Universidade Federal Fluminense Programa de Pós-Graduação em Antropologia Disciplina: Métodos de Trabalho em Antropologia (EGH 00087)
WEBER, Florence. “TRABALHO FORA DO TRABALHO: uma etnografia das percepções” Yasmin Alves Monteiro
O referi referido do livr livro o é uma uma etno etnogra grafifia a das das práti práticas cas sociai sociaiss fora fora do trab trabal alho ho dos dos operários de uma fábrica metalúrgica, numa cidade monoindustrial do Nordeste da França, utilizando-se de diversos conceitos nativos, como bricole e trabalho paralelo, privilegiando a observação no exterior da fábrica e tentando relacionar os ambientes externo e interno a esta. A análise foi centrada na escala de um bairro e em algumas famíli famílias. as. O objeti objetivo vo deste deste texto texto é destac destacar ar as contri contribui buiçõe çõess metodol metodológi ógicas cas para o trabalho etnográfico, contidas na obra. A autora traça como “princípios de método” os atos de observar e escutar, por oposição ao ato de perguntar, de maneira a preservar as iniciativas de classificação e o domínio domínio das palavras palavras de seus informantes. informantes. Dentro dessa perspectiva, perspectiva, valoriza valoriza o ato de “estar com” como método de observação, por oposição a uma mera observação. Este “estar com” implica numa maior atenção aos termos nativos, bem como a desconstruir o princípio princípio da alteridade alteridade como parte fundamentar fundamentar do olhar do etnólogo, como como proposto por Lévi-Strauss. Essa crítica da autora está fundada numa condição fundamental do ato de estar no campo que é a implicação de que sua presença gera uma apreciação positiva ou negativa, por isso o grupo inevitavelmente atribuirá um lugar . Este lugar, contudo, não é um impedimento, pois é através da reflexão do lugar ocupado que o etnógrafo é capaz de compreender aos significados das ações e discursos do grupo estudado.
A respeito da pesquisa de campo, ressalta que é especialmente é util para o estudo dos fenômenos menos oficiais, sejam eles práticas consideradas ilegais À margem da legalidade ou práticas que os nativos pesquisados jugam indignas de discurso, que é o caso do trabalho paralelo por ela observado. A etnografia de Weber foi centrada na aproximação com algumas famílias e, neste sentido, a família Moreau adquire um papel importante, tanto na observação de suas dinâmicas, quanto na colaboração de pesquisa e diálogo com alguns de seus membros. Weber ressalta que a pesquisa é resultado dessa colaboração, tanto na medida em que contou com o trabalho de uma assistente, quanto na utilização das informações e mesmo de textos de informantes, na figura de Daniel Moreau. Um ponto que a autora destaca é em que medida as suas preocupações em escolher as alianças a fazer no campo, e por conseguinte, as que não fazer, não são totalmente possíveis de manejar, uma vez que não é só o etnógrafo que as escolhe, ele também é escolhido para elas. Através do estreitamento de relações com as pessoas no campo, Weber percebe a incompatibilidade de dois estilos de relacionamento com eles: por um lado, um mais ortodoxo e formal, por outro, um mais amigável, com aliados. Ela percebe ainda que, não só não é possível manter duas posturas na mesma situação, mas também cada uma implica em possibilidades diferentes de coleta de dados. Isso se expressou na dificuldade, por exemplo, em realizar entrevistas formais com as pessoas com as quais teve mais proximidade, e na necessidade de tratar a família Moreau como excluída de suas análises. O temor da pesquisadora em visitar a fábrica é ilustrativo da sua intenção de neutralidade, posteriormente reconhecida como ilusão de neutralidade: Weber temia, sobretudo, que uma visita ao local de trabalho dos operários fizesse transparecer ainda mais seu pertencimento a outra classe social e gerasse um sentimento de que ela estaria “do lado dos patrões”. Como suas observações se centraram nas atividades no exterior da fábrica e a respeito do interior, utilizou exclusivamente o discurso dos operários, esses problemas não chegaram a se concretizar.
A autora usa usa extratos de seu caderno de campo com o objetivo de esclarecer a posição dela na pesquisa e os motivos pelos quais os nativos mostraram a ela de modo privilegiado determinadas facetas do comportamento e da identidade deles. Reconstrói, assim, sua relação anterior com o local e tenta demonstrar como é lida pelo grupo estudado, tanto em seus hábitos de trabalho, quanto com relação a sua origem e a seu comportamento. Ao colocar a questão fundamental da pesquisa, o que fazem os operários fora de seu trabalho na fabrica, Weber encontra algumas “surpresas”: a reticência dos operários em falar de algumas ocupações, seja por seu caráter privado, seja por um caráter ilegal, a variedade das ocupações, a recusa de falar sobre a usina como forma de se distanciar do trabalho formal fora dele e a violência das relações interpessoais, expressa sobretudo nas acusações de alcoolismo.A violência das acusacões de alcoolismo levou ela a considerar o bar como inverso do trabalho paralelo representando indolência e inatividade Os conceitos utilizados pela autora de trabalho paralelo e cena social surgiram de uma critica aos pressupostos dela mesma, conduzidos a partir das observações em campo. Por exemplo, deixou de lado a noção de lazer, por ser uma noção excessivamente circunscrita à classe média e adotou uma hipótese, a ambiguidade do trabalho paralelo entre gosto e necessidade. O interesse dela no trabalho paralelo estava relacionado a uma questão expressa num debate entre a escolha do necessário ou o lazer criador. Desta forma, se faz as perguntas: os operarios sentem prazer em realizar os trabalhos manuais para tentar encobrir a resignação da necessidade econômica ou poderia ter outro fundamento? Os operários são completamente desprovidos de qualquer tipo de capital social a ponto de não possuirem qualquer estratégia de reputação ou trunfo a valorizar, através do trabalho paralelo? A autora chega a uma constatação de que não ter uma atividade paralela é reconhecido como indolência, decadência, que podem refletir uma incapacidade fisica (doença ou velhice) ou social (possuir meios ou não de trabalhar paralelamente -
espaço, ferramentas, etc, fornecidos pela inserção da pessoa numa rede de relações ou parentesco de trocas sem contrapartida monetária). A atividade de bricole é definida como atividade produtiva privada e não mercantil, e aparece ao lado do trabalho independente e do segundo salário como formas de trabalho paralelo. A autora utiliza a expressão cena social como conceito por perceber esse termo como sendo de mais fácil controle, uma vez que a ideia de campo ja está marcado por varias teorias que ela não pretende discutir. A cena social é assim definida como o subconjunto de relações orientadas por uma prática no conjunto das relações tecidas por um indivíduo. Tais relações sao observáveis em acontecimentos (esses últimos são os unicos objetos de descrição etnográfica). Uma cena social é, portanto, o aspecto a partir do qual um grupo de interconhecimento fundado sobre uma prática comum aparece a um de seus membros. Chamo de “prática comum” o conjunto das práticas consideradas como análogas ou, ao menos, comparáveis pelos próprios nativos. Outro questionamento que emerge no texto é de que maneira é possível colocar em evidência os contextos da percepção e como o observador pode se despir dos seus próprios contextos sociais de percepção para dar conta dos pontos de vista do outro. Neste sentido, questiona quais são os processos de socialização através dos quais se adquire as ferramentas de percepção individual. Retoma que a ideia de percepção socializada foi formulada pela escola durkheiminiana, citando Halbwachs: "Estamos de tal modo habituados a opor os fatos sensiveis e as operaçoes intelectuais que nao percebemos logo de cara em qual conjunto de observaçoes, aproximaçoes, classificaçoes, previsoes e panoramas gerais é tomada e em certa medida enquadrada qualquer percepçao. À medida em que novos objetos são descobertos e que passamos de um a outro, nós realizamos, na ocasião, todo um trabalho de interpretação" (Halbwachs apud Weber, p. 258)
Coloca assim, como um de seus objetivos, examinar a especificidade de uma abordagem etnográfica das percepções sociais e o papel dos significados nativos
nisso. Weber define duas principais maneiras de se perceber o mundo sensível que estão ligadas a socializações individuais distintas: uma estética da produção e uma estética da contemplação. Para Weber, “classificação” é uma noção excessivamente ligada à linguagem, assim como “ponto de vista” e “perspectiva sobre o mundo” remetem excessivamente à percepção visual. Por isso ela prefere falar de percepções sensoriais, para com isso dar conta de esquemas corporais de percepção e do lugar no corpo na experiência; mas com a condição de dizer imediatamente que este corpo é socializado. Um passo a mais que defende que deve ser dado é focar o interesse nas interações e não simplesmente no mundo sensível: perceber o significado de uma interação significa situar-se na cena social na qual ela faz sentido. Ao final do texto, discorre sobre a escrita etnográfica, defendendo que a originalidade de seu livro a inscreve em uma corrente da antropologia reflexiva, pois busca demonstrar o desdobramento das duas vozes da etnógrafa: a voz como atriz da pesquisa e a voz como pesquisadora. A isso se soma sua proposição de que, no campo, nem o anonimato nem a relação pessoal são bons ou maus em si, mas para compreender o que permitem um ou outro e em qual momento, é fundamental dispor de uma etnografia capaz de restituir o processo de pesquisa.