a maior parte do tempo em Calcutá, Ramkumar tinha o hábito de ir a Kamarpukur uma vez por ano por algumas semanas, para ver como as coisas estavam indo com sua mãe e com seus irmãos. Desta vez ficou particularmente preocupado com a indiferença de Gadadhar por qualquer tipo de estudo sistemático. Com cautela fez-lhe perguntas, como passava o tempo e depois de consultar sua mãe e Rameswar, decidiu levar Gadadhar para Calcutá e mantê-lo próximo. Pensou que seria essa a maneira certa de agir pois, com o aumento do número de estudantes a direção da escola havia se tornado difícil e ele sentia a necessidade de um assistente. Ficou então estabelecido que Gadadhar iria para Calcutá ajudálo um pouco e, ao mesmo tempo, estudar com os outros alunos, sob sua direção. Quando isso foi exposto a Gadadhar, ele não levantou as mínima objeção, porque sabia que isso significava ajudar seu irmão mais velho, a quem respeitava como a seu pai. Então, numa hora auspiciosa de um dia favorável, Ramkumar e Gadadhar apresentaram homenagem a Raghuvir, tomaram a poeira dos pés da mãe e partiram para Calcutá. Esse foi o fim do mercado de alegria em Kamarpukur. Chandra e as outras mulheres passavam seus dias de uma maneira ou outra com a doce lembrança de Gadadhar e o pensamento em seu bem-estar futuro. SRI RAMAKRISHNA, O GRANDE MESTRE PARTE II
COMO ASPIRANTE ESPIRITUAL PREFÁCIO O QUE ESTA PARTE CONTÉM
P
ela graça de Deus a apresentação das práticas espirituais sem par de Sri Ramakrishna como aspirante espiritual, é agora levada a público. Tentamos nessa seção não somente escrever a natureza das Sadhanas que ele empreendeu e os princípios filosóficos a elas subjacentes, mas também dar uma visão histórica desse período de sua vida, que se estende desde o seu décimo sétimo até o quadragésimo ano e apresentam os acontecimentos numa ordem cronológica. Portanto essa parte do livro, "Como Aspirante Espiritual", pode ser considerada a história de sua vida como aspirante até a época em que seus jovens discípulos, incluindo Swami Vivekananda, vieram a seus sagrados pés. Tivemos grandes dúvidas se na época de escrever essa parte do livro, seria possível determinar as datas de todos os acontecimentos importantes da vida do Mestre. Embora ele nos tivesse falado dos fatos de sua vida como aspirante espiritual, jamais nos narrou cronologicamente. Em conseqüência, os acontecimentos desse período de sua vida permaneceram confusos e difíceis para seus devotos. Mas devido a investigações, somos agora capazes de afirmar, por sua graça, as datas de muitos daqueles acontecimentos. Continua até hoje uma controvérsia sobre o ano do nascimento do Mestre porque ele próprio disse que seu horóscopo original havia sido perdido e o que foi feito mais tarde continha muitos erros. Fomos capazes de resolver aquela controvérsia consultando diversos almanaques com mais de cem anos. Por isso foi fácil determinar as datas dos acontecimentos da vida do Mestre. Os fatos a respeito da adoração de Shodasi pelo Mestre não eram conhecidos até agora. Será fácil para o leitor compreender aquele acontecimento ao ler essa parte do livro. Concluindo, nossa humilde oração é que esse livro receba as bênçãos do Mestre e seja uma fonte de benefícios para todos. Autor INTRODUÇÃO A ENCARNAÇÃO DIVINA COMO SADHAKA
ASSUNTOS: 1. Falta de registros sobre o assunto. 2. Conceitos errôneos dos devotos. 3. A falta de racionalidade desses conceitos. 4. O amor espiritual íntimo e a consciência do poder divino. 5. Destruição da atitude espiritual; um exemplo no jardim de Kasipur. 6. Na Encarnação, Deus comporta-se como ser humano. 7. Conversa entre Vishnu e Narada sobre este assunto. 8. As Encarnações descobrem caminhos para a liberação . 9. Sem a aceitação da natureza humana das Encarnações esse conceito perde o significado. 10. A visão das Encarnações sobre as almas não iluminadas . 11. A Encarnação e a compaixão de Deus pela humanidade.
1. O estudo da história religiosa do mundo revela que, à exceção de Buda e de Sri Chaitanya, não há qualquer relato a respeito das disciplinas e práticas espirituais das Encarnações de Deus como aspirantes. Na história de suas vidas não encontramos qualquer descrição sobre o fervor indomável e sobre o amor sem limites que nutriam em seus corações e com os quais conseguiram realizar seu objetivo espiritual. Nem temos qualquer descrição clara das ondas alternadas de medo e admiração, de dor e prazer, de esperança e desespero, presos às quais sentiam-se exaltados e imediatamente desanimados sem contudo, permitir que a visão do objetivo diminuísse mesmo por um momento. Além disso, não podemos determinar a ligação entre seus maravilhosos feitos e comportamento durante o período final de suas vidas de um lado e a educação, atos e aspirações de sua infância, juventude etc., de outro. Por exemplo como Krishna, o Bem Amado das Gopis de Vrindavan, acabou se transformando em Sri Krishna, o Senhor de Dwaraka e Ressuscitador da Religião, não está claramente indicado. Somente um fato ou dois da maravilhosa vida universal de Jesus Cristo, antes do trigésimo ano, nos são conhecidos. Somente as peregrinações da pregação do Acharya Sankara estão registradas. O mesmo ocorre com todas as Encarnações. 2. A razão para isso é difícil de ser mostrada. Talvez esses detalhes não tenham sido relatados por causa da devoção excessiva dos devotos. Talvez hesitassem em atribuir imperfeições humanas às figuras divinas e portanto, pensaram que fosse melhor tirá-las do olhar do povo. Talvez os devotos tenham pensado que fariam mais bem à humanidade apresentando a seus olhos como ideal, as idéias e os sentimentos nobres plenamente desenvolvidos desses grandes seres, em lugar de descrever a história de seus esforços sobre-humanos para atingi-los. Então consideraram inútil registrar tais esforços. Os devotos gostam muito de ver seus Bem Amados Mestres sempre perfeitos. Recusam-se admitir que, mesmo assumindo forma humana, qualquer espécie de fraqueza humana ou qualquer ausência de visão interior ou poder, poderia alguma vez ocorrer em seu caráter. Ficam ansiosos em ver neles a imagem da perfeição, desde sua infância. Não somente estão sempre ansiosos para verem a experiência e inteligência de um adulto nos atos inexpressivos de sua infância, mas também lutam para vê-los como personificações perfeitas de onisciência e onipotência, de amor universal e tolerância. Não é de se admirar que considerassem todos os esforços das Encarnações na prática das Sadhanas espirituais e também suas experiências do corpo, como fome, fatiga, sono, doença e morte, como meras dissimulações para iludir a observação de homens sem valor. Mesmo em nossos dias conhecemos devotos eminentes do nosso Mestre que têm a firme convicção de que sua doença foi um fingimento desse tipo. 3. É devido à simples fraqueza de fé e de compreensão que esses devotos chegam a essa conclusão. Não gostam de atribuir esforços humanos, objetos, etc. às Encarnações de Deus somente porque sentem que tais falhas humanas contradizem e portanto, obstruem o cultivo da devoção plena a essas personalidades divinas. Nada temos contra eles, mas tal fraqueza é vista num devoto somente quando sua devoção não é suficientemente madura. Nesse estágio de desenvolvimento, ele pode pensar em Deus somente como Poder e a atribuição de qualquer espécie de fraqueza humana a Ele inibe seu sentido devocional. Com o correr do tempo, quando a devoção amadurece e aprofunda-se em verdadeiro amor a Deus, ele encontra a posição inversa. Sente que o pensamento de Deus como Poder é um obstáculo à experiência d'Ele como puro Amor e deixa de dar importância ao primeiro aspecto. Com freqüência todas as escrituras dizem isso. Vemos que, embora Yasoda, a mãe adotiva de Sri Krishna, experimentasse diariamente os poderes divinos d'Ele, considerava-O somente um menino e O acariciava ou castigava. As Gopis também não podiam atribuir qualquer relação a Sri Krishna que não fosse a de Bem Amado apesar de saberem que Ele era a própria fonte do universo. Os exemplos podem ser facilmente multiplicados. 4. Quando os devotos do Mestre demonstravam um grande desejo de experimentar qualquer tipo de visão indicativa da majestade e do poder de Deus, ele lhes dizia ternamente: "Ah, não é bom ter essas visões; o medo vai intervir quando vocês experimentarem Seus poderes. Alimentar e vesti-Lo e o profundo relacionamento de amor 'Tu' e 'eu' cessarão." Meu
Deus, quantas vezes nessas ocasiões ficávamos frustrados pensando que ele estivesse fugindo do nosso pedido! Contudo, se naquele momento algum devoto tomasse coragem e dissesse, sentidamente, com fé, "Tua graça pode tornar o impossível, possível. Por favor sê misericordioso e concede-me a visão," o Mestre respondia com um tom terno: "Posso eu fazer acontecer alguma coisa, meu filho? O que a Mãe quiser, acontece." Recebendo essa resposta se alguém ainda insistisse e dissesse: "Seu desejo é o da Mãe, também," a resposta usual do Mestre era: "Meu filho, quero que vocês experimentem todos os estados e visões espirituais, mas isto é possível?" Em vez de insistir, se o devoto persistisse em sua fé, o Mestre somente expressava seu amor por ele, com um sorriso amável e um olhar afetuoso, ou às vezes dizia: "O que posso dizer? Que a vontade da Mãe seja feita." O Mestre, embora pressionado de forma tão persistente, jamais tentava quebrar a fé tão firme do devoto e destruir sua atitude espiritual. Muitas vezes vimos esse comportamento do Mestre e o ouvimos dizer: "Ah! A atitude espiritual de ninguém deve ser destruída." 5. Embora não diretamente relacionado com o assunto dessa introdução, este assunto, uma vez abordado, tem que ser esclarecido à luz de um certo incidente. O poder de transmitir por um simples toque ou por um ato de vontade, a capacidade de realizar as verdades espirituais, pertence a poucos aspirantes. O Mestre dizia-nos de vez em quando que Swami Vivekananda, ao longo do tempo teria esse poder, com o qual poderia fazer muito bem às pessoas. Uma pessoa tão qualificada como o Swami certamente é rara no mundo. O Mestre sabia disso muito bem desde o começo de seu encontro com o Swami e começou a moldar seu caráter e vida religiosa numa maneira especial, transmitindo-lhe o conhecimento da unidade da existência, mencionada na Vedanta. Acostumado à maneira dualista de adoração do Brahmo Samaj o Swami olhava o Não dualismo, ensinado na Vedanta, como uma blasfêmia. O Mestre tentou de várias maneiras fazê-lo praticar. O Swami dizia: "Logo que fui a Dakshineswar o Mestre deu-me aqueles livros que proibia aos outros lerem. Entre eles havia em seu quarto, a cópia do Astavakra Samhita. Quando o Mestre encontrava alguém lendo esse livro, proibia-lhe e dava-lhe livros como 'Mukti e como atingi-la', o Bhagavad Gita, ou algum Purana. Logo que eu chegava, porém, pegava aquele livro e pedia-me que o lesse. Ou então, pedia-me para ler algum trecho do Adhyatma Ramayana que está cheio de idéias não dualistas. Às vezes eu respondia asperamente: 'Qual a utilidade de ler esse livro? É um pecado pensar: "Sou Deus". O livro ensina essa blasfêmia. Deveria ser queimado.' O Mestre sorria e dizia: 'Pedi para que o lesse para você mesmo? Pedi para ler para mim. Por favor, faça-o. Neste caso não tem que pensar que é Deus.' Assim eu tinha que ler um pouco para ele, a seu pedido." Assim também ainda que ele estivesse treinando o Swami, o Mestre guiava Swami Brahmananda e os outros jovens em sua vida espiritual, de várias maneiras - alguns pela adoração de Deus com forma, outros por devoção pura e ainda outros pela devoção com disciplina de discriminação entre o Real e o irreal. Ainda que o Swami Vivekananda e outros jovens devotos sentassem, comessem, andassem de um lado para o outro e discutissem teorias religiosas na companhia do Mestre em Dakshineswar, este treinava todos nos diversos caminhos, segundo seus gostos e tendências. Era março de 1886. O Mestre então no jardim de Kasipur a cada dia que passava ficava mais fraco por causa do câncer em sua garganta, mas empenhava-se com entusiasmo ainda maior e com todo o coração, moldando as vidas espirituais de seus devotos, particularmente a vida de Swami Vivekananda. Não se empenhou somente em encaminhar o Swami no caminho da Sadhana, mas ajudou-o a pôr em prática seus ensinamentos. Treinava-o para algo maior, isto é, impedir que os outros rapazes voltassem à vida mundana e também, para que os guiasse e mantivesse juntos. Todas as noites após o entardecer, pedia que se retirassem, chamava o Swami e transmitia-lhe aqueles ensinamentos durante duas ou três horas seguidas, às vezes conduzindo-o à argumentação. Para a maioria dos devotos as palavras e ações do Mestre davam a impressão que ele estava fingindo estar doente da garganta para estabelecer sua Ordem firmemente e que ficaria bom assim que aquele objetivo fosse alcançado. À medida que os dias se passavam, o Swami Vivekananda, sozinho, sentiu no fundo do coração que o Mestre estava organizando tudo e preparando-se para uma longa despedida dos devotos. É duvidoso, contudo, saber se ele estava sempre consciente disso. Por essa época o Swami sentiu um leve despertar do poder de transmitir espiritualidade aos outros pelo toque. Sem dúvida já havia percebido que aquele poder surgia dentro dele de tempos em tempos, mas ainda não havia testado a sua autenticidade tocando em alguém. Ficou também convencido da verdade da doutrina do Não-dualismo ensinado na Vedanta e procurou introduzir aquela doutrina entre os devotos, jovens ou velhos, casados ou solteiros, com a ajuda da razão e da argumentação. Levantou-se, então, uma grande controvérsia a esse respeito,
conduzindo a grandes diferenças de opinião e ainda, agitação entre os devotos porque era da natureza do Swami, afirmar veementemente o que entendia por verdadeiro e obrigar sua aceitação pelos outros por meio de argumentos lógicos. Imaturo como era, o Swami não compreendia que a verdade dessas doutrinas no mundo prático assume formas diferentes de acordo com as diferentes condições e capacidade dos aspirantes. Era a noite do Sivaratri no mês Phalgun. Três ou quatro jovens jejuavam com o Swami. Tinham em mente passar a noite em adoração e vigília. Com receio de que o barulho perturbasse o Mestre, a adoração foi feita num pequeno aposento construído para ser cozinha, situado um pouco a leste das acomodações residenciais. Depois do entardecer choveu muito. Os devotos estavam encantados vendo as massas de nuvens recémformadas, os clarões dos relâmpagos de vez em quando, que pareciam o cabelo despenteado de Siva. Ao acabar a adoração, Japa e meditação no primeiro quarto da noite, o Swami descansava e conversava com os outros, sentado no lugar do adorador. Um dos presentes saiu para preparar fumo e o outro foi a outro aposento para fazer algo importante. Naquele momento um forte despertar do poder divino subitamente surgiu no Swami. Ele quis observar seu efeito pondo-o a teste naquela noite e disse ao Swami A., que estava sentado defronte dele: "Toque-me por um minuto." Nesse meio tempo o rapaz que havia saído para preparar fumo, entrou no quarto e viu o Swami sentado, imóvel, em meditação e A., de olhos fechados, tocando o joelho direito do Swami com a mão direita que, ele reparou, tremia rapidamente. Um minuto ou dois passaram-se assim. Então o Swami abriu os olhos e disse: "Basta. Como se sentiu?" A: "Exatamente como se algo estivesse entrando em alguém segurando uma bateria elétrica, a mão tremendo o tempo todo." O outro rapaz perguntou a A.: "Sua mão estava tremendo quando você tocou Naren?" A: "Sim, não podia mantê-la firme, embora tentasse." Não mais se falou sobre o assunto. O Swami fumava. Todos dirigiram a mente para a adoração e meditação no segundo quarto da noite. Naquele momento A. entrou em meditação profunda. Nunca o havíamos visto entrar em tal meditação. Todo o seu corpo tornou-se rijo, com o pescoço e a cabeça levemente inclinados; a consciência do mundo exterior parecia ter desaparecido completamente. Todos os presentes pensaram que ele estivera nesse estado como resultado de ter tocado anteriormente o Swami. O Swami também notou esse estado e mostrou-o a um companheiro com um sinal. Depois que a adoração do último quarto terminou às quatro da manhã, Swami Ramakrishnananda chegou à sala de adoração e disse ao Swami: "O Mestre quer vê-lo." Imediatamente o Swami subiu ao quarto do Mestre no primeiro andar. Ramakrishnananda seguiu-o a fim de atender ao Mestre. Mal o Mestre viu o Swami, disse: "O que é isso? Gastar antes de acumular! Deixe primeiro acumular o bastante em você mesmo; então saberá onde e como gastar. A Própria Mãe o ensinará. Você não vê o mal que fez ao injetar-lhe sua atitude mental? Ele vinha progredindo até agora com uma determinada atitude e tudo foi destruído, como um aborto no sexto mês. O que foi feito está feito. De agora em diante não aja tão impensadamente. O rapaz, contudo, tem sorte." O Swami disse mais tarde: "Fiquei completamente perplexo. O Mestre soube o que eu havia feito durante a adoração! O que mais eu podia fazer a não ser ficar calado enquanto ele me repreendia?" Como resultado, não somente a antiga atitude de A. ficou completamente destruída, mas a nova atitude não-dualista sendo difícil de ser captada e assimilada rapidamente, foi também mal interpretada; e em nome do Não-dualismo comportava-se como um ateu, às vezes agindo de forma contrária às prescrições das escrituras. Apesar do Mestre, de vez em quando, ensinar-lhe a verdade do Não-dualismo e afetuosamente, mostrar-lhe o erro que estava cometendo nos seus atos do dia a dia, levou muito tempo depois da morte do Mestre para que A., guiado por essa atitude, pudesse ajustar suas ações diárias àquele ideal. 6. Para os devotos que pensam que os esforços das Encarnações de Deus para alcançar a verdade ou para sua manifestação mais plena na vida são simples simulação, nossa resposta é que jamais ouvimos o Mestre expressar esse ponto de vista. Ao contrário, muitas vezes o ouvimos dizer: "Quando o Divino diverte-Se exatamente como um ser humano, comporta-Se como um homem comum e experimenta o bem e o mal, alcançando a perfeição pelo esforço pessoal, diligência e austeridade." A história das religiões do mundo testemunha isso, senão o verdadeiro propósito da Divindade encarnando-Se, seria malogrado. Os ensinamentos do Mestre sobre as questões do livre arbítrio e da auto-entrega podem ser classificados em duas categorias. De um lado ele expressou o seguinte a seus devotos: "Cozinhei a comida, agora sentem-se para comê-la. O molde está preparado, agora coloquem suas mentes nele e tomem forma. Se não puderem fazer nada, dêem-me sua procuração". Por outro lado o
encontramos também instruindo assim: "Abandonem todos os desejos, um por um. Este é o caminho para serem bem sucedidos. Sejam como uma folha carregada pelo vento. Abandonem a luxúria e a avidez e chamem por Deus. Fiz todas as dezesseis partes, façam pelo menos uma para vocês mesmos." Parece que nosso progresso na vida é muitas vezes retardado porque não compreendemos o significado desses dois conjuntos de ensinamentos do Mestre e não sabemos equilibrar livre arbítrio e predestinação, esforço e auto-entrega. Um dia em Dakshineswar tivemos uma longa discussão com um dos nossos amigos, Swami Niranjananda, sobre livre arbítrio e predestinação e não sendo capazes de chegar a qualquer conclusão, fomos até o Mestre para que ele resolvesse nossa dificuldade. A princípio divertiu-se com nossa discussão infantil, mas então acrescentou com seriedade: "Há alguém que tenha livre arbítrio ou coisa parecida? É somente pela vontade de Deus que as coisas têm acontecido e acontecerão. O homem compreende isto com o correr do tempo. Então algo tem que ser acrescentado. Assim, quando uma vaca está amarrada a um mourão com uma longa corda, pode andar a distância de um cúbito do poste ou pode andar todo o comprimento da corda à sua escolha, assim também é o livre arbítrio do homem. O homem amarra a vaca com a idéia, deixe-a deitar-se, ficar de pé ou mover-se como quiser dentro daquela área. De maneira semelhante Deus deu ao homem algum poder. Deu-lhe também liberdade para utilizá-la como quiser. É por isso que o homem sente-se livre, mas a corda continua amarrada ao mourão. Anotem: se alguém orar a Deus com humildade, Ele pode removê-lo para outro lugar e atá-lo ali; ou pode aumentar o comprimento da corda ou até tirá-la completamente do seu pescoço." Assim instruídos, perguntamos: "Será por isso que o homem não tem qualquer responsabilidade quanto às práticas espirituais? Poderá dizer: 'O que eu fizer está de acordo com a vontade de Deus.' O Mestre respondeu: "De que vale simplesmente falar assim? São palavras vazias. Não há qualquer utilidade em dizer: 'Não há espinho, ele não está espetando, quando na realidade grita 'ui', assustado, ao tocar o espinho. Se os homens fossem livres para praticar Sadhana, todos o teriam feito. Por que não podem? Há contudo uma coisa: Deus não dá mais poder a uma pessoa se o pouco dado não for adequadamente usado. Por isso o esforço individual e a perseverança são necessários. Não vêem que cada um deve fazer esforço, embora pequeno, antes de obter a graça de Deus? Quando se faz assim as experiências pelas quais se deve passar em dez vidas frutificarão numa e o homem atingirá a realização espiritual imediatamente. Deve-se, entretanto, fazer algum esforço. Ouçam a história: 7. "Vishnu, que Se diverte eternamente em Goloka, por qualquer razão amaldiçoou Narada dizendo que ele iria para o inferno. A ansiedade de Narada não conheceu limites. Cantou hinos. Seu louvor e tratou de agradá-Lo. Disse então: 'Ó Senhor, quero saber o que é e onde o inferno está e quantas espécies de inferno há. Por favor seja misericordioso e conte-me tudo a respeito. Vishnu então desenhou no chão, com um giz, o céu, a terra e o inferno como eles estão situados e disse: 'Este é o céu e este é o inferno.' Narada disse: 'É assim? Minhas experiências de sofrimento no inferno podem ser passadas aqui também.' Assim falando rolou no inferno desenhado no chão, levantou-se e inclinou-se profundamente ante o Senhor. Vishnu disse: 'O que é isso? Pode ser este o inferno de sofrimento?' Narada respondeu: 'Por que não, Senhor? Não são o céu e o inferno criações Suas? Quando o Senhor desenhou o inferno e chamou-o como tal o lugar realmente tornou-se um inferno e quando rolei nele, foi realmente um inferno de sofrimentos para mim.' Narada falou assim com uma profunda fé. Foi por isso que Vishnu disse: 'Que assim seja.' Narada havia rolado naquele inferno desenhado no chão com verdadeira fé e devoção. Foi fazendo esse pequeno esforço que seu sofrimento foi anulado." O Mestre explicava de tempos em tempo, com a ajuda dessa história, como também havia lugar para perseverança e esforço individual no campo da graça. 8. As Encarnações de Deus têm que sentir, em larga extensão, a cegueira espiritual e o ilimitado conhecimento experimentado por nós quando Elas assumem corpos humanos e representam seus papéis como seres humanos. Têm que fazer esforços, como nós, para descobrir a saída da escuridão espiritual e da ignorância. Embora a consciência de sua real natureza divina surja em suas mentes de vez em quando, durante pouco tempo, essa consciência permanece velada até que se torne firme por sua descoberta através da prática de Sadhanas. Assim, para o bem de muitos, Elas têm que tomar um véu de Maya e tatear o caminho como todos nós, no campo da luz e da escuridão, mas como estão livres de qualquer desejo egoísta obtém uma percepção mais vívida do caminho espiritual e do objetivo. Então, concentrando todas as tremendas energias que há n'Elas, resolvem os problemas da vida muito rapidamente e depois empenhamse em trabalhar para o bem do mundo. 9. Embora nosso Mestre, o homem-Deus tivesse de fato aceito as imperfeições
humanas, muito bem nos advém com o estudo dos seus sentimentos humanos. É por isso que aconselhamos a nossos leitores estudarem sua natureza divina mantendo, ao mesmo tempo diante de seus olhos, também, suas características humanas. Se não o tivéssemos como um de nós, não seríamos capazes de descobrir qualquer propósito por trás de seu empenho sobre-humano, perseverança etc., durante sua Sadhana. Então se levantará a pergunta: Por que lhe foi necessário tanto esforço se ele já era perfeito? Não podemos, também, fugir da idéia de que esses grandes esforços, ameaçando sua própria vida, fossem somente um engodo. Isso não é tudo. Por essa razão não representa nenhuma lição ou consolo para o homem comum em sua luta espiritual. Sentimos real a luta contra as forças opressoras da ignorância e somente o exemplo da vitória de uma luta verdadeira e não um engodo, pode servir-nos de modelo e trazer-nos esperança e alegria em nosso objetivo. 10. Dependendo como somos da graça do Mestre, devemos aceitá-lo como um ser dotado de sentimentos humanos como nós, pois não é a sua simpatia com nossos pesares que nos conduz a ir em frente para removê-los? Portanto, olhando de qualquer ângulo, não temos outro caminho, senão pensar nele como possuidor de sentimentos humanos. Enquanto nós pessoalmente não tivermos livres de todos os tipos de ligadura e estabelecidos na natureza de Brahman sem atributos, teremos de pensar e aceitar Deus e Suas Encarnações como dotados de sentimentos humanos. O ditado, "Ao tornar-se Deus, uma pessoa deve ser adorada.", é realmente verdadeiro. Se você tiver atingido o plano Nirvikalpa de consciência por virtude do Samadhi, somente então será capaz de compreender a verdadeira natureza de Deus, ter uma concepção correia d'Ele e realmente adorá-Lo, mas se você não foi capaz de fazê-lo, sua adoração será somente uma tentativa de elevar-se àquele plano divino e de se fazer capacitado para a verdadeira adoração de Deus. Até então deve considerar Deus a causa do universo, dotado de sentimentos humanos a par de poderes extraordinários. 11. As pessoas que podem realmente pôr em prática o dictum: "Ao tornar-se Deus, uma pessoa deve ser adorada", são muito raras. Fracos aspirantes como nós, estamos muito longe daquele estado. Assim, sentindo compaixão por mortais comuns como nós e desejando aceitar nossa adoração sincera, Deus desce ao plano dos seres humanos, com a aparência de Deushomem ao assumir o corpo e os sentimentos humanos. Estamos numa posição vantajosa para estudar a história da luta espiritual do Mestre, em comparação com as dos Deus-homens do passado; porque o próprio Mestre delineava com detalhes, de tempos em tempos, os fatos de seu período de Sadhana, em cores tão brilhantes que ficaram firmemente impressos em nossas mentes. Há também o maravilhoso papel de sua vida como aspirante encenado diante de todas as pessoas do templo de Kali antes de irmos até lá. Muitas dessas pessoas ainda vivem e por isso, tivemos a oportunidade de ouvir delas aqueles acontecimentos. Isto à parte, antes de começarmos a estudar a história desses acontecimentos é bom que recapitulemos uma vez mais, o caminho geral dos princípios fundamentais da Sadhana. Por isso faremos uma breve exposição desse assunto.
CAPÍTULO I SADHAKA E SADHANA (O ASPIRANTE ESPIRITUAL E A DISCIPLINA ESPIRITUAL) ASSUNTOS: 1. Concepções errôneas sobre Sadhana. 2. A Sadhana é o meio para a realização de Brahman em todos os seres. 3. A ilusão esconde a Verdade; A causa da ilusão é um mistério. 4. A realização dos sábios é a Verdade; por que? 5. A ilusão, embora compartilhada por muitos, não é o conhecimento correio. 6. Por que todos têm a mesma ilusão. 7. O Universo está além do tempo e do espaço; Prakriti é sem começo. 8. A Sadhana é o esforço para conhecer a causa universal. 9. Os dois caminhos da Sadhana. 10. O objetivo do caminho "Não é isto, Não é isto," é saber "Quem sou eu?" 11. Nirvikalpa Samadhi. 12. O Nirvikalpa Samadhi e o caminho de "Isto, Isto". 13. As Encarnações: combinação do divino e do humano.
Para nos familiarizar verdadeiramente com o estado mental do Mestre como Sadhaka, devemos antes de mais nada, saber o que é Sadhana. Pode-se levantar uma objeção: por que aumentar o tamanho do livro introduzindo este tópico, tão familiar às pessoas na Índia que têm sempre praticado Sadhana de uma forma ou de outra? Que outra nação no mundo aplicou e ainda está aplicando seus poderes para realizar diretamente as verdades do campo espiritual, como este país tem feito, desde o despertar dos tempos? Em que outro país nasceram tantas Encarnações de Deus e tantos conhecedores de Brahman? Portanto é supérfluo descrever outra vez princípios fundamentais da disciplina espiritual para nós que já estamos familiarizados com eles.
1. Embora o que dissemos seja verdadeiro, uma necessidade real será atendida, porque as pessoas geralmente têm idéias fantásticas a respeito da Sadhana em diversos lugares. Tendo perdido o contato com as tradições autênticas, elas geralmente identificam Sadhana com a prática de dureza física fora do comum com rituais feitos em lugares inacessíveis, utilizando materiais raros obtidos em diversos lugares, com retenção de respiração e até com feitos fantásticos de mentes desequilibradas. Também consideram peculiares essas práticas originalmente prescritas por algumas grandes almas a fim de trazerem à normalidade mentes obsedadas por más impressões e hábitos maus, como Sadhana, e essas são pregadas como adequadas a todos. Há ainda outros, que não tendo desapego e desejando ardentemente desfrutar os objetos fugazes dos sentidos, como formas belas e pratos saborosos, passam suas vidas em vãos esforços com a ilusão de que o Senhor, a causa do universo, poderia ser coagido através de certos Mantras e práticas, como as serpentes o são. Por isso não é fora de propósito fazer uma breve revisão das verdades sobre a Sadhana, descoberta pelo esforço e perseverança dos sábios e videntes da Índia ao longo de milênios. 2. O Mestre costumava dizer: "Ver Brahman ou Deus em todos os seres é a última palavra em Sadhana." Este é o propósito final das disciplinas espirituais e os Vedas e os Upanishads, as escrituras mais autorizadas dos hindus, sustentam essa idéia. Tudo o que se vê no mundo, denso ou sutil, sensível ou insensível - telhas e vigas, lama e pedra, plantas e árvores, homens e animais, deuses e semideuses - são todos, dizem, o Brahman não-dual. É somente a realidade de Brahman que se vê, se ouve, se toca, se cheira e se prova em diversas formas. Embora toda conduta do dia a dia, ao longo da vida, esteja n'Ele, não se está consciente d'Ele e pensa-se que se esteja lidando com coisas e pessoas diferentes. Isso será facilmente compreendido se descrevermos aqui, através de perguntas e respostas, a essência das dúvidas a respeito dessas doutrinas e assim como as respostas dadas nas escrituras. Pergunta: Por que esse fato (que estamos experimentando o Brahman não-dual e não objetos e pessoas individuais), não é diretamente percebido por nós? Resposta: Vocês estão em ilusão. Como podem detectá-la enquanto não for removida? Somente pela comparação com coisas e estados reais descobriremos as ilusões externas e internas. De forma semelhante vocês devem ter uma espécie de conhecimento comparativo, se quiserem descobrir aquela ilusão. 3. Pergunta: Bem, qual a causa da ilusão? E quando ela surgiu em nós? Resposta: A causa da ilusão aqui é a mesma que em qualquer lugar. É a ignorância. Como podem saber quando essa ignorância aparece? Enquanto estiverem em ignorância, seus esforços para conhecer sua origem são inúteis. Ao sonhar, a pessoa permanece convencida de que o sonho é real. Quando o sono acaba, o sonho é comparado com o estado de vigília e é reconhecido como irreal. Vocês poderão objetar que certas pessoas têm, às vezes, a sensação de que estão dormindo, quando na realidade estão no próprio estado de sonho. Mas também obtém esse conhecimento da memória do estado de vigília. De maneira semelhante, algumas pessoas têm a memória da realidade do Brahman nãodual, quando estão conscientes do mundo no estado de vigília. Pergunta: Então qual a saída? Resposta: A saída é remover aquela ignorância. Posso dizerlhes com certeza que essa ignorância e ilusão podem ser removidas. Os antigos videntes foram capazes de removê-las e deixaram instruções sobre seu método. 4. Pergunta: Muito bem, mas antes de prosseguirmos para conhecer esses meios, queremos fazer uma ou duas perguntas. O senhor afirma que é irreal aquilo que nós e muitos outros vemos e sentimos como real: o senhor considera que somente é real o que alguns sábios viram e experimentaram. Não será que a percepção deles estava errada? Resposta: Não existe a regra de que o que muitos acreditam é sempre o verdadeiro. Digo que o conhecimento dos videntes é verdadeiro, porque com aquele conhecimento alcançaram a liberdade do medo em todos os aspectos e desfrutaram paz eterna destituída de qualquer tipo de infelicidade. Além disso esse conhecimento lhes trouxe a consciência de um grande propósito por trás das lutas e sofrimentos sem sentido que terminam com a morte. Além disso, o reconhecimento desenvolve sempre na mente humana, tolerância, contentamento, compaixão, humildade e outras nobres qualidades dotando-a de uma magnanimidade maravilhosa. Sabemos pelas escrituras que os videntes possuíam aquelas qualidades e poderes incomuns e nós as encontramos em pessoas que, seguindo seus passos, alcançaram a perfeição. 5. Pergunta: Bem, como todos nós temos a mesma ilusão? O que identifico como um animal é também conhecido por vocês como um animal e não como um homem; e assim é com tudo o que existe. É inacreditável que, a totalidade das pessoas tenha a mesma ilusão sobre todas as coisas, ao mesmo tempo. Vê-se em todos os lugares que se poucas pessoas tiverem um conhecimento
errado de uma determinada coisa, há muitas que têm a percepção correta . Mas aqui esta verdade está contraditada. Portanto o que o senhor diz não parece ser provável. 6. Resposta: Aqui vocês encontram uma exceção à regra, porque não incluem entre as pessoas, os poucos videntes que têm o conhecimento correto. Por outro lado a réplica está na resposta à própria pergunta anterior. (Isto quer dizer que a aceitação de que um grupo de pessoas veja um fenômeno de maneira diferente da que os outros percebem, é suficiente para não provar a universalidade contida na pergunta sobre a percepção daquelas pessoas ignorantes.) Além disso, em resposta à sua pergunta, como todas as pessoas estão sob a mesma ilusão, as escrituras dizem: na mente cósmica sem limites e infinita o universo surgiu devido à ideação (imaginação criativa) e como as mentes individuais de vocês, minha e de todas as pessoas são parte e estão compreendidas naquela mente cósmica, estamos todos unidos para experimentar as ideações dessa mente do mesmo modo. É por isso que não podemos, por nossos próprios esforços, ver um animal como outra coisa. É por essa mesma razão que enquanto um de nós alcança conhecimento reto e liberta-se daquela ilusão, todos os outros continuam como antes na mesma ilusão. (Por esta razão o vidente iluminado sai dessa magia universal de ilusão ao realizar sua identidade com o conhecimento dessa mente cósmica ou a Própria Pessoa Divina e participando dela, enquanto os outros continuam no mesmo estado de ilusão.) Para compreender essa idéia, mais um ponto sobre a mente cósmica da Pessoa Divina, deve ser entendido, que embora o universo surja na mente da Pessoa onipresente que tudo penetra, por ideação, Ela não fica mergulhada na escravidão da ignorância como nós, centros de consciência envolvidos nela. Isso porque Ela, a Pessoa que tudo conhece vê a Realidade não-dual de Brahman interpenetrando a ideação, tanto dentro como fora do universo nascido da ignorância. Não podemos fazê-lo porque o nosso caso é diferente. O sábio iluminado, ao contrário de nós, é aquele que obtém o conhecimento ou a percepção interior da Pessoa Divina que tudo conhece, pela identificação em ser ou ter a consciência com Ela. Portanto ele se torna livre da ilusão da ignorância cósmica, à qual estamos sujeitos.) O Mestre mais tarde elucidou a natureza da Pessoa Divina inatingível, dizendo: "Uma cobra tem veneno na boca. Come diariamente por meio dela mas permanece não afetada pelo veneno. Qualquer um que ela morda, entretanto, encontra a morte instantaneamente." 7. Por isso, do ponto de vista das escrituras, sabemos que o universo, uma idéia na mente universal é, também, de certo modo uma ideação de nossas mentes pois nossas mentes limitadas têm uma relação eterna e inseparável com a mente universal agregada, semelhante àquela dos membros e do corpo. Também não se pode dizer que houve um tempo em que a ideação acima mencionada não tenha existido na mente universal e que tenha vindo à existência posteriormente. As duas categorias, nome e forma, ou espaço e tempo, sem as quais não poderia haver qualquer diversidade, estão incluídas na idéia do universo; em outras palavras, elas tem uma coerência eterna e inseparável com a referida idéia. Pensando com um pouco mais de calma, o leitor será capaz de compreender isso e saber porque os Vedas e outras escrituras ensinam que Prakriti ou Maya, o último material da criação, é sem começo e além do tempo. Se o universo é uma idéia mental e essa idéia não está dentro do que compreendemos por "tempo", segue-se que simultaneamente com a idéia de "tempo", a idéia de "universo" também existe na mente cósmica, suporte daquela idéia. Como nossas mentes individuais limitadas vêm experimentando essa idéia (isto é o universo) por um tempo infinitamente longo, temos a firme crença na existência real do universo. E tendo sido privado do conhecimento imediato da realidade do Brahman não-dual por longo tempo, não reconhecemos que o universo seja uma simples idéia e que somos incapazes de reconhecer nosso erro. Pois, como já foi dito, somente pela comparação com coisas e estados reais é que podemos reconhecer os erros externos e internos. 8. Agora está claro que nossa concepção, experiência etc. do universo assumiram suas formas atuais como resultado de hábitos acumulados por um tempo quase que infinitamente longo. Assim, se quisermos ter o conhecimento correto do universo teremos que estar familiarizados com a entidade além de nome e forma, tempo e espaço, mente e intelecto e todas as coisas abrangidas pelo universo. A luta por esse conhecimento tem sido descrita como Sadhana pelos Vedas e outras escrituras: e os homens e mulheres que estão lutando nessa direção consciente ou inconscientemente, são chamados Sadhakas. 9. Falando de forma geral, o esforço acima mencionado na busca da realidade além do universo, tem tomado seu curso através de dois principais canais: um é aquele que tem sido chamado nos Sastras como Neti, Neti (Isto não, Isto não) 1 (1 Brihadaranyaka Upanishad 2, 3, 6 e de fato todos os Upanishads o advogam. O restante das escrituras hindus, baseado na parte dos Vedas de "trabalho", enfatizam o caminho de "Isto, Isto".) ou o caminho do conhecimento; e o outro é Iti, Iti (Isto, Isto) ou o caminho
da devoção. O aspirante que segue o caminho do conhecimento tem desde o início, uma concepção do Ideal Supremo; e sempre O tendo na lembrança, vai adiante, conscientemente, na
direção daquele Ideal. O viajante do caminho da devoção ignora muitas vezes onde irá, no final. Aceita ideais cada vez mais elevados, um após outro, na medida em que caminha para frente e, por fim, conhece diretamente a realidade não-dual além do universo. Essa é a única diferença entre os dois; porque os viajantes, em ambos os caminhos, têm que renunciar ao conceito de universo do homem comum. O homem, no caminho do conhecimento, tenta desde o começo, renunciar a ele em todos os aspectos e embora o devoto prossiga em parte renunciando, em parte retendo-o, ele também por fim renuncia a ele completamente e chega à verdade, "Uno sem segundo." A renúncia dessa concepção comum do universo colorido pelo centro do nosso eu, que fez do prazer o único objetivo da vida, foi chamada, pelas escrituras, desapego ou despaixão (Vairagya). Como a vida humana está sempre mudando e deve acabar com a morte, o conhecimento da transitoriedade do mundo vem naturalmente à mente humana. É possível, portanto, que no passado a busca pela causa última do universo tenha tomado em primeiro lugar o caminho do "Isto não, Isto não", juntamente com a renúncia completa do conceito comum do universo. É por isso que o desenvolvimento completo pelo caminho do conhecimento ocorreu nos Upanishads antes que o caminho da devoção se tornasse completo em todos os aspectos, embora estivessem simultaneamente em voga. 10. Os Upanishads testemunham o fato que o homem avançou nesse caminho de negação e tornou-se introspectivo em pouco tempo. Descobriu que de todas as entidades do mundo, seu corpo e sua mente são os mais íntimos e imediatos objetos de conhecimento. Parecem-lhe que ele obteria o conhecimento da causa do universo mais cedo, se continuasse a buscá-lo mais através de seu corpo e de sua mente, do que através do mundo exterior. Se assim como "somente pressionando com os dedos um grão de arroz na panela, pode-se saber se todos os grãos estão bem cozidos ou não," assim também, logo que uma pessoa puder conhecer em si mesma, a eterna causa universal, poderá também conhecê-la nas outras coisas e pessoas. É por isso que a investigação e compreensão de "Quem sou eu?" torna-se o único objetivo do aspirante no caminho do conhecimento. 11. Dissemos anteriormente que a idéia do universo, mantida pela maioria das pessoas, deve ser renunciada tanto por homens no caminho do conhecimento, como por aqueles no caminho da devoção. Por sua completa renúncia o homem se torna livre de todas as modificações mentais e por conseguinte, pronto para o Samadhi. Esse tipo de Samadhi é chamado nas escrituras, Nirvikalpa Samadhi. Falaremos ao leitor mais adiante (cf.III.3) como o aspirante no caminho do conhecimento esforça-se para conhecer "Quem sou eu?", como alcança o Nirvikalpa Samadhi e qual a experiência que tem nesse momento. Agora, deve-se explicar ao leitor como o aspirante no caminho da devoção chega à realização daquele estado supraconsciente. Designamos o caminho da devoção como o caminho de "Isto, Isto". Pois, embora o viajante nesse caminho tenha conhecimento verdadeiro da transitoriedade do mundo, ele crê em Deus, seu criador e está convencido da realidade e existência do mundo criado por Ele. O devoto olha e mundo e todas as coisas e pessoas como relacionadas com Deus, tornando-as Suas. Ele afasta tudo o que considera obstáculo no caminho que conduz à realização desse relacionamento. É o ideal imediato do devoto ficar absorvido em Deus pelo amor e pela meditação de Suas formas 2 (2 Consideramos a adoração do Brahmo Samaj como meditação numa forma de Deus, porque quando se medita numa personalidade que possui nobres qualidades, mas sem forma, somos levados a pensar numa ou outra dessas coisas como éter, água, ar, fogo etc.) e também, tudo fazer por amor a Ele.
12. Vamos agora discutir como, esquecendo a existência do universo, uma pessoa atinge o estado de consciência chamado Nirvikalpa, estando absorvido na meditação das formas de Deus. Já dissemos anteriormente que o devoto aceita como seu Ideal Escolhido uma forma particular de Deus e continua a pensar e a meditar naquela forma. No começo não pode trazer para seus olhos mentais, na hora da meditação, a figura completa da pessoa de seu Ideal Escolhido. Às vezes as mãos daquele quadro mental, às vezes os pés e às vezes somente o rosto, aparecem diante dele, dissolvendo-se, por assim dizer, logo que são vistos; não permanecem diante dele. Como resultado da prática, quando a meditação se aprofunda, o quadro completo daquela forma aparece diante de seus olhos mentais. Quando a meditação se aprofunda, o quadro se apresenta em uma continuidade vívida e ininterrupta, enquanto a mente permanece firme e inabalável. Depois de acordo com o aumento da intensidade da meditação, o devoto torna-se consciente do movimento, do sorriso, da fala e por fim, do toque daquela forma viva. Então o devoto vê, de olhos abertos ou fechados, a presença viva e bondosa do Senhor e Seus movimentos graciosos em todos os lugares e sob quaisquer condições. O aspirante sincero gradualmente tem visões de várias formas divinas emanando do próprio Ideal Escolhido, como resultado de sua fé que "seu Ideal assumiu, por sua própria vontade, todas as formas." O Mestre costumava dizer: "Quem tiver a visão dessa forma como uma presença viva, obtém facilmente a visão de todas as outras formas."
"Do que foi dito antes, uma coisa está clara. Aquele que tem a boa fortuna de ter a visão dessas formas vivas sente que elas pertencem ao campo das idéias e da experiência durante a meditação, e que elas têm uma existência real como as coisas e as pessoas do estado de vigília. Assim, à medida que se aprofunda o sentimento de que essas experiências do mundo das idéias são reais como as do mundo exterior, intensifica-se a convicção de que essas últimas são uma projeção mental. Durante a meditação profunda, as experiências no campo das idéias tornam-se tão poderosas na mente do devoto, que ele não tem o mais leve conhecimento do mundo exterior nesse momento. Esta condição do devoto foi chamada de "Savikalpa Samadhi". Contudo, devido à força de seu poder mental, o mundo exterior se desvanece da mente do devoto por ocasião desse Samadhi, mas o campo das ideais ainda persiste. Sua experiência do Ideal Escolhido nesse mundo de ideais e a alegria que o devoto experimenta não são menos intensas e reais para ele do que aquelas do mundo de vigília e seus contatos com os homens e com as coisas do mundo. Todas as idéias, sem exceção, que surgem naquele momento em sua mente têm por objeto somente seu Ideal Escolhido. As escrituras denominam essa condição mental do devoto Savikalpa Samadhi, porque naquele momento as modificações mentais do devoto têm uma coisa como objeto principal. Assim o mundo exterior denso desaparece da mente do devoto devido à meditação num objeto particular no campo do mundo ideal, porque, quando uma idéia predomina, todas as outras desaparecem. Atingir o Nirvikalpa Samadhi não está muito longe desse aspirante sincero que foi capaz de avançar tanto. Assim a mente que se liberta da crença da existência do mundo externo com o qual esteve familiarizado durante um período bem longo fica dotada de muito mais força e determinação. A totalidade dessa mente vai adiante, com entusiasmo, na direção do prazer da felicidade divina, quando então, fica convencido que o prazer daquela felicidade se torna mais intenso se puder ficar completamente livre de modificações. Então a pessoa sobe ao plano mais elevado no campo das idéias, pela graça de seu instrutor e de Deus e se estabelece firmemente no conhecimento não-dual, alcançando a paz eterna. Ou pode-se dizer que o amor intenso pelo Ideal Escolhido lhe mostra aquele plano e impelido por ele, realiza sua identidade com aquele Ideal, como as Gopis de Vraja. 13. Estes são os caminhos estabelecidos pelas escrituras para quem trilha os caminhos do conhecimento e da devoção para alcançar o objetivo final. Mas como as Encarnações Divinas são dotadas, simultaneamente, de natureza humana e divina durante toda a vida, elas são às vezes, vistas manifestando conhecimento e poder de uma pessoa perfeita, ainda no período de sua Sadhana, o que acontece porque têm naturalmente o poder de morar em ambos planos, o divino e o humano. Ou porque, sendo sua natureza divina inata e espontânea, às vezes atravessa o véu externo de sua natureza humana e manifesta-se de tempos em tempos. Qualquer que seja nossa conclusão, esses fatos fizeram as vidas das Encarnações de Deus impenetravelmente misteriosas para o intelecto humano. Não parece provável que esse mistério intricado seja algum dia solucionado completamente, mas é certo que um bem infindável advém ao homem se ele estudar essas vidas com reverência. Na antiga Era Purânica, a natureza humana das Encarnações de Deus era mantida oculta e somente o aspecto divino era manifestado. Nesta cética era moderna, a natureza divina desses seres tem sido completamente desconsiderada, enquanto o lado humano é altamente enaltecido. No presente exemplo faremos um esforço para explicar ao leitor pela discussão desses dois aspectos, que ambas as naturezas coexistem nelas. Não é necessário acrescentar aqui que não fomos capazes de considerar o caráter das Encarnações de Deus dessa maneira, se não tivéssemos tido o privilégio de encontrar o grande Mestre e observar sua vida e seus feitos. CAPÍTULO II A ATITUDE DE UM SADHAKA NA VIDA DA ENCARNAÇÃO DE DEUS ASSUNTOS: 1. Coexistência do divino e do humano no Mestre. 2. O mesmo com todas as Encarnações. 3. As Encarnações não têm desejos egoístas. 4. Sua compaixão: empreendem Sadhana para o bem dos outros. 5. A ilustração do "Bosque de Felicidade". 6. As Encarnações e o autocontrole. 7. Os inúmeros desejos da mente. 8. O Mestre abandona os desejos. 9. A instrução às devotas. 10. A luta das Encarnações contra os desejos sutis. 11. A refutação da objeção sobre os sentimentos humanos das Encarnações. 12. A mesma coisa observada de outro ponto de vista. 13. Diferenças de enfoque a partir de diversos planos de consciência. 14. As Encarnações vistas de um exaltado plano de consciência. 15. A evolução da mente das Encarnações. 16. Sua consciência que tudo abrange. 17. As ciências naturais não podem revelar a causa do universo. 18. A absorção espiritual na infância das Encarnações. 19. O êxtase do Mestre aos seis anos de idade. 20. O êxtase durante a peregrinação a Visalakshi. 21. O êxtase no Sivaratri.
1. Abençoados com a oportunidade de estar na companhia sagrada do divino Mestre, ficamos encantados em notar a maravilhosa coexistência de tantos aspectos de divindade e humanidade em sua pessoa. Quanto mais tivemos a chance de observar sua vida e seu caráter mais ficamos convencidos desse fato. Se não o tivéssemos visto, jamais teríamos compreendido como tais aspectos contraditórios poderiam coexistir naquela doce congruência e harmonia numa mesma pessoa. Foi porque os observamos nele, que cresceu em nós a convicção de que era Deus e homem numa só pessoa e que era exatamente o que o infinito ser de Deus e Seu poder são, quando manifestados por trás do véu de um corpo e sentimentos humanos. Devido à nossa experiência direta, viemos a compreender que ele não fingiu nenhum dos aspectos, mas na realidade assumiu a natureza humana para o bem da humanidade e mostrou-nos o caminho que conduz à divindade. Assim também porque tivemos a felicidade de vê-lo, tornamo-nos convencidos de que certamente havia maravilhosas manifestações de ambos os aspectos na vida das Encarnações em épocas passadas. 2. Encontraremos a mesma verdade ao estudarmos com reverência a vida de quaisquer Encarnações de Deus. Veremos que impelidos por um maravilhoso poder desconhecido, elas estão às vezes no mesmo plano de consciência que qualquer outro ser humano e comportam-se como nós mesmos em relação a todos os objetos e pessoas do mundo. Mas outras vezes nós as encontramos elevando-se aos mais altos planos e trazendo-nos informações sobre o desconhecido. Mesmo sem terem consciência, alguma Força faz esses arranjos e ajustes e suas ações parecem ser guiadas por Ela. Isso acontece desde sua infância. Obtendo de vez em quando uma indicação daquela Força em si mesmos desde tenra idade, não podem a princípio compreender que Ela faz parte delas ou permanece dentro delas. Também não podem utilizar aquela Força à vontade para se elevarem a planos espirituais mais elevados, ver todas as coisas e pessoas do mundo à luz da consciência divina e lidar com elas, mas à medida que vão tendo experiências mais freqüentes dessa Força em suas vidas, dia após dia, um forte desejo de estarem completamente familiarizados com Ela surge em suas mentes. Esse desejo lhes dá um ardor e entusiasmo ímpares e as induz a fazerem disciplina espiritual. 3. Não existe, contudo, o mais leve vestígio de egoísmo naquele desejo das Encarnações de Deus, para não falar que elas não têm qualquer desejo pelo gozo dos pequenos prazeres dos sentidos nesse mundo e no outro e até mesmo a idéia de que possam se liberar e desfrutar infinita felicidade independentemente do destino dos outros. O único motivo detrás de sua busca é a necessidade de saber com certeza se essa extraordinária e desconhecida Força realmente existe como pano de fundo do universo ou se é uma simples elaboração da sua própria imaginação - essa Força extraordinária, sob cuja orientação e direção experimentam desde o nascimento idéias ímpares e incompreensíveis aos homens e por cuja vontade sentem tudo no campo das idéias como tendo existência tão real como a das coisas e pessoas conhecidas no mundo denso. Pois, comparando seu conhecimento e suas experiências com os das pessoas comuns, ficam convencidas em pouco tempo de que aquelas pessoas não têm o mesmo conhecimento sobre a natureza das coisas e das pessoas do mundo, como elas próprias sempre conseguiram ter e que a elas falta quase completamente o poder de ver o mundo de um mais elevado plano de consciência. 4. Isso não é tudo. Ficam convencidas simultaneamente de outro fato por aquela comparação. Por que elas vêem o mundo de duas maneiras diferentes, de dois planos de consciência - o ideal e o material - os prazeres fugazes oferecidos pelos sentidos como visão, gosto etc., não podem seduzi-las, como acontece com os seres humanos em geral e as densas nuvens de desânimo e angústia que surgem com o reverso da sorte, não anuviam sua mente. Por isso suas mentes compassivas tornam-se completamente absorvidas na luta por obter completo controle sobre aquela Força. Daí alçarem-se a planos cada vez mais elevados de consciência, aí permanecendo o tempo que quiserem a fim de ensinar as pessoas de todas as classes e condições, do mais alto ao mais baixo, a atingirem os estados mais elevados de realização e encontrarem a paz. Assim, duas poderosas correntes, a da Sadhana e a da compaixão são sempre vistas fluindo lado a lado em suas vidas. A compaixão das Encarnações aumenta cem vezes ao comparar-se sua própria condição àquela dos seres humanos comuns. Ninguém, contudo, conhece a fonte de sua infinita compaixão. Deve ser inata. Nada mais pode ser acrescido a isso. Vamos citar uma ilustração do Mestre: 5. "Três amigos foram passear no campo. Ali viram uma área cercada por um muro alto, de onde vinham doces sons de música, vocal e instrumental. Atraídos pela música, quiseram saber o que acontecia lá dentro. Rodearam o muro e descobriram que não havia entrada. O que podiam fazer? Um deles procurou uma escada e chegou ao topo do muro, enquanto os outros dois permaneceram embaixo. O primeiro homem subiu e ficou fora de si de alegria ao ver o que
estava acontecendo lá dentro. Deu uma gargalhada e pulou. Não pôde nem mesmo contar aos dois que estavam embaixo o que haviam visto. Os dois amigos pensaram: 'Ah, o nosso amigo é interessante! Nem mesmo contou-nos o que viu. Temos que ver o que está dentro!' Então o segundo deles subiu pela escada. Chegando em cima do muro, como o primeiro, também deu uma gargalhada e pulou. O que o terceiro homem fez então? Subiu pela escada e viu muita alegria lá dentro. Vendo isso seu primeiro pensamento foi pular e juntar-se a eles. Mas analisou o que ocorria, pensando: 'Se agora eu me reunir a eles, as pessoas de fora não poderão saber que há um lugar aqui para se desfrutar essa felicidade. Devo desfrutá-la sozinho?' Assim pensando, desceu de volta para o campo. Então começou a contar a todos o que acontecera: 'Escutem, há um mercado de felicidade aqui. Venham, vamos desfrutar dele juntos.' Assim levou todas as pessoas consigo para se reunirem naquele campo de felicidade. Vejam, assim como não podemos encontrar a causa da inclinação do terceiro amigo em partilhar o divertimento com muitos, também não podemos explicar porque o desejo de fazer bem à humanidade está presente nas Encarnações desde sua infância." 6. Do que foi dito, talvez alguns cheguem à conclusão que as Encarnações de Deus não têm que lutar como nós contra os sentidos turbulentos. Podem concluir que os sentidos são naturalmente submissos como crianças a essas pessoas divinas no curso de suas vidas e que por isso é muito fácil para elas retirar sua mente dos objetos dos sentidos dirigindo-a para as verdades espirituais. Mas temos que dizer que não é assim. Tendo assumido o papel humano são como todas as pessoas e têm que sair vitoriosas na luta contra sua natureza inferior, antes de prosseguirem na direção da meta espiritual. 7. Qualquer pessoa que tenha tentado conhecer um pouco da natureza da mente humana pode ver que começando do denso, nela existem muitas camadas de desejos - sutis, mais sutis e ainda mais sutis. Se vocês forem capazes de ir além de um desejo, outro vem e obstrui seu caminho e quando conquistarem o último, outro toma o lugar. Quando vocês tiverem deixado para trás os densos, os sutis vêm e se opõem. Se abandonarem a sedução de sexo, a do ouro surge em seu lugar; se deixarem de ceder a eles, de uma maneira grosseira, o apego à beleza exterior, o desejo de nome e fama e outros desejos vêm. Ou, se pela força evitarem todos os apegos, uma vez mais manifestam-se secretamente na forma de falso abandono de atividades ou pseudo-simpatia pelos outros. 8. O Mestre falava dessa natureza traiçoeira da mente e sempre nos aconselhava a nos afastar da rede dos desejos. Para nos convencer, às vezes citava exemplos de sua própria vida, como ele pensou ou agiu em circunstâncias semelhantes. Narrava-os repetidamente a todas as devotas, bem como aos homens e acendia o amor de Deus em seus corações. O seguinte incidente tornará isso claro: Homem ou mulher, quem quer que fosse ao Mestre ficava tão atraído no fundo de seu coração por sua amabilidade, cortesia e extraordinário amor, sem qualquer motivo egoísta, que eram impelidos a procurar sua abençoada companhia repetidamente, sempre que houvesse oportunidade. Não somente o visitavam muitas vezes, mas levavam pessoas de suas relações para que elas também pudessem desfrutar da felicidade pura em sua companhia. Certa tarde, uma pessoa de nossas relações foi ao Mestre em Dakshineswar com a filha de seu padrasto e com a irmã do falecido marido. O Mestre perguntou-lhe como estavam e iniciou a conversa que tratava do assunto de que o único objetivo da vida humana é a prática da devoção amorosa a Deus. "Pode alguém", continuou, "facilmente tomar refúgio no Senhor? Inescrutáveis são os caminhos de Mahamaya! Será que Ela permite isso? Mahamaya faz com que alguém, que não tem parentes no mundo, crie um gato e leve uma vida mundana. Essa pessoa vai procurar leite para o gato e diz: 'O que posso fazer? O gato só se alimenta de peixe e leite.' 9. "Talvez a pessoa venha de uma família rica e nobre. Marido e filhos morreram. As que ficaram para trás são viúvas, vivendo como se não houvesse morte para elas. Algumas partes da casa estão caindo em pedaços, outras já não existem mais. Mudas de baniano e hortaliças, como espinafre, cresceram no telhado. As viúvas colhem o espinafre para o curry e continuam sua vida mundana! Mas por que? Por que não tomam refúgio no Senhor? Certamente é o tempo para o fazerem, mas não o farão! "Também, talvez uma tenha perdido o marido logo após o casamento e tenha-se tornado uma viúva-menina. Agora ela é uma viúva crescida sem filhos. Por que não chama Deus? Ela não o fará. Torna-se governanta na casa do seu irmão. Com o cabelo preso em cima e com o molho de chaves pendurado no canto da roupa, ela se movimenta com arrogância, dando ordens a todos. Vendo-a os vizinhos fogem para evitar sua presença malévola. E ela vai dizendo: 'Meu irmão não pode tomar uma refeição se eu não estiver lá.' Ah, que mulher má! Por que ela não olha para o que lhe aconteceu - o que, afinal de contas, ela teve para si mesma!"
Bem, houve uma coincidência peculiar aqui. A terceira senhora do grupo, que estava conhecendo o Mestre naquele dia pela primeira vez, era uma governanta desse tipo na casa do irmão. Ninguém havia falado ao Mestre sobre isso antes, mas ao longo da conversa o Mestre referiu-se àquele exemplo e começou a explicar a influência poderosa dos desejos e a existência de infinitas camadas de desejos na mente humana. É desnecessário dizer que aquelas palavras entraram fundo no coração da senhora. Ouvindo os exemplos, a irmã da senhora de nossas relações, cutucou-a e sussurrou: "Irmã, imagine, tais palavras saíram dos lábios do Mestre hoje mesmo! Como minha cunhada as entenderá?" A isso nossa amiga respondeu: "O que podemos fazer? É o prazer dele. Ninguém o informou." 10. Torna-se muito claro do estudo da natureza do homem que quanto mais alto a mente humana se eleva, mais intensamente os desejos sutis o penalizam. Aquele que cometeu furtos, pronunciou falsidades ou entregou-se à licenciosidade inúmeras vezes, não é penalizado ao repetir esses atos, mas o homem honesto e elevado considera-se deprimido só com o pensamento dessas coisas. Embora as Encarnações de Deus sejam muitas vezes vistas reprimindo-se de prazeres mundanos densos durante toda a vida, também têm que lutar contra os desejos sutis de sua mente, mas com uma diferença. Ao contrário de nossa mente endurecida, sua mente pura e sensível sente, como testemunhada por si mesmas, uma terrível angústia, cem vezes mais intensa do que a nossa, ao menor despertar desses desejos sutis internos. Como podemos, portanto, considerar as lutas para retirar seus sentidos, dos objetos de vista e gostos e outras faculdades dos sentidos, como fingidas? 11. Talvez agora, algum leitor familiarizado com as escrituras possa dizer: "Como posso aceitar o que o senhor diz? Não vê o que Sankara, o modelo dos monistas, diz no início do seu comentário do Gita sobre o nascimento e tomada de um corpo humano por Sri Krishna? Diz: 'Deus eternamente livre, eternamente desperto e eternamente puro por natureza, o controlador de todos os seres vivos, destituído de nascimento etc., nasceu, por assim dizer e possuindo um corpo através de Maya, Seu próprio poder, para o bem da humanidade.' Quando o próprio Sankara diz isso, como pode aquela afirmação manter-se?" Sem contradizer Sankara, dizemos que ainda temos razão suficiente para nos apoiar. Para compreender Sankara, devemos lembrar-nos de uma coisa. Assim como ele vê a posse de nome e forma de Deus como aparentes, assim também, nossa posse deles é igualmente falsa. Ele considera o universo como uma falsa super-imposição sobre a realidade de Brahman e não admite sua existência real. 1 (1 Ver os comentários de Sankara sobre Adhyasa no Brahma-Sutra-Bhashya. ) Por isso, sua conclusão será compreendida ao tomarmos em conjunto ambas as afirmações. Não é sua intenção que devemos olhar a tomada de corpo e experiência de dor e de prazer da Encarnação como falsa aparência e olhar essas coisas de nossa parte somente como reais. Se assim aceitarmos nossos próprios sentimentos e percepções devemos aceitar os de uma Encarnação também como reais. O que dissemos anteriormente, portanto, ainda prevalece. 12. Isto será claramente compreendido se for discutido de um outro ponto de vista. As escrituras dizem que duas concepções distintas do mundo levantam-se em nós quando as olhamos de dois planos de consciência, o não-dual e o dual. Se nos elevarmos até esse último plano e tentarmos compreender até que ponto consideramos o universo como real, teremos o conhecimento imediato que ele não existe nem jamais existiu. Só há a realidade de Brahman, 'Somente o Uno, sem segundo'; enquanto que se olharmos do plano dual, o mundo, como o agregado de vários nomes e formas, parece ser real e eternamente existente, como ele está agora conosco, seres humanos comuns. Embora possuindo corpos, as Encarnações e as pessoas liberadas em vida, destituídas da consciência do corpo, como são, moram muitas vezes no plano não-dual de consciência. Por isso têm a convicção, mesmo vivendo no plano da dualidade, que o mundo é irreal, como um sonho. Apesar de, comparado com o estado de vigília, o sonho seja tomado como irreal, o sonho de um sonhador durante a sonhação não pode ser chamado de absolutamente irreal. Assim também, comparada com o estado de absorção em Brahman, a aparência do mundo, nas mentes das Encarnações e pessoas liberadas em vida, é irreal; mas quando não estão em Samadhi isso não pode ser olhado como absolutamente irreal. 13. Assim como o que se chama mundo é visto de duas maneiras diferentes a partir dos dois planos acima mencionados, também uma determinada pessoa nele, é vista como dois seres diferentes a partir daqueles dois planos de consciência. Vista do plano da dualidade, ela é conhecida como pessoa ligada ao mundo; e vista do plano não-dual, infinito, ela é considerada Brahman, eternamente livre e eternamente pura. O plano não-dual, infinito, é a região mais elevada no campo das idéias. A mente humana passa por planos de consciência cada vez mais elevados, antes de atingir o plano não-dual, que é a meta. Enquanto a mente do aspirante elevase àquelas regiões cada vez mais elevadas, tanto o universo como um indivíduo nele, assumem
formas diferentes e suas concepções prévias sobre elas mudam de várias maneiras: por exemplo, para ela o mundo parece então ser constituído somente de idéias e um indivíduo particular parece estar separado do corpo e dotado de poderes extraordinários, ou constituído de mente ou de luz celestial. 14. Se um homem comum aproximar-se de uma Encarnação de Deus com devoção e reverência, eleva-se inconscientemente aos planos de consciência cada vez mais elevados mencionados anteriormente. Naturalmente ele obtém aquele poder de ascensão devido aos poderes maravilhosos da Encarnação. Olhando a Encarnação desse vantajoso terreno, recentemente conquistado, o aspirante devotado reconhece-A somente como Divindade pura com poderes maravilhosos e portanto, interpreta o elemento humano na Encarnação como mera dissimulação por compaixão ao homem comum. À medida que sua devoção se aprofunda, o aspirante devoto é visto a princípio tendo aquela concepção sobre esses devotos de Deus e, em seguida, sobre o mundo inteiro, Sua criação. 15. Já foi dito que desde a infância as Encarnações divinas percebem o mundo das idéias com a mesma intensidade e vividez que vêem os objetos do mundo dos sentidos, mas como seu poder de percepção mais elevado se desenvolve com o correr do tempo, começam a atribuir maior validade ao mundo das idéias. Finalmente, alcançando a Não-dualidade e o Conhecimento do Uno Sem segundo, origem de todos os mundos de nome e forma, alcançam a perfeição e o auge de seus poderes. Tais fatos são também verdadeiros no caso das almas liberadas em vida (Jivanmukta). Existe a diferença de que elas têm que fazer muito esforço durante toda a vida para alcançar essa realização, enquanto as Encarnações a alcançam em muito pouco tempo. Ou então, se elas (Jivanmuktas) são logo bem sucedidas, manifestam muito pouco poder de liberar os outros, comparado com o das Encarnações Divinas. Há um dito do Mestre sobre esse ponto: "A diferença entre o Jiva e uma Encarnação consiste somente no grau de manifestação de poder." 16. Desfrutando conhecimento imediato da causa do universo, as Encarnações moram por algum tempo no plano não-dual e logo descem a planos mentais inferiores. Aos olhos das pessoas comuns elas se parecem com seres humanos, mas na realidade, não o são. Tornaram-se super-homens ou homens-deuses. Depois de terem o conhecimento direto tanto do universo como de sua causa, sentem que o universo tem uma existência comparativamente sombria. Os poderes elevados de suas mentes continuam então a manifestar-se por si mesmos para o bem da humanidade. Têm, naquele momento, o conhecimento do começo, meio e fim de todas as coisas e atingem a onisciência. Somente então nós, seres fracos, vemos seu extraordinário caráter e ação. Suas palavras doces infundem esperança e também indicam-nos que a intuição do Absoluto, que traz o conhecimento imediato da causa do universo, não é possível enquanto não tivermos eliminado todas as modificações mentais causadas pela percepção do mundo exterior e de seus objetos. 17. O leitor bem versado na cultura ocidental, dirá: "Tudo está perdido agora. O senhor tomou sua posição enfraquecida, falando como a fábula da rã no poço. Aquele que conhece o quanto o conhecimento do homem progrediu e está diariamente progredindo como resultado da investigação dos objetos do mundo exterior, vivos ou não-vivos, não pode jamais aceitar o que o senhor diz." A isso respondemos: “Admitimos o que vocês dizem sempre sobre o progresso das ciências materiais, mas a verdade última jamais poderá ser realizada através delas; porque vocês se contentam em considerar a causa do universo como insensível ou em conseqüência, a uma entidade inferior a você mesmo. Com o progresso da ciência vocês fizeram que o desfrutar sempre crescente da visão, dos gostos etc., fosse o único objetivo de suas vidas. Portanto, mesmo se puder ser provado no futuro, com a ajuda do método científico, que todas as coisas do mundo, sensíveis ou insensíveis têm sua origem numa única substância insensível, as verdades no campo subjetivo permanecerão sem serem investigadas, verificadas e para sempre escondidas de todos. Sem a renúncia dos desejos e a conseqüente aquisição da tendência mental introspectiva (o que é impossível se os desejos se multiplicarem) vocês jamais poderão conhecer a verdade transcendental e indivisível e obter a força de convicção e a conseqüente liberdade. 18. Foi dito que todas as Encarnações, de vez em quando, elevam-se a altos estados de consciência desde a mais tenra infância. Por exemplo, de tempos em tempos Krishna fez seus pais e amigos realizarem sua divindade de diversos modos, mesmo durante sua meninice. Enquanto passeava pelo jardim, Buda, ainda criança, entrou em êxtase, sob uma figueira santa, chamando assim a atenção dos deuses e dos homens. Jesus atraiu pássaros silvestres em sua infância pelo poder do seu amor e alimentou-os com suas próprias mãos. Sankara, quando menino, impressionou sua mãe por seu poder espiritual e renunciou ao mundo. Em seus
primeiros anos, Chaitanya foi tomado de emoções espirituais e deu indicação que um amante de Deus vê a manifestação d'Ele em todas as coisas, boas ou más. Não faltam também, esses acontecimentos na vida do Mestre. Mencionaremos aqui alguns como exemplo para que o leitor compreenda esse ponto. Dessas palavras, recontadas pelo próprio Mestre, compreendemos que ele teve a experiência dessa participação no mundo das idéias, durante sua infância. Ele disse: 19. "Nesta parte do país (Kamarpukur) dá-se para as crianças arroz tostado, servido em pequenas cestas. Aquelas que não têm essas cestas em casa, colocam-no nas pregas de sua roupa. Enquanto brincam nos campos, algumas crianças comem o arroz das cestas e outras, das pregas de suas roupas. Eu estava então com seis ou sete anos de idade. Um dia peguei o arroz tostado de uma cestinha e estava comendo enquanto passeava pelos estreitos caminhos dos campos de milho. Era o mês de Jyashtha ou Ashadh. Numa parte do céu apareceu uma linda nuvem de chuva. Eu olhava para ela enquanto comia o arroz. Em seguida a nuvem cobriu quase todo o céu. Um bando de grous brancos como a neve surgiu voando contra o fundo daquela nuvem escura. Tudo parecia tão lindo, mas logo fiquei absorvido num estado extraordinário. Esse estado permaneceu e minha consciência externa desapareceu. Caí e todo o arroz espalhou-se pelo caminho. As pessoas viram e levaram-me para casa. Essa foi a primeira vez que, em êxtase, perdi a consciência exterior." 20. O vilarejo de Anur está situado a mais ou menos duas milhas ao norte de Kamarpukur, terra natal do Mestre. A Deusa Visalakshi é uma presença viva. As pessoas do vilarejo vizinho, perto ou longe, fazem adoração e oferendas à Deusa, para a realização de diversos desejos. Quando são atendidas, vêm oferecer adoração e sacrifícios, na época propícia. Não é necessário dizer que as mulheres são comparativamente mais numerosas do que os homens, entre os peregrinos visitantes. A maioria vai com oferendas votivas, pela recuperação de doenças. Até hoje são vistos pequenos grupos de aldeãs, de famílias socialmente elevadas, vindo adorá-La, cantar e contar histórias sobre a primeira aparição e revelação da Deusa e andar pelos campos, sem medo. Kamarpukur e os vilarejos vizinhos foram mais populosos e prósperos durante a infância do Mestre, do que são agora. Isto é evidente ao vermos as casas de tijolos, desertas e quebradas, cobertas de mato, templos dilapidados e decaídos, palcos para danças religiosas e similares, abandonados. Deduzimos, portanto, que os peregrinos para a Deusa2 (2 É difícil determinar se o nome é Vishalashmi ou Visalakshi. Vishahari é o outro nome da deusa Manasa, encontrado nos antigos textos bengali. A palavra Vishahari pode ser transformada em Vishalkshimi. Também, descrevendo a forma de Manasa, a palavra Visalakshmi é usada em livros como Manasa-mangala. Assim também, Manasa talvez seja Vishalakshimi ou Visalakshi. A adoração da Deusa é vista em muitos lugares. Vimos um lindo templo dessa Deusa em nosso caminho de Kamarpukur a Ghatal. Ficamos convencidos de que a adoração era bem feita ali, pois vimos o hall de música, o reservatório, o jardim etc. juntos ao templo. )
em Anur eram então mais numerosos. A Deusa mora no campo a céu aberto. Os agricultores constroem todos os anos uma cobertura de folhas para proteger o lugar da chuva e do sol. Há uma indicação, nas ruínas vizinhas, de que houve no passado um templo feito de tijolos. Perguntados a esse respeito os aldeões disseram que a Deusa demoliu-o por Sua vontade. Contam a seguinte história: "Os pastores do vilarejo são os companheiros queridos da Deusa. Chegam pela manhã, soltam as vacas e sentam-se; contam histórias, cantam e jogam. Apanham flores silvestres e enfeitam-nA. Apanham o dinheiro e os doces oferecidos à Deusa pelos peregrinos e divertem-se. Ela não pode passar sem as brincadeiras deles. Um dia, um homem rico do vilarejo, tendo seu pedido atendido, construiu aquele templo e ali entronou a Deusa. O sacerdote do templo vinha todas as manhãs e tardes fazer o culto, mas agora ele fechava a porta do templo quando ia embora após o serviço. Aqueles que vinham fazer a adoração em horas diferentes do culto, ofereciam seus presentes respeitosos à Divindade através da treliça da porta. Por esta razão os pastores não podiam mais apanhar o dinheiro, comprar doces, oferecê-los à Deus, comê-los e divertirem-se. Com tristeza no coração eles oraram, implorando: "Mãe, Tu nos privaste de nossa festa. Seu dinheiro nos permitia ter doces diariamente. Quem agora nos dará essas coisas para comer?" "A Deusa", acrescentaram os aldeões, "ouviu a queixa dos rapazes de coração puro e o templo apresentou uma rachadura tão grande, naquela mesma noite, que, no dia seguinte, o sacerdote colocou rapidamente a Deusa fora do templo e a pôs ao ar livre, senão a imagem ficaria sepultada sob os escombros. Desde então quem tentasse reconstruir o templo, era avisado, pela Deusa, em sonhos ou de outro modo qualquer, que isso não era de Seu agrado." Os aldeões dizem que algumas pessoas foram ameaçadas e intimidadas pela Deusa. Ela dizia-lhes em sonhos: " Estou bem aqui no campo, com os jovens pastores; se você me confinar num templo eu o arruinarei. Não conservarei vivo um só membro de sua família." O Mestre tinha oito anos. Ainda não havia sido investido com o cordão sagrado. Um dia, algumas senhoras pertencentes às famílias respeitáveis do vilarejo, sairam em grupo para
cumprirem a promessa de oferenda à Visalakshi. Entre elas estavam uma ou duas senhoras da própria família do Mestre e também, Prasanna, a irmã viúva de Dharmadas Laha, a quem o Mestre tinha em alto conceito de pureza, amabilidade, simplicidade e espiritualidade. Muitas vezes falou com a Santa Mãe para seguir os conselhos de Prasanna em todos os assuntos. Ele também, de vez em quando, falava sobre Prasanna com as devotas. Desde sua infância ela alimentou sincera afeição sincera pelo Mestre. Por diversas vezes o teve como o Próprio Deus. Sendo pessoa de coração simples, ficava encantada ao ouvi-lo contando as histórias sagradas de deuses e deusas e canções devocionais. De vez em quando perguntava-lhe afetuosamente: "Gadai, o que é isso que, por diversas vezes, você me dá a impressão de ser o Próprio Deus? Sim, sinto sinceramente assim." Gadai ouvia isso e sorria docemente, mas nada dizia; ou, então, puxava outros assuntos e procurava desviar-se da pergunta. Mas Prasanna não se convencia com aquelas palavras. Dizia sinceramente com um aceno: "Qualquer coisa que disser, você não é um mortal comum." Prasanna construiu um templo e nele instalou as imagens de Radha e Krishna e ela própria costumava fazer o serviço diário. Em ocasiões festivas realizavam-se ali, apresentações dramáticas com canções e danças. Mas Prasanna raramente ouvia essas canções. Perguntada a esse respeito, ela dizia: "Ouvi canções cantadas por Gadai e nenhuma outra soa tão doce. Gadai estragou meus ouvidos." Claro, esses acontecimentos ocorreram muito tempo depois. Quando viu as mulheres partindo, Gadai disse: "Eu também vou com vocês." Embora as mulheres dissessem que era uma distância grande para ele andar, Gadai manteve-se firme em sua decisão de ir com elas. As senhoras ficaram mais felizes que aborrecidas; porque, quem não ficaria encantado com a companhia de uma criança que está sempre alegre e feliz? Além disso, apesar de sua pouca idade, Gadai sabia de cor todas as canções e versos sobre deuses e deusas. No caminho ele certamente repetiria algumas delas, a pedido. Além disso, não haveria problemas se ele sentisse fome na volta, porque elas levavam comida, leite etc., já oferecidos à divindade. Então, qual o impedimento? O que poderia preocupar se Gadai fosse com elas? Assim as senhoras pensaram sobre o assunto e sem hesitação deram início à viagem, com Gadai. Gadai também foi alegremente com elas e como era esperado, contou histórias e cantou canções sobre deuses e deusas. Mas, à medida que ia cantando a glória de Visalakshi, algo inesperado ocorreu, antes de terem atravessado o campo. O menino subitamente parou de cantar; seu corpo e membros ficaram rígidos e paralisados. Torrentes de lágrimas escorriam incessantemente de seus olhos e ele nem mesmo respondia aos chamados repetidos e afetuosos, enquanto elas tentavam reanimá-lo. As mulheres temiam que a criança, desacostumada em andar grandes distâncias, tivesse tido uma insolação. Trouxeram água de um pequeno lago próximo, despejaram um pouco em sua cabeça e aspergiram alguma em seus olhos mas ele não voltou a si. Ficaram ansiosas e sentiram-se impotentes. Qual a saída? Como seria dada a oferenda prometida e a adoração feita à Deusa? E como Gadai seria levado para casa, em segurança? Não havia um único homem na vizinhança para ajudá-las. O que teria que ser feito? As senhoras estavam em grande apuro e esqueceram-se de tudo a respeito de deuses e deusas. Sentaram-se em volta da criança e às vezes abanavam-na, às vezes aspergiam água e novamente chamavam-na pelo nome. Algum tempo passou assim. Prasanna subitamente sentiu em seu coração: "Será que uma influência extática da Deusa caiu sobre a criança de coração puro? Já não ouvi dizer que uma influência extática de divindades vem aos homens, mulheres e crianças que são puros e de coração simples como ele?" Prasanna expressou esse pensamento às outras senhoras e pediu-lhes que repetissem, com a mente concentrada, o nome de Visalakshi, em lugar de "Gadai". As senhoras sentiam reverência por Prasanna, por seu caráter puro. Prontamente acreditaram em suas palavras e dirigiram-se ao menino, como se fosse a Deusa e disseram repetidamente: "Ó Mãe Visalakshi, por favor sê graciosa conosco! Salve-nos, Mãe! Por favor sê misericordiosa conosco! Por favor levanos a um refúgio seguro, Mãe!" Maravilha das maravilhas! Mal havia chamado o nome da Deusa algumas vezes e o rosto de Gadai brilhou com um doce sorriso e sinais de uma fraca consciência exterior foram vistos. Elas sentiram-se confiantes e estavam certas que uma influência extática da Deusa havia caído sobre a criança. Saudaram-na repetidamente, dirigindo-se a ela como Mãe e orando. 3 (3 Dizem que algumas mulheres, pela intensidade de sua devoção, ofereceram ao menino os artigos que levavam para a Deusa. ) Aos poucos a criança recobrou a consciência exterior e voltou a seu estado normal novamente. Mas estranhamente nenhum cansaço ou fraqueza foram notados em seu corpo, como conseqüência das mudanças que haviam ocorrido pouco tempo antes. Com devoção transbordante, as senhoras chegaram ao templo da Deusa com Gadai. Ofereceram a Ela a adoração devida, voltaram para casa e contaram tudo à mãe de Gadai. Ela ficou assustada e
naquele dia fez uma adoração especial a Raghuvir pelo bem-estar de Gadai. Também saudou Visalakshi e fez-Lhe uma adoração especial. Um outro evento na vida de Sri Ramakrishna serve como testemunha do fato de que, desde a infância, ele subia de vez em quando a elevados planos. Ocorreu assim: Uma família de Suvarna-vanikas 4 (4 Classe de negociantes, inicialmente negociantes (vanikas) em couro (suvarna). ) vivia um pouco a sudoeste da propriedade ancestral do Mestre em Kamarpukur. A família dos Pynes era nesse época, muito próspera, o que pode ser constatado até hoje através do templo de Shiva em tijolos e decorado com desenhos artísticos. Um ou dois membros dessa família ainda estão vivos, mas a construção está em ruínas. Dizia-se no vilarejo que os Pynes eram muito ricos. A casa enchia-se de gente. Eram ricos fazendeiros que possuíam grandes extensões de terras, muito gado e arado e recebiam uma boa renda com seus negócios. Mas os Pynes não eram ricos como os membros do vilarejo. Pertenciam a uma classe média alta da sociedade. O chefe da família Pyne era muito religioso. Jamais quis mudar sua casa para uma de tijolos, embora estivesse em condições de fazê-lo. Sempre viveu numa casa de dois andares5 (5 Feita de bambu, madeira e terra, mas sem tijolos. ) com paredes de barro, mas como tinha tijolos cozidos, contratou um bom pedreiro e mandou construir um belo templo. Seu nome era Rasiklal. Não teve filhos, mas muitas filhas. Não sabemos porque todas suas filhas, embora casadas, viviam na casa do pai. Disseram-nos que a caçula atingiu a adolescência quando o Mestre estava com dez ou onze anos. Todas as filhas eram bonitas e devotadas aos deuses e Brahmanas. Sentiam muito afeto pelo menino Gadai, seu vizinho. Em sua infância, o Mestre passava muito tempo com aquela família religiosa e mesmo agora nos contaram as muitas "leela" ("jogo" divino) do Mestre na casa dos Pynes, quando atingia altos planos de consciência. Ouvimos do próprio Mestre o acontecimento que agora descreveremos. Parece que os devotos de Vishnu e os de Siva viviam em grande harmonia em Kamarpukur. Ainda hoje o anual "Setenta e duas horas de canto das glórias dos nomes de Vishnu", assim como o "Gajan" de Siva, são celebrados com grande pompa. O número de templos de Siva, contudo, era maior de que o de Vishnu. Muitos dos Suvarnavanikas eram vaishnavas beatos. A fé vaishnava prevalecia entre as pessoas dessa classe, desde que o Senhor Nityananda iniciou Uddaran Datta e libertou-o das ligaduras mundanas. Os Pynes de Kamarpukur eram devotos de Vishnu e Siva e o chefe da família Pyne costumava tomar o nome de Hari três vezes ao dia como prescrito, mas ao mesmo tempo, havia instalado Siva e costumava observar o voto de Sivaratri, todos os anos. Durante o Sivaratri costumava ser organizada uma representação dramática naquele templo de Siva para ajudar os devotos a manterem vigília durante a noite. 21. Certa vez, por ocasião do Sivaratri, foram feitos os arranjos habituais para uma apresentação dramática. O elenco pertencia ao vilarejo vizinho. Tinham que apresentar algumas cenas indicativas da grandeza de Siva. A peça devia começar mais ou menos meia hora depois do crepúsculo. Ao cair da tarde soube-se que o menino que ia representar o papel de Siva estava seriamente doente. Não se encontrava ninguém que pudesse substituí-lo. O proprietário perdeu todas as esperanças e propôs, com humildade, que a apresentação fosse transferida. O que poderia ser feito? Como a vigília iria se manter durante a noite? As pessoas mais velhas reuniram-se para estudar o assunto. Enviaram um recado ao proprietário, perguntando se ele poderia conduzir o drama naquela noite caso fosse encontrada uma pessoa para fazer o papel de Siva. A resposta foi afirmativa. O conselho do vilarejo novamente foi consultado para saber se havia alguém que poderia fazer o papel de Siva. Embora Gadai fosse jovem, conhecia muitas canções sobre Siva e tinha uma aparência apropriada para fazer o papel. Ficou, então, acertado que ele seria chamado. Quanto a algumas palavras que deveriam ser ditas durante aquele papel, isso seria resolvido pelo proprietário. Gadadhar foi consultado e quando viu que todos estavam ansiosos, concordou. A peça, como combinado, começou meia hora antes da noite. Dharmadas Laha, o proprietário de terras do vilarejo, era um grande amigo do pai do Mestre. Seu filho mais velho, Gayavishnu e o Mestre eram grandes amigos. Quando Gaya-vishnu soube que seu amigo iria representar Siva, ele e seus companheiros começaram a vesti-lo de acordo. O Mestre vestiu a indumentária de Siva, sentou-se no salão verde e estava pensando em Siva, quando foi chamado a entrar no palco. Um de seus amigos veio buscá-lo. Chamado pelo amigo, o Mestre ascendeu a um estado de grande abstração mental e sem olhar para qualquer direção, aproximou-se do palco com passos tranqüilos e vagarosos e ficou ali imóvel. A platéia sentiu uma emoção divina indescritível e imperceptível e foi tomada de alegria e admiração ao ver o Mestre vestido daquela maneira, coberto de cinzas e cabelos emaranhados, de jeito calmo e digno. A platéia ficou particularmente encantada em testemunhar aquele olhar celestial interior e fixo e aquele sorriso gentil de seus lábios. Como os aldeões estavam inclinados a fazer,
subitamente gritaram o nome de Hari. Algumas mulheres pronunciaram o auspicioso som "ulu" e outras sopraram a concha. Depois para restabelecer a ordem na platéia o proprietário começou a recitar hinos a Siva mesmo antes do barulho diminuir. Embora a platéia se tornasse um pouco mais calma, ainda gesticulava e se cutucava, murmurando em voz baixa: "Bravo, como Gadai está bonito! Nunca pensamos que o menino fosse fazer o papel de Siva tão bem; seria muito bom se pudéssemos tê-lo de alguma maneira e formar um grupo yatra nosso." Gadadhar, contudo, permanecia o tempo todo em pé na mesma postura. Além disso, incessante torrente de lágrimas escorriam por sua face. Algum tempo se passou assim e Gadadhar não falava nem se movia. Então o proprietário e um ou dois anciãos do vilarejo foram até o menino e viram que suas mãos e pés estavam insensíveis e que ele não tinha qualquer consciência exterior. O barulho então duplicou. Alguns gritavam: "Agua! Agua! Joguem um pouco de água nos seus olhos e rosto." Alguns disseram: "Abanem-no!" Outros: "Uma influência extática de Siva deve ter caído sobre ele; pronunciem o Seu nome!"- e ainda outros murmuravam: "O menino estragou todo o divertimento; é claro que agora a peça não pode continuar." Por fim, a platéia se dispersou, enquanto o menino não pôde ser trazido à consciência exterior, de nenhuma maneira. Algumas pessoas carregaram Gadadhar para casa, em seus ombros. Aquele êxtase, disseram-nos, não terminou aquela noite apesar de muito esforço e houve grande agitação na casa. Voltou a seu estado normal no dia seguinte depois do nascer do sol. 6 (6 Alguns dizem que ele permaneceu em êxtase, continuamente, durante três dias. ) CAPÍTULO III A PRIMEIRA MANIFESTAÇÃO DA ATITUDE DE UM SADHAKA ASSUNTOS: 1. Os exemplos posteriores de percepção espiritual na infância. 2. Seis aspectos do caráter do Mestre. 3. Sua memória prodigiosa. 4. Forte determinação. 5. Curso infinito. 6. Amor à alegria. 7. Constituição natural da mente do Mestre. 8. Sua repulsa pela educação ganha-pão. 9. O Mestre no Jhamapukur Tol em Calcutá. 10. A ignorância de Ramkumar pelo enfoque de seu irmão. 11. A condição mundana de Ramkumar.
1. Além dos acontecimentos que já mencionamos, são conhecidos muitos outros fatos relativos à absorção do Mestre em estados espirituais em sua infância. Sabemos dessa natureza de sua mente, ligadas a muitos outros pequenos assuntos. Por exemplo, o ceramista do vilarejo fazia imagens de Siva, Durga e outras divindades. Durante um passeio o Mestre, com uns amigos, foi até ele. Olhou para as imagens durante um certo tempo e subitamente disse: "O que é isso? Será que os olhos de uma divindade são desse modo? Devem ser feitos assim." Dizendo isso explicou ao ceramista a maneira pela qual as linhas deveriam ser modeladas e os olhos retratados, de maneira que a expressão do poder sobre-humano, a compaixão, a interioridade e a felicidade pudessem ser mostrados, dotando a imagem de uma aparência viva, divina. Todos ficaram assombrados pensando como o menino Gadadhar podia compreender e explicar tudo isto sem que lhe tivesse sido ensinada aquela arte. Mas ninguém pôde encontrar a razão. Citando outra ocorrência: desejando adorar uma divindade, em brincadeira com seus amigos, fez a imagem daquela divindade ou delineou-a de uma forma tão linda na tela, que as pessoas ao vê-la, pensavam que era trabalho de um perito ceramista ou pintor. Também uma afirmação inesperada e espontânea do Mestre a alguém tirou uma dúvida que há muito tempo estava em sua mente. Aquela pessoa obteve a chave para seu caminho espiritual e a capacidade de regular sua vida futura. Admirada com isso, esteve propensa em pensar que seu Ideal Escolhido, na pessoa de Gadai, lhe mostrara o caminho por compaixão. Além disso o menino Gadai maravilhou a todos, resolvendo com uma simples palavra, o problema que os eruditos, bem versados nas escrituras, não haviam conseguido solucionar. 2. Não é verdade que cada um dos incidentes ímpares que ocorreram nos primeiros tempos da vida do Mestre fosse expressão de seus poderes divinos, de um plano mais elevado de consciência. Embora alguns deles fossem dessa natureza, podemos classificar os outros em seis grandes divisões, a saber, aquelas indicativas de sua maravilhosa memória, seu forte poder de julgamento, sua firmeza e forte determinação, sua infinita coragem, seu amor pela alegria e seu ilimitado amor e compaixão. Mas a pureza, o inegoísmo e a fé ímpar constituíram um fator comum de todos e parecia que esses constituintes inatos de sua natureza estavam reagindo de tempos em tempos ao impacto de várias situações mundanas erigindo ondas de memória, julgamento, determinação, coragem, alegria, amor e compaixão. O leitor terá uma compreensão correta do que dizemos ao darmos alguns exemplos aqui. 3. Uma vez realizou-se uma representação teatral sobre a vida de Rama e Krishna.
Muitas pessoas, inclusive Gadadhar, assistiram. Todas esqueceram-se das canções e das palavras sagradas dos Puranas no dia seguinte e estavam ocupadas em continuar com objetivos egoístas. Mas não havia fim às emoções espirituais produzidas na mente de Gadai! O menino reuniu os amigos no vizinho pomar de mangas, para ensaiá-los e desfrutarem aquela felicidade. Fez todos decorarem o quanto possível, os papéis dos diferentes personagens do drama. Tomou para si mesmo o papel principal e começou a apresentar a peça. Os agricultores, de coração simples, que aravam os campos vizinhos, ficaram encantados vendo o desempenho dos meninos e imaginaram como eles, tendo ouvido a peça somente uma vez, puderam decorar quase todas as palavras e canções. 4. Na época de sua investidura com o cordão sagrado, o menino insistia, contra o costume da família e da sociedade, que ele deveria ter a primeira cerimônia de esmolas, de Dhani, uma mulher da casta de ferreiros (cf. pág.68). Encantado pela afeição e devoção daquela senhora e atraído por sua intensa oração, o menino punha de lado as restrições da sociedade, roubando curry, molho etc., cozidos por aquela mulher de casta inferior e comendo-os. Temerosa, Dhani proibiu-lhe que o fizesse, mas não conseguiu fazer o menino desistir. 5. Os Sannyasins Naga, com seus cabelos emaranhados e corpos cobertos de cinzas sempre geravam medo na mente dos meninos, nas cidades e nos vilarejos. Há uma crença corrente em toda Bengala de que esses faquires atraíam os jovens; quando surgia uma oportunidade, raptavam-nos, levando-os para lugares distantes a fim de reuni-los a seu grupo. Bandos desses faquires e vairagis viajavam diariamente naquela época para o sul de Kamarpukur, pela estrada que ia até Puri, a morada de Jagannath. Vinham ao vilarejo, mendigavam o alimento, descansavam um dia ou dois e depois partiam para seu destino, Embora os amigos de Gadai tivessem medo daqueles homens devido às crenças que prevaleciam sobre eles, Gadai estava acima desses medos. Misturava-se com grupos desses mendicantes logo que os via e agradava-os com seu serviço e conversa doce. Costumava passar muito tempo com eles para observar sua conduta e comportamento. Às vezes, a pedido deles, compartilhava da comida que ofereciam à sua Divindade e voltando para casa, relatava à sua mãe o que havia feito. Desejoso de imitá-los por sua admiração ao tipo de vida que levavam, um dia ele apareceu diante da mãe, com o corpo todo coberto de cinzas, usando uma tanga e kaupina, feita à moda deles, de pedaços da roupa nova com que seus pais lhe haviam presenteado. 6. Muitas pessoas das camadas mais baixas da sociedade do vilarejo não sabiam ler o Ramayana e o Mahabharata. Quando queriam ouvir a leitura desses livros, geralmente convidavam um Brahmana ou alguém de sua própria casta para explicar os épicos. Quando chegava alguém que sabia ler, ofereciam-lhe água para lavar os pés, fumo, um bom assento enquanto lia e, na falta deste, uma esteira nova. Assim reverenciada, a pessoa enchia-se de orgulho e egoísmo. Amante do divertimento, Gadadhar, com aguda inteligência, observava bem de perto e estudava os modos do expositor das escrituras - como sentavam-se numa plataforma elevada diante da platéia do vilarejo, como gesticulava enquanto recitava os versos dos textos com tom afetado e como, a cada vez, esforçavam-se em mostrar erudição e superioridade sobre as pessoas sentadas diante dele. Depois, Gadai imitava o maneirismo e a voz do homem, causando grandes risadas e muita alegria entre as pessoas. Pelo estudo dos fatos do começo da vida do Mestre, compreendemos a natureza da mente com a qual ele estava equipado para empreender a disciplina espiritual. Sentimos que uma mente assim poderia realizar tudo o que empreendesse, jamais esqueceria o que ouvisse e que rejeitaria sem titubear tudo que considerasse obstáculo em seu caminho para a realização do objetivo desejado. Compreendemos que esse coração faria todas as ações no mundo confiando firmemente em Deus, em si mesmo e na natureza divina que se encontra no interior de todos os seres humanos. Nenhuma idéia que tivesse o menor vestígio de estreiteza mental lhe seria aceitável, muito menos as mentes mesquinhas e impuras e somente o amor, a pureza e a compaixão regulariam-na o tempo todo, em todos os assuntos. Seria também realizado que nenhuma idéia, tanto no seu próprio coração ou no coração dos outros seria capaz de enganá-lo, escondendo sua natureza. Enquanto prosseguimos estudando suas Sadhanas, nos seria de ajuda compreender sua exclusividade se nos recordarmos bem de perto o que foi dito sobre a constituição de seu coração e de sua mente. 8. Vemos a primeira manifestação definitiva da atitude de um aspirante, quando ele estava na escola do irmão, em Calcutá - no dia em que Ramkumar, o irmão mais velho, repreendeu-o pedindolhe que aplicasse a mente na aquisição do conhecimento, ao que ele respondeu: "Não quero aprender a arte de 'debulhar arroz e plântano'. Desejo uma educação que conduza ao reto conhecimento e permita ao homem realmente alcançar o verdadeiro objetivo de sua vida". Tinha
então dezessete anos. Sabendo que havia poucas oportunidades de progredir na escola do vilarejo, seus responsáveis, depois de se consultarem mutuamente, enviaram-no a Calcutá. Seu irmão mais velho, dotado de mente religiosa, bem versado em astrologia e Smriti, havia inaugurado uma escola de sânscrito perto da casa do falecido Digambar Mitra em Jhamapukur e tinha alguns alunos. Encarregou-se também do serviço diário das divindades da família Mitra, bem como o de outras famílias ricas daquele bairro. A maior parte do tempo era gasto em lecionar e fazer suas obrigações religiosas diárias. Por isso, tornou-se muito difícil para ele, num curto espaço de tempo, ir duas vezes por dia a diferentes casas e fazer o serviço do templo. Ao mesmo tempo, não foi capaz de desistir disso, pois o ganho na escola, sob a forma de doações, era muito pequeno e a cada dia diminuía. Como os assuntos da família poderiam ser administrados se ele rejeitasse o que estava recebendo pelo serviço das divindades? Depois de reflexão feita sobre estes aspectos do problema, resolveu trazer o irmão mais novo para Calcutá, encarregou-o do serviço das divindades e ele próprio dedicou-se ao ensino. 9. Chegando a Calcutá, Gadadhar conseguiu seu trabalho favorito e o fez com prazer. Além de servir o irmão mais velho, também estudava um pouco. Possuidor de nobres qualidades e de aparência agradável, o rapaz logo tornou-se querido por todas as pessoas. As senhoras das respeitáveis famílias daquele lugar, que usavam véu como as de Kamarpukur não hesitaram em aparecer diante dele, quando se familiarizaram com sua vivacidade, comportamento puro, conversa doce e devoção aos deuses. Ficavam ansiosas para que ele lhes fizesse alguns trabalhos extraordinários e para ouvir canções devocionais. Aqui também, como em Kamarpukur, o rapaz tornou-se o centro de atração de um grupo de pessoas afetivas sem qualquer esforço de sua parte. Sempre que tinha um tempo vago, reunia-se com aquelas pessoas e passava alegremente algum tempo em sua companhia. Portanto, o rapaz aqui também não fez qualquer progresso significativo em seus estudos. Embora Ramkumar observasse tudo, não podia subitamente falar com seu irmão, porque pesava em sua consciência que ele já havia privado o irmão, o mais novo e querido filho, do benefício da afeição maternal trazendo-o para longe, praticamente para sua própria conveniência. Deveria ele, além disso, colocar obstáculos à alegria e à satisfação do jovem quando, atraídas por suas nobres qualidades, as pessoas afetuosamente o convidavam a suas casas? E se ele assim o fizesse, não seria a vida do rapaz em Calcutá tão insuportável como numa floresta? Se não houvesse necessidades na família não seria preciso tirá-lo de sua mãe. Teria sido suficiente que ele fosse enviado para algum vilarejo perto de Kamarpukur para estudar, sob a direção de um erudito. Nesse caso poderia ficar com a mãe e ao mesmo tempo ser educado. Embora Ramkumar não se tenha queixado durante um certo tempo por essas razões, ainda assim, movido por um sentimento de dever, certo dia repreendeu brandamente o rapaz e pediu-lhe que direcionasse sua mente para os estudos porque, parecia-lhe claro, um dia ou outro ele, de coração simples e esquecido de si mesmo, teria que prover sua própria subsistência. Se agora não aprendesse como conduzir-se no caminho que levava ao progresso dos negócios mundanos, será que poderia fazê-lo no futuro? Por conseguinte, foi o amor fraternal e a sabedoria mundana que impulsionaram Ramkumar a agir como agiu. 10. Ainda que encontrasse dificuldades surgidas das maneiras duras e egoístas do mundo e houvesse adquirido alguma experiência, o afetuoso Ramkumar não conhecia muito a respeito da natureza extraordinária da mente do irmão mais novo. Embora fosse sem dúvida um homem de considerável experiência do mundo e bem familiarizado com as inclinações distorcidas das mentes das pessoas mundanas, ele tinha pouca percepção da inclinação incomum da mente de Gadadhar e de sua reação às situações da vida. Mal podia compreender que, apesar de sua pouca idade, o irmão houvesse olhado através do vazio da natureza efêmera e não edificante dos motivos por trás dos trabalhos da vida inteira dos mundanos chegando a aceitar um ideal completamente diferente como meta e propósito da vida humana. Quando, impassível com a repreensão, o jovem puro comunicou seus pensamentos sobre o assunto ao longo das linhas acima mencionadas, Ramkumar não pôde de forma alguma compreendê-lo. Pensou que, como era o predileto de seus pais, o rapaz estivesse ressentido ou aborrecido por ser assim repreendido pela primeira vez na vida e por isso, havia respondido daquela maneira. Naquele dia o jovem amante da verdade tentou da melhor maneira explicar sua relutância em participar do que considerava uma simples educação para ganhar pão. Mas quem iria dar ouvidos às suas palavras? Um rapaz, afinal de contas, é um rapaz! Ó! Estamos num mundo que pensa que se um homem está acima da consideração egoísta em seus esforços deve ser suspeito de ter um cérebro desequilibrado. Naquele dia Ramkumar não compreendeu as palavras do irmão. Além disso, assim como quando castigamos alguém que amamos, nos arrependemos em seguida e tentamos reconquistar
nossa paz de espírito, amando-o cem vezes mais do que antes, assim Ramkumar comportou-se com seu irmão durante algum tempo depois. Mas, ao examinarmos os atos de Gadadhar depois desse incidente, teremos uma prova clara que desde então, ele buscou uma oportunidade para preencher o desejo de seu coração. 11. A corrente de acontecimentos na vida do Mestre e de seu irmão mais velho fugiu um pouco mais rapidamente durante os dois anos seguintes a esse acontecimento. A situação financeira do irmão deteriorava a cada dia e apesar dele tentar, de diversas maneiras, não conseguiu melhorá-la. Ponderou muito se deveria fechar a escola e procurar outro emprego. Mas não podia encontrar qualquer solução. Podia compreender no fundo do seu coração que se passasse os dias daquela maneira, em vez de adotar logo outros meios para a administração dos negócios mundanos, ficaria cheio de dívidas e conseqüentemente sofreria. Mas, o que fazer? Não havia aprendido outra coisa que não fosse ensinar, fazer rituais, oficiando-os. Será que teria a essa altura de sua vida, energia e perseverança para tentar aprender uma profissão adequada a seu tempo? Também mesmo se adquirisse uma arte dessa natureza e tentasse ganhar dinheiro, certamente lhe seria difícil arranjar tempo para as orações e observâncias ritualistas diárias. Então, decidindo "deixar Raghuvir modelar seu destino de acordo com Sua vontade", retirou a mente desses pensamentos e continuou a fazer, com o coração partido, o que há muito tempo vinha fazendo. Porque, pensamos, Ramkumar tinha grande fé em Deus, estava contente com o pouco que tinha e sendo de boa índole, não participava muito da vida mundana. Ocorreu então, pela vontade de Deus, um acontecimento que mostrou a Ramkumar uma saída para aquela incerteza e o aliviou de todas as ansiedades. CAPÍTULO IV O TEMPLO DE KALI EM DAKSHINESWAR ASSUNTOS: 1. Porque Ramkumar iniciou Tol. 2. Rani Rasmani. 3. Sua devoção à Deusa. 4. A divina instrução a respeito do templo. 5. A construção do templo. 6. O problema de fazer oferendas de arroz cozido. 7. A opinião desvantajosa dos pundits sobre o assunto. 8. A opinião favorável de Ramkumar. 9. A decisão da Rani de consagrar o templo. 10. O universalismo de Ramkumar. 11. A busca da Rani por um sacerdote adequado. 12. Mahesh Chandra oferece-se para procurar um sacerdote. 13. Ramkumar é convidado para ser sacerdote. 14. A entronização da Deusa. 15. O comportamento do Mestre no dia da consagração. 16. O Mestre na consagração do templo. 17. Sua firmeza com respeito à comida. 18. Sua devoção ao Ganga. 19. Vivendo da comida feita por ele. 20. A diferença entre iliberalidade e firmeza religiosa.
1. Ramkumar provavelmente tinha quarenta e cinco anos de idade quando começou seu Tol em Calcutá em 1850. No passado, muitas faltas mundanas, má sorte, etc., provocaram-lhe ansiedade durante um certo tempo. Sua esposa havia morrido ao dar à luz ao único filho, Akshay. Dizia-se que o Sadhaka Ramkumar havia previsto a morte da esposa e comunicado a algumas pessoas da família que ela não sobreviveria ao nascimento do primeiro filho. O Mestre agora atingia seu décimo quarto aniversário. Muitas pessoas abastadas da classe média viviam na rica Calcutá. Ramkumar poderia ter ficado livre dessas preocupações do mundo se tivesse tornado eficientes os estudantes de sua escola, porque isso também faria crescer sua reputação de erudito. Poderia fazer adoração religiosa e dar pareceres escritos sobre assuntos religiosos, o que certamente lhe traria algumas rupias a mais. Talvez alguns desses pensamentos tenham trazido Ramkumar a Calcutá depois da morte da esposa, ou talvez, com a morte dela tivesse ele sentido uma grande mudança e vazio em sua vida e a idéia de que se livraria deles até certo ponto se estivesse ocupado em vários trabalhos, num lugar distante o tenha levado a tomar aquele rumo. Já explicamos qual a razão pela qual ele havia trazido o Mestre para Calcutá alguns anos antes de inaugurar a escola em Jhamapukur e a maneira pela qual o Mestre passou os primeiros três anos depois de sua chegada em 1852. Devemos agora dirigir nossa atenção para outro lugar, se tivermos que acompanhar os acontecimentos subseqüentes da vida do Mestre. O leitor deve agora direcionar sua mente para a série de acontecimentos ocorridos pela vontade de Deus numa bem conhecida família, em outro bairro de Calcutá. Nessa época Ramkumar se havia reunido ao grupo de Chatu Babu para aumentar sua renda com presentes de despedida e melhorar a situação da escola. 2. Uma conhecida senhora chamada Rani Rasmani vivia em Janbazar, ao sul de Calcutá. Era mãe de quatro filhas e ficara viúva com quarenta e quatro anos. Havia herdado a enorme propriedade do marido, Rajchandra Das. Desde então ela mesma vinha administrando essa propriedade, melhorando-a muito e tornando-se assim, bem conhecida em Calcutá. Ficou famosa e
benquista de todos não somente por sua habilidade em administrar, como também por inúmeras outras virtudes e boas obras tais como sua fé em Deus, sua energia, 1 (1 Dizia-se que havia um quartel de
soldados ingleses perto da casa da Rani em Janbazar. Bêbados e descontrolados, os soldados um dia dominaram os porteiros, entraram entraram em casa e começaram começaram a saqueá-la. saqueá-la. Mathur Babu, genro da Rani e outros outros homens haviam haviam saído a negócios. negócios. Sem encontrar encontrar resistênci resistênciaa os soldados estavam quase a ponto de entrar nos aposentos internos, internos, quando quando a Rani tomou tomou as armas, armas, pronta para enfrentá-los pessoalmente. ) coragem, inteligência, presença de espírito e sobretudo por sua simpatia simpatia pelos pobres2 (2 Dizia-se que o Governo britânico havia imposto uma taxa aos pescadores do Ganga. Muitos pescadores viviam na propriedade da Rani. Oprimidos por causa da taxa, contaram-lhe sua triste história. A Rani ouviu e disse-lhe para não terem medo. Por uma grande soma de dinheiro ela arrendou aquela parte do rio para pesca. O Governo pensou que a Rani iria entrar no negócio de peixe, mas logo que o referido direito lhe foi concedido, a Rani pôs correntes em muitos lugares, o que tornou quase impossível para os navios e outras embarcações do Governo entrarem no rio. Quando o Governo protestou protestou contra aquele aquele ato da Rani, ela enviou-lhe enviou-lhe um recado, "Comprei o direito de pescar no rio com o pagamento de uma grande quantia, aos senhores. O que fiz estava de acordo com aquele direito. Se os navios e outras embarcações passarem constantemente pelo rio, os peixes fugirão para outro lugar e eu perderei muito. Portanto, como posso retirar as correntes do rio? Mas se os senhores concordarem em abolir o novo imposto sobre o direito de pescar, eu de minha parte, estou pronta a abrir mão voluntariamente do meu direito. Caso contrário haverá litígio e o Governo terá que me ressarcir dos prejuízos." Diz-se que devido a essa exposição razoável da Rani e também, sabendo que ela estava agindo assim para proteger os pobres pescadores, o Governo, em pouco tempo, aboliu aquela taxa. Os pescadores então continuaram seu trabalho abençoando-a muito. A Rani demonstrava grande interesse em todos os assuntos que diziam respeito ao bem de seu povo. Temos a prova disso com a construção dos mercados em Sonai, Beleghata e Bhawanipur, o Ghat e a casa para morimbundos de Kalighat, o Ghat do Ganga em Halishar, a estrada para Puri a pouca distância, do outro lado de Suvarnarekha e muitos outros atos virtuosos. A Rani foi de peregrinação a Gangasagar, Triveni, Navadwip, Agrawip e Puri gastando grande quantidade de dinheiro em nome dos deuses. Além disso, protegeu os arrendatários da propriedade de Makimpur contra a opressão dos plantadores de índigo. Despendeu dez mil rupias mandando unir Madhumati a Navaganga pelo canal de Tona. Esse e outros atos de utilidade p elas incessantes doações e distribuição inegoísta inegoísta de alimento alimento pública atestam seu mérito.) representada pelas
para todos. Por suas nobres qualidades qualidades e atos, atos, embora tenha tenha nascid nascido o numa numa famíli famíliaa Kaivar Kaivarta ta (de pescadores), provou ser merecedora de seu nome, "Rani", e atraiu o amor profundo e reverência de todas as pessoas, independentemente de casta. Na época da qual estamos falando, as filhas da Rani estavam casadas e tinham filhos. Nessa época a terceira filha da Rani havia morrido e deixado apenas um filho. Pensando que esse acontecimento resultaria na gradual separação do amáv amável el e elega elegant ntee Ma Math thurn urnat ath, h, seu terceir terceiro o genro, genro, a Ra Rani ni fez casar casar com ele, sua quarta quarta filha, filha, Jagadamba Dasi e o fez novamente membro da família. Os descendentes das quatro filhas da Rani ainda hoje estão vivos. 3 3 Para informação do leitor damos aqui o quadro genealógico da Rani Rasmani, tirado do pequeno livro Sri Dakshineswar:
3. Dotada de muitas virtudes, a Rani Rasmani tinha grande devoção aos sagrados pés da Deusa Kali. "Sri Rasmani Dasi, anelando pelos pés de Kali" foram as palavras gravadas no selo ofic oficia iall de sua sua prop propri ried edad ade. e. Ouvi Ouvimo moss do próp própri rio o Me Mest stre re que que a devo devoçã ção o da Ra Rani ni à Deus Deusaa manifestava-se em todas suas palavras e atos. 4. Dizia-se que a Rani havia alimentado em seu coração, durante muito tempo, um forte desejo desejo de ir a Kasi Kasi prestar prestar reverên reverência cia e oferece oferecerr adoraç adoração ão especial especial a Visves Visvesvar vara, a, o senhor senhor do univers universo o e a Annapur Annapurna, na, a Mãe Divin Divina. a. DiziaDizia-se se também também que ela havia juntado uma grande soma de dinheiro dinheir o para aquele propósi propósito, to, mas como como seu marido marido havia havia morrido morrido de repente repente e ela teve que tomar sob seus ombros a responsabilidade de administrar a enorme propriedade, não havia sido capaz de concretizar sua intenção até então. Agora que seus genros haviam aprendido a ajudá-la, em particular particular o mais jovem, Mathuramoh Mathuramohan, an, seu braço direito, ela estava se aprontando para ir a Kasi. Quando estava tudo pronto, teve a visão da Deusa num sonho, na noite anterior à viagem 4 (4 Alguns dizem que a Rani Rasmani iniciou a viagem de barco, chegando ao vilarejo de Dakshineswar, norte de Calcutá. Recebeu a o rdem de proibição enquanto passava a noite no barco. ). A Deusa deu-lhe essa instrução: "Não é necessário ir a Kasi.
Instala minha estátua em pedra, num lindo lugar às margens do Bhagirathi, faz Minha adoração e ofereciment oferecimento o de comida, comida, diariamente. diariamente. Eu Me manifes manifestarei tarei na imagem imagem e aceitarei aceitarei tua adoração diária." diária." A devota Rani ficou ficou extremamente maravilhada ao receber essa instrução. Desistiu de ir a Kasi e decidiu utilizar o dinheiro que juntara, naquele empreendiment empreen dimento o sagrado. 5. Não podemos podemos dizer dizer até que ponto ponto essa essa tradiç tradição ão é verda verdadei deira ra,, mas mas é cert certo o que que a devoção da Rani, há muito acumulada, à Mãe do universo estava a ponto de tomar uma forma
visível sob a forma do templo e da imagem. Ela comprou a grande área às margens do Bhagirath por muito dinheiro e começou começou a constru construir ir um grande grande templo, templo, com nove torres, torres, além de outras subsidiá subsidiárias rias a essas. Havia, Havia, também, também, previsão para um lindo jardim ligado a esses templos. Embora o trabalho de construção durasse sete ou oito anos, a obra não ficou pronta nem por volta do ano de 1855. Então a Rani refletiu: "Como a vida é incerta, o desejo de instalar a Mãe do universo talvez não se complete durante meu período de vida se levar tanto tempo para terminar o templo." templo." Pensando assim, assim, a Rani fez a cerimônia de instalação instalação da Mãe no dia "Snanayatra" "Snanayatra" de 31 de maio de 1855. Como é necessário que o leitor conheça os acontecimentos ocorridos anteriormente, vamos narrá-los agora. 6. Seja por causa da ordem divina que recebera da Própria Deusa, ou por um desejo ardente de seu coração - porque os devotos devotos sempre sempre gostam de servir servir seus seus Ideais Escolh Escolhidos idos com o que consideram o melhor - a Rani teve vontade de oferecer diariamente comida cozida à Mãe. A Rani pensou: "Os templos e outros edifícios foram construídos de acordo com meu desejo. Vou dedicar recursos suficientes para continuar com o serviço regularmente. Apesar de fazer tudo isso, se eu não puder servi-La de acordo com o desejo de meu coração e oferecer-Lhe diariamente comida cozida, tudo será em vão. Isto me trará, no máximo, uma pequena reputação; as pessoas dirão: 'Quão grande era a Rani Rasmani'. Mas para que me servem as palavras das pessoas sobre mim?" "Ó Mãe do Universo", Universo", ela orou fervorosamente, fervorosamente, "Tu me deste nome e fama em outros assuntos, mas neste caso não me enganes, dando-me lixo. Não importa importa se tenho tenho fama fama ou não, não, peco-Te, peco-Te, permanece sempre verdadeiramente manifestada aqui e preenche o acariciado desejo desta Tua serva, aceitando o serviço diário." 7. A Rani viu que seu status inferior no sistema de castas e as proibições das escrituras a ele ele liga ligada dass eram os maiores obstáculos obstáculos a seu oferecimento oferecimento de comida cozida. Em seu cora coraçã ção, o, contudo, jamais duvidou que a Mãe do Universo aceitaria sua oferenda de alimento. De fato, seu coração sempre se enchia de alegria com aquele pensamento e jamais duvidava. Então por que foi instit instituída uída aquela aquela proibiç proibição ão imprópr imprópria? ia? Quem escrev escreveu eu as escrit escritura uras? s? Foram Foram os autores autores das escrituras homens sem coração? Ou, movidos pelo interesse próprio, tentaram impor a distinção entre o superio superiorr e o inferior, inferior, mesmo mesmo diante diante da Mãe do universo? Sendo assim, ela não encontrava encontr ava qualquer utilidade nessas escrituras. Preferia seguir os anseios de seu coração. Mas qual seria então a saída? Se agisse contra os costumes em vigor, os devotos Brahmanas e as pessoas boas não viriam ao templo tomar Prasada. Prasada. Qual a solução? A Rani teve os pareceres escritos de Pundits de diversos div ersos lugares, lugares , mas nenhum disse disse o que ela deseja desejava. va. 8. Embora a construção do templo e da estátua estivesse concluídas, não havia o menor sinal de realização do desejo da Rani em servir a Deusa de acordo com o contentamento de seu coração. coração. Nenhum dos pontos pontos de vista vista sobre as injunções das escrituras escrituras expressas pelos eruditos, eruditos, gran grande dess ou pequ pequen enos os,, fora foram m de vali valia. a. Quan Quando do toda todass as suas suas espe espera ranç nças as quas quasee havi haviam am desaparecido, um dia uma regra veio de Ramkumar de Chatushpathi, em Jhamapukur, que dizia: dizia: "Se "Se a Rani Rani fizer doaçã doação o da propriedade propriedade a um Brahmana, Brahmana, depois instalar instalar a Deusa no templo e providenciar a oferenda de comida comida cozida, não haverá haverá violação vio lação do mandato mand ato das escrituras. e scrituras. Os Brahman Brahmanas as e as outras outras cast castas as eleva elevadas das não incorre incorrerão rão em culpa culpa se tomare tomarem m Prasa Prasada da do templo." 9. As esperanças reviveram no coração da Rani. Ela decidiu consagrar o templo em nome de seu Guru e, com sua permissão, assumir o cargo de oficial para supervisionar a propriedade e o serviço do templo. Depois Depo is a Rani, informou aos outros outros pundits pundits sua intenção intenção de seguir seguir a prescrição prescrição das escrituras dadas por Ramkumar. Embora eles não ousassem falar claramente que seria um ato em desacordo com as escrituras, disseram: "O ato ainda é contrário ao costume em vigor na sociedade. Os Brahmanas e outras pessoas não podem tomar Prasada ali, mesmo se for feito dessa maneira". 10. Podemos muito bem deduzir que a atenção da Rani tenha ficado grandemente atraída por Ramkumar por esse acontec acontecime imento. nto. Descobri Descobrimos mos que emitir tal prescriçã prescrição, o, naqueles naqueles tempos, tempos, era indicat indicativa iva de um grande grande univers universal alism ismo o por parte de Ramkumar. Ramkumar. As mentes dos Pundits Pundits Brahmanas, dirigentes da sociedad sociedadee haviam haviam se confinad confinado o em caminhos caminhos estreitos estreitos naqueles naqueles dias. d ias. Poucos Poucos entre entre eles eles cons consegu eguiri iriam am sair sair desses desses cami caminho nhoss e segu seguir ir uma uma orien orienta taçã ção o liber liberal al na interpretação interpretação das escrituras, escrituras, opinando opinando de acordo acordo com as circunst circunstânci âncias. as. Conseqüent Conseqüentement ementee sentiam-se inclinados a desconsiderar aquelas opiniões. 11. A ligação da Rani com Ramkumar, contudo, não acabou aí. Embora ela apresentasse respeit respeito o aos membros membros da famí família lia de seu inst instrut rutor or espiri espiritu tual, al, a intel intelige igente nte Ra Rani ni observ observou, ou, de manei maneira ra perspi perspica caz, z, a ignorâ ignorânci nciaa dele dele a respei respeito to das escri escritur turas as e uma inadequação inadequação em fazer o serviç serviço o divino divino de acordo acordo com elas. elas. Por isso, isso, decidi decidiu u que todo o encarg encargo o do serviç serviço o do novo novo
temp templo lo foss fossee perm perman anen ente teme ment ntee post posto o nas nas mãos mãos dos dos Brah Brahma mana nass de condut condutaa virtuo virtuosa sa,, bem versados nas escrituras, mas que ao mesmo mesmo tempo, tomassem tomassem cuidado cuidado para que as oferendas oferendas merecidas e adequadas à família do seu Guru não fossem afetadas. Aqui também, o costume em vigor da sociedade interpunha-se em seu caminho. Naqueles dias os Brahmanas nascidos em boas famílias famílias e dedicados dedicados à tradição, tradição, nem saudavam saudavam as divindades divindades instal instalada adass pelos pelos Sudras, Sudras, muito muito menos as adoravam. Consideravam os Brahmanas degradados como Sudras, como a família do instrutor espiritual da Rani. Não é de admirar, portanto, que nenhum Brahmana, de conduta reta, capaz de fazer rituais e oficiar como sacerdote, concordasse em encarregar-se da adoração do temp templo lo da Ra Rani ni.. Cont Contud udo, o, a Ra Rani ni não não perd perdeu eu a espe espera ranç nçaa e aume aument ntan ando do salá salári rio o e outr outras as remunerações, continuou a buscar um sacerdote, em vários lugares. 12. A casa de Hemangini Devi, prima do Mestre, ficava no vilarejo de Sihar, não longe de Kamar Ka marpuk pukur. ur. Ai vivia viviam m muitos muitos Brahmana Brahmanas. s. Maheshc Maheshchand handra ra Chattopa Chattopadhya dhyaya, ya, daquele daquele vilarej vilarejo, o, trab trabal alha hava va na propri proprieda edade de da Ra Rani ni.. Pens Pensan ando do que que talvez talvez pudess pudessee ganhar ganhar um pouco pouco mais, mais, ofereceu-se para procurar Brahmanas, que fossem sacerdotes e cozinheiros, para os templos da Rani. Rani. Mahesh Mahesh encarre encarregougou-se se dessa tarefa tarefa escolhe escolhendo ndo o irmão mais velho Kshetranath para o cargo cargo de sacerdo sacerdote te do temp templo lo de Ra Radh dhaa-Go Govi vind nda, a, foss fossee com com a inte intenç nção ão de conv conven ence cerr os Brahmanas pobres do vilarejo a aceitarem o emprego nos templos da Rani não era reprovável, fosse visando a condição financeira de sua família, ou ambos. Como escolhera uma pessoa de sua própria família para trabalhar com a Rani, tornou-se-lhe fácil até certo ponto, encontrar outros Brahmanas para o serviç serviço o nos templos. templos. Mas ficou ficou muito muito apreen apreensi sivo vo quando quando,, apesar apesar de muito muito esforço, não encontrou sacerdote que servisse para o templo de Kali. 13. Mahesh há muito tempo era conhecido de Ramkumar. Parece que já tinham um relac relacion ioname amento nto íntimo íntimo desde desde o tempo tempo em que viviam viviam no vilarejo vilarejo.. Mahesh Mahesh não ignorava que Ramkumar Ramkumar era um Sadhaka Sadhaka devoto devoto e há muito tempo inic iniciara-s iara-see no Mantra Mantr a de Sakti por sua própria pr ópria vontade. Deduzimos Deduzimos também que Mahesh sabia da difícil situação de Ramkumar e de sua família. família. Assim Assim teve a atenção atenção dirigida dirigida a ele a fim de conseguir a indicação de um sacerdote para o templo da Mãe Kali. Mas logo lembroulembrou-se se que Ramkum Ramkumar ar era um Brahma Brahmana na que não oficiava oficiava sacrifíci sacrifícios os feitos por pessoas de casta inferior. Embora às vezes aceitasse o cargo de sacerdote nas casas de Digambar Mitra e outros em Calcutá, aceitaria ele fazê-lo no templo da Rani, que era Kaivarta por nascimento? Era muito duvidoso. Mas o dia da consagraç consagração ão da Deusa estava estava próximo próximo e ainda não havia sido encontrado um sacerdote. Pensando assim, Mahesh achou conveniente fazer pelo menos uma vez mais um esforço naquela direção. Contudo não sabia como fazer. Contou tudo a Rani e pediu-lhe para convidar Ramkumar para o cargo de sacerdote para o dia da consagração, pelo pelo meno menoss para para faze fazerr todo todoss os ritos ritos daquel daquelee dia. dia. A Rani Rani já tinha tinha Ramkum Ramkumar ar em elevad elevado o conceito, pois já tivera dele indicação favorável a respeito das escrituras. Assim ela ficou muito satisfeita com a possibilidade de que ele oficiasse como sacerdote e humildemente enviou-lhe um conv convit ite: e: "Est "Estou ou agor agoraa pron pronta ta para para cons consag agra rarr a Mã Mãee do univer universo so basead baseadaa na força força de sua prescrição," escreveu e também tomei todas as providências para realizar aquela cerimônia na hora auspiciosa no dia do próximo Snanayatra. Temos um sacerdote para Radha-Govinda. Mas não há nenhum nenhum Brahmana Brahmana para para oficia oficiarr como como sacerdo sacerdote te da Mãe Kali e ajudar ajudar-me -me no ato de sua consagração. Por favor tome as providências que achar necessárias para ajudar-me. Como o senhor é um erudito versado nas escrituras, não é necessário dizer-lhe que não é qualquer um que poderá oficiar como sacerdote." O próprio Mahesh levou a Ramkumar a carta com o pedido, explicou-lhe a situação e persuadiu-o a que concordasse em oficiar como sacerdote, até que fosse encontrado alguém disponível. Foi sem qualquer motivo financeiro que o devoto Ramkumar veio pela primeira vez a Dakshineswar. Sua única intenção era que a consagração da Mãe Universal ocorresse sem qualquer problema.5 (5 Ouvimos de Hriday, sobrinho do Mestre, o relato sobre a chegada de Ramkumar a Dakshineswar, mas Ramlal, o filho de outro irmão mais velho do Mestre, dá uma versão diferente. Ele diz que, "Ramdhan Ghosh do vilarejo de Desra Desra,, perto perto de Kamar Kamarpuk pukur, ur, era empreg empregado ado da Rani Rani Rasmani Rasmani.. A Rani Rani o tinha tinha em alto conceito conceito por sua eficiência eficiência.. Gradualmente chegou a ser secretário dela. Como era conhecido de Ramkumar, enviou-lhe uma carta convidando-o a vir e receber os presentes de despedida por ocasião da cerimônia de consagração do templo de Kali." Ramkumar foi à casa da Rani em Janba Janbazar zar e diss dissee a Ramdhan, Ramdhan, "A Rani é uma Kaivarta por nascimento. nascimento. Somos Brahmanas Brahmanas pertencentes à classe Rarhi. Ficaremos Fica remos em e m má situação se aceitarmos seu convite para receber as oferendas." oferendas." Ramdhan Ramdhan mostrou-lhe mostrou-lhe uma lista lista e disse, "Por que? Veja quantos quantos Brahmana Brahmanass desta desta classe foram foram convid convidados ados.. Todos Todos irão irão e aceitarão aceitarão as oferendas oferendas da Rani." Rani." Ramkumar concordou em aceitar os presentes e chegou a Dakshineswar com o Mestre, no dia anterior à consagração. Fluía uma uma corren corrente te de felici felicidad dadee no templo templo naquel naquelee dia dia devido devido à aprese apresenta ntaçã ção o do Yatra, Yatra, canto da glória glória de Kali, Kal i, leitura leitura do Bhagavata e do Ramayana e assim por diante. Essas correntes de felicidade não cessaram nem durante a noite. Cada lugar e canto do templo era claro como o dia devido às inúmeras luzes. O Mestre costumava dizer: "Andando em volta do templo, sentia-se que a Rani havia trazido a montanha de prata, colocando-a ali.” Ramkumar chegou ao templo de Kali para ver o festival no dia anterior à consagração. ) Então devido ao humilde pedido da Rani e de Mathur Babu, ele viveu ali até
o fim da vida, depois de constatar que não havia outro sacerdote disponível. Todos os acon-
tecimentos do mundo, grandes ou pequenos, ocorrem pela vontade da Mãe Divina. Quem pode dizer sim ou não, se Ramkumar, o devoto da Deusa conhecia a vontade da Fonte de todos os desejos ao aceitar aquele encargo? 14. Assim a Rani conseguiu que Ramkumar, de forma inesperada, oficiasse como sacerdote. Ela teve a consagração da Mãe Divina realizada com grande pompa no novo templo na quinta-feira, 31 de maio de 1855, dia de Snanayatra. Dizia-se que naquela ocasião o templo ficou cheio, ininterruptamente, dia e noite, com o barulho e o alvoroço das festas e festividades. A Rani gastou prodigamente e fez o máximo para tornar todos os convidados e outras pessoas tão felizes como ela própria estava. Muitos mestres dos Sastras e Pundits Brahmanas chegaram na ocasião, vindos de diversos centros de cultura - de lugares distantes como Kanyakubja, Kashi, Sylhet, Chittagong, Orissa, Navadvip, etc. Como presentes de despedida cada um recebeu uma roupa de seda, um agasalho e moedas de ouro. A Rani, diziase, gastou novecentos mil rupias na construção e cerimônias de consagração do templo. Comprou de Trailokyanath Thakur, por duzentos e vinte e seis mil rupias o Salbari Parganah na sub-divisão de Thakurgaon no distrito de Dinajpur, fez uma doação e dedicou a propriedade ao serviço das divindades. 15. Alguns dizem que Ramkumar ganhou mantimentos que ele mesmo cozinhou naquele dia, às margens do Ganga e, depois de oferecer comida a seu Ideal, tomou-a como Prasada. Mas isso parece-nos improvável, porque Ramkumar era devoto da Deusa e havia dado a prescrição sobre o oferecimento da comida cozida segundo seus conhecimentos das escrituras, sem esperar qualquer ganho. É ilógico que ele mesmo não tomasse a comida oferecida, indo contra sua própria recomendação e contra as injunções das escrituras devocionais. O Mestre também não nos contou dessa maneira. Portanto nossa impressão é que no final da adoração ele tomou com satisfação a comida oferecida à Mãe do universo. Mas apesar do Mestre ter se juntado ao alegre festival de todo o coração, agiu de acordo com seu estrito princípio a respeito de alimentos. Ao cair da tarde comprou no mercado vizinho, um pouco de arroz tostado, que comeu antes de voltar à escola de Jhamapukur onde descansou pelo resto da noite. 16. O próprio Mestre contou-nos em diversas ocasiões muitas coisas sobre a fundação pela Rasmani do templo de Kali em Dakshineswar. Costumava dizer: "A Rani Rasmani estava pronta para ir a Kasi, morada de Vishnu e Annapurna. Marcou um dia para a partida e tinha, no Ghat, mais ou menos cem barcos, pequenos e grandes, carregados com diversos artigos. Recebeu instrução proibitiva da Deusa na noite imediatamente anterior ao dia da partida e resolveu não prosseguir. Daí em diante empenhou-se em procurar um terreno adequado para construir o templo." Disse também: "Com a convicção de que a margem ocidental do Ganga pode ser comparada a Varanasi, em primeiro lugar ela procurou um pedaço de terra em vilarejos como Bali e Uttarpara, na margem ocidental do Ganga, mas nada encontrou.6 (6 As pessoas idosas desses vilarejos testemunham esse fato, até hoje. ) Embora a Rani estivesse disposta a pagar muito dinheiro, os conhecidos proprietários de terra daqueles lugares disseram que não viriam ao Ganga por um Ghat construído por qualquer pessoa nesses locais de suas propriedades. Portanto a Rani foi obrigada a comprar o terreno à margem oriental do Ganga." O Mestre costumava dizer: "Uma parte do terreno escolhido pela Rani em Dakshineswar pertencia a um inglês e na outra parte havia um túmulo muçulmano associado à memória de um santo. Esse terreno tinha a forma do casco de uma tartaruga. Um túmulo assim, segundo os Tahtras, é bastante recomendável para a consagração de Sakti e Sua Sadhana. Portanto, guiada pela Providência, a Rani escolheu aquele terreno." Também ele levantava a razão pela qual a Rani havia consagrado a Mãe do universo no dia Snanayatra, dia do festival de Vishnu, em vez de qualquer outro dia auspicioso para a consagração de Sakti. "Rani praticou severas austeridades, de acordo com as escrituras, desde o dia em que começaram a esculpir a imagem. Banhava-se três vezes ao dia, comia alimento simples, deitava-se no chão e praticava Japa, adoração etc., segundo suas possibilidades. Depois que o templo foi construído e a imagem esculpida, demorou ser escolhido o dia auspicioso para sua consagração, devido à maneira vagarosa de trabalhar das pessoas. Nesse meio tempo, a imagem foi guardada numa caixa, para não se danificar. Mas subitamente ela suou por uma razão ou outra e a Rani recebeu uma ordem em sonho, "Por quanto tempo você vai me manter confinada dessa maneira? Sinto-Me sufocada; consagra-Me o mais breve possível." Mal recebeu essa ordem, a Rani muito agitada, mandou consultar o almanaque para ver um dia auspicioso. Mas como esse dia não foi encontrado antes de Snanayatra, ela resolveu fazer a consagração naquele dia. Além disso, ouvimos do Mestre muitas outras coisas, incluindo a consagração do templo em nome
do Guru da Rani, para que a comida cozida pudesse ser oferecida à Deusa. De Hriday soubemos somente duas coisas: primeiro, que Ramkumar deu à Rani, prescrições das escrituras a respeito da consagração do templo e em segundo lugar, que ele recorreu à prática do Dharmapatra7 (7 Ainda há o
costume nos vilarejos, das pessoas dependerem da Providência quando não há possibilidade de se chegar a uma conclusão racional sobre determinado assunto e de se recorrer ao Dharmapatra, a folha da imparcialidade, para conhecer a vontade da Providência. Ao escolherem esse modo, agem de acordo, sem argumentação ou raciocínio posterior. A folha da imparcialidade é usada da seguinte maneira: "SIM" e "NÃO" são escritos em alguns pedaços de papel ou em folhas de vílva, colocados num jarro de água vazio. Pede-se a uma criança para apanhar um papel ou uma folha. Se a criança apanha o papel "SIM", a pessoa que recorreu a esse recurso sabe que a Providência aprova o caminho desejado. Se o outro papel é apanhado, ele aceita que a vontade de Deus proíbe o caminho. A divisão de propriedade e outras coisas, algumas vezes é feita com a ajuda desse esquema. Tomemos o exemplo: quatro irmãos que moram juntos, querem viver separadamente e dividir a propriedade, mas não chegam a um acordo quanto à parte de cada um. Pedem então a algumas pessoas importantes do vilarejo para encontrar a solução. Dividem toda a propriedade tanto a parte móvel quanto a imóvel, em quatro partes iguais, na medida do possível. Decidem por meio de uma "folha imparcial" qual a parte que deve caber a cada irmão. Uma prática semelhante também é seguida aqui. Os nomes dos donos da propriedade são escritos em pequenos pedaços de papel. São dobrados para que ninguém possa ler os nomes e depois colocados num jarro de água. Cada parte da propriedade, dividida em quatro partes, é marcada com A, B, C e D etc., em pequenos pedaços de papel marcados de forma semelhante que são colocados, como antes, num jarro. Duas crianças são chamadas e pede-se a uma delas para pegar um pedaço de um dos jarros e a outra criança, para pegar o outro. Os pedaços são lidos e cada irmão deve aceitar o pedaço que corresponde a seu nome. ) para convencer o
dono da propriedade a aceitar o cargo de sacerdote do templo. Sabemos pelo comportamento do Mestre nessa época, que Ramkumar, em princípio, não fez questão de aceitar permanentemente o cargo de sacerdote no templo de Kali em Dakshineswar. Refletindo também, ficou claro que Ramkumar, que possuía um coração puro, não tinha essa idéia naquela época. Ele deve ter pensado somente em dar a prescrição relativa à oferenda da comida cozida à Deusa e em voltar a Jhamapukur, depois de pessoalmente oferecer a comida cozida no dia da consagração. De seu comportamento com seu irmão mais novo, nessa época, depreendemos que ele não estava hesitante sobre o oferecimento da comida cozida e que não via nada de errado e em desacordo com as escrituras. Vamos explicar isso agora. Bem cedo, na manhã seguinte, o Mestre veio a Dakshineswar ou para saber de seu irmão ou para observar, por curiosidade, as cerimônias que ainda continuavam desde a véspera. Ficou ali por muito tempo, quando viu que não havia qualquer possibilidade do seu irmão voltar a Jhamapukur naquele dia. Por isso, embora o irmão lhe tivesse pedido para ficar o resto do dia, não obedeceu e regressou a Jhamapukur para comer. Por uma semana o Mestre não foi a Dakshineswar. Permaneceu em Jhamapukur pensando que o irmão voltaria numa outra ocasião oportuna, depois do término das cerimônias em Dakshineswar. Mas quando Ramkumar não regressou depois de uma semana, ficou preocupado e foi a Dakshineswar para obter notícias. Soube que Ramkumar havia concordado em assumir o cargo permanente para o culto da Mãe Divina, a pedido insistente da Rani. O Mestre não aprovou aquela atitude, criticando bastante a conduta de seu irmão. Recordou-lhe que seu pai não oficiava os sacrifícios Sudras nem aceitava presentes de ninguém e procurou dissuadi-lo do caminho que havia tomado. Diz-se que Ramkumar tentou justificar sua atitude junto ao Mestre de diversas maneiras, pela razão e por meio das escrituras, mas nada tocou-lhe o coração. Por fim, ele recorreu ao expediente simples do Dharmapatra, a folha da imparcialidade. A folha da imparcialidade dizia: "Ramkumar não incorreu em falta ao aceitar o cargo de sacerdote, o que será benéfico para todos." 17. Embora o Mestre tenha ficado livre de ansiedade a respeito da decisão do irmão, outro pensamento veio-lhe à cabeça. Pensou sobre o que deveria fazer, agora que o Chatushpafhi havia sido abolido. O Mestre ficou absorvido naquele pensamento e não voltou a Jhamapukur naquele dia. Mas não pôde concordar em tomar Prasada no templo, apesar da persuasão de Ramkumar. Ramkumar disse: “Trata-se de um templo e a comida é cozida com água do Ganga. Além disso foi oferecida à Mãe do universo. Não é reprovável que você a tome." Mas essas palavras não tocaram o Mestre. Ramkumar disse: "Então pegue provisões da dispensa do templo, cozinhe-as com suas próprias mãos nas areias do Ganga, debaixo do Panchavati e tome as refeições. Você não aceita que o Ganga purifica tudo em suas margens e leito?" O princípio estrito do Mestre a respeito da comida rendeu-se agora à sua devoção ao Ganga. Sua fé e devoção fizeram o que Ramkumar, o bem versado nos Sastras, não pôde fazer com muita argumentação. O Mestre concordou e continuou em Dakshineswar, tomando as refeições diárias preparadas por ele mesmo, à maneira sugerida por Ramkumar. 18. Ah! Que devoção profunda ao Ganga o Mestre teve durante toda sua vida! Costumava chamar a água do Ganga, 'Brahmavari,' isto é, Brahman na forma de água. Dizia: "Toda pessoa, que mora em qualquer margem do Ganga, tem o coração mudado para um outro igual ao dos deuses e dessa maneira são as virtudes manifestadas neles. O vento cheio das partículas sagradas
da água do Ganga purifica a terra em ambos os lados até onde sopra. Pela graça de Bhagirathi, filha da grande montanha, bondade, austeridade, generosidade, devoção a Deus e firmeza espiritual estão sempre manifestadas nas pessoas que vivem naquelas terras." Se alguém falasse de coisas mundanas durante muito tempo ou se misturasse com pessoas mundanas, o Mestre lhe pediria para beber um pouco de água do Ganga. Se um homem avesso a Deus e apegado à mudanidade se sentasse em qualquer lugar da morada sagrada da Mãe Divina e a poluísse com pensamentos mundanos, ele aspergia ali água do Ganga. Sentia-se muito mal quando via alguém limpando-se com aquela água depois de ter respondido ao chamado da natureza. 19. Em poucos dias, o impacto de muitos fatores em seu novo ambiente ocasionou uma transformação na mente do Mestre. A situação do templo nas margens do grandioso Ganga, os lindos jardins cheios de pássaros chilreantes, o serviço divino feito pelos Sadhakas devotos no templo espaçoso, a afeição sincera de seu irmão mais velho, que era verdadeiramente como um pai para ele e também, o toque da fé e da devoção da Rani Rasmani e de seu genro Mathur Babu em tudo. Tudo isso foram experiências que conspiraram para que se sentisse atraído a Dakshineswar, tornando-a uma segunda Kamarpukur a seus olhos. Sem dúvida continuou a cozinhar a comida diária ainda por algum tempo mais, mas vivia ali feliz, e aquela atitude de incerteza relativa a seu dever futuro foi posta de lado. 20. Ao sabermos dos firmes propósitos do Mestre sobre alimentação, talvez pensemos: "Esse conservadorismo estreito é encontrado geralmente em homens como nós. Ao mencionar esse exemplo, o senhor quer dizer que o objetivo final da espiritualidade não pode ser realizado se não for similarmente conservador?" Em resposta dizemos: "A falta de liberalidade e firmeza religiosa não são a mesma coisa. A primeira nasce do egoísmo. Quando prevalece, o homem põe o mais elevado valor naquilo que ele próprio compreende e faz, e assim limitando-se, permanece despreocupado. Mas a última nasce da fé nos ensinamentos das escrituras e das grandes almas; quando prevalece, o homem domina o egoísmo, progride na vida espiritual e gradualmente realiza a verdade suprema. Quando aquele princípio firme predomina, uma pessoa pode no começo, parecer não liberal por algum tempo, mas recebe com sua ajuda uma luz cada vez mais clara no caminho de sua vida e a estreiteza que a limita desaparece por si mesma. Por isso, como podemos negar que a firmeza seja absolutamente necessária no caminho do progresso espiritual? Familiarizados com essa qualidade na vida do Mestre, da maneira mencionada acima, compreendemos claramente que nós também seremos dotados de verdadeira liberalidade no tempo devido e alcançaremos a paz final se formos em frente para realizar as verdades espirituais com devoção total aos ensinamentos das escrituras e não de outra maneira. Temos que 'remover um espinho com o auxílio de outro espinho' como o Mestre costumava dizer. Temos que recorrer à firmeza religiosa para alcançar a liberalidade da verdade - temos que seguir regras e leis para atingir o estado além deles." Observando essa imperfeição na infância do Mestre, talvez alguns digam: "Por que então ele é chamado de Encarnação de Deus? Por que não chamá-lo de homem? Mas se você desejar fazer dele Deus, é melhor esconder essas imperfeições quando estiver escrevendo sua vida." Dizemos: "Irmão, houve um tempo em que também não acreditávamos, nem em sonho, que Deus pudesse tomar um corpo humano e encarnar-Se. Quando, contudo, por Sua graça ilimitada, o Mestre fez-nos compreender que isso era possível, ao mesmo tempo deu-nos a percepção interna para compreender a idéia de que a Encarnação também assumiria imperfeições mentais, assim como ele assumiu a fraqueza do corpo. O Mestre costumava dizer: "O formato de um ornamento não pode ser dado ao ouro se ele não contiver alguma liga." Jamais fez a menor tentativa de esconder de nós aquelas imperfeições, embora nos tenha dito repetidamente: "Aquele que foi Rama e Krishna tornou-Se agora essa caixa (mostrando o corpo), mas sua descida agora é "incógnito", como o rei que vai, disfarçado, ver os arredores da capital. É assim." CAPÍTULO V ASSUMINDO O CARGO DE SACERDOTE ASSUNTOS: 1. A atração de Mathur pelo Mestre. 2. Hriday, sobrinho do Mestre. 3. O Mestre à chegada de Hriday. 4. O amor de Hriday pelo Mestre. 5. Sua incapacidade para entender os atos do Mestre. 6. Mathur, louvando a imagem de Shiva. 7. A opinião do Mestre sobre o serviço. 8. O Mestre hesita encontrar-se com Mathur. 9. O Mestre aceita o cargo de sacerdote. 10. A imagem quebrada de Govinda. 11. O Mestre sobre a adoração de uma imagem quebrada. 12. Seu talento musical. 13. Sua primeira visão durante a adoração. 14. Ramkumar instruindo o Mestre sobre rituais. 15. Kenaram Bhattacharya inicia o Mestre em Mantra Sakti. 16. A morte de Ramkumar.
1. A aparência agradável do Mestre, sua terna natureza, sua devoção e sua juventude chamaram atenção de Mathur Babu, genro da Rani Rasmani, após algumas semanas da consagração do templo. Vê-se muitas vezes que onde há uma íntima e duradoura relação de amor, a atração que conduz a essa relação é sentida à primeira vista. As escrituras dizem que isso decorre das impressões dos relacionamentos em vidas anteriores. Ao refletirmos sobre o relacionamento profundamente amoroso que se desenvolveu mais tarde entre o Mestre e Mathur, somos levados a concluir que uma atração indefinível ocorreu na mente de Mathur pelo Mestre desde os primeiros dias de seu conhecimento. Um mês após a consagração do templo, o Mestre passou a viver em Dakshineswar sem qualquer tarefa específica ou plano para o futuro. Nesse meio tempo Mathur resolveu encarregá-lo de vestir a Deusa e discutiu o assunto com Ramkumar que lhe contou tudo a respeito da atitude mental do irmão e desencorajou Mathur em seu esforço de levar avante seu plano. Mathur, entretanto, não era homem de ser facilmente dissuadido. Embora seu oferecimento tenha sido assim desencorajado, esperou uma oportunidade para realizar seu intento. 2. Uma pessoa intimamente ligada à vida do Mestre chegou então a Dakshineswar. Hridayram Mukhopadhyaya, filho da prima do Mestre, Hemangini Devi, veio a Burdwan em busca de emprego. Tinha ele, então, dezessete anos. Ficou em Burdwan por algum tempo, na casa de um conhecido de seu vilarejo, mas nada conseguiu. Ao saber que seus tios maternos moravam no novo templo da Rani Rasmani, que os tinha em grande respeito, pensou que haveria chances de concretizar seu objetivo se fosse ali. Assim Hriday não tardou em chegar ao templo de Dakshineswar, onde começou a passar o tempo em companhia de seu tio, Sri Ramakrishna. Eram ambos quase da mesma idade e íntimos desde a infância. Hriday era alto, simpático e de constituição masculina. Seu físico era firme e forte, sua mente extremamente ativa e livre de medo. Podia agüentar trabalhos pesados e adaptar-se facilmente às circunstâncias. Desembaraçado, superava dificuldades e situações adversas, inventando meios extraordinários. Além disso, tinha uma atenção muito terna e afetiva pelo tio mais jovem, não poupando esforços para torná-lo feliz, mesmo que tivesse de suportar problemas infindáveis. Sempre ativo, Hriday não tinha um só traço de contemplação. Por isso sua mente, como a das pessoas mundanas, não podia ficar livre das necessidades egoístas. Quanto mais analisamos seu relacionamento com o Mestre desde os primeiros tempos, mais veremos que a pouca contemplação e esforço inegoísta vistos em sua vida eram devidos à companhia constante do Mestre, personificação daquelas virtudes. Hriday tinha o hábito de imitá-lo, às vezes, nesse particular. A ajuda de um homem de ação, corajoso, reverente e fácil de ser conduzido, era muito necessária para o sucesso da vida contemplativa daquele que era indiferente a comer, beber e outras necessidades do corpo e que era completamente despido de egoísmo e sempre absorto em contemplação. Foi essa a razão pela qual a Mãe Divina trouxe alguém como Hriday para a vida do Mestre, naquele estágio inicial de sua Sadhana e estabeleceu um elo de profundo e significativo relacionamento entre eles? Quem sabe? Contudo, é verdade que, sem Hriday, teria sido impossível para o Mestre manter o corpo e a alma juntos naquela época. Portanto, seu nome permanece eternamente ligado à vida de Sri Ramakrishna e merece para sempre a homenagem do fundo do coração. 3. O Mestre tinha vinte anos e alguns meses quando Hriday chegou a Dakshineswar. Podemos facilmente deduzir que sua vida tornou-se fácil até certo ponto quando teve a companhia de Hriday. Daí em diante tudo que ele fazia, tomar banho, andar, deitar-se, sentar-se, etc., era com sua ajuda. Os atos de Sri Ramakrishna, da natureza de um menino, pareciam sem propósito aos olhos das pessoas comuns; mas Hriday, longe de criticá-los, aprovava-os de coração e simpatizava com eles. Isto tornou-o benquisto aos olhos do Mestre. 4. Disse-nos o próprio Hriday: "Muitas vezes senti uma atração indescritível pelo Mestre e ficava sempre com ele, como sua sombra. Um minuto de separação dele, causava-me dor. Eu o banhava, passeava com ele, sentava-me a seu lado e deitava-me com ele. Tínhamos que nos separar por algum tempo na hora da refeição do meio-dia, porque o Mestre tirava da dispensa do templo arroz e outras provisões cruas, que cozinhava com suas próprias mãos. Tomava a refeição no Panchavati enquanto eu tomava Prasada no templo. Antes de nos separarmos eu preparava tudo para que ele cozinhasse. Seu princípio relativo à comida era tão estrito que se sentia mal mesmo com o arroz cozido por ele mesmo. À noite, contudo, ele costumava tomar, como todos nós, os Luchis oferecidos à Mãe do universo. Reparei que em muitas ocasiões, seus olhos ficavam cheios de lágrimas quando comia Luchi e eu o escutava queixando-se tristemente à
Mãe do universo sobre sua situação. O próprio Mestre, também, muitas vezes falava sobre os acontecimentos daqueles dias: "Eu me sentia extremamente aflito em pensar que tinha que tomar alimento de um Kaivarta. Muitos mendigos não vinham ao templo de Kali da Rasmani para comer, por aquela razão. Como não havia número suficiente de pessoas para tomar o alimento cozido oferecido à Divindade, as vacas eram alimentadas com ele e o que sobrava era jogado no rio." Mas ouvimos tanto dele, quanto de Hriday, que ele não teve de comer alimento cozido por ele mesmo, durante muito tempo. Nossa impressão é que assim agiu até assumir o cargo de sacerdote do templo de Kali, dois ou três meses depois da consagração do templo. 5. Hriday sabia que o Mestre o amava ternamente. Havia somente uma coisa a respeito dele que Hriday não podia de modo algum compreender: quando ele ia ajudar seu tio mais velho Ramkumar, ou descansar depois do almoço, ou ver o serviço vespertino do templo, o Mestre enganava-o e desaparecia por algum tempo, não sabia para onde. Não podia encontrá-lo, apesar de muita busca. Perguntado a esse respeito na sua volta, depois de algumas horas, não dava uma resposta clara e dizia: "Eu estava por aí." Nessas ocasiões, durante alguns dias, quando Hriday ia buscá-lo, encontrava-o regressando do Panchavati. Pensava que teria ido ali talvez para responder aos chamados da natureza e não lhe perguntava mais nada. 6. Hriday disse: "Certa vez, naquela época, ele teve em mente fazer uma imagem de Siva para adoração. Já dissemos que às vezes assim fazia em sua infância, em Kamarpukur. Logo que sentia desejo, pegava um pouco da terra do leito do rio e modelava, com suas próprias mãos, a imagem de Siva, com o touro, o tambor etc. e adorava-O na imagem. Um dia Mathur chegou, depois de uma caminhada e ansioso por conhecer qual a divindade que o Mestre estava adorando com tanta concentração, aproximou-se e viu aquela imagem. Embora não fosse grande, era linda. Mathur ficou encantado. Sentiu que a imagem tão expressiva da natureza divina, não seria encontrada no mercado. Perguntou a Hriday, por curiosidade: "Como você conseguiu a imagem? Quem a fez?" Ficou espantado ao saber de Hriday, que o Mestre fazia imagens de divindades e consertava as partes quebradas. Pediu que a imagem lhe fosse dada depois da adoração. Hriday concordou e com a permissão do Mestre, apanhou-a após a adoração, dando-a a Mathur. Quando Mathur a recebeu, olhou-a muito minuciosamente e encantado com ela, enviou-a a Rani para que ela a visse. Ela também ficou muito satisfeita e, como Mathur, expressou sua surpresa ao saber que o Mestre a havia feito1. (1 Alguns dizem que esse acontecimento ocorreu após ter assumido o cargo de sacerdote e que Mathur mostrou a imagem a Rani, dizendo: "A Deusa brevemente será 'despertada', porque temos um sacerdote competente.") Pouco antes desse acontecimento, a idéia de nomear o Mestre para os deveres
do templo havia despontado na mente de Mathur. Aquela idéia tornou-se agora mais forte ao tomar conhecimento daquela rara habilidade do Mestre. O Mestre já havia sabido pelo irmão, da intenção de Mathur, mas não levou-a em consideração porque havia tomado a firme resolução, desde a infância, "de que serviria somente a Deus." 7. Ouvimos o Mestre expressar, em diversas ocasiões, sua opinião sobre aceitar um serviço. O Mestre não olhava com bons olhos qualquer pessoa que servisse outra sem ser pressionado pela necessidade. Uma vez, quando veio a saber que um dos seus jovens devotos 2 (2 Swami Niranjananda) fora trabalhar, ficou muito desgostoso e ouviram-no dizer: "Senti mais dor em saber que ele estava trabalhando do que ouvir que ele estava morto." Quando o Mestre o encontrou mais tarde e soube que ele estava trabalhando para manter a velha mãe, disse, passando a mão afetuosamente sobre a cabeça e o sobre o corpo do rapaz, "Não há mal nisso; você não pode ser censurado por trabalhar por esse motivo; mas se você tivesse agido assim, sem a compulsão do dever, mas simplesmente para ganhar dinheiro para satisfações egoístas, eu não poderia tocá-lo mais. Por isso digo: meu Niranjan não tem a menor 'anjan' (mácula) em si; por que deveria rebaixar-se?" Todos os recém-chegados ficaram surpresos ao ouvir essas palavras do Mestre a NityaNiranjan, pois esse era seu nome completo e foi corajoso suficiente para dizer: "Senhor, o senhor condena o trabalho; mas como poderemos manter nossas famílias sem ele?" O Mestre respondeu: "Deixe quem quiser trabalhar que o faça; não proíbo ninguém de agir assim. Falo somente a eles (mostrando Niranjan e os outros jovens devotos). O caso deles é diferente." O Mestre estava moldando a vida desses jovens devotos de maneira diferente; e ele, não há necessidade de dizer, deu esse conselho porque trabalhar não era compatível com a atitude que um aspirante espiritual sincero deveria desenvolver. 8. Quando o Mestre soube por seu irmão, da intenção de Mathur Babu, procurou ficar, na medida do possível, fora de suas vistas e evitá-lo. Porque assim como ele respeitava as pessoas quando essa relação entrava em conflito com a verdade e os princípios religiosos, assim também ele recusava ferir as outras, mostrando-lhes desrespeito desnecessário. Também era da natureza do Mestre estimar os méritos de uma pessoa de boas qualidades e honrar um homem
respeitável de maneira natural e simples, sem esperar favores. Se Mathur tivesse que lhe pedir para aceitar o cargo de sacerdote no templo antes que ele próprio tivesse chegado a uma conclusão a respeito, teria que recusar e dessa maneira, feri-lo. Vemos claramente que essa apreensão estava na origem da conduta do Mestre ao evitar Mathur Babu. Além disso era um jovem sem importância e Mathur, braço direito da Rani, era uma pessoa muito importante. Sob essas circunstâncias, se tivesse de recusar o oferecimento de Mathur, não seria bem visto e seria considerado um capricho infantil de sua parte. Além disso, o estado emocional do Mestre estava também mudando, como ele mesmo sentia, através de seu poder de introspecção. Com o correr do tempo começou a sentir o encanto do jardim-templo de Dakshineswar e a vida ali lhe parecia bastante cômoda e agradável. Já não estava tão ansioso por regressar a Kamarpukur, sua terra natal. Agora não tinha mais objeção em ficar em Dakshineswar, desde que não fosse sobrecarregado de deveres e de responsabilidades. 9. O que o Mestre percebia aconteceu pouco tempo depois. Quando Mathur veio um dia ao templo para prestar adoração, viu o Mestre a uma certa distância e mandou chamá-lo. O Mestre estava então passeando com Hriday. Vendo Mathur ao longe, afastou-se, quando o empregado de Mathur chegou e lhe disse: "Babu deseja vê-lo." Hriday viu que o Mestre relutava em ir ver Mathur e perguntou-lhe a razão. Ele respondeu: "Assim que eu for lá, ele me pedirá para ficar e prestar serviço." Hriday disse: "Que mal há nisso? Só existe bem em ser escolhido para trabalhar sob um grande homem neste lugar. Por que está relutando?" O Mestre respondeu: "Não tenho desejo de ficar preso ao trabalho para o resto da vida. Além disso, se concordar em fazer o culto aqui devo ficar responsável pelos ornamentos da Deusa; essa é uma tarefa difícil. Não será possível mas se você assumir essa responsabilidade e ficar, não farei objeção em fazer o culto." Foi realmente à procura de emprego que Hriday havia ido lá. Por isso concordou alegremente com o que disse o Mestre, que então foi até Mathur. Como previsto, Mathur pediu-lhe sinceramente para fazer o serviço do templo. O Mestre expressou sua concordância condicional e Mathur aceitou. Nomeou o Mestre para vestir a imagem no templo de Kali e a partir daquele dia pediu a Hriday para ajudar o Mestre e Ramkumar. Ramkumar ficou livre de ansiedade ao ver que o irmão concordara em fazer aquela tarefa, a pedido de Mathur. 10. Todos os acontecimentos mencionados anteriormente ocorreram no período de três meses após a consagração do templo. Era o final de 1855. As cerimônias ligadas ao "Oitavo Dia Lunar", aniversário de Sri Krishna, haviam sido convenientemente feitas sem impedimentos no templo. No dia seguinte era o festival de Nanda. A adoração especial do meio-dia de Radha-Govinda e as oferendas de comida haviam terminado. O sacerdote Kshetranath levou Radharani para outro aposento, colocando-A na cama. A seguir, quando estava pegando a imagem de Govinda, com o mesmo propósito, o sacerdote caiu e uma perna da imagem quebrou-se. Com esse acontecimento houve uma comoção no templo. Foram obtidas diversos pareceres dos pundits. Por fim a perna quebrada da imagem foi colocada e a adoração da imagem continuou de acordo com o conselho do Mestre (vide III, 6). Tendo visto o Mestre entrar às vezes em êxtase, Mathur ficou ansioso em ter seu conselho sobre a substituição da imagem quebrada por uma nova. Hriday disse que o Mestre estivera em êxtase antes de aconselhar Mathur e que, ao final do êxtase disse que a substituição não era necessária. Mathur sabia que o Mestre podia consertar muito bem as partes quebradas das imagens. Por isso o Mestre teve de colocar a perna da imagem, a pedido de Mathur. E o fez tão bem que até hoje não se pode dizer que a imagem alguma vez quebrou, mesmo se for examinada minuciosamente. 11. Depois que a imagem foi quebrada, muitos disseram diversas coisas sobre a adoração sem valor de uma imagem destituída de um membro; mas a Rani Rasmani e Mathur Babu tinham uma fé firme no conselho do Mestre e não deram ouvidos àquelas conversas. De qualquer maneira o sacerdote Kshetranath foi destituído do serviço por descuido e o Mestre nomeado desde então, para a adoração de Radha-Govinda. Hriday ajudava Ramkumar a vestir Mãe Kali durante Sua adoração. Noutra ocasião Hriday mencionou-nos outro fato sobre a imagem quebrada. Há um Ghat pertencente a Ratan Roy, o conhecido proprietário de terras de Naral, perto de Kutighat, em Baranagar, a algumas milhas ao norte de Calcutá. Perto daquele Ghat há um templo onde se encontram as imagens dos dez Mahavidyas. No passado eram feitos adoração, oferecimentos etc., naquele templo, mas na época de que estamos falando, estava em estado decadente. Pouco tempo depois Mathur passou a ter muita devoção e reverência pelo Mestre. Ambos foram certa vez ver o templo e encontrando-o em más condições, o Mestre pediu a Mathur para dar mensalmente grande quantidade de arroz e duas rupias, com o que ele prontamente concordou. Um dia, ao voltar de uma de suas visitas ao templo, o Mestre viu Jayanarayan Bandyopadhyaya,
o conhecido proprietário de terras do lugar, junto com muitas pessoas no Ghat que ele havia consagrado. Como conhecia Jayanarayan, foi a seu encontro. Jayanarayan saudou-o e deu-lhe as boas-vindas respeitosamente, apresentando-o ao seus companheiros. No curso da conversa, surgiu o assunto do templo de Kali da Rani Rasmani e ele perguntou ao Mestre: "Senhor, Govinda desse templo está quebrado?" O Mestre lhe disse: "Ah, que bela compreensão! Pode o Uno, que é Todo indivisível estar quebrado?" Para evitar a possibilidade de vários assuntos serem levantados sobre a pergunta de Jayanarayan, o Mestre mudou de conversa e aconselhou-o a desistir das partes não essenciais de tudo e aceitar somente as essenciais. O inteligente Jayanarayan também entendeu a sugestão do Mestre e evitou fazer outras perguntas vãs. 12. Ouvimos de Hriday que a maneira com que o Mestre fazia adoração deveria ser observada. Quem o visse ficava encantado. Ó! As canções cantadas por ele, com sua voz doce e com o coração transbordante de emoções! Quem ouvisse essas canções jamais poderia esquecêlas. Nelas não havia nada da artificialidade dos chamados mestres da música de alta classe. Seus únicos méritos eram a completa identificação de si mesmo com a emoção das canções, uma expressão acurada das mesmas, numa voz doce que tocava o coração e a precisão de tempo e cadência. Quem ouvisse o Mestre cantar ficaria convencido de que a emoção é a verdadeira vida da música e que, na apresentação da maior parte dos cantores, esse fator vital da música não aparece devido à falta de cuidado na observância de tempo e cadência. Sempre que a Rani vinha a Dakshineswar mandava chamá-lo e ouvia suas canções. Ela gostava particularmente da seguinte canção: "Que idéia é essa, Ó Mãe, que ficas com Teus pés no peito de Hara?... Puseste Tua língua para fora por Tua vontade, como se Tu fosses uma simples menina. Compreendi, Ó Salvadora; é este Teu traço hereditário? Será que Tua mãe fica no peito de Teu pai, assim?" Havia outra razão pela qual as canções do Mestre eram tão doces. Ele ficava tão absorvido na emoção da canção, quando cantava, que se esquecia completamente que estava cantando para alguém. Não vimos alguém como o Mestre, em toda nossa vida, cantar e se tornar tão absorvido na emoção, a ponto de perder-se completamente nela. Até os cantores devocionais esperam pelo menos um pouco de aplauso de seus ouvintes. Somente no Mestre vimos alguém que sentia, quando elogiado pelas suas canções, que o elogio era para a emoção transmitida pela canção e não para si mesmo. 13. Hriday costumava dizer que enquanto cantava, lágrimas abundantes corriam dos olhos do Mestre. Por ocasião da adoração ficava tão absorvido que se tornava totalmente inconsciente de qualquer pessoa que se aproximasse ou que o chamasse. O Mestre dizia que enquanto fazia rituais como Anganyasa, Karanyasa, realmente via as letras dos Mantras colocadas em cores brilhantes em seu corpo. Ele realmente via o Poder Enrolado subindo, em forma de serpente, através do Sushumna até o Sahasrara (vide III.2). Sentia que as partes de seu corpo deixadas para trás, por aquele Poder, imediatamente tornavam-se imóveis e insensíveis e aparentemente mortas. Também quando, segundo o método prescrito de adoração, pronunciava o Mantra "Rang", 3 (3 Verdadeiro nome do fogo ou o som produzido por sua Sakti, ouvido pelos yogins ) aspergia água em volta de si mesmo e imaginava um muro de fogo em volta do lugar de adoração, ele realmente via um muro de obstáculos intransponíveis com centenas de línguas espalhadas, protegendo o lugar do adorador de todos os obstáculos. Hriday dizia que outros Brahmanas, vendo a mente do Mestre tão absorvida e o corpo inteiro luzindo com um brilho resplandescente, diziam, um para o outro: "É como se o Próprio Vishnu assumisse corpo humano e tivesse sentado para adorar." 14. Ramkumar, devoto da Deusa, estava quase totalmente livre de preocupações com respeito à subsistência de seus familiares desde que chegara a Dakshineswar. Mas, de tempos em tempos, preocupava-se com outro problema, porque havia notado em seu jovem irmão um gosto pela solidão e um estranho estado de indiferença pelos negócios mundanos. Encontrava nele completa falta de interesse por tudo. Ramkumar a princípio, pensou que o rapaz talvez estivesse ansioso em voltar para a mãe, em Kamarpukur, em quem pensava sempre. Via o jovem ou sentado quieto sob o Panchavati ou caminhando à margem do Ganga, longe do templo, pela manhã e à tarde. Via-o naqueles dias durante muitas horas no bosque em torno do Panchavati e então voltando de lá. O tempo passava mas o rapaz não mostrava vontade de voltar para casa. Ramkumar, às vezes, indagava-lhe a esse respeito, mas ficava sabendo que ele não nutria aquele desejo. Por isso desistiu da idéia de mandá-lo de volta para casa. Pensou: "Estou avançado em idade e a cada dia mais doente. Quem sabe quando minha vida chegará ao fim?" Nessas circunstâncias sentia que algo tinha que ser feito para assegurar o futuro do jovem irmão. Antes
de morrer, era seu dever imprescindível educar o rapaz, para que ele pudesse firmar-se em suas próprias pernas, ganhar a vida decentemente e administrar os negócios mundanos. Por isso Ramkumar ficou muito satisfeito quando Mathur consultou-o sobre a nomeação do rapaz para o serviço do templo. Ficou livre de ansiedade quando depois de certo tempo, a pedido de Mathur, o rapaz aceitou, de início, o encargo de vestir a imagem e depois oficiar como sacerdote, começando a fazer essas tarefas com habilidade. Passou então a ensiná-lo a ler o Chandi e a fazer a adoração da Mãe. Pensou que assim, o rapaz iria tornar-se perfeito no culto e poderia aliviá-lo, quando ele próprio não pudesse mais fazê-lo. O Mestre logo aprendeu aqueles deveres e sabendo que não é conveniente adorar a Deusa sem antes ser iniciado em Seu Mantra, resolveu tomar essa iniciação. 15. Um competente Sadhaka da Sakti, chamado Kenaram Bhattacharya, vivia em Baithakkhana-bazaar em Calcutá. Costumava freqüentar o templo da Rani Rasmani em Dakshineswar e parece que era amigo de Mathur e de todos os outros membros da família da Rani. Hriday contou-nos que todos o conheciam, mostravam-lhe grande respeito como um devoto Sadhaka. Já era conhecido do irmão do Mestre, Ramkumar. O Mestre decidiu ser iniciado por ele. Disseram-nos que logo após sua iniciação, o Mestre entrou em êxtase. Kenaram ficou encantado ao ver sua devoção incomum e abençoou-o de todo o coração para que ele pudesse realizar seu Ideal Escolhido. 16. Nessa época o próprio Ramkumar que fazia o serviço de Radha-Govinda, autorizou o Mestre a fazer o culto da Mãe Kali, seja por causa da própria incapacidade física, ou porque desejava que o Mestre se acostumasse à condução do culto. Mathur, em pouco tempo, veio a tomar conhecimento desse fato e com a permissão da Rani, pediu a Ramkumar, que doravante fizesse permanentemente o culto no templo de Vishnu. Agora o Mestre foi nomeado para o cargo de sacerdote e Hriday para vestir a imagem no templo de Kali. O porquê desse arranjo na adoração parece ter sido que Mathur achava que Ramkumar se tornara velho e enfermo e estava além de suas forças desempenhar tarefas difíceis no templo de Kali. Ramkumar também ficou contente com essa mudança e permanecendo ao lado do irmão no templo de Kali, ensinou-o a fazer o culto e o serviço da Mãe, de forma adequada. Estava assim livre de preocupações. Pouco tempo depois falou com Mathur e conseguiu que Hriday fosse nomeado para o culto de Radha-Govinda. Agora estava se preparando para voltar para casa, em licença, por algum tempo. Mas Ramkumar jamais voltou. Foi a negócios a um lugar chamado Syamnagar Mulajor ao norte de Calcutá, por uns dias, mas ali morreu subitamente. Ramkumar adorou a Mãe Divina somente durante um ano, depois que o templo da Rani Rasmani foi consagrado; portanto, morreu provavelmente durante a metade de 1856. CAPÍTULO VI A ANGÚSTIA DA ALMA E A PRIMEIRA VISÃO ASSUNTOS: 1. O comportamento do Mestre nessa época. 2. A preocupação de Hriday. 3. O Panchavati nessa época. 4. Hriday pergunta porque ele vai ao Panchavati à noite. 5. Hriday assustando o Mestre. 6. O Mestre necessita livrar-se dos grilhões antes da meditação. 7. Necessidade de pôr os pensamentos em ação. 8. Perfeição da renúncia do Mestre. 9. Refutação a uma objeção a esse respeito. 10. O modo de adorar do Mestre por essa época. 11. O apreço de Mathur ante a adoração feita pelo Mestre. 12. Efeitos do amor a Deus em seu corpo. 13. A visão que se seguiu ao grande anelo.
1. O Mestre era muito jovem quando seu pai morreu. Cresceu sob os cuidados afetuosos da mãe, Chandradevi, e do irmão mais velho, Ramkumar. Ramkumar era mais ou menos trinta e um anos mais velho do que ele. Por isso o Mestre respeitava o irmão quase como a um pai. É certo que o Mestre ficou extremamente pesaroso com a morte súbita do irmão, que lhe era tão caro como um pai. A renúncia ao mundo, por Buda, uma Encarnação de Deus, à vista de doença, velhice e morte é bem conhecida. Quem pode dizer o quanto a morte do irmão contribuiu para acender o fogo da renúncia na mente pura do Mestre, dando-lhe uma firme convicção a respeito da transitoriedade do mundo? O que quer que tenha sido, ele passou a dedicar sua mente mais intensamente à adoração da Mãe do universo, a partir daquela época e ficou ansioso para saber se um homem sedento por Sua visão pode realmente ser abençoado por ela. Sabemos que nessa época ele costumava passar os dias no templo com a Mãe Divina ao final do culto, permanecendo absorto n'Ela. Tornou-se tomado, perdido no amor da Mãe enquanto cantava para Ela hinos compostos por devotos como Ramprasad e Kamalakanta. Agora relutava em desperdiçar um só momento em conversas vãs e quando a porta do templo era fechada ao meio-dia e à noite, ele
abandonava todos, entrava no bosque em volta do Panchavati e passava o tempo na contemplação da Mãe do universo. 2. Esse comportamento do Mestre não agradava Hriday. Mas o que podia fazer? Não ignorava que, desde a infância, o Mestre levava avante tudo o que desejava ardentemente e que ninguém podia impedir que ele o fizesse. Portanto era inútil protestar ou pôr obstáculos. Mas Hriday não pôde evitar em mostrar-lhe sua ansiedade quando viu que aquele estado crescia com uma rapidez alarmante a cada dia. Hriday ficou bastante preocupado ao reparar que, ao invés de dormir à noite, ele deixava o leito e ia a algum lugar. Passando as noites em claro, não poderia agüentar o duro trabalho do serviço do templo. Além disso o Mestre já não comia tanto quanto costumava. Era provável que sob essas circunstâncias sua saúde sofresse se não dormisse à noite. Então Hriday resolveu inquiri-lo a respeito e acertar as coisas de acordo com suas possibilidades. 3. Naqueles dias a terra em volta do Panchavati não era tão plana como hoje. Era cheia de covas, vales, terras baixas, bosques etc. Ali cresceu uma árvore, Amalaki, entre as árvores e plantas silvestres. Esse lugar havia sido um cemitério antes de ser um bosque. Por isso, as pessoas dificilmente iam ali, mesmo durante o dia. Se fossem, jamais entravam no bosque. Por isso ir à noite estava fora de cogitações. Ninguém se aventurava com medo dos fantasmas. Soubemos de Hriday que as árvores cresciam na parte baixa do terreno. Assim, qualquer um que sentasse debaixo da árvore não poderia ser visto na parte alta de fora do bosque. O Mestre costumava sentar-se ali, à noite, para meditar. 4. Uma noite, quando o Mestre saiu, Hriday seguiu-o sem seu conhecimento e o viu entrar no bosque. Não foi além, para que o Mestre não fosse incomodado. Mas a fim de assustá-lo, jogou algumas pedras e cascalhes que cairam à volta dele durante algum tempo. Vendo que isso não trazia o Mestre de volta, a única coisa a fazer era voltar para o quarto. Perguntou ao Mestre no dia seguinte: "O que o senhor fez quando entrou no bosque, a noite passada?" O Mestre respondeu, "Há uma árvore Amalaki lá. Sento-me debaixo dela e pratico meditação. As escrituras dizem que meditar sob uma árvore Amalaki com algum desejo na mente, traz sua realização". 5. Depois desse incidente, todas as vezes que o Mestre sentava para meditar debaixo daquela árvore, ocorriam de vez em quando vários tipos de perturbação, como pedras atiradas. Embora soubesse que se tratava de Hriday, o Mestre jamais lhe falou a respeito. Mas Hriday não se sentia bem vendo que de nenhum modo podia assustá-lo. Certo dia entrou no bosque, com passos silenciosos, pouco tempo depois que o Mestre chegou à árvore e viu, de uma certa distância, que ele tinha tirado a roupa e o cordão sagrado e estava sentado, à vontade, em meditação. Ao ver pensou: "Será que o tio ficou maluco? Somente pessoas malucas agiriam assim. Se ele quer meditar, que o faça; mas por que joga fora a única peça de roupa que está vestindo?" 6. Assim pensando aproximou-se imediatamente dele e disse: "O que é isso? Que história é essa de tirar o cordão sagrado, a roupa e ficar sentado totalmente nu?" Quando gritou assim algumas vezes, o Mestre foi trazido à consciência normal do estado de absorção interior e ouviu Hriday fazendo-lhe essas perguntas. Disse em resposta: "O que você sabe? Assim livre de todos os laços, deve-se praticar meditação. Desde o nascimento o homem trabalha sob os oito grilhões de ódio, medo, vergonha, aversão, egoísmo, vaidade, orgulho de descendência nobre e obsessão pela conduta formal. O cordão sagrado também é um 'grilhão', porque é um sinal do sentimento de auto-importância. 'Sou um Brahmana e superior a todos.' Quando se chama a Mãe deve-se descartar os grilhões e chamá-La com a mente concentrada. É por esta razão que me desfiz deles. Vou colocá-los quando terminar a meditação." Hriday ficou espantado ao ouvir essas palavras que não lhe pareceram familiares e, incapaz de dar uma resposta, deixou o local. Pouco tempo antes ele havia pensado que poderia mostrar ao tio, seu erro e censurá-lo, mas o que ocorreu foi exatamente o contrário. 7. É bom expor aqui um fato relacionado com o acontecimento acima, porque se ele for conhecido poderemos compreender muitos dos acontecimentos que ocorreram ao longo da vida do Mestre. Desse incidente pode-se ver que o Mestre não podia ficar contente com o pensamento de que, pela renúncia dos oito grilhões, estaria renunciando em verdade e em realidade. Ficou satisfeito somente depois de renunciá-los, também, fisicamente. Nós o vemos agir dessa maneira com respeito a todos os outros assuntos em sua vida posterior. Tomemos como exemplos os seguintes fatos: A fim de destruir a vaidade nascida de uma ascendência nobre e conquistar por meio dela a verdadeira humildade, limpou com suas próprias mãos e com muito cuidado, lugares que eram totalmente evitados pelos outros por serem muito sujos.
Ele soubera que a mente de um aspirante espiritual deveria olhar da mesma maneira um torrão de terra, uma pedra preciosa e um pedaço de ouro - em outras palavras, considerar as pedras preciosas e os metais preciosos como sem valor, como um punhado de terra. A não ser que a mente fosse capaz de pensar assim, não lhe seria possível libertar-se do desejo dos prazeres do corpo ou direcionar-se e totalmente para Deus e prati pratica carr Yoga. Yoga. O Mestre, Mestre, por por essa essa razão razão,, apanhou uma moedas e um punhado de terra e os jogou ao Ganga, repetindo incessantemente, "rupia-terra, terra-rupia." 8. A fim de tornar tornar firme firme seu conheci conhecimen mento to de que Siva (Deus) está em todos todos os Jivas (criaturas), comeu e colocou em sua cabeça, como Prasada, um pouco dos restos dos pratos de folha folha dos pobres pobres depois depois deles terem sido alime alimenta ntados dos no templo templo de Kali. Kali. Em seguid seguidaa levou levou as folhas folhas,, na cabeça cabeça,, às margens margens do Ganga Ganga.. Com uma vassour vassouraa varreu varreu e lavou lavou o lugar lugar com as próprias próprias mãos. Sentiu-se Sentiu-se feliz em pensar que parte do serviço serviço de Deus Deus havi haviaa sido sido feito feito com com a ajuda de seu corpo mortal. Muitos acontecimentos semelhantes podem ser mencionados. Nota-se que em todos esses casos, ele não havia ficado (satisfeito com a mera renúncia mental dos obstáculos no caminho da realiza realização ção de Deus, Deus, mas também também os descar descartar taraa nas suas suas forma formass densa densas. s. Em outr outras as pala palavra vras, s, manteve manteve o corpo corpo e os sentidos longe longe dos objetos objetos de tentaçã tentação o e obrigou obrigou esses último últimoss a agir em contrário contrário às suas inclinaç inclinações ões naturais. naturais. Vê-se que ao agir assi assim, m, sua mente mente teve teve toda todass as impressões passadas completamente destruídas. A mente pôde dali em diante captar as novas inclinações contrárias tão firmemente, que jamais poderia ir contra elas. Não admitia que as novas idéias fossem convenientement convenientementee apreendi apreendidas das e as de sentid sentido o contrár contrário io abandonad abandonadas, as, até que, pelo menos um pouco das primeiras tivessem sido levadas à prática com seu corpo e sentidos. 9. Totalmente avessos a abandonar as impressões passadas, pensamos que não havia necess necessida idade de de tais tais atos atos do Mestr Mestre. e. No curs curso o da discus discussã são o sobre sobre tais tais ações ações suas suas,, algun algunss chegaram chegaram a dizer: "Seus atos, como limpar lugares sujos e abomináveis, abomináveis, jogar no Ganga as moedas e punhad punhados os de terra terra,, repetindo, repetindo, 'rupia-terra, 'rupia-terra, terra-rupia' parecem ser extravagância extravagânciass de sua imaginação. O desenvolvimento mental que ele obteve por meio desses meios extraordinários poderi poderiaa ter sido conse consegui guido do mais mais rapidam rapidamente ente através através de outros outros mais mais fáceis. fáceis."" Em resposta resposta dizemos: "Tudo soa tão bem. Mas quantas pessoas até agora conseguiram ficar completamente adver adverso soss a visõ visões, es, gosto gosto e outros outros objeto objetoss mundan mundanos, os, dedican dedicando do suas suas mentes mentes a Deus Deus e adotando os seus chamados meios mais fáceis de mentalmente desistir dos objetos dos sentidos, sem recorrer a práticas externas? Jamais poderá ser assim. Não se pode ser bem sucedido em qualquer grande empreendimento, muito menos na realização de Deus, quando a mente tem uma idéia e move-se numa determinada direção, enquanto o corpo age contrariamente a essa idéia e move-se move-se em direção direção oposta. Mas com esse anseio anseio inerent inerentee para para com os prazer prazeres es da vista, vista, do gosto etc., o homem não realiza a verdade dessa afirmação. Dominado pelas impressões passadas, não procura abandonar abandonar fisicamente fisicamente os objetos dos sentidos sentidos,, mesmo mesmo quando quando compreende compreende que essa renúncia renúncia é boa, mas continua pensando: "Que o corpo faça como quiser, mas deixe a mente me nte voar alto." Ansioso por ter Yoga e Bhoga simultaneamente, engana-se a si próprio; porque, como luz e trevas trevas,, essas essas duas coisas coisas jamais jamais podem coexist coexistir. ir. Ninguém Ninguém até hoje foi capaz de descobrir descobrir um método método fácil fácil de desenvol desenvolviment vimento o espiritu espiritual al que combine combine simulta simultaneam neamente ente o 1 1 serviço de Deus e a mundanidade que é somente sinônimo sinônimo de luxúria e ouro. ( Não se pode servir a Deus e a Mammon. Bíblia Sagrada. Math. V, 124. ) ) Por Por cons consegui eguinte nte,, as as esc escritu rituras ras consta constante ntemen mente te ensi ensinam nam:: "O que quer que tenha que ser abandona abandonado, do, tem que ser com corpo, mente e fala e o que quer que seja aceito tem que ser aceit aceito o de forma forma simila similar. r. Somente Somente assim assim o aspira aspirante nte estará estará apto apto a realizar Deus." É por isso que os sábios dizem: "O homem jamais poderá ter a realização do Ser com a ajuda do conhecimento, sem a ajuda de prática e sem colocar emblemas, 2 ( 2 Tapasovapyalingat — Mundaka Upanishad, 3.2.4. ) ) o que faz surgi surgirr as atitu atitudes des espirit espirituai uais. s."" É também também razoável razoável crer que a mente humana atinge o estado sutil a partir do denso e o causal a partir do sutil. "Não há outro caminho para a realização da meta suprema 3. ( 3 Svetasvatara Upanishad, 6.15. ) ) 10. Já dissemos que o Mestre estava se tornando cada vez mais absorvido na adoração da Mãe Divina, após a morte do irmão mais velho. Impelido por uma fé ardente, ele agora fazia ansiosamente o que considerava próprio para alcançar Sua visão. Entoar canções de Ramprasad e de outros grandes devo devotos-poetas tos-poetas diante da Deusa tornou-se agora um auxiliar constante de sua adoraçã adoração o diária. diária. Sua mente mente era tomada tomada de fervor fervor enqua enquant nto o canta cantava va essas essas canç canções ões,, com o coração cheio de profunda emoção espiritual. Pensava: "Devotos como Ramprasad tiveram a visão da Mãe. Mãe. Entã Então o é cert certo o que que a Mã Mãee do unive univers rso o é realiz realizáve ável; l; por que então então não posso posso ser abençoado abençoado com Sua visã visão? o?"" Cost Costum umav avaa dize dizer, r, com com o cora coraçã ção o ansi ansios oso: o: "Tu "Tu Te revelas revelaste te a Ramprasad, Mãe. Por que então Tu não Te revelas a mim? Não quero riqueza, amigos, parentes,
prazer e outras coisas assim. Mostra-Te a mim." Orava e chorava dessa maneira, enquanto seu peito ficava encharcado pelas lágrimas de seus olhos. Devido a isso o peso de seu coração diminuiu um pouco. Impelido por uma afetuosa esperança, era tranqüilizado como uma criança e tornava-se pronto para agradar a Deusa, cantando novamente para Ela. Continuou assim a passar os dias em adoração, meditação e canto de hinos devocionais. Seu amor e anseio por Ela aumentavam dia a dia. Assi Assim m o mara maravi vilh lhos oso o períod período o desti destina nado do à adora adoraçã ção o e ao serv serviç iço o da Deus Deusaa aume aument ntav ava. a. Sent Sentav avaa-se se para para ador adorar ar e colo coloca cando ndo uma flor na cabeça, cabeça, de acordo acordo com a prescrição prescrição das escritur escrituras as e talvez talvez permanec permanecess essee sem movime movimento nto como como o tronco tronco de uma uma árvor árvore, e, medi medita tando ndo duran durante te duas duas longas longas horas. horas. Depois Depois de oferecer oferecer comida comida cozida cozida e outras outras coisas coisas à Mãe, talvez passasse longo tempo pensando que Ela estava comendo. Também, talvez passasse muito tempo, todas todas as manhãs, manhãs, enfeit enfeitando ando a Deusa Deusa com grinaldas de flores, fl ores, colhidas com as próprias mãos. Ou passava um longo período fazendo o Arati vespertino, com o coração cheio de devoção amorosa. Também Também,, cantan cantando do para a Mã Mãee do univ univers erso o à tarde tarde ou ao final final do Arati Arati fica ficava va às vezes vezes tão absorvido, tomado por emoções espirituais, que podia ser impelido a fazer o Arati, os serviços vespertinos vespertinos de ofereciment oferecimento o de comida etc. depois depois de ser várias várias vezes lembrado lembrado que era tarde demais para esses serviços. A adoração co continuou ntinuou assim por um tempo. tempo. 11. É claro que a atenção das pessoas do templo foi despertada para o Mestre ao verem tanta devoção, ansiedade ansiedade e firm fi rmez ezaa espiri espiritu tual. al. A princ princípi ípio, o, as pessoas pessoas ridic ridicul ulari arizam zam e zombam de alguém que é visto abandonar o caminho seguido seguido por elas e conduzir-se ou fazer algo de maneira nova. Mas com o decorrer do tempo e com sua perseverança no caminho, apesar de toda crítica, a atitude delas muda e a reverência passa ocorrer. O caso do Mestre não foi uma exceção. Logo que começou a nova forma de adoração, tornou-se objeto de escárnio. Mais tarde as pessoas começaram a reverenciá-lo. Diz-se que Mathur viu a adoração do Mestre nessa época e disse, com grande alegria, à Rani Rasmani: "Temos um adorador extraordinário; a Deusa será despertada brevemente." O Mestre jamais se desviou de seu rumo por causa da opinião das pessoa pessoas. s. Como Como um rio rio corr corren endo do para para o mar, mar, sua sua ment mente, e, de agora agora em dian diante te,, progr progredi ediaa incessantemente na direção dos sagrados pés da Mãe Divina do universo. 12. À medida que os dias se passavam, a devoção e a ansiedade do Mestre aumentavam. Cada vez mais o fluxo contínuo de sua mente em direção à meta espiritual teve seu efeito no corpo corpo também, também, ocasio ocasionan nando do o apareci aparecimen mento to de vários vários sintom sintomas as físicos. físicos. Sua necessidade necessidade de comida e de sono diminuíram. Como o sangue de seu corpo estivesse circulando rapidamente para para seu peito peito e cérebro cérebro,, seu peito peito apareci apareciaa consta constante ntemen mente te averm avermelh elhado ado e seus seus olhos olhos ficavam às vezes subitamente cheios de lágrimas. Sentia grande ansiedade pela realização do Divino e sua mente era tomada de uma ansiedade incessante em relação ao que deveria fazer e como poderia ter a visão da Mãe. Por isso havia em seu corpo um estado de inquietude e falta de tranqüilidade o tempo todo, exceto quando estava meditando ou fazendo o culto. Soubemos pelo próprio Mestre que nessa época, ele cantou para a Mãe Divina e em seguida chorou ansiosamente para ter a Sua visão, "Tu não ouves, Ó Mãe, não ouves? nem um pouco das muitas orações que faço para Ti? Tu Te revelaste a Ramprasad. Por que não Te revelas a mim?" 13. Costumava dizer: "Havia então, uma angústia intolerável em meu coração porque não podia ter Sua visão. Assim como um homem torce a toalha com força para retirar toda água, eu sentia como se alguém tivesse se apoderado do meu coração e da minha mente e os estava torcendo da mesma maneira. Muito Muito aflito aflito com a idéia de que jamais pudesse pudesse ter a visão visão da Mãe, entrei em agonia. Pensei que não havia utilidade em viver tal vida. Meus olhos subita subitamen mente te caíram caíram na espada espada que havi haviaa no templ templo. o. Deci Decidi di por por fim fim à minh minhaa vida vida naqu naquele ele momento. Como louco corri e apanhei-a e subitamente tive a maravilhosa visão da Mãe e cai ao chão inconsc inconscient iente. e. Não sabia o que acontecia acontecia no mundo exterior exterior - como como aquele aquele dia e o seguin seguinte te passa passaram ram desap desaperc ercebi ebidos dos.. Ma Mass no fundo fundo do coraç coração ão fluí fluíaa uma uma corr corren ente te de inte intens nsaa felicidade jamais antes experimentada e tive o conhecimento imediato da Luz que é a Mãe." Nout Noutra ra ocas ocasiã ião o o Me Mest stre re desc descre reve veuu-no nos, s, em deta detalh lhe, e, sua sua visã visão o marav maravililhos hosaa acim acimaa menci menciona onada da.. Ele diss disse: e: "Era "Era como como se as casa casas, s, porta portas, s, templ templos os e todas todas as outra outrass coisa coisass desaparecessem totalmente, como se não houvesse nada em lugar algum! E o que vi era um mar ilimitado ilimitado de Luz Consciente! Consciente! Por mais distante distante e em qualquer qualquer direção direção que eu olhass olhasse, e, via a sucessão contínua de Ondas Brilhantes avançando, devastando e desencadeando-se de todos os lados com grande velocidade. velocidade. Logo caír ca íram am sobre sobre mim, fazend fazendoo-me me afunda afundarr nas nas Profu Profunde ndeza zass Abism Abismais ais da Infini Infinitude tude.. Fiquei Fiquei arqueja arquejante nte e lutei, lutei, por assim assim dizer, dizer, perden perdendo do todo todo senti sentido do de consc consciên iênci ciaa extern externa. a."" O Mestre Mestre contou contou-n -nos os que que naqu naquel elaa ocas ocasiã ião o viu viu um mar mar lumi lumino noso so de Consci Consciênci ência. a. Mas o que dizer da forma da Mãe Divina consistindo somente somente de Pura Consciência? Consciência? -
Sua forma forma com mãos que doam graças graças e liberdade liberdade sem medo? Será que o Mestre Mestre então então teve a visão daquela forma também naquele mar de Luz? Parece que sim porque, assim que recobrou a mais leve consciência por ocasião da primeira visão, ele, nos foi dito, repetia incessantemente a palavra "Mãe" com a voz embargada de emoção. Quan Quando do a visã visão o term termin inou ou,, surg surgiu iu no coraç coração ão do Me Mest stre re uma uma arde ardent ntee e ince incess ssan ante te necess necessida idade de e aspir aspiraç ação ão de uma visão visão imedia imediata ta const constant antee da Mãe Divin Divina, a, soment somentee feita feita de Consciência. Ainda que nem sempre fosse manifestado por sintomas externos, como choro, etc., isso sempre existiu em seu coração. Às vezes aumentava tanto que, incapaz de suprimi-lo, ele caía ao chão contorcendo-se e lutando, com dor. Chorava tanto dizendo: "Concede-me Tua graça, Mãe! Revela-Te Revela-Te a mim", que as pessoas pessoas juntavam-s juntavam-see à sua volta. volta. Nem uma sombra de preocupação preocup ação com o que poderia estar pensando de tal inquietude passava por sua mente naquele momento. Costumava Costumava dizer: "Emb "Embor oraa as pesso pessoas as fica ficass ssem em em volt volta, a, pare pareci ciam am como como somb sombra rass ou figuras figuras pintadas em telas e nem mesmo o mais leve sentimento de vergonha ou hesitação cruzava minha mente naquela altura. Mas imediatamente perdia a consciência devido à angústia insuportável e então, então, eu via vi a aquela aquela forma da Mãe com mãos mãos que concede concedem m graças graças e liber libertaç tação ão do medo - a forma que sor s orri ria, a, falava e consolava consolava e ensinava-me, ensinava-me, de maneiras maneiras infindáveis infindáveis." ." CAPÍTULO VII SADHANA E INTOXICAÇÃO DIVINA ASSUNTOS: 1. Depois da primeira visão. 2. Novas sensações físicas e percepções mentais. 3. Mudança em suas idéias e ações. 4. Contraste entre o comportamento atual e o anterior. 5. Pontos de vista de Hriday a esse respeito. 6. Relato dos funcionários do templo e Mathur Babu. 7. Mathur impressionado com a adoração do Mestre. 8. O Mestre atinge Ragatmika Bhakti. 9. As Encarnações e Ragatmika Bhakti. 10. A experiência de Papa-purusha. 11. A punição do Mestre à Rani. 12. O Mestre transcende a adoração exterior. 13. Opinião de Hriday sobre isto e as dúvidas de Mathur. 14. O tratamento do Mestre por Gangaprasad Sen. 15. A chegada de Hriday a Dakshineswar.
1. Por alguns dias o Mestre tornou-se incapaz de empreender qualquer trabalho porque sua mente estava absorvida na felicidade da visão da Mãe. Era-lhe impossível fazer regularmente o culto e outras obrigações do templo. Hriday, de algum modo, as executava com a ajuda de outro Brahmana. Também pensava em fazer um tratamento para o tio, porque achava que ele estava ficando insano. De certa forma relacionara-se com um médico da casa principesca de Bhukailas, sob o qual havia colocado o Mestre para tratamento e sabendo que não havia possibilidade de uma recuperação rápida, enviou uma carta à mãe e ao irmão do Mestre em Kamarpukur. 2. Mas o próprio próprio Mestre Mestre esforçav esforçava-s a-see em fazer fazer o culto culto nos dias dias em que estava estava de certa certa forma, livre de emoções espirituais e de perda da consciência exterior pela ansiedade da visão de Deus. As vezes, o Mestre falava-nos um pouco sobre seus pensamentos e experiências durante o culto culto e meditaçã meditação, o, naqueles naqueles dias. dias. Dizia: Dizia: "Costum "Costumava ava mostrar mostrar à minha minha mente mente a imagem imagem da Bhairava em postura de meditação, na sala de música e dizia-lhe: 'Você tem que estar firme e imóv imóvel el assim assim e medi medita tarr nos Pés de Lotus Lotus da Mã Mãe!' e!' Mal havia sentad sentado o para meditar, meditar, ouvi ouviaa estalos produzidos pelas juntas do corpo e membros, a partir das pernas para cima. Uma após a outra outra fechav fechava-s a-se, e, como se alguém alguém de dentro dentro girasse girasse as chaves. chaves. Enquanto Enquanto meditava, meditava, não podia mover o corpo e mudar de posição nem abandonar a meditação, ir a outro lugar ou fazer qualquer coisa coisa que desejas desejasse. se. Estava Estava,, por assim assim dizer, dizer, forçadam forçadament entee mandad mandado o a me sentar sentar na mesma mesma postura, enquanto as juntas não fizesse os estalos como antes e fossem abertas, dessa vez da cabeça para as pernas. Quando sentava e meditava, tinha no início, a visão de partículas de luz como se fossem bandos de vagalumes; via às vezes, que todos os lugares estavam cobertos de massas de luz semelhantes à neblina. Em outras ocasiões percebia que todas as coisas estavam interpenetra interpenetradas das por ondas brilhantes brilhantes de luz, como como prata prata.. Via Via tudo tudo isso isso,, às vezes vezes,, de olhos olhos fechados, às vezes de olhos abertos. Não compreendia o que via, nem sabia se era bom ou mau ter essa essass visõ visões es.. Entã Então o orava orava à Mã Mãee com com o coraç coração ão afli aflito: to: "Não "Não compr compreen eendo, do, Mã Mãe, e, o que que está está acontecendo comigo; não conheço Mantras e outra maneira de chamar-Te; por favor ensina-me pessoalment pessoalmentee o que me permitirá permitirá realizar-Te, realizar-Te, Mãe! Se Tu não me ensinare ensinares, s, quem mais o fará? fará? Porque não há refúgio para mim a não ser em Ti! Costumava orar com a mente concentrada e chorar com tanta comoção devido à ansiedade de meu coração." 3. O culto, a meditação, etc. do Mestre, sofreram novas mudanças. É difícil explicar quão integra integralme lmente nte devota devotada da e profund profundaa era sua absorç absorção ão n'Ela n'Ela.. Era carac caracter teriza izada da por uma simplicidade simplicidade infantil, doçura, fé e confiança na Mãe - seu único esteio e apoio. Livre da seriedade de
um adulto, não fez qualquer esforço pessoal para observar as prescrições das escrituras e proibições relativas a tempo, lugar e pessoa; nem se preocupou em comportar-se à maneira dos padrões aprovados tanto por mundanos quanto por divinos. Sempre que alguém o via pensava que ele havia fundido sua pequena vontade e seu pequeno ego na vontade d'Ela, que era a fonte de todos os desejos e que ele fazia tudo como se fosse totalmente um instrumento em sua mão, orando do fundo do coração: "Ó Mãe, meu único refúgio! Bondosamente faz-me, Teu menino, dizer e fazer o que devo." Era natural que esta marcada mudança, na conduta e no comportamento, do que as pessoas mundanas consideravam correto, levou a críticas, inicialmente em sussurros e mais tarde em maledicência declarada. Tudo isso, contudo, pouco lhe importou, porque, como menino da Mãe Divina que era, agora vagueava e fazia tudo por Sua orientação. O vão clamor do mundo não chegou a seus ouvidos. Embora no mundo, não pertencia a ele. O mundo exterior transformara-se num mundo de sonhos para ele. Agora, apesar de seus esforços, não podia atribuir-lhe substância. A forma da Mãe Universal, consistindo de Consciência pura e Felicidade, era para ele a única realidade. 4. Anteriormente, em algumas ocasiões na hora do culto e da meditação, o Mestre costumava ver a mão da Mãe Divina ou um pé brilhante e delicado, ou Sua doce, afetuosa e sorridente face, supremamente bela. Agora ele via, até nas horas que não eram de adoração e de meditação, a figura inteira da brilhante Mãe, sorrindo e falando, guiando-o e acompanhando-o, dizendo: "Faça isso, não faça aquilo." Previamente, ao oferecer comida cozida, etc., à Mãe, costumava ver um extraordinário raio de luz saindo, brilhando, de Seus olhos. Tocava todas as coisas oferecidas, apanhava as partes essenciais e recolhia-se novamente em Seus olhos. Agora ele via que mesmo antes que a oferenda fosse feita, a própria Mãe, em pessoa, sentava-se para tomá-las, iluminando o templo como brilho de Sua sagrada presença. Um dia Hriday chegou subitamente na hora da adoração e viu que o Mestre havia pego um Arghya consistindo de rosas e de folhas de vilva que ia oferecer aos Pés de Lotus da Mãe Divina. Ele estava tão absorvido n'Ela, quando subitamente gritou: "Espera, espera. Deixa-me pronunciar o Mantra primeiro; depois Tu o tomarás." Então ofereceu a comida ritualisticamente antes de terminar a adoração. Antes da adoração e da meditação via Sua maravilhosa presença viva na imagem de pedra diante dele. Agora, não via aquela imagem quando entrava no templo; mas, em seu lugar, em pé, estava a Própria Mãe, viva, pura Consciência, com as mãos oferecendo dádivas e liberação do medo. O Mestre disse: "Coloquei a mão perto de Suas narinas e senti que a Mãe estava realmente respirando. Observei bem de perto mas jamais consegui ver a sombra da pessoa divina da Mãe na parede do templo à luz do lampião, à noite. Ouvia em meu quarto o tilintar das tornozeleiras da Mãe, quando ela subia as escadas como uma alegre menina. Saí e vi que, com os cabelos esvoaçantes, Ela estava realmente na varanda do primeiro andar do templo, que agora olhava Calcutá, para em seguida olhar o Ganga. 5. "Uma pessoa sentia-se tomada de medo" disse Hriday, "ao entrar no templo de Kali, quando o Mestre não estava lá, mas imagine quando ele estava. Contudo não podia resistir à tentação de ver como o Mestre se comportava durante adoração. O que eu vi quando subitamente cheguei ali, em muitas ocasiões, encheu meu coração de medo e de devoção. Mas uma dúvida surgiu quando saí. Pensei: 'Será que o tio ficou realmente louco? Por que ele comete esses atos proibidos durante a adoração?' Fiquei apreensivo com o que a Rani e Mathur Babu pensariam e diriam quando viessem a saber, mas esses pensamentos jamais passaram pela cabeça de meu tio, nem deu ouvidos ao que eu lhe disse sobre isso. Também eu não podia me arriscar a lhe falar muito; um medo indescritível e hesitação surgiram e fecharam minha boca, não sabia qual a razão. Senti uma indefinível distância entre mim e ele, por algum motivo desconhecido. Não tendo outra alternativa eu o servia silenciosamente como podia mas sentia-me apreensivo, com receio de que ele algum dia me repreendesse." Hriday deu-nos o seguinte relato sobre as ações do Mestre que enchiam seu coração de espanto, medo e devoção ao entrar subitamente no templo na hora da adoração. Dizia: "Vi o tio preparar um Arghya constituído de rosas e de folhas de vilva e tocar com elas a cabeça, o peito, os membros e mesmo os pés para oferecê-las aos Pés de Lotus da Mãe do Universo... "Vi que seu peito e seus olhos estavam sempre avermelhados como os de um bêbado. Cambaleando, deixava o assento do adorador e subindo ao altar, acariciava a Mãe Divina tocandolhe afetuosamente o queixo e começava a cantar, rir, gracejar e conversar com Ela; ou às vezes, pegava Suas mãos e dançava... "Às vezes via que enquanto oferecia comida cozida etc., à Mãe Divina, levantava-se subitamente, apanhava um pouco de arroz e curry de um prato, tocava a boca da Mãe Divina e dizia:
'Mãe, coma! Coma, Mãe!' depois talvez dizia: Tu me pedes para comer? Depois Tu vais comer? Muito bem, estou comendo agora.' Dizendo isso tomava uma parte para si e colocava o resto em Sua boca outra vez, dizendo: 'Já comi. Agora come Tu.' Um dia vi que durante o oferecimento da comida, o Mestre viu um gato entrar miando no templo. Alimentou-o com a comida que devia ser oferecida à Mãe Divina, dizendo: 'Vai comê-la, Mãe?'... "Eu o vi em algumas ocasiões à noite, pondo a Mãe na cama e ele mesmo ficando na cabeceira, dizendo, Tu me pedes para deitar? Está bem, vou deitar'... "Vi também que quando ele se sentava para adorar, ficava tão absorvido na meditação, que não tinha a menor consciência do mundo exterior por muito tempo... "O tio levantava-se muito cedo e apanhava flores para fazer guirlandas para a Mãe Kali. Naquela ocasião, também, parecia-me que havia alguém lá que ele acariciava e com quem conversava, ria, gracejava, alegrava-se e brincava como uma criança levada. ... "Depois via que o tio não havia conseguido dormir à noite. Sempre que eu despertava, via que, tomado de emoções espirituais, ela falava ou cantava e às vezes, ia ao Panchavati e ficava imerso em meditação." 6. Hriday costumava dizer que embora estivesse apreensivo com o comportamento do Mestre, não podia desabafar suas apreensões com ninguém porque a pessoa poderia falar com os funcionários mais categorizados do templo, prejudicando seu tio, envenenando-o junto aos proprietários. Mas como poderiam as coisas ficar encobertas se não somente a cada dia, como a cada momento, esses acontecimentos estranhos aconteciam? Alguns adoradores que vinham ao templo de Kali na hora da adoração viam tudo com os próprios olhos e queixavam-se ao caixa ou aos outros funcionários. Estes ouviam, vinham ao templo de Kali e constatavam tudo por si mesmos, mas quando viam o rosto de Sri Ramakrishna transtornado e elevado como o de alguém possuído por um poder, seu comportamento sem hesitação, seu destemer e total abstração, recuavam com um medo indefinido de dizer-lhe qualquer coisa ou de proibi-lo de fazer o que fazia. Consultaram-se mutuamente ao voltarem ao escritório do templo e concluiram que o Bhattacharya deveria ter enlouquecido ou que estava tomado por algum espírito. Ninguém poderia comportar-se de uma maneira contrária às escrituras na hora da meditação. De qualquer forma, a oferenda de comida e os outros serviços da Deusa não estavam realmente sendo feitos. O Bhattacharya havia estragado tudo. Eles nada podiam fazer a não ser enviar uma mensagem aos proprietários. Um recado foi enviado a Mathur em Janbazar. Em resposta ele escreveu que iria pessoalmente observar os acontecimentos e tomar as providências necessárias. Pediu-lhes que deixassem o Bhattacharya fazer a adoração e outros serviços a seu modo e que não pusessem qualquer impecilho até que chegasse. Receberam a carta de Mathur e ansiosamente esperaram sua chegada. Falaram entre si: "Está evidente que o Bhattacharya dessa vez será despedido. Logo que Babu chegar vão expulsá-lo. Ofender os deuses! Por quanto tempo eles aguentarão?" e assim por diante. 7. Um dia, inesperadamente, Mathur chegou na hora da adoração e sem ninguém saber entrou no templo de Kali e observou minuciosamente os atos do Mestre durante muito tempo. Tomado de emoções espirituais, o Mestre não notou sua presença. Como todos os dias, sua mente estava absorvida na Presença Divina e ignorava a chegada e a saída de qualquer pessoa. Esse estado foi a primeira coisa que Mathur observou quando entrou no templo. Ele pôde também perceber, quando mais tarde ouviu seus importunos pedidos infantis a Ela, que tudo nascia de sua pura devoção ingênua e amor à Divina Mãe. Quem mais poderia, pensou, realizar a Mãe, se essa devoção sincera não pudesse? Seu coração ficou tomado de uma extraordinária felicidade ao ver as torrentes de lágrimas cairem dos olhos do Bhattacharya enquanto fazia a adoração, como ele estava cheio de alegria genuína e ilimitada e como ficava sentado, imóvel, privado de consciência exterior e ignorando tudo que o cercava. Mathur sentiu que o templo sagrado estava realmente cheio de intensa e palpável manifestação das presença divina. Teve agora a firme convicção de que o Bhattacharya havia realmente sido abençoado pela graça da Mãe Universal. Com os olhos cheios de lágrimas e o coração purificado pela devoção, repetidamente saudou a Mãe Divina e Seu extraordinário adorador, de longe, dizendo: "Depois de muito tempo a consagração da Devi correspondeu a seu objetivo! Pode-se dizer que agora a Devi foi verdadeiramente consagrada e que o verdadeiro culto da Mãe foi feito." Voltou para casa sem nada dizer aos funcionários. Na manhã seguinte o chefe do funcionários recebeu a ordem: "Não se obstrua o Bhattacharya em sua adoração, qualquer que seja o modo como ele a faz."(cf. III,6). 8. Ao ouvir a série de acontecimentos acima mencionados, um leitor bem versado nas escrituras facilmente compreenderá a natureza da grande mudança que havia ocorrido na mente do
Mestre naquela época, que ultrapassou os limites da devoção baseada nas prescrições das escrituras (Vaidhi Bhakti) e progrediu rapidamente no campo do puro amor devocional (Ragatmika Bhakti). Mas essa mudança veio de forma natural, simples, que mesmo o próprio Sri Ramakrishna não pôde compreender claramente, quanto mais os outros. A única coisa que ele entendia era que, impelido por seu amor à Mãe Divina, só podia comportar-se daquela maneira, como se fosse forçado a agir assim. Nós o vemos pensar, às vezes: "O que está acontecendo comigo? Estou no caminho certo?" Por isso, ansiosamente, falou à Mãe Divina: "Não sei nem compreendo, Ó Mãe! O que são essas coisas que estão acontecendo comigo? por favor, faz-me agir como devo! Ensina-me o que Tu queres que eu aprenda e revela-Te a mim! Continua sempre segurando-me pela mão!" Dirigia essa suplicante oração à Mãe Divina, do fundo do coração, fugindo completamente de todos os desejos que iam atrás dos valores mundanos como riqueza, sexo, honra, fama, prazeres e poderes. A Mãe do Universo, de Sua parte, segurou-o pela mão, protegeu-o sob todas as circunstâncias e atendeu à sua oração. Espontaneamente, sempre que necessário, Ela lhe trazia todas as coisas e todas as pessoas necessárias ao crescimento e à perfeição de sua vida como aspirante fazendo-o atingir fácil e naturalmente a meta última do puro conhecimento e pura devoção. No Gita (IX.22) o Senhor prometeu a seus devotos: "Aqueles devotos com mente não dividida que Me adoram e permanecem sempre unidos a Mim, que colocam sua mente totalmente em Mim e que não pensam nem em seu alimento nem nos atos necessários à vida, trago, mesmo que não me "peçam, todas as coisas que necessitam." Quanto mais estudamos a vida do Mestre nessa época, mais ficamos perplexos vendo essa promessa do Gita literalmente cumprida em sua vida. Foi necessário provar com clareza novamente, a verdade da promessa do Senhor nesta época moderna egoísta, que tem a luxúria e a ambição como as únicas forças motivadoras da vida. Embora os Sadhakas tenham até hoje ensinado aos homens de tempos em tempos a "abandonar tudo para ter Tudo", significando que um Sadhaka não sofrerá falta de nada se renunciar tudo pelo Senhor, ainda assim, os homens de mentalidade fraca, enredados nos objetos mundanos não conseguiram acreditar na promessa sem vê-la ser cumprida novamente nos tempos modernos. Por isso, a Mãe do Universo encenou essa peça maravilhosa com o Mestre, possuidor de uma mente não dividida, para mostrar ao homem a verdade da afirmação das escrituras: Ouve isso, Ó homem, de coração puro e avança no caminho da renúncia, de acordo com tua capacidade. 9. O Mestre costumava dizer que quando uma poderosa corrente de estados divinos chega inesperadamente à vida humana, não pode ser cortada ou ocultada por qualquer esforço. Não é tudo; o corpo denso, material, não consegue conter o espírito ativado pelo poderoso surgimento de emoções divinas e muitas vezes fica completamente abalado. Muitos Sadhakas morrem assim. É necessário um corpo preparado para conter a onda exuberante de emoções nascidas do conhecimento perfeito ou devoção perfeita. Até hoje, somente os corpos das grandes almas, conhecidas como Encarnações de Deus, puderam suportar aquela força em sua totalidade e continuar a viver no mundo. É por isso que as escrituras devocionais as descrevem repetidamente como tendo corpos formados de puro Sattva. As Encarnações podem agüentar o impulso total das emoções espirituais somente porque vêm ao mundo com corpos feitos do elemento de puro Sattva, isentos de qualquer contato com Rajas e Tamas. Apesar de terem esses corpos, em particular as Encarnações, trilhando o caminho da devoção, são vistas sofrendo, tomadas pela poderosa pressão dos estados divinos. São incontestáveis os relatos que recebemos, que as juntas dos corpos de Jesus e de Sri Chaitanya afrouxaram e gotas de sangue saíam como suor, de cada poro de seus corpos, devido à poderosa onda de emoções espirituais. Sem dúvida essas modificações físicas foram extremamente dolorosas e contudo, através delas seus corpos adaptaram-se ao surgimento extraordinário de emoções divinas. Com o tempo acostumaram-se a esses impulsos que, por isso, deixaram de se manifestar de forma penosa para seus corpos. 10. Daqui em diante uma série de mudanças extraordinárias ocorreram no corpo do Mestre com o aparecimento daquele amor devocional. Já mencionamos a sensação de queimação em seu corpo, desde o começo de sua Sadhana. Teve de sofrer em diversas ocasiões essa sensação. O próprio Mestre mostrou-nos a causa, várias vezes. "Na época de fazer o Sandhya e a adoração," dizia o Mestre, "eu costumava pensar, segundo a prescrição das escrituras, que o Papa-purusha no interior do corpo havia sido queimado! Quem sabia se realmente havia um Papa-Purusha no interior do corpo que poderia ser queimado e destruído de fato? Uma sensação de queimação apareceu em meu corpo, desde o início da Sadhana. Pensei: 'O que é essa doença?' Ela aumentou gradualmente e tornou-se insuportável. Vários tipos de óleos receitados pelos médicos foram usados; mas nada a aliviou. Um dia, quando estava sentado no Panchavati, vi uma pessoa bem escura, de olhos vermelhos e aparência horrível, cambaleando como se estivesse bêbado, saindo deste (mostrando seu próprio corpo) e andando na minha frente. Vi também uma outra pessoa,
de aparência plácida, de roupa ocre, com um tridente na mão e saindo também do meu corpo. Com força atacou a outra, matando-a. A sensação de queimação no corpo diminuiu depois dessa visão. Sofri com essa sensação de queimação de forma contínua durante seis meses, antes que o Papa-purusha fosse queimado." O Mestre contou-nos que uma sensação parecida ocorreu-lhe de novo, pouco tempo depois que o Papa-purusha foi queimado. O Mestre havia ido além dos limites da Vaidhi Bhakti ou prática das disciplinas devocionais segundo as injunções das escrituras e empenhou-se no serviço da Mãe Divina com Ragatmika ou devoção amorosa, da maneira como foi descrita anteriormente. A sensação de queimação aumentou gradualmente tanto que ele não podia encontrar alívio, mesmo que colocasse uma toalha úmida na cabeça e mantivesse o corpo imerso no Ganga durante três ou quatro horas. Vamos descrever mais adiante (IV.1) os modos fáceis como a Brahmani, ao chegar, curou a queimação mostrando que ela tinha sua origem na ânsia do Mestre pela total visão do Senhor e pelo sofrimento por estar separado d'Ele. O Mestre sofreu novamente aquela sensação de queimação em seu corpo mais tarde, por ocasião da prática do Madhura-Bhava, o "estado doce de desposar Deus." Hriday disse: "O Mestre sofreu uma dor e uma sensação de queimação semelhante àquela que se sente quando uma panela cheia de brasa incandescente é colocada no peito de alguém. Sofreu durante muito tempo aquela sensação que lhe parecia de tempos em tempos. Alguns anos depois do término da Sadhana, conheceu Kanailal Ghosal, advogado de Barasat, um Sadhaka adiantado de Sakti, que aconselhou o Mestre a usar em seu corpo um amuleto contendo o Mantra do Ideal Escolhido. A sensação parou quando o amuleto foi colocado." 11. Mathur voltou para Janbazar e contou a Rani a extraordinária maneira de adoração. A devota Rani ficou encantada. Ela costumava vir ao templo de Dakshineswar e ouvir as canções entoadas pelo Bhattacharya e havia se afeiçoado a ele. Na ocasião em que a imagem de Govinda foi quebrada, ela ficou admirada ao ver sua inteligência inspirada pela devoção (III.5,6). Não precisou de muito tempo para que ela compreendesse que era possível para uma pessoa como o Mestre ter a graça da Mãe Universal. Mas ocorreu logo um fato que poderia ter abalado a fé da Rani e de Mathur. Um dia a Rani foi ao templo para adorar a Mãe Divina e reverenciar a Deusa. Mas enquanto ela estava externamente ligada à adoração, pensava ansiosamente no possível sucesso ou fracasso de uma ação judicial pendente, ao invés de estar absorvida no serviço divino. O Mestre, em êxtase estava sentado perto, cantando para ela, a seu pedido. Conhecendo o estado mental da Rani, castigou-a e corrigiu-a, esbofeteando sua terna pessoa, exclamando: "Ah, esse pensamento até aqui!" A Rani, uma aspirante espiritual pronta para receber a graça da Mãe Universal, compreendeu a fraqueza de sua mente e arrependeu-se. Sua devoção ao Mestre aumentou muito depois desse incidente. Mencionaremos todos esses fatos em detalhe em outro capítulo (Vol. II, parte III, 5). 12. Antes que se passasse muito tempo, a companhia constante da Mãe Divina levou o Mestre a um tal estado feliz de espírito que já não lhe era mais possível fazer os serviços diários e ocasionais do templo. O Mestre costumava dar um exemplo de como, com o progresso espiritual do aspirante, as ações prescritas pelas escrituras caem por si mesmas. Dizia: "A sogra permite à nora comer de tudo e fazer todos os trabalhos até que ela conceba, mas assim que ela fica esperando criança, começa; uma pequena diferença sobre alimento e trabalho. Mais tarde, quando estiver em adiantado estado de gravidez, seu trabalho é muito reduzido. Quando gradualmente se aproxima o parto, não lhe é dado nenhum trabalho porque algum mal poderia sobrevir ao feto, e por fim, quando o bebê nasce, os dias são utilizados em cuidar somente dele." Assim também a renúncia do Mestre à adoração exterior e aos serviços da Mãe Divina aconteceu naturalmente. Ele agora não estava mais consciente do tempo conveniente para a adoração e outros serviços. Sempre imerso em estados espirituais, servia a Mãe Universal quando e como desejava. Por exemplo, às vezes oferecia comida antes de fazer a adoração ou, absorvido em meditação, esquecia-se completamente da idéia de sua existência separada d'Ela e enfeitava-se com flores, pasta de sândalo, etc., trazidos para adoração da Deusa. O próprio Mestre disse-nos, em diversas ocasiões, que seus atos tomavam essa forma por causa da visão constante da Mãe Div ina intern a e externamente. Disse-nos mais: “Sempre que ocorria qualquer diminuição em sua constante experiência da presença da Mãe Divina e absorção n'Ela, enchia-o um sentimento pungente de separação, que o fazia jogar-se violentamente no chão, esfregar seu rosto nele e encher a vizinhança com altos lamentos. Ele lutava pela vida e seu alento quase parava. Não notava que todo o corpo estava sendo cortado, machucado e coberto de sangue. Igualmente não era consciente quando tropeçava no fogo ou caía na água. Em seguida, quando novamente tinha a visão da Mãe, aquela atitude mental desaparecia. Sua face brilhava de alegria e tornava-se uma
pessoa completamente diferente. 13. Mathur permitiu que a adoração do templo fosse conduzida de qualquer maneira pelo Mestre até atingir o estado acima descrito. Mas, vendo que era impossível fazer o culto daquela maneira, resolveu fazer algumas modificações. Hriday disse: "Houve uma razão especial para aquela decisão de Mathur. Um dia o Mestre levantou-se subitamente do assento do adorador, em estado de êxtase e viu Mathur Babu e eu no templo. Pegou-me pela mão, fez-me sentar naquele assento e disse a Mathur: 'Hriday de hoje em diante fará o culto. A Mãe diz que Ela aceitará seu culto da mesma maneira que o meu.' O devoto Mathur aceitou as palavras do Mestre como uma ordem da Mãe. Não podemos constatar a veracidade das palavras de Hriday, mas Mathur sabia muito bem que era impossível ao Mestre fazer o culto e outros serviços, diariamente, na condição mental em que se encontrava. 14. Já dissemos que a mente de Mathur sentiu-se atraída pelo Mestre desde a primeira vez que o viu. Desde então havia tentado contornar todas as dificuldades em mantê-lo em Dakshineswar. Quanto mais se familiarizava com as extraordinárias e nobres qualidades do Mestre, mais ficava encantado com elas e provia de acordo com suas necessidades, olhando com olhos afetuosos, sempre protegendo-o contra as opressões injustas dos outros. Eis um exemplo: Mathur providenciou para que o Mestre tivesse diariamente bebida feita de xarope de açúcar cande, pois sabia que o humor do vento era muito forte em seu corpo. Ele o protegia contra todas as críticas e interferências de pessoas irrefletidas, quando sua adoração tomou aquele rumo incomum, sob a influência de Ragatmika Bhakti. Em outra passagem (III.6) mencionamos alguns exemplos dessa natureza, mas parece-nos que ele tinha em mente dúvidas sobre o estado do Mestre, desde o dia em que esbofeteara a Rani Rasmani, para ensiná-la. Concluiu que o Mestre sofria de insanidade mental. Incapaz de compreender o adiantado estado do Mestre, Mathur, que tinha mente humana, parece, inferiu que havia nele uma combinação de espiritualidade e insanidade; porque naquela época, fez com que o Mestre fosse tratado por Gangaprasad Sen, o conhecido médico aiurvédico de Calcutá. Pensando que o Mestre sofria doença física, Mathur não somente tomou todas as providências para seu tratamento, mas tambem tentou confortá-lo, apresentando-lhes razões e argumentos, para que ele controlasse sua mente e prosseguisse com as práticas espirituais. Já descrevemos em outro lugar (III,6), como Mathur convenceu-se do engano cometido com o Mestre depois do incidente que o levou a ver dois hibiscos, um vermelho e outro branco, brotados no mesmo galho de um pé de hibiscos vermelhos. Sabendo que era impossível ao Mestre fazer o serviço diário da Deusa, no templo, Mathur fez nova mudança. Ramtarak Chattopadhyaya, primo do Mestre, viera ao templo à procura de trabalho. Foi então nomeado para o culto da Deusa até que o Mestre se recuperasse. Isso ocorreu em 1858. 15. O Mestre costumava chamar Ramtarak, Haladhari. Em diversas ocasiões o Mestre nos contou muitas coisas a seu respeito. Haladhari era um bom erudito e Sadhaka, dedicado à prática dos rituais das escrituras. Era versado no Bhagavata, Adhyatma-Ramayana e outros textos sagrados, os quais lia diariamente. Embora dedicasse um amor maior a Vishnu do que à Devi, não era adverso a essa ultima. Apesar de devoto de Vidhnu, não hesitou em aceitar o encargo do culto da Mãe Divina, a pedido de Mathur. Antes que Haladhari aceitasse aquele encargo, Mathur providenciou para que ele tivesse comida crua para cozinhar para si mesmo. Disseram-nos que Mathur, no início, fez objeção e perguntou: "Por que? Ramakrishna, seu primo, e Hriday, seu sobrinho, não tomam Prasada no templo?" O inteligente Haladhari respondeu: "Meu primo está num exaltado estado espiritual. Culpas não lhe advém de forma alguma, estou nesse estado por isso será reprovável se eu quebrar o princípio re lativo à comida." Mathur ficou satisfeito ouvindo essas palavr as. Haladhari obtinha provisões cruas e diariamente cozinhava para si mesmo, no Panchavati. Embora Haladhari não tivesse qualquer aversão à Sakti, não era favorável a que se oferecesse sacrifício animal à Deusa. Como era norma no templo oferecer sacrifício animal à Mãe Divina, por ocasião dos festivais, ele não podia fazer o culto naqueles dias com alegria e zelo. Disseram que ele vinha fazendo adoração por quase um mês quando, certo dia em que ele fazia seu Sandhya viu a Deusa assumir uma forma terrível e ouviu-A dizer-lhe: "Levante-se e vá embora daqui. Você não vai fazer o culto. Seu filho morrerá devido à oferenda de seu culto irreverente." Diz-se que ele recebeu a notícia da morte do filho poucos dias depois desse incidente. Ele contou ao Mestre esses acontecimentos e desde então parou de fazer o culto da Deusa. Por isso Hriday retomou o culto de Kali e Haladhari o de Radha-Govinda. Soubemos desse acontecimento pelo irmão de Hriday, Rajaram.
CAPÍTULO VIII ÚLTIMA PARTE DA HISTÓRIA DOS PRIMEIROS QUATRO ANOS DE SADHANA ASSUNTOS: 1. Cronologia do período de Sadhana. 2. Suas divisões principais. 3. Uma recapitulação das experiências dos quatros primeiros anos de Sadhana. 4. O significado das Sadhanas do Mestre: comparando suas experiências com as escrituras. 5. A analogia de Suka. 6. O Mestre praticou Sadhana para os outros. 7. A realização segue o anseio verdadeiro. 8. A Sadhana do Mestre de Dasya-Bhava personificando Mahavir. 9. A visão de Sita. 10. Plantando o Panchavati. 11. Prática de Hatha-Yoga. 12. A maldição de Haladharí . 13. A mudança de opinião de Haladhari a respeito do Mestre. 14. O orgulho de Haladhari de sua erudição. 15. Haladhari e a concepção de Kali. 16. Haladhari repreendendo o Mestre por quebrar as regras de castas. 17. A crítica de Haladhari e a ordem divina para que o Mestre permanecesse em Bhavamukha. 18. Duração da permanência de Haladhari . 19. A discussão sobre intoxicação divina do Mestre. 20. O erro de considerar essa intoxicação como doença. 21. O comportamento do Mestre desaprova tal conclusão. 22. Primeiro encontro de Vaishnavacharan com o Mestre. 23. O Mestre fazendo outros tipos de Sadhana. 24. Sua mente funcionando como Guru. 25. lição de suas visões. 26. Suas visões jamais provaram ser falsas. 27. Um exemplo. 28. Noções equivocadas da Rani Rasmani e de Mathur.
1. Ao estudarmos o período da Sadhana do Mestre, devemos em primeiro lugar lembrar o que ele próprio nos disse a esse respeito. Então não será difícil determinar as datas. Ao leitor já foi dito que havíamos ouvido dele que ele esteve empenhado nas disciplinas de diversos crenças e doutrinas durante doze anos, de forma ininterrupta. Deduz-se do fato da doação feita pela Rani Rasmani, que o templo de Kali em Dakshineswar tenha sido consagrado na sexta-feira, 31 de maio de 1855. No fim desse mesmo ano o Mestre assumiu o cargo de sacerdote. Fica, portanto, perfeitamente claro que o período de sua Sadhana, estende-se praticamente de 1856 a 1867. Embora esse período fique claramente determinado como sendo o de sua Sadhana, veremos que o Mestre saiu em peregrinação a alguns lugares sagrados ao final desse período e empenhou-se novamente em Sadhana ao regressar a Dakshineswar. 2. Vamos continuar dividindo esse período de doze anos em três partes, cada uma estudada separadamente. Em primeiro lugar os quatro anos, de 1856 a 1859, cujos principais eventos já estudamos. Em seguida um igual número de anos, de 1860 a 1863, passados sob instrução da Brahmani na prática das disciplinas dos principais sessenta e quatro Tantras, observando todas as prescrições das escrituras. Em terceiro lugar um período de igual duração, de 1864 a 1867, na prática das Sadhanas que se seguiram. O Mestre foi iniciado no Mantra de Rama por um monge da seita Ramawat, chamado Jatadhari e obteve a imagem de Ramalala; usando roupa de mulher durante esse período de seis meses, empenhou-se na Sadhana a fim de realizar a atitude espiritual de amante de Deus, de acordo com os livros vaishnavas; recebeu também o Mahavakya védico de Totapuri e atingiu o plano de consciência Nirvikalpa; e por fim foi instruído no islamismo por Govinda (II.16). Durante o período desses doze anos praticou a disciplina de Sakhya-Nhava segundo as escrituras vaishnavas e entrou em contato com as denominações secundárias de Kartabhaja, Navarasika etc. Que ele foi intimamente familiarizado com essas denominações fica bem claro pelo fato que Vaishnavacharan Goswami e outros Sadhakas seguidores dessas crenças vieram ao Mestre buscando ajuda espiritual. Se dividirmos o período de sua Sadhana nas três divisões acima mencionadas e considerarmos o assunto em profundidade, veremos que há uma nítida diferença na natureza das Sadhanas da primeira divisão com as outras duas. 3. Vemos que a única ajuda externa que teve no começo de sua Sadhana foi a iniciação de Sri Kenaram Bhattacharya. Prosseguiu praticando firmemente essa disciplina. O profundo anelo de seu coração para a realização de Deus foi seu principal sustentáculo então. Esse anelo tornou-se gradualmente cada vez mais forte e em pouco tempo, abalou seu corpo e sua mente e fundiu-os num molde inesperadamente novo, ocasionando um grande amor pelo Ideal Escolhido, o que o levou além das rígidas regras e regulamentos da devoção ritualista, à espontaneidade e à liberdade da forma Ragatmika de amor divino, culminando na realização imediata da Mãe Divina e na aquisição dos poderes ióguicos. 4. Talvez o leitor diga: "Onde estava a necessidade de qualquer outra Sadhana se já havia atingido a mais elevada realização espiritual nessa primeira fase? O que lhe faltou atingir? Em resposta, dizemos que embora isso seja verdadeiro, num certo sentido, a Sadhana foi necessária mesmo depois. O Mestre costumava dizer: "As árvores e trepadeiras primeiro dão flor para depois darem frutos, segundo a lei comum da natureza; mas há outras plantas cujos frutos vêm primeiro e depois, as flores." O desenvolvimento mental do Mestre no campo da Sadhana
ocorreu exatamente assim como essa última espécie de árvores e trepadeiras. Por isso a objeção do leitor é verdadeira em termos. Embora o Mestre tivesse visões etc., no começo de sua Sadhana, não ficou perfeitamente certo se eram reais ou se ele havia atingido a meta última. Ele pode fazer isso somente comparando suas experiências espontâneas com as relatadas pelos Sadhakas do passado e também, reproduzindo em si mesmo, seguindo as práticas prescritas nas escrituras, experiências idênticas às que tivera sem sua ajuda. Portanto a Sadhana posterior foi necessária. Precisou realizar uma vez mais, seguindo o caminho e o procedimento descritos nas escrituras, o que havia experimentado anteriormente pela graça incompreensível da Mãe Divina, tendo como única ajuda, o desejo ardente de seu coração. As escrituras sustentam que três condições precisam ser preenchidas se o aspirante quiser ter certeza absoluta. Deve ter experiência pessoal. Tem que comparar suas próprias visões e experiências com as verdades ensinadas pelo Guru. Deve, também, compará-las com as experiências dos Sadhakas do passado, relatadas nas escrituras. Suas dúvidas ficam absolutamente removidas quando a identidade das experiências é estabelecida com a tríplice comparação e sua mente, dali para frente, repousa em perfeita paz. 5. Como exemplo do que foi dito, podemos citar um acontecimento da vida de Sukadeva, o maior dos Paramahamsas, filho de Vyasa. Sukadeva, intocado pela Maya, costumava ter várias visões divinas e experiências extraordinárias desde o nascimento. Com o intuito de determinar se eram reais e se ha vi a alcançado o objetivo final, estudou os Vedas, os seis ramos auxiliares de estudo 1 (1 Siksha, ciência que estuda a pronúncia correta das palavras e leis da eufonia; (2) Kalpa, que expõe o ritual e prescreve regras para atos cerimoniais e sacrificiais; ( 3 ) dramática; (4), Nirukta, explicações etimológicas das palavras védicas difíceis; (5) A ciência da prosódia e (6) Astronomia. Esse conjunto é chamado Vedangas. ) e outros Sastras com
seu pai, Vyasa, conhecedor de todas as escrituras. Quando os estudos terminaram, Vyasa disse ao pai, "Experimentei desde o nascimento, todos os estados espirituais relatados nas escrituras; mas não estou certo se esses estados e experiências são a verdade última. Então, por favor, diga-me agora, o que o senhor experimentou a esse respeito." Vyasa, de supremo conhecimento, refletiu: "Ensinei a Suka o objetivo da espiritualidade e a verdade última, relatando-lhe as experiências de minha própria vida, nascidas das práticas espirituais. Mas as dúvidas ainda não foram removidas de sua mente. Ele pensa que embora tenha desejado conhecer a verdade, eu, tomado pela afeição paterna, não lhe transmiti toda a verdade. Do contrário ele teria abandonado a vida mundana, ao ser iluminado. Isto, ele pensa, é a razão pela qual todas as dúvidas não foram removidas. Por isso é bom que ouça essas coisas de outro sábio." Pensando assim, Vyasa disse: "Não sou capaz de remover sua dúvida; você não desconhece que Janaka, rei de Mithila, é, na verdade, um homem de conhecimento; vá até ele e terá todos os seus problemas resolvidos." Assim orientado pelo pai, Suka, conforme o Mahabharata, foi imediatamente a Mithila. Depois de instruído por Janaka, sábio entre os reis a respeito da experiência que os conhecedores de Brahman têm, Suka encontrou completa identidade entre a instrução do Guru, as palavras das escrituras e as experiências de sua própria vida. 6. Além das razões acima mencionadas, houve ainda outra; mais profunda, que fez o Mestre praticar Sadhana mais tarde. Vamos mencioná-la aqui. O objetivo da Sadhana do Mestre não era simplesmente conseguir paz em sua própria vida. A Mãe Divina o fez tomar um corpo para o bem do mundo e por isso ele tinha que conhecer as Sadhanas de todas as religiões e sua meta final, a fim de que pudesse tornar-se um verdadeiro instrutor espiritual. Por essa razão vemos o esforço extraordinário da parte do Mestre para demonstrar, através da prática real, a verdade ou a falsidade das doutrinas religiosas. Isso não é tudo. Ao colocar diante da humanidade uma pessoa quase iletrada que conseguiu, por meio de suas práticas espirituais, atingir de modo natural as experiências relatadas nas escrituras, a Mãe Divina provou à idade moderna a verdade dos Vedas, dos Puranas, do Corão e de todas as outras escrituras religiosas. Por isso sua Sadhana não parou, mesmo depois de ter pessoalmente alcançado a paz. Quanto mais prosseguimos no estudo dessa vida extraordinária, mais claramente veremos como a Mãe Universal, desejando levar a cabo aquele fim específico, trouxe para o Mestre, no momento propício, homens perfeitos e eruditos em cada escritura. Colocando-o diretamente sob sua instrução, Ela tornou-o familiarizado com os ensinamentos e disciplinas das diversas religiões que ele, com sua rara genialidade, pôde dominar e recordar-se sempre, graças à sua maravilhosa memória retentiva. 7. Já dissemos anteriormente que o Mestre nos primeiros quatro anos de sua Sadhana dependeu para a realização de Deus essencialmente de seu intenso anelo. Ninguém veio naquele período ajudá-lo em seu progresso espiritual, guiando-o ao longo do caminho prescrito pelas escrituras. O único meio, portanto, de que dispunha era o ardente desejo, requisito comum a todas as Sadhanas. Como o Mestre teve a visão da Mãe Divina somente com a ajuda de seu desejo ardente, está provado que qualquer aspirante pode ter a visão de Deus de forma semelhante, sem
qualquer ajuda do exterior. Muitas vezes esquecemos de ponderar quão grande deve ser a intensidade desse anelo para podermos atingir o objetivo dessa maneira; o que está claro ao estudarmos a vida do Mestre nessa época. Já vimos que devido à intensidade de seu anelo, hábitos de vida e os modos de pensar juntamente com as impressões mentais por trás, firmemente estabelecidos, desapareceram totalmente dele. Não prestava atenção nem para a preservação de sua vida e de sua saúde física. O Mestre dizia: "Como não era dada atenção à higiene do corpo, o cabelo ficou comprido e emaranhado pela sujeira e pela poeira. Durante a meditação o corpo costumava ficar imóvel como o tronco de uma árvore. Pensando tratar-se de uma coisa inerte, os pássaros vinham sem medo empoleirar-se em minha cabeça, revolvendo a poeira do cabelo à procura de grãos do arroz! Também, impaciente pela separação do Senhor, eu esfregava o rosto contra o chão com tal veemência que ficava cortado e contundido, sangrando em vários lugares. Não tinha consciência de como passava o dia inteiro em oração, meditação, exercícios devocionais, oferecimento do eu e assim por diante. Com a chegada da noite, quando eram sopradas as conchas e os sinos tocavam, eu me lembrava que o dia havia terminado. Mais um dia se passara em vão; não havia ainda tido a visão da Mãe. Um intenso pesar apoderava-se de mim e tornava meu coração tão inquieto que não podia permanecer calmo. Atirava-me violentamente ao chão, dizendo: 'Mãe, Tu ainda não Te revelaste a mim!' E enchia todos os lugares com lamentos e me contorcia de dor. As pessoas diziam: 'Ele está com cólicas e é por isso que grita tanto'." Quando estávamos com o Mestre, ele nos contava repetidamente esses acontecimentos da época de sua Sadhana, para trazer-nos de volta à necessidade de intenso anelo do coração para a realização de Deus. Acrescentava amargamente: "As pessoas derramam torrentes de lágrimas pela morte de esposas, filhos e semelhantes ou a perda de bens mundanos; mas quem agirá assim por não ter ainda realizado Deus? Contudo, dizem: 'Nós O chamamos tanto e Ele ainda não Se mostrou a nós!' Que essas pessoas pelo menos uma vez chorem por Deus com tanta intensidade e que eu possa ver se Ele Se mantém afastado sem revelar-Se." Tais palavras aguçavam nosso empenho. Quando as ouvíamos ficava claro que ele falava com tanta segurança, somente porque as teve como certas no começo de sua vida. 8. O Mestre não ficou satisfeito em ter somente a visão da Mãe Divina durante os primeiros quatro anos de sua Sadhana. Sua mente foi naturalmente atraída para Raghuvir, a Divindade familiar, depois que teve a visão da Mãe Divina quando estava em Bhavamukha (III, 1&3). Sabendo que com a ajuda da devoção era possível ter, como Mahavir, a visão de Ramachandra, empenhou-se na Sadhana assumindo a atitude de Mahavir, com a finalidade de atingir a perfeição em Dasya-Bhava. O Mestre dizia que pensando em Mahavir incessantemente naquela época, tornou-se tão absorvido que esqueceu-se completamente, durante algum tempo, de sua existência separada e de sua individualidade. "Naquela época," disse o Mestre: "tinha que andar, comer e fazer todos os outros atos como Mahavir. Não agia assim por minha conta, mas as ações aconteciam por si mesmas. Amarrava minha roupa em volta da cintura para que se parecesse com a cauda e me locomovia pulando. Só comia frutos e raízes que também não me inclinava a comer quando descascadas. Passava a maior parte do tempo nas árvores, sempre gritando, 'Raghuvir, Raghuvir!' com a voz profunda. Meus olhos adquiriram uma expressão desassossegada como os animais dessa espécie e estranho dizer, a parte final do osso (cóccix) aumentou naquela época quase uma polegada." Quando ouvimos esse último fato, perguntamos: "Senhor, essa parte de seu corpo continua assim, agora?" Ele disse: "Não, com o correr do tempo ela voltou a seu tamanho natural quando o domínio daquele estado sobre minha mente terminou." 9. Uma visão extraordinária e experiência ocorreram na vida do Mestre quando praticava Dasya-bhakti. A visão e a experiência foram tão novas, tão diferentes das anteriores, que ficaram impressas em sua mente e sempre frescas em sua memória. Ele disse: "Um dia, naquela época, eu estava sentado no Panchavati - não meditando, simplesmente sentado - quando uma figura feminina incomparável, brilhante, apareceu diante de mim, iluminando todo o lugar. Não foi somente aquela figura que então vi, mas também as árvores e plantas do Panchavati, o Ganga e todos os outros objetos. Vi que se tratava de uma mulher porque nela não havia sinais de uma deusa, como os três olhos, etc. Mas a extraordinária, vivaz e solene expressão de seu rosto, manifestando amor, tristeza, compaixão e tolerância, não era geralmente vista nem nas figuras de deusas. Olhando graciosamente para mim, aquela mulher-deusa caminhava do norte para o sul em minha direção com um passo lento e grave. Imaginava quem ela poderia ser, quando um macaco de cara preta chegou subitamente, ninguém sabe de onde e prosternou-se a seus pés e alguém dentro de mim exclamou: 'Sita, Sita que foi só pesar durante toda a vida, Sita, a filha do Rei Janaka, Sita
para quem Rama era a própria vida!' Dizendo: 'Mãe' repetidamente, estava a ponto de me jogar a seus pés, quando ela aproximou-se rapidamente e entrou aqui (mostrando o próprio corpo). Tomado de alegria e admiração, perdi completamente a consciência e caí no chão. Antes desse acontecimento eu não havia tido visão igual sem estar meditando ou pensando. Foi a primeira visão desse tipo. Como Sita, venho sofrendo toda minha vida, talvez porque minha primeira visão a olho nu foi dela - de Sita, cuja vida, desde o início foi uma coleção de sofrimentos 2. (2 Sri Sita disse o autor para alguns, incluindo o tradutor, deu o dom de Seu sorriso ao Mestre. Assim, aqueles que viam o Mestre sorrir, souberam como ela sorria. )
10. Sentindo a necessidade de um lugar adequado à prática de austeridades, o Mestre expressou a Hriday o desejo de plantar um novo Panchavati, um esconderijo de cinco árvores sagradas. Explicando o motivo, Hriday disse: "O pequeno lago, chamado Duck Pond, perto do Panchavati, foi escavado de novo e o pedaço de terra perto do velho Panchavati aterrado com a lama desse lago e nivelado. Também a árvore Amalaki, sob a qual o Mestre costumava meditar anteriormente, foi destruída." O Mestre então, com suas próprias mãos plantou uma figueira sagrada a oeste do lugar onde se encontra a cabana da Sadhana e pediu a Hriday para plantar mudas de baniano, de Asoka, de Vilva e de Amalaki 3.( 3 A figueira sagrada, as árvores Vilva, Amalaki. Baniano e Asoka, em conjunto chamadas Panchavati, devem ser plantadas em, cinco direções, com o objetivo de se praticar austeridades. A figueira sagrada deve ser plantada a leste , a Vilva ao norte , o Baniano a leste, a Amalaki ao sul e Asoka a sudeste e um lindo altar de cinco cúbitos quadrados e agradável à mente, deve ser construído no meio - Skanda Purana.) plantando mudas das
trepadeiras sagradas, Basil e Aparajita, o lugar ficou todo cercado, com a ajuda de Bhartabhari, um jardineiro do templo, no maravilhoso caminho que será descrito mais adiante (III.2). As sagradas plantas Basil e trepadeira Aparajita cresceram muito de forma alta e densa em pouco tempo porque o Mestre as regava regularmente e cuidava para que ninguém do lado de fora pudesse vêlo naquele cercado quando sentado, em meditação. 11. Depois que a Rani Rasmani consagrou o templo de Kali, peregrinos como os monges que desejavam visitar Puri e Gangasagar, passaram a aceitar a hospitalidade da devota Rani para descansar alguns dias no templo de Dakshineswar, na ida e na volta desses dois lugares de peregrinação (IV.2). O Mestre dizia que desde essa ocasião, muitas almas perfeitas e grandes Sadhakas costumavam a vir ali e sob a instrução de um deles, o Mestre praticou Pranayama e outros exercícios de Hathayoga. Um dia enquanto descrevia o incidente abaixo a esse respeito a Haladhari, ele nos mostrou isso, mas mais tarde nos proibiu de praticar os exercícios de Hathayoga porque os havia praticado e conhecia os resultados. Quando alguns de nós se aproximavam dele para receber instrução a esse respeito, dizia-nos: "Essas práticas não são para esta época. Os seres vivos têm um período curto de vida e dependem da comida, no Kaliyuga; onde há tempo, nessa época, para praticar Rajayoga, em outras palavras, para chamar Deus, depois de tornar o corpo firme com a prática de Hathayoga? Assim também, se alguém quiser praticar aqueles exercícios tem que viver constantemente com um instrutor perfeito nessa Yoga e seguir por muito tempo regras muito duras com respeito à comida, descanso, exercícios etc., de acordo com suas instruções. O menor desvio no cumprimento dessas regras produz doenças no corpo do Sadhaka e muitas vezes pode até provocar sua morte. Por isso não é necessário fazer tais exercícios. Além disso, não é com a finalidade de controlar a mente que alguém tem que reter o ar vital ao praticar Pranayama, etc.? Vocês verão que tanto a mente como as forças vitais serão gradualmente controladas pela meditação e devoção a Deus. Os seres humanos têm vida curta e possuem pouca capacidade no Kali Yuga; é por essa razão que o Senhor, por Sua graça, tornou muito fácil seu caminho para a realização. Nesta época, se os sentimentos de angústia e vazio como aqueles sentidos pela morte da esposa ou do filho forem sentidos por Deus e se persistirem, mesmo que seja durante vinte e quatro horas na mente dessa pessoa, Ele com certeza Se revela. 12. Já dissemos ao leitor em outro lugar, que os Sadhakas devotos, seguidores dos Smritis, muitas vezes recorrem aos Tantras também na prática. Tais pessoas, pertencentes à denominação Vaishnava, seguem o caminho da Sadhana do amor Parakiya (II.13 & IV.1). Também dissemos aos leitores que Haladhari era um Vaishnava muito culto e fiel observador dos ritos e práticas das escrituras; mas secretamente seguia o caminho Parakiya da Sadhana, algum tempo depois de ser nomeado para o culto de Radha e Govinda. Com o decorrer do tempo as pessoas vieram a saber e começaram a murmurar, mas havia uma crença corrente de que tudo que Haladhari dissesse a respeito de alguém, aconteceria; assim ninguém ousava discutir ou pilheriar sobre seus hábitos em sua presença, para que não incorresse em seu desagrado. O Mestre também veio a tomar conhecimento das práticas indesejáveis de seu primo mais velho. Vendo que as pessoas murmuravam e caluniavam por trás, o Mestre, destemido como era, contou tudo a Haladhari, que ficou muito aborrecido e disse: "Como você, que é mais novo do que eu ousa desprezar-me? Sangue jorrará de sua boca." O Mestre tentou acalmá-lo de diversas maneiras
explicando-lhe porque havia falado daquela maneira, mas ele não deu ouvidos ao que o Mestre lhe dizia. Certo dia pouco tempo depois desse acontecimento, mais ou menos, às 8 ou 9 horas da noite, o Mestre sentiu uma sensação desagradável em seu palato e o sangue realmente começou a jorrar de sua boca. O Mestre dizia: "A cor daquele sangue era como o do suco de feijão. Era tão espesso que parte saiu da boca enquanto outra coagulou dentro ficando dependurada, como raízes aéreas do baniano, dos lábios, perto dos dentes. Tentei estancar o sangramento com um pano contra o palato mas ele não parava. Fiquei muito assustado. Todos acudiram correndo quando souberam. Haladhari estava fazendo o serviço do templo. Também ficou apreensivo e veio rapidamente, assim que soube. Quando o vi, disse com lágrimas nos olhos: 'Primo, veja a que condição você me reduziu com sua praga!' Ele também chorou ao ver meu lamentável estado. "Um Sadhu havia chegado naquele dia no templo. Também veio ao ouvir o tumulto e, examinando a cor do sangue e o lugar dentro da boca de onde saía, disse: 'Não há razão para temor; é muito bom que o sangue tenha saído. Vejo que você esteve praticando Yoga. No final da prática da Hathayoga atinge-se Jada Samadhi (terminando com a morte do corpo). Você também alcançou esse estágio. O Sushumna abriu-se e um grande fluxo de sangue correu para a cabeça. Foi muito bom que ao invés de fluir daquela maneira, tenha automaticamente criado um canal conduzindo à boca e saído. Tivesse esse sangue alcançado a cabeça, você teria entrado em Jada Samadhi, do qual jamais sairia. A Mãe do universo tem algum propósito especial para cumprir com seu corpo. Penso que foi por isso que Ela o salvou.' Ouvindo essas palavras do santo fui, por assim dizer, trazido à vida." A praga de Haladhari transformou-se assim em graça por uma coincidência acidental. 13. Houve um elemento de suave mistério no comportamento do Mestre com Haladhari. Dissemos anteriormente que Haladhari era filho do tio mais velho do Mestre. Veio a Dakshineswar provavelmente em 1858 e foi nomeado sacerdote para o culto de Sri Radha-Govinda. Conservouse nesse cargo até 1865. Viveu, portanto, em Dakshineswar durante os segundos quatro anos da Sadhana do Mestre e por mais dois anos, tendo a oportunidade de conhecê-lo intimamente. Não pôde, entretanto, formar uma opinião definitiva sobre o elevado estado espiritual do Mestre. Haladhari foi um homem devotado aos ritos e às práticas prescritas pelas escrituras; não gostava, portanto, da falta de cuidado do Mestre com sua roupa e com o cordão sagrado durante o êxtase. Pensava que o jovem primo havia enlouquecido ou se tornado inconformado com a conduta ritualista. Às vezes não se continha e dizia a Hriday: "Hriday, ele deixa a roupa e o cordão sagrado. Isso é muito mau. Devido a uma grande acúmulo de méritos de Karmas de nascimentos passados uma pessoa nasce numa família Brahmana. Contudo ele considera o estado de Brahmana uma coisa banal e quer rejeitá-lo. Será que realizou estado tão elevado para agir assim, impunemente? Hriday, ele tem alguma fé em suas palavras. Você deve ficar atento para que ele não se comporte assim. Será conveniente impedi-lo de fazer tudo isso, mesmo que seja necessário mantê-lo preso." Ele também ficava encantado vendo a torrente de lágrimas que escorriam dos olhos do Mestre na hora do culto, sua maravilhosa alegria ao ouvir as canções em louvor da glória do Divino e seu extraordinário anelo pela realização de Deus. Achava que todos esses estados do jovem primo eram certamente devidos a uma infusão do espírito Divino e que não podiam ser vistos em seres humanos. Haladhari estava surpreso em ver e ouvir tudo isso. Às vezes dizia: "Hriday, você deve ter sentido algum poder extraordinário nele senão não o teria servido tão fielmente." 14. Sempre assaltado por dúvidas, a mente de Haladhari não conseguia qualquer conclusão segura sobre o verdadeiro estado do Mestre e mantinha-se oscilando entre respeito e piedade. O Mestre dizia: "Haladhari ficava encantado em ver-me durante o culto no templo e disse diversas ocasiões: 'Ramakrishna, reconheci sua verdadeira natureza.' A isso muitas vezes eu respondia jocosamente: 'Tome cuidado, senão ficará confuso novamente' Ele dizia: 'Você não pode de forma alguma jogar poeira nos meus olhos; há certamente um acúmulo de divindade em você; isso compreendi totalmente agora.' Ouvi suas palavras e disse: 'Muito bem, vamos ver quanto tempo dura essa certeza.' Quando Haladhari, depois de terminar o serviço do templo, tomava uma pitada de rapé e começava a discussão sobre o Bhagavata, Gita, Adhyatma Ramayana ou qualquer outro livro, tornava-se logo um homem diferente devido ao egoísmo. Então fui lá e disse: 'Realizei todos os estados que você leu nas escrituras; posso compreender todos eles.' Logo que ele ouviu isso, disse: 'Verdade? Você é um grande tolo. Pode você compreender todas essas coisas?' Eu disse: 'Digo a verdade, o Uno que está 'dentro' deste (mostrando seu próprio corpo) explica tudo a respeito do Uno de quem você esteve falando agora.' Ouvindo isso, Haladhari ficou irritado e disse: 'Vá, seu grande tolo! Qual é a escritura que fala de uma encarnação de Deus
exceto de Kalki no Kali Yuga? Você enlouqueceu, e por isso, pensa assim.' Ri e disse: 'Há pouco você não disse que não haveria confusão novamente?' Quem dará então ouvido a tudo isso? Este fato aconteceu não uma ou duas vezes, mas em muitas ocasiões. Um dia ele me viu sentado num galho de baniano sob o Panchavati, urinando. Dali em diante ficou absolutamente convencido de que eu estava possuído por um espírito." 15. Já falamos da morte do filho de Haladhari, sob as circunstâncias peculiares já explicadas anteriormente. Sendo seguidor do culto de Vishnu, porém de mentalidade estreita, ele estava convencido de que Kali era formada de Tamoguna. Um dia chegou ao extremo de dizer ao Mestre: "Pode haver qualquer progresso espiritual no culto a uma Divindade formada de Tamas? Por que você adora essa Deusa com tanto cuidado?" O Mestre ouviu mas não deu qualquer resposta. Magoado por ouvir seu ideal Escolhido caluniado, foi ao templo de Kali e perguntou à Mãe do Universo, com lágrimas nos olhos: "Mãe, Haladhari, um erudito bem versado nas escrituras diz que Tu és formada de Tamoguna; Tu és assim?" Quando lhe foi mostrada a verdade pela Mãe Divina, encheu-se de alegria e correu imediatamente para Haladhari. Pulando em seus ombros, dizia repetidamente com a voz agitada: "Você diz que a Mãe é formada de Tamas! É assim? A Mãe é tudo - Ela tornou-Se os três Gunas e também, Ela é pura Sattvaguna." Haladhari teve então o olho direito aberto, por assim dizer, pelas palavras e toque do Mestre, naquele estado extático. Sentado no lugar do adorador, Haladhari aceitou de coração o que o mestre havia dito. E tendo visto a manifestação da Própria Mãe Divina em si, pegou um ramo de flores com pasta de sândalo e ofereceu-o aos pés de lótus do Mestre, com devoção. Pouco temo depois Hriday perguntou-lhe: "O senhor não diz, tio, que Ramakrishna está possuído por um espírito? Por que então o senhor o adorou?" "Não sei", respondeu Haladhari, "ele voltou do templo de Kali e surpreendeu-se de tal modo que me esqueci de tudo e vi a luz de Deus nele! Sempre que vou a Ramakrishna no templo de Kali ele produz esses estados em mim! Ó, que incidente intrigante! Não entendo." Embora Haladhari visse com freqüência a luz divina no Mestre, enquanto tomava seu rapé para discussão das escrituras, ficava tomado pelo egoísmo surgido de sua erudição e retomava novamente seu antigo eu, como o rato da história de "Purna-mushika" (vide Glossário, Vol. III) 16. Do comportamento de Haladhari acima narrado, vê-se que enquanto o apego à luxúria e ao ouro não desapareça, a prática de limpeza externa e o conhecimento das escrituras não são de muita utilidade e não podem dar ao homem o conhecimento da verdade última. Considerando os pobres que vinham tomar Prasad no templo de Dakshineswar como Narayana, o Próprio Deus, o Mestre, como já dissemos anteriormente, comia um pouco das sobras da comida deixadas em seus pratos. Aborrecido, Haladhari disse-lhe: "Quero ver como o senhor vai casar seus filhos!" Profundamente irritado com as palavras de Haladhari que iam contra a sua declarada admiração do conhecimento vedantista, o Mestre disse: "Seu canalha! Não é você mesmo que diz que os Shastras mandam considerar todos os seres como Brahman e o mundo como irreal? Você pensa que vou dizer, como você, que o mundo é irreal e ao mesmo tempo, ter filhos? Fora com seu conhecimento dos Shastras!" 17. O Mestre, de natureza infantil, confundido de vez em quando pela erudição de Haladhari, corria para a Mãe Universal para obter dela a opinião sobre o que deveria ser feito. Disseram-nos que Haladhari conseguiu provar que as experiências divinas do Mestre, em êxtase, eram todas falsas e mostrou, com a ajuda das escrituras, que Deus está além da existência e não existência. Grande foi a comoção do Mestre e mais tarde, narrando esse evento disse: "Pensei que todas as formas divinas que via e as palavras divinas que ouvia em Bhavasamadhi fossem todas ilusão. Havia a Mãe realmente me enganado? Profundamente nervoso, chorei com o sentimento de amor ferido e disse à Mãe: 'Ó Mãe, Tu me enganas assim porque sou iletrado e ignorante?' Aquele grito de agonia não parava. Sentei-me a Chorei na 'mansão'. Pouco tempo depois vi uma fumaça semelhante a uma neblina subindo subitamente do chão e preenchendo algum lugar em minha frente. Depois vi nessa fumaça um lindo rosto vivo, de pele dourada, com uma barba que chegava até o peito! Olhou-me firmemente e disse, com voz profunda: 'Meu filho, permaneça em Bhavamukha.' A figura repeliu aquelas palavras três vezes e imediatamente dissolveu-se na neblina e a fumaça também desapareceu no vazio. Depois dessa visão recuperei minha paz de espírito." Um dia o Próprio Mestre descreveu esse acontecimento a Swami Premananda. Disse que essa mesma dúvida havia surgido em sua mente mais uma vez ao lembrar-se das palavras de Haladhari. "Sentando-me para adorar", disse nosso Mestre: "chorei e importunei a Mãe para que ela solucionasse o problema. Ela então apareceu perto do jarro do culto, disfarçada de uma mulher chamada 'mãe de Rati" e disse: 'permanece em Bhavamukha'." Também, quando Tota Puri, o instrutor errante, deixou Dakshineswar depois de transmitir-lhe o conhecimento da Vedanta e de ficar no plano de consciência Nirvikalpa, ininterruptamente, durante
seis meses, o Mestre ouviu, no fundo do coração ao final daquele período, a voz incorpórea da Mãe Divina: "Permanece em Bhavamukha." 18. Haladhari viveu cerca de sete anos em Dakshineswar. Portanto foi testemunha de todos os acontecimentos que ocorreram em Dakshineswar - a chegada do Sadhu que tinha o conhecimento perfeito e que se comportava como um fantasma, da Brahmani, do santo da seita Ramawat chamado Jatadhari e de Tota Puri, um após o outro. O próprio Mestre contou que Haladhari e Tota Puri ocasionalmente sentavam-se e juntos liam o Adhyatma Ramayana e outras escrituras. Os acontecimentos acima mencionados sobre Haladhari ocorreram em diferentes ocasiões durante sua estadia no templo de Dakshineswar. Para conveniência do leitor, falamos sobre todos aqui. 19. Da análise do período de Sadhana do Mestre, sem dúvida está claro que, embora ele fosse considerado louco pelas pessoas comuns, na realidade não o era; nem sofria de qualquer doença ou desarranjo do cérebro. Um intenso anseio pela realização de Deus surgiu em seu coração. Ele não podia controlar-se devido à intensidade daquele anseio. Por essa razão as pessoas diziam que ele havia enlouquecido; porque, com o desejo ardente da realização de Deus, que consumia seu coração, não podia misturar-se com elas ou passar o tempo rindo e chorando sobre assuntos comuns. E quem pode? Quando a angústia do coração transcende a capacidade normal de tolerância, ninguém pode controlar-se e manter-se em dia com um mundo que corre cegamente atrás da luxúria e de ouro, tendo sua mente, sua palavra e suas ações variando a cada passo. Mas o limite da capacidade de tolerância, pode-se dizer, não é o mesmo para todos; uns ficam tomados com um pouco de infelicidade ou de felicidade; outros, permanecem firmes e imperturbáveis como a rocha, apesar de haver agitação profunda em seus corações. Por isso, quem pode conhecer o limite da resistência do Mestre? Em resposta, podemos dizer que seu poder de resistência era extraordinário. Isso será claramente compreendido, ao refletirmos sobre os outros acontecimentos de sua vida. Mas não é desnecessário falar da fantástica capacidade de tolerância do corpo e da mente de uma pessoa como o nosso Grande Mestre - que podia ficar calmo apesar de mal alimentado ou com fome e sem sono durante doze longos anos; que rejeitou os oferecimentos e imensa riqueza, tantas vezes quanto surgiram, porque eram obstáculos no caminho da realização de Deus? Há muitos outros exemplos mas desistimos de mencioná-los. O leitor cuidadoso vai encontrá-los na medida em que continuar conhecendo sua vida. 20. Assim o estado acima mencionado do Mestre parecia ser uma doença somente aos olhos das pessoas extremamente apegadas às coisas do mundo. Ninguém, à exceção de Mathur, é claro, que estava então presente no templo de Kali em Dakshineswar, poderia, com ajuda da razão e da imaginação, determinar parcialmente no íntimo, o estado mental do Mestre. Não podemos dizer quando Kenaram Battacharya desapareceu imediatamente após a iniciação do Mestre, porque não se ouviu mais falar dele, seja por Hriday, seja por qualquer outra pessoa depois daquele acontecimento. Portanto, os ignorantes e ambiciosos funcionários do templo de Kali foram os únicos a julgar os atos e estados mentais do Mestre naquela época. O que disseram não pode ser considerado como prova. Por isso, é certo que as palavras dos santos que chegavam a Dakshineswar, naquela época, eram as únicas provas confiáveis. Do que ouvimos do Mestre e de outros, sabe-se que esses Sadhakas e homens perfeitos, longe de julgá-lo vítima de insanidade, sempre o tiveram em alta conta. 21. Ao estudarmos os eventos que seguiram-se a esse período, veremos que o Mestre prontamente seguiu o conselho daqueles que desejavam o seu bem para a preservação de sua saúde. Mas quando o intenso anseio pela realização de Deus tornou-o esquecido do corpo e do mundo exterior, perdeu todo interesse por sua própria vida. Jamais foi visto persistir em sua própria vontade sem razão. Quando as pessoas diziam: "Que ele fique sob tratamento", ele concordou. Quando disseram que deveria ser levado à sua mãe em Kamarpukur, prontamente consentiu; também, quando foi arranjado seu casamento, não discordou. Levando em consideração tudo isso, como podemos tomar seus atos e comportamento como causados por insanidade? Além do mais, embora realmente tentasse manter-se indiferente às pessoas e aos negócios mundanos, não fazia objeção em misturar-se com as pessoas. Por outro lado ansiosamente as procurava e reunia-se a elas sempre que vinha adorar Deus e cantar Suas glórias. Isso é claramente observado quando vemos que costumava visitar o templo dos dez Mahavidyas em Baranagar; ir às vezes adorar a Mãe Universal em Kalighat e juntar-se ao grande festival anual de Panihati. Nesses lugares também às vezes encontrava-se e conversava com Sadhakas versados nas Escrituras. Depreendemos do pouco que sabemos dessas coisas que aqueles Sadhakas tinham-no em grande veneração. 22. Podemos mencionar por exemplo, a visita do Mestre a Panihati, durante o grande
festival de 1859. Naquele dia conheceu Vaishnavacharan, filho de Sri Utsavananda Goswami. Alguns entre nós ouviram de Hriday e também do próprio Mestre, que ele foi a Panihati e permaneceu durante algum tempo no templo de Manimohan Sen, quando, ao chegar, Vaishnavacharan o viu e imediatamente concluiu definitivamente que o Mestre estava em elevado estado de espiritualidade e que era uma das almas elevadas mais raras. Naquele dia Vaishnavaran passou a maior parte do tempo com o Mestre no pátio onde se realizava o festival, comprando mangas, arroz frito, coalhadas e doces que ofereceu ao Senhor numa deliciosa mistura, em pratos de cerâmica, divertindo-se ao dividir o Prasad com o Mestre e com os devotos. Voltando a Calcutá, depois do festival, Vaishnavacharan foi ao templo de Kali, da Rani Rasmani, com o intuito de ter o privilégio de vê-lo novamente Quando lhe disseram que o Mestre não havia regressado do festival, ficou desapontado. Já dissemos em outra ocasião (IV,1) como Vaishnavacharan encontrou-se com o Mestre três ou quatro anos mais tarde e como um relacionamento íntimo surgiu entre eles. 23. Durante esse período de quatro anos, o Mestre por diversas vezes, pegava algumas moedas e pequenos torrões de terra e as usava para praticar discriminação entre o real e o irreal, com o objetivo de remover de sua mente apego ao ouro, chegando com a ajuda do raciocínio à conclusão certeira de que a pessoa que houvesse chegado à realização de Brahman, Existência-Conhecimento-Bem-Aventurança Absolutos, único objetivo de sua vida, não poderia obter ajuda do ouro, mais do que um punhado de terra. Portanto, repetindo continuamente, "rupia-terra", "terra-rupia",4 (4 Quer dizer: Isto é uma rupia, isto é um pouco de terra. Ambos são inúteis, no que diz respeito à realização de Deus. Alguns pensam, "rupia-terra, terra-rupia" dignifica que "rupia é terra e terra é rupia" o que é um absurdo, embora seja aceito que ambos sejam modificações da terra. Como efeitos certamente são diferentes, lendo valores pragmáticos diferentes; mas como meios para a meta última, ambos são igualmente sem valor. ) tirou-os ao Ganga
a fim de tornar essa conclusão firmemente estabelecida em sua mente. Com a idéia de obter a firme convicção de que todas as coisas e pessoas, sem exceção, desde Brahman até uma pequena folha de grama são manifestações e partes da Mãe Divina, o Mestre compartilhou das sobras dos pratos dos pobres e limpou o lugar onde haviam comido. Com o propósito de remover completamente o orgulho e egoísmo da mente e de ter a convicção de que ele não era de modo algum superior a qualquer objeto de aversão geral, limpou, como varredor, os lugares sujos com suas próprias mãos. Também, a fim de superar o sentimento de aversão aos objetos geralmente considerados desprezíveis, adotou a prática de considerar o esterco e a pasta de sândalo iguais, na medida em que ambos são produtos dos cinco elementos. Para reforçar tal convicção em sua mente, tocou as fezes dos outros com sua língua, mantendo perfeita equanimidade mental. Todas essas e muitas outras extraordinárias e desconhecidas disciplinas foram feitas pelo Mestre durante esse período. Quando ponderamos sobre aquelas práticas e visões divinas do Mestre durante os primeiros quatro anos, fica claro que o anseio intenso de realização de Deus assaltou-o e com fé extraordinária mergulhou na Sadhana. Esses aspectos de sua vida convencem-nos que mesmo sem a ajuda externa, devido à pura intensidade de seu desejo, foi capaz de alcançar a visão perfeita da Mãe Divina e ter assim satisfeita a única ambição de lua vida. E tendo assim alcançado, inicialmente, os frutos de todas as disciplinas espirituais, prosseguiu comparando-os com os ensinamentos do Guru e dos Sastras. 24. De acordo com os ensinamentos do Mestre, a mente de um aspirante, purificada pelo autocontrole e renúncia, pode fazer o papel de seu próprio Guru. O pensamento e idéias que brotam dessa mente jamais pode desviá-lo. Ao contrário, mostram-lhe o caminho correto e conduzem-no rapidamente ao objetivo da vida. Esse foi o caso do próprio Mestre. Durante os primeiros quatro anos de sua Sadhana, a mente pura e santa tornou-se seu Guru e ensinou-lhe o que devia ser feito ou rejeitado. Isso não foi tudo. Em diversas ocasiões, assumindo a forma, por assim dizer, de uma outra pessoa, saiu do corpo e apareceu diante dele, encorajando-o a prosseguir com sua Sadhana. Às vezes ameaçava-o com castigo, se não mergulhasse profundamente numa determinada disciplina. Explicou-lhe porque uma determinada Sadhana deveria ser feita e o que resultaria dela. Foi por isso que o Mestre viu, por ocasião da meditação, um Sannyasin com o afiado tridente na mão, sair do corpo e dizer: "Se não abandonar todos os outros pensamentos e meditar de todo o coração no Ideal Escolhido, vou atravessar-lhe o coração com este tridente." Noutra ocasião viu que quando o Papa-purusha, personificação da natureza inferior ou animal do homem, saía de seu corpo, um jovem sannyasin simultaneamente aparecia e matava aquele ser maligno. Sempre que o desejo surgia na mente do Mestre para adorar a imagem divina num lugar distante, ou assistir ao canto das glórias do Senhor nas apresentações feitas em lugares distantes, ele descobria aquele mesmo jovem Sannyasin saindo de seu corpo em forma brilhante, semelhante à sua própria, viajando àqueles lugares por um caminho luminoso e voltando pelo mesmo caminho a seu corpo denso. O Mestre contou-nos muitas dessas visões.
O Mestre começou a ter a visão do jovem Sannyasin dentro do seu corpo, como imagem no espelho, quase desde o começo de sua Sadhana. Gradualmente acostumou-se a ser conduzido por seu conselho para fazer ou não todos os atos. No decorrer de uma conversa a respeito das extraordinárias visões e experiências de sua vida durante a Sadhana disse-nos o Mestre, um dia: "A figura de um jovem Sannyasin parecendo-se comigo costumava sair repetidamente de dentro de mim e instruir-me sobre todos os temas; quando emergia, às vezes eu mantinha uma pequena consciência exterior. Outras vezes perdia-se totalmente e ficava inerte, somente vendo e ouvindo suas ações e palavras, voltando à total consciência exterior somente quando ele entrava no corpo denso novamente. A Brahmani, Tota Puri e outros vieram e ensinaram-me posteriormente, o que eu ouvira previamente dele. Parece que chegaram como Gurus em minha vida para que a autoridade das escrituras, como os Vedas, pudesse ser mantida pelo fato de eu respeitar suas prescrições. Não existe qualquer outra razão para que eu aceitasse o "Desnudo" e outros, como Gurus. Quando o Mestre foi a Kamarpukur, durante a última parte desse período de Sadhana, outra visão extraordinária ocorreu enquanto ele ia, de palanquim, de Kamarpukur à casa de Hriday, no vilarejo Sihar. Olhando o céu azul profundo e uma grande extensão de campos abertos cobertos de arroz, de coloração verde e azul escuro com filas de figueiras, banianos e outras árvores que davam sombra fresca ao longo do caminho, ele estava com o coração cheio de alegria, quando duas lindas figuras de meninos, de tenra idade, subitamente saíram de seu corpo. Ora avançando com passos lentos, ora correndo alegremente aqui e ali, às vezes afastando-se para os campos à procura de flores silvestres, outras vezes caminhando ao lado do palanquim, riam e brincavam, conversavam e divertiam-se, como fazem os meninos. Assim continuaram alegremente durante muito tempo, quando voltaram e entraram em seu corpo. A erudita Brahmani chegou ao templo de Dakshineswar pela primeira vez aproximadamente um ano e meio depois dessa visão. Ela tomou conhecimento da visão que o Mestre teve e sem mostrar surpresa, disse: "Meu filho, o que você viu é verdade; Chaitanya está manifestado dessa vez na envoltura (corpo) de Nityananda Nityananda e Chaitanya vieram juntos e ambos estão morando em você, um único e mesmo receptáculo. Hriday disse: "Falando assim, a Brahmani recitou os seguintes versos do Chaitanya Bhagavata: 'Passando seus braços em torno do pescoço de Advaita, Sri Chaitanya diz repetidamente: Vou manifestar uma vez mais meu maravilhoso jogo. Minha forma será a felicidade durante o canto da glória de Deus. A Brahmani citou novamente: 'Gora representa seu papel até hoje. Só pessoas da mais alta sorte têm o privilégio de testemunhá-lo'." 25. Quando o visitamos um dia, o Mestre disse, a respeito dessa visão: "É verdade que tive essa visão e é, também, verdade que a Brahmani falou assim quando soube do ocorrido. Mas como posso dizer qual é o verdadeiro significado disso?" Dessas palavras sobre a visão, pensamos que, nessa época, ele teve alguma indicação clara de que, identificado com seu corpo e sua mente, algum antigo Ser conhecido do mundo durante incalculáveis épocas, estivesse morando nele com a finalidade de realizar algo importante. Parece que a indicação extraordinária que teve sobre sua individualidade com a ajuda dessas visões e experiências, ao longo do tempo, convenceu-o de que, "o Uno, que se manifestou em Ayodhya, como Sri Ramachandra, caro a Janaki e em Vrindavan, como Sri Krishnachandra, o bem-amado de Radha, com o propósito de restabelecer a religião dos tempos antigos, encarnou-Se mais uma vez como Sri Ramakrishna em corpo humano, para comunicar um novo ideal de religião, à Índia e ao mundo." Porque, quando estávamos com ele, nós o ouvimos dizer repetidamente, tanto quando o corpo em estava pleno gozo de saúde, ou quando o corpo estava abatido pela terrível doença, "O Uno que Se tornou Rama e Krishna está agora dentro dessa caixa (mostrando o corpo). Mas sua vinda dessa vez é como um rei visitando seu reino incógnito" 26. Se quisermos testar a veracidade da visão acima mencionada, não há outro meio senão acreditar no que o próprio Mestre falou a respeito em outras ocasiões a seus devotos do círculo íntimo. Deixando de lado essa visão, podemos certificar-nos da veracidade de todas suas outras visões; pois visões dessa natureza ocorriam diariamente em sua vida quando nós o visitávamos. E seus céticos discípulos, de educação inglesa, fracassaram quando testaram as verdades de tais visões e experiências. Embora já tenhamos dado alguns desses exemplos em outro lugar (IV.4), vamos relatá-los aqui uma vez mais, para alegria do leitor. 27. No final de 1885 a população de Calcutá - homens, mulheres e crianças - estava tomada de alegria e entusiasmo, como sempre, por ocasião da grande adoração e festival de outono. Embora a corrente daquela felicidade fosse particularmente sentida no coração dos devotos do Mestre, houve um grande obstáculo à sua manifestação - porque ele, em cuja companhia sentiam uma grande onda de felicidade, estava gravemente doente - o Mestre tinha câncer na garganta. Os devotos alugaram uma casa de dois andares em Shyampukur, Calcutá, e
levaram o Mestre para lá, havia aproximadamente um mês. Mahendralal Sarkar, o famoso médico, estava tratando dele e fazendo o máximo para curá-lo, mas a doença não apresentava sinais de declínio; pelo contrário, piorava gradualmente. Os devotos chefes de família vinham, de manhã e à noite, supervisionavam tudo e tomavam as providências necessárias. Muitos dos jovens devotos estudantes ocupavam-se do serviço do Mestre o tempo todo, exceto quando voltavam às suas casas para tomar a refeição. Alguns, sempre que necessário, passavam as vinte e quatro horas lá, sem irem à casa para comer. Se o Mestre falasse muito ou entrasse em êxtase repetidamente, o sangue em seu corpo subia e retardava a cura, constantemente irritando a ferida da garganta. Por isso o médico aconselhara o Mestre a controlar-se em ambas as atividades. O Mestre tentava seguir a recomendação, mas apesar de sua melhor cooperação nesse assunto, não conseguia evitar falar e deixar de ter êxtases repetidamente. Ao contrário das pessoas comuns, ele não considerava importante o corpo. Durante sua vida acostumou-se a considerá-lo com desprezo, como uma gaiola insignificante de carne e osso da qual tinha que retirar a mente, completamente. Logo que se apresentava um assunto devocional, esquecia-se de tudo a respeito do corpo e de tudo o que era necessário para mantê-lo. Ao discutir um assunto com o mesmo entusiasmo do passado entrava repetidamente em êxtase. Havia muitas almas sedentas de espiritualidade. Incapaz de ficar indiferente à ânsia de seus corações, o Mestre ensinava-lhes Sadhana, com a voz fraca. Vendo sua alegria e seu entusiasmo no trabalho do ensino espiritual, muitos dos devotos pensavam que a doença do Mestre era simples e poderia facilmente ser curada e ficavam despreocupados. Bastante estranho, alguns também eram de opinião que o Mestre havia contraído deliberadamente a doença para conceder sua graça a um círculo maior de devotos, atraídos para ele. O médico visitava-o quase diariamente, de manhã e à tarde. Enquanto examinava o paciente, escrevendo a receita e dando instruções aos atendentes, permanecia tão absorto na conversa do Mestre a respeito de Deus, que não se retirava, mesmo depois de duas ou três horas. Também, fazendo perguntas uma após outra e ouvindo durante muito tempo as maravilhosas soluções àquelas perguntas, às vezes dizia, com remorso: "Eu o fiz falar tanto; foi uma imprudência. Mas não converse com ninguém mais pelo resto do dia e não lhe fará mal. Não vê que suas palavras têm tal atração que sempre que Venho ao senhor, não posso abandonar esse lugar por duas ou três horas e negligencio minha profissão. Nem mesmo tenho noção de como o tempo passa. Não fale tanto tempo com ninguém mais; (em parte como gracejo, em parte com amor e alegria), ele dizia, "Converse assim comigo quando venho e isso não fará mal algum." A isso o médico e todos riam. Surendranath Mitra, a quem o Mestre às vezes chamava Suresh Mitra, estava celebrando o Durga Puja naquele ano, em sua residência de Simla. No passado sua família costumava celebrar anualmente, mas houve um infortúnio e a adoração foi então suspensa. Depois disso ninguém em sua casa teve coragem suficiente para fazê-lo e se alguém tentasse celebrá-lo, todos o dissuadiam veementemente. Fortalecido, contudo, por sua fé no poder do Mestre, Surendranath ficou completamente livre de medo por qualquer infortúnio pela interferência dos semideuses etc. Não se importou com as objeções de quem quer que fosse, já que decidira fazer. Embora todos os membros da casa apresentassem objeções, não conseguiram detê-lo por levar avante sua resolução naquele ano. Obteve a aprovação do Mestre e tomou as providências para que a imagem da Mãe fosse levada à sua casa, arcando com todas as despesas, sem qualquer ajuda dos outros membros da família. O único elemento de tristeza na alegria de Surendra foi que o Mestre não poderia juntar-se às celebrações devido à sua doença. Como alguns parentes adoeceram seriamente alguns dias antes do começo a adoração, sentiu-se responsável por isso e incorreu no desagrado de toda a família. Mas imperturbável, Surendra começou, com devoção, a adoração da Mãe Divina e com muito cuidado e atenção e convidou todos seus condiscípulos. A adoração concernente ao sétimo dia do calendário lunar havia terminado no dia anterior. Era o auspicioso oitavo dia. Muitos devotos reuniram-se na residência temporária do Mestre em Shyampukur e desfrutaram de sua bem-aventurada companhia. No meio de conversas inspiradoras e canções sobre o Divino, Narendranath começou a entoar canções devocionais imediatamente após a chegada do médico, às quatro horas da tarde. Todos estavam encantados com as vibrações extremamente melodiosas dos cantos e unidos por um notável fervor espiritual, perdiam-se completamente. O Mestre, às vezes, entrava em êxtase, no final do qual explicava em voz baixa, ao médico, sentado perto dele, a importância do conteúdo das canções. Alguns devotos perdiam a consciência, tomados por profundas emoções espirituais.
Fluía no aposento uma forte corrente de felicidade, quase palpável. O tempo passava desapercebido. Eram agora sete e meia da noite. O médico estava preocupado. Abraçou Narendra, com afeição paternal, despediu-se do Mestre e levantou-se. O Mestre, sorrindo, levantou-se de seu lugar e entrou imediatamente em Samadhi profundo. Os devotos começaram a murmurar: "Não é hora do Sandhi Puja? Foi por isso que o Mestre entrou em Samadhi. É de pouca surpresa que ele tenha entrado em Samadhi subitamente e sem saber da hora!" Mais ou menos meia hora depois o Samadhi do Mestre terminou e o médico deu-lhe boa noite. Agora, o Mestre falou aos devotos a respeito do seu Samadhi: "Vi que o caminho abriuse luminoso 'daqui' até a casa de Surendra. Atraído pela devoção de Surendra vi também que a Mãe havia aparecido na imagem e que raios de luz saíam de seu terceiro olho. Vi, também, que fileiras de lampiões estavam acesos na varanda da frente e Surendra, sentado, chorando de modo comovente no pátio da Mãe. Vão todos agora à casa de Surendra. Ele se sentirá mais confortado ao vê-los." Todos, incluindo Narendranath saudaram então o Mestre e foram à casa de Surendra. Fizeram-lhe perguntas e soube que fileiras de lampiões estiveram realmente acesos na varanda e que, incapaz de controlar sua onda de emoção, Surendra sentara-se no pátio diante da imagem e chorava em alta voz como um menino, dizendo: 'Mãe, Mãe', durante aproximadamente uma hora, tempo que durou o Samadhi do Mestre. Vendo que a visão durante o Samadhi do Mestre correspondeu aos acontecimentos exteriores, em cada detalhe, os devotos ficaram admirados e alegres. 28. Certa vez, nos primeiros quatro anos da Sadhana do Mestre, a Rani Rasmani e Mathur Babu, seu genro, pensaram que a absoluta abstinência do Mestre fosse responsável pelo que eles consideravam um desequilíbrio mental e consequente inquietude. Imaginando que ele poderia reconquistar a saúde se sua continência fosse quebrada, eles, com a melhor das intensões, tentaram seduzi-lo através de Lachmi Bai e outras belas prostitutas com suas atitudes amorosas, primeiro em Dakshineswar e depois, numa casa de Mechuabazar em Calcutá. O Mestre costumava dizer que ele viu a Mãe Divina naquelas mulheres e que, repetindo, 'Mãe', algumas vezes, perdeu a consciência. Seu órgão sexual contraiu-se e entrou completamenle dentro do corpo como a pata de uma tartaruga. Disseram-nos que surgiu um sentimento de afeição maternal nos corações daquelas mulheres decaídas que ficaram encantadas com o comportamento infantil do Mestre. Pensando que haviam cometido uma grande pecado ao tentar seduzi-lo a quebrar sua continência, elas lhe imploraram perdão com lágrimas nos olhos, saudaram-no repetidamente e disseram-lhe adeus com as mentes apreensivas. CAPÍTULO IX CASAMENTO E RETORNO A DAKSHINESWAR ASSUNTOS: 1. O Mestre em Kamarpukur. 2. Teoria da possessão por um espírito. 3. Um exorcista invoca um Chanda. 4. A opinião dos parentes do Mestre. 5. Um exemplo dos poderes ióguicos do Mestre. 6. A família decide sobre o casamento do Mestre. 7. Porque o Mestre consentiu em casar-se. 8. O Mestre escolhe a noiva. 9. O casamento. 10. A conduta de Chandramani e a do Mestre, depois do casamento. 11. O retorno do Mestre a Calcutá. 12. A intoxicação divina do Mestre pela segunda vez. 13. Prayopavesa de Chandradevi diante de Siva. 14. O estado do Mestre nessa época. 15. Mathur vendo o Mestre como Siva e Kali.
1. Em Kamarpukur a mãe e o irmão do Mestre ficaram muito preocupados ao ouvirem as notícias de que ele havia abandonado seus deveres de sacerdote. Mal haviam passados dois anos desde a morte de Ramkumar, quando Chandramani Devi, mãe do Mestre, e seu segundo irmão, Rameswar, vieram a saber, com muito desgosto, que ele estava sofrendo de 'insanidade'. As desgraças jamais vêm só. Um após outro, os infortúnios chegam com todos os lados e obscurecem completamente a vida de uma pessoa. Foi exatamente isso que lhes aconteceu. Gadadhar, a quem Chandradevi havia dado à luz com idade avançada, era-lhe naturalmente muito querido. Portanto, tomada de tristeza, acertou para que ele voltasse para casa. Quando já a seu lado, ela observou sua indiferença pelo mundo exterior e seu sentimento de falta, que se expressava em lamentos repetidos e pungentes de 'Mãe! Mãe!'. Tentou diversos meios para curá-lo com remédios e com a execução de ritos para propiciar os diversos deuses e semideuses. Isso ocorreu no final de 1858. 2. Por ocasião de seu retorno à casa, embora o Mestre tenha passado a levar uma vida normal, às vezes era tomado de emoções espirituais quando seu comportamento e conduta tornavam-se contrários ao normal. Também voltou a sentir grande dor com a sensação de
queimadura em seu corpo. Assim, por um lado apresentava a conduta usual simples e amável com todos, devoção a Deus e à sua mãe e amor a seus amigos; por outro lado era evidente nele, de tempos em tempos, um comportamento extraordinário e incomum - indiferença a tudo; ausência de vergonha, aversão e medo, ânsia ardente por alcançar um objeto vago e desconhecido e um esforço obstinado para vencer todos os obstáculos no caminho de seu objetivo desejado. Isso ocasionava na mente das pessoas a estranha crença de que ele estivesse possuído por um espírito. 3. Esse pensamento também passou pela cabeça da simplória Chandradevi. Agora quando ela ouviu os outros comentando o mesmo assunto, resolveu chamar um exorcista para o bem de seu filho. O Mestre costumava dizer: "Um dia veio um exorcista, acendeu uma vela santificada por Mantras e fez-me cheirá-la, dizendo: 'Se for um espírito, que vá embora', mas isso nada adiantou. Em seguida, a adoração e outras cerimônias terminaram com a ajuda de alguns exorcistas famosos e um 'Chanda' foi invocado. O Chanda aceitou a adoração e as oferendas, ficou satisfeito e disse aos exorcistas: 'Nem ele está possuído por um espírito, nem está sofrendo de qualquer doença.' O Chanda então dirigiu-se a mim na presença de todos e disse: 'Ó Gadai, você quer ser um Sadhu. Por que mastiga tanto betel? Não sabe que isso aumenta a luxúria?' Realmente eu gostava de betel e costumava mastigá-lo com muita freqüência; contudo, abandonei esse hábito, a pedido de Chanda." 4. O Mestre então estava perto de completar vinte e três anos. Recobrou bastante seu estado normal de saúde e durante a estadia em Kamarpukur. Deve ter havido alguma razão especial que lhe permitiu recobrar a saúde normal e acabar com seu lamento pungente. Que ele agora pudesse estar em paz foi certamente devido às repetidas visões da Mãe Divina. Estamos firmemente convencidos disso pelo que ouvimos dos parentes a respeito do seu estado nessa ocasião. Narramos agora seus relatos. Completamente só, ele passava a maior parte do tempo em dois solitários crematórios aterradores chamados Bhutirkhai e Budhuimoral, nos limites ocidental e nordeste de Kamarpukur. Seus parentes vieram a saber das manifestações ocasionais de poderes extraordinários nele. O Mestre saía de casa com um jarro cheio de doces e outros alimentos para oferecer aos chacais e semideuses que viviam no crematório. Quando aqueles alimentos eram oferecidos como uma oblação a eles, o Mestre lhes dizia que o jarro se elevava no ar e desaparecia no vazio. Às vezes ele podia ver, com seus próprios olhos, aqueles semideuses. Quando o segundo irmão, Rameswar, via que ele não voltava para casa, mesmo depois da meia noite, ia àqueles lugares e chamava o irmão pelo nome, em voz alta. O Mestre ouvia e respondia em voz alta: "Sim, irmão. Estou indo. Não venha além desse ponto, os semideuses podem fazerlhe mal." Nessa época o Mestre plantou uma semente de vilva, com as próprias mãos, no crematório de Bhutirkhal. Costumava sentar-se sob a velha árvore peepal que ali havia, meditar e fazer japa por longos períodos. Do que os parentes nos contaram, parece que a dolorosa falta que ele vinha experimentando, a falta da visão da forma da Mãe Divina, fora agora removida por algumas extraordinárias visões e experiências. Ao estudar esse período de sua vida, parece-nos que agora ele tinha visões constantes da forma da Mãe Divina, constituída de consciência pura e extremamente dadivosa ao Sadhaka - segurando em duas de suas mãos uma espada e uma cabeça cortada e estendendo as outras duas mãos num gesto de oferecimento de graças e destemor absoluto. Ele então moldava a vida de acordo com Suas ordens, recebidas em resposta às perguntas que fazia. Desde então, parece, passou a ter a firme convicção de que, em breve, obteria a ventura sem par de ter, constantemente, a visão beatífica da Mãe Divina. 5. Ouvimos não somente que o Mestre estava empenhado nesses ritos e cerimônias, como alimentar chacais e semideuses, mas também estava praticando Yoga. Como resultado, havia desenvolvido poderes proféticos. Tais fatos foram confirmados por Hriday e por muitas pessoas em Kamarpukur e Jayrambati e nós mesmos os ouvimos do próprio Mestre. 6. A mãe do Mestre e outros membros da casa haviam aprendido que, pela graça da providência, a doença da qual haviam pensado que ele estivesse sofrendo, havia diminuído bastante, porque observaram que já não chorava tão pungentemente como antes, alimentava-se na hora certa e sua conduta era como a das outras pessoas. Mas o fato de ir freqüentemente aos campos de cremação, sentar-se para adoração e meditação, ti ran do a roupa, sem qualquer sentimento de vergonha, de se aborrecer com a interferência em sua oração e meditação, de passar a maior parte do tempo com deuses e deusas sem importar-se com as palavras dos outros - tudo isso era considerado sua natural inclinação, desde a infância e não algo inusitado devido à insanidade. Contudo eles viam, com grande apreensão, que o Mestre era completamente indiferente aos
assuntos e que havia uma introversão ininterrupta em sua personalidade. Temiam que enquanto essas características persistissem haveria sempre o perigo de uma recaída em suas antigas anormalidades mentais. Sua querida mãe e o irmão mais velho estavam muito ocupados em inventar diversos meios de salvá-lo dessa recaída. Depois de muito pensarem e de muita consulta mútua, mãe e filho decidiram casar o Mestre. Começaram a busca urgente de uma noiva adequada. Pensavam que a mente do Mestre regressaria de suas aventuras nos elevados estados espirituais se seu amor viesse a ser dado a uma esposa de boa índole, vinda de uma família digna. Embora ele estivesse no auge de sua juventude dependendo, em todos os aspectos da mãe e do irmão, continuava o mesmo menino inocente de sempre. Nele não era percebido o menor desejo ou esforço para melhorar as condições de vida. Como isso poderia ocorrer a não ser que a responsabilidade de manter esposa e filhos repousasse em seus ombros? A noiva tinha que ser trazida à família do noivo somente depois que uma certa importância como dote, fosse paga à família da noiva, segundo o costume naquela parte do país. Tinham eles recursos para pagar uma importância tão elevada, necessária para obter uma menina de dez ou onze anos? Eles hesitaram. Haviam adiado o casamento de Gadadhar até então, somente porque não haviam levantado a importância necessária, devido aos vários infortúnios na família. Se ele já tivesse se casado há muito tempo atrás, com uma menina de cinco anos, ela estaria crescida por essa época para atrair a mente do marido e poderia tomar para si muitas das responsabilidades da família. De qualquer modo, o que tinha sido destinado a acontecer, aconteceu; não haveria mais demora. Começaram portanto, a procurar uma noiva pelos arredores. 7. Por mais secreta que fosse a consulta entre a mãe e o filho mais velho, o perspicaz Mestre logo veio a saber. Mas ele não fez qualquer objeção à proposta de casamento; pelo contrário, comportouse como uma criança que se diverte e sente-se feliz nas ocasiões festivas da família. Seria por ter obtido da Mãe Universal resposta afirmativa a essa questão que estava em tal felicidade? Ou era devido à sua infantil falta de reflexão e previsão? Sem dúvida as pessoas em geral dão essa última hi pótese como razão, mas nós discutimos o assunto em outro lugar (III,4) e expressamos nossa discordância a esse ponto de vista. 8. Emissários foram avisados nos vilarejos vizinhos à procura de uma noiva adequada, mas nenhuma foi encontrada. Rameswar, o irmão mais velho do Mestre, não arriscaria a acertar o casamento com nenhuma das moças disponíveis, porque seus pais pediam importâncias bem acima da que ele poderia pagar. Seus amigos no vilarejo também aconselharam-no a não assumir o compromisso de pagar somas tão altas. Chandradevi, contudo, ficou muito ansiosa, pois estava arranjando o casamento que considerava necessário para o futuro de seu querido Gadadhar, para seu bem-estar e estabilidade nos anos seguintes e não pela simples satisfação pessoal de uma celebração para brilhar sobre a tristeza que se abatera sobre ela depois da morte do marido por ela divinizado e do primogênito, Ramkumar. Por isso não podia ficar sossegada enquanto não se encontrasse a noiva. Novamente uma grande busca foi realizada. Como nenhuma noiva que conviesse foi encontrada, apesar de seus esforços, a mãe e irmão do Mestre ficaram extremamente preocupados. Mas um dia o Mestre subitamente entrou em Bhavasamadhi e disse: "É inútil buscar aqui e ali; procurem na família de Ram Mukhopadhyaya no vilarejo de Jayrambati; a noiva foi 'marcada com uma palha' (III.4) e ali foi mantida reservada." 9. Embora não depositasse muita fé nas palavras do Mestre, ainda assim sua mãe e seu irmão enviaram alguém para averiguar. Veio a notícia que, à parte outras coisas, a pretensa noiva era muito nova, com pouco mais de cinco anos. Como não havia outra noiva disponível em qualquer outro lugar e como a menina havia sido identificada de forma tão inesperada, a mãe do Mestre não teve outra alternativa senão a de concordar com o casamento de Gadadhar com ela. Tudo foi acertado em poucos dias de negociação e em seguida foram fixados o dia e a hora auspiciosos, consultando o almanaque. Rameswar foi com o irmão à vila de Jayrambati, a quatro milhas de Kamarpukur, onde foi celebrado o casamento de Gadadhar com a menina de cinco anos, filha única de Ramachandra Mukhopadhyaya. Dali voltaram para casa. O dote de trezentas rupias tinha que ser pago à família da noiva. Isso aconteceu em maio de 1859, quando o Mestre havia atingido, então, a idade de vinte e quatro anos. 10. Chandradevi, é claro, sentiu-se bastante aliviada após o casamento de Gadadhar. Quando viu que seu filho obedecia suas instruções quanto ao casamento e a outros assuntos, pensou que, afinal das contas, a Providência era-lhe agora auspiciosa. Pois teriam todas as coisas acontecido tão bem, se Ela não tivesse sido favorável? O indiferente filho havia retornado à casa; uma noiva de nobre descendência havia honrado sua família; a falta de dinheiro havia sido providencialmente superada e Gadai havia entrado na vida do mundo! Então, como não se
podia dizer que a Providência não era auspiciosa? Por isso a virtuosa e bondosa Chandradevi ficou agora um pouco feliz, mas essa felicidade durou pouco, porque lembrou-se da penosa pobreza da família. A fim de agradar o pai da noiva e manter as aparências, as jóias da noiva foram emprestadas dos Lahas, proprietários seus amigos, para a noiva, no dia do casamento. Desde o dia do casamento, Chandradevi depositou seu amor na noiva, tornando-a sua nova nora muito querida. Agora que o momento de devolver aquelas jóias chegara, os olhos da velha senhora enchiam-se de lágrimas ao pensar em tirá-las da menina. Contudo, não expressou a angústia de seu coração a ninguém, mas não levou muito tempo para que Gadadhar a compreendesse. Acalmou sua mãe com algumas palavras e tirou as jóias da esposa enquanto ela dormia, de forma tão hábil que ela não percebeu. Imediatamente as jóias foram devolvidas aos Lahas. Mas o caso não ficou por aí. A inteligente menina, quando acordou disse: "Onde estão as jóias que eu estava usando?" Com lágrimas nos olhos Chandradevi pegou a menina no colo e disse, consolando-a: "Minha filha, Gadadhar lhe dará mais tarde, muitas jóias melhores." O tio da recém-casada veio vê-la e ao tomar conhecimento desse fato, expressou grande desagrado e levou-a embora consigo. Chandradevi mais uma vez ficou cruelmente chocada, mas logo o Mestre removeu sua tristeza com seu jeito de brincar, comentando jocosamente: "Deixe-os fazer o que quiserem; o casamento não pode ser mais anulado." 11. Depois do casamento, o Mestre passou aproximadamente um ano e sete meses em Kamarpukur. Sua mãe o tinha consigo e não lhe dava permissão para voltar a Calcutá com facilidade. Temia também que poderia haver uma volta de seu estado de insanidade, caso ele fosse. Assim ele permaneceu e, segundo o costume da família, foi à casa do sogro por alguns dias regressando a Kamarpukur num dia auspicioso com a esposa que, agora, estava com sete anos. Decidiu voltar a Calcutá logo após sua "volta como um par", como é chamada a cerimônia acima mencionada. Mas devido à sua pobreza não podia ir a Calcutá. Embora a mãe e o irmão lhe pedissem para ficar em casa por mais algum tempo, não desconhecia a pobreza da família. Como então poderia o coração afetuoso e amoroso do Mestre ficar livre de ansiedade, conhecendo aquelas condições? Ele não aquiesceu a seus desejos e voltou para Calcutá, ao templo de Kali e retomou o serviço da Mãe Divina. 12. Mal havia feito a adoração durante alguns dias quando tornou-se tão absorvido n'Ela, que tudo a respeito de Kamarpukur - mãe, irmão, esposa, negócios mundanos, pobreza etc. desapareceram de sua consciência. A única idéia que passou a ocupar sua mente era o de como poderia ver a Mãe Divina em todos os seres, durante o tempo todo. Seu peito tornou-se vermelho novamente devido ao contínuo Japa, lembrança de Deus, reflexão e meditação n'Ele. O mundo com todas suas conversas parecia-lhe um veneno mortal; aquela terrível sensação de queimadura voltou novamente; o sono desapareceu, por assim dizer, no ar. Mas como já havia experimentado esses estados físicos e mentais, não ficou completamente tomado por eles como antes. Hriday nos disse que sob a orientação de Mathur Babu, Gangaprasad, o importante médico aiurvédico de Calcutá, receitou ao Mestre remédios, como pílulas de Chaturmukha e Madhyamanarayna e outros óleos, um, após o outro, para a cura de sua insônia, excesso de humor de vento, sensação de queimadura em seu corpo e outros sintomas. Embora nenhum resultado imediato fosse constatado pelo tratamento, Hriday não perdeu a esperança e ocasionalmente ia com o Mestre à casa do médico em Calcutá. Um dia, disse o Mestre, ele foi com Hriday e Gangaprasad examinou-o cuidadosamente e receitou novos medicamentos. Estava ali um outro médico de Bengala Oriental. Atraído pelo jeito do médico e pensando profundamente sobre sua doença, disse: "Parece, pelos sintomas, que ele está em estado de embriaguez divina. Não será curado com remedios.1" (1 Alguns dizem que foi o irmão de Gangaprasad, Durgaprasad, quem viu o Mestre e assim falou. ) O Mestre costumava dizer que esse médico foi a primeira pessoa a determinar a causa real de suas mudanças físicas, que pareciam doença, mas ninguém acreditou em suas palavras. Assim o tempo passava. Mathur Babu, outros amigos e pessoas que desejavam o bem do Mestre ficaram ainda mais preocupados e continuaram tentando diversos tratamentos para aquela doença fora do comum. Ela, entretanto, continuava progredindo e não apresentava sinais de melhora. 13. Aos poucos, as notícias chegaram a Kamarpukur. Sem outra alternativa, Chandradevi jejuou quase até a morte, diante de Siva, para a recuperação de seu filho. Sabedora que o "antigo" Siva de Kamarpukur era uma divindade "despertada", foi ao Seu templo e ali permaneceu prosternada, sem comer nem beber. Recebeu instrução do "antigo" Siva que teria seu desejo atendido, se fizesse a promessa no templo de Siva de Mukundapur, para onde foi e novamente jejuou. Embora soubesse que ninguém jamais havia jejuado naquele templo antes, a velha senhora tinha fé cega na instrução divina e jejuou. Mal se passaram dois ou três dias quando ela sonhou com
Siva, o grande Deus, com a pele mais prateada do que a própria prata, adornado com um brilhante cabelo emaranhado e vestido numa pele de tigre. No sonho Ele apareceu e consolou-a, dizendo: "Não tenhas medo, seu filho não está louco; está nesse estado devido ao tremendo despertar do divino espírito nele." Assim, encorajada pela divina informação, a virtuosa senhora adorou o grande Deus com o coração purificado pela emoção e, quando regressou à casa, começou a servir Sitala e Raghuvir com grande e exclusiva dedicação a fim de obter a paz mental do filho. Disseram-nos que, desde então, muitos homens têm jejuado no templo de Siva de Mukundapur e que seus desejos são atendidos. 14. Ao recordar a experiência de divina embriaguez naqueles dias, o Mestre costumava dizer-nos, de vez em quando: "Esse estado jamais ocorreu com pessoas comuns, porque mesmo um quarto de sua intensidade teria destruído seu corpo e sua mente. Eu permanecia ocupado com uma visão ou outra da Mãe durante a maior parte do dia e da noite, o que salvou a situação. Caso contrário teria sido impossível para esse envoltório (mostrando seu corpo) sobreviver. Não dormi nada durante seis longos anos. Os olhos perderam a capacidade de piscar, não podia fechar os olhos, apesar de todos os meus esforços. Não tinha noção do passar do tempo e estava completamente inconsciente do corpo. Quando a atenção saía da Mãe para o corpo, mesmo que fosse por pouco tempo, eu me sentia apreensivo e pensava: 'Será que estou nas raias da loucura?' Ficava diante do espelho e colocava o dedo nos olhos para sentir se as pálpebras se fechavam, via que as pálpebras eram igualmente incapazes de piscar; fiquei alarmado e chorei, queixando-se à Mãe: 'Mãe, será esse o resultado de chamar-Te? Será que por minha total confiança em Ti, Tu deste essa terrível doença a meu corpo?' No momento seguinte eu dizia: 'Que qualquer coisa aconteça a este corpo. Que o corpo se vá, se assim tiver que ser, mas que Tu não me desampares. Revela-Te a mim e concede-me Tua graça; Mãe, tomei completamente refugio em Teus pés de lótus e não tenho absolutamente outro apoio que não sejas Tu.' Costumava chorar assim por muito tempo, quando minha mente ficava novamente tomada por um extraordinário êxtase. O corpo parecia uma coisa insignificante - algo indigno de atenção. Então eu era abençoado com Sua visão e consolado por Suas palavras, o que me livrava do medo. 15. Foi também nessa época que Mathur, um dia, ficou admirado e aturdido ao ter uma visão inesperada da maravilhosa manifestação do Mestre, pela vontade inescrutável da Mãe do universo. Já descrevemos em outro lugar (III,6) como ele teve aquela visão das formas de Siva e Kali no Mestre e ofereceu-lhe sua sincera adoração, como ao verdadeiro Deus. Desde aquele dia foi obrigado a ver o Mestre com olhos diferentes e considerá-lo com fé e devoção. Ao vermos que um acontecimento impossível acontece, compreendemos que a Mãe Divina, a Vontade de todas as vontades, uniu inseparavelmente os dois com o cordão do amor, porque a ajuda e o serviço de Mathur no período seguinte da Sadhana do Mestre foram indispensáveis. Com esses acontecimentos ficamos admirados com as provas do imenso cuidado que a Mãe Divina tomou, com os meios maravilhosos que Ela empregou para tornar o corpo e a mente do Mestre instrumentos adequados para deter o declínio da religião e infundir um novo vigor espiritual no mundo moderno tomado pelo agnoticismo, ateísmo e materialismo. CAPÍTULO X A CHEGADA DA BHAIRAVI BRAHMANI ASSUNTOS: 1. A séria doença da Rani Rasmani. 2. A execução do Ato Devottara e sua morte. 3. A visão por ocasião de sua morte. 4. As apreensões derradeiras da Rani provaram ser verdadeiras. 5. As providências de Mathur para o serviço do templo. 6. Os recursos de Mathur para ajudar o Mestre. 7. As idéias de Mathur e outros sobre o Mestre. 8. Chegada da Bhairavi Brahmani. 9. Seu primeiro encontro com o Mestre. 10. A conversa entre eles. 11. A visão dela no Panchavati. 12. A discussão sobre os Sastras no Panchavati. 13. Porque a Bhairavi veio morar no ghat de Devamandal. 14. As razões de sua convicção a respeito do estado de Encarnação do Mestre. 15. A visita do Pandit Vaishnavacharan a Dakshineswar.
1. O Mestre, após seu casamento, voltou de Kamarpukur para Dakshineswar. Depois desse acontecimento, em 1861, dois fatos importantes ocorreram que, devido à sua profunda influência na vida futura do Mestre, merecem ser detalhados em especial. O primeiro foi a morte da Rani. Ela teve um ataque de disenteria pouco depois da chegada do Mestre a Dakshineswar. Ele contou a alguns de nós que a Rani, certo dia, levou uma queda, que deu lugar à febre, dor no corpo, indigestão e outras complicações que gradualmente levaram à disenteria. A doença, aos poucos, tomou um rumo fatal. 2. Possuidora de inúmeras qualidades nobres, a Rani havia consagrado o templo de Kali na
quinta-feira, 31 de maio de 1855; e para a continuação perpétua do serviço das divindades, havia comprado no dia 29 de agosto daquele mesmo ano, três propriedades, no distrito de Dinajpur, por duzentos e vinte seis mil rupias.1 (1 Queixa na Alta Corte de Justiça no. 308 de 1872, Puddomoni Dasee contra Jagadamba Dasee, cita o seguinte Feito de Doação, executado por Rani Rasmanni: "De acordo com o último desejo de meu marido... eu, em 18 de Jaistha 1262 B.S. (31 de maio de 1855) estabeleci e consagrei a Thakurs... e com o propósito de continuar o seva, comprei três lotes dos Zemindars no Distrito de Dinajpur, no dia 14 Bhadra 1262 (29 de agosto de 1855) por Rs. 226,000.") Embora tivesse em mente fazer doação da propriedade, até então não havia executado o
ato formal de doação. Vendo que a hora de sua morte estava se aproximado rapidamente, tornouse ansiosa em fazê-lo. Das quatro filhas da Rani, a segunda e a terceira, Kumari e Karunamayi, morreram antes da consagração do templo de Kali. Portanto somente as outras duas filhas, a mais velha, Padmamani e a mais nova, Jagadamba, estavam presentes em seu leito de morte. Soubemos que quando chegou a minuta do ato de doação do templo de Kali, redigida de acordo com a vontade da Rani, ela pediu as duas filhas para assiná-la, concordando assim, com os termos do ato e desse modo, evitando todas as possibilidades de brigas futuras entre seus descendentes, relativas à doação. Jagadamba assinou o documento, mas Padmamani não, apesar dos repetidos pedidos da Rani, na hora da morte. Por isso a Rani não teve paz em seu leito de morte. Como não restava outra alternativa, a Rani assinou 2 (2 O Ato de Doação, datado de 18 de fevereiro de 1861, foi executado pela Rani Rasmani; ela reconheceu a execução do mesmo diante de J. F. Watkins, promotor, Calcuta. Essa doação foi aceita como válida por todas as partes na ação judicial Alípor no. 47 de 1872, Puddomoni contra Jagadamba e também, quando aquela ação judicial (no. 308) foi revista depois da contestação de 15 de julho de 1881. ) o ato de doação, no dia 18
de fevereiro de 1861 pensando: "A vontade da Mãe Divina será feita", e passou para a esfera da Devi, na noite seguinte. 3. O Mestre dizia que a Rani Rasmani voltou para casa em Adiganga no Kalighat, poucos dias antes de sua morte. Antes de falecer, viu muitos lampiões acesos à sua frente e subitamente exclamou: "Tirem todos, não gosto deles. Minha Mãe, a Mãe do Universo está chegando agora; todos os locais ficaram iluminados com o brilho de Sua sagrada pessoa. (Um pouco mais tarde) Mãe, Tu chegaste? Mas Padma não assinou; o que vai acontecer, Mãe?" Assim falando a virtuosa Rani entrou num estado tranqüilo e sereno e imediatamente caiu no sono no colo da Mãe, sono que não tem despertar. Foi, também, levada às areias do Ganga e altos uivos 3 (3 A Devi é representada cercada de chacais. Assim o uivo dos chacais é considerado um bom augúrio. ) dos chacais podiam ser ouvidos em todos os lugares próximos. 4. A Rani estava muito apreensiva na hora da morte com o futuro do templo, que lhe era mais caro do que sua vida e sua angústia por esse motivo era mais aguda do que a dor física provocada pela doença fatal. A subseqüente história das brigas e litígios entre os netos justificou esses temores da previdente Rani. Vê-se nos documentos oficiais, que a propriedade do templo está agora hipotecada por um pouco menos de um laksh de rupias 4 (4 O débito da hipoteca da propriedade é de Rs.50,000; juros pagáveis trimestralmente, são de 876-0-0; custos da Justiça, já estipulados chegam a Rs. 20,000, sem taxas.) para custear as pesadas despesas do litígio. Quem poderá dizer algo sobre o futuro do
templo - se alguma coisa dele permanecerá como resultado daquelas querelas, além da simples memória, como um exemplo da piedade ímpar e louvável da Rani? 5. Desde a fundação do templo de Kali em Dakshineswar, Mathuranath Biswas, o genro mais novo da Rani, sobressaiu-se como seu braço direito na administração da propriedade. Ele já estava familiarizado com a situação financeira da doação do templo e desde o dia da consagração empenhou-se ativamente na organização dos serviços e sua execução, segundo os desejos da Rani. Por isso foi ele quem continuou a administrá-lo depois da morte da Rani. Com a influência exaltadora de Sri Ramakrishna havia dominado por completo a mente de Mathur algum tempo antes, o serviço da Mãe, em Dakshineswar, evidentemente não foi afetado depois da morte da Rani. 6. Já falamos muitas vezes ao leitor sobre o relacionamento especial de Mathur com o Mestre. Por isso é desnecessário mencioná-lo novamente. É suficiente dizer que a posição de Mathur, como a única autoridade na administração do templo depois do súbito falecimento da Rani, deu-lhe uma grande oportunidade de ajudar o Mestre em suas Sadhanas tântricas, que se prolongaram por um longo período. Quem pode dizer se essa autoridade de Mathur sobre o gerenciamento da propriedade não foi ocasionado pela vontade da Mãe Divina, para ajudar Seu filho, o Mestre? Porque, vemos que daquela época em diante, até sua morte, Mathur empenhou-se de todo o coração no serviço do Mestre. Ter fé firme numa pessoa por mais de onze longos anos e passar a vida em exaltado estado espiritual são possíveis somente pela graça de Deus. Fica-se convencido da boa sorte de Mathur pelo fato que, a cada dia sua fé no Mestre aumentava, em vez de dar livre curso a paixões ao ponto de perder a cabeça pela aquisição do poder total e único sobre a vasta propriedade da Rani. 7. Até agora ninguém, a não ser os Sadhakas de Deus, puderam formar qualquer idéia a
respeito do elevado estado espiritual do Mestre. A maioria das pessoas pensava que ele estava louco, pois diziam que ele não sabia discernir completamente o que era bom e o que era mau para si mesmo; não era atraído pelos objetos de prazer; jamais havia feito mal a alguém, vivendo satisfeito dentro de si, passando os dias repetindo os nomes de Deus - Hari, Rama ou Kali - um de cada vez. Viram também que ele não podia melhorar sua situação mundana, nem poderia jamais fazê-lo, mesmo sendo favorito da Rani e de Mathur Babu - cuja influência era suficiente para fazer as pessoas aumentarem suas fortunas, sob todos os aspectos. Porém uma coisa eles todos compreenderam: que, embora aquele louco fosse uma pessoa inútil, mesmo assim, seus olhos brilhantes, seu comportamento extraordinário, sua voz doce, seu modo de falar terno e sua maravilhosa presença de espírito tinham tal atração e encanto para todos, que ele poderia, sem vacilar, aproximar-se e fazer-se benquisto até daquelas pessoas ricas e respeitáveis das quais ninguém se aventurava aproximar-se. Embora as pessoas em geral e os funcionários do templo de Kali em particular, tivessem formado uma idéia um tanto estranha do Mestre, Mathur tinha dele uma visão bem diferente. Hriday contou-nos que Mathur havia dito: "A razão pela qual ele parece louco é que ele teve a graça da Mãe de todos." 8. Logo após a morte da Rani, ocorreu outro acontecimento importante na vida do Mestre. Havia um lindo jardim de flores na espaçosa margem do Ganga, a oeste do templo de Kali. Como o jardim era muito bem tratado, as árvores e trepadeiras cresciam exuberantes incorporandose maravilhosamente à beleza do lugar e enchendo todos os espaços com o perfume das flores. Embora o Mestre não fizesse o culto da Mãe Divina naquela época costumava apanhar diariamente flores naquele jardim, fazer guirlandas e enfeitá-La com suas próprias mãos. Ainda hoje, no meio do jardim há um lance de escadas que vai do Ganga ao templo, através de um lindo pórtico aberto e um Ghat de tijolos para uso das mulheres, no lado nordeste da margem, ao lado do Nahabat, ao norte do templo de Kali. As pessoas costumavam chamar aquele Ghat, BakulGhat, por causa de uma grande árvore bakul que se espalhava próxima dali. Um dia o Mestre estava apanhando flores naquele jardim, quando um bote chegou ao ghat de Bakul e ancorou. Uma bela senhora, vestida como Bhairavi, roupa ocre e folgada, e cabelo ondulante, desceu com uma pilha de livros na mão e caminhou na direção do pórtico, no amplo Ghat, ao sul. Embora a Bhairavi houvesse passado da juventude, ninguém poderia considerá-la avançada em idade porque a graça e a beleza da juventude ainda eram visíveis em sua pessoa. O próprio Mestre nos disse que a Bhairavi tinha então, quarenta anos. Não podemos dizer até onde o Mestre, à primeira vista, previu o futuro relacionamento, mas é verdade que sentiu grande atração por ela, como as pessoas sentem quando vêem alguém cuja vida está ligada à sua própria. Assim que o Mestre viu a Bhairavi, de longe, voltou a seu quarto, chamou Hriday e pediulhe que fosse buscar a Sannyasini para ele. Hriday hesitou e disse: "A senhora é uma estranha. Por que viria?" O Mestre respondeu, "Peça-lhe em meu nome e ela virá prontamente." Hriday disse que não foi pequena a surpresa que sentiu ao ver a ansiedade do Mestre em falar com uma mulher que lhe era completamente estranha; jamais o havia visto comportar-se assim. Contudo Hriday sabia que ele devia somente obedecer a seu tio insano. Portanto foi ao pórtico, viu a Bhairavi sentada e disse-lhe que seu tio materno, que era devoto de Deus, pedialhe que fosse vê-lo. Hriday ficou ainda mais admirado ao ver que a Bhairavi imediatamente levantou-se para acompanhá-lo, sem qualquer pergunta. 9. Quando a Bhairavi chegou ao quarto do Mestre e viu-o, foi tomada de alegria e espanto, derramou lágrimas de felicidade e disse, "Ah, meu filho, você está aqui! Eu sabia que você vivia num lugar às margens do Ganga e há tanto tempo venho procurando-o; finalmente o encontrei". O Mestre lhe disse: "Como soube de mim, mãe?" A Bhairavi respondeu: "Há muito tempo sabia, pela graça da Mãe Universal, que teria de encontrar três de vocês. Já encontrei dois em Bengala Ocidental. Hoje encontro-o aqui." 10. O Mestre sentou-se então ao lado da Bhairavi e falando alegremente, como uma criança, com o coração aberto à sua mãe, continuou narrando suas visões extraordinárias - a perda da consciência do mundo exterior enquanto falava sobre Deus, a sensação de queimadura em seu corpo, a falta de sono, outras mudanças em seu corpo, devido às quais era tomado como louco. Repetidamente perguntava-lhe: "Mãe, por que essas coisas estão acontecendo comigo? Será que fiquei realmente louco? Será que fui tomado de uma doença terrível por chamar a Mãe com todo o coração?" Ouvindo essas palavras do Mestre, como mãe, ora agitada, ora alegre, com o coração desmanchando-se em compaixão, consolava-o, dizendo-lhe repetidamente: "Quem o chama de louco, meu filho? Não é loucura. Você está em estado de Mahabhava e é por isso que todas essas coisas lhe estão acontecendo. É dado às pessoas comuns compreenderem o estado em que se encontra? Em sua ignorância, dizem todos os tipos de coisas. Tudo isso aconteceu a
Sri Radharani e a Sri Chaitanya, o Grande Senhor. Está tudo relatado nas escrituras devocionais. Tenho esses livros comigo. Vou lê-los para você e provar que esses estados ocorreram com aqueles que verdadeiramente chamaram por Deus no passado e assim o fazem no presente." Hriday simplesmente estava perplexo ao ver a Bhairavi Brahmani e seu tio comportando-se e conversando um com o outro como parentes próximos ou amigos de longa data. Quando mais tarde o Mestre achou que o dia estava avançando, deu à Bhairavi Brahmani, como desjejum, frutas, raízes, manteiga, açúcar cande etc., todos Prasad da Devi; e sabendo que a Brahmani, inspirada por amor espiritual maternal por ele, não tomaria nada sem antes alimentá-lo, ele primeiro dividiu com ela um pouco de todas aquelas coisas. Depois que ela prestou reverência às divindades e tendo tomado seu desjejum, apanhou da dispensa do templo um pouco de farinha, arroz etc., como Bhiksha, para fazer oferenda cozida ao símbolo de pedra de Raghuvir que ela usava no pescoço. Ela mesma cozinhou no Panchavati. 11. Em seguida, quando terminou de cozinhar, colocou comida, bebida etc., diante de Raghuvir e ofereceu-a a Ele. Logo meditou em seu Ideal Escolhido. Ao aprofundar sua concentração entrou em Samadhi e teve uma visão extraordinária. De seus olhos escorriam lágrimas abundantes de amor e ele ficou completamente esquecido do mundo. Sentindo uma atração irresistível para ir ao Panchavati naquele momento, o Mestre entrou em êxtase e não sabendo exatamente o que fazia, começou como alguém hipnotizado, a comer a comida oferecida pela Brahmani a seu Ideal Escolhido. A Brahmani retomou a consciência normal depois de algum tempo, abriu os olhos para ver aquele comportamento encantador do Mestre, que estava em Bhavasamadhi, fora da consciência do mundo. Vendo que tudo correspondia à sua visão, ela foi tomada de felicidade e espanto e os pêlos de seu corpo eriçaram-se. Descendo à consciência normal, o Mestre sentiu-se constrangido com o que havia feito e disse a Brahmani: "Quem sabe, mãe, porque perco o autocontrole e faço essas coisas?" A Brahmani então, como mãe, tranqüilizou-o dizendo: "Fez bem, meu filho. Não é você que fez isso, mas o Uno dentro de você. Ele fez o que sempre faz. Do que vivenciei durante a meditação, cheguei à conclusão correta de quem fez e sinto que não necessito mais prestar adoração cerimonial; minha adoração finalmente atingiu seu objetivo." Assim falando, a Brahmani, sem hesitar, partilhou dos restos da comida que havia sido deixada pelo Mestre, como Prasad sagrado do seu Ideal Escolhido. Tendo obtido a presença concreta e permanente de Raghuvir no corpo e na mente do Mestre, ela agora, com muito cuidado, jogou no Ganga o emblema de Raghuvir, que tão ternamente havia adorado todos aqueles dias, derramando lágrimas de amor e de alegria, como havia feito num estado semi-consciente de absorção espiritual. 12. A afeição mútua e atração experimentadas à primeira vista pelo Mestre e pela Brahmani, aumentavam diariamente. Com o coração transbordante de afeição espiritual e maternal, a Sannyasini permaneceu em Dakshineswar. O Mestre e a Brahmani empenhavam-se diariamente em conversas espirituais no Panchavati e costumavam ficar tão absorvidos nelas, que nenhum deles notava o tempo passar. O Mestre falou francamente à Brahmani a respeito de seus estados e visões espirituais e de vez em quando fazia-lhe diversas perguntas. A Bhairavi Brahmani resolvia todos aqueles problemas, com a ajuda de livros sobre os Tantras. Às vezes, também, ela lia versos do Chaitanya Bhagavata, do Chaitanya Charitamrita e de outros livros devocionais que mostravam os sinais produzidos pelo forte aparecimento do amor divino nos corpos e mentes das Encarnações de Deus, dissipando assim, as dúvidas do Mestre. Assim fluía uma corrente de felicidade divina no Panchavati. 13. Seis ou sete dias passaram-se, quando pareceu evidente ao arguto Mestre que não era bom manter a Brahmani ali, embora nada houvesse de censurável. Incapazes de compreender aquele relacionamento puro, as pessoas mundanas, dadas à luxúria e ao ouro, poderiam começar a falar mal do caráter da pura mulher. Logo que esse pensamento surgiu, mencionou-o à Brahmani. A Brahmani também sentiu que era razoável e deixou o templo de Kali, decidindo morar em algum lugar na vizinhança e vir diariamente ver o Mestre, durante algum tempo. Na direção norte do templo, no vilarejo de Dakshineswar, na margem do Ganga, está o Devamandal Ghat. A Brahmani foi para lá, onde passou a morar 5.( 5 Hriday dizia: "O próprio Mestre aconselhou a Brahmani a morar em Devamandal Ghat. Enviou-a à casa de Mandal. Logo que ela ali chegou, foi recebida pela esposa do último Navinchandra Niyogi. A piedosa senhora não somente deu-lhe permissão para morar no quarto do Ghat, pelo tempo que quisesse, como também deu-lhe cama, uma porção de arroz, grãos, ghee e outros alimentos." ) Ela
passeava pelo vilarejo, tornando-se querida das senhoras do lugar, por suas nobres qualidades. Por isso não teve qualquer problema de casa e comida e podia encontrar-se com o Mestre diariamente, sem medo da crítica das pessoas. Costumava visitar o templo de Kali todos os dias, durante algum tempo e conversar com ele, como antes. Ela armazenava vários tipos de provisões, pedidas às mulheres do vilarejo e cozinhava no templo, para oferecê-las ao Mestre
(III,8).
14. O que ouviu das experiências, visões e estados espirituais do Mestre levou a Brahmani à firme convicção de que todos aqueles estados eram produzidos por seu extraordinário amor a Deus. Quando viu que ele sentia felicidade suprema ao cantar a glória do Senhor e que muitas vezes perdia a consciência em Bhavasamadhi enquanto conversava com Deus, teve a certeza de que ele não era um Sadhaka comum. Ao constatar tudo isso, lembrou-se várias vezes das sugestões encontradas no Chaitanya Charitamrita, no Chaitanya Bhagavata e em outros livros do vaishnavismo bengali, de que Chaitanya, o Grande Senhor, novamente tomaria um corpo e desceria à terra, para a liberação do homem. A Brahmani, grande erudita que era, comparou minuciosamene a conduta e o comportamento do Mestre com os de Chaitanya, relatados naqueles livros e encontrou grande semelhança. Viu manifestado no Mestre, como em Chaitanya, o poder de despertar a espiritualidade nos outros pelo toque, durante o Bhavasamadhi. Assim também, guirlandas, pasta de sândalo etc. que, segundo relatos, curaram a constante sensação de queimadura no corpo de Chaitanya que sofria com as dores da separação de Deus, foram também aplicadas ao Mestre, com o mesmo objetivo, obtendo igual resultado (IV,1). Por isso a lembrança da divina visão a respeito de Sri Ramakrishna, que a Brahmani havia tido no Panchavati no primeiro dia de sua chegada, bem como os acontecimentos ainda mencionados convenceram-na profundamente que Chaitanya e Nityananda haviam voltado novamente na época atual e estavam morando no corpo e na mente do Mestre a fim de disseminarem o amor a Deus para a liberação dos Jivas. O Mestre, ao dirigir-se ao vilarejo de Sihar, conforme já mencionamos, viu dois rapazes de tenra idade, saindo do seu corpo. A Brahmani ouviu do próprio Mestre sobre essa visão e ficou ainda mais convencida de sua conclusão sobre ele. Disse: "Chaitanya está se manifestando nesta época na 'envoltura' de Nityananda." A Sannyasini Brahmani não esperava favor de ninguém neste mundo; não tinha medo de ser condenada ou ridicularizada se sua conclusão a respeito de Sri Ramakrishna fosse comentada. Por isso, indagada a esse respeito, não hesitou em expressar plenamente seu ponto de vista, primeiro ao Mestre e em seguida, aos outros. Certo dia o Mestre estava sentado no Panchavati com Mathur e Hriday. Ao longo da conversa o Mestre falou a Mathur sobre a fé da Brahmani a seu respeito e disse: "Ela disse que os sinais que estavam manifestados nas Encarnações de Deus estão aqui neste corpo e nesta mente. Ela leu muitas escrituras e tem consigo muitos livros." Quando Mathur ouviu isso, riu e disse: "Pai, deixe que ela diga o que quiser; as Encarnações de Deus não podem ser mais do que dez. Por isso, como suas palavras podem ser verdadeiras? Mas não há dúvida que a Mãe Kali conferiu Sua graça ao senhor." Estavam assim conversando, quando viram a Sannyasini vindo em sua direção. Mathur perguntou ao Mestre: "É ela?" O Mestre respondeu: "Sim". Viram que ela havia conseguido em algum lugar, um prato cheio de doces e estava chegando com ele na mão, num raro estado espiritual, caracterizado pela introversão e esquecimento do mundo exterior. Com o coração transbordante de amor, como Yasoda, a mãe de Krishna, que tinha zelo em alimentar seu Gopala, ela caminhava em direção ao Mestre, com o prato de doces na mão. Quando se aproximou deles, viu Mathur Babu e assim, cuidadosamente se conteve e estendeu o prato para Hriday, para que ele desse ao Mestre. Apontando para Mathur, o Mestre então lhe disse: "Mãe, eu estava lhe contando o que a senhora havia falado sobre mim, a que ele respondeu que as Encarnações de Deus não podem ser mais do que dez." Mathur saudou a Sannyasini nesse meio tempo e admitiu que realmente havia levantado objeção. A Brahmani deu-lhe suas bênçãos e respondeu: "Por que? O Bhagavata não fala a princípio de vinte e quatro Encarnações e em seguida, de inúmeras outras? Além disso, o novo advento do Grande Senhor Chaitanya está claramente mencionado nos livros vaishnavas, e entre ele e Sri Chaitanya podem-se observar grandes semelhanças em suas experiências e caráter." A Brahmani manteve assim sua posição e disse que se um bom erudito do Bhagavata e dos livros dos instrutores vaishnavas bengalis fosse consultado, só poderia confirmar a verdade do que ela havia dito. Ela estava disposta, disse, a sustentar sua posição na presença de um erudito. Não sabendo o que dizer, Mathur permaneceu em silêncio. 15. Todas as pessoas, importantes ou não, no templo de Kali, ficaram aos poucos sabendo da convicção extraordinária da Brahmani sobre o Mestre. Isto ocasionou grande alvoroço entre elas. Mencionamos em detalhe em outro lugar, o resultado desse sensacional desenvolvimento (III,5,6;IV,1). Por isso será suficiente mencionar aqui somente que, embora a Brahmani tivesse subitamente elevado o Mestre à posição de Deus e lhe prestado a reverência devida a Deus, na presença de todos, ele permaneceu a mesma criança simples da Mãe Divina, intocada pelo egoísmo e pelas mudanças resultantes. Mas ele queria conhecer as opiniões das pessoas bem versadas nos Sastras sobre a conclusão da Brahmani e insistiu, como um menino, para que Mathur
convidasse os Pundits a virem a Dakshineswar. Como resultado desse pedido, o Pundit Vaishnavacharan veio ao templo de Kali. Descrevemos em outro lugar (IV,1), como a Brahmani ao encontrar-se com Vaishnavacharan, não somente manteve sua posição diante dele, mas também o fez apoiá-la... CAPÍTULO XI SADHANA TÂNTRICA ASSUNTOS: 1. O entendimento correto da Brahmani a respeito do Mestre. 2. Porque ela lhe pediu para fazer Sadhana Tântrica. 3. Como a Brahmani pôde pensar em ajudá-lo, uma Encarnação. 4. A ansiedade dela para agir assim. 5. O Mestre pedindo permissão da Mãe Divina. 6. O zelo do Mestre na Sadhana. 7. Construção do assento no Panchavati. 8. Vendo a Deusa na mulher. 9. Renúncia à aversão. 10. O comportamento do Mestre por ocasião das Sadhanas Tântricas. 11. A história de Ganesha. 12. A volta ao redor do universo por Ganesha e Kartika. 13. A singularidade do Mestre em sua Sadhana Tântrica. 14. O propósito divino por detrás de tudo isso. 15. A implicação do sucesso do Mestre sem associação com uma mulher. 16. Objetivo das práticas tântricas. 17. Outra razão para o sucesso do Mestre sem associação com uma mulher. 18. Suas experiências durante a Sadhana Tântrica. 19. Repartindo a comida tomada pelos chacais e cães. 20. Penetração pelo fogo do conhecimento. 21. O despertar da Kundalini. 22. Visão da Brahmayioni. 23. Anahata Dhvani. 24. Inutilidade dos poderes miraculosos. 25. A conversa do Mestre com Swami Vivekananda a esse respeito. 26. O poder ilusório da Mãe Universal. 27. A beleza de Shodasi, a Mahavidya. 28. Resultados da Sadhana Tântrica. 29. Esplendor da pessoa do Mestre. 30. A Bhairavi Brahmani, uma parte de Yogamaya.
1. A Brahmani não chegou à conclusão acima sobre a natureza incomum do Mestre somente pela razão e dedução. O leitor pode recordar-se do que ela disse ao Mestre, em seu primeiro encontro com ele, que tinha que entrar em contato com três pessoas, Sri Ramakrishna e mais duas outras e ajudá-las em seu desenvolvimento espiritual. Ela havia recebido ordem da Mãe do Universo muito antes de ter tido o privilégio de encontrar o Mestre. Está, portanto, claro que foi sua percepção interior, resultante de suas práticas espirituais, que a trouxe a Dakshineswar e ajudou-a a entender o Mestre. Com o passar dos dias, à medida que a associação da Brahmani com o Mestre se tornava cada vez mais íntima, teve a avaliação exata do papel que ela teria em sua Sadhana e a natureza da assistência que deveria dar-lhe. Portanto, agora não passava o tempo em simplesmente mudar a concepção errônea que as pessoas tinham a respeito dele, mas obrigava o Mestre a praticar diversas disciplinas de acordo com as injunções estritas das escrituras, para que ele, tendo uma visão perfeita da Mãe Universal e dotado de Sua graça e favor infinitos se tornasse firmemente estabelecido em Seu próprio poder divino, isto é, em sua verdadeira natureza. 2. A Brahmani, ela mesma uma aspirante adiantada, ao ver o Mestre e conversar com ele, não levou muito tempo para compreender que o Mestre não poderia livrar-se das dúvidas sobre seu próprio estado, porque havia alcançado, até então, a visão da Mãe Divina somente com a ajuda de sua extraordinária devoção, ao invés de seguir estritamente os tradicionais caminhos dos instrutores espirituais. Por isso surgia de vez em quando na mente dele, a dúvida se suas visões da Mãe Divina, eram ou não o resultado de um desarranjo do cérebro, ou se suas extraordinárias mudanças físicas e mentais eram apenas sintomas de uma doença maligna. A Brahmani pensou no assunto e induziu o Mestre a seguir o caminho da disciplina prescrita pelos Tantras. Ela sabia que, assim que o Mestre seguisse o caminho da disciplina trilhado pelos Sadhakas do passado e tivesse experiências dos estados espirituais semelhantes àqueles experimentados por eles, compreenderia que esses seus estados não eram produzidos por qualquer doença. Quando ele visse relatado, nos Tantras, que determinados resultados eram produzidos pela execução de ritos particulares e quando ele próprio conseguisse aqueles resultados pela prática daqueles ritos, teria a firme convicção de que, pela disciplina, o homem alcança experiências incomuns ao elevar-se a planos de consciência, no campo interior, cada vez mais altos e que seus estados físicos e mentais haviam sido produzidos somente daquela maneira. O resultado seria que, por mais incomuns que fossem as experiências que ele pudesse vir a ter no futuro, ele as consideraria verdadeiras e iria em direção a seu objetivo sem ser perturbado por elas. A Brahmani sabia que as escrituras, por esta razão, aconselhavam que o aspirante sempre comparasse as experiências de sua própria vida com as palavras do Guru e com os Sastras, para ver se concordavam ou não. 3. Por que a Brahmani, pode-se perguntar, empenhava-se em fazer o Mestre praticar aquelas disciplinas, embora soubesse que ele era uma Encarnação Divina? Ou será que aquele que compreende a glória das Encarnações de Deus aceita a conclusão de que elas são perfeitas e que as disciplinas são completamente desnecessárias para elas? Respondemos que isso teria sido verdadeiro, se a Brahmani sempre estivesse consciente somente da grandeza transcendente do
Mestre e livre da afeição pessoal por ele. Mas esse não foi o caso. Já dissemos que a Brahmani sentiu desde o primeiro encontro, uma afeição maternal pelo Mestre. Não há na terra nada mais poderoso do que o amor para obliterar numa pessoa, a consciência de poder sobre o objeto de seu amor e impeli-la a fazer o que considera bom. Portanto não há dúvida que foi sua afeição sincera por ele que impeliu a Brahmani a induzir o Mestre a fazer aquelas práticas espirituais, embora conhecesse a grandeza do Mestre. O mesmo ocorreu nas vidas de todas as Encarnações. Apesar das pessoas ligadas a esses seres serem às vezes tomadas por temor pelo conhecimento de seus extraordinários poderes espirituais, elas, como se vê, esquecem-se de tudo no momento seguinte e, encantadas pela atração de seu objeto de amor, sentem-se contentes simplesmente em oferecerlhes o amor de seus corações, buscando o seu bem-estar. De maneira semelhante, a Brahmani, embora maravilhada com os freqüentes e extraordinários êxtases e com a manifestação de poderes no Mestre, esquecia sua importância imediatamente, cega pelo amor maternal. Não é necessário dizer que a afeição filial autêntica do Mestre por ela e sua absoluta dependência e fé nela não tiveram um papel pequeno ao levantar ondas ternas, embora austeras, de afeto maternal no coração da Sannyasini. Foi esse afeto maternal que a fez esquecer-se dos poderes dele e impeliu-a a suportar problemas infindáveis para tornar o Mestre feliz de todas as maneiras, protegendo-o das tiranias dos outros e ajudando-o em sua Sadhana naquela fase de sua vida. 4. Quando há oportunidade de ensinar um discípulo extraordinariamente brilhante, surge, naturalmente, no coração do Guru, um contentamento e uma satisfação supremos. A Brahmani jamais havia sonhado que, no mundo espiritual, poderia nascer, na época atual, uma pessoa tão elevada e competente como o Mestre. Por isso podemos muito bem imaginar a grande alegria que deve ter enchido o seu coração, ao ter a oportunidade de ensiná-lo. Por isso não é de se espantar que ela estivesse tão ansiosa para que o Mestre experimentasse, em pouco tempo, todos os resultados de seus estudos e austeridades. 5. Ouvimos do próprio Mestre que ele havia perguntado à Mãe Divina sobre a justeza e necessidade das disciplinas, de acordo com os Tantras, antes de começar a praticá-las e que as havia feito com Sua permissão. Portanto, não foi simplesmente a ansiedade e a persuasão da Brahmani que o fizeram levar a cabo aqueles exercícios espirituais, mas também sua percepção interior, nascida da Sadhana. Essa percepção fez com que sentisse no fundo do seu coração que a oportunidade de alcançar o conhecimento imediato da Mãe Divina recorrendo aos métodos das escrituras, havia chegado. Assim, a mente concentrada do Mestre, agora, adiantara-se rapidamente, movida pelo poder da aspiração, ao longo do caminho da Sadhana ensinada pela Brahmani. Não nos é possível, mortais comuns, sentir a medida e a intensidade daquela ansiedade porque, onde está aquela tranqüilidade e aquele direcionamento de nossas mentes para um só ponto, distraídos como somos por muitas e para muitas direções? Onde está em nós aquela coragem sem limites, para mergulharmos de cabeça no mar de consciência profunda e tocar seu fundo, em vez de sermos iludidos pelas faltas de suas ondas superficiais representadas pelos objetos da consciência normal? Onde está em nós o poder de erradicar o apego a todas as coisas do mundo, incluindo nossos próprios corpos e mergulhar com total abandono, nas profundezas da interiorização espiritual para realizar o que o Mestre nos recomendava repetidamente ao dizer: "Mergulhem profundamente, mergulhem nas profundezas de vocês mesmos." Soubemos que tomados pela angústia de seu coração, o Mestre esfregava o rosto nas margens de areia do Ganga, no Panchavati, dizendo: "Mãe, revela-Te." e isso foi assunto de um dia ou dois? Persistiu inabalável e os dias passavam. Aquelas palavras apenas entram em nossos corações, mas não ocasionam ecos correspondentes em nossos corações. E como pode ser diferente? Temos a fé infantil do Mestre, que tudo consome, na existência da Mãe Divina e na oportunidade de alcançar Sua visão renunciando a tudo e chamando-A com a mais profunda ansiedade do coração? 6. Um dia, enquanto vivia em Kassipur, o Mestre surpreendeu-nos ao dar uma pequena indicação da medida e da intensidade de seu anseio espiritual na época da Sadhana. Não podemos dizer se seremos capazes de dar ao leitor a mais fraca pintura do que sentimos então. Vamos, contudo, tentar. Nós testemunhamos, com nossos próprios olhos, o desejo ardente do Swami Vivekananda pela realização de Deus - como, o despertar espiritual lhe veio quando ia depositar a taxa para o exame de Direito: como, tomado por intenso zelo e esquecido do mundo, correu pela cidade como louco, descalço e coberto somente por uma simples peça de roupa, até o lugar onde se encontrava o Mestre e obteve sua graça ao revelar-lhe a angústia de seu coração; como, desde então, dia e noite passava o tempo em Japa, meditação, canções devocionais e estudo espiritual; como, devido ao entusiasmo sem limite pela Sadhana, seu coração normalmente terno tornou-se duro, ficando bastante indiferente ao sofrimento da mãe e dos irmãos; e como,
avançando com devoção integral no caminho da Sadhana, determinado por seu preceptor, teve visão após visão, culminando por desfrutar a felicidade do Nirvikalpa Samadhi, após período de três ou quatro meses. Tudo isso ocorreu diante de nossos próprios olhos e deixou-nos atônitos. Profundamente satisfeito, o Mestre costumava exaltar a devoção extraordinária do Swami e sua ansiedade e entusiasmo pelas práticas espirituais. Um dia, naquela época, o Mestre comparou o amor do Swami e entusiasmo pela Sadhana, com os seus próprios e disse: "A devoção e entusiasmo de Narendra são realmente extraordinários, mas comparados com a ansiedade daqui (mostrando a si próprio) por ocasião da Sadhana, o seu é absolutamente comum. Não é nem um quarto daquele." Pode imaginar, ó leitor, a surpresa que sentimos com aquelas palavras do Mestre? Assim o Mestre aceitou a sugestão da Mãe Universal, esqueceu tudo o mais e mergulhou na Sadhana. A erudita e magistral Brahmani esforçou-se bastante para conseguir, de diversos lugares, as coisas especificamente necessárias a certos ritos particulares e deu ao Mestre instruções relativas à sua aplicação por ocasião da Sadhana. 7. Os crânios1 (1 Agora ouve, Ó Rainha dos Devas, a melhor Sadhana com a ajuda dos crânios, com a qual o Sadhaka alcança a meta suprema que é a Própria Devi, Ó Aquela de rosto excelente; "os três crânios" são os de um homem, de um búfalo e de um gato ou são "três crânios somente de um homem e as cabeças de chacal, de cobra, de cachorro e de um touro e, entre elas, a cabeça de um homem. Caso contrário, somente os cinco crânios de um homem são chamados, Ó Poderosa, em conjunto, "os cinco crânios"... E um altar, de um palmo quadrado, deve ser feito. Ou um altar de quatro cúbitos quadrados, Ó Devi, deve ser construído." A 5" Patala-Yogini-Tantra. ) de cinco seres mortos, inclusive o de um homem, foram trazidos de algum lugar, longe do Ganga; e dois altares 2 (2 Os Sadhakas geralmente fazem um altar sobre as cinco cabeças enterradas e sentadas sobre ele, praticam Japa, meditação etc. Mas o Mestre não falou-nos de "dois assentos de crânios". Os três crânios humanos foram enterrados debaixo do altar, debaixo da árvore vilva e cinco crânios de cinco espécies de geres mortos, enterrados debaixo daquele, no Panchavati. Em pouco tempo tornou-se perfeito em suas Sadhanas. Jogou aqueles crânios no Ganga e derrubou ambos os altares. Foram feitos "dois assentos" porque o assento dos "três crânios" era favorável à Sadhana ou porque o lugar sob a árvore vilva era, naquela época, completamente solitário e portanto, mais adequado para as Sadhanas. Ou pode ser que nenhum fogo para o Homa pudesse ser aceso sob a árvore vilva, devido à proximidade do depósito da "Companhia" (depósito do Governo da Índia)) propícios às Sadhanas Tântricas foram
construídos, um sob a árvore vilva, situado no limite norte do templo e o outro, no Panchavati, plantado pelo próprio Mestre. Sentado em qualquer um desses 'crânios-assentos', segundo a necessidade, o Mestre passava o tempo em Japa, meditação, etc. Esse Sadhaka extraordinário e sua guia não tiveram consciência, durante alguns meses, de quantos dias e quantas noites se passaram. Mestre costumava dizer:3 (3 Damos aqui, de uma forma interligada, o que ouvimos do Mestre por diversas vezes.) "Durante o dia a Brahmani ia a diversos lugares, longe do jardim-templo, apanhava e trazia artigos raros prescritos pelos Tantras. Colocando-os sob a árvore vilva ou no Panchavati à noite, ela me chamava, ensinava-me a usar tais coisas e ajudava-me a fazer a adoração da Mãe Divina segundo as regras prescritas com sua ajuda, pedindo por fim, para mergulhar em Japa e meditação. Eu fazia tudo de acordo, mas tinha que fazer pouco Japa; porque, mal passava o rosário uma vêz, mergulhava completamente em Samadhi e realizava os resultados próprios daqueles ritos. Assim não havia limite para minhas visões e experiências, todas extraordinárias. A Brahmani fez-me executar, uma após a outra, todas as disciplinas prescritas nos sessenta e quatro Tantras principais, todas difíceis de fazer e, ao tentar praticá-las, muitos Sadhakas fracassaram. Mas eu passei por todas elas com sucesso, pela graça da Mãe. 8. "Numa ocasião vi que a Brahmani havia trazido - ninguém sabia de onde - uma linda mulher, em plena juventude e disse-me: 'Meu filho, adora-a como a Devi.' Quando a adoração terminou ela disse: 'Sente-se em seu colo, meu filho, e faça Japa.' Fui tomado de medo, chorei amargamente e disse à Mãe: 'Ó Mãe, Ó Mãe! Mãe do Universo! Que ordem é essa que Tu dás àquele que tomou refúgio absoluto, em Ti? Tem Teu fraco filho o poder de ser tão imprudentemente arrojado?' Mas logo que disse isso, senti como se estivesse tomado por alguma força desconhecida e um vigor extraordinário encheu meu coração. Logo que acabei de me sentar no colo da mulher, pronunciando os Mantras, como hipnotizado, inconsciente do que estava fazendo, mergulhei completamente em Samadhi. Quando retomei à consciência, vi a Brahmani servindo-me com muito cuidado, tentando trazer-me à consciência normal. Ela disse: 'O rito foi completado, meu filho; outros, com muita dificuldade conseguem controlar-se sob tais circunstâncias e então terminam o rito com Japa nominal somente por pouco tempo; mas você perdeu toda a consciência e esteve em Samadhi profundo.' Ao ouvir isso tranquilizei-me e comecei a saudar a Mãe repetidamente, com o coração grato por me ter permitido passar ileso por aquela prova. "Noutra ocasião vi que a Brahmani havia cozinhado peixe no crânio de um cadáver e feito Tarpana. Pediu-me para fazer o mesmo e tomar aquele peixe. Assim o fiz e não senti qualquer aversão. 9. Mas no dia em que a Brahmani trouxe um pedaço de carne em decomposição e pediu-me
que a tocasse com a língua depois do Tarpana, senti aversão e disse: Isso pode ser feito?' Assim indagada, ela respondeu: 'O que há de mal, meu filho? Veja como faço.' Assim, colocou um pedaço em sua boca e disse: 'A aversão não deve ser cultivada,' e colocou, novamente, um pouco diante de mim. Quando a vi agir assim, a idéia da terrível forma Chandika da Mãe Universal surgiu em minha mente e pronunciando repetidamente 'Mãe', entrei em Bhava-samadhi. Não senti então aversão quando a Brahmani colocou o pedaço em minha língua. 10. "Tendo assim me iniciado no Purnabhisheka, a Brahmani ordenou-me fazer, diariamente, os numerosos ritos tântricos. Agora não me recordo de todos os detalhes, mas lembro-me do dia em que pude, pela graça da Mãe, assistir, com perfeita equanimidade, o prazer supremo de um casal de amantes, nada mais vendo do que o maravilhoso jogo do Divino. A mente em vez de descer à vizinhança dos sentimentos humanos comuns elevou-se cada vez mais alto, mergulhando, por fim, em Samadhi profundo. Depois de retomar à consciência normal, ouvi a Brahmani dizer: 'Você alcançou o objetivo desejado de uma Sadhana tântrica muito difícil e estabeleceu-se no estado divino. Esta é a última Sadhana da atitude 'heróica' de adoração.' "Pouco tempo depois fiz a adoração da figura feminina segundo os ritos tântricos, com a ajuda de uma outra Bhairavi, no hall aberto de música do templo, na presença de todos, durante o dia. Quando terminei saudei-a segundo as prescrições dos Sastras. Esse foi o último rito relacionado com a atitude heróica de adoração, que completei daquela maneira. Mesmo que minha atitude mental a respeito de todas as mulheres, isto é, a de um filho para com sua mãe tenha permanecido inalterada durante toda a Sadhana tântrica, assim também jamais pude experimentar uma gota de vinho naquela ocasião. A simples menção da palavra Karana4 (vinho) (4 Em bengali a palavra Karana significa tanto 'causa' como 'vinho'; assim pela lei de associação, a menção de um leva ao pensamento do outro, de vinho à Causa Universal. ) inspirava em mim a experiência da Causa Universal e eu me perdia nela completamente. De forma semelhante, logo que ouvia outras palavras daquele tipo, a Causa do Universo apresentava-Se diante de mim e eu entrava em Samadhi. 11. Um dia, enquanto ainda vivia em Dakshineswar, o Mestre mencionou sua atitude filial em relação a todas as mulheres e contou-nos uma história dos Puranas. A história fala quão firmemente o conhecimento da relação filial com todas as mulheres, sem exceção estabeleceu-se no coração de Ganesha, o chefe dos iluminados. Antes de nos contarem aquela história, não tínhamos muita devoção e reverência por esse Deus barrigudo com cara de elefante, com suor escorregando de suas têmporas. Mas quando ouvimos a história dos lábios santos do Mestre, ficamos convencidos que Ganesha era realmente digno de ser adorado antes de todos os deuses, como de fato o é. A história é como se segue: Um dia Ganesha, com tenra idade, enquanto brincava, vi u um gato em quem, por brincadeira, bateu, feriu e torturou de diversas maneiras. O gato conseguiu fugir com vida. Quando Ganesha se acalmou e foi até sua mãe, viu com surpresa, marcas dê pancada em várias partes do sagrado corpo da Devi. Muito desgostoso em ver aquele estado de sua mãe, o menino perguntou-lhe a razão. A Devi respondeu-lhe tristemente: "Você mesmo é a causa desta minha triste condição!" Mais triste do que surpreso, o dedicado Ganesha disse com lágrimas nos olhos: "Que estranho! Mãe, quando bati na senhora? Não me recordo que Sua criança, ignorante como é, tenha cometido qualquer ato mau pelo qual a senhora tenha que sofrer insultos das mãos de alguém." Parvati Devi, cuja forma externa densa é o universo, disse: "Procure recordar se você bateu em algum ser vivo hoje." "Sim", disse Ganesha, "Eu bati num gato há pouco tempo." Ganesha pensou que o dono do gato havia batido em sua mãe. A mãe de Ganesha tomou o rapaz arrependido em seus braços e consolou-o, dizendo: "Não é assim, meu filho, ninguém bateu em meu corpo; mas fui eu quem assumiu a forma de um gato; é por isso que você está vendo as marcas de suas pancadas em mim. Você agiu assim sem saber; portanto, não se lamente; mas lembre-se, de hoje em diante, que todos os Jivas do mundo que têm forma feminina são partes de mim e os que têm forma masculina são partes de seu pai. Não há outras pessoas ou coisas no mundo a não ser Siva e Sakti." Ganesha teve fé naquelas palavras e guardou-as, como relíquias, no santuário do seu coração. Quando atingiu a idade de se casar, não consentiu em fazê-lo porque assim, teria que se casar com sua mãe. Ganesha permaneceu então um Brahmacharin toda a vida e tornou-se o mais importante entre os seres iluminados, porquanto sempre teve em seu coração a certeza de que o universo era da natureza de Siva e Sakti, Brahman e Seu Poder. 12. Depois dessa narrativa, o Mestre contou-nos a seguinte história que também, revela a grandeza do conhecimento de Ganesha; mostrando certa vez o valioso colar de pedras
preciosas em seu pescoço a Ganesha e Kartika, Parvati Devi disse-lhes: "Darei este colar àquele que andar em volta do Universo, compreendendo os quatorze mundos e voltar para mim, em primeiro lugar." Kartika, Comandante do exército celestial, tendo como veículo um pavão, sorriu com certo desdém, pensando no corpo gordo, pesado e barrigudo do irmão mais velho e na pouca força e no movimento vagaroso do rato, sua montaria, ficando absolutamente certo de que o colar já era seu. Imediatamente começou a fazer a volta em torno do universo. Muito tempo depois da partida de Kartika, o tranqüilo Ganesha deixou seu lugar calmamente e vendo, com os olhos do conhecimento, que o universo era formado de Siva e Sakti, localizado nos corpos de Hara e Parvati, circulou-os de maneira graciosa, adorou-os e sentou-se. Muito tempo depois, Kartika voltou. Então satisfeita com o conhecimento e a devoção de Ganesha, Parvati Devi colocou o colar de pedras preciosas afetuosamente em seu pescoço como símbolo de Sua graça. Assim mencionando a grandeza do conhecimento de Ganesha e sua relação filial com todas as mulheres sem exceção, o Mestre disse: "Minha atitude com as mulheres é a mesma; é por isso que tive a visão da forma maternal da Causa do Universo em minha esposa e adorei-a, inclinando-me a seus pés." 13. Não ouvimos falar de nenhum outro Sadhaka, em qualquer época que, mantendo intacta aquela atitude filial para com todas as mulheres, tenha adotado as disciplinas tântricas segundo as regras prescritas para o modo heróico de adoração. Seguindo essa maneira heróica, os aspirantes têm, ao longo do tempo, tomado uma companheira por ocasião de sua Sadhana. Como não vêem qualquer aspirante da atitude heróica abrir mão dessa prática, as pessoas têm a firme convicção de que a realização do objetivo desejado da disciplina, isto é, alcançar a graça da Mãe Divina, é impossível sem essa prática. Tal idéia conferiu às escrituras conhecidas como Tantras, uma reputação desfavorável. 14. Somente o Mestre, a Encarnação dessa época, veio estabelecer uma nova tradição a esse respeito, quando não manteve a companhia de uma mulher nem mesmo em sonho. Através da prática do Mestre da adoração heróica, apesar de manter a atitude filial para com todas as mulheres, um propósito oculto da Mãe é revelado. 15. O Mestre disse: "Não levei mais de três dias para ser bem sucedido em qualquer das disciplinas. Quando escolhia uma determinada disciplina e pedia importunadamente à Mãe Divina, com ardente ansiedade no coração, para realizar seu objetivo, Ela benignamente coroava-me de sucesso, dentro do curto período de três dias." Está claramente provado que a presença de uma mulher não é auxiliar indispensável para aquelas práticas, porquanto o Mestre foi bem sucedido naquelas disciplinas num período bem curto, sem utilizar uma mulher. Se os Sadhakas vêm fazendo assim, é somente conseqüência da fraqueza e da falta de autocontrole de sua parte. A promessa dos Tantras que, pela prática contínua de seus ritos com uma companheira, um Sadhaka pode eventualmente alcançar o estado divino ou Divyabhava (estado acima da natureza do sexo), é somente uma concessão feita ao homem fraco e um exemplo de catolicidade e cuidado para tornar sua disciplina acessível a todos. Jamais deve ser interpretada como prescrição obrigatória. 16. O objetivo comum a todas as práticas tântricas é dar ao aspirante, através do autocontrole e perseverança, a certeza de que vista, gosto e outras experiências dos sentidos que tentam os seres humanos e acarretam-lhe repetidos nascimentos e mortes, impedindo-o de alcançar o conhecimento pela realização de Deus - nada mais são do que formas verdadeiras de Deus. Levando em consideração as diferenças na capacidade de autocontrole e no grau de certeza alcançado pelos aspirantes, os Tantras lidaram com três tipos diferentes de adoração, a saber: o "animal" ou Pasu, o "heróico" ou Vira e o "divino" ou Divya5 (5 O que se segue é importante para a classificação. Pasu ou o homem de mentalidade animal é aquele que não tem muito autocontrole. Provavelmente sucumbe aos objetos dos sentidos se for exposto a eles. Tem, portanto, que seguir estritamente, a prática da 'virtude enclausurada', isto é, de evitar expor-se aos objetos tentadores dos sentidos. As Sadhanas para ele são baseadas nesse princípio. O Vira ou Sadhaka heróico é aquele cujo poder de autocontrole está altamente desenvolvido, e cuja convicção nos ensinamentos dos Tantras, de que todas as manifestações da natureza - nobres, belas e sublimes, bem como as degradantes, tentadoras, terríficas e repulsivas - são expressões da Mãe Divina é desenvolvido o suficiente para que ele se mantenha impassível mesmo quando exposto a elas. É colocado nessas situações como teste de sua força e não, para sucumbir a elas sob o disfarce de piedade. O Divya ou personagem divino é aquele que provou sua força e visão interior e cuja natureza dos sentidos foi completamente divinizada. Vê Deus em tudo.) e aconselham-nos a adorar Deus adotando o primeiro, o
segundo ou o terceiro modo, de acordo com cada aptidão. Ao longo do tempo as pessoas esqueceram-se quase completamente que as práticas tântricas frutificariam somente se os aspirantes observassem um austero autocontrole, como base daquelas disciplinas. Ao invés, cederam à sensualidade grosseira devido à sua fraqueza, mas sem o conhecimento adequado, as pessoas, contudo, começaram a culpar os Tantras pelos abusos de seus seguidores. O sucesso do Mestre, mesmo mantendo a atitude filial em relação a todas as mulheres através dessas práticas,
foi de grande benefício tanto para os aspirantes sinceros, como para as escrituras tântricas - para os primeiros, ao mostrar-lhes o verdadeiro caminho para alcançarem o objetivo de suas vidas e para as escrituras, mostrando sua verdadeira glória e estabelecendo, firmemente sua autenticidade. 17. Embora o Mestre tenha praticado as disciplinas, segundo os mistérios tântricos durante três ou quatro anos, parece que ele não nos disse qual a ordem em que foram praticadas nem nos deu qualquer relato detalhado a esse respeito. Mas a fim de encorajar-nos no caminho da Sadhana, falou-nos sobre esses eventos em diversas ocasiões e, segundo as necessidades individuais, fez com que alguns raros entre nós fizéssemos aquelas práticas. A Mãe do universo, parece, tornou o Mestre completamente familiarizado com esse caminho naquela época, porque se ele não tivesse tido as experiências incomuns das práticas tântricas, não teria sido capaz de detectar os estados mentais dos devotos, de diferentes naturezas, que vieram a ele, no final de sua vida e de conduzí-los no caminho da Sadhana. Mostramos, em outro lugar (III,1,2), uma pequena indicação de como o Mestre guiou, ao longo dos diversos caminhos de disciplinas, os devotos que vieram a ele e tomaram refúgio a seus pés. Um estudo daquela parte mostrará quão razoável é o que falamos acima. 18. Além de nos falar assim sobre as práticas tântricas, o Mestre às vezes contava muitas de suas visões e experiências. Iremos agora descrever algumas delas. Uma mudança total ocorreu em sua natureza interior por ocasião de sua Sadhana tântrica. 19. Quando disseram-lhe que a Mãe Divina às vezes assumia a forma de um chacal e que o cachorro era o transporte da Bhairava, passou a considerar os restos dos alimentos tomados por esses animais como puros e sagrados e tomou-os, sem hesitar, como Prasad. 20. Oferecendo, como oblações aos pés de lótus da Mãe Divina, seu corpo, sua mente, sua vida e tudo o mais, o Mestre via-se incessantemente penetrado interna e externamente, pelo fogo do conhecimento. 21. O Mestre viu nessa época o despertar da Kundalini prosseguindo até o alto da cabeça. Todos os lótus, do Muladharâ, o centro básico, até o Sahasrara de mil pétalas na cabeça, ergueramse e desabrocharam plenamente. Logo que aconteceu isso, um após o outro, teve experiências estranhas e maravilhosas (III.2). Viu, por exemplo, que um ser celestial e luminoso atravessava o Sushumna, o Canal Central, até aquele lótus subindo e os fazia florescer ao tocá-los com sua língua. 22. Certa vez, quando Swami Vivekananda sentou-se em meditação, apareceu diante dele, um muito grande e maravilhoso triângulo de luz que ele sentiu como se estivesse vivo. Um dia vindo a Dakshineswar, falou ao Mestre a esse respeito e o Mestre disse: "Muito bem, você viu o Brahmayani; enquanto eu praticava Sadhana sob a árvore Vilva também o vi. E o que é mais, observei-o dando à luz a inúmeros mundos a cada momento." 23. Por essa época o Mestre ouviu, surgindo naturalmente e sem cessar, de todos os lugares do universo, o Anahata Dhvani, o grande som Pranava, que é formado de todos os diferentes sons do universo. Alguns entre nós, ouviram do próprio Mestre que naquela época, ele podia compreender a linguagem dos animais. 24. Nesse período, o Mestre viu a Própria Mãe Divina na forma feminina. No final desse tempo o Mestre viu-se diante de poderes miraculosos, como o de tornar-se tão pequeno como o átomo. Um dia foi, a pedido de Hriday, até a Mãe Universal para saber a respeito da propriedade de usá-los e ouviu que deveriam ser rejeitados e descartados como fezes. O Mestre disse que desde então, soava-lhe repugnante ouvir o termo 'poder miraculoso'. 25. Estamos nos recordando de algo a respeito da posse pelo Mestre, dos 'oito poderes miraculosos'. Um dia chamou particularmente Swami Vivekananda ao Panchavati e disse-lhe: "Olhe. Tenho os bem conhecidos 'oito poderes miraculosos.' Há muito tempo, entretanto, decidi que jamais faria uso deles; nem sinto necessidade de usá-los. Você terá muitas coisas a fazer, como pregar religião; decidi dá-los a você; aqui estão." Em resposta o Swami lhe disse: "Senhor, eles me ajudarão de algum modo a realizar Deus?" O Mestre respondeu que não, mas que em certos trabalhos, como pregar religião, poderiam ser úteis. O Swami, portanto, recusou-se a aceitá-los, para a imensa alegria do Mestre. 26. Surgiu na mente do Mestre, nessa época, o desejo de ver o poder de ilusão da Mãe do universo. Em conseqüência viu uma figura feminina de extraordinária beleza surgindo das águas do Ganga e dirigindo-se, com um andar elegante, ao Panchavati. Em seguida, viu que aquela figura estava em adiantado estado de gravidez. Pouco tempo depois ela deu à luz a um lindo menino, em sua presença e logo amamentou-o com muito carinho; viu que a mesma figura assumiu uma forma muito cruel e assustadora. Tomando o bebê em sua boca, mastigou-o e engoliu-o. Depois entrou nas águas do rio do qual havia surgido. 27. Além das visões acima mencionadas, não havia limite para o número de formas da
Devi, desde a de dois braços até a de dez braços, que viu naquele período. Assim também algumas conversaram com ele e instruiram-no. Embora todas aquelas formas da Mãe fossem extraordinariamente belas, disse-nos que não podiam comparar-se à de Sri Rajarajeswari, também chamada Shodasi. O Mestre dizia: "Vi, numa visão, a beleza da pessoa de Shodasi, que se diluía e se espalhava em volta, iluminando todos os lugares." Naquela ocasião o Mestre teve visões de várias formas masculinas como Bhairava e também, dos seres celestiais. Desde a época de sua Sadhana tântrica houve tantas visões extraordinárias e experiências na vida do Mestre dia após dia, que está além de nossa capacidade enumerá-las todas. É desnecessário perder mais tempo mencionando-as. 28. Ouvimos do próprio Mestre que desde a época da Sadhana Tântrica, o orifício de seu Sushumna foi completamente aberto e sua natureza transformada permanentemente na de um menino. Desde a última parte desse período ele não mais pôde conservar a roupa, o cordão sagrado etc., em seu corpo por nenhum momento, apesar de seus esforços. Não sentia onde, nem quando, todas essas coisas caíram. Não é necessário dizer que esse estado era causado pela ausência da consciência do corpo, devido ao fato de sua mente permanecer sempre absorvida nos pés de lótus da Mãe Divina. Soubemos pelo próprio Mestre que, ao contrário dos Paramahamsas comuns, ele jamais foi um monge errante ou andou nu — e que esse estado lhe veio naturalmente com a perda gradual da consciência corpórea. O Mestre dizia que, no final dessas disciplinas, seu conhecimento da não dualidade em relação a todas as coisas aumentou tanto que sentia que tudo aquilo que considerava insignificante desde a infância parecia-lhe agora ser tão puro quanto as coisas mais puras. Afirmava: "As folhas do sagrado basil (Tulasi) e as da Sajna (vara de tambor)6 (6 Hyperanthena moranga.) pareciam-me igualmente sagradas." 29. Assim também o esplendor da pessoa do Mestre aumentou tanto em poucos anos desde aquela época que ele tornou-se o centro de atração, o tempo todo. Como era destituído de egoísmo, orou à Mãe Divina várias ocasiões para libertá-lo daquela beleza celestial e implorando dizia: "Mãe, não tenho a menor necessidade dessa beleza exterior; toma-a em seu lugar e dá-me beleza espiritual interior." Já falamos ao leitor, em outro lugar (III.7,8) que essa sua opção foi atendida mais tarde. 30. Assim como a Brahmani ajudou o Mestre em sua Sadhana Tântrica, assim o Mestre ajudou a Brahmani mais tarde a desenvolver sua vida espiritual. Já demos uma indicação de que, sem a ajuda do Mestre ela não poderia ter se estabelecido no estado divino. O nome da Brahmani era Yogeswari que, o Mestre dizia, era uma parte de Yogamaya (poder místico do Senhor). Alcançando os poderes divinos pela Sadhana Tântrica, o Mestre veio a tomar conhecimento de outra coisa. Soube, pela graça da Mãe Divina, que muitas pessoas viriam até ele nos últimos dias para cumprirem o objetivo de suas vidas, isto é, atingir a iluminação espiritual. Ele falou sobre isso a Hriday e também a Mathur, que era extremamente dedicado a ele. Mathur respondeu: "Ótimo, Pai! Vamos todos nós nos divertir em sua companhia." CAPÍTULO XII O SADHU DE CABELO EMARANHADO E A SADHANA DO MESTRE DE VATSALYA BHAVA ASSUNTOS; 1. As experiências e o comportamento de Mathur. 2. A doação de uma "montanha de alimento". 3. Encontro com Padmalochan. 4. Porque o Mestre fez as Sadhanas Vaishnavas. 5. Aparecimento de estados femininos no Mestre durante certas Sadhanas. 6. A estrutura mental do do Mestre. 7. Ausência de impressões passadas. 8. As nobres qualidades do Mestre. 9. Algumas ilustrações. 10. O serviço de Mathur aos santos. 11. A chegada de Jatadhari a Dakshineswar. 12. Intimidade entre o Mestre e Jata-dhari. 13. O estado de companheira. 14. A Sadhana Vatsalya praticada durante a predominância do estado feminino. 15. Seu extremismo na Sadhana. 16. Controlando os desejos por Sadhakas confirmados. 17. Eles são imperturbáveis. 18. Eles são livres de egoísmo. 19. Todas suas mentalizações correspondem aos fatos. 20. O Mestre e Jatadhari. 21. Jatadhari presenteia o Mestre com a imagem de Ramalala. 22. A ajuda da Brahmani na Sadhana Vatsalya.
1. Sri Yogeswar, a Brahmani, chegou ao templo de Kali depois da morte da Rani Rasmani, no final de 1861. Desde então até 1863, o Mestre aplicou-se, de forma particular, às disciplinas tântricas. Mathur Babu teve o raro privilégio e a bênção de servir o Mestre nos dias em que ele mergulhou nas práticas daquelas disciplinas. Anteriormente, Mathur já havia firmemente se convencido, ao testar o Mestre repetidamente, de seu extraordinário amor a Deus, seu maravilhoso
autocontrole e sua ardente renúncia e desapego. Da mesma maneira suas experiências com o Mestre nesse período de Sadhana Tântrica estabeleceram-no na convicção de que a Devi, seu Ideal Escolhido, havia ficado satisfeita em manifestar-Se a ele na pessoa do Mestre e aceitado seus serviços (III.6) e também, protegê-lo em tudo, acompanhando-o a todos os lugares, manter sua influência e autoridade sobre a propriedade e derramar sobre ele honrarias e reconhecimento, à medida que o tempo passava. Ele assim pensava porque, nessa época, foi bem sucedido no que quer que empreendesse e sentiu a mão protetora do Divino na companhia amiga do Mestre. Por isso não é de se admirar que Mathur tenha gasto prodigamente largas somas de dinheiro, fornecendo os artigos necessários à Sadhana do Mestre e ao serviço de Deus e outros atos virtuosos, segundo os desejos do Mestre. Como a manifestação dos poderes espirituais do Mestre aumentavam dia após dia com as práticas tântricas, Mathur, que havia tomado refúgio a seus pés sagrados, sentiu que seu ardor, sua coragem e sua força aumentavam de forma correspondente. Sua experiência nesse período foi exatamente a de um devoto que, movido pela fé de que a graça e a proteção de Deus estão nele, sente um influxo de força extraordinária e de entusiasmo em seu coração. Mas, de mentalidade mundana como era, com predominância de Rajas, Mathur ficou muito satisfeito em servir o Mestre e praticar atos virtuosos. Jamais desejou penetrar fundo no campo espiritual. Apesar dessa limitação, estava totalmente convencido de que o Mestre era a única fonte de sua força, de sua inteligência e de sua esperança, que somente ele era o esteio e o apoio neste mundo e no próximo e que ele estava na raiz de suas prosperidade mundana e de sua posição exaltada. 2. Os empreendimentos que Mathur levou avante nessa ocasião provaram que agora ele se considerava plenamente seguro em seus negócios mundanos, pela graça do Mestre. Lemos no livro: "A História da Vida de Rani Rasmani", página 236, que Mathuranath realizou uma cerimônia religiosa, muito dispendiosa, chamada Annameru, consistindo de uma "montanha de alimentos" e de outras necessidades, em 1864 em Dakshineswar. Hriday disse que além de uma grande soma de ouro, prata, etc., ele doou aos pundits uma grande quantidade de arroz e de sésamo, nomeando Sahachari, a famosa cantora, para cantar as glórias de Deus e Rajnayan para cantar as canções do Chandi, convertendo durante algum tempo o templo de Kali num festival. Hriday também disse que Mathur viu o Mestre entrar repetidamente em êxtase ao ouvir as canções profundamente devocionais apresentadas por aqueles cantores. De fato tomou os vários graus da reação apreciativa do Mestre como sendo a medida dos talentos deles e assim deu-lhes como recompensa, xales preciosos, sedas e centenas de rupias. 3. Atraído pela humildade e outras virtudes de Padmalochan, o então principal pundit da corte do Maharaja de Burdwan, o Mestre foi vê-lo pouco antes da doação da "montanha de alimentos" feita por Mathur. O Mestre nos disse que Mathur queria muito levar o famoso erudito ao encontro dos Pundits, reunidos durante aquela cerimônia religiosa e fazê-lo aceitar presentes. Sabendo que o Pundit era extremamente dedicado ao Mestre, Mathur enviou-lhe um convite através de Hriday. Mas naquela ocasião Padmalochan não pode aceitar o convite respeitoso de Mathur. Narramos em detalhe, em outra ocasião (III.2), a história de Padmalochan. 4. O Mestre sentiu-se atraído pelas disciplinas das doutrinas Vaishnavas depois de haver realizado as Tântricas. Encontramos, como resultado de nossas pesquisas, algumas razões óbvias para esse fato. Primeiro, a dedicada Bhairavi Brahmani era muito versada nas disciplinas dos Panchabhavas (os cinco estados espirituais), mencionados nas escrituras Vaishnavas e havia passado longos períodos para dominar um ou outro deles. Já mencionamos anteriormente que ela alimentava o Mestre com a mesma atitude espiritual afetuosa com a qual Yasoda costumava alimentar o filho, Gopala. Portanto é provável que ela tenha encorajado o Mestre a fazer as disciplinas das escrituras Vaishnavas. Em segundo lugar era natural que o Mestre, nascido numa família Vaishnava, tivesse amor pelas disciplinas e estados espirituais dos Vaishnavas. Ele havia tido grandes oportunidades para cultivar reverência por aquelas Sadhanas, que prevaleciam em Kamarpukur e vizinhanças. Em terceiro lugar e a razão mais importante contudo, foi que havia no Mestre uma mistura extraordinária das naturezas masculina e feminina. Sob a influência de uma delas, ele parecia ser o mais austero e valoroso dos homens, destemido como um leão, que não sossegava sem investigar tudo até o fundo. Sob a influência da outra, tornava-se possuído por uma maravilhosa natureza feminina, terna mas severa, dedicando-se a ver e a pesar as coisas e as pessoas no mundo por meio de seu coração. Tornava-se, por natureza, profundamente apegado ou desapegado de certas coisas e podia, com facilidade, suportar infortúnios infindáveis quando seu coração respondia, mas ao contrário das pessoas comuns, nada podia fazer quando sentia que não devia.
5. Nos primeiros quatro anos das práticas espirituais, o Mestre não aceitou qualquer coisa ajuda externa e empreendeu as disciplinas das atitudes de Santa (calma), Dasya (servidão) e às vezes também, o de Sakhya (camaradagem) como a de Sridam, Sudama e outros amigos de Krishna em Vraja sendo bem sucedido em todas elas. O leitor talvez se recorde que o Mestre recorreu ao Dasya Bhava e passou algum tempo no mesmo estado de Mahavir, para quem Ramachandra era tão caro como a vida e que teve a visão de Sita, a filha de Janaka, sofredora a vida inteira. Por isso, agora dedicou a mente às disciplinas das duas atitudes mais importantes, a de Vatsalya (amor dos pais) e a de Madhura (amor conjugal), praticadas pelos instrutores Vaishnavas. Nessa época ele se considerava amiga da Mãe Divina, dedicando-se a abaná-La com um Chamara. Vestido com roupas femininas e cercado de senhoras, prestou reverência à Devi durante Seu culto de outono na casa de Mathuranath em Calcutá e devido à sua absorção nos sentimentos femininos, muitas vezes esquecia-se que tinha um corpo masculino (III,7). Quando começamos a visitar os sagrados pés do Mestre em Dakshineswar, muitas vezes víamos sua natureza feminina manifestar-se. Mas na época de que estamos falando, essa natureza não predominava por muito tempo. E não havia necessidade, porque tornou-se fácil para ele, pela graça da Mãe Divina, morar à vontade em qualquer um dos estados, de homem ou de mulher, ou da não-dualidade, fonte de todos os estados. Ele então permanecia, para o bem dos devotos visitantes, em qualquer um desses estados particulares, enquanto o espírito o impelia a fazê-lo. 6. Para avaliar adequadamente a grande importância do seu período de Sadhana, temos que levar em consideração suas grandes qualidades, inerentes por nascimento, a maneira pela qual ele reagia às experiências quotidianas ao longo da vida e a natureza da mudança que nele se operou com a tempestade espiritual que se abateu sobre ele nos últimos oito anos de suas Sadhanas. Ele nos disse que, até sua chegada ao templo de Kali em Dakshineswar em 1855, e ainda durante algum tempo depois, acreditava sinceramente que levaria, como seus ancestrais, a vida de um estrito e virtuoso chefe de família. Como era livre de egoísmo desde o nascimento, jamais lhe passou pela cabeça que era superior a qualquer pessoa a esse respeito ou que possuísse qualidades mais nobres do que as de qualquer um. Mas sua extraordinária especialidade começou a manifestar-se quando penetrou no campo da ação. Sentiu como se um Poder Divino desconhecido o acompanhasse a todo momento, pintando em cores sombrias a transitoriedade e inutilidade das visões, gostos, etc., diante de seus olhos, forçando-o a orientar sua vida para uma direção oposta. Buscador inegoísta da verdade pura, o Mestre logo acostumou-se a viver no mundo sob a inspiração daquele Poder. É claro que lhe teria sido difícil agir dessa maneira se tivesse um forte desejo de possuir qualquer objeto de prazer do mundo. 7. O que dissemos ficará claro se nos recordarmos do comportamento Mestre ao longo de sua vida, em todos os campos. Ele não deu continuidade aos estudos quando compreendeu que o objetivo dos Brahmanas de adquirir conhecimento era somente, "fardo de arroz e plantano", em outras palavras, ganhar dinheiro. Aceitou o cargo de sacerdote, pensando que seria bom tratar dos negócios mundanos; mas logo compreendeu que o objetivo de adorar Deus era algo bem diferente, isto é, vê-Lo e n'Ele viver; logo tornou-se louco para realizá-Lo. Sabia que a realização de Deus dependia de um perfeito autocontrole e embora casado, absteve-se de qualquer relacionamento sexual com sua esposa no corpo, mente e fala. Compreendeu que ninguém pode ter confiança perfeita em Deus se armazenar para uso futuro e imediatamente retirou de sua mente a idéia de guardar até mesmo coisas triviais, para não falar de acumular ouro e outros metais preciosos. Exemplos como esses poderiam ser facilmente multiplicados. Quando consideramos esses fatos, torna-se claro quão pouco sua mente sofreu as influências das tendências diversas enraizadas, que produzem ilusões nas mentes das pessoas. O poder do Mestre de captar idéias e praticá-las era tão forte que nenhuma tendência adversa podia resistir e fazê-lo desviar-se do caminho. 8. Além disso, desde a infância, o Mestre foi um Srutidhara , pessoa de memória retentiva extraordinária, que podia repetir palavra por palavra, na ordem correta, o que havia lido somente uma vez, podendo guardá-lo para sempre. O leitor já conhece como ele em sua infância, juntamente com os amigos, costumava ensaiar nos campos e nas pastagens de Kamarpukur, as canções, Yatras e histórias do Ramayana, do Mahabharata e outros trechos, depois de tê-los ouvido somente uma vez. Vemos, assim, que o Mestre entrou na vida de Sadhaka com três qualidades raras - uma memória com poderes extraordinários, verdade e sinceridade de objetivo que não se detinha sem antes pôr em prática uma idéia ou princípio que tivesse aceito como verdadeiro e desejado pela mente. É difícil para os aspirantes comuns adquirirem essas qualidades na mesma extensão, mesmo depois de uma vida inteira de esforço. Não é, portanto, de se admirar que o Mestre tenha alcançado, em pouco tempo, grande sucesso em sua vida espiritual. Se ficamos admirados em saber que ele foi bem sucedido em cada uma das disciplinas, mesmo em somente
três dias, é porque não compreendíamos nem um pouco sua constituição mental fora do comum. 9. O leitor compreenderá melhor ao mencionarmos alguns acontecimentos da vida do Mestre. No começo de sua prática espiritual, logo que o Mestre discriminou entre o real e o irreal e jogou no Ganga algumas moedas com um punhado de terra, repetindo "rupia-terra, terra-rupia", o apego ao ouro, que penetra até o fundo do coração humano, foi erradicado para sempre de sua mente. Mal havia acabado de limpar com as próprias mãos os lugares abominavelmente sujos, em contato com os quais as pessoas normalmente só se sentiriam limpos e purificados com um banho, sua mente abandonou o egoísmo resultante da consciência de ser um Brahmana de nascimento e ele ficou para sempre convencido de que não era de forma alguma superior àquelas pessoas, consideradas intocáveis pela sociedade. Logo que ficou convencido de que era filho da Divina Mãe e que todas as "mulheres eram partes d'Ela" 1, (1Chandi,11.6 ) foi-lhe impossível considerar qualquer mulher como não sendo a expressão da Própria Mãe Divina, nem pôde pensar em ter qualquer relacionamento conjugal com quem quer que fosse. Quando se pondera sobre esses exemplos, sente-se claramente que o Mestre não poderia ter alcançado tais resultados se não tivesse tido um poder extraordinário de captar as idéias e pô-las em prática. O motivo pelo qual não conseguimos acreditar totalmente nesses acontecimentos da vida do Mestre e ficamos espantados ao ouvi-los, é a ausência total dessas qualidades em nós mesmos. Por exemplo, se olharmos no fundo de nossos corações, vemos que o apego ao ouro não desaparecerá se jogarmos mil vezes n'água moedas e torrões de terra; que o egoísmo de nossa mente não será lavado mesmo se limparmos inúmeras vezes lugares sujos; e que a atitude filial em relação a qualquer mulher não surgirá em nossas mentes no momento crítico, mesmo se nos disserem durante toda a vida a verdade, que a mulher é uma manifestação espiritual da Mãe Divina. Não podemos alcançar os resultados que o Mestre conseguiu nesses assuntos, apesar de nossos esforços, porque nosso poder de compreender as idéias e pô-las em prática é limitado e obstruído pelas impressões de nossos Karmas passados. Entramos no campo da Sadhana com a mente destituída de autocontrole e poder retentivo, contendo todos os tipos de traços adversos. E os resultados obtidos, também, são correspondentemente fracos. É duvidoso que mesmo ao longo de quatro ou cinco séculos venha ao mundo alguém com a mente dotada de poderes tão extraordinários como a do Mestre. É impossível para mentes como as nossas sequer imaginar o quanto ela foi inigualável - como, por natureza, era dotada de total autocontrole e poder retentivo perfeito, como era despida de quaisquer traços malévolos e como seu extraordinário anelo pela visão da Mãe Divina, que retirou até mesmo as preocupações vitais como a de comida e de sono e levou às alturas seu poder natural e visão interior. 10. Já dissemos que o serviço da Mãe Divina no templo de Dakshineswar não foi afetado com a morte da Rani Rasmani. Seu sucessor, Mathur, para quem Sri Ramakrishna era tão caro como a vida, não somente era propenso a dar uma quantia estipulada para Seu serviço, mas generosamente gastava grandes somas eventuais de dinheiro, em cumprimento aos pedidos Mestre. Além de efetuar os serviços das divindades, ele gostava muito de servir os homens santos. Devido aos ensinamentos do Mestre, Mathur, que havia tomado refúgio a seus pés, considerava os homens santos como imagens verdadeiras de Deus. Por isso, quando o Mestre pediu-lhe para dar aos Sadhus artigos de uso diário como roupas, cobertores, jarros e outros, além de comida, Mathur comprou-os e armazenou-os num aposento para que pudessem estar disponíveis para serem distribuídos aos homens santos, a qualquer momento, na quantidade que lhes satisfizesse. Disse aos funcionários que os artigos no novo depósito deveriam ser distribuídos segundo as ordens do Mestre. Assim também, quando logo depois veio a saber que o Mestre desejava servir os devotos de todas os credos, dando-lhes artigos úteis para suas práticas espirituais, Mathur também tomou as devidas providências (III,2). Todas essas doações foram feitas provavelmente em 1862-3, quando a maravilhosa hospitalidade do templo de Kali da Rani Rasmani tornou-se bem conhecida em todas as partes, entre os Sadhus. Embora mesmo durante a vida da Rani o templo de Kali fosse considerado pelos peregrinos em viagem, como um lugar de descanso, a caminho de seus destinos, agora sua reputação espalhou-se por regiões afastada e os devotos monges, os principais de todas as crenças, vieram em grande número. Satisfeitos com a hospitalidade a eles dada, seguiam seu caminho, abençoando o administrador pelos serviços prestados com tanta dedicação. Já relatamos em outro lugar tudo o que o próprio Mestre nos falou dos importantes homens santos que vieram assim. Mencionamos novamente aqui somente porque queremos contar ao leitor a respeito da chegada a Dakshineswar de um santo da seita de Ramawat, chamado "Jatadhari", por quem o Mestre foi iniciado no Mantra de Rama e de quem recebeu a imagem do Menino Rama chamado "Ramalala." Foi provavelmente em 1864 que ele veio até o Mestre. 11. Em diversas ocasiões ouvimos do próprio Mestre a respeito do amor e do apego
extraordinários de Jatadhari a Ramachandra. A imagem do Menino Ramachandra era-lhe muito querida. Mesmo antes de chegar a Dakshineswar, a longa e dedicada adoração daquela imagem o havia levado a um estado de amor divino e introversão que o permitiram realmente ter a visão de Rama como uma criança luminosa, aceitando todos seus serviços, santificados pela intensa devoção. A princípio aquela visão aparecia diante dele por um momento, de vez em quando, fazendo-o transbordar de felicidade. Mas à medida que ele avançava na Sadhana, com o passar do tempo, a visão tornava-se mais intensa e contínua por longos períodos, até que por fim, ela se tornou tão vívida e contínua como os objetos dos olhos são. Assim estabelecido em contemplação espiritual amorosa, ele teve o Menino Rama quase como companheiro constante. Empenhando-se diariamente no serviço daquela imagem de Ramalala, por meio da qual conseguiria realizar aquela visão divina em sua vida, Jatadhari viajou pelos diversos lugares de peregrinação na Índia e chegou ao templo de Kali em Dakshineswar. 12. Embora empenhando-se de todo o coração no serviço de Ramalala, como presença viva, Jatadhari não contou a ninguém o segredo de que possuía o privilégio de ter de vez em quando a forma do Menino Rama, a personificação do amor. As pessoas somente viam que ele servia diariamente a imagem mental de uma criança, com extraordinária constância. Sabiam disso e nada mais. Mas a visão interior do Mestre, o senhor imaculado do campo dos estados espirituais, rompeu a densa cortina exterior desde o primeiro encontro com Jatadhari e desvendou o escondido mistério interior. Por isso ele tinha grande respeito por aquele monge e com satisfação o supria de todos os artigos necessários para o serviço de Ramalala. Além disso, o Mestre passava diariamente com ele muitas horas e, com devoção, observava seu serviço a Ramalala. O Mestre assim fez porque ele, como já dissemos em outro lugar (IV,2) tinha a visão divina da forma celestial de Rama, a personificação do amor espiritual que Jatadhari também costumava ter. Em conseqüência o relacionamento do Mestre com Jatadhari gradualmente tornou-se íntimo e respeitoso. 13. Já mencionamos que o Mestre passou algum tempo em estado de mulher para satisfazer a necessidade de desenvolver aquele aspecto de sua personalidade dual. Considerando-se eterna companheira da Mãe Universal, aplicou-se totalmente, por um período relativamente longo, a Seu serviço. Adornava-A enfeitava-A com grinaldas de flores feitas por suas próprias mãos e com jóias de ouro, arranjados por Mathur a seu pedido, abanava-A com um Chamara para refrescá-La e cantava e dançava diante d'Ela vestindo roupa feminina para agradá-La. É desnecessário dizer que o Mestre empenhou-se em fazer tudo isso porque surgiu e sua mente uma forte necessidade de fazê-lo. 14. O amor e a devoção do Mestre por Rama reviveu na companhia de Jatadhari. A forma que agora ele via na imagem, sob o impulso despertado, foi a do Menino Rama, personificação do amor espiritual. Portanto não é de se admirar que sua mente estivesse agora preenchida de afeição maternal por aquela Criança divina. O Mestre começou a sentir por ela o amor e a atração maravilhosa que a mãe sente por seu filhinho. Somente aquele amor e atração, sem dúvida, fizeram o Mestre sentar-se agora, ao lado da imagem infantil de Ramalala e olhá-la tão fixamente que não tinha consciência do tempo transcorrido. Devido às diversas e alegres travessuras infantis, o Mestre dizia que, o extraordinário e brilhante Menino Luminoso fazia-o esquecer-se de tudo o mais, tentando prendê-lo diariamente a seu lado, espreitando-o ansiosamente quando ele saía e acompanhava-o a todos os tempos, apesar de seu pedido para que não o fizesse. 15. A mente ativa do Mestre não podia deixar qualquer trabalho pela metade. Isso foi verdadeiro com os assuntos do mundo exterior e também, com o campo ideal do espírito. Foi visto que, se qualquer idéia surgisse espontaneamente em seu coração, não sossegava enquanto não alcançasse seus últimos limites. Ao estudarem esta faceta de sua natureza, alguns leitores poderão pensar: "Mas isso é bom? Será benéfico para um homem perseguir qualquer e toda idéia que possa surgir em sua mente a qualquer hora e tornar-se instrumento em suas mãos?" Apesar dessa natureza do Mestre não o deixar desviar-se do caminho, isto não deve ser imitado pelas pessoas em geral, porquanto todas as idéias, boa ou más, surgem nas mentes da humanidade fraca. Os homens jamais devem ter essa fé em si mesmos a ponto de acreditar que somente idéias boas surgirão em sua mente. Por isso deve ser o objetivo do homem controlar seus desejos. Sem dúvida é um argumento razoável, mas há outro lado, sobre o qual temos algo mais a dizer. 16. Não podemos negar que a mente de uma pessoa, ávida de sexo e ouro, aos quais está totalmente presa, não deve depositar tanta confiança em si mesma. Por isso somente os ignorantes, aqueles de visão curta, podem questionar a necessidade de se controlar os desejos. Mas, em alguns raros Sadhakas, os Vedas e outras escrituras dizem que o autocontrole vem pela graça de Deus, como uma função normal, como a respiração. Por isso, completamente livres de atração pela luxúria e pelo ouro, suas mentes convertem-se em repositórios somente de idéias
boas e salutares. O Mestre também dizia que nenhum desejo mau, pela graça da Mãe Divina levanta a cabeça e controla a mente de um homem que tomou perfeito refúgio n'Ela. Ele dizia: "A Mãe não lhe permite dar um passo em falso." O homem que atingiu esse estado pode confiar perfeitamente em cada impulso seu; então isso não lhe faz qualquer mal, mas torna-se também uma fonte de imenso bem para os outros, porque passa a ser absolutamente impossível àquele homem procurar seu próprio interesse naquele estado, pois o pequeno "eu", que nasceu da identificação com o corpo, que produz egoísmo e que permanece sempre insatisfeito com os prazeres do mundo, está fundido para sempre no "Eu" de Deus, que tudo penetra. Por isso, a vontade de Deus, cuja natureza é fazer bem a todos, manifesta-se então com diversos desejos na mente daquele homem para o bem-estar universal. Ou o Sadhaka, naquele estado, sempre sente no fundo do coração, "Eu sou a máquina e Tu és o maquinista"; e estando certo de que o que surge como desejos em sua própria mente, brota da vontade de Deus, a Pessoa que Tudo penetra e ele não hesita em agir segundo a força dos desejos. A prova dessas ações inspiradas é que elas sempre trazem grandes benefícios para os outros. Esses estados aparecem muito cedo nas vidas de almas de grandeza incomum, como o Mestre. Portanto essas grandes almas, como lemos em suas biografias, confiam integralmente nas tendências de suas mentes e muitas vezes agem de acordo com elas sem parar para refletir ou encontrar razão para isso. Mantendo suas pequena vontades identificadas com a grande Vontade Universal, sempre podem detectar e compreender tudo além das mentes e intelectos das pessoas comuns, pois as idéias que surgem de suas mentes são verdades eternas que existem em estado sutil na Mente Universal. 17. Assim também, essas grandes almas, embora unas com a humanidade normal, distinguem-se das outras por sua absoluta dependência da Vontade Universal e sua libertação do medo e da busca de interesse próprio. Assim, ao contrário das pessoas comuns, são muitas vezes vistas cooperando em circunstâncias e atividades que causam sua própria destruição, apesar de conhecerem de antemão as conseqüências nefastas dessa cooperação. Não somente não demonstram aversão a elas, como lhe dão boas vindas. O leitor compreenderá o que queremos dizer se dermos alguns exemplos. Consciente do inevitável banimento de Sita, Rama enviou-a para a floresta, embora soubesse que ela era inocente. Ainda que soubesse que o abandono de Lashmana, que lhe era mais querido do que sua vida, inevitavelmente terminasse Seu Lila como ser humano, ele continuou até o fim. Sabendo de antemão que a raça dos Yadus, a qual ele pertencia, seria destruída, Krishna não fez a menor tentativa para impedi-la. Ao contrário, agiu de maneira a que se realizasse no tempo certo. Assim também, tendo como certo que encontraria a morte nas mãos de um caçador, escondeu cuidadosamente seu corpo atrás de uma árvore e conservou os dois pés avermelhados balançando de tal modo que, assim que o caçador os viu, confundiu-os com um passarinho e atirou sua flecha. Então Ele abençoou o caçador que estava arrependido de seu engano e deixou o corpo. Embora já soubesse que atingiria Parinirvana, ou o estado sem corpo no final de sua beatitude, se aceitasse a hospitalidade de Chandala, Buda aceitou-o e ascendeu àquele estado, protegendo o Chandala com sua bênção e consolo, contra o ódio e reprovação dos outros. Também, consciente de que a religião pregada por ele logo seria poluída, se aprovasse a iniciação das mulheres em Sannyasa, ele permitiu que a venerável Gautami, sua tia, fosse iniciada. Embora sabendo que Judas o trairia com seus inimigos, que poriam fim à sua vida, Jesus, outra Encarnação de Deus, sempre permaneceu afeiçoado a ele. 18. Encontramos muitos desses eventos até na vida de pessoas perfeitas, liberadas em vida, para não falar nas Encarnações de Deus. Ao tentarmos conciliar essas expressões incomuns de esforço pessoal, tão freqüentemente visto na vida dos grandes homens, com a teoria de sua absoluta dependência na Vontade Universal, inevitavelmente concluímos que seus esforços pessoais nada mais são que manifestações dessa mesma Vontade que tudo penetra. É claro, portanto, que todas as impressões egoístas nas mentes dessas pessoas que dependem absolutamente da vontade de Deus, são destruídas de uma vez por todas; suas mentes ascendem a um plano de consciência sagrado, onde somente desejos puros, absolutamente não tocados pelo egoísmo, surgem nelas. Assim, livremente depositando a fé nos desejos de Sua mente e agindo sob seus impulsos, esses Sadhakas, naquele estado, não incorrem em qualquer censura. Não se pode deixar de dizer que tais atos do Mestre não devem ser imitados por pessoas comuns. Mas os Sadhakas, no estado ímpar acima mencionado, serão bastante iluminados por eles na condução de suas vidas. As escrituras compararam seus desejos, como comer, beber etc., necessários à preservação da vida, a sementes fritas. Assim como as sementes tostadas das árvores, trepadeiras etc., perdem o poder vital e não podem germinar, assim os desejos daquelas pessoas, tostados no fogo do autocontrole e do conhecimento divino não podem mais atraí-las ao prazer e desviá-las. O Mestre
também comentou a esse respeito da seguinte maneira: "Entrando em contato com a pedra filosofal, a espada de aço transforma-se em ouro; mantém inalterada sua formidável forma, mas não pode mais ferir." 19. Os videntes dos Upanishads dizem que todos os processos mortais dos Sadhakas, naquele estado correspondem a fatos. Em outras palavras, todas as idéias que surgem naturalmente em suas mentes provam ser objetivamente verdadeiras e jamais ao contrário. Jamais poderíamos ter acreditado nas palavras acima mencionadas dos videntes, se não tivéssemos, repetidas vezes, testado as idéias do Mestre, estabelecido em Bhavamukha e as tivéssemos achado verdadeiras. Se ele hesitasse comer qualquer alimento, verificava-se depois que o alimento havia sido contaminado anteriormente. Se ele sentisse que seu poder de falar falhasse subitamente quando estava prestes a dar um conselho sobre assunto espiritual a alguém, ficava provado que a referida pessoa, na verdade, estava completamente despreparada para isso. Se ele sentisse que determinada pessoa não realizaria verdades religiosas, ou realizaria somente algumas em sua vida, isso realmente ocorria. Quando determinado estado ou a forma especial de uma divindade aparecesse em sua mente, ao ver certa pessoa, sabia-se que ela era um Sadhaka daquele estado, ou que adorava aquela divindade. Se subitamente dissesse algo a alguém sob influência de um estado interior, aquela pessoa obtinha mais luz e sua vida mudava completamente. Inúmeros incidentes desse tipo podem ser citados. 20. Impulsionado por aquele estado devocional interno irresistível, o Mestre, como costumava fazer antes, olhava-se agora como mulher tanto no corpo como na mente e agia de acordo. Assim quando teve a visão de Rama, como um meigo menino, assumiu a atitude de afeição maternal por Ele. Sem dúvida havia sido iniciado no Mantra de Rama há muito tempo atrás para fazer de forma correta a adoração e o serviço da divindade Raghuvir; mas então não estava atraído para Ele em outro estado a não ser o de servo para seu Amo. Tomado pelo estado mencionado com a Divindade, ficou agora ansioso para ser iniciado por um Guru, de acordo com as escrituras com o Mantra adequado a esse novo estado e atingir o limite último de realização naquela disciplina. Perfeito no Mantra da Divina Criança, Jatadhari veio a tomar conhecimento da ansiedade do Mestre e, com alegria, iniciou-o no Mantra de seu próprio Ideal Escolhido. Mergulhado na Sadhana daquele Mantra da maneira ensinada por ele, o Mestre foi bem sucedido no decorrer de somente alguns dias, a ter a visão do Menino Rama. Absorvido na meditação daquela forma divina, na atitude de afeição maternal, logo chegou à realização: "Rama, que é filho de Dasaratha, está em todo ser; o mesmo Rama é imanente no universo e contudo o transcende." Isto quer dizer que Rama não somente é filho de Dasaratha, mas também existe como Jiva em cada corpo. Assim também, penetrando o Universo e eternamente manifestando-se como ele, Ele está sempre existindo em Sua própria natureza sem atributos, destituída de Maya e além de tudo no universo, Ouvimos o Mestre recitando, em diversas ocasiões, os versos Hindi acima referidos. 21. Além de iniciar o Mestre no Mantra, Jatadhari, antes de ir-se embora, deu de presente ao Mestre a imagem de Ramlala, a quem ele havia servido durante tanto tempo com devoção exclusiva. Pois aquela imagem viva expressou a Jatadhari seu desejo de viver dali para frente com o Mestre. Já descrevemos em outro lugar (IV.2) em detalhes, a extraordinária Lila daquela imagem com o Mestre e Jatadhari. Portanto é desnecessário tratar deste assunto aqui. 22. Quando o Mestre dedicou sua mente, da maneira supracitada, para aumentar sua devoção Vatsalya e experimentar a realização final, a Bhairavi Brahmani estava em Dakshineswar. O próprio Mestre contou-nos que ela era altamente experiente nas disciplinas dos Panchabhavas mencionados nos livros Vaishanavas, quanto era nos Tantras. Será que o Mestre recebeu qualquer ajuda especial dela enquanto praticava as Bhavas Vatsalya e Madhura? Não ouvimos dele nada a esse respeito mas o Mestre e Hriday disseram-nos que, estabelecida na atitude de afeição maternal com Deus, a Brahmani tratava o Mestre como Gopala, o Menino Krishna. Portanto deduz-se que o Mestre recebeu pelo menos alguma ajuda dela, tanto na época em que adotou o estado de afeição maternal com o Menino Rama e teve a experiência final naquele estado, como quando praticou a Madhura Bhava, o estado doce, no qual ele adotou a atitude de uma mulher para com seu amante. Pode-se duvidar se ele realmente recebeu dela alguma ajuda em particular; mas admite-se, sem dúvida, que um forte desejo de praticar as disciplinas daquelas atitudes surgiu em sua mente quando viu a Brahmani envolvida neles, enaltecendo-os. CAPÍTULO XIII ESSÊNCIA DA MADHURA BHAVA (A ATITUDE DOCE) ASSUNTOS; 1. A luta interna do aspirante. 2. Nirvikalpa Samadhi e Satlhakas extraordinários. 3. Sunya e
Purna, a mesma coisa. 4. A natureza da Não-Dualidade. 5. As cinco atitudes e a realização de Deus. 6. Como essas atitudes ajudam o homem a progredir. 7. O amor e a personalidade de Deus. 8. O amor e a erradicação da consciência do poder. 9. Auto-suficiência de cada atitude. 10. Atingimento da Não-Dualidade por meio das atitudes. 11. Sadhanas dos diferentes estados em épocas diferentes. 1 2 . Evolução dos cinco estados na Índia e no exterior. 13. Indicação da profundidade das atitudes. 14 . Exclusividade do sucesso do Mestre em todas as atitudes. 15. Falta de registro sobre as práticas espirituais dos gigantes do passado. 16. Provas. 17. Madhura Bhava e os instrutores Vaishnavas. 18. Sobre a historicidade da Lila em Vridavan. 19. O que o Mestre disse a esse respeito. 20. Chaitanya e Madhura Bhava. 21. Chaitanya e as condições espirituais contemporâneas. 22. O ponto principal do Madhura Bhava. 23. Amor a Deus como o de um amante. 24. Madhura Bhava como sendo mais do que um conjunto de todos os outros estados. 25. O serviço de Chaitanya através do Madhura Bhava. 26. Os Vedantistas e o Madhura Bhava. 27. Madhura Bhava e o estado amoroso de Radha.
1. É muito difícil para quem não seja um Sadhaka, entender o espírito das ações e experiências dos Sadhakas e chegar a um conhecimento adequado, porque trata-se de um assunto do espírito, fora do campo dos densos e ilusórios objetos dos sentidos. Aí a sequência de tempo, que se refere aos acontecimentos e objetos da vida sensória, deixa de ter qualquer significado. Assim, os esforços frenéticos da vida competitiva, que nascem dá natureza inferior do homem, mas erroneamente interpretados como grandeza e heroísmo pelas pessoas mundanas não têm relevância. As únicas entidades significantes são a mente do aspirante e as infindáveis correntes de impressões aí armazenadas pelas experiências das vidas passadas. A atração para ideais elevados e para um objetivo final, nascida da insatisfação gerada pelos conflitos da vida exterior, é o fator principal. Há também a presença consequente da luta contra as Impressões adversas do passado lutas que engendram um poder daqueles esforços para superá-las. Também a vida de um Sadhaka é caracterizada pela tentativa resoluta de mergulhar cada vez mais profundamente em sua própria personalidade, ao voltar a mente para dentro de si mesma, longe dos sentidos. Escavando, por assim dizer, as camadas cada vez mais profundas do mundo interior, o Sadhaka experimenta campos de idéias cada vez mais profundos até que atinge o Campo de sua existência e permanece uno com ele - a imutável Realidade sem segundo, destituída de som, tato e forma e da qual todas as idéias, inclusive o sentido do Eu, brotam e têm seu ser. Essa é a experiência do Samadhi. Se as impressões sutis da mente não forem completamente erradicadas, um traço de ignorância ainda é deixado e consequentemente, o Sadhaka desce do Samadhi para experimentar novamente o mundo exterior, revertendo o processo através do qual atingiu o conhecimento imediato da Realidade não-dual. Assim, a mente do aspirante continua a descer, da consciência supraconsciente à normal e novamente eleva-se à supraconsciente, repetidamente. 2. A história do mundo espiritual, desde os tempos mais antigos até os dias presentes, também relata a descrição de algumas mentes, cujo estado natural parece ser o plano supraconsciente, mas que de algum modo mantiveram-se forçosamente confinadas, por algum tempo, ao plano do mundo exterior, para o bem da humanidade. Quanto mais estudarmos a história das lutas espirituais de Sri Ramakrishna, mais compreenderemos que sua mente pertenceu a essa classe. Se os leitores, com o estudo deste livro, não ficarem convencidos, foi devido à deficiência do autor, porque o Mestre dizia-nos repetidamente: "Agarrava-me forçosamente a um ou dois desejos banais, com a ajuda dos quais mantinha a mente voltada para baixo, por causa de todos vocês; senão uma inclinação natural era a de permanecer unida e identificada com o Uno indivisível." 3. Alguns dos antigos videntes descreveram a Realidade não-dual indivisível experimentada em Samadhi como o 'Vazio' (Sunya, o grande Vazio do Ser) e outros como o 'Pleno' (Purna, a Plenitude do Ser). De fato ambos implicam na mesma experiência. Porque descreveram-n'A como 'O Uno do qual todas as coisas vêm a ser e ao qual se unem.' A Realidade, que foi chamada por Buda como o "Vazio"(Sunya), na qual todos os seres extinguem-se, foi descrita por Sankara como o "Pleno", (Purna), que constitui o substratum não modificado de todos eles. Se deixarmos de lado as opiniões dos últimos instrutores budistas e estudarmos Buda e Sankara, sem dúvida chegaremos a essa conclusão. 4. O plano da consciência não-dual, contido nos conceitos de "Vazio" e de "Pleno" foi descrito nos Upanishads ou Vedanta como o estado além de toda ideação, pois perfeitamente estabelecido nele, a mente do aspirante transcende os limites de todos os outros planos de consciência, produzidos pelo jogo de criação, preservação e dissolução de Deus e funde-se na homogeneidade. Por essa razão o estado não-dual de consciência é algo não relacional, diferente das cinco atitudes, Santa, Dasya, etc., com a ajuda das quais a limitada mente humana entra no campo espiritual e une-se a Deus numa relação eterna. Somente quando o homem se torna absolutamente indiferente a todo tipo de prazer desse mundo ou do outro, e atinge pela força da
pureza, uma posição mais elevada do que os deuses, entra no estado não-dual. Com essa ajuda realiza Brahman sem atributos, no qual todo o Universo juntamente com Deus, seu criador, preservador, criador e destruidor, tem seu eterno ser e ao alcançá-lo, atinge o ápice da vida. 5. Deixando de lado o estado não-dual e Brahman sem atributos, atingível com o auxílio desse estado, encontramos os aspirantes dos cultos de Bhakti falando da manifestação das "cinco atitudes" (Panchabhava) a saber, Santa (atitude plácida), Dasya (atitude de um servo), Sakhya (atitude de camaradagem), Vatsalya (atitude de pais) e Madhura (atitude conjugal). O objeto a ser alcançado por cada uma é Brahman com atributos ou Isvara, que tudo controla, todo poderoso e por natureza eternamente puro, desperto e livre. O aspirante procura conhecê-lo "através da relação correspondente a uma ou outra dessas atitudes que ele assume e Ele, o Senhor, que é o controlador interno de todos os seres e repositório de todos os estados, vê a devoção integral do aspirante e para ajudá-lo a desenvolver a atitude, revela-Se a ele, na forma apropriada e assim o abençoa. É dessa maneira que Deus, que é consciência pura, assume nas diferentes épocas, várias formas que são as personificações desses diferentes estados. Ele, lemos nas escrituras, encarna-Se como homem para satisfazer os desejos de Seus devotos. 6. As cinco atitudes são as formas sutis e purificadas das relações mundanas pelas quais os seres humanos estão ligados uns aos outros em sua vida diária. Somos conscientes das relações particulares com pai, mãe, marido, esposa, amigo, amiga, senhor, servo, filho, filha, rei, súdito, instrutor, discípulo e assim por diante e sentimos também que, à exceção dos inimigos, devemos comportar-nos com todas as outras pessoas, de maneira calma e respeitosa. Os instrutores de Bhakti classificaram essas relações nas cinco divisões de Santa e o restante, mencionadas acima, e aconselhavam as pessoas a adotar uma ou outra dessas atitudes para a prática, a fim de estabelecerem um relacionamento amoroso com o Divino. Porque é mais fácil para os Jivas tentarem conhecer Deus com a ajuda dessas cinco atitudes, cuja natureza já lhes é conhecida em seus relacionamentos mundanos. Isso não é tudo. Aquelas atitudes que, enquanto baseadas nas relações mundanas enraizadas em desejos, produzem somente aversão, apego e várias outras modificações similares e impelem os homens a cometerem ações más, entretanto, quando orientadas para Deus, ajudam os aspirantes a alcançarem a realização de Deus por sua força original irresistível, sem corrupção mundana. Tome-se, por exemplo, a luxúria, doença, por assim dizer, do coração e causa de toda infelicidade mas quando direcionada para Deus, manifesta-se como desejo pela visão de Deus. A raiva do aspirante será agora direcionada contra as pessoas e as coisas que são obstáculos no caminho daquela visão. Agora ficará louco e enfatuado com o desfrutar da maravilhosa beleza e amor de Deus. Notando o esplendor ímpar de espiritualidade nas pessoas que conseguiram alcançar a visão sagrada de Deus, auge da felicidade, agora ele ficará ansioso para tê-la. 7. Não podemos dizer com certeza que os ensinamentos a respeito dessas cinco atitudes de relacionamento amoroso com Deus foram dados por um determinado instrutor numa determinada época. Mas muitas almas grandes apareceram na Índia, a grande hermida do mundo, em épocas diferentes e empenharam-se em práticas para a realização de Deus, por meio de uma, duas ou mais atitudes e, ao se tornarem íntimas d'Ele através de Seu amor extraordinário, ensinaram os homens a fazer o mesmo. Quando estudamos as vidas ímpares desses instrutores, fica claro que somente o amor de Deus está na raiz das Sadhanas daquelas atitudes e que o referido amor tem sempre como objeto, uma ou outra das numerosas expressões do aspecto pessoal de Deus, pois, enquanto um homem não experimenta a Realidade-não dual, estará sempre ligado somente à concepção e experiência de Deus como Pessoa. 8. Ao estudarmos o desenvolvimento do amor entre dois amantes, vemos como ele elimina a distância e a diferença entre os respectivos poderes e posições em sua situação mundana. De maneira semelhante, o amor remove, aos poucos, da mente do aspirante empenhado na Sadhana de qualquer uma dessas atitudes, sua consciência dos poderes ilimitados de Deus e o ensina a olhar Deus somente como seu bem-amado, segundo sua atitude particular. Portanto, o aspirante que trilha esse caminho torna-O seu muito íntimo por meio do amor e, de forma alguma hesita em pedir, importuná-Lo ou até mesmo censurá-Lo, devido ao seu sentimento de intimidade amorosa com Ele. Quanto mais a prática de uma dessas atitudes permitir ao aspirante esquecer os poderes de Deus e experimentar somente Seu amor e doçura, mais exaltada ela é considerada nessa Sadhana de atitudes. É somente desse ponto de vista que os instrutores de Bhakti atribuiram superioridade ou inferioridade a cada uma dessas atitudes e deram o lugar mais elevado à Madhura Bhava; e cada uma delas seria, como aqueles instrutores admitiram unanimemente, capaz de fazer o aspirante realizar Deus. 9. Sabe-se pelo estudo da história das religiões que, com o desenvolvimento final de qualquer
uma dessas atitudes, o aspirante esquece-se de si mesmo e sente-se feliz quando o objeto de seu amor está feliz. Absorvido no pensamento d'Ele durante a separação, às vezes perde mesmo a consciência de sua própria existência. Do estudo dos livros devocionais, como o Bhagavata, vê-se que não somente as Gopis de Vraja esqueceram-se de sua existência, mas realmente, em algumas ocasiões, identificaram-se com seu bem-amado Krishna. É bem conhecido dos livros devocionais cristãos que, absorvidos na Paixão de Cristo, alguns místicos suportaram os estigmas e sangraram pelas marcas em seu corpo.1 (1 Vide vidas de São Francisco de Assis e de Santa Catarina de Sienna. ) Vemos, portanto, que com o desenvolvimento final de cada uma das atitudes, o aspirante fica absorvido no pensamento de seu objeto de amor e unido e identificado com Ele sob o forte impulso do amor, realiza o estado não-dual de consciência. A vida ímpar de luta espiritual de Sri Ramakrishna lançou uma luz maravilhosa sobre esse assunto. Ele praticou cada uma dessas atitudes do amor espiritual e em cada uma mergulhou no objeto de seu amor. Esquecendo-se completamente de sua própria existência, realizou a Realidade não-dual. Como, pergunta-se, pode a mente humana experimentar, com a ajuda dessas cinco atitudes, a Realidade não-dual, que está além de todos os estados? Pois nenhuma atitude pode levantar-se, existir ou desenvolver-se na mente humana sem a consciência de duas pessoas. 10. É verdade. Mas quanto mais uma atitude se desenvolve, mais ela estende sua própria influência e remove gradualmente todas as idéias contrárias da mente do aspirante. Assim também, quando completamente desenvolvida, a mente concentrada do aspirante, às vezes em meditação, esquece-se do "eu" (servo) e do "Tu" (o Amo) e também, o relacionamento entre eles e permanece perfeitamente identificada através do amor com a Realidade simbolizada pela palavra Tu. A mente humana, dizem os eminentes instrutores da Índia, não está ao mesmo tempo consciente do eu e do Tu relacionamento amoroso entre eles. Conhece a entidade simbolizada pela palavra "Tu", num dado momento e pela palavra "eu" no momento seguinte, mas como a mente oscila rapidamente entre as idéias dessas duas entidades, desenvolve-se nela a idéia de uma relação entre elas. Parece então ser simultaneamente consciente dessas duas entidades e da relação entre elas. Mas quando o desassossego da mente é destruído pela influência da atitude madura do amor, gradualmente é capaz de detectar o que foi dito acima. Quanto mais o funcionamento da mente é tranqüilizado por ocasião da meditação, mais compreende, aos poucos, que viu a Realidade não-dual de dois ângulos de visão e confundiu-A com duas entidades independentes. 11. Ficamos simplesmente admirados ao pensar quanto tempo e que esforços sobrehumanos de inúmeros aspirantes foram necessários para o completo desenvolvimento de cada uma das atitudes pelas quais a mente humana foi capaz de realizar a Realidade não-dual. Ao estudarmos a história das religiões, conforme as escrituras, fica claro que uma determinada atitude tornou-se o principal apoio da mente humana durante a meditação numa determinada época e com a ajuda dela muitos aspirantes eminentes daquele período, realizaram Deus e alguns raros alcançaram o conhecimento imediato da Realidade não-dual de Brahman. Nos períodos Védico e Budista encontramos a predominância da atitude Santa culminando na experiência da Nãodualidade. As atitudes Dasya e Apatya 2 (2 Apatya, isto é, a atitude de considerar Deus como pai ou como mãe. Aqui, como pai.) prevaleceram na época upanishádica. As atitudes Santa e Dasya, misturadas com a ação sem motivo são a principal característica do período épico. A mistura de Apatya com Madhura parcial é observada na época tântrica e as atitudes Sakhya, Vatsalya e Madhura são vistas florescerem com toda exuberância no período Vaishnava. 12. Na história religiosa da Índia encontramos estas cinco atitudes totalmente desenvolvidas e florescendo lado a lado com a experiência da consciência não-dual. Mas isso não ocorreu nas comunidades religiosas em outras partes do mundo. Entre elas somente as atitudes Santa, Dasya e Apatya floresceram. Embora as canções do Rei Salomão, o sábio real, expressando as atitudes doce e de amigo em relação a Deus estejam intactas nas comunidades judia, cristã e muçulmana, os membros dessas comunidades são incapazes de compreender a importância dessas canções e dão-lhes um significado diferente. As atitudes de Sakhya e Madhura, é desnecessário dizer, ainda sobrevivem em grande escala na comunidade Sufi que professa o Islamismo, embora a maioria dos muçulmanos encarem essa adoração de Deus contrária aos preceitos do Corão. Assim também, a comunidade cristã católica apesar de render homenagem a Maria, mãe de Cristo, está longe de reconhecer a Maternidade de Deus. Portanto não foi tão proveitosa como a adoração da Mãe Universal existente na Índia, pois não permitiu ao aspirante realizar o indivisível Existência-Conhecimento-Felicidade absolutos e experimentar a manifestação divina em todas as mulheres sem exceção. A corrente da idéia da Maternidade de Deus desapareceu na metade do caminho, como o rio Phalgu. 3 (3 Rio semi-místico.)
13. Quando a mente do aspirante é atraída para Deus, a ajuda de alguma atitude de amor, torna-se, como já dissemos anteriormente, gradualmente absorvida naquela atitude, desvia-se do mundo exterior e funde-se no Ser. No momento em que a mente se funde, suas impressões passadas interpõem-se em seu caminho e tentam fazê-lo nadar na superfície, empurrando-o repetidamente para cima. Portanto a mente humana com o fardo de poderosas impressões passadas, não pode ficar absorvida nem mesmo num estado, apesar de lutar toda a vida: Quando isso acontece, em primeiro lugar fica desencorajada e desiste do esforço e por fim, perdendo a fé no evangelho da própria realização espiritual, começa a considerar o desfrutar de visões, gostos etc. do mundo exterior como a única coisa digna de possuir e procurar com avidez. Aversão às coisas exteriores, absorção na meditação do objeto de amor devocional e êxtase produzido por seu estado espiritual são, portanto, considerados na esfera dessa forma de Sadhana como a medida do progresso do aspirante em direção do objetivo. 14. É difícil para alguém que não tenha tentado cultivar qualquer dessas atitudes, compreender a grande extensão da luta interna que um aspirante tem que experimentar, ao enfrentar os fortes obstáculos causados pela manifestação de impressões passadas, submersas nas camadas da mente. Somente quem passou por tais dificuldades e sofrimentos ficará atônito com a rapidez com a qual Sri Ramakrishna pôde ter a mente absorvida numa atitude após a outra. Também, somente assim poderá avaliar a idéia de que a mente do Mestre deve ter sido algo bem maior que a mente humana, para poder agir assim. 15. Será que foi devido à incapacidade da mente humana comum de compreender as verdades sutis do campo espiritual que a história das Sadhanas desses heróis espirituais, conhecidos como Encarnações de Deus, não tenha sido convenientemente registrada? Pois tudo o que conseguimos das histórias sobre eles refere-se a seus atos comoventes de renúncia, antes de terem embarcado na vida da Sadhana e com os poderes maravilhosos que manifestam depois de Suas Sadhanas para redimir o homem da ignorância e dos envolvimentos mundanos. Quanto às Encarnações, encontramos pouco registro de sua extraordinária luta interior na qual elas devem ter-se empenhado no período de suas Sadhanas, para destruir e arrancar de vez as impressões profundas de suas mentes e para obter autocontrole. Ou aquela luta foi descrita em tais histórias, com a ajuda de metáforas e hipérboles, de tal maneira que agora nos é impossível separar o grão da verdade do restante de descritivas extravagâncias. 16. O leitor compreenderá o que queremos dizer quando dermos alguns exemplos. Sri Krishna muitas vezes estava empenhado em praticar austeridades, visando conseguir poderes especiais, com o propósito de fazer bem à humanidade. Mas não há relato sobre a sucessão de atitudes de sua mente, exceto que ele ficou num pé só por um certo período, vivendo somente de água e ar. Não temos um relato detalhado das Sadhanas de Buda, a não ser sobre seu desapego do mundo, sua saída de casa com intuito de se tornar eremita e em seguida, estabelecer-se em Dharmachakra, a roda da religião. Contudo um pouco da história de suas atitudes espirituais está disponível, ao contrário de outros heróis espirituais. Sabe-se que, abstendo-se de comida e bebida e tomando a firme resolução de ser bem sucedido, empenhou-se em fazer austeridades e meditação durante seis longos anos sem sair do mesmo lugar e que, controlando as forças vitais internas e praticando meditação, entrou em Samadhi. Seu biógrafo também tentou dar ênfase à luta contra as impressões latentes da mente, ao introduzir a história da luta com Mara (Satã Budista). É também conhecida a história da luta de Jesus. Depois de registrar alguns acontecimentos da vida de Jesus até a idade de doze anos, o biógrafo descreveu como, aos trinta anos, Jesus foi balizado por João, um santo realizado, e foi sozinho para o deserto onde praticou austeridades e meditação durante quarenta dias; como, apesar de ser tentado por Satã, saiu vitorioso e regressou; e como, por fim, empenhou-se em fazer bem à humanidade. Continuou no corpo denso somente por mais três anos após esse acontecimento. Não há, portanto, registros de como passou o tempo entre doze e trinta anos. Embora boa parte dos acontecimentos da vida de Sankara seja conhecida, tem-se muitas vezes que deduzir a história das atitudes de sua mente. Encontramos registrados muitos acontecimentos da Sadhana de Chaitanya. A história de seu exaltado amor a Deus, destituído do mais leve traço de desejo, tem sido descrita de maneira incompreensível para as mentes comuns, sob forma de metáforas, com a ajuda das histórias do amor entre Radha e Krishna e sua separação. Tem-se que admitir que Chaitanya e seus principais companheiros registraram, com algum detalhe, embora numa linguagem metafórica, as mudanças que ocorreram na mente do aspirante desde o começo até quase o
final do estado perfeito de cada uma das atitudes de Sakhya, Vatsalya e Madhura, com ênfase especial para essa última. Mas não apresentaram a verdade definitiva, quando a mente do aspirante torna-se completamente absorvida em qualquer uma das três atitudes acima mencionadas, experimenta sua unidade com o objeto de seu amor e se funde na Realidade nãodual. A vida ímpar de Sri Ramakrishna e a extraordinária história de sua Sadhana ensinaramnos, com muita clareza, essa verdade última na idade moderna e permitiram-nos compreender que todos os estados religiosos de todas as comunidades religiosas do mundo conduzem a mente do aspirante a um e mesmo objetivo. Deixando de lado todas as outras coisas que podem ser aprendidas de sua vida, pode-se aqui dizer que todo o mundo está indubitavelmente em dívida com ele para sempre, pela catolicidade abrangente de sua visão espiritual, estabelecendo a verdade de todas as religiões. 17. A Madhura Bhava é considerada a maior contribuição dos instrutores Vaishnavas, como Chaitanya, ao mundo espiritual. Se eles não a tivessem pregado, muitas pessoas teriam ficado sem os meios para a realização de Deus e a paz e a felicidade que disso resulta. Foram os primeiros a compreender que a Lila de Vrindavan de Sri Krishna não foi representada em vão e também, a se esforçar para explicá-la aos outros. Se não tivesse havido o advento de Chaitanya, Vrindavan teria sido olhada como uma floresta comum. 18. Esforçando-se, à imitação do ocidente, para registrar somente os acontecimentos externos, os historiadores da idade moderna dirão: "Mas não há evidência que o jogo de Vrindavan tenha realmente ocorrido, como vocês dizem. Portanto, não vêem que muito de sua alegria e de sua tristeza e os estados, incluindo Mahabhava, são todos sem base?" Os instrutores Vaishnavas responderiam: "Podem vocês, de sua parte, dar evidência que esses incidentes mencionados nos Puranas não tenham ocorrido? Enquanto não estivermos convencidos de que seus historiadores exploraram totalmente a história dessas épocas antigas, continuaremos a considerar que suas dúvidas a respeito desses incidentes mencionados nos Puranas, são injustificadas e inválidas. Além disso mesmo se vocês alguma vez apresentarem tal prova, nossa crença não será afetada. Não afetará de forma alguma o eterno jogo do Senhor, na eterna Vrindavan. Esse jogo divino místico permanecerá eternamente no campo espiritual ideal. Se vocês desejarem testemunhar a verdade desse jogo de amor entre Radha e Krishna, podem fazê-lo no campo da consciência espiritual; mas antes de tudo, terão que tornar-se capacitados para isso, em primeiro lugar eliminando qualquer vestígio de luxúria de seu corpo, de sua mente e de sua fala e aprender a fazer ação inegoísta, seguindo os passos de qualquer uma das amigas de Srimati Radha. Verão então que Sri Vrindavan, o "playground" de Sri Hari, está eternamente ali no seu coração e que essa peça está sendo encenada dentro de você todos os dias." 19. Aquele que não aprendeu a manter-se independente dos acontecimentos externos e a estudar, com o coração puro, a história dos estados devocionais pela aceitação ampla do mundo ideal como real, nunca será capaz de desfrutar a beleza de Seu jogo em Vrindavan. Enquanto Sri Ramakrishna estava descrevendo aquele jogo do Divino, com grande entusiasmo, aos jovens de educação inglesa que estavam com ele, viu que eles não estavam gostando e disse: "Por que vocês não observam e apreendem a atração do coração de Srimati por Sri Krishna, naquele jogo divino? Quando se tem esse tipo de atração por Deus, Ele é realizado. Vejam como as Gopis estavam loucas por Krishna, renunciando a tudo que tinham - maridos, filhos, família e boa conduta, honra e desonra, vergonha e aversão, medo da opinião pública e da sociedade e assim por diante! Quando se pode ser assim, realiza-se o Senhor." "Enquanto", continuou ele, "uma pessoa não estiver livre do menor vestígio de luxúria, não pode compreender o estado espiritual de Radha, a personificação do Mahabhava. Logo que viram Krishna, a personificação da Existência-Conhecimento-Bemaventurança, as Gopis sentiam alegria em seus corações, dezenas de milhões de vezes maior do que o prazer sexual; então perdiam a consciência do corpo; Ah, poderia a idéia de prazer sexual pelo corpo desprezível passar então por suas mentes? A luz divina, saindo de Sri Krishna, tocava seus corpos produzindo em cada poro um prazer inifinitamente maior do que o sexual." Certa vez Swami Vivekananda levantou objeção a respeito da historicidade do jogo de Radha e Krishna em Vrindavan e fez uma tentativa de contestar sua autenticidade. Em resposta o Mestre disse: "Muito bem, vamos aceitar como verdadeiro que jamais houve alguém chamado Radha e que algum Sadhaka amoroso imaginou essa personalidade de Radha. Mas ao pintar aquele personagem deve-se admitir que o Sadhaka teve de se perder completamente no estado de Radha e assim, tornar-se Radha. É verdade, portanto, que o jogo de Vrindavan foi encenado no mundo exterior também." Realmente, embora inúmeras objeções com respeito ao jogo de amor do Senhor em Vrindavan possam ter-se levantado, a Madhura Bhava, descoberta primeiramente pelos
instrutores Vaishnavas liderados por Chaitanya e outros e manifestada em suas vidas puras, permaneceria eternamente verdadeiro. O aspirante qualificado sempre alcançará a sagrada visão do Senhor, sentir-se-á abençoado por considerá-Lo seu marido e ele próprio Sua esposa e, com o desenvolvimento final daquele estado, ficará estabelecido no próprio Brahman puro, não-dual. 20. Embora para as mulheres seja fácil e natural atribuir o papel de marido ao Senhor e empreender a disciplina, de acordo, parece não ser natural para aqueles que têm corpo masculino. Portanto, a questão naturalmente surge na mente: por que Chaitanya introduziu no mundo tal disciplina inadequada? Em resposta, dizemos que todas as ações da Encarnação de uma época são feitas para o bem da humanidade. Esse caminho de Sadhana foi introduzido por Sri Chaitanya com o mesmo objetivo. Fez os aspirantes avançarem no caminho de Madhura Bhava, mantendo em mente o ideal espiritual que os aspirantes daquela época ansiavam realizar. Não é possível que o eternamente perfeito Chaitanya, uma Encarnação de Deus, tenha se empenhado em praticar aquela atitude para o seu próprio bem e tenha se estabelecido como ideal perfeito na sociedade. Sri Ramakrishna dizia, "Assim como os colmilhos externos dos elefantes são para atacar os inimigos e os internos para mastigar a comida e manter seus corpos, assim os dois estados manifestavam-se em Sri Chaitanya, um interior e outro, exterior. Ele fez bem à humanidade com a ajuda do estado exterior de Madhura Bhava e ele próprio, estabelecido em Brahman, a frutificação do amor a Deus, desfrutou pessoalmente a imensa felicidade do estado interior da Não-dualidade”. 21. Os historiadores dizem que apareceram nesse país instrutores de Vrajayana no final da Era Budista. Pregavam que a mente humana tendo tentado realizar o Nirvana, a beatitude final e tendo quase se libertado das cadeias dos desejos, avançou para mergulhar no grande Vazio, com a ajuda da meditação. Mas então, "Niratma", a deusa da não-existência, apareceu diante dela e, ao invés de dar-lhe permissão, manteve-a unida a seu próprio corpo. Assim, embora o corpo denso no qual os aspirantes haviam desfrutado objetos humanos não mais existisse, ela o fez desfrutar diariamente do agregado das essências de prazeres sensuais, porque ele ainda possuía um corpo sutil. Portanto não é de se admirar que a doutrina que essa seita pregava, a saber, o desfrutar do prazer sutil do mundo ideal pela renúncia do prazer dos objetos densos tenha posteriormente se deturpado; que o desfrutar do prazer constante dos objetos densos tenha sido encarado como o objetivo da religião; e que disso tudo deve ter resultado no amplo predomínio da relação sexual livre no país. Na época do advento de Chaitanya, as pessoas incultas adotaram aquela deturpada doutrina budista e estavam divididas em várias seitas secretas. O puro Vamachara, mencionado nos Tantras, desviou-se mesmo entre a maioria das classes mais elevadas e a busca de poderes miraculosos e o desfrutar de prazeres sensuais pelo culto da Mãe Universal e meditação n'Ela ficou em voga. No meio desses cultos os aspirantes que queriam alcançar a felicidade divina seguindo qualquer uma das puras atitudes espirituais viram-se abandonados, sem orientação. Foi nesse quadro que Sri Chaitanya apareceu. Primeiro colocou diante daqueles aspirantes os ideais de extraordinária renúncia e desapego, ao praticá-los ele mesmo em sua vida, e depois salientou que, se uma pessoa se tornasse pura e santa e olhasse a si mesmo como mulher e Deus como seu esposo, poderia realmente realizar a felicidade divina ilimitada, no mundo sutil. Além disso pregou a glória dos nomes de Deus para as pessoas em geral e induziu-as a repetir continuamente Seus nomes e cantar Suas glórias em voz alta. Muitas seitas budistas ainda não corrompidas e decaídas de seu ideal foram assim colocadas novamente, por sua graça, no verdadeiro caminho espiritual. Embora os grupos de seguidores do decaído Vamachara tenham em princípio se oposto a ele abertamente, sentiram a extraordinária atração pelo ideal ímpar de sua vida, tornaram-se auto-negadores e tentaram ter a visão da Mãe Universal pela adoração sem interesse. Portanto, ao registrarem os acontecimentos da vida extraordinária de Chaitanya, alguns escritores disseram que os budistas, que sustentavam a doutrina do Vazio, também se alegraram por ocasião de seu nascimento.4 (4 Chaitanya-Mangala.) 22. Sri Krishna, o supremo Ser, a personificação da Existência-Conhecimento-Bemaventurança, é o único Purusha5, (5 Purusha: Existência-Conhecirnento-Bem-Aventurança como sujeito, conhecedor, o que desfruta; Prakriti: Existência-Conhecimento-Bem-Aventurança como objeto, o conhecido, o que é desfrutado. Existência-Conhecimento-Bem-Aventurança Absolutos significam consciência pura ou absoluta, quando a vontade (que, sendo um modo de consciência, nada mais é do que consciência), não está ativa ou não é conhecida. Quando a vontade está ativa ou conhecida, a mesma consciência pura aparece ou é vista como partida em duas, sujeito e objeto, e é falada em termos de amor, com ênfase no aspecto felicidade. ) o princípio masculino e todos os Jivas e criaturas, “ tanto os
densos, como os sutis”, são partes de Prakriti, a personificação do supremo amor e, portanto, Suas esposas. Assim, se os Jivas se tornarem puros e santos e adorá-Lo de todo o coração como seu marido, alcançarão, por Sua graça, liberação e o estado de infindável e pura Felicidade, o objetivo e a realização mais elevada. “Isto é tudo, a Madhura Bhava, pregado por
Chaitanya”. Todas as outras atitudes devocionais estão incluídas na grande atitude, a Mahabhava, da qual Radha, a Gopi mais importante, é a personificação. Cada uma das outras Gopis é a personificação de uma, duas ou mais atitudes contidas na grande atitude. O aspirante fica assim capaz de dominar as atitudes que constituem a Mahabhava ao se empenhar na Sadhana à imitação das Gopis de Vraja e por fim torna-se abençoado com o lampejo da grande Felicidade que emana da grande atitude. O objetivo final do aspirante neste caminho é ficar feliz sob todos os pontos de vista com a felicidade de Krishna ao abandonar todos os desejos para a felicidade dele ou dela para sempre através da contemplação do estado de Radha, a personificação de Mahabhava. 6 (6 O estado no qual se tem receio que algum mal possa abater-se sobre Krishna, mesmo quando ele está feliz e portanto, não se pode permanecer tranqüilo sequer por um momento, é o estágio Rudha de Mahabhava, isto é, o estágio em que os Vikaras sattvicos atingiram o ponto mais elevado. O estágio Adhirudha do Mahabhava é o ponto mais alto do estágio Rudha; é aquele estágio de felicidade e de dor, que surge respectivamente da união e da separação de Krishna, do qual toda a felicidade que existe no âmago do universo e também a dor produzida pela mordida de todas as cobras e picadas de todos os escorpiões são como uma gota no oceano, por assim dizer. A última mencionada atitude da Mahabhava tem duas características: primeira, Modana, isto é, alegria que é encontrada somente nas amigas de Radha; segunda, Madana, "inebriação", que é o completo florescimento de todas as emoções sattvicas e de mudanças corpóreas encontradas somente em Radha. - Bhakti-grantharali de Sri Chakravarty.)
23. O amor de casal, casados de acordo com as regras da sociedade, flui restringido pelas condições exteriores como nascimento, família, conduta virtuosa, medo da sociedade e da opinião pública. Esse par vive dentro dos limites dessas regras e suporta sacrifícios para a felicidade de cada um, tendo em mente diversas coisas que devem ou não ser feitas. Desejosa de observar rigorosamente as regras sociais duras e rígidas, a mulher casada não hesita, em muitas ocasiões, em reprimir ou limitar seu relacionamento de amor com seu marido. Mas o comportamento amoroso de uma amante é diferente. Devido ao impulso do amor, essa mulher com freqüência desrespeita todas as convenções sociais e não hesita em se unir a seu amado mesmo ao custo de toda segurança social. Os instrutores Vaishnavas aconselharam os aspirantes a assumirem para com Deus aquela relação amorosa que tudo devora. Portanto, embora Radha, a senhora suprema de Vrindavan, fosse a esposa de Ayan Ghosh, foi descrita como aquela que a tudo renunciou por amor a Krishna. 24. Os instrutores Vaishnavas descreveram a Madhura Bhava como o agregado das essências das outras quatro doutrinas e algo mais. Porque a mulher que ama serve seu amante como uma escrava, dá bom conselho sob quaisquer circunstâncias como amiga, sente-se feliz com a felicidade dele e infeliz com suas aflições, empenha-se como mãe alimentando seu corpo e sua mente e pensa em seu bem-estar sob todos os aspectos. Assim, anulando totalmente sua própria personalidade, ela se Ocupa em entreter seu amante e de todas as maneiras proporcionar-lhe alegria e conforto, mantendo-o assim, inundado de extraordinária paz e felicidade. A mulher que se esquece sob a influência do amor, mantendo vigilância perfeita no bem-estar e felicidade do amante é descrita nos livros devocionais como Samartha, "a excelente", e seu amor, o melhor. Todos os outros tipos de amor, manchados com um traço de egoísmo, foram incluídos em outras classes, isto é, Samanjasa, "o equilibrado" e Sadharani, "o comum". A mulher da primeira classe importa-se com a própria felicidade, na mesma extensão que a de seu amante e aquela da última classe olha o amante como querido somente por causa de sua própria felicidade. 25. Seja como for Chaitanya pregou a glória dos nomes de Deus e ensinou os aspirantes a conduzirem suas vidas com o ideal de renúncia austera e de colocarem, no que diz respeito ao amor, na posição de bem-amados de Krishna e assim, tentou sustar a maré de sensualidade que prevalecia na sociedade daquela época. Seu modo de devoção e de instrução aos aspirantes propiciou um bem eterno à humanidade. Mostrou o caminho certo àqueles que se haviam desviado, trouxe para os limites de uma nova sociedade aqueles que haviam sido excomungados e que viviam fora do pálio das castas, abraçando a todos dentro de uma nova casta chamada "devotos de Deus" e apresentou o elevado e puro ideal de renúncia e desapego a todas as comunidades. Entretanto, isso não é tudo. Provou, sem dúvida, que todas as modificações mentais e físicas chamadas "oito Sattvikas Vikaras"7 (cujas contrapartes tamásicas são produzidas pelo amor e união dos pares comuns de amantes) (7 As modificações sattvikas são aquelas que produzem uma convulsão de emoção no corpo e na mente. São oito em número as saber: imobilidade, transpiração, horripilação, dificuldade de pronúncia, tremor, palidez, lágrimas e perda de consciência. Estão organizadas em cinco graus segundo dêem cada vêz, mais prazer, tirando sua nomenclatura da capacidade de incandescer do fogo, isto é, fumaça, combustão sem chama, chama, brilho e incandescência. )
realmente sobrevêm ao aspirante possuidor de mente pura, pela intensa meditação e contemplação do Marido Divino, o Amante do Universo. Isso converteu, naquela época, o Alankara Sastra, a ciência da retórica, numa escritura espiritual, dando à literatura dramática, poética e sensual a cor do amor espiritual, tornando-a agradável aos aspirantes espirituais e levando-os ao progresso. Assim tornou o caminho da Sadhana fácil para eles. Trouxe poesia e
romance à vida do aspirante, além de tornar-lhe fácil amar a Deus como "muito íntimo", seu mais próximo e querido. Permitiu-lhe sublimar as paixões mais baixas como a luxúria e cólera, dirigindoas para o Senhor, ao contrário da prática da Santa-bhava, a atitude de tranqüilidade, na qual as paixões são simplesmente evitadas ou afastadas. 26. Embora aos olhos de alguns críticos modernos, a Madhura Bhava pareça não ser natural e adequada para aqueles que têm corpos masculinos, não leva muito tempo para que um Vedantista constate seu valor. Ele sabe que, como resultado de hábitos antigos, todos os pensamentos convertem-se em Samskaras na mente humana e que é devido a essas impressões que o homem percebe as diversidades do Universo, que realmente é o Brahman nãodual. Se ele puder, pela graça de Deus, realmente considerar o universo como não existente neste instante, experimentará seu imediato desaparecimento no Vazio. O universo existe para um homem somente porque ele o considera como existente. Eu sou um homem somente porque me olho como homem e uma outra pessoa é mulher porque se olha como tal. Assim também é fato da experiência diária que, quando uma atitude predomina na mente humana, encobre e gradualmente destrói todas as outras contrárias. Portanto o esforço de um aspirante para encobrir e gradualmente destruir todas as outras atitudes de sua mente, pela predominância da Madhura Bhava, é considerado pela Vedanta como semelhante ao esforço de "remover o espinho em seu pé com a ajuda de outro espinho". A consciência de que "eu possuo um corpo", que é a base de todas as outras impressões da mente humana e a crença firme, "sou um homem ou uma mulher", devido à sua ligação com aquele corpo, são as duas tendências dominantes na mente de um homem. Quando um aspirante masculino é capaz de esquecer sua natureza masculina ao atribuir a natureza de marido ao Senhor e de esposa a si mesmo, ele, é desnecessário dizer, pode muito facilmente jogar fora a atitude "sou Sua esposa" e alcançar o estado além de todas as atitudes. Portanto, o Vedantista acha bastante razoável que um aspirante, quando perfeito na disciplina da Madhura Bhava, chegue bem perto do plano que transcende todas as atitudes. 27. É o objetivo do aspirante, pergunta-se, a realização atitude devocional de Radha? Os instrutores Vaishnavas, contudo, não aconselham essa prática. Sustentam que a atitude ser somente amiga de Radha é atingível, mas não a dela própria. Entretanto, deve inferir-se que a última é o objetivo final do aspirante, pois a diferença entre a atitude de Radha e a de suas amigas é somente de grau e não de espécie. Como Radha, suas amigas também adoravam Krishna, a personificação da Existência-Conhecimento-Bem-Aventurança como seu marido procuravam realizar a união entre Radha e Krishna, a fim de torná-lo feliz, porque elas constataram que Ele sentia-se mais feliz unido a ela. Assim também, vemos que embora Rupa, Sanatana, Jiva e outros instrutores Vaishnavas antigos, que passaram suas vidas em Vrindavan fazendo o serviço das diferentes imagens de Krishna, não instalaram a imagem de Radha ao lado de Krishna. Deduz-se que não agiram assim somente porque consideravam-se na posição de Radha. Aqueles que desejam estudar em detalhe a atitude Madhura Bhava mencionada nos livros Vaishnavas, deverão pesquisar os escritos dos primeiros instrutores Vaishnavas como Rupa, Sanatana e Jiva e também os poemas dos poetas Vaishnavas como Vidyapati e Chandidas no Purvaraga (a aurora do amor divino), Dana (oferenda ou dedicação), Mana (rejeição emocionada do carinho do Bem-amado devido ao excesso de emoção), Abhimana (o sentimento ferido do amor) e Madhura ( angústia da separação). 8 (8 Essas canções sobre a angústia da separação são, em conjunto, chamadas Mathur, associadas à cidade de Madhura, porque as Gopis de Vrindavan experimentaram aquela intensa angústia quando Krishna partiu para Mathura, de onde nunca mais regressou. ) Discutimos aqui o essencial da
Madhura Bhava porque assim será fácil compreender que maravilhoso pináculo de excelência o Mestre atingiu na prática dessa atitude. CAPÍTULO XIV A SADHANA DE MADHURA BHAVA DO MESTRE ASSUNTOS: 1. O Mestre naturalmente inclinado para os estados espirituais. 2. Efeitos da Sadhana sobre ele. 3. Sua primeira atitude quanto à Madhura Bhava. 4. A sanção das escrituras para as Sadhanas do Mestre. 5. Aceitação pelo Mestre dos mandamentos das escrituras. 6. O Mestre usando roupa feminina durante a Madhura Bhava. 7. Traços femininos manifestam-se nele. 8. O Mestre como amiga, na família de Mathur. 9. A não identificação do Mestre usando roupa feminina. 10. As mudanças durante a Madhura Bhava. 11. O amor transcendental do Mestre. 12. O amor transcendental de Srimati. 13. Sri Gauranga sobre o amor transcendental. 14. A visão de Radha pelo Mestre. 15. A identificação do Mestre com Srimati . 16. As extraordinárias mudanças físicas do Mestre durante o estado de mulher. 17. A mente cria o corpo. 18. A visão de Sri Krishna pelo Mestre. 19. Uma aspiração juvenil sua. 20. Os três como o Uno e o Uno como três.
1. O Mestre costumava ficar completamente absorvido em qualquer atitude espiritual adotada por sua mente pura e concentrada. Essa atitude particular ocupava completamente sua mente durante aquele período, varrendo todas as outras atitudes, convertendo seu corpo num instrumento perfeitamente adequado à manifestação daquele estado. Estudando sua vida vemos essa característica mental presente desde a meninice. Observamos essa sua natureza quase diariamente quando o visitávamos em Dakshineswar. Enquanto mergulhado numa determinada atitude espiritual, ao ouvir música devocional, ou por qualquer outra razão, sentia muita dor se alguém cantasse ou falasse de acordo com outra atitude. Evidentemente ele experimentava dor porque o fluxo de sua mente numa determinada direção sob a Influência de um estado era subitamente obstruído pela introdução de outro estado. Patanjali, o grande pensador, descreveu o estado mental que tem somente uma corrente de pensamento concentrada num objeto determinado, como sendo Savikalpa-samadhi. O mesmo tem sido descrito como Bhava-samadhi nas escrituras devocionais. Isso mostra que a mente do Mestre estava acostumada a mergulhar naquela espécie de êxtase, desde a infância. 2. A característica de sua mente, acima mencionada, tomou novo rumo a partir do momento em que começou as práticas espirituais. Enquanto nos primeiros tempos sua mente permanecia somente numa atitude por pouco tempo e depois mudava para outra, notava-se agora que, uma vez iniciada uma atitude, ela persistia até que progredisse a seus limites máximos, terminando com um vislumbre da consciência não-dual. Como exemplos desse fato pode-se dizer que enquanto não alcançou o limite máximo da atitude Dasya, ele não praticou Apatya ou atitude no qual a pessoa considera Deus como Pai ou Mãe; da mesma maneira não se empenhou em praticar as atitudes de Vatsalya e Madhura Bhava antes de ter a experiência final de Apatya, como ensinado nos Tantras. Exemplos desse tipo podem facilmente multiplicarse ao estudarmos os acontecimentos da época de sua Sadhana. 3. Quando a Brahmani chegou, a mente do Mestre estava profundamente empenhada na contemplação da Maternidade de Deus. Nessa época ele via a manifestação real da Mãe Divina em todas as criaturas sensíveis ou insensíveis, mas especialmente naquelas que tinham a forma feminina. Por isso, compreendemos claramente a razão pela qual ele se dirigiu à Brahmani como "mãe" logo que a viu e que acreditava plenamente ser seu filho, sentava-se em seu colo e tomava alimento de suas mãos. Inspirada pelo estado devocional das Gopis de Vraja, às vezes a Brahmani cantava canções que transmitiam a idéia de relacionamento conjugal com Deus, quando o Mestre dizia, segundo o testemunho de Hriday, que ele não gostava daquela atitude e pedia-lhe que parasse e cantasse canções expressando a Maternidade de Deus. A Brahmani rapidamente compreendeu a atitude do Mestre e começou a cantar canções relativas ao estado de atendente feminina da Mãe do Universo; ou apresentava canções tomadas da afeição explosiva de Yasoda por seu Gopala. Esses são, naturalmente, fatos que ocorreram muito antes dele se empenhar na atitude de Madhura Bhava. Sua sinceridade transparente e pura está evidente com esses fatos. Como ele mesmo costumava dizer: "Não existe simulação em minha mente." 4. Já vimos como o Mestre passou pelas atitudes de servo de Deus e também, de Seu filho. Descreveremos agora as práticas nas quais ele se empenhou na disciplina de Madhura Bhava. Embora o Mestre fosse quase "iletrado", como a palavra é comumente entendida, um estudo de sua vida revela como ele manteve a autoridade das escrituras durante toda a vida. Mesmo suas primeiras Sadhanas efetuadas sem a ajuda de qualquer Guru e guiadas pelos puros impulsos de seu coração, não estavam em contradição com os Sastras. Provaram somente sua universalidade - a verdade que o sucesso preencherá os esforços de qualquer pessoa nesse campo, desde que seu coração seja puro, santo e cheio de aspiração, "sem qualquer dissimulação". E não há nada com o que se admirar; pois, pensando um pouco veremos que as escrituras foram compiladas dessas experiências originais. Os textos que fazem parte dos Sastras são somente o relatos das experiências de corações como o do Mestre. São o resultado de seus esforços para a realização da Verdade. O Mestre, contudo, era iletrado e por isso, sem qualquer conhecimento prévio desses Sastras. Entretanto alcançou a realização dessas verdades nele relatadas, por seus esforços independentes. Essa vida extraordinária, portanto, desenvolve-se somente para provar a universalidade das experiências descritas nas escrituras e são somente a confirmação, e não a contradição, das escrituras. Swami Vivekananda salientou esse ponto quando disse: "A razão do Mestre encarnar-se nesta época, como pessoa iletrada, foi para provar que os estados e experiências contadas nos Sastras são verdadeiros." 5. Como exemplos da adesão instintiva do Mestre à autoridade das escrituras, podemos
mencionar aqui a maneira pela qual ele vestia diferentes vestimentas, uma atrás da outra, sob o impulso das diversas atitudes. Os videntes disseram através dos Upanishads que não se pode alcançar a perfeição somente por Tapas, sem a adoção de emblemas externos. 1 (1 Mundaka Upunishad 3,2,4. A Auto-realização não é possível somente pelo Conhecimento, sem utilizar os sinais de Sannyasa, i. é, roupa ocre etc. ) Vêse na vida do Mestre que, impelido por seu coração, ele vestiu roupas e outros emblemas exteriores propícios às práticas de qualquer atitude espiritual que adotasse na ocasião. Por exemplo, usou roupas vermelhas, cinzas, vermelhão e contas de Rudraksha como determinados nos Tantras, quando estava praticando a atitude filial com Deus, como Mãe. Por ocasião das atitudes devocionais dos livros Vaishnavas vestiu o Bhek, a conhecida roupa tradicional dos ascetas Vaishnavas, que consistia de roupa branca, pasta branca de sândalo, grinaldas de contas feitas do sagrado basil, etc. Desejando realizar o estado não-dual, ensinado na Vedanta, vestiu a roupa ocre, abandonou o cordão sagrado e o tufo de cabelo no alto da cabeça. Assim também, quando assumiu várias formas masculinas de vestimenta na época dos estados masculinos, não hesitou em enfeitar-se com roupas e adornos femininos, enquanto praticava as atitudes femininas. O Mestre ensinou-nos em diversas ocasiões, que não se poderia realizar Deus enquanto não se liberasse dos oito grilhões: vergonha, ódio, medo e egoísmo devido ao nascimento, família, boa conduta etc. que acompanham a pessoa de uma vida para a outra. O quanto ele próprio seguiu esse ensinamento durante toda a vida, no corpo, na mente e na fala, pode claramente ser compreendida pelo estudo cuidadoso de todas as suas ações, incluindo aquela de usar roupas especiais, ornamentos e outros emblemas apropriados, por ocasião das diferentes Sadhanas. 6. Empenhado nas práticas da Madhura Bhava, o Mestre ficou ansioso em usar roupas e enfeites femininos. Sabedor de seu desejo, o grande devoto Mathur teve o prazer de adorná-lo algumas vezes com um sari luxuoso e outras vezes, com uma anágua, uma echarpe de gaze e um corpete. Querendo fazer com que seu modo de vestir feminino fosse perfeito, Mathur embelezou-o com uma peruca de cabelos longos e um conjunto de jóias de ouro. Esse presente de Mathur, soubemos de fonte confiável, deu às pessoas maldosas a oportunidade de caluniar a austera renúncia do Mestre. Mas nem ele nem Mathur prestaram atenção. Mathur ficou extremamente feliz com a satisfação que havia dado ao "paizinho" e isso era seus olhos justificativa suficiente. Vestido dessa forma, enfeitado com tais jóias, o Mestre identificou-se totalmente com o estado das mulheres devotas de Vraja, perdidas de amor por Krishna e sua consciência masculina desapareceu completamente. Seus pensamentos, palavras e movimentos passaram a se parecer em todos os aspectos com os de uma mulher. Ouvimos do Mestre que ele esteve nesses trajes de mulher durante seis meses, com a mente absorvida no sentimento de que era a esposa espiritual de Deus. 7. Já mencionamos em outro lugar a extraordinária coexistência, no Mestre, dos temperamentos masculino e feminino. Portanto, deve-se imaginar que, sob a influência de roupas femininas, o temperamento do belo sexo tenha surgido nele? Mas ninguém jamais poderia ter imaginado que, sob o impulso dessa atitude, seus movimentos, fala, sorriso, olhar, gestos e outras ações do corpo e de sua mente poderiam tornar-se completamente femininos. Que tudo isso tenha ocorrido, por mais impossível que possa parecer, foi confirmado tanto por Hriday quanto pelo próprio Mestre. Ao freqüentarmos Dakshineswar, vimo-lo imitar, diversas vezes, os modos das mulheres. Essas imitações costumavam ser tão naturais e perfeitas que até as senhoras ficavam admiradas. 8. Naquela época às vezes o Mestre ia à casa da Rani Rasmani em Janbazar e ali vivia com as senhoras, nos cômodos internos. Acostumadas à pureza de caráter do Mestre e com a ausência de qualquer traço de luxúria, as senhoras consideravam-no divino. Além disso elas agora estavam encantadas com seu comportamento feminino simpaticamente tão afinado com o delas. Portanto, habituaram-se a pensar nele como uma delas e deixaram de sentir qualquer hesitação feminina ou vergonha em sua presença (III.7). Nessa época, quando o marido de uma das filhas de Mathur veio à casa de Janbazar, o Mestre, soubemos dele próprio, adornou-a com as melhores roupas e jóias, fez seu cabelo, instruiu-a de diversos modos como entreter o marido, conduziu-a pela mão, como uma amiga, ao quarto de seu marido e voltou, depois de fazê-la sentar-se junto dele. Ele dizia: "Como elas me consideravam uma amiga, não se sentiam constrangidas." 9. "Quando ele estava assim cercado pelas senhoras", Hriday dizia: "era difícil até para os parentes próximos, reconhecê-lo imediatamente. Um dia naquela época, Mathur Babu levou-me ao cômodo interno e perguntou: 'Pode dizer-me qual delas é seu tio?' Embora eu tivesse vivido com ele durante tanto tempo e o servido diariamente, não pude, de imediato, distingui-lo. Nesse período de sua vida, em Dakshineswar, o tio costumava apanhar e juntar flores no jardim, logo de manhã. Nós o observávamos cuidadosamente e notávamos que, sempre que começava a andar, seu pé esquerdo movimentava-se em primeiro lugar, como o de uma mulher. A Bhairavi Brahmani costumava dizer:
'Muitas vezes eu o confundi com Sri Radharani, quando o via apanhar flores daquele jeito'. Depois de apanhar flores e fazer grinaldas variadas, costumava enfeitar Radha-Govinda todos os dias e às vezes, tendo adornado a Mãe do universo também daquele jeito, orava implorando-lhe, como faziam as Gopis de Vraja a Katyayani, para deixá-lo ter Krishna como seu Marido Espiritual. 10. Desejoso da visão de Krishna e de tê-lo como seu Esposo Espiritual, o Mestre agora fazia o serviço e o culto da Mãe Divina. Empenhou-se então no serviço dos sagrados pés de Krishna com a mente concentrada e passava os dias em oração anelante e ansiosa. Essa oração ardente em seu coração jamais cessava - nem durante o dia nem durante a noite. Dias e meses transcorreram sem sucesso, mas nem o desespero nem qualquer abatimento diminuiram-lhe a ânsia. Sua oração expressava-se em lágrimas copiosas e num anseio da alma que se desenvolveu numa inquietude, num anelo ansioso pelo bem-amado, como um possesso, fazendo-o esquecer-se de comer, dormir e dos cuidados vitais com corpo. E como vamos descrever a agonia da separação - um anseio pela completa união durante todo o tempo - do querido do seu coração, agora obstruída cruelmente por múltiplas barreiras; esse anseio que agita seu coração, devasta sua mente e destrói seu corpo e seus órgãos dos sentidos -como poderemos descrever a agonia produzida por tal anseio? Além disso, essa agonia de separação não terminou simplesmente ao manifestar-se como estados mentais agonizantes, mas também ocasionou outra vez aquela queimação ardente, insuportável e aquele intenso calor que ele sentia por todo o corpo durante os estágios iniciais de sua Sadhana. Ouvimos do próprio Mestre que gotas de sangue saíam às vezes de cada poro, devido ao poderoso sentimento de separação de Krishna. Todas as juntas de seu corpo pareciam afrouxar-se ou quase deslocar-se, os sentidos abstinham-se de funcionar e o corpo permanecia imóvel e inconsciente, às vezes como o de um morto - tudo devido à extrema angústia do coração. 11. Nós, eternamente identificados com o corpo e conscientes de ser isso e somente isso, entendemos por amor, a atração de um corpo por outro. Ou se formos, como resultado de um forte esforço estrênuo, apenas um pouco além da consciência do corpo denso e olharmos o amor como atração para um agregado de qualidades nobres manifestadas num determinado corpo, chamamos a isso amor transcendental e lhe cantamos aleluia. Mas não nos leva muito tempo compreender que mesmo esse chamado amor transcendental, louvado por gerações de poetas, não está livre da consciência do corpo denso e dos desejos sutis por prazer. Ah, quão sem valor, insignificante e vazio esse amor parece em contraste com o verdadeiro amor transcendental manifestado na vida do Mestre! 12. Somente Srimati Radharani, dizem as escrituras devocionais, compreendeu esse amor transcendental, em toda sua plenitude. Nela temos o modelo perfeito. Em nenhuma das escrituras devocionais ninguém pode ser encontrado igual a ela pois, completamente esquecida das próprias satisfações do corpo e da mente, ela pôde abandonar vergonha, ódio e medo, sem se importar com a opinião pública e social: pôde pisar no prestígio devido a nascimento, família, boa conduta e posição respeitável, a fim de sentir-se feliz somente com a felicidade de Krishna. Segundo essas escrituras Vaishnavas nenhum Jiva pode alcançar a plenitude dessa forma de amor; somente uma realização parcial dele pode ser atingida pelo Sadhaka e mesmo assim, somente pela graça de Radha, porque Krishna, a personificação de Existência-Conhecimento-Bem-Aventurança está eternamente cativado por seu amor, destituído do mais leve traço de luxúria e atende ao desejo dos devotos por Sua visão, por intercessão dela. A implicação desses ensinamentos é que, enquanto uma pessoa não realizar o tipo de amor experimentado por Srimati (Radha), personificação do amor transcendental, não se pode ter Deus como marido e sentir a perfeita doçura do amor que é chamado Madhura Bhava. 13. Embora a glória extraordinária do amor de Radharani por Krishna tenha sido altamente louvada por Sukadeva, o líder dos Paramahamsas e por outros sábios dotados de auto-controle, livres do domínio de Maya, a maioria das pessoas na Índia não soube durante muito tempo como realizá-Lo em suas vidas. A fim de fazer as pessoas compreenderem a realizá-Lo, o Senhor, dizem as escrituras Vaishnavas, teve de encarnar-Se como Srimati num mesmo corpo, com Krishna no interior e Radha no exterior, naquela personificação extraordinária d'Ele que é conhecida como Gauranga ou Sri Chaitanya. Assim Gaurang veio à terra para fazer bem à humanidade, ensinando-lhe a relação extraconjugal do amor no campo espiritual, tendo Deus como amante e o Jiva como a mulher apaixonada por Ele. Todos os sinais observados no corpo de Radharani, devido ao amor por Krishna, também manifestaram-se no corpo de Gauranga pelo poder de seu amor por Deus, apesar de ser homem. Disso podemos afirmar que Gauranga era Srimati; porque os sinais físicos e mentais de Madhura Bhava, que se manifestaram somente em Srimati no passado, também foram observados nele. Assim Sri Gauranga é o segundo exemplo do ideal de amor
transcendental. 14. Assim compreendendo que alcançar a visão de Krishna era impossível sem a graça de Radha, o Mestre agora passou a se dedicar integralmente à conquista do Seu favor. Perdido na lembrança e reflexão da forma de Radha, a personificação do amor, ele incessantemente oferece a Seus pés de lótus as emoções ardentes de seu coração. Em conseqüência foi logo abençoado com a visão da forma sagrada de Radha, destituído do menor traço de luxúria. Viu então que aquela forma desaparecia também em seu próprio corpo, como as outras divindades ao ter suas visões, "É sempre possível", dizia o Mestre, "descrever a glória e a doçura dessa incomparável, pura, brilhante forma de Radha, que a tudo renunciou por amor a Krishna! O esplendor de seu corpo era amarelo brilhante como o pólen das flores Nagakesara (mesua férrea). 15. Daí em diante o Mestre começou a se considerar Srimati em êxtase. Perdeu completamente a consciência da existência separada devido à contemplação da forma sagrada e do caráter de Radha e ao sentimento incessante de identificação com ela. Por isso pode-se dizer com certeza que seu amor por Deus, tomando a forma de relacionamento conjugal, desenvolveu-se num estado tão profundo com o de Radha, pois na realidade todos os sinais de Mahabhava, que constituem o ápice da Madhura Bhava, manifestaram-se nele depois da visão acima mencionada, como o foram em Radha e Gauranga. As descrições dos sinais físicos que se manifestam no Mahabhava são relatados nos escritos dos reverenciados instrutores Vaishnavas. A Bhairavi Brahmani e mais tarde Vaishnavacharan e outros Sadhakas, todos bem versados nas escrituras Vaishnavas, ficaram espantados ao ver a manifestação daqueles sinais do estágio Mahabhava do relacionamento conjugal, na pessoa sagrada do Mestre e prestaramlhe, do fundo do coração, sua adoração e reverência. Falando da Mahabhava, o Mestre nos disse, em diversas ocasiões: "Está escrito nas escrituras devocionais que o conjunto de dezenove tipos de emoções que se manifestam num único receptáculo, é chamado Mahabhava. É necessária uma vida inteira para que o homem pratique somente uma dessas emoções, antes que possa alcançar perfeição nela. Dezenove desses estados foram totalmente manifestados aqui (mostrando seu próprio corpo) num único receptáculo."2 () 2
As divisões da Ragatmika Bhakti segundo os instrutores Vaishnavas como Jiva Goswami, são dadas abaixo:
16. Já mencionamos anteriormente que saía sangue de cada poro do corpo do Mestre devido à extrema angústia pelo sentimento de separação de Krishna. Isso aconteceu nessa época, último estágio da Mahabhava. Ele tornava-se tão absorvido no pensamento constante de si mesmo como mulher, que não podia considerar-se como pessoa de outro sexo, mesmo em sonho. Seu corpo e seus sentidos funcionavam naturalmente como os de uma mulher. 17. A Vedanta ensina que é a mente do homem que criou seu corpo na forma atual e que o está transformando a cada momento de sua vida, ao decompô-lo e a tornar compô-lo por meio de intensos desejos. Embora já nos tenham falado do grande controle da mente sobre o corpo, na realidade não compreendemos sua completa extensão. Isto porque não há objeto para o atingimento do qual experimentamos aquele tipo de desejo intenso, sob a influência do qual a
mente desliga-se de todos os outros objetos e concentra-se naquele particular e por ele manifesta poderes extraordinários. Este ensinamento da Vedanta, é desnecessário acrescentar, está claramente provado pelo fato de que o corpo do Mestre mudou em pouco tempo, devido ao intenso desejo de experimentar determinado objeto. Ouvindo os detalhes das experiências espirituais do Mestre e desejando compará-las com as dos videntes perfeitos de épocas passadas, Padmalochan e outros Pandits eminentes disseram ao Mestre: "Suas experiências ultrapassaram as relatadas nos Vedas e Puranas." Fica-se admirado ao estudar as mudanças físicas do Mestre sob a influência de suas fortes emoções e tem-se que salientar que as modificações de seu corpo foram além dos fatos até então descobertos pela fisiologia e indicam o início de uma maravilhosa revolução nesta. 18. À medida que sua consciência de Deus como marido tornava-se perfeita e intensificada, experimentava dessa maneira a graça de Radharani, a suprema Senhora de Vraja e finalmente, pouco tempo depois foi abençoado com a sagrada visão de Krishna, personificação de ExistênciaConhecimento-Bem-aventurança puros. Essa forma de Krishna realizada na visão, também fundiu-se com sua sagrada pessoa como todas as outras formas percebidas anteriormente. Tota Puri, o Paramahamsa, chegou dois ou três meses depois do Mestre ter tido aquela visão e o fez dedicar-se à disciplina do estado espiritual não-dual, bem conhecido na Vedanta. Perfeito nas práticas de Madhura Bhava, o Mestre, é claro, vinha desfrutando a felicidade divina, naquele estado, há pouco tempo. Ouvimos do próprio Mestre que naquela ocasião, ele se perdia completamente no pensamento de Krishna e às vezes considerava-se Krishna e olhava todos os seres, desde Brahman até uma folhinha de grama como formas de Krishna. Quando freqüentávamos Dakshineswar e estávamos em sua companhia, um dia apanhou uma flor de grama, veio ao nosso encontro com o rosto brilhando de alegria e disse: "A pele de Sri Krishna, que eu costumava ver então (na época em que praticava Madhura Bhava) era como esta." 19. Um desejo sob o impulso do estado feminino costumava surgir na mente do Mestre durante sua adolescência, antes de deixar Kamarpukur para ir a Calcutá. Sabendo que as Gopis de Vraja tinham Krishna, a personificação de Existência-Conhecimento-Bem-aventurança puros como seu marido espiritual por meio do amor, porque haviam nascido mulher, ele costumava pensar que ele, também, teria sido abençoado o suficiente para amar e ter Krishna como marido, se tivesse nascido numa forma feminina. Considerando seu corpo masculino como um obstáculo para alcançar Krishna, imaginou então que, se nascesse novamente, se tornaria uma linda viúva-menina, de cabelos compridos, numa família Brahmana e conheceria como marido somente Krishna. Teria para subsistência o suficiente em comida e roupa simples. Em volta da cabana haveria um Katha 3 ( Isto é, 0,O16 acres.) ou dois de terra, onde ela cultivaria, com suas próprias mãos, algumas verduras e legumes para consumo próprio. E teria com ela uma senhora mais velha como guardiã, uma vaca que ela mesmo ordenharia e uma roça. A imaginação do menino ia além. Continuava pensando que durante o dia, depois de terminar os trabalhos domésticos, ficaria naquela roca, cantando a respeito de Krishna e depois do crepúsculo choraria ardentemente em segredo, ansiando alimentar Krishna com suas próprias mãos, com doces feitos do leite daquela vaca. Krishna também ficaria satisfeito e chegando vestido de pastor, os comeria. Essa chegada e partida repetir-se iam diariamente sem o conhecimento das outras pessoas. Embora de maneira diferente, seu desejo a esse respeito veio a se realizar da maneira que já mencionamos, por ocasião de sua prática de Madhura Bhava. 20. Concluiremos o presente tópico relatando outra visão do Mestre, enquanto desfrutava Madhura Bhava. Um dia naquela época, enquanto ouvia a leitura do Bhagavata diante do templo de Vishnu, entrou em êxtase e teve a visão da luminosa forma de Sri Krishna. Viu que um raio de luz, como um fio, saía de Seus pés de Lótus, tocava o livro, depois o coração do Mestre e permaneceu tocando simultaneamente os três por algum tempo. Surgiu daquela visão a firme convicção de que, embora os três, isto é a escritura, o devoto e Senhor aparecem como entidades diferentes, são uma e a mesma coisa; em outras palavras são manifestações da mesma Realidade. "Os três o Bhagavata ( a escritura), o Bhakta (o devoto) e o Bhagavan (Senhor) - são o Uno e o Uno são os três", ele dizia. CAPÍTULO XV 3
A SADHANA DO MESTRE DE ACORDO COM A VEDANTA ASSUNTOS: 1. Um estudo do estado mental do Mestre nessa época. 2. A Sadhana mesmo depois da realização: seu significado. 3. A mãe do Mestre em Dakshineswar. 4. Ausência de avareza nela. 5. Saída de Haladhari e a chegada de Akshay. 6. Praticando o estado não dual depois da perfeição. Em Bhavasamadhi; sua explicação. 7. Estado-não dual e estado devocional . 8. Sri Tota em Dakshineswar. 9. O Mestre
recebendo instrução divina para praticar Vedanta. 10. O conceito de Tota sobre a Mãe do Universo. 11. A iniciação do Mestre em Sannyasa, feita de forma privada. 12. Execução de ritos preliminares. 13. Mantras de oração preliminares à iniciação em Sannyasa. 14. O conteúdo do Mantra do Viraja-Homa. 15. O Mestre abandonando o cordão sagrado e o tufo. 16. A exortação de Tota. 17. O Mestre atinge Nirvikalpa Samadhi. 18. A avaliação de Tota e sua surpresa. 19. Tota faz o Mestre descer do Samadhi. 20. O Mestre cura Jagadamba Dasi.
1. Perfeito na disciplina de Madhura Bhava, o Mestre atingiu então o zênite da Sadhana de todos os estados devocionais. Mas antes de relatar a história do final dessa extraordinária luta espiritual, é necessário estudar seu estado mental naquela época. Se um aspirante desejar ser bem sucedido na disciplina de qualquer um dos estados devocionais, terá que afastar-se da vista, do paladar e dos outros objetos mundanos de prazer. A afirmação do perfeito devoto Tulsidas: "Não há ação egoísta onde Rama está."1, (1 Não há ação egoísta onde Rama está e não há Rama onde está a ação egoísta. Como sol e noite, os dois não coexistem - Tulsidas. ) é realmente verdadeiro. A história da luta extraordinária do Mestre vem confirmá-lo. Ele manteve-se na base sólida da renúncia da luxúria e do ouro antes de começar a praticar os estados devocionais. Podia controlar, num curto período, qualquer estado que praticasse a qualquer tempo, isto porque jamais se desviou daquela base. Portanto devemos manter claro diante de nossa mente que agora ele estava morando incessantemente muito além dos limites da tentação de luxúria e de ouro. Como fazia incessantes esforços para realizar Deus durante nove anos, renunciando ao desejo de desfrutar os objetos mundanos, sua mente agora, pela constante contemplação, atingiu um estado tal que até o pensamento de qualquer coisa não relacionada com Deus parecia-lhe veneno. Quanto mais ele compreendia e manifestava no corpo, na mente e na fala que a realidade de Deus era a essência de todas as essências e o final de todos os finais, mais tornavase absolutamente indiferente e livre de qualquer desejo para alcançar aqui ou na vida após a morte qualquer coisa que não fosse Deus. Esquecendo-se de todas as coisas mundanas, das dores e dos prazeres do corpo, estava tão acostumado à meditação concentrada em seu Ideal Escolhido, que sua mente podia, num momento, retirar-se dos objetos externos, concentrar-se naquele Ideal e desfrutar a felicidade divina. Dias, meses, anos passaram-se assim, contudo sua felicidade, o desfrutar divino, não o deixava sequer por um momento e jamais pôde considerar que houvesse qualquer coisa além de Deus que pudesse ser desejada nesta vida. Tendo devoção, fé e confiança ilimitadas na Mãe Universal, a Causa Ultima, como "o objetivo, a protetora, a testemunha, a morada, o refúgio e a amiga" 2, ( 2 Gita, IX,18.) o Mestre não somente ligou-se a Ela em eterna relação de amor, mas também, acostumou-se a executar todas as ações da vida, grandes e pequenas, exclusivamente sob a ordem ou sugestão da Mãe Divina. Pois ele havia tido várias provas de que, por meio da absoluta dependência infantil à Mãe Divina, o aspirante pode realizar Sua constante presença a seu lado, experimentar sempre a bênção de suas palavras doces e o apoio de Seus poderosos braços, ficando assim aliviado de todo o medo ao trilhar os difíceis caminhos da vida. 2. Por que, pergunta-se, o Mestre empenhou-se em fazer disciplina mesmo depois de conhecer a Causa do universo como sua própria Mãe, sempre presente a seu lado? Qual a importância de quaisquer outras disciplinas espirituais quando já se realizou que Ela é totalmente a mais íntima, para cujo atingimento os aspirantes praticam todas as disciplinas e austeridades? Embora tenhamos discutido essa questão anteriormente de um determinado ponto de vista, vamos agora enfocá-la de outro ângulo. Sentado aos sagrados pés do Mestre e ouvindo a história de sua luta, surgiu aquela dúvida em nossas mentes e não hesitamos em falar-lhe a respeito. Descreveremos aqui o que ele nos disse em resposta: "Olhem", disse o Mestre, "aquele que mora o tempo todo à beira-mar, às vezes deseja conhecer a variedade e o número de coisas preciosas escondidas no fundo do oceano que, dizem, é a mina de todas as pedras preciosas. De maneira semelhante, embora eu A tenha realizado e sentido Sua presença sempre a meu lado, um forte desejo surgiu em mim de experimentá-La, em tantas dessas formas e relações quanto Lhe agradasse revelar-me. Portanto, sempre que eu desejava ver ou desfrutá-La numa forma ou relação particular, orava persistentemente para que Ela Se revelasse a mim naquela forma ou relação. A Mãe misericordiosa, por Sua vez, pessoalmente fazia-me executar todo o necessário, supria-me com tudo que era pedido para aquela forma particular de prática espiritual e revelavaSe a mim daquela forma e naquela relação. Assim as diversas disciplinas foram executadas. Perfeito na disciplina de Madhura Bhava, o Mestre, como vimos, atingiu o plano último das Sadhanas dos estados devocionais. Sentiu, então, a necessidade de praticar a disciplina do
estado não-dual, que está além de todos os estados e é bem conhecido na Vedanta. Dizemos agora ao leitor como aquela necessidade sobreveio ao Mestre a pedido da Mãe Divina e como agora realizou Sua natureza sem forma, sem atributos, o que é conhecido como Turiya ou o Absoluto. 3. A mãe do Mestre, já avançada em idade, morava no templo de Kali em Dakshineswar, quando ele deu início à prática do estado não-dual. Com a morte de seu filho mais velho, Ramkumar, a velha senhora, sofrida, consolava-se com dificuldade, olhando com amor seus dois filhos que restavam. Mas logo depois, com os rumores de que seu filho mais novo e mais querido, Gadadhar, havia ficado louco, sua tristeza e pesar não conheceram limites. Trouxe o filho para casa e quando seu estado melhorou um pouco, com a ajuda de vários tipos de tratamento e de ritos propiciatórios, ficou esperançosa novamente e o fez casar-se. Mas quando Gadadhar voltou a Dakshineswar depois do casamento e o estado anterior voltou outra vez, a senhora não pôde mais controlar-se. Orando pela recuperação do filho, foi em primeiro lugar ao templo de Siva em seu vilarejo e depois ao velho templo de Siva em Mukundapur e iniciou um jejum até quase morrer. Quando o grande Deus Mahadeva lhe disse, numa visão, que seu filho estava no estado de intoxicação divina, ela ficou um pouco mais tranqüila. Contudo o mundo deixou de ter qualquer atrativo e foi ao encontro do filho em Dakshineswar pouco depois, determinada a passar o resto da vida às margens do Ganga pois, qual seria o objetivo para ela, pensou, ficar apegada ao mundo, naquela idade avançada, quando aqueles para quem e com quem estivera no mundo, estavam um a um abandonando-a e deixando o mundo para trás? Já relatamos ao leitor o festival ligado à oferenda de Mathur de uma "montanha de alimento". Decidida a passar o resto da vida em Dakshineswar, às margens do Ganga, a mãe do Mestre, deduzimos, chegou ao templo de Kali durante aquele Festival em 1864. A resolução da velha senhora concretizou-se. Nunca mais voltou a Kamarpukur, mas passou os doze últimos anos da vida perto do templo, até a morte, em 1876. Portanto não há dúvida que foi durante a estada da mãe em Dakshineswar que o Mestre foi iniciado no Mantra de Rama por Jatadhari, recebeu dele a imagem de Ramalala e praticou as atitudes de Vatsalya, Madhura e Vedanta. 4. Gostaríamos de relatar ao leitor um acontecimento demonstrando a total ausência de avareza por parte da mãe do Mestre, que ocorreu pouco tempo depois da chegada dela a Dakshineswar. Mathur, como já dissemos anteriormente, estava agora a cargo da administração do templo de Kali, praticando diversos atos meritórios, como a distribuição gratuita de grande quantidade de alimento. Como não havia limites para seu amor, atenção e reverência pelo Mestre, estava sempre esforçando-se em arranjar a continuidade eficiente do serviço do Mestre, mesmo depois de sua partida final. Mas jamais atreveu-se a lhe falar sobre isso devido à renúncia ardente que via no Mestre. Um dia, encontrou-se em grande dificuldade quando, a fim de conhecer a mente do Mestre, consultou Hriday para saber sobre a transferência de uma propriedade para ele: logo que tomou conhecimento dessa conversa, o Mestre correu como um louco para bater nele, dizendo: "Ah, seu patife, você quer fazer de mim um homem do mundo!" Essa idéia nunca abandonou Mathur; estava sempre queimando em sua mente mas não encontrava maneira de concretizá-la. Com a chegada da mãe do Mestre a Dakshineswar, encontrou a oportunidade há muito desejada de realizar sua intenção. Logo começou a se fazer muito amigo da senhora, visitando-a todos os dias, chamando-a de vovó e passando algum tempo conversando com ela. Um dia, encontrando um momento oportuno, fez-lhe um pedido sincero, assim: "Vovó, a senhora nunca me pede algo. Se a senhora de fato me considera íntimo, por favor, peça-me qualquer coisa que desejar." A velha senhora ficou embaraçada; mesmo depois de pensar muito, não pôde encontrar o que necessitava. Nessa situação teve de dizer: "Meu filho, Deus o abençoe! Devido a seus cuidados afetuosos, nada me faltou até agora. Quando precisar de algo pedirei." Assim dizendo, a velha senhora abrindo o armário, disse a Mathur: "Olhe, tenho tanta roupa e devido ao seu cuidado afetuoso, não tenho problema de comida e bebida. Você arranjou e está arranjando tudo; o que, então vou lhe pedir?" Mas Mathur não era homem de desistir facilmente. Insistiu: "Por favor peça algo mais." Depois de muito pensar, a mãe do Mestre encontrou algo de que necessitava. Disse: "Se você tem que me dar algo, por favor compre uma 'anna' de folha de fumo, porque quero as cinzas para meus dentes." Os olhos de Mathur, de mentalidade mundana, ficaram rasos d'água e ele saudou-a, dizendo: "Poderia outra mãe que não fosse a senhora dar à luz a um filho que a tudo renuncia?" Assim falando, mandou que fossem compradas as folhas de fumo para ela. 5. No período da prática de disciplina vedantista do Mestre, seu primo paterno, Haladhari, fazia o serviço de Radha-Govinda no templo de Dakshineswar. Era mais velho do que o Mestre e tinha algum conhecimento das escrituras, como o Bhagavata. Por isso sentia-se orgulhoso. Já dissemos ao leitor como ele ridicularizava o Mestre, criticando suas visões e estados espirituais,
atribuindo-os a um desarranjo no cérebro. Sofrendo com isso, o Mestre corria para a Mãe Divina para consultá-la, como sempre fazia. A Mãe consolava-o sempre e como nessa ocasião Haladhari ridicularizou-o, o Mestre entrou em êxtase e teve a visão de uma linda figura que instruiu-o a "permanecer em Bhavamukha". Concluímos que esses acontecimentos ocorreram pouco antes dele praticar a disciplina vedantista. Vendo o Mestre usar roupas, jóias e adereço femininos e viver como mulher durante a prática de Madhura Bhava, Haladhari concluiu que ele não tinha Autoconhecimento. Quando Tota Puri, o Paramahamsa errante, chegou a Dakshineswar e ali permaneceu, Haladhari, soubemos do próprio Mestre, vivia no templo de Kali e costumava, de vez em quando, discutir com ele a respeito das escrituras. Certo dia, quando Tota e Haladhari estavam discutindo sobre o Adhyatma Ramayana, o Mestre teve a visão de Rama, com Sita e Lakshmana. Tota provavelmente chegou a Dakshineswar ao final de 1865. Poucos meses depois Haladhari deixou o cargo de sacerdote devido à doença ou a outras razões e Akshay, filho de Ramkumar e sobrinho do Mestre, foi nomeado para seu lugar. 6. Faz parte da natureza do devoto jamais tentar realizar o estado de liberação descrito como Sayujya ou identificação com o Senhor, e como Nirvana ou ausência do corpo. Tenta sempre desfrutar a glória das diversas formas e nobres qualidades de Deus com a ajuda de estados devocionais específicos. A frase de Ramprasad, o devoto da Devi: "Não gosto de tornar-me açúcar, mas quero saboreá-lo"; é bem conhecida como um transbordamento natural do coração pleno de emoção dos devotos. Por isso o esforço do Mestre para alcançar o estado não-dual de consciência, além de todos os estados devocionais, pode parecer contraditório para muitas pessoas. Mas antes de chegarmos a essa conclusão devemos recordar-nos que o Mestre agora não era capaz de tomar qualquer iniciativa para fazer algo. Filho da Divina Mãe, como era, o Mestre dependia completamente d'Ela, depositava toda confiança n'Ela e sentia-se altamente gratificado em movimentar-se e ser guiado por Ela, sempre e de qualquer maneira. A Mãe Divina, por Sua vez, tomava para Si todas as responsabilidades dele e visando concretizar um objetivo particular Seu, atirou-o, sem que ele tomasse conhecimento, a um molde totalmente novo. Por revelação vinda da vontade da Mãe, o Mestre veio a saber qual era o objetivo especial de sua vida, no final de todas as Sadhanas e foi por causa desse conhecimento que assumiu, com alegria, a grande responsabilidade de fazer bem à humanidade, assim jogada sobre ele pela Mãe Divina, com quem era uno em amor, mantendo-se um pouco separado como personalidade individual. 7. Há, também, um outro ponto de vista, que revela a razão dele adotar o estado não-dual depois de obter à perfeição nas disciplinas da Madhura Bhava. A relação do campo dos estados devocionais com aquele além deles é a de efeito para causa. Pois, a imensa felicidade do campo da não-dualidade, que está além de todos os estados de amor, limita-se e manifesta-se então como desfrutador da felicidade da visão, do tato, etc., do campo desses estados. Para onde então, senão para o campo da não-dualidade, poderia sua mente ir, quando ela já tinha alcançado o limite máximo de Madhura Bhava, estágio final do campo dos estados devocionais? Embora esse argumento seja bastante razoável, o acontecimento acima prova, que o Mestre lançou-se à prática do estado não-dual somente depois de receber a sugestão da Mãe Divina. 8. Desejoso de banhar-se na confluência do mar com o Ganga e de ter a visão de Sri Jagannath em Puri, o instrutor errante Tota veio, vagando à vontade, da Índia Central até Bengala. Estava mergulhado nas práticas espirituais, às margens do sagrado rio Narmada, onde viveu sozinho durante longo período e alcançou o conhecimento imediato de Brahman, praticando disciplinas que conduzem ao Nirvikalpa Samadhi. Os velhos monges daquele lugar ainda hoje, são testemunhas desse fato. Quando realizou Brahman dessa maneira, surgiu em sua mente a vontade de andar a esmo e, sob o impulso daquele desejo, chegou agora à Índia Oriental onde viajou de um lugar de peregrinação para outro. Um conhecedor de Brahman está sempre contente no Ser. Quando está em Samadhi, está imerso em Brahman. Outras vezes vê o universo inteiro como manifestação de Brahman através de Maya e dedica-se a visitar templos, homens santos e lugares de peregrinação, experimentando Brahman neles. Seguindo essa prática Tota, conhecedor de Brahman, começou a visitar templos, homens santos e lugares de peregrinação, experimentando Brahman neles. Chegou a Dakshineswar em seu caminho de retorno às regiões noroeste deste país, depois de visitar os dois lugares de peregrinação acima mencionados. Não tinha o hábito de ficar mais de três dias no mesmo lugar. Veio, portanto, ao templo de Kali por somente três dias. De imediato, não compreendeu que, devido a Seu inescrutável jogo, a Mãe do universo o trouxera ali para que ele completasse seu próprio conhecimento e fizesse Seu filho praticar a disciplina vedantista com a ajuda dele. 9. Chegando ao templo de Kali, Tota Puri veio em primeiro lugar ao grande pórtico aberto
do Ghat. Usando somente uma peça de roupa, o Mestre estava então sentado, mentalmente ausente, parecendo uma pessoa qualquer. Logo que os olhos de Tota cairam no rosto do Mestre, radiante de austeridade e brilhando com a onda de devoção, foi atraído para ele e sentiu no fundo do coração que aquele não era um homem comum e que havia poucos tão preparados para a Sadhana vedantista. Tomado de curiosidade e espanto, Tota adiantou-se e caminhou até o Mestre, pensando: "Ah, será que há um tal aspirante preparado para a disciplina vedantista em Bengala, tão saturada de práticas tântricas?" Observando-o cuidadosamente, perguntou ao Mestre: "Você parece ser um aspirante bem qualificado; quer praticar disciplina vedantista?" O Mestre respondeu ao alto e desnudo mendicante de cabelos emaranhados: "Nada sei do que devo ou não fazer; minha Mãe sabe tudo; farei o que ela ordenar." Tota respondeu: "Então vá, pergunte à sua mãe e volte; porque talvez eu não fique aqui por muito tempo." Sem nada dizer em resposta, o Mestre foi ao templo da Mãe Divina. Ali, em êxtase, ouviu o conselho da Mãe Divina: "Vá aprender; foi para ensiná-lo que o monge veio aqui." 10. No estado divino de semi-consciência, o Mestre voltou então para Tota, o rosto brilhando de alegria e informou-o sobre a instrução da Mãe. Tomando conhecimento de que o Mestre chamava "Mãe" não era sua mãe terrena, mas a imagem da Devi instalada no templo, Tota, embora encantado com sua simplicidade infantil, pensou que tal atitude mental era devida à ignorância e à superstição. Podemos muito bem imaginar que com esse pensamento, os cantos dos lábios de Tota curvaram-se num sorriso de piedade e desprezo, pois seu agudo intelecto não lhe permitia ter grande consideração pelas divindades. Aceitava somente a idéia de um Isvara, de Deus, de acordo com a Vedanta, como distribuidor dos frutos dos Karmas dos Jivas. Segundo ele, além de se ter fé n'Ele, não havia necessidade de adorá-Lo, quando se tratasse de um aspirante dotado de auto-controle e dado à prática da meditação em Brahman. Se essa era sua concepção de Isvara, podemos bem imaginar sua idéia a respeito de Maya, o poder de Brahman, consistindo dos três Gunas. Essa é a razão pela qual o erudito monge A considerava somente uma ilusão e não sentia qualquer necessidade de admitir a existência de Sua personalidade, muito menos adorá-La e propiciá-La. Sentia no fundo do coração que só o esforço pessoal do aspirante era do que se precisava para se liberar da escravidão da ignorância e que não havia a menor necessidade de oração para se obter a graça misericordiosa de Brahman unido a Seu Poder, também chamado Isvara. Conseqüentemente achou que pessoas que oferecem orações, estão trabalhando sob a influência de impressões nascidas da ignorância. 11. Contudo, nada disse a esse respeito ao Mestre e apresentou outros assuntos, pensando que as impressões da mente do Mestre desapareceriam em breve quando, ao ser iniciado, começasse a praticar a disciplina do caminho do Conhecimento. Disse ao Mestre que teria de abandonar o cordão sagrado e o tufo de cabelo, antes da iniciação espiritual em Sannyasa. O Mestre hesitou um pouco e disse que não tinha a menor objeção se isso pudesse ser feito de forma velada pois não poderia de jeito algum fazê-lo publicamente, de vez que isso daria um terrível golpe no coração de sua velha e pesarosa mãe. O instrutor intinerante compreendeu a razão pela qual o Mestre desejava ser iniciado escondidamente, e disse: "Muito bem, vou iniciá-lo em particular, quando chegar o momento auspicioso." Então visando passar alguns dias um lugar adequado, chegou ao lindo Panchavati, situado ao norte do templo e ali estendeu seu assento. 12. Mais tarde, quando o dia auspicioso chegou, Tota pediu ao Mestre para fazer o Sraddha e outras cerimônias para agradar as almas dos antepassados e, quando aqueles ritos terminaram, Tota mandou-o oferecer Pinda segundo as prescrições das escrituras para propiciar sua própria alma. Pois, desde o momento de ser iniciado em Sannyasa, o aspirante renuncia totalmente à esperança e ao direito de alcançar qualquer um dos mundos como Bhuh, Bhuvah e Swah. É por isso que as escrituras prescrevem a oferenda Pinda a si mesmo. O Mestre submetia-se sem reserva a quem aceitasse como instrutor espiritual e acatava as ordens com fé absoluta. É, portanto, desnecessário dizer que ele seguiu ao pé da letra o que Tota agora lhe pedia para fazer. Fez o Sraddha e outros ritos preliminares, manteve o jejum necessário, apanhou na Sadhana Kutir (cabana) perto do Panchavati conforme instruções de seu instrutor todos os artigos para os ritos ligados à iniciação a Sannyasa e esperou a chegada do momento auspiciso para a cerimônia. Quando, duas horas antes do romper do dia o momento auspicioso de Brahma-muhurta chegou, Guru e discípulo encontraram-se na cabana. Terminados os ritos preliminares, o fogo Homa foi aceso. E os bosques e jardins em volta do Panchavati reverberaram com o som dos Mantras sagrados e profundos cantados antes de tomar o voto de completa renúncia por Deus - voto que desceu, em linha contínua, de Guru a discípulo desde o começo dos tempos até hoje e tem mantido a Índia como o principal país no campo da realização
de Brahman. O seio sensível e afetuoso da Bhagirathi de águas sagradas, vi brando com o toque delicioso daquele som, sentiu a infusão extraordinária de uma vida nova. Ela fluía, dançando de alegria, levando através de seus murmúrios, para todos os cantos, depois de muitas épocas, a mensagem de que um verdadeiro Sadhaka da Índia estava uma vez mais tomando o voto de renúncia total pelo bem de muitos nesse país e do mundo em sua totalidade. O Guru estava agora pronto para recitar os Mantras e o discípulo para repeti-los cuidadosamente e oferecer oblações ao fogo aceso. Em primeiro lugar foram pronunciados os mantras-orações: 13. "Que a verdade de Brahman supremo me alcance! Que a Realidade com as características de felicidade suprema me alcance! Que a indivisível, homogênea, doce realidade de Brahman manifeste-se em mim! Ó Ser Supremo, que és eternamente coexistente com Teu poder de revelar a consciência de Brahman a todos os Teus filhos - Devas, seres humanos e outros - a Ti possa eu, Teu filho e servo, ser um objeto especial de compaixão! Ó grande Senhor, destruidor do sonho mau dos mundos, destrói todos os meus sonhos maus, a percepção da dualidade! O Ser Supremo ofereço como oblações minhas forças vitais e controlando meus sentidos, coloco minha mente em Ti somente. Ó Uno que brilha, que diriges todo ser, remove de mim todos os defeitos que são obstáculos ao conhecimento correto e ordena que o conhecimento da Realidade, livre de absurdos e contradições, surja em mim! Que todas as coisas do mundo - o sol, o ar, a água fresca e pura dos rios, grãos como cevada e trigo, árvores etc., ordenados por Ti, iluminem e ajudem-me a alcançar o conhecimento da Verdade! Tu estás manifestado no mundo, Ó Brahman, em várias formas com força especial. Ofereço oblação a Ti que és fogo, visando alcançar, pela pureza do corpo e da mente, a capacidade de reter o Conhecimento da Realidade. Sê gracioso comigo!3" (3 Conteúdo do Trisuparna-Mantra. ) 14. Então começou o Viraja Homa: "Que os cinco elementos - terra, água, fogo, ar e éter em mim, sejam purificados. Livre dos defeitos produzidos pelo Rajoguna, que eu, pela virtude de oferecer oblação, alcance a natureza da Luz da Própria Consciência - Swaha! "Que possam os alentos vitais, Prana, Apana, Samana, Udana e Vyana em mim, sejam purificados! Livre dos defeitos produzidos pelo Rajoguna, que eu, pela virtude de oferecer oblação,alcance a natureza da Luz da Própria Consciência -Swaha! "Que os cinco envoltórios, corpo denso, ar, mente, intelecto e felicidade sejam purificados! Livre dos defeitos produzidos pelo Rajoguna, que eu, pela virtude de oferecer oblação, alcance a natureza da Luz da Própria Consciência - Swaha! "Que as impressões produzidas em mim pelos objetos, som, toque, vista, gosto e cheiro sejam purificados! Livre dos defeitos produzidos pelo Rajoguna, que eu, pela virtude de oferecer oblação, alcance a natureza da Luz da Própria Consciência - Swaha! "Que minha mente, fala, corpo, ações, sejam purificados! Livre dos defeitos produzidos pelo Rajoguna, que eu, pela virtude de oferecer oblação, alcance a natureza da Luz da Própria Cosnciência - Swaha! "Ó Ser de olhos vermelhos, habitando o corpo do fogo e capaz de destruir os obstáculos para alcançar o Conhecimento, desperta! Ó Aquele que satisfaz os desejos, ordena que todos os obstáculos para que eu atinja o Conhecimento sejam destruídos e o Conhecimento ouvido dos lábios do Guru desperte em minha mente! Que tudo que esteja em mim seja completamente purificado! Livre dos defeitos produzidos pelo Rajoguna, que eu, pela virtude de oferecer oblação, alcance a natureza da Luz da Própria Consciência - Swaha!" "Um reflexo de Consciência, eu, que sou da natureza do Próprio Brahman, ofereço como oblação no fogo - todo meu desejo por esposa, filho, riqueza, honra, beleza e outros objetos! Renuncio a todos - Swaha!" 15. Muitas oblações foram assim oferecidas e o Homa foi encerrado pelo discípulo, dizendo: "Renuncio de agora em diante ao desejo de alcançar o Bhuh e todos os outros mundos; asseguro a todos os seres do universo, liberdade de medo, por minha causa." Ele então ofereceu como oblação seu cordão sagrado e o tufo de cabelos, segundo as prescrições das escrituras. Depois vestindo um par de Kaupinas e a roupa ocre 4, (4 Alguns dentre nós dizem que Tota Puri deu o nome de "Ramakrishna" ao Mestre, ao iniciá-lo em Sannyasa Outros dizem que foi Mathuranath, grande devoto do Mestre e que o serviu com todo coração, o primeiro a chamá-lo por aquele nome. A primeira hipótese nos parece razoável. ) ofertada pelo
Guru, de acordo com o costume seguido pelas sucessivas gerações de Sadhakas desde o começo dos tempos, sentou-se ao lado de Tota para dele receber instrução. 16. Tota, um conhecedor de Brahman, encorajou agora o Mestre a praticar a contemplação de "Isto não", "Isto não", bem conhecida disciplina da Vedanta e a permanecer identificado com o Próprio Brahman. Disse ao Mestre: "Brahman, a única substância que é eternamente pura, eternamente desperto, não limitada pelo tempo, espaço ou causação, é absolutamente real. Pela influência de Maya, que torna o impossível, possível, parece que Ele está
dividido em nomes e formas. Brahman jamais está realmente dividido, pois, em Samadhi, nem mesmo uma partícula, por assim dizer, de tempo e de espaço, de nome e forma produzidos por Maya é percebida. O que quer que esteja, portanto, dentro dos limites de nome e forma jamais pode ser absolutamente real. Abandone este mundo irreal de nome e forma. Rompa a firme cadeia de nome e forma com a poderosa força de um leão e saia dela. Mergulhe dentro da realidade do Ser, que existe em você. Seja uno com Ele com a ajuda do Samadhi. Você verá então o universo formado de nome e forma desaparecer, por assim dizer, dentro do Vazio; você verá a consciência do pequeno "eu" fundir-se naquele imenso "Eu", onde cessa de funcionar; e terá o conhecimento imediato da Existência-Conhecimento-Bem-aventurança indivisível como você mesmo.' A consciência, com a ajuda da qual uma pessoa vê, conhece ou ouve outra, é pequena ou limitada. Tudo o que é limitado é sem valor, porque a suprema felicidade não está ali. Mas o conhecimento, estabelecido no qual uma pessoa se torna destituída da consciência de que vê, conhece ou ouve outra, é "Bhuma", o imenso ou o ilimitado. Com ajuda desse conhecimento ficase identificado com a suprema Felicidade. Aquela imensa e ilimitada consciência que é o Conhecedor todos os seres e cuja luz tudo revela - como pode ser conhecida pela mente e intelecto limitados? Como pode o Conhecedor de tudo ser conhecido?5 (5 Brihadaranyaka Upanishad. ) Tota tentou fazer o Mestre alcançar o Samadhi naquele dia, com a ajuda de diversos argumentos e citações conclusivas das escrituras. Fomos informados pelo Mestre que Tota esforçouse ao máximo naquela ocasião, para colocá-lo imediatamente no estado de consciência não-dual que ele mesmo havia alcançado depois de uma Sadhana de vida inteira. "Depois de iniciar-me", disse o Mestre: "o Desnudo ensinou-me muitas máximas que conduzem às conclusões da Vedanta e pediu-me para fazer que minha mente parasse de funcionar em todos os aspectos para mergulhar na meditação do Ser. Mas aconteceu que quando eu me sentava para meditar, não podia, de jeito algum, fazer a mente ir além dos limites de nome e forma e parar de funcionar. A mente retirava-se facilmente de todas as coisas, mas assim que o fazia, a forma intimamente familiar da Mãe Universal, constituída do brilho da pura consciência, aparecia como presença viva e fazia-me esquecer a renúncia de nomes e formas de toda descrição. Quando ouvia a máxima conclusiva e sentava-me para meditar, isto acontecia várias vezes. Quase desistindo de atingir o Nirvikalpa Samadhi, abri então os olhos e disse ao Desnudo: 'Não, não pode ser feito; não posso fazer a mente deixar de funcionar e forçá-la a mergulhar no Ser.” Repreendendo-me severamente, o Desnudo disse, muito agitado: 'O que! Não pode ser feito! Que tolice!' Olhando em volta da cabana e encontrando um caco de vidro, pegou-o e violentamente furou minha testa, entre as sobrancelhas, com sua ponta semelhante a uma agulha e disse: 'Reúna a mente neste ponto.' Com firme determinação sentei-me em meditação novamente e assim que a forma sagrada da Mãe Divina apareceu novamente em minha mente, como antes, considerei o conhecimento como uma espada e cortei mentalmente aquela forma em duas com a espada do conhecimento. Não restou então qualquer função na mente, que transcendeu rapidamente o campo de nomes e formas, fazendo-me mergulhar em Samadhi." 18. Durante muito tempo Tota ficou sentado ao lado do Mestre, que entrou em Samadhi da maneira acima descrita. Saindo silenciosamente da cabana, trancou a porta para que ninguém entrasse sem seu conhecimento e perturbasse o Mestre. Sentou-se no Panchavati, não longe da cabana e ficou esperando que o Mestre o chamasse para abrir a porta. O dia entrou pela noite. Os dias calma e vagarosamente rolaram. Ao final de três dias, quando Tota ainda não tinha ouvido o Mestre chamá-lo, foi tomado de curiosidade e espanto e deixou o assento para abrir a porta. Desejando ver o estado de seu discípulo, entrou na cabana e verificou que o Mestre estava sentado na mesma posição no qual ele o deixara e que não havia o menor sinal de função vital em seu corpo. Seu rosto, contudo, estava calmo e sereno, pleno de brilho. Compreendeu que o discípulo estava completamente morto para o mundo externo e que sua mente, mergulhada em Brahman, estava calma e imóvel como a chama imóvel de um lampião num lugar sem vento. Versado no mistério de Samadhi, Tota ficou perplexo e disse para si mesmo: "Ó, que maravilha! Como posso crer nos meus olhos? Será que esta grande alma realizou num dia o que pude experimentar somente como resultado de quarenta anos de austera Sadhana?" Tomado pela dúvida, Tota passou a examinar o estado do Mestre e escrutinou minuciosamente todos os sinais manifestados no corpo do discípulo. Examinou de forma especial se o coração estava batendo e se havia qualquer sinal de alento. Tocou repetidamente o corpo do discípulo, que estava numa postura firme, como um pedaço de madeira, duro e fixo. Mas não houve mudança ou modificação, nem qualquer retorno à consciência normal. Fora de si de alegria e de espanto, Tota gritou: "Ó, Maya divina! É realmente Samadhi - Nirvikalpa Samadhi, resultado final atingido pelo caminho do
conhecimento mencionado na Vedanta! Ah, que estranha é a Maya do Divino!" 19. Tota então empreendeu o processo de trazer o discípulo de volta ao mundo exterior. Profundos sons do Mantra, "Hari Aum", encheram a terra, a água e o céu do Panchavati. Já descrevemos em outro lugar (III.8) como, atraído pelo amor de seu discípulo e desejoso de torná-lo firmemente estabelecido no plano Nirvikalpa de consciência, Sri Tota ali passou dia após dia, mês após mês e, com a ajuda do Mestre, teve sua própria vida espiritualmente completada em todos os aspectos. Abstemo-nos, portanto, de repetir tudo aqui. Depois de viver ininterruptamente em Dakshineswar por onze meses, Tota partiu para o noroeste do país. Logo após sua partida surgiu na mente do Mestre uma forte determinação de permanecer em Samadhi contínuo no plano não dual de consciência. Já falamos ao leitor em outro lugar (III.2) como ele pôs em prática esta resolução, como pôde permanecer continuamente seis meses naquele elevado plano da não-dualidade, onde mesmo os Adhikarikas, que estão somente num plano pouco abaixo das Encarnações de Deus, não podem morar durante muito tempo, para não falar de Sadhakas comuns, os Jivakotis; e como, naquela época, um monge chegou ao templo de Kali e como, vindo a saber que a humanidade seria grandemente beneficiada no futuro com a sobrevivência do Mestre, ali viveu durante seis meses cuidando do seu corpo, salvando a vida, de diversas maneiras. 20. Antes de finalizarmos este capítulo, vamos descrever um acontecimento na vida de Mathur que teria terminado em catástrofe para ele se o Mestre não lhe tivesse concedido sua graça especial. A devoção e fé no Mestre já haviam aumentado enormemente, como resultado de Mathur ter visto diversos poderes divinos maravilhosos manifestados nele. Um acontecimento dessa época confirmou e estabilizou aquela sua devoção, fazendo com que Mathur tomasse refúgio total no Mestre durante toda a vida. Já havíamos ouvido do Mestre que Mathur, embora nascido de família pobre, tinha excelente aparência e foi por essa razão que Rani Rasmani deu-lhe a terceira filha, Karunamayi, em casamento e depois que ela faleceu, a filha mais nova, Jagadamba Dasi. Portanto, imediatamente após o casamento, uma profunda mudança ocorreu em sua situação e dentro de pouco tempo passou a ser o braço direito da sogra, devido à sua habilidade e inteligência. Já narramos como, após a morte da Rani Rasmani, ele conseguiu autoridade absoluta para o gerenciamento da propriedade da Rani. A segunda esposa de Mathur, Srimati Jagadamba Dasi, teve um ataque de disenteria. A doença gradualmente piorou tanto que renomados doutores e médicos de Calcutá que, a princípio estavam receosos por sua vida, depois vieram a perder toda esperança. Não somente Mathur agora iria perder a querida esposa, Jagadamba Dasi, mas também estava a ponto de ao mesmo tempo, ficar privado da autoridade sobre o gerenciamento da propriedade da sogra. Portanto é desnecessário dizer muito a respeito de sua condição mental, quando os doutores declararam o caso como desesperador. Ficou extremamente ansioso e veio a Dakshineswar e depois de saudar a Mãe do Universo, foi ao Panchavati à procura do Mestre. Vendo-o naquela tumultuada condição, o Mestre pediu-lhe afetuosamente para que se sentasse perto dele e fez-lhe perguntas sobre a causa de sua preocupação. Mathur caiu a seus pés e com a voz embargada de emoção e com os olhos cheios de lágrimas, informou o Mestre de tudo, dizendo, repetidamente, de forma comovente: "O pior neste caso, Pai, é que vou ficar privado do privilégio de servi-lo." Cheio de compaixão, vendo a luta infeliz de Mathur, o Mestre entrou em êxtase e disselhe: "Não tenha medo, sua esposa se recuperará." O dedicado Mathur considerava o Mestre o Próprio Deus, e assim, sob sua garantia foi, por assim dizer, trazido de volta à vida e despediu-se dele naquele dia. De volta a Janbazar viu que ocorrera uma súbita mudança para melhor no estado da paciente. "Jagadamba Dasi", disse o Mestre, lentamente recuperou-se depois daquele dia, mas os sofrimentos daquela doença tiveram que ser suportados por este corpo (mostrando seu próprio corpo). Como conseqüência de ter restabelecido Jagadamba Dasi, tive que sofrer de disenteria e outras doenças durante seis meses." Falando do maravilhoso serviço de amor que Mathur lhe dedicava, um dia o Mestre referiuse àquele acontecimento e disse-nos: "Foi para nada que Mathur me serviu durante quatorze anos? A Mãe Divina mostrou-lhe os diversos poderes maravilhosos através deste (mostrando seu próprio corpo). Foi por isso que ele me serviu com tanta devoção." CAPÍTULO XVI EPÍLOGO DA SADHANA DE VEDANTA DO MESTRE E SUA PRÁTICA DO ISLAMISMO
ASSUNTOS: 1. O Mestre seriamente doente. 2. A experiência auditiva do Mestre sobre permanecer em Bhavamukha. 3. Recordação das vidas passadas e a realização de Brahman. 4. O estado no qual todas determinações se realizam. 5. Luz nas extraordinárias realizações do Mestre. 6. Razões para que elas não fossem simultâneas. 7. Consciência não-dual como objetivo último de todas as disciplinas. 8. A realização ímpar do Mestre. 9. Sua prática do islamismo. 10. A chegada do Sufi Govinda Ray. 11. A decisão do Mestre depois de conversar com Govinda. 12. Sua iniciação por Govinda. 13. O comportamento do Mestre durante a Sadhana islâmica. 14. Seu significado. 15. Quão forte era a lembrança da Não-dualidade na consciência do Mestre. 16. Alguns exemplos.
1. O corpo robusto do Mestre ficou enfraquecido e doente durante alguns meses, seja como resultado da cura da doença fatal de Jagadamba Dasi, como mencionado antes, seja de seus esforços sobre-humanos durante seis longos meses para morar continuamente no plano de consciência não-dual. Ele nos disse que teve, então, grave crise de disenteria. Seu sobrinho Hriday empenhou-se em cuidar dele dia e noite. Mathur colocou-o sob tratamento com Gangaprasad Sen, o famoso médico e tomou medidas especiais para sua dieta etc. Embora seu corpo estivesse muito doente, é surpreendente ver quão extraordinariamente calma e feliz estava sua mente, livre da consciência do corpo. À menor sugestão, sua mente libertava-se da consciência do corpo e ao mesmo tempo das garras da doença e de todos os objetos e experiências do mundo e ficava absorvido no plano sutil de Nirvikalpa, onde nenhuma modificação mental pode perturbar. Mal ouvia as palavras Brahman, Atman ou Isvara, mergulhava em seu conteúdo, esquecendo todas as outras coisas e sua própria existência separada durante certo tempo. Está claro, pois, que apesar da severa dor em seu corpo devido à seriedade da doença, na realidade muito pouco a sentia. Mas a dor, devido à doença, ouvimos do próprio Mestre, fazia sua mente descer às vezes de planos elevados da experiência espiritual e tornava-se consciente do corpo. O Mestre dizia que foi durante essa época que os mais importantes Paramahamsas, seguidores da Vedanta, costumavam visitá-lo. Seu quarto estava sempre reverberando com os sons de suas discussões a respeito dos preceitos da Vedanta, como Neti, Neti (isto não, isto não), o Sat-Chit-Ananda (Existência-Conhecimento-Bem-aventurança Absolutos) Ayam-atma Brahma (este Ser é verdadeiramente Brahman) e assim por diante. Quando, durante as discussões desses elevados ensinamentos vedantistas, não chegavam a uma conclusão correta sobre alguma questão, o Mestre tornava-se o árbitro e decidia. Não é necessário acrescentar que estivesse ele sempre distraído, como as outras pessoas, por sua doença, nunca lhe teria sido possível ter tomado parte constantemente naquelas discussões filosóficas de difícil compreensão. 2. Foi aproximadamente no final do período de seis meses de sua absorção no plano Nirvikalpa, que o Mestre teve, como descrito em detalhe em outro lugar (II.8), a maravilhosa experiência auditiva, ordenando-lhe, pela terceira vez, que "permanecesse em Bhavamukha". Embora a chamemos experiência auditiva, o leitor deve entendê-la como realização, do fundo do coração, pois o Mestre não a ouviu, ao contrário das duas ocasiões anteriores, da boca de qualquer forma visível. Agora ela lhe vinha como consciência imediata da existência dessa idéia ou expressão de vontade na mente cósmica de Brahman onipresente. Sua mente estava então na maior parte do tempo, em completa unidade com o Ser Não-dual Absoluto e sempre que, por períodos breves, ele sentia um obscuro sentido de diferença do Absoluto, estava pousado na consciência de ser parte do Brahman que tudo penetra, com atributos (Savisesha-Brahman) que é o mesmo que a Mãe do universo (III.3). Devido a essa realização, o objetivo futuro de sua vida foi-lhe completamente revelado. Ele não necessitava de corpo, nem lhe foi deixado qualquer traço de 'vontade de viver', contudo veio ordem da Mãe universal para 'permanecer' em Bhavamukha". Disse o Mestre que deveria dali para frente viver no corpo de acordo com a vontade e propósito do jogo Divino. Para isso seu corpo deveria sobreviver e isso não teria sido possível se ele tivesse de permanecer identificado eternamente com Brahman. Daí a ordem divina. Veio também a conhecer suas vidas anteriores, através de Jatismaratwa (poder de se recordar de vidas passadas) como também ser um Adhikarika-purusha (aquele que tem comissão divina especial), ou melhor, uma Encarnação de Deus, eternamente puro por natureza, mas agora havia assumido um corpo e feito Sadhanas para deter o declínio da religião na época moderna e propiciar bem-estar à humanidade. Além disso veio a saber que foi visando cumprir algum propósito especial Seu que a Mãe universal trouxe-o à terra como filho de uma pobre família Brahmana, destituído de toda grandeza de poderes exteriores. Veio a saber também, que somente algumas pessoas seriam capazes de conhecer e entender, durante sua vida, o mistério daquele jogo da Mãe Divina e que logo que a maioria das pessoas começassem a compreendê-lo, a Mãe absorveria Seu filho em Sua própria Pessoa; mas que as
ondas espirituais que seu corpo e sua mente gerariam continuariam a se movimentar com força ainda maior, depois de seu desaparecimento, contribuindo para o bem-estar da humanidade. 3. Devemos recordar-nos de algumas afirmações das escrituras, se quisermos compreender como o Mestre pôde ter aquelas experiências extraordinárias. O aspirante, dizem as escrituras, alcança Jatismaratwa 1 (1 As vidas anteriores são recordadas ao se alcançar o conhecimento dos Samskaras (impressões passadas). Aforismos de Patanjali - 4.18. ) antes de se tornar totalmente estabelecido na Consciência Pura, com a ajuda do estado não-dual. Em outras palavras, com o pleno desenvolvimento dessa lembrança, sua memória alcança tal estado de maturidade, que o histórico completo de sua transmigração - como, onde, quantas vezes foi encerrado em corpos e que ações, boas ou más, fez -é-lhe revelado com grande nitidez. A experiência apresenta à sua mente, a lição da transitoriedade de tudo e completa futilidade do envolvimento no ciclo repetitivo de nascimentos e mortes e da busca de prazeres atingíveis através dela. O intenso desapego que então surge no coração do aspirante liberta-o de todos os desejos. 4. O Upanishad2 (2 Chandogya Upanishad, 8.2. ) diz que os desejos dessas pessoas se realizam que suas mentes podem, através do Samadhi, explorar qualquer esfera que desejar, seja dos deuses ou dos ancestrais ou de quaisquer outros seres extraterrestres. Patanjali, o grande sábio, menciona em seus Yoga Sutras, que todos os tipos de poderes ióguicos são alcançados por essas pessoas. Assim também o autor do Panchadasi, reconciliando as contradições aparentes envolvidas na coexistência dos poderes ióguicos e ausência de desejo na mesma pessoa, sustenta que, embora elas atinjam tais poderes maravilhosos, jamais utilizam para seus interesses particulares, pela simples razão que não possuem desejos, Totalmente dependentes da vontade de Deus, somente os Adhikarikas, entre eles usavam, às vezes, aqueles poderes para o bem-estar de muitos. É por isso que o autor de Panchadasi diz que essa pessoa tem o poder, mas não a necessidade, de mudar as circunstâncias mundanas, nas quais ela alcança o conhecimento de Brahman e passa seu tempo naquele estado. 5. Se estudarmos a vida do Mestre nessa época, à luz do acima mencionado, o 'como' e o 'porquê' da maioria de suas realizações extraordinários, senão todas elas, são plenamente revelados. Pode-se compreender, como resultado da oferenda de todo coração de si mesmo aos pés de lótus do Senhor, a maneira como ele pode alcançar o perfeito desapego e como, em tão pouco tempo, pôde ascender e firmemente estabelecer-se no plano Nirvikalpa de conhecimento de Brahman. Pode-se compreender como ele alcançou Jatismaratwa, através do qual teve o conhecimento imediato que o Uno, que Se manifestou como Rama e Krishna em épocas passadas e fez bem à humanidade, assumiu novamente um corpo e manifestou-Se atualmente como "Ramakrishna"(II.21). Pode-se compreender porque ele jamais utilizou os poderes divinos para o conforto do próprio corpo e mente, embora as manifestações desses poderes, para o bem da humanidade, ocorressem quase diariamente; porque ele podia e despertava nos outros o poder de realizar verdades espirituais com um simples olhar ou desejo; e porque sua extraordinária influência está se espalhando lenta mas efetivamente, conquistando domínio em todos os países do mundo. 6. Assim o Mestre conheceu seu passado e seu futuro quando desceu do estado não dual ao campo das idéias, onde ficou estabelecido final e totalmente. Mas todas essas experiências não parecem ter-lhe vindo subitamente num dia. Ele, deduzimos, teve o conhecimento perfeito de todas essas coisas após um ano de sua descida ao campo das idéias. Nessa ocasião a Mãe do universo esteve removendo, por assim dizer, véu após véu, diante de seus olhos, explicando-lhe com clareza tudo aquilo, dia após dia. Se nos perguntarem porque todas aquelas experiências não foram reveladas, simultaneamente ao Mestre, respondemos que, estabelecido no estado nãodual de consciência e completamente perdido na felicidade de Brahman, ele não tinha tempo ou inclinação para conhecê-las, até que a mudança na mente tomou a direção para o exterior. Assim cumpriu-se a oração sincera à Mãe do universo no começo de sua Sadhana: "Mãe, não sei o que devo fazer, aprenderei o que Tu mesma me ensinares." 7. Firmemente estabelecido no plano não-dual de consciência, o Mestre realizou também outro fato. Veio a sentir, no fundo do coração, que a realização da não-dualidade era o objetivo último de todos os tipos de disciplinas, pois, tendo feito Sadhanas segundo os ensinamentos de todas as religiões que prevaleciam na Índia, já estava convencido de que todas levam os aspirantes ao plano não-dual. Perguntado a respeito do estado não-dual, ele, portanto, dissenos várias vezes: "É o final, meu filho, o ápice, que vem por si mesmo na vida de todos os aspirantes, como o desenvolvimento último de seu amor por Deus. Saiba que se trata da última palavra de todas as crenças e as crenças são só caminhos (e não o objetivo)." 8. Tendo assim tido a experiência direta da Não-dualidade, a mente do Mestre foi tomada de ilimitada catolicidade. Passou a ter uma simpatia extraordinária por todas as
comunidades religiosas que ensinavam que o objetivo da vida humana era a realização de Deus. Mas não compreendeu a princípio que esta catolicidade e simpatia universal eram descobertas suas (IV.4) e que nenhum aspirante, nem mesmo o mais importante entre eles, pôde, no passado, alcançá-las de forma tão completa como ele. Veio a tomar conhecimento desse fato gradualmente, ao longo de seu contato com Sadhakas, sábios pertencentes às diversas comunidades religiosas no templo de Kali em Dakshineswar e em outros bem conhecidos lugares de peregrinação. Daquela época em diante não pôde mais suportar intolerância e exclusivismo em assuntos religiosos e tentou todos os meios para corrigir aquela visão estreita. 9. Podemos claramente compreender, de um acontecimento recente, como o estabelecimento na consciência não-dual conduziu a mente do Mestre a um estado de extrema liberalidade. O Mestre, já vimos, ficou doente durante alguns meses depois de ter alcançado o ápice de sua prática da atitude não-dual. O evento em referência ocorreu logo após sua recuperacão. Por essa época um ardente aspirante espiritual chamado Govinda Ray, que devia há muito tempo estar buscando Deus, chegou a Dakshineswar. Hriday contou-nos que ele era um Kshatriya por nascimento. Talvez fosse conhecedor das línguas persa e árabe. Tendo estudado as diversas doutrinas e entrado em contato com várias comunidades religiosas, foi por fim, atraído pela doutrina liberal do Islamismo e formalmente iniciado nela. Govinda, sedento da verdade, aceitou a fé islâmica, mas não podemos dizer o quanto seguiu suas maneiras sociais e seus costumes. Contaram-nos que logo que foi iniciado, dedicou-se ardentemente à leitura do Corão e às práticas religiosas prescritas por aquela escritura. Govinda era um ardente amante de Deus. O método de adorar a Deus segundo os ensinamentos e atitude mental prevalecente entre os Sufis, seguidores de uma das seitas islâmicas, parecem ter cativado sua mente; porque ele agora empenhava-se dia e noite na prática das atitudes devocionais, como a dos Derviches, devotos dessa seita. 10. De uma maneira ou outra, Govinda chegou ao templo de Kali em Dakshineswar e começou a passar o tempo com seu "Assento" estendido sob a sombra cheia de paz do Panchavati que, pensou, era um lugar favorável às práticas religiosas. Assim como os Sannyasins hindus, os faquires muçulmanos também eram bem-vindos ao templo de Kali da Rani Rasmani e a hospitalidade era igualmente oferecida a ambos. Portanto, enquanto ali estava, Govinda não tinha que sair para esmolar. Feliz, passava os dias em práticas espirituais segundo os ensinamentos de sua religião. 11. O Mestre foi atraído para o devoto Govinda e depois de conversar com ele, ficou encantado com sua fé sincera e seu amor a Deus. A mente do Mestre estava assim atraída para a religião islâmica. "Esse também", pensou: "é um caminho para a realização de Deus. A Mãe esportiva, fonte de Lila infinita, vem abençoando muitas pessoas com o atingimento de Seus pés de Lotus também por este caminho. Devo ver como as pessoas que n'Ela tomam refúgio são conduzidas à realização de suas aspirações espirituais. Vou ser iniciado por Govinda e empenharme na prática dessa atitude espiritual." 12. O pensamento foi imediatamente seguido pela ação. O Mestre expressou seu desejo a Govinda e foi iniciado. Empenhou-se na prática do Islamismo segundo suas regras. O Mestre dizia: "Eu repetia a sílaba sagrada 'Allah' com grande devoção, usava roupas como os muçulmanos, dizia o Namaz três vezes ao dia e nem me sentia inclinado a ver as divindades hindus, isso para não falar em saudá-las à maneira hindu de pensar, desapareceu de minha mente. Passei três dias naquela atitude e tive a completa realização do resultado das práticas segundo aquela fé." Por ocasião da prática do Islamismo, o Mestre teve primeiro a visão de uma figura brilhante, que impressionava, com longa barba; em seguida, alcançou o conhecimento de Brahman que tudo permeia com atributos e, finalmente, fundiu-se no Brahman sem atributos, o Absoluto. 13. Segundo Hriday, por ocasião da prática do Islamismo o Mestre quis comer alimento muçulmano. Foi somente o pedido solícito de Mathur que o impediu de fazê-lo. Sabendo que a natureza infantil do Mestre não se contentaria se aquele desejo não fosse pelo menos parcialmente satisfeito, Mathur mandou trazer um cozinheiro e sob as instruções do qual um cozinheiro Brahmin preparou a comida do Mestre à moda muçulmana. O Mestre nem uma vez entrou no pátio interno do templo de Kali enquanto praticava o Islamismo, mas permaneceu na mansão de Mathur, situada do lado de fora. 14. Do acontecimento mencionado acima, fica claro o quanto simpática tornou-se a mente do Mestre em relação às outras comunidades religiosas depois de ter alcançado perfeição na disciplina vedantista. Fica também claro como tendo somente fé no conhecimento vedantista, os hindus e maometanos da Índia podem harmonizar-se uns com os outros e desenvolver um sentimento fraternal, pois caso contrário, como o Mestre costumava dizer: "Existe uma montanha
de diferença entre eles. Seus pensamentos e crenças, atos e comportamento tornaram-se incompatíveis uns com os outros, apesar de viverem juntos por tanto tempo." Será que a prática do islamismo pelo Mestre, a Encarnação Divina desta época, indicou que a diferença algum dia desapareceria e tanto hindus quanto muçulmanos se abraçarão com amor? 15. Como resultado de estar estabelecido no plano de consciência Nirvikalpa, a memória da Não-dualidade costumava ser subitamente despertada no Mestre e sua mente ficava submergida no Absoluto mesmo com a menor sugestão recebida das visões e das pessoas vivendo estritamente dentro dos limites do plano da dualidade. Vimos como aquele estado lhe vinha pela associação de idéias, mesmo sem desejá-lo. É, pois, desnecessário acrescentar que ele poderia alcançar a qualquer momento aquele plano, por um simples desejo. Ficará claro, pelos incidentes que se seguem, embora pequenos, como era profundo e amplo seu estado não-dual e como sua mente tinha uma atração natural por ele. 16. Os jardineiros não achavam conveniente semear verduras no espaçoso templo de Dakshineswar, coberto pelo capim, durante a estação das chuvas. Por isso os capinadores foram autorizados a cortar e retirar o capim. Um dia, tendo obtido permissão para apanhar capim sem pagar nada, um velho cortador começou a cortá-lo e arrumá-lo em um fardo e estava pronto a levá-lo ao mercado para vendê-lo. O Mestre viu que o velho havia cortado, por cobiça, muito capim e que estava acima de suas forças levá-lo ou mesmo levantar aquele fardo. Mas o cortador indigente recusou-se a reconhecer esse fato e apesar de repetidos esforços para levantar aquele grande peso e colocá-lo em sua cabeça, não conseguiu. Olhando aquela cena, o Mestre foi tomado de emoção espiritual e pensou: "Ah, o Ser, o conhecimento infinito mora no interior e contudo tanta tolice e ignorância no exterior!" Então exclamando, "Ó Rama, inescrutável é Teu jogo!" entrou em êxtase. Um dia em Dakshineswar o Mestre viu uma linda bor boleta voando com um pequeno graveto preso à cauda. A princípio ficou penalizado pensando que algum garoto travesso havia feito aquilo, mas logo em seguida teve uma intuição e rindo, disse: "Ó Rama, Tu mesmo Te conduziste a tal situação!" Certa vez um determinado lugar do jardim do templo de Kali estava coberto de grama durva que havia recentemente brotado e tinha uma linda aparência. Enquanto olhava para ela, o Mestre transcendeu a consciência normal e sentia-se identificado com aquele lugar, quando um homem passou por aquele campo. Com isso o Mestre ficou bastante inquieto, sentindo uma dor insuportável em seu peito. Mencionando aquele acontecimento, disse-nos mais tarde: "Senti então aquela espécie de dor que se sente quando alguém pisa no peito de uma pessoa. Aquele estado de Bhavasamadhi é muito doloroso. Embora eu o tenha tido por somente seis horas, mesmo assim tornou-se insuportável." Um dia o Mestre, em Bhavasamadhi, estava olhando o Ganga, no espaçoso Ghat de pórtico aberto. Dois barcos estavam ancorados no Ghat e os barqueiros discutiam por qualquer razão. A briga tornou-se gradualmente acirrada e o homem mais robusto deu um forte tapa nas costas do mais fraco. A isso o Mestre subitamente deu um grito de dor. Hriday ouviu-o do templo de Kali, dirigiu-se para lá rapidamente e viu que as costas do Mestre estavam vermelhas e inchadas. Tomado de raiva, Hriday disse repetidamente: "Tio, mostre-me o homem que lhe bateu; vou arrancar sua cabeça." Depois, quando o Mestre havia se acalmado um pouco, Hriday, atônito ao ouvir o ocorrido, pensou: "Será possível?" Girish Chandra Ghosh ouviu esse acontecimento dos lábios do Mestre e contou-nos. Inúmeros eventos dessa natureza a respeito do Mestre podem ser mencionados, mas nos abstemos de narrá-los para evitar o supérfluo. CAPÍTULO XVII A VISITA
DO MESTRE AO SEU VILAREJO NATAL
ASSUNTOS: 1. A visita do Mestre a Kamarpukur com Hriday e a Bhairavi. 2. Entre amigos e parentes. 3. A Santa Mãe em Kamarpukur. 4. A conduta do Mestre com todos. 5. O Mestre a respeito do progresso espiritual de alguns deles. 6. O sentimento do Mestre em Kamarpukur. 7. O amor do Mestre por seu vilarejo natal. 8. O Mestre cumprindo o dever com sua esposa. 9. O sucesso do Mestre nesse caso. 10. A apreensão da Brahmani. 11. A Brahmani em estado de orgulho e egoísmo. 12. Um acontecimento ilustrativo. 13. A discussão de Hriday com a Brahmani. 14. O reconhecimento pela Brahmani do seu erro e sua partida. 15. O regresso do Mestre a Dakshineswar.
1. Como já foi dito, o Mestre sofreu durante seis meses e quando ficou curado de sua enfermidade, notou-se que sua mente, em lugar de tender constantemente para a Não-
dualidade, havia se habituado a morar no estado de Bhavamukha no qual a multiplicidade e Nãodualidade (Dvaita e Advaita) são simultaneamente percebidas. Mas seu corpo não era tão forte e saudável quanto antes e temia-se que sua disenteria pudesse voltar por falta de água pura, já que as águas do Ganga estavam salinas por ser estação chuvosa. Decidiu-se então que ele iria a Kamarpukur, sua terra natal por alguns meses. Foram tomadas medidas para sua viagem em 1867. A dedicada Jagadamba Dasi, esposa de Mathur Babu, sabia que o lar do Mestre continuava pobre como o de Siva. Por isso tomou, com muito cuidado, todas as medidas a fim de obter os artigos necessários para que o "pai" não tivesse qualquer dificuldade (IV.1). O Mestre então partiu, num dia auspicioso. Hriday e a Bhairavi acompanharam-no, mas sua idosa mãe, aferrada à antiga decisão de viver perto do Ganga, permaneceu em Dakshineswar sob os cuidados de Mathur. 2. Havia oito anos que o Mestre não ia a Kamarpukur. Por isso seus amigos e parentes estavam ansiosos para vê-lo. Não é necessário dizer que havia uma razão especial, porque muitas notícias estranhas a seu respeito chegavam de vez em quando a seus ouvidos. Souberam que ele gritava: "Hari, Hari", vestido de mulher, que havia se tornado monge, que repetia continuamente "Allah, Allah", comportando-se assim de maneira estranha. Mas logo que o Mestre permaneceu entre eles, viram como eram sem fundamento as notícias, porque constataram que ele era o mesmo de sempre. A mesma amabilidade, a mesma alegria afetuosa, a mesma veracidade austera, a mesma profunda sensibilidade religiosa e a mesma onda de transbordante de emoção ao ouvir o nome de Hari - todas essas suas antigas qualidades numa intensidade ainda maior do que antes. A única mudança que viram nele, foi que seu corpo e sua mente tinham um tal brilho indescritível e celestial que hesitavam em chegar à sua presença subitamente ou falar de assuntos mundanos sem que ele mesmo provocasse. Também sentiam que todas as suas ansiedades mundanas dissolviam-se no ar quando estavam em sua presença e que, ao invés, fluía em seus corações uma corrente serena e tranqüila de felicidade e de paz. Além disso, quando estavam longe dele, experimentavam forte e inexplicável desejo de ir até ele uma vez mais. Assim, havia um fluir incessante de felicidade naquela família pobre por ele estar com ela depois de tanto tempo. E, a fim de encher a taça de felicidade até a borda, um mensageiro, sob orientação das senhoras, foi enviado a Jayrambati, vilarejo do sogro do Mestre, para trazer sua esposa. O Mestre soube, mas não expressou nem aprovação nem desaprovação. Até agora sua esposa o havia encontrado somente uma vez após o casamento. Isto ocorreu de acordo com o costume da família, pelo fato do Mestre ter sido levado a Jayrambati quando ela tinha sete anos. Mas ela era então muito jovem para entender o que o casamento significava. Portanto a única coisa relacionada com o acontecimento que ela reteve na memória foi que o Mestre, ao chegar à casa de seu pai com Hriday, trouxe-lhe muitas flores de lótus, tirou-a de um lugar reservado da casa onde ela havia se escondido, adorou seus pés com aquelas flores, enquanto ela se encolhia por timidez, seis anos mais tarde, ela foi levada a Kamarpukur, já com treze anos. Dessa vez passou ali um mês, mas não teve a boa sorte de ver o Mestre ou sua sogra, pois ambos estavam em Dakshineswar. Voltou novamente seis meses após à casa do sogro para passar um mês e meio, mas não pôde ver nenhum dos dois pela mesma razão. 3. Três ou quatro meses depois da volta de sua visita à casa do sogro chegaram notícias da vinda do Mestre a Kamarpukur e o pedido para ela reunir-se a ele. Havia completado quatorze anos, seis ou sete meses antes desse acontecimento. Foi praticamente o primeiro encontro de fato com o marido, depois do casamento. 4. Parece que o Mestre permaneceu então em Kamarpukur durante seis ou sete meses. Os amigos de seus primeiros anos e todos os homens e mulheres do vilarejo que o conheciam juntaram-se a ele como antes, tentando fazê-lo feliz. O Mestre também estava muito satisfeito de vê-los, depois de tanto tempo. Ao misturar-se com homens e mulheres de Kamarpukur que viviam vida estritamente mundana, o Mestre sentiu uma alegria semelhante àquela que os grandes pensadores e eruditos sentem quando, nas horas de lazer, depois de duras tarefas, reúnem-se às crianças em seus divertimentos, sem rumo e sem sentido. Ele, contudo, sentiu fortemente que eles deveriam tornar-se conscientes da transitoriedade desta vida e embora vivendo no mundo, deveriam gradualmente alcançar auto-controle e aprender a confiar em Deus em todos os assuntos. Isso deduzimos da maneira pela qual ele sempre nos ensinava as mesmas coisas por meio de brincadeira e alegria, felicidade e encantamento. Descobrindo que, embora vivendo no estreito mundo de um pequeno vilarejo, alguns haviam feito progressos inesperados na vida espiritual, ele foi tomado de admiração pela glória inconcebível de Deus. Contou-nos, muitas vezes, um acontecimento para ilustrar isso. 5. O Mestre disse que um dia, naquela época, estava descansando em seu quarto, depois do almoço. Algumas senhoras vizinhas vieram vê-lo, sentaram-se próximas dele e começaram a
conversar sobre assuntos espirituais. O Mestre subitamente entrou em êxtase e sentiu que era um peixe brincando alegremente, às vezes chegando até a superfície, às vezes mergulhando profundamente no oceano de Existência-Conhecimento-Bem-aventurança. O Mestre costumava entrar em tais êxtases com muita freqüência enquanto conversava. Portanto, sem estarem conscientes do que acontecia, as senhoras expressavam suas próprias opiniões, o que criou muito barulho. Uma delas proibiu as outras de agirem assim e pediu-lhes que se conservassem caladas até que o êxtase terminasse. Ela disse: "Ele agora tornou-se um peixe nadando no mar de Existência-Conhecimento-Bem-Aventurança. Se fizerem barulho, a felicidade dele será interrompida." Embora muitas delas não acreditassem em suas palavras, todas permaneceram quietas. Quando desceu daquele estado e lhe perguntaram sobre sua experiência, o Mestre disse: "Sim, o que ela diz é verdade. Que estranho! Como ela pôde sabê-lo?" 6. Parece-nos que as visitas diárias dos homens e das mulheres de Kamarpukur agora pareciam ser uma grande novidade para o Mestre. Sentia-se como alguém que tivesse voltado para casa, vindo de um lugar distante e para quem cada pessoa e objeto do vilarejo pareciam novos. Embora o Mestre tivesse estado ausente de sua terra natal pelo curto período de oito anos, uma violenta tempestade de lutas espirituais havia assolado seu coração durante aquele período produzindo uma mudança radical; durante aqueles oito anos esquecera-se de si mesmo e do mundo e elevara-se muito além dos limites de tempo e de espaço. Mas quando descia, voltava transfigurado pelo conhecimento de que Brahman existia em todos os seres e via que todas as pessoas e coisas estavam embebidas em extraordinária luz nova. É bem conhecido em filosofia que nossa consciência de tempo e a medida de sua duração surgem da sucessão de nossos acontecimentos mentais. Por isso um curto período, durante o qual grande número de pensamentos surge e mergulha em nossas mentes, parece-nos muito longo. Fica-se admirado ao se pensar quantas tumultuosas ondas de pensamentos e de emoções surgiram na mente do Mestre durante esse período. Não é, portanto, surpreendente que tal período lhe parecesse tão longo? 7. Ficamos admirados ao pensar na maravilhosa relação de afeto que o Mestre havia estabelecido com todas as pessoas de Kamarpukur. Homens e mulheres de todas as famílias, incluindo os Lahas, os Brahmanas, os ferreiros, os carpinteiros, os negociantes de ouro e outros estavam todos ligados a ele, num relacionamento de amor reverente. Ficamos espantados ao ouvir o Mestre falar, em diversas ocasiões, com grande prazer, sobre a devoção e o afeto de um grande número de homens e mulheres por ele. Entre eles estavam a pura e devota Prasanna, irmã viúva de Dharmadas Laha; o amigo do Mestre, Gaya-vishnu Laha, filho de Dharmadas; Srinivas Sankhari, dotado de fé sincera; as devotas da família Pyne e Bhikshamata Dhani, a babá do Mestre, que pertencia à classe dos ferreiros. Todos permaneciam a maior parte do tempo com o Mestre, naqueles dias em Kamarpukur. Os que não podiam fazê-lo, devido às obrigações domésticas ou outros negócios, vinham de manhã ou ao meio-dia, ou à tarde, sempre que tinham um momento livre. Quando chegavam, as senhoras traziam vários doces e pratos deliciosos e sentiam-se muito felizes em alimentar o Mestre. Já demos ao leitor em outro lugar (IV.1) uma indicação de como o Mestre, apesar de viver com a família em casa, cercado pelas pessoas no vilarejo que se comportavam de maneira tão gentil, sempre permaneceu divinamente inspirado. Portanto, é desnecessário repeti-lo aqui. 8. Quando veio desta vez a Kamarpukur, o Mestre deu muita atenção ao cumprimento de uma outra obrigação. A princípio esteve indiferente à vinda de sua esposa a Kamarpukur, mas agora teve a intenção de dar-lhe educação e treiná-la para seu bem-estar. Sabendo que o Mestre era casado, Tota Puri, o instrutor que o havia iniciado em Sannyasa, havia-lhe dito certa vez: "Que importa? Somente ele pode ser olhado como realmente estabelecido em Brahma, cuja renúncia, desapego, discriminação e conhecimento permanecem intactos em todos os aspectos, apesar de sua esposa estar com ele. Só pode ser considerado como tendo realmente atingido o conhecimento de Brahman, aquele que pode olhar igualmente tanto o homem quanto a mulher, como o Ser e comportar-se de acordo. Outros que têm consciência aguda da diferença de sexos (e se mantém longe do sexo oposto como medida de proteção) podem ser bons Sadhakas, mas ainda estão muito longe do conhecimento de Brahman." Esse comentário de Tota Puri veio à mente do Mestre e induziu-o a testar o conhecimento alcançado pelas práticas espirituais que se estenderam durante longo período, bem como zelar pelo bem-estar de sua esposa. 9. O Mestre jamais pôde negligenciar ou deixar inacabada qualquer coisa que considerasse obrigação. O mesmo comportamento valeu aqui também. Não parou de educar a jovem esposa que dependia completamente dele com relação a tudo ligado a seu bem-estar mundano e espiritual. Dali em diante ficou especialmente atento para que ela aprendesse as obrigações domésticas,
conhecesse o caráter das pessoas, desse bom uso ao dinheiro e sobretudo se auto-entregasse a Deus e se comportasse corretamente de acordo com o lugar, tempo e circunstâncias (III.2 e 4). Em muitos outros lugares soubemos quão abrangente foi o resultado do ensinamento que o Mestre lhe transmitiu, reforçando-o com o exemplo de sua própria vida de continência ininterrupta. Basta dizer que a Santa Mãe, como ela era chamada pelos devotos de Sri Ramakrishna, ficou extremamente feliz com essas experiências. Em todos os aspectos continuou recebendo atenção afetuosa do Mestre, destituída, contudo, de qualquer traço de luxúria e ela, de sua parte, ofereceu-lhe adoração durante toda sua vida como seu Ideal Escolhido, seguindo seus passos e moldando sua vida de acordo com seus ensinamentos. 10. A Bhairavi Brahmani em muitas ocasiões não compreendeu o Mestre quando ele adiantava-se em cumprir seu dever para sua esposa. Já vimos que ela tentou fazer o Mestre desistir de ser iniciado em Sannyasa quando ele conheceu Tota Puri (III.2). Isso porque pensou que o pensamento de Deus seria totalmente arrancado da mente do Mestre se ele fosse assim iniciado. Mesmo agora um pouco dessa apreensão ainda tomava conta de seu coração. Parece que ela achava que prejudicaria a continência do Mestre se ele se misturasse tão intimamente com a esposa. Mas o Mestre não pôde ceder às idéias da Brahmani, como não pôde fazê-lo quando ela demonstrou apreensão pela associação dele com Tota Puri. A Brahmani ficou bastante magoada com a atitude do Mestre, o que provocou egoísmo, agravado pelo orgulho e pela vaidade, resultando muitas vezes em perda de fé no Mestre. Hriday contou-nos que de vez em quando ela expressava seus sentimentos. Por exemplo, se alguém diante dela fizesse uma pergunta sobre algum assunto espiritual e dissesse que iria perguntar a Sri Ramakrishna e conhecer sua opinião a esse respeito, enfurecia-se e dizia: "O que ele pode dizer? Fui eu quem abriu seus olhos." Ou discutia com as mulheres da família por motivos banais, mesmo sem qualquer razão. Mas o Mestre permaneceu calmo apesar das palavras e do comportamento opressivo dela e não cessava de demonstrar-lhe devoção ou de reverenciá-la como antes. Instruída pelo Mestre, a Santa Mãe apresentava a Brahmani o respeito devido à sua própria sogra e sempre empenhou-se no seu serviço com amor e devoção; considerando-se uma jovem ignorante, não protestava contra quaisquer de suas palavras ou ações. 11. Quando o orgulho e o egoísmo estão em ascenção, até a inteligência de um homem sensato torna-se anuviada. Devido ao seu próprio comportamento perverso, começa a experimentar baques e golpes a cada momento. A frustração repetida dessas experiências, se ele ainda tiver algum bom senso, lhe ensinará seu erro e o trará de volta ao estado normal. Tal foi o caso da erudita Brahmani agora. Incapaz, sob a influência de seu orgulho excessivo, de olhar de maneira adequada as pessoas e as circunstâncias, um dia criou uma situação bastante embaraçosa. O incidente foi o seguinte: 12. Já falamos de Srinivas Sankhari. Embora não tivesse nascido de família importante, Srinivas estava acima da maioria dos Brahmanas no que diz respeito à devoção a Deus. Certo dia nessa época, veio ao Mestre para obter Prasad de Raghuvir. Não é necessário dizer que o Mestre e todos os membros da família ficaram muito felizes de terem Srinivas com eles. A devota Brahmani também estava satisfeita de ver a fé e a devoção de Srinivas. Conversaram sobre vários assuntos devocionais até o meio-dia, quando a oferenda a Raghuvir e outros serviços terminaram e Srinivas sentou-se para comer. Quando terminou e estava pronto para limpar, segundo o costume, o lugar onde havia comido, a Brahmani proibiu-o. "Nós mesmos o faremos." Sob a insistência da Brahmani, Srinivas não teve outra alternativa senão esquecer o assunto e voltar para casa. 13. Nos vilarejos, naqueles dias, dominados como estavam por regras e regulamentos de casta, já haviam surgido muitas contendas e ressentimentos devido à transgressão daquelas regras. O mesmo aconteceu agora pois, as mulheres Brahmanas que visitavam o Mestre, levantaram grande objeção à retirada dos restos de Srinivas pela Bhairavi, que era de casta Brahmana. A Bhairavi não admitiu a validade da objeção. A discussão aumentou gradativamente. Hriday, sobrinho do Mestre, soube do acontecimento. Pressentindo que uma grande briga poderia surgir com aquele evento banal, Hriday pediu à Brahmani para não violar o costume vigente, mas ela não lhe deu atenção. Hriday inflamou-se e seguiu-se uma discussão barulhenta entre ele e a Brahmani. Hriday disse: "Se você assim proceder, não lhe permitiremos permanecer na casa." A Brahmani não era do tipo de pessoa que se intimidasse com ameaças. Respondeu: "E se você não deixar? Manasa1 (1 Manasa - deusa das cobras. A Brahmani comparou-se assim, a uma cobra zangada. ) irá dormir no quarto de Sitala2." ( 2 O templo no qual Sitala, a deusa, foi instalada.) Todos os outros membros da família intermediaram, tentando demover a Brahmani de limpar o lugar. Isso pôs fim à disputa.
14. Embora ela tenha cedido, seu orgulho ficou severamente ferido naquele dia. Quando sua cólera passou, ela pensou calmamente sobre o assunto e compreendeu o próprio erro. Pensou que enquanto continuasse repetidamente a cometer tais erros, não deveria continuar ali. Quando os olhos de um aspirante possuidor de aguda visão interior caem de uma maneira ou outra em seu próprio coração, nenhuma idéia impura ali escondida pode ocultar-se dele. Isto foi o que agora aconteceu a Brahmani. A introspecção tornou-a consciente da mudança perversa de sua atitude para com o Mestre e a fez arrepender-se. Alguns dias se passaram quando então ela fez guirlandas de várias flores, esfregou-se com pasta de sândalo e tendo lindamente adorado o Mestre como Sri Gauranga, implorou-lhe perdão, com todo o coração. Em seguida, controlando-se cautelosamente e oferecendo o coração e a alma a Deus, deixou Kamarpukur e tomou o caminho de Kasi, a morada do Senhor do universo. Assim a Brahmani deixou finalmente o Mestre depois de ter passado seis longos anos ininterruptos com ele. 15. O Mestre passou cerca de sete meses em várias atitudes espirituais em Kamarpukur e voltou a Dakshineswar (provavelmente no final de 1867) quando já havia recuperado a saúde e estava quase tão forte e saudável quanto antes. Um importante acontecimento ocorreu em sua vida pouco depois de sua volta. Vamos apresentá-lo ao leitor. CAPÍTULO XVIII PEREGRINAÇÃO DO MESTRE E HISTÓRIA DE HRIDAYRAM ASSUNTOS; 1. Organizada a peregrinação do Mestre. 2. O dia da partida. 3. Arranjos para a peregrinação. 4. Visita a Sri Vaidyanath e serviço aos pobres. 5. Um acontecimento desagradável no caminho. 6. Estada em Kedar-ghat. 7. O Mestre e Trailanga Swami. 8. O comportamento do Mestre em Prayag. 9. A visita do Mestre a Nidhuvan etc. em Vrindavan. 10. Retorno a Kasi. 11. Encontrando a Brahmani em Kasi. 12. A visita do Mestre a Mahesh, o tocador de Vina. 13. Volta a Dakshineswar e fatos subsequentes. 14. Morte da esposa de Hriday. 15. Hriday em Bhavasamadhi. 16. A visão maravilhosa de Hriday. 17. A mente de Hriday tornou-se embotada. 18. Obstáculo à Sadhana de Hriday. 19. Hriday celebrando o culto de outono de Durga. 20. A visão de Hriday, do Mestre. 21. A última ocasião do culto de Durga.
1. Mathuranath e sua esposa preparavam-se para visitar os lugares santos do noroeste da Índia. O começo da viagem foi marcado para o mês de janeiro e ficou acertado que muitas pessoas, incluindo o filho do Guru de Mathur e outros, iriam com eles. Mathur e a esposa fizeram sinceros pedidos ao Mestre para que ele fosse também. O Mestre concordou em acompanhá-los, levando a mãe idosa1 (1 Alguns dizem que a mãe do Mestre não foi em peregrinação com ele, mas Hriday nos disse que ela foi. ) e o sobrinho Hriday. 2. Mathur partiu com o Mestre e os outros no auspicioso dia 27 de janeiro de 1868. Já relatamos ao leitor, em outra parte (IV.3), muitos acontecimentos dessa peregrinação do Mestre. Vamos, portanto, mencionar de forma abreviada, o que ouvimos de Hriday sobre ela. 3. Cerca de cento e vinte cinco pessoas ao todo - Sri Ramakrishna, sua mãe, Mathur, a esposa, a enteada, o filho de seu Guru, Hriday, um cozinheiro Brahmin, um porteiro, empregados e empregadas - faziam parte do grupo em peregrinação. Um vagão de segunda classe e outro de terceira foram reservados para eles pela Cia. Ferroviária e ficou acertado que aqueles quatro vagões poderiam ser desatado, em qualquer lugar entre Calcutá e Kasi, se fosse necessário. 4. Mathur e outros visitaram Sri Vidyanath em Deoghar durante a viagem e ali descansaram alguns dias, quando ocorreu um importante acontecimento. O coração do Mestre encheu-se de compaixão ao ver a luta infeliz de homens e mulheres de um pobre vilarejo da região. Um dia pediu a Mathur para que os alimentasse e lhes desse uma muda de roupa (III.7). Mathur agiu de acordo com a vontade do Mestre. 5. De Deoghar, Mathur foi direto a Kasi. Nada importante aconteceu no caminho, exceto quando Sri Ramakrishna e Hriday desceram numa certa estação perto de Kasi e o trem partiu antes que pudessem tomá-lo. Mathur ficou preocupado e telegrafou de Kasi informando que eles deveriam ser embarcados no próximo trem. Não tiveram, contudo, que esperar pelo próximo trem. Rajendralal Bandyopadhyaya, importante funcionário da Cia. Ferroviária chegou, em função de supervisão, num trem especial e logo depois, vendo-os naquela dificuldade, levou-os para Kasi. Rajendralal Bandyopadhyaya residia no bairro de Baghbazar em Calcutá. 6. Chegando a Kasi, Mathur alugou duas casas, uma ao lado da outra, em Kedarghat. Ali comportou-se como um príncipe, em todos os aspectos (IV.3). Sempre que saía à rua usava uma sombrinha de prata, enquanto empregados à sua frente e atrás carregavam bastões de prata e
outras parafernálias. Enquanto esteve em Kasi, Sri Ramakrishna ia de palanquim prestar adoração a Viswanath, principal Divindade de Kasi, quase todos os dias. Hriday acompanhava-o a pé. Mesmo a caminho do templo o Mestre costumava entrar em êxtase, para não falar quando via a Divindade. Embora entrasse em êxtase em todos os templos, agia assim de maneira especial no templo de Kedarnath. 7. Além de visitar os templos, o Mestre foi ver os importantes santos de Kasi. Hriday sempre o acompanhou. O Mestre fez algumas visitas ao famoso Trailanga Swami, um dos mais importantes Paramahamsas. O Swami estava então fazendo voto de silêncio e ficava no Manikernika Ghat. No primeiro encontro o Swami, como forma de lhe dar uma cordial recepção, colocou sua caixa de rapé diante do Mestre para que ele a usasse. Examinando os órgãos dos sentidos e os membros do santo, o Mestre disse a Hriday, que ele possuía os sinais de um verdadeiro Paramahamsa e que isso equivalia dizer que era a imagem viva de Shiva. O Swami havia resolvido mandar construir um Ghat perto de Manikernika. A pedido do Mestre, Hriday participou daquela obra, colocando algumas pás de terra ali. Num daqueles dias, o Mestre convidou e trouxe Trailanga Swami à residência de Mathur e alimentou-o com Payasam, servindo-o com suas próprias mãos. O Mestre permaneceu em Kasi cinco ou seis dias e daí foi para Prayag com Mathur. Banhouse na sagrada confluência onde permaneceu três noites. Mathur e todos os outros rasparam a cabeça de acordo com a prescrição das escrituras mas o Mestre não, dizendo: "Não é necessário que eu faça isso." De Prayag voltaram a Kasi, onde passaram uma quinzena antes de seguirem para Vrindavan. 9. Em Vrindavan Mathur hospedou-se numa casa perto de Nidhuvam. Como em Kasi, ali também ostentou sua pompa e seu poder. Foi com a esposa visitar os templos, onde doaram algumas moedas de ouro como sinal de respeito enquanto saudavam as divindades. Além de visitar Nidhuvan, o Mestre foi a Radhakunda, Shyamakunda e ao monte Govardhan, cujo cume atingiu em estado extático. Ouviu falar a respeito dos importantes santos do lugar e visitou-os. Ficou muito contente em encontrar Gangamata, em Nidhuvan. Mostrou a Hriday os sinais dela e disse que ela havia alcançado um estado elevado de espiritualidade. 10. Tendo permanecido em Vrindavan mais ou menos uma quinzena, Mathur e sua comitiva regressaram a Kasi. Para verem Viswanath, o Grande Senhor do universo, vestido com roupa especial e enfeitado de jóias, ali permaneceram até aproximadamente a metade do ano de 1868. Nessa época o Mestre viu a imagem dourada de Annapurna. 11. O Mestre, dizia Hriday, encontrou a Bhairavi Brahmani, Yogeswari, em Kasi. Foi diversas vezes à sua casa, no bairro chamado "Sessenta e Quatro Yoginis." A Brahmani ali morava com uma senhora chamada Mokshada. O Mestre ficou satisfeito em ver a fé e devoção dessa senhora. A Brahmani acompanhou o Mestre a Vrindavan, onde ele pediu que ela vivesse ali permanentemente. Ela veio a falecer pouco tempo depois que o Mestre regressou de Vrindavan. 12. Durante sua estada em Vrindavan, o Mestre quis ouvir o instrumento de corda chamado Vina, mas seu desejo não foi satisfeito, porque naquela ocasião não havia qualquer tocador disponível. Novamente surgiu em sua mente esse desejo ao regressar a Kasi. Acompanhado de Hriday, foi à casa do exímio tocador de Vina, Maheshchandra Sarkar, a quem pediu para tocar. Mahesh vivia no bairro chamado Madanpura em Kasi. Com muita satisfação, a pedido do Mestre, tocou durante muito tempo. Logo que ouviu o doce som da Vina, o Mestre entrou em êxtase. Retomando consciência parcial, foi ouvido orando à Mãe Divina: "Mãe, dá-me consciência normal; quero ouvir atentamente a Vina." Imediatamente após, ficou em condição de permanecer no plano exterior de consciência e de ouvir a música com alegria, de vez em quando cantando também com acompanhamento da Vina. De cinco às oito da tarde passou o tempo de forma muito agradável, quando Mahesh ofereceu-lhe uma comida ligeira, que ele tomou, voltando em seguida à casa de Mathur. Mahesh acostumou-se então a visitar o Mestre todos os dias. 13. Mathur expressou o desejo de ir a Gaya, morada de Vishnu, mas como o Mestre fez grande objeção, desistiu da idéia e regressou a Calcutá. Depois dessa peregrinação aos principais lugares, durante aproximadamente quatro meses, o Mestre, segundo Hriday, regressou a Dakshineswar, na metade de 1868. O Mestre trouxe de Vrindavan um pouco de terra de Radhakunda e de Shyamakunda. Chegando a Dakshineswar, espalhou, com a ajuda de Hriday, um pouco de terra em volta do Panchavati e enterrou o restante, com suas próprias mãos, em sua cabana de Sadhana, dizendo: "Este lugar torna-se a partir de hoje tão santo quanto Vrindavan." Pouco tempo depois, pediu a Mathur para convidar os instrutores e devotos Vaishnavas de vários lugares que vieram e o Mestre celebrou um festival no Panchavati. Mathur deu dezesseis rupias
para cada instrutor Vaishnava e uma rupia para cada devoto, na hora da despedida, mostrando assim, seu respeito a eles. 14. A esposa de Hriday morreu pouco depois de sua volta da peregrinação. Devido a esse fato sua mente foi tomada de desapego durante algum tempo. Hriday já dissemos anteriormente, não tinha um temperamento contemplativo. Seu ideal de vida era melhorar sua condição mundana e passar a vida desfrutando o máximo possível dos prazeres do mundo. Embora outros estados lhe sobreviessem, de vez em quando, devido à sua constante companhia com o Mestre, essas, contudo, não podiam durar muito. Sempre que surgia uma oportunidade para satisfazer seu desejo de prazer, esquecia-se de tudo o mais, perseguia o que tanto ansiava e enquanto não alcançasse, nenhum outro pensamento entrava em sua mente. Portanto, embora todas as Sadhanas do Mestre tivessem sido feitas durante a permanência de Hriday em Dakshineswar, ele foi pouco tocado ou influenciado pelo fervor devocional que presenciava no tio. Contudo, Hriday amava verdadeiramente o tio e não deixava de prestar-lhe qualquer serviço que fosse necessário, em qualquer momento e como resultado, desenvolveu grande coragem, sagacidade e inteligência. Quanto mais ouvia dos homens santos a respeito da natureza sobre-humana de seu tio e quanto mais observava a manifestação dos poderes divinos durante suas práticas espirituais, maior era seu sentimento de força - graças à proximidade de seu querido tio. Seu sentido de proximidade com o Mestre era devido ao grande serviço que lhe prestava - o sentimento de que o Mestre era 'intimo' e ele próprio seu favorito - fizeram-no pensar que todas as conquistas do Mestre eram, de uma certa maneira, suas também. Se por acaso fizesse qualquer esforço para consegui-los, seu tio, por seus divinos poderes, permitiria que ele os fizesse. Ele, portanto, não se sentia na obrigação de pensar na vida após a morte. Queria primeiro desfrutar um pouco deste mundo e depois dedicar-se aos assuntos espirituais. Essa tinha sido sua atitude em relação à vida até agora. Tomado de pesar com a morte da esposa, pensou agora que o momento adequado para uma mudança em sua visão e modo de vida havia chegado. Dedicou-se com mais firmeza do que antes à adoração da Mãe do universo e começou a praticar meditação, despojando-se das roupas e do cordão sagrado, à imitação do Mestre. Com sinceridade pediu também, ao Mestre que o ajudasse a ter experiências espirituais semelhantes às deles. O Mestre assegurou-lhe que ele não tinha necessidade de fazer tais coisas, pois todos os resultados seriam seus, somente por estar servindo-o. Disse-lhe que se ambos estivessem cheios de inspiração divina dia e noite e se esquecessem de tudo o que diz respeito ao corpo, como comer e dormir, nenhum seria capaz de tomar conta um do outro. Hriday, contudo, não deu atenção àquelas palavras. O Mestre por fim, teve de ceder e disse: "Que vontade da Mãe seja feita. Alguma coisa deve acontecer por minha vontade? Foi a Mãe que retirou minha mente do mundo e deu-me aquelas condições e fez-me ter experiências estranhas; se a Mãe assim desejar, você também as terá." 15. Alguns dias depois dessa conversa, Hriday começou a ter, durante a adoração, algumas visões maravilhosas e estados de êxtase divino ligados e estados de semi-absorção de consciência. Um dia Mathur Babu viu Hriday assim e perguntou ao Mestre: "Que estado é esse que Hriday está, Pai?" O Mestre explicou-lhe: "Não há nada errado com ele. Importunou a Mãe para ter visões espirituais, por isso ele as está tendo. A Mãe o trará de volta à sua condição normal depois de fazê-lo sentir um pouco o gosto das visões." "Pai", disse Mathur, "tudo é Seu jogo; somente o senhor colocou Hriday nesse estado. Tranquilize-o por favor, pois ambos devemos permanecer com o senhor, como Nandi e Bhringi e servi-lo. Por que estados estranhos devem ocorrer conosco?" 16. Pouco tempo depois desta conversa entre o Mestre e Mathur, uma noite Hriday viu o Mestre ir em direção ao Panchavati. Pensando que ele poderia necessitar de sua jarra e toalha, pegou-os e seguiu-o. Enquanto caminhava, Hriday teve uma visão extraordinária. Viu que o Mestre não era um ser humano, que não era constituído de carne e sangue, que o Panchavati estava iluminado pela luz que saía de seu corpo e que enquanto o Mestre caminhava, nem seus pés, que eram também de luz, tocavam o solo, mas transportavam-se pelo ar. Tomando tudo como ilusão ótica, Hriday esfregou os olhos repetidamente, observou todas as coisas à sua volta, em seu estado natural e olhou para o Mestre uma vez mais. Nada adiantou. Embora ele visse todas as outras coisas - árvores, trepadeiras, o Ganga, a cabana, etc.- como eram, via sempre o Mestre naquela forma luminosa. Muito admirado, Hriday perguntou-se se havia ocorrido qualquer mudança em sua mente, que o fazia ter aquela experiência. Assim pensando, olhou para seu próprio corpo e viu que ele, também, era um ser brilhante feito de luz - um atendente e companheiro do Próprio Deus, servindo-O eternamente, uma parte e pedaço de Sua pessoa divina de luminosidade espiritual solidificada, tendo agora uma existência separada, com o único objetivo de servi-Lo. Ao ter essa experiência e conhecer o mistério de sua própria vida, seu coração foi inundado por uma
forte corrente de felicidade. Esqueceu-se de si próprio, esqueceu-se do mundo e de considerar se as pessoas do mundo falariam bem ou mal dele. Ficou em êxtase somente com consciência parcial e gritava repetidamente, como louco: "Ó Ramakrishna! Ó Ramakrishna! Não somos seres normais. Por que estamos aqui? Venha, vamos de lugar a lugar libertar as almas da escravidão! Sou também o que o senhor é." O Mestre disse-nos: "Ouvindo-o gritar assim, disse: 'Ah, pare! Pare! Mas por que você está se comportando dessa maneira? As pessoas vão sair correndo pensando que alguma calamidade caiu sobre nós.' Mas deu ele ouvidos a tudo isso? Então precipitei-me em sua direção, toquei seu coração e disse: 'Faz o rapaz a ser estúpido outra vez, Ó Mãe'." 17. Hriday disse-nos que assim que o Mestre falou, sua felicidade e visão desapareceram no vazio e ele novamente voltou a seu antigo estado de tolo. Então caindo subitamente do êxtase, sua mente encheu-se de melancolia. "Tio", soluçou ele, "por que fez isso, por que disse que eu deveria tornar-me tolo? Nunca mais terei aquela visão de felicidade." "Eu disse, respondeu o Mestre, que você deveria ser tolo para sempre? Eu disse: 'Fique calmo agora'. Que estardalhaço você fez com uma visão tão pequena! E por isso que tive que falar assim. Que riqueza de visões e experiências tenho durante as vinte e quatro horas! Mas faço qualquer estardalhaço? Ainda não chegou o momento de você ter essas visões. Agora fique tranqüilo, quando for a época terá várias visões e experiências." 18. Embora Hriday tivesse que permanecer calado com as palavras do Mestre, sentiu-se muito ferido. Sob a influência do egoísmo, pensou mais tarde que tentaria ter de algum modo aquela visão novamente. Refletindo assim, aumentou seu período de Japa e meditação e decidiu que iria ao Panchavati à noite sentando-se sob a árvore onde o Mestre no passado costumava sentar-se para Japa e meditação e chamaria a Mãe do universo. Assim pensando, na calada da noite, saiu da cama, foi ao Panchavati e sentou-se no lugar do Mestre para meditar. De modo bastante estranho, o Mestre sentiu desejo de ir naquele momento ao Panchavati. Mal havia chegado ouviu Hriday, de modo comovente chamando-o, "Salve-me, tio, salve-me! Estou sendo queimado até morrer." O Mestre caminhou rapidamente até ele e perguntou-lhe: "O que há Hriday?" Desassossegado pela dor, Hriday disse: "Tio, mal sentei aqui para meditar senti como se alguém estivesse jogando um prato cheio de carvão em brasa em meu corpo. Estou com uma queimadura insuportável." O Mestre passou a mão em seu corpo e disse: "Não tenha medo; vai esfriar. Por que você fez tudo isso? Já não lhe disse repetidamente que alcançará tudo se me servir?" Hriday costumava dizer que toda sua dor foi retirada imediatamente pelo toque das mãos do Mestre. Hriday jamais voltou ao Panchavati para meditar e convenceu-se de que não seria bom agir de maneira contrária aos conselhos do tio. 19. Hriday, sem dúvida, conseguiu ter certa paz com as palavras do Mestre, mas as obrigações diárias do templo agora pareciam-lhe insípidas. Sua mente procurava algo novo, do qual poderia obter alguma alegria. Vendo a chegada do outono de 1868, decidiu fazer a adoração da Mãe em sua casa. Ganganarayan, seu meio irmão mais velho havia morrido e Raghav, outro parente, nomeado agora para receber aluguel na propriedade de Mathur Babu, estava com uma boa renda. Com a mudança de tempo, quando o prosperidade cresceu, um novo hall de adoração foi construído. Ganganarayan havia demonstrado desejo de invocar a Mãe Divina e adorá-La ali, mas não teve oportunidade de fazê-lo. Hriday lembrou-se daquele desejo dele e procurou satisfazê-lo. Sabendo que Hriday, homem de ação, pudesse conseguir paz com a celebração do culto, o Mestre concordou, enquanto que Mathur prestou-lhe ajuda financeira. Hriday queria muito levar o Mestre consigo e tê-lo em sua residência durante o culto, mas Mathur não concordou porque desejava que o Mestre ficasse com ele naquela ocasião. Ferido no coração por ter falhado a esse respeito, Hriday preparou-se para ir para casa sozinho a fim de fazer o culto. Vendo-o tão triste, o Mestre, como Hriday nos contou, consolou-o, dizendo: "Por que você está magoado? Através do corpo sutil irei diariamente ver seu culto; ninguém a não ser você me verá. Tenha, segundo o Tantradharaka, um Brahmana para recitar os Mantras para você e faça você mesmo o culto com devoção. Ao invés de manter jejum rigoroso, ao meio dia beba um pouco de leite, água do Ganga e xarope de açúcar cande. Se fizer o culto dessa maneira, a Mãe do universo certamente aceitará sua adoração." Hriday disse que o Mestre deu-lhe instruções detalhadas a respeito da pessoa a quem pedir para fazer a imagem, quem seria nomeado Tantradharaka e todas as outras coisas a serem feitas. Muito feliz foi para casa fazer o culto. 20. Chegando em casa Hriday procedeu de acordo com as instruções do Mestre. Fez os ritos relativos ao sexto dia da quinzena brilhante, como o despertar da Deusa, a consagração preliminar da imagem e a invocação da Devi e ele mesmo fez o culto. Durante o serviço de acenar as luzes (Arati), no ritual do culto do dia Saptami, Hriday viu a luminosa forma do Mestre, em pé, em
êxtase, ao lado da imagem. Hriday informou-nos que costumava ser tomado de grande amor espiritual para ter essa visão do Mestre em todos os dias do culto durante o serviço de agitar a luz e também, nos ritos especiais do Sandhipuja ou culto de junção, assim chamado devido à sua execução na junção dos dias de culto Ashtami e Navami. Hriday voltou a Dakshineswar logo depois que o culto terminou e contou ao Mestre tudo a respeito. "No momento do Arati e do 'culto de junção', disse-lhe o Mestre: "eu costumava sentir um grande desejo de ver sua adoração e então, entrava em êxtase. Sentia que entrava num 'caminho de luz' e estava presente no seu saguão de adoração num corpo luminoso." 21. Hriday contou-nos que uma vez o Mestre predisse, em êxtase: "Você fará o culto anual três vezes". E isso realmente aconteceu. Não levando em consideração as palavras do Mestre, ele estava fazendo os preparativos para o culto pela quarta vez, quando uma série de obstáculos ocorreram e que por fim ele teve de desistir. Hriday casou-se novamente após o culto do primeiro ano. Dali em diante dedicou sua mente ao serviço do Mestre e ao culto no templo de Dakshineswar como antes. CAPÍTULO XIX A MORTE DE PESSOAS LIGADAS AO MESTRE ASSUNTOS: 1. A história de Akshay. 2. A beleza de Akshay. 3. A devoção de Akshay à Sadhana. 4. O casamento de Akshay . 5. A doença grave de Akshay depois do casamento. 6. A segunda doença de Akshay. 7. Apreensão e o comportamento de Hriday. 8. A morte de Akshay e o comportamento do Mestre. 9. Sua agonia com a morte de Akshay. 10. O irmão do Mestre, Rameswar, nomeado sacerdote. 11. O Mestre com Mathur em Ranaghat e o serviço dos pobres como Narayana . 12. O Mestre na casa ancestral de Mathur. 13. O Mestre em Hari Sabha de Kolutola e em Kalna, Navadwip etc. 14. A devoção integral de Mathur. 15. O amor e a devoção mútuos. 16. Uma história. 17. Outra história. 18. Os Sastras sobre devoção integral. 19. A morte de Mathur. 20. O Mestre vendo este acontecimento em Bhavasamashi.
1. Já tornamos o leitor um pouco familiarizado com Akshay, filho do irmão mais velho do Mestre, Ramkumar. Akshay veio a Dakshineswar e foi nomeado sacerdote no templo de Vishnu em 1865, pouco tempo depois que Tota Puri ali chegou. Akshay tinha então mais ou menos dezessete anos. É preciso dizer alguma coisa a seu respeito. Como a mãe morreu por ocasião de seu nascimento, tornou-se objeto de especial amor de todos os parentes. Tinha apenas três ou quatro anos quando o Mestre veio pela primeira vez a Calcutá, em 1852. O Mestre, portanto, teve oportunidade de pegar Akshay no colo e educá-lo com cuidado amoroso durante dois ou três anos antes de ir para Calcutá. Seu pai, Ramkumar, entretanto, jamais o pegou no colo. Ao lhe ser perguntada a razão, dizia: "Será amor desperdiçado; a criança não viverá muito." Depois o Mestre esqueceu-se de si mesmo, do mundo e de todas as suas preocupações, durante seus dias de absorção nas práticas espirituais. Akshay estava passando então os ternos dias de sua juventude e agora tornara-se um belo rapaz. 2. Soubemos pelo Mestre e pelos parentes que Akshay era na verdade um belo rapaz. Disseram que sua pele era tão brilhante quanto suas feições eram cheias de graça. Parecia a forma viva de Siva. 3. Akshay era muito devotado desde a infância, a Sri Ramakrishna. Diariamente passava muito tempo no serviço de Raghuvir, divindade da família. Portanto sua indicação para sacerdote do templo de Vishnu em Dakshineswar foi uma tarefa muito a seu agrado. O Mestre dizia: 'Enquanto ele fazia o culto de Radha-Govinda, ficava tão absorvido em meditação, que não tinha idéia do grande número de pessoas que entravam e saíam do templo e não voltava à sua consciência normal antes de algumas horas". Terminado o culto diário no templo, ele ia, soubemos por Hriday, ao Panchavati e aí passava muito tempo adorando Siva. Então cozinhava suas refeições e depois de comer, dedicava-se ao estudo do Bhagavata. Além disso, devido a uma nova necessidade de amor a Deus, praticava tanto Nyasa e Pranayana que sua garganta e palato sangravam e inchavam repetidamente. Não será portanto de admirar que tanto amor e devoção de sua parte a Deus o tornassem tão querido ao Mestre! 4. Um a um passaram-se os anos até que chegamos ao final do ano Bengali de 1275 (A. D.1869). O tio de Akshay, Rameswar, veio a tomar conhecimento da tendência do jovem Akshay e começou a procurar uma noiva para impedir aquela inclinação! Foi no mês de Chaitra que uma noiva adequada foi encontrada no vilarejo de Kuchkol, não longe de Kamarpukur e Rameswar veio a Dakshineswar para levar Akshay para casa. Foram feitas objeções contra sua viagem, considerado que o mês de Chaitra não fosse auspicioso para início de viagem. Rameswar e
Akshay não deram atenção a isso e disseram que a proibição das escrituras não eram aplicáveis quando se tratasse de regresso à casa depois de uma estada temporária em qualquer lugar. O casamento de Akshay realizou-se logo depois de sua volta ao lar, no mês de Vaisakh 1276 (A.D.1869). 5. Akshay ficou seriamente doente quando estava na casa de seu sogro alguns meses após o casamento. Rameswar, recebendo essas notícias, trouxe-o para Kamarpukur, onde entrou em tratamento e melhorou. Foi então mandado para Dakshineswar. Sua aparência melhorou e a saúde parecia recuperar-se, quando certo dia teve um ataque de febre. Os médicos pensaram que se tratasse de uma febre simples e da qual se curaria brevemente. 6. Quando soube que Ashay havia adoecido na casa do seu sogro, logo após o casamento, o Mestre, Hriday contou-nos, disse: "Hridu, os presságios são extremamente maus; ele casou-se com uma noiva de Rakshsagana; receio que o rapaz morrerá." Como a febre não cedesse depois de três ou quatro dias, chamou Hriday e disse, "Hridu, os médicos não foram capazes de diagnosticar a doença. Akshay está com uma febre complicada, elevada e contínua. Chame um bom médico e dê-lhe um bom tratamento, se desejar, mas o rapaz, é certo, não sobreviverá." 7. Hriday dizia: "Ao ouvi-lo falar assim censurei-o dizendo: 'Não fale assim, tio. Não deixe que tais palavras saiam de seus lábios!' Ele disse: 'Será que falo por mim mesmo? Digo coisas involutariamente sob influência divina; digo o que a Mãe me faz saber e dizer. Será que desejo que Akshay morra?." 8. Hriday ficou muito alarmado ao ouvir estas palavras do Mestre. Chamou bons médicos e tentou por diversos modos curar Akshay. Mas a doença continuou piorando. Akshay sofreu durante mais ou menos um mês. Quando seu último momento chegou, o Mestre foi à sua cabeceira e disse: "Akshay diga: 'Ganga, Narayana, OM Rama'. " Akshay repetiu o Mantra, uma, duas, três vezes e morreu. Hriday contou-nos que quanto mais ele chorava a morte de Akshay, mais o Mestre ria, em êxtase. 9. Embora o Mestre risse daquela maneira, olhando de um elevado plano de consciência espiritual, a morte de seu querido sobrinho, Akshay, não significa que ele não tenha sentido um grande choque em seu coração. Muito tempo depois falou-nos desse acontecimento, diversas vezes. Costumava dizer que embora durante o êxtase considerasse a morte como apenas uma mudança de estado, sentiu grande vazio com a morte de Akshay, quando retornou ao estado normal de consciência (III,I). Nunca mais pode morar na mansão dos proprietários após a morte de Akshay, porque foi ali onde ele morreu. 10. Rameswar, segundo irmão mais velho do Mestre, foi escolhido para fazer a adoração de Radha-Govinda em Dakshineswar, após a morte de Akshay. Mas ele nem sempre podia estar em Dakshineswar uma vez que era encarregado da administração da casa de Kamarpukur. Costumava deixar alguém competente e de confiança em seu lugar, em Dakshineswar - e ir ocasionalmente a seu vilarejo para ali ficar. Informaram-nos que Ramachandra Chattopadhyaya e outra pessoa chamada Dinanath oficiavam por ele durante sua ausência. 11. Foi nesse período que Mathur, acompanhado pelo Mestre, foi à sua propriedade rural e à casa de seu Guru. Isso foi talvez para aliviar o sentimento de falta produzido pela morte de Akshay no coração do Mestre. Porque, se de um lado o elevado devoto Mathur considerava o Mestre o Próprio Deus e o seguia implicitamente em todos os assuntos espirituais, por outro lado, ele o considerava uma criança frágil a ser protegida em todos os assuntos mundanos. Durante essa viagem, o Mestre ficou muito comovido ao ver a condição extremamente miserável dos homens e mulheres num certo vilarejo. Convidou a todos e fez Mathur dar a cada óleo suficiente para esfriar a cabeça, uma refeição completa e uma muda de roupa. Hriday disse que este evento aconteceu em Kalaighat, perto de Ranaghat, quando Mathur, acompanhado por ele e pelo Mestre, estava num barco no canal Churni. 12. Hriday contou-nos que Mathur tinha uma casa no vilarejo chamado Sonabere, perto de Satkshira. Os povoados vizinhos pertenciam à propriedade de Mathur, para onde levou o Mestre. A casa do Guru de Mathur não ficava longe. Naquela época havia um litígio entre os membros da família do Guru sobre a divisão de sua propriedade. Pediram a Mathur que intercedesse como mediador. O vilarejo chamava-se Talamagro. Durante o trajeto Mathur mandou o Mestre e Hriday cavalgarem seu elefante e ele próprio foi de palanquim. 1 (1 Hriday dizia que, enquanto ia para o vilarejo, Mathur pediu ao Mestre para ir num palanquim porque o chão era muito irregular e ele próprio conduziu seu elefante. Chegando ao vilarejo, contudo, satisfez a curiosidade do Mestre e o fez sentar-se no elefante. ) Satisfeito com o
carinhoso serviço dos filhos do preceptor de Mathur, o Mestre passou ali algumas semanas antes de regressar a Dakshineswar. 13. Pouco tempo depois de sua volta ocorreu um evento importante relacionado com o Mestre em Kolutola, em Calcutá. Um Hari Sabha, reunião onde o nome de Hari era cantado
costumava ser realizado na casa de Kalinath Datta, também conhecido como Kalinath Dhar. Tendo sido convidado para o Sabha o Mestre aceitou e, em êxtase, sentou-se no lugar reservado em nome e em honra de Sri Chaitanya, o Grande Senhor. Demos ao leitor uma descrição detalhada do incidente, em outro lugar (IV.3). Muito tempo depois o Mestre teve desejo de visitar Navadwip e Mathur levou-o a Kalna, Navadwip e outros lugares. Já dissemos ao leitor em outro lugar como ele encontrou o devoto, Bhagavan Das, em Kalna e que maravilhosa visão teve em Navadwip (IV.3). Foi talvez em 1870 que visitou aqueles lugares sagrados. Ele não se sentiu tão profundamente inspirado em Navadwip como quando passou pelos bancos de areia acumulados no leito do Ganga, perto daquele lugar. Mathur e outros perguntaram-lhe qual a razão e o Mestre disse que a velha Navadwip, contendo os lugares do divino esporte de Chaitanay havia submergido no rio. Estavam situados onde agora estavam os bancos de areia. Foi por isso que entrou em êxtase profundo, ao passar por eles. 14. Não é fora de propósito mencionar aqui, sob a autoridade de Hriday, um acontecimento que ilustra a devoção inegoísta de Mathur, alcançada como resultado do serviço abnegado que ele dedicou ao Mestre durante quatorze longos anos. Uma vez Mathur Babu ficou acamado devido a um furúnculo numa das juntas de seu corpo. Tendo sabido da ansiedade de Mathur para ver o Mestre naquela ocasião, Hriday falou ao Mestre a esse respeito. Mas ele disse: "Qual a utilidade de minha ida? Posso curá-lo?" Quando Mathur viu que o Mestre não vinha, mandou mensageiro atrás de mensageiro informando seu desejo ardente. Depois de tanta súplica, o Mestre teve de ceder. A felicidade de Mathur não teve limites quando o Mestre chegou. Levantou-se com muita dificuldade, sentou-se inclinado num almofadão e disse: "Pai, dá-me um pouco de poeira de seus pés." O Mestre disse: "Para que serve você tomar a poeira de meus pés? Curará seu furúnculo?" Mathur respondeu, "Pai, será que sou tão mesquinho? Quero a poeira de seus pés para curar meu furúnculo? Os médicos estão aqui para isso. Quero a poeira de seus pés para atravessar o mar do mundo." Logo que Mathur assim falou, o Mestre entrou em êxtase. Mathur colocou a cabeça nos pés do Mestre e considerou-se abençoado. Lágrimas de felicidade escorriam-lhe dos olhos. Mathur curou-se de sua doença pouco depois. 15. Tanto Hriday quanto o Mestre nos falaram de diversos eventos daquela época, que demonstram a grande fé e devoção de Mathur pelo Mestre. Mathur tinha a firme convicção de que o Mestre era seu único refúgio e abrigo tanto aqui como na vida após a morte. A graça do Mestre para ele também, não conhecia limites. Embora o Mestre, que era mentalmente independente, se sentisse de vez em quando aborrecido com alguns atos de Mathur, esqueciase imediatamente deles e satisfazia-lhe os desejos e procurava fazer tudo o que propiciasse seu bem-estar, tanto neste mundo como no próximo. Que uma forte e profunda relação de amor existia entre o Mestre e Mathur, pode ser claramente visto na seguinte história. 16. Um dia o Mestre disse, em êxtase: "Mathur, enquanto você viver, eu também estarei aqui (em Dakshineswar)". Mathur ficou alarmado ao ouvir isso, porque sabia que a Própria Mãe do universo na pessoa do Mestre estava sempre protegendo-o e à sua família. Portanto, ao ouvir isto, Mathur pensou que o Mestre desampararia sua família depois de sua morte. Então, com muita humildade disse ao Mestre: "Por que, Pai? Minha esposa e meu filho Dwaraka são também muito devotados ao senhor." Vendo que Mathur ficara angustiado, o Mestre disse: "Muito bem, ficarei aqui enquanto sua esposa e Dwari viverem." De fato, aconteceu assim. O Mestre deixou Dakshineswar para sempre pouco tempo depois da morte de Jagadamba e Dwarakanath. Jagadamba Dasi morreu em 1881. 2 (2 Jagadamba morreu em, ou em torno do, dia 1° de janeiro de 1881, sem fazer testamento, deixando o demandante Trayluksha, então único filho de Mathura, herdeiro sobrevivente." Transcrito da Declaração do Demandante na Ação n° 203 de 1889 da Alta Corte. ) Depois desse acontecimento, o
Mestre permaneceu em Dakshineswar por pouco mais de três anos. 17. Noutra ocasião Mathur disse ao Mestre: "O que é isso, Pai? O senhor disse que seus devotos viriam, mas onde estão eles? Não os vejo chegar." O Mestre respondeu: "Não sei quando a Mãe os trará. Mas a Própria Mãe na verdade me revelou isso. Tudo o que Ela me fez saber, provou ser verdadeiro, um a um; quem sabe por que ainda não aconteceu?" Assim falando, o Mestre entrou num estado depressivo pensando: "Será que aquela minha visão foi uma miragem?" Mathur ficou triste ao vê-lo naquele estado e pensou consigo mesmo que havia sido uma tolice de sua parte ter levantado a questão. Para consolar o Mestre, que tinha a natureza de uma criança, disse-lhe então: "Pai, deixe-os vir ou não. Estou aqui, seu devoto, sempre seguindo-o obedientemente. Como se pode dizer que sua visão a respeito dos devotos não era verdade? Pois eu mesmo sou um monte deles. Foi por isso que a Mãe disse: 'Muitos
devotos virão'." O Mestre respondeu: "O que você diz pode ser verdadeiro, quem sabe?" Mathur não continuou com o assunto, mas puxado um outro desviou a mente do Mestre. 18. Falamos ao leitor na terceira parte intitulada, "Como Mestre Espiritual" que grandes mudanças se operaram nas idéias de Mathur pela constante companhia do Mestre. Aqueles que prestam serviço a uma pessoa liberada tornam-se, dizem as escrituras, recipientes dos resultados de todas as boas ações feitas por ela. Portanto, é de se admirar que aqueles que servem uma Encarnação de Deus sejam dotados de tão grandes qualidades superiores? 19. O contínuo fluxo de tempo com suas ondas de adversidades e prosperidade, felicidade e miséria, união e separação, vida e morte, gradualmente trouxe o mundo no ano da Era Bengali de 1278 (A.D.1871). O relacionamento de Mathur com o Mestre, aprofundando-se através dos anos, atingiu o décimo quinto ano. Os meses de Vaisakh e Jyaishtha tinham passado e Ashadh também já havia mergulhado no abismo do passado, quando Mathur ficou acamado com febre. Aumentando rapidamente, a febre evoluiu para um tipo complicado e contínuo e numa semana Mathur perdeu a capacidade de falar. O Mestre sabia de antemão que o voto de devoção de Mathur estava chegando ao fim e que a Mãe estava prestes a levar Seu devoto para Seu seio brevemente. Portanto, embora costumasse mandar Hriday diariamente ver Mathur, ele mesmo não foi vê-lo sequer uma vez. O último dia chegou e Mathur foi levado ao Khalighat. O Mestre nem mesmo mandou Hriday aquele dia, mas permaneceu em êxtase profundo à tarde, por duas ou três horas. Seu corpo permanecia em Dakshineswar enquanto ia, em corpo celeste, por um caminho de luz até Mathur, seu devoto, e ajudou-o a alcançar o objetivo, o preenchimento de sua vida. Pessoalmente o fez alcançar a esfera para a qual uma pessoa é qualificada somente com grande acúmulo de méritos. 20. Quando o êxtase do Mestre chegou ao fim, passava das cinco da tarde. Chamou Hriday e disse: "Mathur entrou num carro celestial no qual companheiras da Mãe elevaram-no afetuosamente e seu espírito foi para a esfera da Devi." Hriday permaneceu calado enquanto ouvia. Quando a noite estava avançada, os funcionários do templo de Kali voltaram e disseram a Hriday que Mathur havia morrido às cinco da tarde. Ouvimos do Mestre em outra ocasião - e já familiarizamos o leitor com isto em outro lugar (III.7) 3 (3 Mathuranath Moan Biswas morreu em julho, sem testamento, deixando como sobreviventes Jagadamba, única viúva, Bhupal já falecido, um filho de outra esposa falecida antes dele, - e Dwarkanath Biswas já falecido, o réu Trayluksha Nath e Thakurdas (aliás) Dhuamadas, três filhos da mencionada Jagadamba. Citado da declaração de demandante no Processo 230 de 1889 da Alta Corte - Shyama Charar Biwas vs. Trayluksha Nath Biswas, Gurudas, Kallidas, Durgadas e Kumudini. ) que o altamente dedicado
Mathuranath teria que voltar a esse mundo, porque seu desejo de prazeres ainda não havia se esgotado. CAPÍTULO XX A ADORAÇÃO DE SHODASI ASSUNTOS: 1. O primeiro encontro da Santa Mãe com o Mestre após o casamento. 2. Sua atitude mental então. 3. Sua vida em Jayrambati. 4. Sua angústia mental e determinação. 5. Pondo em prática sua determinação. 6. Ida a Dakshineswar a pé como pai. 7. A visão da Santa Mãe durante sua doença. 8. O comportamento do Mestre à chegada da Santa Mãe. 9. Sua alegria transbordante com esse fato. 10. O Mestre testando seu próprio conhecimento de Brahman. 11. O treinamento de sua esposa. 12. Seu método de ensino. 13. Como o Mestre considerava a Santa Mãe. 14. O Mestre testando seu autocontrole. 15. O comportamento ímpar do mestre. 16. O Mestre a respeito da natureza extraordinária da Santa Mãe. 17. A decisão do Mestre depois do teste. 19. A Santa Mãe adorada como Divindade. 20. O Samadhi do Mestre e oferenda. 21. A Santa Mãe e o Samadhi contínuo do Mestre.
1. Mathur havia morrido, mas o curso da vida no templo de Dakshineswar continuou como antes. Dias e meses passaram-se e chegou o ano de 1872. Ocorreu então um acontecimento especial na vida do Mestre. Devemos agora direcionar nossa atenção à casa do sogro do Mestre no vilarejo de Jayrambati para compreender a série de eventos que levaram àquele acontecimento. Quando o Mestre foi com a Bhairavi Brahmani e Hriday a Kamarpukur, sua terra natal em 1867, as senhoras de sua família, como já foi mencionado anteriormente, trouxeram sua esposa. Esta foi, na realidade, a primeira vez que a Santa Mãe encontrou seu marido. Qualquer um que tenha tido a oportunidade de comparar as jovens de cidades como Calcutá com as de vilarejos como Kamarpukur, verá que os corpos e as mentes das moças das cidades desenvolvem-se mais cedo do que aqueles das jovens dos vilarejos. Nos povoados, as meninas de quatorze anos e às vezes de quinze e dezesseis, não apresentam os sinais físicos de sua juventude plenamente desenvolvida.
Suas mentes, como seus corpos, desenvolvem-se tarde. Essa constituição saudável das moças criadas nos vilarejo é talvez devida ao fato que elas não têm que viver em lugares pequenos, amontoadas como pássaros em gaiolas. Vivem num ambiente natural, respirando ar puro e andando livremente pela vila. 2. A Santa Mãe, portanto, era muito jovem quando com a idade de quatorze anos encontrou seu marido no sentido verdadeiro, pela primeira vez. Sua capacidade de compreender o ideal profundo e a responsabilidade da vida de casada, e stavam a ponto de desabrochar. Naquela época a jovem pura eslava maravilhada, experimentando uma felicidade celestial indescritível por estar na divina companhia do Mestre e por desfrutar seu amor inegoísta e sua atenção, não corrompidos pelas necessidades do corpo. Por diversas ocasiões ela costumava descrever aquela sua alegria às devotas do Mestre, dizendo: "Meu coração estava incessantemente cheio de uma felicidade indescritível e desde então senti sempre como se um jarro de felicidade, cheio até a borda estivesse sido colocado em meu coração." 3. Depois de alguns meses, quando o Mestre voltou a Calcutá, vindo de Kamarpukur, a jovem também regressou à casa do pai, sentindo em seu coração que estava de posse de uma riqueza infinita de felicidade. Aquela sensação de felicidade produziu uma mudança em toda sua conduta, fala, movimento e trabalho, mas não se sabe se as pessoas de modo geral notaram, porque aquela felicidade tornou-a calma e não volúvel, pensativa e não ousada, inegoísta e não interesseira. E acima de tudo, ao remover de seu coração todas as espécies de necessidade tornouse infinitamente simpática às tristezas e ao sofrimento das pessoas, convertendo-se gradualmente na personificação da própria compaixão. Pela influência dessa alegria, mesmo o sofrimento físico interminável agora lhe parecia não ter qualquer conseqüência e ela não sentia qualquer mágoa se seu cuidado e sua afeição pelos outros não tivessem qualquer retorno. Assim, contente com as mais simples necessidades físicas e perdida em si mesma, a moça vivia na casa do pai apenas fisicamente, sua mente morando bem longe, em Dakshineswar, aos pés do Mestre. Embora um forte desejo surgisse de vez em quando em sua mente para ir até ele e vê-lo, controlava-se e permanecia paciente, pensando todo o tempo que aquele que bondosamente a havia amado em seu primeiro encontro, jamais poderia esquecê-la e certamente a chamaria no momento oportuno. Assim passaram-se os dias, um após o outro, e a jovem, firme em sua fé, esperou pelo dia auspicioso. 4. Quatro longos anos passaram-se, mas a forte corrente de esperanças e saudade continuou fluindo na mente da jovem. Seu corpo, contudo, não continuou no mesmo estado de sua mente, mas transformando-se diariamente, moldou-se no de uma jovem de dezoito anos, pelo ano de 1872. Embora a felicidade oriunda de seu primeiro encontro com o divino marido a mantivesse num plano muito acima da dor e do prazer diários, mesmo isto não ficou livre das intrusões do mundo hostil e sem compaixão. Porque em seus mexericos, as pessoas do vilarejo faziam comentários ferinos, dizendo que seu marido estava louco, que tirava a roupa, andava nu, repetindo "Hari, Hari", e as moças de sua idade referiam-se a ela como esposa de um louco, considerando-o objeto de piedade ou desprezo. Ela ficava com o coração partido com tudo isso, mas nada dizia. Embora absorvida no pensamento do Mestre, às vezes entregava-se a dúvidas: "Não é ele então a mesma pessoa que vi antes? A mudança de que as pessoas falam realmente aconteceram com ele? Se por vontade da Providência isso realmente ocorreu, não posso mais ficar aqui; devo ficar a seu lado e servi-lo." Refletiu muito e chegou à conclusão de que deveria ir pessoalmente a Dakshineswar e ter todas as dúvidas esclarecidas à luz dos fatos e fazer o que as circunstâncias exigiam. 5. Sri Chaitanya nasceu no dia de lua cheia do mês Phalgun, dia do Dolyatra, dia de festa no qual Sri Krishna é embalado num balanço. Muitas pessoas dos lugares mais afastados de Bengala vêm todos os anos nesta época a Calcutá para se banharem nas sagradas águas do Ganga. Algumas mulheres, parentes distantes da Santa Mãe, haviam decidido que lá iriam naquela época do ano. A moça foi até elas e expressou seu desejo de tomar banho no Ganga. Pensando que não seria razoável levá-la sem permissão de seu pai, as senhoras resolveram consultar Ramchandra Mukhopadhyaya a esse respeito. Assim que o inteligente pai ouviu, compreendeu porque a filha queria ir a Calcutá e organizou tudo para ele mesmo levá-la. Graças à estrada-de-ferro, a distância entre Calcutá e a longínqua Kasi ou Vrindavan parece bem reduzida em termos de tempo que se gastava para atingir aqueles lugares. Mas, não havendo aquela bênção naqueles dias, Kamarpukur, terra natal do Mestre e Jayrambati, terra natal da Santa Mãe, ficavam longe de Calcutá. 6. Assim ainda é hoje 1 (1 Agora pode-se tomar um trem de Howrah a Vishnupur ou a Tarakeswar e então viajar de ônibus para Jayrambati e Kamarpukur; ou viajar diretamente, de carro ou ônibus de Howrah a Kamarpukur. ) isto
para não falar daquela época. Naqueles dias as linhas da estrada-de-ferro não haviam sido estendidas ou via Vishnupar ou via Tarakeswar, nem era Chalal ligada a Calcutá por barco. Portanto as pessoas daqueles vilarejos não tinham outra alternativa senão viajar de palanquim ou a pé. E todos, exceto os ricos como zamindars e outros, utilizavam somente o último. Assim, acompanhado da filha e outros companheiros, Ramchandra iniciou uma longa viagem a pé. Todos caminharam com alegria nos primeiros dois ou três dias. Viram um arrozal atrás do outro, pequenos lagos cheios de lótus e desfrutaram das sombras refrescantes de árvores como peepal e baniano. Mas aquela alegria não continuou até o destino. Não habituada à fatiga das viagens, a filha de Ramchadra teve um forte ataque de febre durante a viagem, o que deixou o pai muito aflito. Vendo que era impossível prosseguir enquanto a filha estivesse naquele estado, parou numa hospedaria e ali permaneceram. 7. A terrível angústia que a Santa Mãe sentiu em seu coração devido à doença que lhe acometeu, não pode ser descrita, mas teve uma maravilhosa visão que a consolou. Às vezes costumava dar a seguinte descrição dessa visão às devotas: "Perdi completamente a consciência devido à elevada temperatura e permaneci inconsciente mesmo sobre minha roupa, quando vi uma moça chegar e sentar-se a meu lado. Sua pele era negra, mas eu jamais havia visto antes tanta beleza. Sentou-se a meu lado e começou a passar a mão sobre minha cabeça e meu corpo. Sua mão era tão suave e refrescante que a sensação de queimação de meu corpo começou a diminuir. Perguntei-lhe afetuosamente: 'Posso saber de onde você veio?' A moça disse: 'Venho de Dakshineswar.' Admirada eu disse: 'De Dakshineswar? Pensei em ir lá para vê-lo e servi-lo (o Mestre); mas tive essa febre durante a viagem e não poderei satisfazer esse desejo.' 'Por que não? Perguntou a moça. 'Você certamente irá a Dakshineswar. Ficando boa, você irá e o verá. É por você que eu o mantive lá.' Eu disse: 'É assim? Por favor diga-me, você está ligada a ele?' 'Sou sua irmã.' Ela respondeu. Eu disse: 'Verdade! É por isso que você veio.' Conversando com ela dessa maneira, peguei no sono." 8. Ramachandra levantou-se de manhã para ver se a febre de sua filha persistia. Pensou que seria melhor continuar a viagem devagar, ao invés de ficar sem auxílio, esperando na estrada. Encorajada pela visão da noite anterior, a Santa Mãe aprovou a idéia. Mal haviam andado um pouco quando encontraram um palanquim. Novamente ela teve febre, mas como não era tão forte como a da noite anterior ela não perdeu o domínio de si mesma. Nem mesmo falou com alguém sobre isso. Gradualmente chegaram ao fim da viagem e a Santa Mãe encontrou o Mestre em Dakshineswar, às nove horas da noite. O Mestre ficou preocupado ao vê-la com aquela febre. Arranjou-lhe cama em seu próprio quarto, do contrário sua febre aumentaria devido ao frio e disse com um suspiro: "Por fim você veio. Meu Deus! Meu Mathur não está mais aqui. Que cuidado ele teria tido com você!" Com as providências adequadas tomadas para remédio, dieta, etc., a Santa Mãe recuperou-se em dois ou três dias. O Mestre manteve-a em seu quarto por três ou quatro dias e pessoalmente supervisionou tudo. Então providenciou para que ela fosse viver com sua mãe no Nahabatkhana, o salão de música. 9. Assim foram removidas as preocupações causadas pelos rumores. A poeira da dúvida, levantada pelos rumores e que havia anuviado sua fé, agora espalhou-se por todos os lados e desapareceu. O cuidado afetuoso e a atenção ansiosa que o Mestre lhe dedicou confirmaram sua fé em que ele era seu antigo ser e que somente pessoas com mentalidade mundana, sem qualquer força de discriminação, haviam espalhado aqueles falsos rumores. Seu 'senhor' era o mesmo 'senhor', assim refletiu a Santa Mãe, que longe de tê-la esquecido continuava tão terno com ela quanto anteriormente. Portanto decidiu rapidamente o que deveria fazer. Passou a viver feliz no Nahabat e empenhou-se no serviço do Mestre e de sua mãe. O pai dela, feliz com a felicidade da filha, ainda permaneceu uns dias mais e depois voltou satisfeito para casa. 10. Já falamos ao leitor sobre a linha de pensamento do Mestre na situação com a qual se defrontou com a chegada da Santa Mãe em Kamarpukur enquanto esteve ali em 1867. Recordando-se das palavras de Tota Puri que o conhecedor de Brahman supera a diferença entre homem e mulher baseada na consciência do corpo, ficou preparado para utilizar aquela situação tanto para testar seu próprio conhecimento como para cumprir o dever para com sua esposa, mas teve de regressar a Calcutá quando havia começado a realizar aqueles dois objetivos. Tendoa ao lado agora aplicou sua mente outra vez naqueles objetivos. 11. Por que então, pode-se perguntar, não havia trazido a esposa para Dakshineswar antes e testado seu conhecimento? Em resposta pode-se dizer que um homem comum sem dúvida assim teria agido. Mas o Mestre não pertencia à classe de seres humanos comuns e por isso sua conduta foi diferente. Aqueles acostumados a fazer tudo dependendo inteiramente de Deus o tempo todo,
não planejam previamente o que querem fazer. Em vez de dependerem, como nós, do pequeno e limitado intelecto para tomar decisões sobre assuntos que afetam o bem-estar deles mesmos e de outros, procuram ajuda e orientação do intelecto Divino, que tudo penetra. São, portanto, avessos a cortejar qualquer situação por iniciativa própria. Agem o tempo todo de pleno acordo com a vontade universal e se, por si mesmo, sem qualquer iniciativa de sua parte, um tempo de prova vier, continuam submetendo-se a ela. O Mestre não se aplicou voluntariamente a provar a profundidade de seu conhecimento divino, mas quando viu que a esposa havia vindo a Kamarpukur e que, se tivesse que cumprir o dever para com ela, teria de suportar aquela prova, somente então estava pronto para submeter-se a ela. Também, quando pela vontade de Deus a situação mudou e ele teve de regressar a Calcutá e viver longe de sua esposa, jamais procurou trazê-la por sua própria iniciativa. Até que ela mesmo chegasse, não fez o menor esforço para trazer a Santa Mãe a Dakshineswar. Podemos assim ver por meio de nosso intelecto comum uma coerência desenvolvendo-se em todas as fases do comportamento do Mestre em relação a ela. Além disso, temos que compreender que por sua visão ióguica ele sabia que esta era a vontade de Deus. 12. Agora quando viu que havia chegado o tempo de submeter-se à prova do cumprimento dos deveres para com sua esposa, sentiu-se perfeitamente pronto. Sempre que havia uma oportunidade costumava ensinar à Santa Mãe tudo a respeito do objetivo e dos deveres da vida humana. Dizia-se que nessa época falou à Santa Mãe: "Assim como a 'tia' lua é a tia de todas as crianças, assim Deus é de todos." É privilégio de qualquer um chamar por Ele. Qualquer um que O chame, será abençoado com Sua visão. Se você chamá-Lo, também O verá." O método de ensino do Mestre não consistia somente em dar instruções a um discípulo. Mantinha o discípulo perto dele, tornava-o seu em todos os aspectos pelo amor e pela afeição, e então, davalhe instruções. Mesmo assim o Mestre não parava por aí. Mantinha o olho aguçado vendo até onde o discípulo punha as instruções em prática; e se, inadvertidamente, o discípulo agisse contrariamente a suas instruções, corrigia-o mostrando os desvios de sua parte. Agora adotou também o mesmo método com a Santa Mãe. O quanto ele a tornou sua por meio do amor, desde o primeiro dia, fica claro pelo fato que ele pedia-lhe para morar em seu próprio quarto assim que ela chegou, e que, quando ela recuperou-se da enfermidade, deu-lhe permissão para compartilhar seu próprio leito, todas as noites. Já falamos ao leitor em outro lugar (III.4) sobre o comportamento puro e imaculado do Mestre com a Santa Mãe naquela época. Não vamos, portanto, repetí-lo aqui. Acrescentaremos somente uma ou duas palavras ao que já mencionamos. 13. Certo dia, nessa época, enquanto massageava os pés do Mestre, a Santa Mãe perguntou-lhe: "Como você me considera?" Logo veio a resposta: "A Mãe que está no templo, a Mãe que deu nascimento a este corpo e que está agora vivendo no Nahabat, a mesma Mãe está agora massageando meus pés. Verdadeiramente, sempre considero você uma forma da bemaventurada Mãe Divina." 14. Noutra ocasião, vendo a Santa Mãe adormecida a seu lado, o Mestre dirigiu-se à sua própria mente e começou a discriminar: "Este é, Ó mente, um corpo feminino. As pessoas consideram-no como um objeto de grande prazer, uma coisa altamente apreciada e morrem para desfrutá-lo. Se alguém, contudo, está atrás disso, ficaria obcecado com a consciência do corpo. Não se pode ir além dele e realizar Deus que é a ExistênciaConhecimento-Bem-aventurança. Ó mente, não acolha um pensamento no interior e uma atitude contrária no exterior. Diga com sinceridade se quer tê-lo ou Deus. Se quiser, está aqui diante de você; tome-o" Ele discriminou assim, mas mal havia abrigado em sua mente a idéia de tocar a pessoa da Santa Mãe, sua mente encolheu-se e imediatamente perdeuse tão profundamente em Samadhi que não retomou à consciência normal naquela noite. Teve que ser trazido com grande dificuldade à consciência normal na manhã seguinte pela repetição contínua do nome de Deus em seus ouvidos. 15. Acontecimentos assim, narrados pelo Mestre a partir das páginas de sua vida na companhia da Santa Mãe, descrevendo o total desapego e ausência de desejos carnais em ambos, apesar do total desabrochar de sua juventude, são desconhecidos na vida de qualquer outra Encarnação de Deus na história espiritual do mundo. Encantado de ouvir essas coisas, o coração humano vem naturalmente acreditar na natureza divina do casal e sente-se compelido a ter amor do fundo do coração e reverência por eles. O Mestre, livre da consciência do corpo, passou noites inteiras em êxtase, nesta época. Mesmo quando ele voltava ao plano de consciência normal no final do êxtase, sua mente morava num estado tão exaltado que a consciência do corpo como a das pessoas comuns nunca surgia, nem mesmo por um momento. 16. Assim os meses correram e mais de um ano passou-se. Entretanto o autocontrole do maravilhoso Mestre e de sua igualmente maravilhosa esposa não os abandonou. Nem mesmo
por um instante, por uma inadvertência, suas mentes consideraram a união física como agradável e desejável. Recordando o que aconteceu naquela ocasião, o Mestre dizia-nos de vez em quando, "Não tivesse ela (a Santa Mãe) sido tão pura, perdido o autocontrole de si mesmo e me assediado, quem sabe meu autocontrole teria sido desfeito e surgida a consciência do corpo? Havia implorado à Mãe Divina, depois do meu casamento, para que mantivesse a mente dela absolutamente livre de luxúria. Tendo vivido com ela naquela época, vi que a Mãe Divina realmente ouviu e atendeu aquela minha oração." 17. Um ano de experiência convenceu-o de que nenhuma paixão do corpo poderia alguma vez vencer sua mente e que sua feição mental a respeito da esposa, como parte da Mãe Universal ou Brahman havia se tornado uma duradoura e inquebrantável inclinação de sua consciência. Estava convicto que a Mãe Divina o havia feito suportar aquele teste e que, por Sua graça, sua mente estava agora estabelecida no estado divino de uma maneira fácil e natural. Sentiu agora no fundo do seu coração que sua Sadhana, pela graça da Mãe, estava perfeitamente completada e que sua mente estava tão absorvida em Seus pés de lótus, que não havia possibilidade de qualquer desejo contrário à Sua vontade ali surgir consciente ou inconscientemente. Por ordem da Mãe Divina, um desejo maravilhoso surgiu agora em seu coração e que ele pôs em prática sem a mínima hesitação. Vamos contar ao leitor de forma relacionada o que, de vez em quando ouvimos a este respeito, do Mestre e da Santa Mãe. 18. Um pouco mais da metade do mês de Jyaishtha do ano de 1280 da Era Bengali (25 de maio de 1873) passou-se. Era o dia da lua nova, ocasião sagrada para a adoração da Phalaharini Kalika Devi. Era o dia de um festival especial no templo de Dakshineswar. O Mestre havia feito preparativos especiais naquele dia para a adoração da Mãe do universo. Estes preparativos, contudo, não haviam sido feitos no templo, mas particularmente em seu próprio quarto, segundo sua vontade. Um assento de madeira, pintado de Alimpana, pigmento de pó de arroz, para que a Devi se sentasse durante a adoração, foi colocado no lado direito do adorador. O sol se pôs. A noite de lua nova, coberta pela profunda escuridão, iluminou a terra. Hriday, sobrinho do Mestre, tinha que fazer um culto especial à Devi, no templo. Ajudou o Mestre o quanto pôde, nos preparativos para a adoração e foi para o templo. Tendo terminado o serviço noturno e a adoração de Radha-Govinda, o sacerdote principal, Dinu, veio ajudar o Mestre. Eram nove horas da noite quando todos os preparativos para a adoração da Devi ficaram prontos. Neste meio tempo, o Mestre mandou um recado à Santa Mãe para que ela fosse ao culto. Ela foi ao quarto e o Mestre deu início à adoração. 19. Os artigos do culto foram purificados pelos Mantras e terminaram todos os ritos preliminares. O Mestre fez sinal para que a Santa Mãe se sentasse no assento de madeira enfeitado de Alimpana. Enquanto presenciava o culto, a Santa Mãe já estava em estado semi-consciente. Não totalmente consciente do que fazia, ela como uma pessoa encantada pelos Mantras, permaneceu olhando para o norte, à direita do Mestre que estava sentado com o rosto para o leste. Segundo as prescrições das escrituras, o Mestre aspergiu repetidamente a Santa Mãe com água purificada pelos Mantras, do jarro colocado diante dele, pronunciando o Mantra em seu ouvido recitando a oração: 'Ó Senhora, Ó Mãe Tripurasundari que és a controladora de todos os poderes, abre a porta à perfeição! Purifica seu corpo e sua mente (da Santa Mãe), manifesta-Te nela e sê benéfica." 20. Depois o Mestre executou o Nyasa dos Mantras na pessoa da Santa Mãe de acordo com as prescrições dos Sastras e adorou-a com os dezesseis artigos, como se fosse a Própria Devi. Em seguida ofereceu alimento com sua mão e pôs uma parte dele na boca da Santa Mãe que perdeu a consciência normal e entrou em Samadhi. O Mestre também, pronunciando Mantras em seu estado semi-consciente, entrou em completo Samadhi. O adorador em Samadhi tornou-se perfeitamente identificado e unido à Devi. Passou-se um longo tempo. O segundo quarto da noite terminou e o terceiro já ia adiantado, quando o Mestre, cuja alegria estava somente no Ser, apresentou um pequeno sinal de retomar à consciência normal. Retomando ao estado semi-consciente novamente, ofereceu-se à Devi. Agora abandonou para sempre aos pé de lótus da Devi tudo o que era seu - o resultado de suas Sadhanas, seu rosário etc. - a par com seu ser e saudou-a pronunciando os Mantras: "Ó Tu, Ó bom augúrio de todas as coisas auspiciosas! Ó porta de todas as ações! Ó refúgio! Ó Uno de três olhos! Ó esposa de pele clara de Siva! Ó Narayani! Inclino-me ante Ti, inclino-me ante Ti!" A adoração chegou ao fim. 2 (2 Com respeito à data exata do Shodasi Puja, há uma outra versão que saiu depois da publicação desse livro. Está contido no trabalho bengali sobre as conversações da Santa Mãe, entitulado MayerKatha, vol.II. Nele está relatado que ela falou que o Puja teve lugar depois de um mês e meio após sua chegada a Dakshineswar. Neste caso deve ter ocorrido no puja Phalaharini-Kali de junho de 1872 e não, em maio de 1873. ) A Sadhana
do Mestre alcançou seu ápice com a adoração d'Aquela que governa o universo, a Mãe Divina no
corpo de uma mulher, a personificação do próprio conhecimento espiritual. O homem-deus alcançou perfeição em todos os aspectos. 21. A Santa Mãe permaneceu com o Mestre mais ou menos cinco meses depois da adoração de Shodasi. Agora, como antes, ela empenhava-se no serviço do Mestre e de sua mãe, passava seu dia no Nahabat e à noite compartilhava da mesma cama que ele. O Mestre vivia em contínuo Bhava-Samadhi, dia e noite. Às vezes sua mente mergulhava em Nirvikalpa Samadhi de tal maneira que apareciam em seu corpo sinais de morte. Apreensiva com a ocorrência de tais estados a qualquer hora da noite, a Santa Mãe não podia dormir. Quando numa ocasião o Mestre não desceu à consciência normal do Samadhi durante muito tempo, ela ficou alarmada e não sabendo o que fazer, perturbou o sono de Hriday e de outros. O Samadhi do Mestre terminou quando Hriday chegou e pronunciou os nomes de Deus em seus ouvidos durante bom tempo. Vindo a saber de tudo isso depois de seu Samadhi e também da perturbação do sono da Santa Mãe a cada noite, o Mestre arranjou para que levassem a cama dela para o Nahabat junto de sua mãe. Ela viveu assim cerca de um ano e meio com o Mestre em Dakshineswar e voltou a Kamarpukur provavelmente num dia de outubro de 1873. CAPITULO XXI EPÍLOGO À HISTÓRIA DAS SADHANAS DO MESTRE ASSUNTOS: 1. O desejo do Mestre por Sadhana termina com o Shodasi-Puja. 2. A razão para isto. 3. A prática da religião de Jesus. 4. Sua visão da verdadeira forma de Jesus. 5. Seus pontos de vista a respeito de Buda. 6. A fé do Mestre na religião Jaina e Sikh. 7. Reafirmação das experiências extraordinárias do Mestre . 8. Experiências a respeito de si mesmo. 9. Experiências sobre assuntos espirituais em geral. 10. Opiniões de três Sadhakas eruditos sobre o Mestre. 11. A época da chegada desses três eruditos. 12. O Mestre gritando pela chegada dos seus devotos do círculo íntimo.
1. O voto de Sadhana do Mestre completou-se com a adoração de Shodasi. Durante doze longos anos o fogo sagrado da paixão pela intoxicação de Deus queimou constantemente em seu coração, mantendo-o incansavelmente empenhado nas práticas das várias atitudes espirituais sem lhe permitir qualquer descanso mesmo depois de haver terminado as Sadhanas de cada determinado atitude. Com a adoração de Shodasi parou de queimar, tendo recebido o Purnahuti ou a oblação completa e final. E o que mais poderia ele fazer? Por que teria agora sobrado algo que ele pudesse chamar de seu e que já não houvesse oferecido como oblação? Há muito tempo havia sacrificado todas as coisas cobiçadas do mundo - riqueza, honra, nome, fama etc. Havia oferecido como oblação às suas terríveis chamas, uma atrás da outra, seu coração, forças vitais, mente, intelecto, memória, egoísmo etc. A única coisa que havia permanecido com ele era o desejo de ver a Mãe do universo nas Suas diversas relações e formas ao trilhar os vários caminhos de Sadhana. Aquele desejo também foi agora oferecido ao fogo. O que mais poderia fazer a não ser permanecer tranqüilo? 2. Conhecendo a ansiedade do coração do Mestre, a Mãe Divina lhe havia concedido, em primeiro lugar, a bênção de Sua visão e em seguida o havia colocado em contato com pessoas de extraordinárias e nobres qualidades, com cuja ajuda ele poderia trilhar os vários caminhos das Escrituras, de forma que pudesse comparar sua primeira visão d'Ela com os resultados finais de todas as Sadhanas. Portanto o que ele poderia pedir-Lhe agora? Viu também que as práticas dos sessenta e quatro Tantras haviam sido feitas por ele uma após outra e que todas as disciplinas relacionadas com as cinco atitudes da fé Vaishnava, que prevaleciam na Índia, haviam também sido levadas a cabo de acordo com as prescrições das Escrituras; que, seguindo o eterno caminho védico e tendo sido iniciado em Sannyasa, teve a visão da Mãe Divina sem forma e sem atributos; e que, por Seu inescrutável jogo, havia tido resultado correto das Sadhanas, de acordo com o Islamismo, religião que tivera sua origem fora da Índia. Por conseguinte, o que ele agora poderia pedir à Mãe Divina para lhe mostrar ou contar? 3. Um ano depois a mente do Mestre novamente procurou ter a visão da Mãe Divina por um outro caminho. Nessa ocasião conheceu Sambhudaran Mallick que costumava ler a Bíblia para ele. Assim veio a conhecer a vida pura de Jesus e da crença que Ele fundou e o desejo de seguir a Sadhana daquele caminho surgiu em sua mente. Mal surgiu o desejo em sua mente, e a Mãe Divina o satisfez de forma maravilhosa e abençoou-o. Não teve que fazer qualquer esforço para essa realização. O que ocorreu foi o seguinte: a casa de Jadunath Mallick está situada ao sul do templo de Kali em Dakshineswar. O Mestre costumava passar por lá de vez em quando. Jadunath e sua mãe tinham uma grande devoção ao Mestre desde a primeira vez que o
encontraram e assim, mesmo que não tivessem em casa quando o Mestre ia lá, os funcionários abriam a porta da sala de visitas e pediam-lhe para que se sentasse e descansasse um pouco. Havia alguns quadros lindos na sala. Um deles era o Menino Jesus no colo de sua mãe. O Mestre costumava dizer que um dia estava sentado na sala olhando atentamente para o quadro e pensando na vida extraordinária de Jesus, quando sentiu que o quadro tomava vida e que raios brilhantes de luz, saindo dos corpos da mãe e da Criança, entraram em seu coração e mudaram radicalmente as idéias de sua mente! Vendo que todas as impressões hindus inatas estavam desaparecendo num canto escondido de sua mente e que outras diferentes estavam surgindo, tentou, por diversas maneiras, controlar-se e orou ansiosamente à Mãe Divina: "Que estranhas mudanças Tu me estás trazendo, Mãe?" Mas nada adiantou. Levantando com grande força, as ondas daquelas impressões submergiram completamente em sua mente, as idéias hindus. Seu amor e devoção aos Devas e Devis desapareceram e em seu lugar uma grande fé e reverência por Jesus e sua religião ocuparam sua mente. Começou a ver devotos cristãos oferecendo incenso e luz diante da imagem de Jesus, na igreja, e sua mente penetrou no espírito da ânsia que sentiam pelo Senhor, expressa em seus corações sinceros. O Mestre voltou ao templo de Dakshineswar e permaneceu o tempo todo absorvido na meditação daqueles estados interiores. Esqueceu-se totalmente de ir ao templo da Divina Mãe e prestar-Lhe reverência. As ondas daquelas idéias dominaram sua mente por três dias. Por fim, quando o terceiro dia terminou, o Mestre viu, enquanto caminhava no Panchavati, que um maravilhoso Deus-homem de pele muito clara vinha em sua direção, olhando fixamente para ele. Logo que o Mestre o viu, notou que se tratava de um estranho. Observou que seus grandes olhos davam uma beleza extraordinária a seu rosto e que a ponta do seu nariz, embora um pouco chato, não prejudicava de todo aquela beleza. O Mestre, encantado ao ver a extraordinária expressão divina daquela linda face, ficou imaginando quem seria. A pessoa aproximou-se dele e logo do fundo do coração puro do Mestre saíram, como o som de uma campainha, as palavras de Jesus: "Jesus, o Cristo! O grande Yogi, o amoroso Filho de Deus, Uno com o Pai, que deu o sangue do seu coração e sofreu torturas sem fim para livrar o homem do sofrimento e da miséria!" Jesus, o homem-Deus, então abraçou o Mestre e desapareceu em seu corpo e o Mestre entrou em êxtase, perdeu a consciência e permaneceu identificado por algum tempo com o onipresente Brahman com atributos. Tendo alcançado a visão de Jesus dessa maneira, o Mestre ficou livre de qualquer dúvida a respeito de Cristo ter sido uma Encarnação de Deus. 4. Quando mais tarde, após esse evento, visitamos o Mestre, ele abordou o assunto de Jesus e perguntou: "Bem, rapazes, vocês leram a Bíblia, podem me dizer o que está escrito sobre os traços físicos de Jesus? Qual era a sua aparência?' Respondemos: "Senhor, não vimos nada a esse respeito na Bíblia, mas como nasceu judeu, deve ter tido a pele clara, olhos grandes e um nariz aquilino, com certeza." Quando assim lhe dissemos, o Mestre disse: "Mas vi que a ponta do seu nariz era chato, não sei porque O vi assim." Embora nós não tenhamos dito nada sobre o que o Mestre nos dissera, pensamos: "Como pode a forma vista por ele em êxtase coincidir com a verdadeira forma de Jesus? Como todos os judeus, ele também deve ter tido um nariz aquilino." Mas viemos a saber, pouco tempo depois da morte do Mestre, que havia três descrições diferentes dos traços físicos de Jesus e que, segundo uma delas, a ponta do seu nariz era um pouco chato. 5. Sabendo que o Mestre foi perfeito segundo os princípios das principais religiões prevalecentes no mundo, o leitor talvez fique imaginando qual era a sua opinião a respeito de Buda. É oportuno que relatemos aqui o que conhecemos sobre o assunto. O Mestre considerava Buda como os hindus em geral o consideram. Sempre ofereceu sua amorosa adoração e reverência a Buda como Encarnação de Deus e acreditava que a Encarnação de Buda continuava mesmo agora a manifestar-se na imagem de Puri de "três gemas" nas formas de Jagannath, Subhadra e Balaram. Quando soube que a glória do lugar acima mencionado era a que, por graça de Jagannath, fazia desaparecer todos os sentimentos de diferença e por conseguinte todas as distinções de casta, teve vontade de visitá-lo. Mas desistiu da idéia (IV.3), quando veio a saber que não sobreviveria à visita daquele lugar santificado. Compreendeu, por sua percepção interior, que a vontade da Mãe Divina era contra sua ida lá. Já falamos da firme fé do Mestre no poder purificatório das águas do Ganga, que ele considerava o próprio Brahman em forma líquida (Brahmavari). Acreditava igualmente que a mente do homem, apegada, aos objetos do mundo, torna-se imediatamente pura e preparada para apreender conceitos espirituais, ao tomar comida oferecida a Jagannath. Quando era obrigado à estar em companhia de pessoas mundanas durante um certo tempo, bebia imediatamente depois um pouco de água do Ganga e o "Atke" Mahaprasad, arroz cozido oferecido a Jagannath e pedia a seus discípulos para fazerem o
mesmo. mesmo. Além Além do que foi dito acima acima sobre a fé do Mestre Mestre em Buda como Encarnaç Encarnação ão de deus, viemos também a saber, de outro fato que confirma essa opinião. Quando o grande poeta Girish Chan Chandra dra Ghos Ghosh, h, segu seguidor idor muito muito devota devotado do do Mestre, Mestre, public publicou ou seu drama, drama, Buddha Buddha-ch -chari arita, ta, retratando o jogo divino de Buda, o Mestre assistiu à encenação e disse: "É certo que Buda é uma Encarnação Encarnaçã o de d e Deus. Não há diferença diferença entre a crença fundada por Ele e o caminho védico védico do Conhecimento." Nossa opinião é que o Mestre chegou a essa conclusão através de sua percepção espiritual. 6. O Mestre Mestre ouviu ouviu dos Jainas Jainas e Sikhs Sikhs,, no final final de sua vida vida,, muit muitas as coisas coisas sobre sobre os Tirthankaras, fundadores da religião Jaina Jaina e sobre os dez Gurus, Gurus, de Nanak Nanak a Govinda, fundadores fundadores da religião Sikh. Devotava Devotava muito amor e respeito por todos eles. Além das figuras das divindades, havia uma imagem de pedra de Mahavira, o Tirthankara e um quadro de Jesus numa das paredes de seu quarto. O Mestre também os adorava todas as manhãs e à tarde, queimando incenso diante de ambos, ambos, como como havia feito antes com todos os outros quadros. Mas apesar de ter-lhes ter-lhes mostrado mostrado assim grande amor e reverência, nunca o vimos referir-se a qualquer um dos Tirthankaras ou a qualque qualquerr um dos dez Gurus como Encarnação de Deus. Sobre os dez Gurus dos Sikhs, costumava dizer: "São todos encarnações do Rishi Janaka. Janaka. O real Rishi Janaka, disseram-me disseram-me os Sikhs, teve o desejo, às vésperas de sua liberação, de fazer bem a seu povo. Daí renascer dez vezes como Guru, de Na Nana nakk a Govi Govind ndaa e depo depois is de ter ter estab estabele eleci cido do a relig religiã ião o entre entre os Sikh Sikhs, s, "perma "permanec neceu eu eternamente unido ao Brahman Supremo. Não há motivo para achar que o que os Sikhs Sikhs dissera disseram m não seja verdadeiro." 7. Quando se tornou perfeito em todas as Sadhanas, o Mestre teve algumas experiências únicas únicas.. Alguma Algumass referia referiam-s m-see a si mesmo e outras eram sobre assuntos espirituais espirituais em geral, Embora Embora já tenham tenhamos os mencio mencionad nado o alguma algumass dessas dessas experiênc experiências ias,, trataremos trataremos aqui somente das princip principais ais.. Quando Quando estabel estabeleci ecido do constantem constantemente ente no estado estado divino divino de Bhavamukha Bhavamukha (limite da consciência consciência relativa), no final de suas Sadhanas, ele parecia ter tido uma consciên consciência cia vívida vívida do signifi significado cado dessas dessas experiência experiências. s. Embora o Mestre as tenha tido com a ajuda de sua visão ióguica, daremos aqui uma explicação racional para elas. 8. Primei Primeiro, ro, o Mestre Mestre estava estava conve convenci ncido do de que era uma uma Enca Encarn rnaç ação ão de Deus Deus,, um Adhikarika Purusha, cujos esforços espirituais era para o bem dos outros. Comparando a vida de outros Sadhakas Sadhakas com a sua, pôde ver uma grande diferença entre eles com a ajuda da razão. Viu que um aspirante comum praticava uma atitude espiritual a vida inteira e quando realizava Deus segundo segundo essa atitude, ficava satisfeit satisfeito o e marcava marcava o fim de sua Sadhana. Sadhana. Seu caso, entretanto, foi muit muito o difere diferent nte. e. Nã Não o ficou ficou satisfei satisfeito to enquanto enquanto não praticou praticou as discipli disciplinas nas segundo segundo toda todass as atitudes e credos e além disso, precisou de pouco tempo para ser bem sucedido na prática de qualquer atitude ou credo que adotasse. Um efeito só pode ser produzido por uma causa; sua busca da causa do fato acima levou-o à meditação profunda e mostrou-lhe a razão dada acima. Ela lhe fez saber que sua condiç condição ão era única única porque porque ele era uma Encarn Encarnaçã ação o especi especial al de Deus, Deus, o Todo Todo Poderoso, sempre livre, sempre puro e sempre desperto. Isso o fez realizar mais, que todas as suas práticas espirituais extraordinárias haviam trazido uma nova luz para o mundo espiritual e que ele teve de levar a cabo todas elas, não para a realização realização de qualquer desejo desejo pessoal, pessoal, mas somente para o bem de todos. Estava convencido de que, ao contrário dos Jivas, não alcançaria Liberação. Mas não leva muito tempo para que isso ser compreendido, mesmo com a ajuda do raciocínio comum. Como se pode falar de liberação para alguém que está eternamente unido a Deus, que é uma parte especial d'Ele, d'Ele, sempre sempre livre livre,, puro puro e desper desperto to e que que não não tem qualque qualquerr desejo desejo ou limit limitaçã ação? o? Enqua Enquant nto o o trabalho de Deus de redimir os Jivas continuar, Ele terá de Se reencarnar de tempos em tempos para executá-lo. Portanto como pode ter Liberação? O Mestre costumava dizer: "Um administrador tem sempre sempre que correr para onde onde há desordem em sua propriedade." Isso não foi a única coisa a respeito de si que o Mestre veio a conhecer com a ajuda de sua visão ióguica. Apontando para a direção noroeste, disse-nos repetidamente que na próxima vez viria naquela região. Alguns 1 (1 O grande poeta Girísh Chandra Ghosh. ) afirmam que ele anunciou a época de sua próxima vinda e disse: "Devo vir naquele naquele lado lado (direção (direção norte-ociden norte-ocidental) tal) daqui daqui a duzentos duzentos anos. anos. Muitos Muitos serão serão então então liberados. Aqueles que não o conseguirem nessa ocasião terão que esperar muito tempo." O Mestre veio a conhecer em Bhavasamadhi a época de sua morte muito tempo antes dela ocorrer. Um dia disse à Santa Mãe em Dakshineswar, num exaltado estado espiritual: "Quando você me vir aceitando aceitando comida comida das mãos de qualquer qualquer um e de todos, passando passando as noites em Calcutá Calcutá e comendo um pouco do que outra uma pessoa já havia comido - saiba que a época da minha morte está próxima." Essas palavras, ditas pelo Mestre, provaram literalmente serem verdadeiras. Em outra ocasião disse à Santa Mãe, em estado de exaltação espiritual: "Não comerei nada nos meus
últimos dias que não seja mingau." Já dissemos dis semos em outro lugar lugar como isso veio a ser verdadeiro (III.2). 9. Vamos agora relatar o segundo tipo de experiências suas, relativas a assuntos espirituais em geral. Depois de alcançar perfeição segundo todas as crenças, o Mestre convenceu-se firmemente que todas as religiões religiões são verdadeiras verdadeiras - que todas tod as as crenç crenças as são apena apenass muitos muitos camin caminhos hos.. O Mest Me stre re realizo re alizou u isso isso,, tanto tanto por seus poderes ióguicos, ióguicos, quanto pela razão. Ao fazer fazer Sadhana Sadhanass segundo todas as crenças, realizou durante a vida o resultado final de cada uma das disciplinas. Não se leva muito tempo para compreender compreender que o propósito da vinda do Mestre, a Encarnação Encarnação da época atual, é promulgar a verdade acima mencionada, deter o declínio das crenças e pôr fim às disputas disputas entre elas. elas. Antes, Antes, nenhuma nenhuma outra Encarnação Encarnação de Deus havia realizado realizado tão amplamente amplamente essa verdade em sua vida com ajuda de Sadhana e a ensinou ao mundo. Se a eminência das Encarnações de Deus deve ser determinada na base da liberalidade das doutrinas espirituais que sustentam, o lugar mais elevado deve ser indubitavelmente dado ao Mestre por ter pregado essa doutrina. Em segundo lugar as doutrinas de dualismo, não-dualismo qualificado e não-dualismo vêm por si mesmas a cada pessoa de acordo com seu progresso espiritual. O Mestre, portanto, disse que elas não se contradizem entre si mas dependem dos estágios particulares de evolução de cada mente humana. Ao se pensar um pouco, pouco, fica clara clara a imensa ajuda ajuda que o homem pode ter se compree compreende nderr as escrit escritura urass segund segundo o essa essa reali realizaç zação ão do Mestre Mestre.. As palavr palavras as não podem podem exprimir adequadamente a confusão sem fim que foi criada e quão intrincado ficou o caminho para para a espi espiri ritu tual alid idad adee pela pelass três três dout doutri rina nass acim acimaa menc menciona ionadas, das, descobertas descobertas pelos Rishis Rishis e relatadas relatadas nos Vedas, Vedas, Upanisha Upanishads ds e outras outras escritu escrituras ras.. Incapa Incapazes zes de se harmoni harmonizare zarem, m, os seguidores seguidores de cada uma dessas dessas doutrinas doutrinas empenharamempenharam-se se o mais mais que pudera puderam m para para provar provar que, mesmo ferindo os textos, o que pregavam era a única interpretação correta das escrituras. O resultado dessa tentativa dos comentadores fez surgir um certo medo na mente das pessoas em nome de discussões religiosas para determin determinar ar as verdades verdades dos Sastras Sastras.. E esse esse medo medo ocasiono ocasionou u uma descrença nos Sastras, levando à degradação espiritual da Índia. Portanto foi necessário para o Mestre, a Encarnação desta época, realizar as três doutrinas nos diferentes estágios de sua própria vida e propagar a todos sua maravilhosa harmonia. O único caminho que nos conduzirá ao entendimento dos Sastras é recordar-nos sempre esta conclusão do Mestre. Lembremo-nos sempre do que o Mestre disse sobre este assunto: "Saibam que o estado não-dual de consciência é o último últi mo a ser realizado; realizado; é a realização realização além da mente e da fala.” "Somente os estados estado s até o dualismo não-qualificado podem ser ser compreend compreendido ido pela pela mente mente e pelo pelo intel intelect ecto o e express expressos os em pala palavra vras. s. Nesse Nesse estad estado, o, tant tanto o o abso absolu luto to como como o relat relativ ivo o são igualmente igualmen te eternos. eterno s. O Próprio Própr io Senhor S enhor,, Seu nome e Sua Su a morada - são são todos todos de Consc Consciên iência cia Pura. Pura.” ” "Para os seres humanos comuns, nos quais há apego aos objetos mundanos, o dualismo é recomendável. Para eles aconselha-se o canto em voz alta do nome do Senhor, Sua Glória, Seus poderes etc., como ensinado no Narada Pancharatra." O Mestre pôs limites à execução de ações para o desenvolvimento espiritual do homem e disse: "Numa pessoa em que predomina o Sattva a tendência para ação cai normalmente. Ele não as pode executar apesar de seus esforços nesse sentido. Colocado sob outra forma, forma, Deus não permite que ele as execute. execute. Tome, por exemplo, o caso de uma cunhada; quanto mais próximo estiver do parto, mais suas obrigações domésticas caem e, quando a criança nasce, não tem nada a fazer a não ser cuidar dela. Mas todas as outras pessoas devem depender de Deus e fazer as ações como a empregada2 (2 "Uma empregada serve uma família
rica, atende cuidadosamente a todas as suas obrigações, toma conta da todas as coisas da casa, educa as crianças como suas, acariciaas e alimenta-as, comporta-se com as outras pessoas da família como se fosse um membro da família, serve e até mesmo briga com os outros pelo bem da família. Mas ela sabe o tempo todo que não pertence à família, que uma palavra do dono da casa ou da concubina, é suficiente para pô-la na rua, e que seu verdadeiro lar e seus familiares estão muito longe, no vilarejo." De maneira similar, Ó homem do mundo, viva no mundo, misture-se com os membros de sua família, sirva-os da melhor maneira que puder, mas saiba no fundo do coração que eles não são seus e que seu lar e seus verdadeiros parentes parentes estão no reino dos céus, Deus sendo o verdadeiro verdadeiro centro deles todos, sua vida e seu ser. - Evangelho de Sri Ramakrishna - (Texto tirado de várias partes partes do li vro e adaptado adaptado). ).) de uma família rica na parábola. Trabalhar assim é o que se chama
Karmayoga. Repetir continuamente o nome de Deus, juntamente com meditação n'Ele e fazer todas as ações na maneira mencionada - é esse o caminho." O Mestre compreendeu que, como instrumento nas mãos mãos da Mãe Mãe do univer universo, so, teri teriaa de encontrar uma nova Comunhão especialmente adequada para a fé liberal revelada em sua própria vida. O Mestre realizou tudo isso durante a vida de Mathur Babu. "A Mãe" disse ele a Mathur, havia-lhe falado que muitos devotos viriam a ele para alcançarem espiritualidade. É desnecessário acrescentar que isto veio a ser literalmente verdadeiro. Certo dia no jardim de Kasipur o Mestre, olhand olhando o para para sua própria própria fotograf fotografia, ia, disse-nos disse-nos:: "Esta "Esta é uma fotograf fotografia ia que mo most stra ra um
elevado estado de Yoga. Ela 3 (3 Esta é a fotografia do Mestre, sentado em Samadhi. ) será adorada daqui em diante de casa em casa." Soube, Soube, com a ajuda ajuda de seu poder poder ióguic ióguico o que aqueles aqueles que esta estava vam m em sua últim últimaa encarn encarnaç ação ão viria viriam m a ele para para alcançar alcançar espiritualidade. Já expressamos ao leitor nossa opinião a esse respeito (IV.4). É, portanto, desnecessário repeti-lo aqui. 10. Três eminentes Sadhakas-pandits, bem versados nas escrituras, vieram até o Mestre durante durante os três períodos períodos importantes importantes de sua Sadhana, Sadhana, viram com seus próprios olhos seus estados espirituais e tiveram a oportunidade de discuti-los. Pandit Padmalochan viu o Mestre depois que ele havia havia alcançado alcançado perfeição per feição nas práticas tântricas. O Pandit Vaishnavacharan encontrouencontrou-o o depois de seu sucesso nas disciplinas Vaishnavas e o Pandit Gauri teve o privilégio de ver o Mestre tomado pelo esplen esplendor dor divino divino produz produzido ido pela Sadha Sadhana, na, quando quando havia havia terminado terminado todas as suas práti prática cass espi espiri ritu tuai ais. s. Padm Padmal aloc ocha han n viu viu o Me Mest stre re e diss disse: e: "Vej "Vejo o em você você pode poderr divi divino no e manifestaçã manifestação." o." Compond Compondo o um hino em sânscr sânscrito ito que descreve descreve o Mestre Mestre como uma Encarnação de Deus, Vaishnavacharan cantou-o para o Mestre em êxtase. De maneira semelhante, Gauri, ao ver o Me Mest stre, re, disse disse-l -lhe he:: "Vej "Vejo o real realiz izad ado o no senh senhor or,, de form formaa tang tangív ível el,, todos todos os estados estados espirituais elevados relatados nas escrituras que li. Além disso, vejo no senhor as manifestações de tais estados exaltados, de uma maneira que não estão relatados nelas. Seu estado transcendeu àqueles mencionados nos Vedas, Vedanta e outros Sastras. O senhor não é um ser mortal. A Real Re alida idade de da qual qual origin originam am-se -se as Encarn Encarnaç ações ões,, está está no senho senhor." r." Ao estu estuda darm rmos os a hist histór ória ia extraordinária da vida do Mestre e de suas maravilhosas experiências, mencionadas anteriormente, podemos claramente compreender que aqueles pandits-Sadhakas proeminentes não disseram as palavr palavras as acima acima por bajula bajulaçã ção. o. As datas datas da chegada chegada daqueles daqueles eruditos eruditos a Dakshi Dakshinesw neswar ar foram foram determinadas assim: 11. Quando Quando esteve esteve em Dakshine Dakshineswar swar pela primeira primeira vez, a Santa Mãe encontrou o Pandit Gauri. Também o Mestre nos disse que o Pandit veio a Dakshineswar quando Mathur Babu ainda estava vivo. Portanto parece que ele chegou a Dakshineswar Dakshineswar em 1871 onde permaneceu permaneceu com o Mestre até 1873. O Mestre sempre manifestou desejo de conhecer aqueles Sadhakas-pandits que procura procuravam vam pôr pôr em prática prática o conhec conhecimen imento to das escrituras, escritur as, que q ue haviam adquirido adquir ido ao longo l ongo de sua vida. Como Bhattacha Bhattacharya rya Sri Gaurikant Gaurikantaa Tarkabhus Tarkabhushan han (porque esse era o nome nome complet completo) o) perte pertenc ncia ia àquel àquelaa espéc espécie ie de Sadh Sadhak akas as,, o Mestre Mestre alim aliment entava ava o desejo desejo de vê-lo vê-lo e troux trouxe-o e-o a Dakshineswar através de Mathur, que o convidou. O Pandit morava no vilarejo de Indesh perto da terra natal do Mestre. O irmão de Hriday, Ramratan, levou o convite de Mathur a Gaurikanta e trouxe-o ao templo sagrado de Dakshineswar. Já falamos ao leitor em outro lugar (III.I) sobre o poder poder maravil maravilhoso hoso que lhe adveio de sua Sadhana Sadhana e da maneira maneira pela qual veio a renunci renunciar ar ao mundo devido ao desenvolvimento gradual do intenso desapego pelo seu contato com o Mestre durante sua permanência em Dakshineswar. A data do Annameru, oferenda de uma "montanha de comida", havia sido fixada em 1864 como vemos mencionado no livro "A História da Vida da Rani Rasmani". O Mestre falou-nos sobre a ansiedade ansiedade de Mathur Mathur em trazer trazer Padmaloc Padmalochan, han, sob convite, convite, a Dakshi Dakshinesw neswar ar e fazê-lo fazê-lo então, então, aceitar presentes. Portanto 1864 é considerado o ano em que Batthacharya Sri Padmalochan Tarkalankar, o erudito vedantista, veio ao Mestre. A época época em que o Pandit Pandit Vaishn Vaishnava avacha charan ran,, filho filho de Utsa Utsava vana nand ndaa Gosw Goswam ami, i, veio veio a Dakshineswar, pode ser facilmente determinada, porque ouvimos do Mestre sobre o debate dele em Dakshineswar a respeito da divindade do Mestre, primeiro com Yogeswari, a Bhairavi Brahmani e depois, com Gaurikanta Tarkabhushan. Como a Brahmani, Vaishnavacharan viu manifestado na ment mentee e no corp corpo o do Me Mest stre re todo todoss os sina sinais is de Ma Maha habh bhav ava, a, menc mencio iona nado doss nas nas escr escrit itur uras as vaishnavas. Perdeu-se em admiração com o ponto de vista da Bhairavi de que o Mestre era o Próprio Gauranga, sob nova forma. Quando se ouve as palavras do Mestre acima mencionadas, fica clar claro o que Vaish Vaishnava navacha charan ran veio veio ao Mestre Mestre em 1865 depois que este este último último havia se tornado tornado perf perfei eito to na disc discip iplilina na de Ma Madh dhur uraa Bhav Bhava. a. Vais Vaishn hnava avach char aran an freqü reqüen ento tou u Daks Dakshi hine nesw swar ar ocasionalmente até 1873. 12. Foi por inspiração divina, que surgiu na mente do Mestre um novo e intenso desejo, depois depois de ter tido tido as experiên experiênci cias as mencionadas mencionadas anteriormente. anteriormente. Tornou-se muito ansioso ansioso para encontrar seus devotos, anteriormente vistos nas suas visões ióguicas, e transmitir-lhes seu próprio pode poderr de espir es pir itual it ualidade. idade. "Aquel "Aquelaa ansieda ansiedade" de",, disse o Mestre Mestre,, "não tinha tinha li mi t e . Com Com grand grandee dificulda dificuldade de eu conseguia conseguia controlar controlar aquela aquela ansiedade ansiedade constante durante o decorrer de correr do dia. Ouvindo as conversas vãs das pessoas mundanas, que na verdade me pareciam veneno, costumava pensar que, quando chegassem, eu teria com eles conversas agradáveis sobre Deus, que acalmariam minha mente e meu coração e refrescariam meus ouvidos. Eu então lhes falaria sobre minhas
próprias experiências pessoais, aliviando assim o fardo do meu coração. A idéia da chegada deles ficou associada a tudo a meu redor e levou-me a pensar incessantemente neles. Fiquei pronto sobre o que deveria dizer ou dar a cada um deles. Quando o dia acabava e a noite chegava, não mais podia controlar com paciência aquela onda de ansiedade; surgia o pensamento de que outro dia havia transcorrido e nenhum deles havia chegado. Quando os templos ressoavam com os sons das conchas, dos sinos etc., subia ao terraço da 'mansão' dos proprietários. Desassossegado com a angústia do meu coração, gritava com o máximo de minha voz e com lágrimas nos olhos: "Onde estão vocês, meus filhos? Venham todos. Não posso mais descansar sem vê-los"; e enchia todos os lugares com altos gritos. Tão grande eram minha ansiedade e desassossego que é duvidoso que uma mãe possa querer tão intensamente encontrar seu filho; nem jamais ouvi falar de um casal de amantes ou de amigos comportando-se desse jeito para se reunir. Alguns dias depois, os devotos começaram a chegar, um a um." Alguns acontecimentos importantes ocorreram antes dos devotos chegarem a Dakshineswar, atendendo àquele chamado ansioso do Mestre. Como não estão diretamente ligados à presente parte do livro, vamos falar deles no Apêndice da Parte II do livro. APÊNDICE À PARTE II OS PRINCIPAIS ACONTECIMENTOS DA VIDA DO MESTRE, DESDE A ADORAÇÃO DE SHODASI ATÉ A CHEGADA DE SEUS DEVOTOS 'MARCADOS' ASSUNTOS: 1. A morte de Rameswar. 2. A natureza caridosa de Rameswar. 3. A advertência do Mestre sobre a morte de Rameswar. 4. A preocupação com os sentimentos de sua mãe. 5. O comportamento de Rameswar às vésperas da morte. 6. A aparição de Rameswar após a morte. 7. Ramlal nomeado sacerdote. 8. A história de Sambhu Mallick. 9. Sambhu Mallick constrói um cômodo para a Santa Mãe. 10. A séria doença da Santa Mãe. 11. Sua Prayopavesa no templo de Simhavahini. 12. O comportamento imperturbável de Sambhu Babu face à morte. 13. Os últimos dias de Chandramani. 14. A tentativa do Mestre em praticar Tarpana. 15. O Mestre visita Kesav Babu. 16. Kesav no jardim, em Belgharia. 17. A primeira conversa do Mestre com Kesav. 18. O relacionamento íntimo entre o Mestre e Kesav. 19. O comportamento de Kesav em Dakshineswar. 20. O Mestre ensina Kesav. 21. O casamento em Coochbehar e depois. 22. Kesav reverencia o Mestre mas não pôde aceitar todos seus ideais. 23. A Nova Revelação e a opinião do Mestre a respeito. 24. O Mestre e o problema nacional na Índia. 25. A reação do Mestre à morte de Kesav. 26. Ò Mestre vendo Gauranga no Sankirtan.)
1. Já falamos ao leitor que a Santa Mãe voltou a Kamarpukur em outubro de 1873, depois da adoração de Shodasi. Pouco depois de sua chegada, Rameswar, o segundo dos irmãos mais velhos do Mestre, morreu de tifo. A espiritualidade, de uma forma ou outra, manifestava-se na vida de cada homem e de cada mulher pertencente à linha paterna do Mestre. Ouvimos muitas coisas ilustrativas a esse respeito sobre Rameswar. 2. Rameswar era um homem de natureza muito liberal. Dava sem hesitar aos Sannyasins e faquires que viessem à sua porta qualquer coisa que pedissem, desde que houvesse na casa. Seus parentes disseram que esses mendicantes costumavam vir e desejar muitas coisas - um, uma panela, outro, um jarro d'água, um terceiro, um cobertor e assim por diante - e Rameswar tirava da casa e lhes dava. Se qualquer membro da casa fizesse qualquer objeção, calmamente dizia: "Deixe-os levar, não façam objeção. Teremos muitos desses artigos outra vez, por que se aborrecer?" Rameswar possuía também algum conhecimento de astrologia. 3. Quando Rameswar estava vindo para casa, voltando de Dakshineswar pela última vez, o Mestre soube que ele não regressaria mais e em êxtase, disse-lhe: "Vejo que você está voltando para casa; vá mas não compartilhe o leito com sua esposa; se o fizer, é duvidoso que você sobreviva." Mais tarde um de nós 1 (1 Swami Premananda. ) ouviu a esse respeito, do próprio Mestre. 4. Pouco tempo depois de Rameswar chegar em casa soube-se que estava doente. Quando o Mestre ouviu, disse a Hriday: "Ele não obedeceu à proibição; é duvidoso que sua vida seja salva". Depois de cinco ou seis dias chegaram notícias que Rameswar havia morrido. O Mestre temeu que a notícia sobre a morte do filho fosse um grande choque para sua idosa mãe. Foi ao templo e lamentando-se, orou à Mãe do universo para que Ela a poupasse de sofrimento. Então o Mestre, com lágrimas nos olhos, ele mesmo nos contou, foi do templo até o Nahabat para transmitir a notícia e consolar sua mãe. O Mestre disse: "Eu tinha medo que a mãe pudesse perder completamente a consciência ao ouvir a notícia e aí seria duvidosa a chance dela sobreviver. Mas em realidade, ocorreu o contrário. A mãe ouviu a notícia, expressou um pouco de tristeza e começou a consolar-me dizendo: 'O mundo é transitório, todo o mundo deve morrer um dia ou outro; assim é inútil lamentar-se.' Pareceu-me que a Mãe Divina havia elevado sua mente
ao tom mais elevado, como um Tanpura ajustado a uma nota muito alta e por isso a tristeza e o pesar humanos não a tocavam. Quando notei isso saudei a Mãe Divina repetidamente e fiquei livre de ansiedade." 5. Rameswar teve conhecimento da época de sua morte cinco ou seis dias antes. Contou para os parentes e fez todos os preparativos para o funeral e para a cerimônia de Sraddha. Vendo uma mangueira em frente à sua casa ser cortada por algum motivo, disse: "É bom, a madeira será usada nos ritos do funeral!" Pronunciou o nome sagrado de Sri Ramachandra até os últimos momentos. Ficou inconsciente apenas por certo período de tempo antes de morrer. Antes de sua morte pediu aos parentes para não cremar seu corpo, mas que o enterrassem na estrada próxima. Ao ser perguntado a razão, respondeu: "Vou atingir um céu elevado pela virtude do toque da poeira dos pés de muitos Sadhus que caminharam na estrada." Rameswar morreu altas horas da noite. 6. Rameswar e um aldeão chamado Gopal foram amigos durante muito tempo. Gopal disse que após a morte de Rameswar - que deve ter ocorrido simultaneamente com o incidente - ouviu uma pancada na porta da casa e, ao perguntar quem era, ouviu a resposta: "Sou Rameswar e vou dar um mergulho no Ganga. Raghuvir está ali na casa; por favor veja que Sua adoração não seja prejudicada de modo algum." Quando Gopal foi abrir a porta, ao chamado do amigo, este lhe disse novamente: "Não tenho corpo, assim você não poderá me ver mesmo que abra a porta." Apesar disso Gopal abriu a porta mas não viu ninguém. Então foi à casa de Rameswar para se certificar de que o que ouvira era verdadeiro, e soube que Rameswar havia falecido. 7. Ramlal Chattopadhyaya diz que seu pai Rameswar morreu em 1873 com a idade aproximadamente de cinquenta e oito anos. Apanhou as cinzas do falecido pai e foi para Vaidyavati perto de Calcutá e jogou-as no Ganga. Aí atravessou o rio de barco, para ver o Mestre, em Dakshineswar. Olhando para Barrackpur, enquanto atravessava o rio, viu o templo da Devi Annapurna que estava sendo erigido a favor de Jagadamba Dasi, esposa de Mathur Babu, ainda em construção. A consagração da Devi ocorreu depois, em 1875. Com a morte de Rameswar, seu filho Ramlal foi nomeado sacerdote em Dakshineswar. 8. Quando Mathur morreu, Sambhucharan Mallick de Sinduriapati, Calcutá, veio a conhecer o Mestre e dedicou-lhe grande amor e reverência.2 (2 Alguns devotos do Mestre dizem que ouviram-no dizer que depois da morte de Mathur Babu, Manimohan Sen de Panihati tomou para si o amoroso dever de suprir todas as necessidades do Mestre. Manimohan tinha muito respeito pelo Mestre e costumava visitá-lo com freqüência. Sambhu assumiu aquela obrigação depois de Manimohan. Sambhu, o próprio Mestre afirmava, foi o segundo provedor de suas necessidades. Assim Mani Babu parece-nos, não pôde continuar servindo-o por muito tempo, apesar de ter começado a cumprir a tarefa que havia se imposto.) Sambhu por essa época tinha grande atração pela religião do Brahmo Samaj. Era
conhecido das pessoas de Calcutá por sua generosidade. Seu amor e devoção ao Mestre tornavamse cada vez mais profundos e ele teve o privilégio de servi-lo, como Mathur. Também ficava feliz em suprir suas necessidades, sempre que vinha tomar conhecimento de alguma. Continuou a servi-lo até o fim de seus dias e sentia-se altamente gratificado. Sambhu dirigia-se ao Mestre como "Guruji", (honrado preceptor). Aborrecido, o Mestre lhe disse: "Quem é Guru e quem é discípulo? Você é meu Guru." Mas, ao invés de desistir, Sambhu chamou-o assim pelo resto da vida. Essa maneira de se dirigir ao Mestre é prova clara que a companhia do Mestre lhe havia trazido muita iluminação e completo sucesso em sua vida espiritual. Sua esposa também ofereceu ao Mestre adoração do fundo do coração, como ao Próprio Deus. Quando a Santa Mãe estava em Dakshineswar, costumava levá-la para sua casa todas as terças-feiras 3 (3 Terça-feira é olhada como dia auspicioso para a adoração da Devi. ) e adorava seus sagrados pés com os seis artigos tradicionais. 9. A Santa Mãe veio a Dakshineswar pela segunda vez, provavelmente na metade de 1874. Passou a viver, como antes, com a mãe do Mestre no Nahabat. Sabedor disso e presumindo que ela estava se sentindo desconfortável vivendo num aposento tão pequeno, Sambhu comprou, por duzentos e cinqüenta rupias, um terreno próximo ao templo de Dakshineswar no qual desejou construir para ela um espaçoso cômodo, com telhado de sapé. Nessa época, o capitão Viswanath Upadhyaya, oficial do Governo do Nepal estava visitando o Mestre a quem tornou-se extremamente dedicado. Conhecendo a decisão de Sambhu de mandar construir o aposento, o Capitão Viswanath prontamente ofereceu-se para doar a madeira necessária para a construção, porque todos os negócios de madeira Sal do Governo do Nepal estavam em suas mãos e por conseguinte, não lhe seria muito caro consegui-la. Quando se iniciou a construção do quarto, Viswanath enviou três grandes toras de madeira Sal de seu estoque, para o vilarejo de Belur, do outro lado do Ganga. Mas como durante a noite a maré ficou muito alta, uma das peças foi arrastada pela água. Hriday ficou aborrecido chegando ao ponto de chamar a Santa Mãe de "infeliz". Contudo, ao tomar conhecimento de que uma das toras havia sido arrastada, o Capitão enviou outra e a construção foi terminada. A Santa Mãe viveu ali aproximadamente um ano. Uma mulher foi contratada para
ficar com a Santa Mãe e ajudá-la nos seus afazeres. A Santa Mãe cozinhava a comida que levava diariamente ao Mestre no templo de Dakshineswar e voltava depois que ele a tomava. O Mestre também costumava visitá-la durante o dia, ficar com ela algum tempo e depois voltar ao templo. Somente uma vez houve uma exceção a essa rotina. Uma tarde, logo que o Mestre chegou, começou a chover tão forte e continuamente até tarde da noite, que lhe foi impossível regressar ao templo aquela noite. Foi então obrigado a ficar. A Santa Mãe cozinhou sopa e arroz para o Mestre que passou a noite lá. 10. A Santa Mãe teve forte ataque de disenteria depois de estar morando ali há cerca de um ano. Sambhu Babu tomou todos os cuidados para seu restabelecimento. Chamou o Dr. Prasad que a pôs sob tratamento. Na convalescência, foi mandada para sua cidade natal, o vilarejo de Jayrambati, provavelmente em 1876. Mal chegou ocorreu uma recaída da doença e ela ficou novamente de cama. Gradualmente foi piorando tanto que todos duvidaram que ela se recuperasse. Ramchandra, pai da "Santa Mãe”, havia recentemente morrido. Assim, sua Mãe e seus irmãos serviam-na da melhor maneira que podiam. Contaram-nos que ao ouvir a respeito da séria doença, disse a Hriday: "Então, Hriday, parece que a vinda e a saída dela do mundo foi em vão! Não há razão de se tomar um corpo humano se Deus não for alcançado." 11. Vendo que a doença não cedia de jeito algum, a Santa Mãe resolveu observar Prayopavesaba (jejum até a morte), diante da Devi. Pensando que sua mãe e seus irmãos se opusessem, foi sem consentimento deles ao templo de Simhavahini, no vilarejo e aí praticou Prayopavenasa. Depois de permanecer naquela condição por algumas horas, a Devi ficou satisfeita e deu-lhe o remédio para sua recuperação. Mal havia tomado o remédio de acordo com a ordem da Devi, curou-se e ficou forte como antes. Desde que a Santa Mãe havia feito Prayopavesana e obtido o remédio, a Devi passou a ser conhecida nos vilarejos vizinhos como aquela especialmente "despertada", isto é, aquela com quem se pode comunicar, fazer oferendas e orar com a certeza de resposta. 12. Sambhu serviu o Mestre e a Santa Mãe durante aproximadamente quatro anos, quando, então, ficou doente. Um dia o Mestre foi visitá-lo durante sua doença e ao regressar, disse: "Não há óleo no lampião de Sambhu." As palavras do Mestre efetivaram-se pouco tempo depois. Sambhu morreu de diabetes com complicações. Sambhu Babu era muito liberal e um intrépido devoto de Deus. A alegria de sua mente não esmoreceu sequer um dia durante sua enfermidade. Com o coração cheio de alegria disse a Hriday, poucos dias antes de falecer: "Não tenho qualquer ansiedade a respeito da morte; já fiz minhas malas e estou pronto para partir." Muito tempo antes de conhecer Sambhu Babu, o Mestre, em êxtase, viu que a Mãe do universo havia escolhido Sambhu como o segundo provedor de suas necessidades e reconheceu-o à primeira vista. 13. Ocorreu um importante acontecimento na vida do Mestre depois que a Santa Mãe foi para a casa do pai durante a enfermidade. No dia do aniversário do Mestre em 1876 sua mãe, Chandramani Devi, morreu com oitenta e cinco anos. Devido à velhice, sua força mental e seus sentidos começaram a se enfraquecer alguns anos antes da morte. Daremos a seguir a descrição de sua morte, como nos foi transmitida por Hriday: Hriday estava de viagem para casa quatro dias antes da morte de Chandramani. Estava desassossegado com vago temor ocasionado por pressentimentos indefinidos e por essa razão hesitou bastante em voltar para casa e deixar o Mestre sozinho. Hriday passou ao Mestre sua apreensão que lhe disse: "Então não vá." Passaram-se três dias sem que algo ocorresse. O Mestre tinha o hábito de visitar sua mãe diariamente por certo tempo e servi-la com suas próprias mãos. Hriday também costumava servi-la e a mãe de Kali, uma empregada, ficava a maior parte do dia com a velha senhora. Agora ela não estava com boa vontade para com Hriday porque, em sua senilidade, havia ficado com a impressão desde a morte de Akshay, que fora Hriday que o havia matado e que estava tentando matar o Mestre e sua esposa também. Por esta razão, às vezes ela prevenia o Mestre dizendo: "Jamais concorde com o que Hriday diz." Sinais de perda de lucidez devido à idade foram vistos em outras ocasiões. Tome-se por exemplo, o seguinte fato: A fábrica de juta de Alambazar estava situada perto do jardim de Dakshineswar. Os operários tinham licença para sair por algum tempo ao meio-dia. Eram chamados meia hora depois pelo toque de um apito. A velha senhora achava que o apito era o bater das conchas em Vaikunthar e por isso ela não deveria comer antes que o apito tocasse. Ao ser-lhe pedido para que comesse, respondia: "Como posso comer? A comida ainda não foi oferecida à Lakshirni-Narayana. A concha em Vaikuntha ainda não tocou. Pode-se comer algo antes disso?" Era difícil fazê-la sentar-se para comer nos feriados, quando o apito não tocava. Hriday e o Mestre tinham que inventar muitas razões para que ela tomasse a refeição.
O quarto dia chegou. A velha senhora até então não havia apresentado qualquer sinal de enfermidade. O Mestre foi vê-la após o escurecer e encheu sua mente de alegria levando a conversa para o início de sua vida. Ela foi posta na cama à meia-noite, quando então o Mestre voltou para o quarto. Era a manhã seguinte. O relógio bateu oito horas, mas a velha senhora não abriu a porta e saiu. A mãe de Kali subiu até a porta do aposento no primeiro andar do Nahabat, chamando-a repetidamente, mas não obteve resposta. Pôs o ouvido na porta e ouviu um som que não era normal, saindo da garganta da velha senhora. Ficou alarmada e falou com o Mestre e Hriday. Hriday chegou, tirou com jeito a barra da porta, pelo lado de fora e viu que ela estava inconsciente. Trouxe então um remédio ayurvédico e colocou-o na língua. Começou a fazê-la tomar leite e água do Ganga, gota a gota, em pequenos intervalos. Permaneceu naquele estado durante três dias. Chegaram então os últimos momentos. Ela foi levada ao Ganga sagrado. O Mestre ofereceu a seus pés de lótus flores, pasta de sândalo e folhas de basil sagrado. Como era proibido ao Mestre, um Sannyasin, fazer os funerais de sua mãe, ele encarregou o filho de seu irmão, Ramlal, para executar os ritos fúnebres. Quando terminou, Ramlal a pedido do Mestre, libertou um touro e fez a cerimônia do Sraddha segundo as prescrições das escrituras. 14. Em consideração ao prestígio e à honra de Sannyasa e prescrições das escrituras relacionadas com ela, o Mestre não observou Asaucha nem fez quaisquer outros ritos por ocasião da morte da mãe. Sentindo por isso que havia negligenciado os deveres próprios de um filho, certo dia esteve a ponto de oferecer Tarpana. Mas mal havia apanhado um Anjali de água, veio-lhe uma inspiração espiritual; os dedos ficaram insensíveis e separados um do outro e toda a água saiu por entre os dedos, apesar de repetidos esforços para fazer o ritual. Então cheio de tristeza, confessou à sua mãe falecida sua incapacidade para fazê-lo. Mais tarde um Pandit disse-lhe que essa reação vem a um homem que alcançou o estado em que as ações caem. Com o progresso na espiritualidade ele atinge o estado em que a execução de todas as ações védicas torna-se impossível e por essa razão não incorre em pecado. 15. Um importante acontecimento ocorreu na vida do Mestre, pela vontade da Mãe Divina, no ano anterior à morte de sua mãe. Em 1875 o Mestre teve vontade de conhecer Kesav Chandra Sen, chefe do Brahmo Samaj da Índia. Quando o Mestre estava em êxtase recebeu orientação da Mãe Divina nesse sentido e sabendo que Kesav e seus discípulos estavam fazendo práticas na chácara de Jayagopal Sen em Belgharia, a poucas milhas de Calcutá, foi com Hriday na carruagem do capitão Viswanath, onde chegou aproximadamente uma hora da tarde. Naquele dia o Mestre estava usando uma roupa bordada de vermelho. A extremidade da parte da frente, arrumada em dobras, havia sido jogada no ombro esquerdo e balançava em suas costas. 16. Hriday desceu da carruagem e viu Kesav e seus seguidores sentados no ghat do lago do jardim. Aproximando-se, Hriday disse a Kesav: "Meu tio materno é um grande amante de Deus e gosta de ouvir conversas e canções sobre Hari. Ouvindo-as ele fica inspirado e entra em êxtase. Ele soube que o senhor é um grande devoto de Deus e veio aqui para ouvir palestras do senhor sobre a glória divina do senhor. Se o senhor concordar, vou trazê-lo aqui." Kesav concordou. Hriday ajudou o Mestre a descer da carruagem e acompanhou-o. Kesav e os outros até então haviam estado muito ansiosos para vê-lo, mas quando o viram, a ansiedade esfriou porque ele parecia um homem comum. 17. O Mestre aproximou-se de Kesav e disse: "É verdade, senhores, que todos os senhores têm a visão de Deus? Gostaria de conhecer a natureza dessa visão. É por isso que vim até os senhores." Dessa maneira levantou-se o assunto Deus. Não podemos dizer qual foi a resposta de Kesav às palavras do Mestre. Mas o Mestre, disse-nos Hriday, cantou a famosa canção de Ramprasad: "Quem sabe, Ó mente, como Kali é? Ela não pode ser vista pelo estudo dos seis Darsanas" e imediatamente entrou em Samadhi. Quando viram aquele êxtase do Mestre, Kesav e os outros não o consideraram num elevado estado de consciência. Pensaram que se tratasse de simples fingimento ou de um desarranjo do cérebro. Visando trazê-lo de volta à consciência normal, Hriday começou então a pronunciar o Pranava em seu ouvido. A isso seu rosto brilhou com um doce sorriso. Retomando assim à consciência parcial, o Mestre continuou explicando assuntos espirituais profundos numa linguagem tão simples com ajuda de exemplos banais, que todos ficaram encantados e permaneceram olhando fixamente para o seu rosto. Ninguém reparou que a hora de tomar banho e de comer já havia passado há muito tempo e que imperceptivelmente, o momento da próxima prece estava prestes a chegar. Vendo o estado deles, o Mestre disse: "Se outro animal aproxima-se de um rebanho de gado eles vão este avança para atacá-lo com chifradas, mas se chega uma vaca, eles lambem os corpos uns dos outros. Hoje nosso caso é exatamente esse." Dirigindo-se a Keshav disse: "Sua cauda caiu". Incapazes de compreender o significado dessas palavras, os seguidores de Keshav pareciam aborrecidos, mas o Mestre encantou-os ao explicar-lhes o que queria dizer: "Vejam",
disse, "enquanto o girino tem cauda vive somente dentro d'água e não pode subir à terra; mas quando a cauda cai, pode viver tanto na terra como na água. Assim também, enquanto um homem tem a cauda da ignorância, só pode viver na água do mundo, mas quando ela cair, poderá moverse livre pelo mundo como em Existência-Conhecimento-Bem-Aventurança. Sua mente, Ó Keshav, alcançou agora aquele estado em que o senhor pode viver tanto no mundo como, em Existência-Conhecimento-Bem-Aventurança." O Mestre passou muito tempo debatendo assuntos como esse e voltou para Dakshineswar naquele mesmo dia. 18. A mente de Kesav, desde a primeira vez que o viu, foi bastante atraída para o Mestre e desse dia em diante até sua morte, considerou uma honra e um privilégio encontrá-lo e desfrutar de sua companhia. Ele ou ia ao templo de Dakshineswar ou levava o Mestre de vez em quando à sua residência "Kamal Kutir" em Calcutá. O relacionamento entre o Mestre e Kesav aprofundou-se de tal maneira, que ambos sentiam grande falta se não se vissem por alguns dias. Quando isso ocorria, ou o Mestre ia a Calcutá ou Keshav vinha a Dakshineswar. Além disso Keshav considerava como sendo parte do festival anual do Brahmo Samaj vir com seus companheiros até o Mestre ou levá-lo com eles para passarem um dia falando sobre o Divino. Muitas foram as ocasiões em que ele com seus seguidores vieram a Dakshineswar num barco a vapor, cantando todos as glórias de Deus, apanhavam o Mestre e navegavam pelo Ganga, o todo tempo ouvindo seus ensinamentos maravilhosos e doces. 19. Lembrando-se das prescrições das escrituras, Kesav jamais foi de mãos vazias a Dakshineswar. Sempre que vinha, trazia frutas e colocava-as diante do Mestre e como um devotado seguidor, sentava-se a seus pés e conversava com ele. Certa vez o Mestre disse-lhe como um gracejo: "Kesav, você encanta tantas pessoas com suas palestras. Por que não fala qualquer coisa para mim?" Kesav respondeu humildemente: "Senhor, será que devo ir à loja de um ferreiro para vender agulhas? Por favor diga o senhor qualquer coisa e deixe-me ouvir. As pessoas ficam encantadas quando lhes digo algumas palavras suas." 20. Um dia o Mestre explicou a Kesav em Dakshineswar que se uma pessoa aceita a existência de Brahman, tem igualmente que aceitar a existência do poder de Brahman e que Brahman e Seu poder são eternamente um e o mesmo. Kesav aceitou. O Mestre disse-lhe então que, como Brahman e Seu poder, as três entidades, - a saber, as palavras divinas (as escrituras), o devoto e o Senhor - são inseparáveis, em outras palavras, eternamente idênticos. Os três, a saber, as escrituras, o devoto e o Senhor são o Uno e o Uno é os três. Isso Kesav também compreendeu e aceitou. O Mestre continuou dizendo que os três, a saber, o Guru, Krishna (o Senhor) e o devoto são o Uno e o Uno são os três, o que agora ele iria explicar-lhe. Kesav refletiu um pouco - não sabemos que pensamentos passaram por sua mente - e ele disse com humildade, "Senhor, não posso agora aceitar mais do que o senhor já disse. Portanto, é desnecessário tratar deste assunto por hora." O Mestre disse: "Está bem. Vamos parar por aqui." A mente de Kesav, que havia sido inspirada pelas idéias e ideais ocidentais, recebeu assim muita luz na companhia divina do Mestre. Dia a dia seu entendimento a respeito da religião védica expandia-se e ele mergulhou em Sadhana. Isso é evidente porque seus pontos de vista religiosos gradualmente sofreram uma mudança à medida que entrava em contato íntimo com o Mestre. 21. A mente humana a não ser que seja penosamente ferida, não se sente inclinada a se desapegar do mundo e a realizar Deus como o seu tudo. Kesav havia tido um grande golpe depois de dar sua filha em casamento ao príncipe de Coochbehar, aproximadamente três anos após conhecer o Mestre. Esse casamento ocasionou grande comoção no Brahmo Samaj da Índia, que se dividiu em dois. O grupo em oposição a Kesav separou-se formando nova sociedade chamada General Brahmo Samaj. O Mestre em Dakshineswar ficou bastante chocado ao ouvir a respeito daquela briga entre os dois grupos por causa de um assunto fútil. Tomando conhecimento da regra do Brahmo Samaj sobre a idade permitida para o casamento das meninas, o Mestre disse: "Nascimento, morte e casamento são coisas que dependem inteiramente da vontade de Deus. Não podem ser controlados por regras duras e fixas. Por que Kesav quis fixá-las?" Se alguém levantasse o assunto do casamento de Coochbehar e condenasse Kesav na presença do Mestre, ele costumava dizer: "Por que Kesav deve ser reprovado por isso? É um homem que tem família. Por que ele não faria o que fosse bom para seus filhos e filhas? O que há para ser condenado quando um homem, tendo a responsabilidade de uma família em seus ombros, faz algo sem se desviar do caminho da virtude? Kesav em nada agiu contra a religião ou contra a moralidade. Pelo contrário desempenhou o dever de um pai." Portanto olhando do ponto de vista dos deveres de um chefe de família, o Mestre sempre apoiou o ato de Kesav, não o considerando censurável. Contudo não há dúvida de que o golpe ocasionado pelo incidente do casamento de Coochbehar fez a mente de Kesav interiorizar-se ainda mais e conduziu-o mais rapidamente ao longo do caminho
da espiritualidade. 22. Apesar do grande amor do Mestre por ele e das muitas oportunidades que teve de ver e ouvir o Mestre, não se sabe se Kesav, inspirado pelas idéias e pelos ideais ocidentais como estava o tenha compreendido perfeitamente. Porque de um lado ele considerava o Mestre a personificação viva da espiritualidade - pessoalmente levou-o à sua casa, mostrou-lhe os lugares onde dormia, comia, sentava-se e meditava sobre o bem do seu Samaj e pedia-lhe que o abençoasse de maneira que sua mente não pudesse se esquecer de Deus e pensasse nos objetos mundanos quando estivesse num desses lugares. Então, levando-o ao lugar onde meditava em Deus, Kesav ofereceu flores a seus pés de lótus.4 (4 Ouvimos a esse respeito de Vijaykrishna Goswami.) Quando vinha a Dakshineswar muitos de nós o vimos saudar o Mestre, pronunciando, "Salve a (Nova) Revelação!" 23. Por outro lado era incapaz de aceitar completamente a frase do Mestre: "Todas as religiões são verdadeiras - tantos credos, tantos caminhos." Procurou fundar um novo credo chamado: "A Nova Revelação", reunindo o que lhe parecia ser o essencial de todas as religiões e rejeitando o que lhe parecia não essencial. Como esse movimento surgiu pouco tempo depois de ter travado conhecimento com o Mestre, é provável que se tratasse de uma aceitação parcial e da propagação da conclusão final do Mestre relativa à verdadeira natureza de todas as religiões. 24. Quando as poderosas ondas da educação e da civilização ocidentais chegaram à Índia e começaram a ocasionar mudança radical no enfoque espiritual e social das pessoas, todo o homem de talento deste país começou a procurar harmonizar a cultura e a civilização do Oriente com as do Ocidente. Assim como em Bengala, Rammohan Roy, Maharshi Devendranath, Brahmananda Kesav e outros dedicaram suas vidas àquele objetivo, assim também em outras partes do país muitas almas apareceram e fizeram o mesmo trabalho; mas nenhuma delas o conseguiu de maneira perfeita antes da chegada do Mestre. O Mestre praticou convenientemente as disciplinas de todas as religiões da Índia em sua própria vida, alcançando os resultados das Sadhanas prescritas em cada uma delas, mostrando que a religião neste país não era a causa de degradação e que essa causa deveria ser procurada em outro lugar. Mostrou também que a sociedade, modos, costumes, em resumo, a cultura e a civilização da Índia tinham sua base na religião, que havia trazido glória e prosperidade a este país no passado e que a mesma religião que dá vida ainda existe não decaída e que poderíamos novamente pilotar com sucesso o barco nacional, se apenas pudéssemos pôr todos nossos esforços e empenho nela e em nada mais. O Mestre ele mesmo levando uma vida ideal, mostrou ainda o quanto a religião poderia alargar a visão do homem. A seguir transmitiu o poder de liberalizar daquela religião a seus discípulos especialmente Swami Vivekananda - que até então haviam sido inspirados pelas idéias e ideais ocidentais, ensinou como executar todas as ações do mundo tão preso à religião dando assim uma maravilhosa solução para o intricado problema da Índia, acima mencionado. Da mesma maneira como havia estabelecido a harmonia espiritual entre as religiões do mundo ao demonstrar a verdade de todas seguindo realmente as práticas espirituais requeridas por elas, parou com as disputas entre as várias seitas do hinduísmo pelas práticas ortodoxas de cada uma, mostrando sua perfeição em si mesmo. Dessa maneira ele nos demonstrou a verdadeira base de nossa nacionalidade no passado e o que deveria ser feito no futuro. 25. Embora Kesav não tenha logrado compreender a implicação total dos ideais do Mestre, este sentia por Kesav um amor maravilhoso, o que se pode depreender de sua reação à morte de Kesav em 1884. O Mestre dizia: "Não pude deixar o leito por três dias ao saber da notícia; tinha a impressão que um dos meus membros estava paralisado." 26. Vamos fechar esse Apêndice mencionando um fato ocorrido quando se encontrou com Kesav pela primeira vez. O Mestre teve o desejo de ver o enfeitiçador Sankirtan intinerante de Sri Chaitanya. A Mãe Divina satisfez aquele desejo mostrando-o da seguinte maneira: permanecendo do lado de fora do quarto, ele viu lindas ondas de Sankirtan dirigindo-se para ele, vindas do Panchavati, prosseguindo para o portão principal do jardim de Dakshineswar e desaparecendo atrás das árvores. Viu que, absorvido no amor de Deus, Gauranga, a lua de Navadwip, caminhava a passos lentos na parte central, com Nityananda e Advaita de cada lado e cercado por uma densa multidão. Todos estavam em estado de embriaguez espiritual produzida por amor a Deus, alguns expressando a felicidade dos seus corações ao perderem o controle de si mesmos e outros, pelas frenéticas danças extáticas. A multidão era tão grande que parecia como, se não houvesse fim ao número de pessoas ali. Alguns rostos no maravilhoso Sankirtan ficaram gravados na tela da memória do Mestre, em cores brilhantes. Quando ele os viu chegar como seus devotos, pouco tempo depois de ter tido aquela visão, o Mestre chegou à conclusão que eles haviam sido companheiros de Chaitanya numa vida anterior.