OUTROS TÍTULOS DA COLEÇÃO EPRÓXIMOS LANÇAMENTOS v.1 - Direito Penal - Parte Geral v.2 - Direito Penal - Parte Especial - Dos crimes contra a pessoa aos crimes contra afamilia v.3 - Direito Penal - Parte Especial - Dos crimes contra a incolumidade pública aos crimes contra aadministração pública v.4 - Leis Especiais Penais -Tomo 1 v.5 - Leis Especiais Penais -Tomo li v.6 - Lei de Execução Penal v.7 - Processo Penal - Parte Geral v.8- Processo Penal - Procedimentos, Nulidades eRecursos v.9 - Direito Administrativo v.10- Direito Civil- Parte Geral v.11 - Direito Civil - Direito das Obrigações e Responsabilidade Civil v.12 - Direito Civil - Direito das Coisas v.13 - Direito Civil - Contratos v.14- Direito Civil- Familias eSucessões v.1 S- Direito Agrário v.16- Direito Constitucional- Tomo 1 v.17- Direito Constitucional-Tomo li v.18 - Processo Civil -Teoria Geral do Processo Civil v.19- Processo Civil-Recursos v.20- Processo Civil - Processo de Execução eCautelar v.21 - Processo Civil - Procedimentos Especiais v.22 - Leis Trabalhistas Especiais v.23 - Direito do Trabalho v.24- Processo do Trabalho v.25 - Direito Empresarial v.26 - Direito Penal Militar v.27 - Direito Previdenciário v.28- Direito Tributário -Volume Único v.29 - Direito Processual Militar v.30 - Direito Ambiental v.31 - Direito Econômico v.32 - Direitos Transindividuais em Espécie v.33 - Direito do Consumidor v.34 - Juizados Especiais v.35 - Direito Internacional v.36- Estatuto da Criança e do Adolescente v.37 - Direito Financeiro v.38- Etica Profissional v.39- Direitos Humanos v.40- Direito Eleitoral v.41- Súmulas STF eSTJ para Concursos
COLEÇÃO SINOPSES PARA CONCURSOS
DIREITO EMPRESARIAL
Leonardo de Medeiros Garcia Coordenador da Coleção
Estefânia Rossignoli Formada em Direito pela UF]F Pós graduada em Direito Empresarial e Econômico pela UFJF Mestre em Direito Civil pela UERJ Professora de Direito Empresarial em cursos Graduação, pós-graduação e cursos preparatórios Advogada militante nas áreas de Direito Empresarial e Civil
COLEÇÃO SINOPSES PARA CONCURSOS
DIREITO EMPRESARIAL 4ª edição Revista, ampliada e atualizada
,,,
2015
EDITORA .JusPODIVM
www.editorajuspodivm.com.br
EDITORA
fasPODIVM www.editorajuspodivm.com.br Rua Mato Grosso, 175 - Pituba, CEP: 41830-151 - Salvador- Bahia Tel: (71) 3363-8617 I Fax: (71) 3363-5050 •E-mail:
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Copyright: Edições JusPODIVM Conselho Editorial: Eduardo Viana Portela Neves, Dirley da Cunha Jr., Leonardo de Medeiros Garcia, Fredie Didier Jr., José Henrique Mouta, José Marcelo Vigliar, Marcos Ehrhardt Júnior, Nestor Távora, Robrio Nunes Filho, Roberval Rocha Ferreira Filho, Rodolfo Pamplona Filho, Rodrigo Reis Mazzei e Rogério Sanches Cunha.
Capa: Rene Bueno e Daniela Jardim (www.buenojardim.com.br) Diagramaçio: Maitê Coelho (
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Todos os direitos desta edição reservados à Edições JusPODIVM.
É tenninantemente proibida a reprodução total ou parcial desta obra, por qualquer meio ou processo. sem a expressa autorização do autor e da Edições JusPODJVM. A violação dos direitos autorais caracteriza crime descrito na legislação em vigor, sem prejuízo das sanções civis cabíveis.
li Sumário
Coleção Sinopses para Concursos........................................................... Guia de leitura da Coleção...................................................................... Capítulo
1
INTRODUÇÃO AO DIREITO EMPRESARIAL ....................................................... L
2. 3. 4.
5. 6. 7.
Breve histórico do Direito Empresarial............................................ características do direito empresarial............................................. A Empresa......................................................................................... o Empresário.................................................................................... 4.i. Requisitos para ser empresário............................................. 4.2. Empresário individual............................................................. Empresa Individual de Responsabilidade Limitada - EIRELI ............ Microempresa e Empresa de Pequeno Porte.................................. Princípios do Direito Empresarial..................................................... p. Princípio da Livre Iniciativa..................................................... 7.2. Princípio da Livre Concorrência.............................................. 7.3. Princípio da Função Social da Empresa..................................
Capítulo
13 15
17 17 22 23 27 28 30 34 39 42 42 44 45
2
ELEMENTOS E OBRIGAÇÕES EMPRESARIAIS ...................................................
49
i.
50 50 52 53 58 60 60 61 64 66 70 75 75 76
2.
3. 4. 5.
Estabelecimento empresarial........................................................... L L Conceito e natureza................................................................ i.2. Aviamento ............................................................................... i.3. Contrato de trespasse............................................................ i.4. Penhora do estabelecimento.................................................. Nome Empresarial............................................................................. 2.i. Conceito e natureza jurídica................................................... 2.2. Espécies ............................. :..................................................... 2.3. Proteção ao nome empresarial.............................................. Registro Empresarial......................................................................... Escrituração Empresarial.................................................................. Propriedade Industrial..................................................................... 5.1. Introdução............................................................................... 5.2. Bens tutelados ........................................................................
5
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
5.3. 5.4.
5.5. 5.6. 5.7.
Condições de Patente............................................................. Condições de Registro............................................................ 5.4.1. Registro do Desenho Industrial.................................. 5.4.2. Registro de Marca....................................................... Procedimento Administrativo................................................. Proteção à propriedade industrial......................................... Extinção da propriedade industrial........................................
77 80 80 81 83 86 89 ;
Capítulo 3 DIREITO SOCIETÁRIO .................................................................................... 1. Introdução......................................................................................... 2. Classificação das sociedades ........................................................... 2.i. Quanto à natureza do ato constitutivo................................... 2.2. Quanto à natureza da atividade praticada............................ 2.3. Quanto à importância dos sócios ou do capital investido.... 2.4. Quanto à responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais....................................... 2.5. Quanto à aquisição de personalidade jurídica...................... 3. Sociedade em Comum...................................................................... 4. Sociedade em Conta de Participação............................................... 5. Sociedade Simples............................................................................ 5.1. Introdução............................................................................... 5.2. Conceito................................................................................... 5.3. Constituição............................................................................. 5.4. Sociedade entre cônjuges....................................................... 5.5. Responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais......... 5.6. Obrigações e direitos dos sócios............................................ 5.7. Administração......................................................................... 5.8. Dissolução ............................................................................... 6. Sociedade Limitada........................................................................... 6.1. Introdução............................................................................... 6.2. Conceito................................................................................... 6.3. Responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais......... 6.4. Constituição............................................................................. 6.5. Quotas ..................................................................................... 6.6. Administração......................................................................... 6.7. Exclusão extrajudicial de sócio............................................... 6.8. Conselho Fiscal........................................................................ 6.9. Deliberações sociais ............................................................... 6.10. Aumento e redução do capital social..................................... 6.1i. Falecimento de sócio.............................................................. 6
93 94 95 95 95 97 98 98 lOO
103 106 106 106 108 113 114 117 120 123 126 126 i27 128
130 131 139 141 146 147 150 151
SUMÁRIO
7.
6.12. Dissolução da sociedade........................................................ 153 6.13. Liquidação das sociedades contratuais................................. 155 Sociedade Anônima.......................................................................... 156 7.i. Introdução............................................................................... 156 7.2. Conceito e responsabilidade dos sócios pelas obrigações da sociedade.............................................. 157 7.3. Espécies de sociedade anônima ............................................ 158 7.3.1. Mercado de capitais ................................................... 158 7.3.i.i. Bolsa de Valores......................................................... 159 7.3.i.2. Mercado de Balcão..................................................... 160 7.4. Constituição............................................................................. 161 7.4.l. Requisitos preliminares .............................................. 161 7.4.2. Subscrição................................................................... 162 7.4.2.i. Subscrição Pública ......................................... 162 7.4.2.2. Subscrição Particular..................................... 163 7.4.3. Providências complementares................................... Abertura e fechamento do capital ......................................... 7.6. As ações .................................................................................. 7.6.1. Conceito ...................................................................... 7.6.2. Espécies e classes....................................................... 7.6.3. Formas..... .................................................................... 7.6.4. Valores........................................................................ 7.6.5. Negociação com as próprias ações............................ 7.7. Demais valores mobiliários .................................................... 7.8. Obrigações e direitos dos acionistas...................................... 7.9. Órgãos societários................................................................... 7.9.i. Assembleia geral......................................................... 7.9.2. Conselho de Administração ........................................ 7.9.3. Diretoria ...................................................................... 7.9.4. Conselho Fiscal.. .......................................................... 7.10. Poder de controle................................................................... 7.11. Proteção ao acionista minoritário.......................................... 7.12. Dissolução da companhia ....................................................... 7.12.1. Dissolução da companhia ........................................... Tipos Societários Menores ................................................................ 8.1. Sociedade em nome coletivo................................................. 8.2. Sociedade em comandita simples .......................................... 8.3. Sociedade em comandita por ações ...................................... Desconsideração da Personalidade Jurídica .................................... 9.1. Aspectos Gerais ....................................................................... 9.2. Desconsideração no Código Civil............................................ 7.5.
8.
9.
164 165 167 167 167 170 171 172 174 176 183 184 185 186 189 190 194 195 196 199 199 200 200 201 201 202
7
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
9.3. Desconsideração no Código de Defesa do Consumidor ............... 9.4. Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica............ 10. Operações societárias ...................................................................... 10.1. Transformação......................................................................... 10.2. Fusão....................................................................................... 10.3. Incorporação........................................................................... 10.4. Cisão...........................................................................................
205 207 2o8
209 210 211 212
Capítulo 4 FAL~NCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS .................................................... 215
1. 2. 3.
4.
5. 6. 7.
8. 9.
8
Introdução......................................................................................... Aplicabilidade da Lei 11.101/05......................................................... Disposições comuns à Falência e à Recuperação............................ 3-1. Obrigações não exigíveis......................................................... 3.2. Suspensão da prescrição, ações e execuções contra o devedor.................................... 3.2.1. Ações que não serão suspensas................................ 3.3. Prevenção da jurisdição......................................................... 3.4. Verificação e habilitação dos créditos................................... Administrador Judicial....................................................................... 4.1. Conceito................................................................................... 4.2. Nomeação ............................................................................... o. Atribuições do administrador ................................................. Comitê de credores.......................................................................... Assembleia Geral de credores ......................................................... Recuperação Judicial de Empresas.................................................. 7.1. Introdução............................................................................... 7.2. Requisitos para requerer a recuperação judicial.................. 7.3. Pedido inicial da recuperação judicial................................... 7.4. Plano de recuperação judicial................................................ 7.4.1. Créditos sujeitos à recuperação................................ 7.4.2. Meios de recuperação................................................ 7.4.3. Plano especial das Microempresas ............................ 7.5. Deliberação sobre o plano de recuperação.......................... 7.6. Execução da recuperação ....................................................... 7.7. Convolação da recuperação em falência ............................... 7.8. Encerramento da recuperação ............................................... Recuperação Extrajudicial................................................................. Falência ............................................................................................. 9.1. Introdução............................................................................... 9.2. Processamento da falência.....................................................
215 217 220 220 221
224 225 226 228 228 228 229 232 234 237 237 238 238 239 240 242 245 247 251 252 253 254 256 256 257
SUMÁRIO
9.2.i.
Fase pré-falimentar .................................................... Legitimados ativos......................................... Atos de falência ............................................. Procedimento................................................ Participação do Ministério Público................ Fase falimentar ........................................................... 9.2.2.1. Sentença de falência..................................... 9.2.2.2. Levantamento do ativo ................................. 9.2.2.3. Ação Revocatória ........................................... 9.2.2.4. Atos Ineficazes............................................... 9.2.2.5. Pedidos de restituição .................................. 9.2.2.6. Pagamento do passivo: concurso de credores ................................... Fase pós-falimentar ....................................................
9.2.LL 9.2.i.2. 9.2.I.3. 9.2.I.4. 9.2.2.
9.2.3.
257 257 258 261 263 264 264 266 267 269 272 274 277
Capítulo 5 TÍTULOS DE CRÉDITO.................................................................................... 281 i.
2. 3. 4. 5.
6.
7.
8.
Conceito ............................................................................................ Legislação aplicável.......................................................................... Requisitos.......................................................................................... Características................................................................................... Princípios........................................................................................... 5.i. Princípio da Abstração ............................................................ 5.2. Princípio da Autonomia........................................................... 5.3. Princípio da Incorporação ou cartularidade .......................... 5.4. Princípio da Literalidade......................................................... Classificação dos títulos............................ ........................................ 6.1. Quanto ao conteúdo da declaração cartular ......................... 6.2. Quanto à prova da causa de emissão.................................... 6.3. Quanto à circulação ................................................................ 6.4. Quanto à pessoa do emitente................................................ 6.5. Quanto ao prazo..................................................................... Endosso ............................................................................................. 7.1. Conceito................................................................................... 7.2. Forma ...................................................................................... 7.3. Espécies................................................................................... 7.4. Responsabilidade do endossante .......................................... 7.5. Título não à ordem................................................................. 7.6. Endosso tardio ou póstumo................................................... Aval. ................................................................................................... 8.1. Conceito................................................................................... 8.2. Forma...................................................................................... 8.3. Direitos e obrigações do avalista...........................................
281 283 284 287 289 289 292 293 294 295 295 296 297 298 298 299 299 300 302 304 306 308 309 309 310 311
9
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
Espécies................................................................................... Aval x Fiança............................................................................ 9. Protesto............................................................................................. 9.i. Conceito e características ....................................................... 9.2. Espécies................................................................................... 9.3. Procedimento.......................................................................... 9.4. Protestos necessários............................................................. 9.5." Cancelamento do protesto..................................................... lo. Ações Cambiais................................................................................. 10.i. Ação de Execução de Título Extrajudicial................................ 10.1.l. Utilização para os títulos de crédito .......................... l0.1.2. Requisitos.................................................................... io.i.3. Prazos.......................................................................... l0.2. Ação de Anulação da Cambial................................................ 10.3. Ação contra o locupletamento................................................ 10.4. Ação Monitória ........................................................................ 11. Títulos em espécie ............................................................................ 11.i. Letra de Câmbio ...................................................................... 11.2. Cheque.................................................................................... 11.3. Nota promissória .................................................................... 11.4. Duplicata.................................................................................. 11.5. Cédulas de crédito.................................................................. 8.4. 8.5.
313 315 316 316 317 318 320 323 324 325 325 325 326 327 328 328 331 331 332 337 337 342
Capítulo 6 CONTRATOS EMPRESARIAIS ........................................................ .................. i.
2.
3.
70
Introdução......................................................................................... Princípios........................................................................................... 2.i. Princípio da autonomia da vontade....................................... 2.2. Princípio da relatividade dos pactos ..................................... 2.3 . Princípio da função social....................................................... 2.4. Princípio da força obrigatória ................................................ 2.5. Princípio da boa-fé................................................................. Contratos Bancários .......................................................................... 3.1. Conceito................................................................................... 3.2. Espécies................................................................................... 3.2.i. Depósito...................................................................... 3.2.2. Abertura de crédito.................................................... 3.2.3. Desconto bancário...................................................... 3.2.4. Contrato de financiamento ......................................... p.5. Custódia de valores.................................................... 3.2.6. Aluguel de cofre .......................................................... 3.2.7. Cartão de crédito........................................................
347 347 348 348 350 350 351 352 353 353 353 353 356 357 357 358 358 358
SUMÁRIO
4.
5. 6.
7.
8.
Arrendamento Mercantil ou "leasing"............................................. 4.1. Conceito................................................................................... 4.2. Espécies................................................................................... 4.3. Aspectos processuais .............................................................. Alienação Fiduciária em Garantia ..................................................... Franquia ou "Franchising"................................................................ 6.1. Conceito................................................................................... 6.2. Espécies................................................................................... Faturização ou "Facttoring" .............................................................. 7.1. Conceito ................................................................................... 7.2. Espécies................................................................................... Compra e Venda Mercantil ............................................................... 8.1. Conceito................................................................................... 8.2. Obrigações do comprador...................................................... 8.3. Obrigações do vendedor ........................................................ 8.4. Contrato de fornecimento ...................................................... 8.5. Contrato de compra e venda de empresas...........................
360 360 362 363 363 368 368 370 370 370 372 372 372 373 374 375 375
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Coleção Sinopses para Concursos A Coleção Sinopses paro Concursos tem por finalidade a preparação para concursos públicos de modo prático, sistematizado e objetivo. Foram separadas as principais matérias constantes nos editais e chamados professores especializados em preparação de concursos a fim de elaborarem, de forma didática, o material necessário para a aprovação em concursos. Diferentemente de outras sinopses/resumos, preocupamos em apresentar ao leitor o entendimento do STF e do STJ sobre os principais pontos, além de abordar temas tratados em manuais e livros mais densos. Assim, ao mesmo tempo em que o leitor encontrará um livro sistematizado e objetivo, também terá acesso a temas atuais e entendimentos jurisprudenciais. Dentro da metodologia que entendemos ser a mais apropriada para a preparação nas provas, demos destaques (em outra cor) às palavras-chaves, de modo a facilitar não somente a visualização, mas, sobretudo, à compreensão do que é mais importante dentro de cada matéria. Quadros sinóticos, tabelas comparativas, esquemas e gráficos são uma constante da coleção, aumentando a compreensão e a memorização do leitor. Contemplamos também questões das principais organizadoras de concursos do país, como forma de mostrar ao leitor como o assunto foi cobrado em provas. Atualmente, essa "casadinha" é fundamental: conhecimento sistematizado da matéria e como foi a sua abordagem nos concursos. Esperamos que goste de mais esta inovação que a Editora Juspodivm apresenta.
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
Nosso objetivo é sempre o mesmo: otimizar o estudo para que você consiga a aprovação desejada. Bons estudos!
Leonardo de Medeiros Garcia
[email protected] www.leonardogarcia .com.br
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Guia de leitura da Coleção A Coleção foi elaborada com a metodologia que entendemos ser a mais apropriada para a preparação de concursos. Neste contexto, a Coleção contempla:
DOUlRINA OTIMIZADA PARA CONCURSOS Além de cada autor abordar, de maneira sistematizada, os assuntos triviais sobre cada matéria, são contemplados temas atuais, de suma importância para uma boa preparação para as provas.
~
Importante!
Empresário individual não é pessoa jurídica e não tem pe~onalidade jurídica distinta. Sendo assim as obrigações contraídas para a prática da atividade poderão atingir o patrimônio que não está a ela relacionado e as dívidas particulares do empresário também poderão atingir o patrimônio usado na empresa.
• ENTENDIMENTOS DO STF E STJ SOBRE OS PRINCIPAIS PONTOS ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
A súmula i43 trata de uma questão importante que é o prazo para reivindicar os prejuízos decorrentes de uso indevido de marca. Diz o texto da súmula: MPrescreve em cinco anos a ação de perdas e danos pelo uso de marca comercial.w
PALAVRAS-CHAVES EM OUlRA COR As palavras mais importantes (palavras-chaves) são colocadas em outra cor para que o leitor consiga visualizá-las e memorizá-las mais facilmente.
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
Neste diapasão é importante que se corrija uma visão coloquial da expressão empresário que cotidianamente é usada como sinônimo de empreendedor; ou seja, qualquer pessoa que possua ou realize investimentos. Sendo assim, nem todo s6cio ou acionista de uma sociedade será empresário.
•
QUADROS, TABELAS COMPARATIVAS, ESQUEMAS E DESENHOS
Com esta técnica, o leitor sintetiza e memoriza mais facilmente os principais assuntos tratados no livro.
l_ ~ferimento
lndeferimen10
do~ido
1
do pT dº
L
Encerramento
"'º~~~-·· 1 1
do processo
Plano
desrumprido
jJ
Convola ção em fal ência
QUESTÕES DE CONCURSOS NO DECORRER DO TEXTO Através da seção "Como esse assunto foi cobrado em concurso?"
é apresentado ao leitor como as principais organizadoras de concurso do país cobram o assunto nas provas. ~ Como esse assunto foi cobrado em concurso? No Concurso da Magistratura/MG/2012, organizado pela EJEF, o tema foi abordado com o seguinte enunciado: #Com a vigência do Novo Código Civil, à luz do artigo 966. é correto afirmar que o Oireito brasileiro concluiu a transição para aN. A afirmativa correta era a que tinha o texto: "teoria da
empresa•, de matriz Italiana•
16
Capítulo
i
Introdução ao Direito Empresarial Sumário • 1. Breve histórico do Direito Empresarial Características do Direito Empresarial - 3. A Empresa - 4. O Empresário: 4.1. Requisitos para ser empresário; 4.2. Empresário individual - 5. Empresa Individual de Responsabilidade Limitada - EIRELI - 6. Microempresa e Empresa de Pequeno Porte - 7. Princípios do Direito Empresarial: 7.1. Princípio da Livre Iniciativa; 7.2. Princípio da Livre Concorrência; 7.3. Princípio da Função Social da Empresa.
- 2.
1.
BREVE HISTÓRICO DO DIREITO EMPRESARIAL
Este ramo que hoje é conhecido por Direito Empresarial surgiu inicialmente para regular o comércio e, portanto, era chamado de Direito Comercial. Para compreender como surgiu o Direito Comercial, é preciso perpassar por uma breve história e adentrarmos um pouco no conceito econômico do comércio. Quando se perquiri a origem do comércio, em um passado bastante remoto, percebe-se que os homens, por não conseguirem suprir suas próprias necessidades, foram levados a se aproximarem uns dos outros, praticando a troca do que lhes excediam por artigos que necessitavam.
É o que se chama de economia de troca, ou escambo, em que se realizavam permutas de produtos diretamente entre aqueles que os fabricavam, de acordo com as sobras e com as utilidades. Ainda não se fala aqui em um modelo econômico de comércio. Porém, tal prática começa a se tornar inviável com o desenvolvimento da civilização, principalmente pela falta de paridade econômica entre os produtos permutados. Começam a surgir mercadorias-padrão 17
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
que servem de intermediação no processo. o mais utilizado no início era o boi e, posteriormente, metais e pedras preciosas, surgindo, então a moeda. Passa-se a falar em economia de mercado. Não há mais a troca direta. O produtor vende seu produto para receber moeda e poder comprar aquilo de que necessita, criando um ciclo. Com isso cada um pode se especializar naquilo que deseja fabricar. Somente a partir desse momento é que se pode mencionar a existência de um conceito econômico de comércio. Mais tarde, com o prosseguimento da evolução da civilização, mais precisamente na Idade Média, com o surgimento das feiras mercantis, o mundo viu crescer uma nova atividade profissional: a do comerciante. Com o passar do tempo, tais profissionais começaram a sentir a necessidade de se organizarem e o fizeram através de corporações dos mercadores. Foi então que se falou pela primeira vez em um Direito Comercial cuja preocupação era regulamentar o direito dos comerciantes. Esse período ficou conhecido como fase subjetiva do Direito Comercial. Porém, principalmente em virtude dos estudiosos franceses, começou-se a perceber que o direito não poderia preocupar-se apenas com a figura do comerciante mas também com a atividade comercial. Surgiu então a Teoria dos Atos de Comércio na França, que dizia que o objeto de estudo do ainda chamado Direito Comercial era apenas os atos de comercializar, ou seja, comprar e vender. Com isso, a preocupação não era apenas com o comerciante, mas sim com a sua atividade. O Código de Napoleão de i8o7 foi um marco importante para se implementar esta mudança de pensamento, dando início à era objetiva do Direito Comercial. Vivante ressalta que essa passagem da era subjetiva para a objetiva se deu de maneira fictícia, ou seja, ao se estender o direito dos comerciantes a todos que praticavam atos de comércio. Passa-se a estar diante de um sistema que classifica o sujeito do Direito Comercial de acordo com sua atividade e não com o fato de ele estar ou não ligado a uma corporação. Para ser sujeito do Direito Comercial era preciso praticar um ato de comércio, mas o que são atos de comércio? 18
INTRODUÇÃO AO DIREITO EMPRESARIAL
Esse foi o grande desafio da doutrina da época, pois não se conseguia precisar contornos bem definidos dessa atividade que servia de base para caracterizar o objeto de regulamentação do Direito Comercial. Porém, não faltaram tentativas, como as listas elaboradas pelos tribunais de comércio e pelo próprio Código de Napoleão. Tendo em vista a superação atual deste sistema, não há necessidade de nos aprofundarmos no estudo da conceituação dessas atividades classificadas como atos de comércio. Isso porque, principalmente com a evolução dos meios de produção, essa regulamentação somente do comércio começou a ficar insuficiente e o Direito Comercial não conseguia mais abarcar todas as situações que necessitavam de regulamentação. Chega-se a afirmar que o ramo jurídico encontrava-se desacreditado muito em virtude da dificuldade conceituai dos atos de comércio. Surge então no direito italiano a teoria da empresa, que supriu as lacunas no direito comercial e ampliou significativamente o objeto de estudo desse ramo jurídico. Agora o estudo será focado em toda a atividade empresarial, toda a organização dos meios de produção, dos serviços e também do ato de comercializar. Percebe-se a evolução que ocorrera na organização do capital e do trabalho que não havia passado de tudo despercebida pelo legislador francês, mas que não havia sido por ele tão bem trabalhada. Se pensarmos de maneira bem simples, conseguiremos vislumbrar que quando se pensa em atividade de comércio logo se lembra de lojas, shoppings centers, mercados, etc.; ao passo que, quando se pensa em atividade empresária normalmente liga-se a indústrias, a fábricas, a grandes conglomerados e também às lojas e aos mercados. Isso demonstra que a ideia de empresa é mais abrangente e conseguiu se adaptar melhor às novas realidades mercadológicas. Percebe-se que a primeira noção de empresa possui um caráter econômico, ligado tão somente à complexidade da organização dos fatores de produção, mas a doutrina jurídica, principalmente através do autor italiano Alberto Asquini, criou contornos jurídicos a tal conceito e revolucionou o Direito Comercial, como ainda era conhecido. Alberto Asquini, no entendimento de que a empresa é um conceito poliédrico, criou quatro perfis em que ela pode se apresentar: a) o
19
ESTEFÃNIA ROSSIGNOLI
perfil subjetivo; b) o perfil funcional; c) o perfil objetivo; d) o perfil corporativo. Perfis de Alberto Asquini
subjetivo
Considera-se a organização econômica da empresa pelo seu vértice, utilizando a expressão em sentido subjetivo, como sinônima de empresário.
Funcional
A empresa é considerada como a atividade empreendedora determinada a um certo objetivo.
Objetivo
Utiliza-se o complexo patrimonial como o centro de atenção do conceito de empresa, sendo que poderá ser levada em consideração todos os tipos de bens.
Corporativo
Aqui a empresa é considerada como uma especial organização de pessoas, formada pelo empresário e prestadores de trabalho, seus colaboradores.
Afirmar-se que a primeira legislação que apresentou esboço do conceito de empresa foi o Código Comercial alemão de 1897, mas o fato de ter utilizado a terminologia uatos de comércio", faz com que tal ordenamento não seja considerado como marco na utilização da Teoria da Empresa. A primeira legislação de fato que se filiou a essa nova Teoria foi o Código Civil italiano de 1942, considerado o grande marco da transformação desse ramo do direito que, aliás, passa a receber uma nova denominação: Direito Empresarial. No Brasil, uma atividade comercial propriamente dita somente será delineada com a chegada da família real portuguesa e a abertura dos portos às nações amigas, época em que a legislação utilizada era as ordenações portuguesas. Clamando por uma legislação própria, em 1850 foi promulgado o Código Comercial brasileiro que filiava claramente à teoria dos atos de comércio, principalmente no que diz respeito às terminologias. A mudança começa com algumas legislações extravagantes como a Lei de Sociedades Anônimas (Lei n° 6404/76) e se concretizou com o Código Civil de 2002, que revogou quase todo o Código Comercial, 20
INTRODUÇÃO AO DIREITO EMPRESARIAL
seguindo o modelo italiano, com a unificação da estrutura legislativa do Direito Civil e do Direito Empresarial. No decorrer deste nosso estudo, cada um dos novos conceitos introduzidos pelo atual Código Civil serão delineados. Importante ressaltar que no ano de 2011 foi apresentado um projeto (PL n° 1572/11) para que o Brasil volte a ter um Código Comercial autônomo. Tal projeto foi elaborado pelo comercialista Fábio Ulhoa Coelho e apresentado pelo Deputado Vicente Cândido. A ideia é de unificar algumas questões da legislação empresarial, retirando o tratamento do Código Civil e adaptando-se ainda mais à Teoria da Empresa. Entre as justificativas do projeto destaca-se: "A Constituição Federal considera o direito comercial como área distinta do direito civil (art. 22, 1). Revela -se, assim, mais compatível com a ordem constitucional a existência de um Código próprio para o direito comercial, e não a inclusão da matéria desta área jurídica no bojo do Código Civil. ( ...) Três, assim, são os principais objetivos da propositura. Em primeiro lugar, reunir num único diploma legal, com sistematicidade e técnica, os princípios e regras próprios do direito comercial. (. .. ) o segundo objetivo consiste em simplificar as normas sobre a atividade econômica, facilitando o cotidiano dos empresários brasileiros. (. .. ) o terceiro principal objetivo da propositura diz respeito à superação de lamentáveis lacunas na ordem jurídica nacional, entre as quais avulta a inexistência de preceitos legais que confiram inquestionável validade, eficácia e executividade à documentação eletrônica, possibilitando ao empresário brasileiro que elimine toneladas de papel. (. ..) Com este projeto, pretende-se dotar o direito brasileiro de normas sistemáticas modernas e adequadas ao atual momento, de extraordinária vitalidade, da economia brasileira, contribuindo para a criação de um ambiente propício à segurança jurídica e previsibilidade das decisões judiciais, indispensáveis à atração de investimentos, desenvolvimento das micro e pequenas empresas, aumento da competitividade dos negócios brasileiros e desenvolvimento nacional, em proveito de todos os brasileiros."'
i.
Justificativas do PL i572/11 disponível em http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/ fichadetramitacao?idProposicao=5o8884.
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
Tal projeto encontra-se em tramitação na Câmara, mas certamente ainda terá um longo caminho a percorrer. Isso porque sua aprovação está sendo alvo de divisão de opiniões entre doutrinadores. Enquanto alguns acreditam que o novo Código trará mudanças importantes e modernização ao Direito Empresarial, outros entendem ser muito cedo para se implementar mais mudanças neste ramo jurídico que já foi tão alterado há menos de 10 anos. Algumas mudanças já vêm sendo implementadas, mas por legislações esparsas. Fases do Direito Empresarial ia
2•
3'
Estudo focado apenas na figura do comerciante. Conhecida como era subjetiva.
Surgimento da Teoria dos Atos de Comércio que passa a focar o estudo nos atos que eram praticados pelos comerdantes e não apenas na sua figura. Conhecida como era objetiva.
Surgimento da Teoria da Empresa. Muda-se completamente a linha de pensamenta, ampliando o estudo para a empresa e não apenas o comércio. Muda-se inclusive a nomenclatura do ramo jurídico.
~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No Concurso da Magistratura/MG/2012, organizado pela EJEF, o tema foi abordado com o seguinte enunciado: "Com a vigência do Novo Código Civil, à luz do artigo 966, é correto afirmar que o Direito brasileiro concluiu a transição para a". A afirmativa correta era a que tinha o texto: "teoria da empresa de matriz italiana."
2. CARACTERÍSTICAS DO DIREITO EMPRESARIAL
A estrutura atual do Direito Empresarial faz com que a doutrina enumere determinadas características que lhes são peculiares e fazem com que ele se diferencie dos demais ramos jurídicos, principalmente do Direito Civil. As características mais importantes são: cosmopolitismo, individualismo, informalismo e fragmentarismo. Por cosmopolitismo entende-se a característica de ser um direito universal, sem fronteiras. A atividade empresária é comum a diversos povos e diversas economias mundiais, já que grande parte das economias
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INTRODUÇÃO AO DIREITO EMPRESARIAL
mundiais baseiam-se em um sistema capitalista. Assim, sendo, várias são as legislações derivadas de tratados internacionais que tratam de temas do Direito Empresarial, como no caso dos títulos de crédito (Lei Uniforme de Genebra) e da propriedade industrial (Convenção de Paris). O individualismo é um dos pontos que mais diferencia o Direito Empresarial do Direito Civil. Isso porque a atividade empresária está baseada na obtenção de lucro e este está ligado diretamente a interesses individuais. Porém, o atual Código Civil baseia-se em princípios de solidariedade e função social, e o Direito Civil segue de forma bem mais profunda esses pilares, reduzindo significativamente o individualismo. No Direito Empresarial essa característica ainda é muito marcante, dado o fim lucrativo ser o objetivo principal da atividade, porém, nos dias atuais, esse individualismo é mitigado, principalmente frente ao princípio da função social da empresa que será melhor estudado mais a frente. Dada a necessidade de celeridade no trato negocial das atividades empresárias, urge abrir mão do formalismo das relações contratuais, seguindo a tendência explanada no art. io7 do Código Civil. Por isso menciona-se a característica do informalismo do Direito Empresarial. Por fim, diz-se que nosso ramos jurídico é fragmentário, pois como será percebido no decorrer do nosso estudo, várias são as legislações extravagantes que tratam do Direito Empresarial e que não se concentram seu regulamento em uma ou poucas leis. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No Concurso da Magistratura/MG/2009, organizado pela EJEF, o tema foi abordado requerendo que fosse apontado o que não era uma característica do Direito Empresarial. As alternativas eram: a) lnformalismo. b) Fragmentário. c) Cosmopolita. d) Sistema jurídico harmônico. A última alternativa é que era para ser marcada.
3. A EMPRESA O principal conceito para se falar no Direito Empresarial moderno passou a ser, portanto, a empresa, cuja definição ainda necessita de certos contornos.
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A partir do Código Civil de 2002, empresa passou a significar a atividade econômica, negocial, que ocorre de forma organizada voltada para a produção ou circulação de bens ou serviços. Diferencia-se, desta forma, o conceito de empresa do de empresário, do de sociedade empresária e do de estabelecimento empresarial, que na linguagem coloquial são usados todos como significado de empresa. Porém, tecnicamente a expressão empresa somente pode ser utilizada para definir a atividade "econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços" O legislador brasileiro optou pelo pertil funcional de Alberto Asquini para definir a empresa, vendo-a como "aquela particular força em movimento que é a sua atividade dirigida diretamente a um determinado escopo produtivo." A doutrina moderna menciona a empresa como abstração, já que não se trata de uma entidade material e visível. Tal conclusão se dá pelo fato de o conceito ser o de atividade, não se confundindo com o de empresário (sujeito) e nem com o de estabelecimento (objeto). Empresa -+Atividade Organizada
O Código Civil, no seu art. 966, trouxe o conceito de empresa dentro do conceito de empresário, mas essa não é uma definição muito precisa já que toda atividade negocial é organizada e busca colocar em circulação bens ou serviços. Desta forma, inicialmente, para diferenciar a atividade empresária das demais atividades econômicas, é preciso esclarecer o que seja o elemento organização que foi estipulado no conceito. Esta organização se refere à estrutura empresarial, com a existência de um complexo de bens organizados, em que as tarefas para desempenhar a atividade fim sejam separadas em funções específicas, criando uma atuação capaz de produzir e circular riquezas. Tal elemento se opõe ao trabalho individualizado, meramente pessoal, ainda que se tenha o objetivo de circular bens ou serviços. Assim, por exemplo, um taxista que pratica o seu serviço de transporte apenas com seu táxi e somente ele organiza as contas, as receitas e as despesas, não se pode colocar tal atividade como empresa. Porém se uma pessoa é dona de, digamos, 3 táxis, contrata motoristas
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INTRODUÇÃO AO DIREITO EMPRESARIAL
para prestar os serviços, organiza horários, contas, sua atividade entrará na organização que caracteriza a empresa . Não nos esqueçamos de que também há que se falar em atividade econômica, ou seja, a atividade é uma busca por lucratividade. Aquele que inicia a prática de uma atividade empresária, o faz para angariar lucros. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No certame da Magistratura/Pl/2012, de responsabilidade do CESPE, o enunciado perguntava qual o significado de empresa, de acordo com o Código Civil de 2002 e alternativa correta era: "uma atividade organizada com o fito da obtenção de lucros." Apesar de ser uma conceituação simplista, é a alternativa que melhor se enquadrou como empresa.
Porém, não foi apenas do requisito da organização que o legislador brasileiro utilizou-se para conceituar a atividade empresária, pois, quando o elemento pessoal da atividade prevalece, também estará excluída a ideia de empresa. Diz-se isso de determinadas iniciativas onde o mais importante são as características do profissional que as realiza, o que acaba por descaracterizar a estrutura empresarial. Assim, para complementar o conceito de empresa, é preciso observar o parágrafo único do art. 966 do Código Civil que diz quais as atividades não são consideradas empresárias. Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa.
Portanto, as atividades intelectuais, de natureza científica (médicos, cientistas), literária (escritores, advogados) ou artística (músicos, atores) não são consideradas como empresárias. ~
Importante!
Mesmo existindo a atividade econômica e a organização, as atividades de natureza intelectual não são consideradas atividades empresárias. Segue-se o conceito que vai além da ideia econômica de empresa e adota-se uma teoria jurídica da empresa.
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• Como esse assunto foi cobrado em concurso? Dentro do tema das atividades que não são consideradas como empresa e utilizando-se do exemplo mais comum, na prova para Titular de Serviços de Notas do TJ/RN/2012, organizado pelo IESES o enunciado pedia para marcar a alternativa incorreta que era: "O médico que presta seus serviços é empresário, pois, mesmo que não exerça uma atividade organizada com a contratação de colaboradores, exerce tal atividade de forma profissional." A atividade médica pura e simples não é empresária e então ele não será empresário_
Existe apenas uma possibilidade de essas atividades serem consideradas como empresárias que é a ressalva final do dispositivo, ou seja, quando a atividade constituir elemento de empresa. Mas o grande problema é definir o que seja esse elemento de empresa que fará com que as atividades intelectuais possam ser empresárias. Alguns autores partem para o lado econômico e dizem que esse elemento empresarial está na complexidade da organização da atividade intelectual, ou seja, a partir do porte do negócio. Assim, dois médicos que têm um consultório em conjunto não seriam empresários, mas se esse consultório começar a ganhar outro porte, com a participação de mais médicos, com um número maior de funcionários, passaria a ter o elemento de empresa. Entretanto o entendimento que vem prevalecendo é o de que esse elemento seria caracterizado pela existência de outras atividades sendo praticadas em complemento à atividade intelectual. Na clínica médica do exemplo anterior, a atividade seria empresária quando junto com a atividade dos médicos fossem oferecidos exames, serviços de enfermagem, estética, dentre outros. Filiando-se ao primeiro posicionamento temos autores como Fábio Ulhoa Coelho e Ricardo Fiúza, e sustentando o segundo encontram-se Sylvio Marcondes e Alfredo Assis de Gonçalves Neto. Cada um desses autores citados cria determinadas nuances para explicar o elemento de empresa. sempre seguindo as tendências explanadas anteriormente. Elemento de empresa i•
corrente
Baseia-se na estrutura organizadonai. Se possuir complexidade, haverá elemento de empresa.
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2•
corrente
Baseia-se na existência de outras atividades junto à atividade intelectual. Somente havendo outras atividades terá elemento de empresa.
INTRODUÇÃO AO DIREITO EMPRESARIAL
~
Importante!
Na jurisprudência, a questão da definição do que seja elemento de empresa ganha importância na questão tributária. Isso porque o art. 9". §§ 1° e 3•, do Decreto-Lei 4o6/68 dá tratamento diferenciado para pagamento do ISS às atividades não empresárias, ou seja, se ficar configurada a existência do elemento de empresa, não haverá o benefício. o STJ vem entendendo, como no REsp io28o86/RO, publicado em 15 de dezembro de 2011, que o elemento de empresa se caraderiza pela complexidade na organização.
• Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame organizado pela FCC para Procurador do TCE/BA/2011, a alternativa correta a ser assinalada afirmava "Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, mesmo que com o concurso de auxiliares ou colaboradores, a não ser que o exercício da profissão constitua elemento de empresa."
4- O EMPRESÁRIO De acordo com o já analisado art. 966 do Código Civil, será empresário aquele que pratica atividade empresária. Essa é uma definição material do conceito de empresário, sendo ele o sujeito de direitos e obrigações que exerce a atividade econômica organizada para a circulação de bens ou serviços, exceto a atividade intelectual. Essa atuação deve ocorrer de forma profissional, ou seja, o empresário tem que exercer a atividade com habitualidade, não entrando neste conceito aquele que esporadicamente praticou uma atividade empresária, como por exemplo, uma pessoa que vende seu próprio carro, mas não tem como cotidiano a prática de venda de automóveis. Neste diapasão é importante que se corrija uma visão coloquial da expressão empresário que cotidianamente é usada como sinônimo de empreendedor, ou seja, qualquer pessoa que possua ou realize investimentos. Sendo assim, nem todo sócio ou acionista de uma sociedade será empresário. Somente o será se possuir cargo de administração e efetivamente participar da organização da atividade. Quando se tem sociedade, os empresários serão os administradores e a própria pessoa jurídica que é quem efetivamente organiza a atividade.
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
A empresa, portanto, pode ser exercida em sociedade (através das sociedades empresárias) ou individualmente (através do empresário individual e da empresa individual de responsabilidade limitada). ~
Importante!
Não se pode confundir mais o conceito de empresário com o de investi· dor, dessa forma, o fato de ser sócio de uma sociedade não faz com que a pessoa seja considerada empresária. Para sê-lo precisará participar efetivamente da organização da atividade empresária.
O legislador brasileiro optou pelo conceito material de empresário, tendo em vista que o já analisado art. 966 não exige o registro para que alguém seja caracterizado como tal. O art. 967 do Código Civil exige que o empresário se registre na Junta Comercial antes do início da atividade, e em virtude dessa previsão há quem defenda que o conceito seria formal, já que todo empresário deve se registrar. Esse não é o entendimento correto, uma vez que alguém que organize atividade empresária será considerado empresário. Se não se registrar será um empresário irregular, mas não deixará de sê-lo. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Esse é o entendimento seguido pelas bancas, como ocorreu no exame organizado pelo TRT da 24• região em 2012 em prova da magistratura do Trabalho. A questão pedia para marcar o que caraderiza o empresário e a resposta era: "Pelo exercício profissional de atividade econômica organizada para produção ou circulação de bens ou de serviços." Dentre as alternativas erradas tinha a que dizia: "Pelo registro na Junta Comercial."
4.1. Requisitos para ser empresário Dois são os requisitos para que seja possível se inscrever como empresário individual: capacidade e ausência de impedimentos. Na interpretação conjunta do art. 972 com o art. 974, do Código Civil, conclui-se que para requerer a inscrição como empresário é necessário ter plena capacidade civil. Não é possível requerer a inscrição por representante ou assistente.
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INTRODUÇÃO AO DIREITO EMPRESARIAL
A atividade empresarial poderá, entretanto, ser continuada, através de representante ou assistente, quando ocorrer incapacidade superveniente. Essa incapacidade superveniente poderá ocorrer quando o próprio empresário passa por um processo de interdição e é declarado incapaz ou quando ele falece e seu(s) herdeiro(s) é(são) incapaz(es). Em qualquer dos casos, a continuação da atividade dependerá de autorização judicial e os bens que o incapaz possuía antes de interdição ou da sucessão não poderão ser penhorados para o pagamento de dívidas decorrentes da atividade. Art. 974. Poderá o incapaz, por meio de representante ou devidamente assistido, continuar a empresa antes exercida por ele enquanto capaz, por seus pais ou pelo autor de herança.
As duas hipóteses de continuação do empresário incapaz são taxativas, não comportando interpretações extensivas. Por exemplo, não pode, ao argumento da continuidade, o empresário capaz transferir em vida seu registro para seu filho menor de idade, pois tal hipótese não está prevista no art. 974. ~
Importante!
Não há possibilidade de o incapaz iniciar atividade empresária. Ele apenas pode continuar, nas hipóteses taxativas do art. 974 do Código Civil, quais sejam, em caso de incapacidade superveniente ou em caso de receber a atividade por herança. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova da Magistratura/Pl/2012 organizado pelo CESPE, pedia-se para marcar a alternativa correta e o enunciado começava dizendo #Pode exercer a atividade empresária#. A resposta correta era: #o incapaz, por meio de representante ou devidamente assistido, desde que se refira à continuação da empresa que antes exercia quando capaz, a depender de autorização judicial após exame das circunstâncias e dos riscos da empresa#. A lei cuidou de proteger o patrimônio do incapaz que prossegue na atividade empresária, por isso o §iodo art. 974 do Código Civil dispõe que: MNão ficam sujeitos ao resultado da empresa os bens que o incapaz já possuía, ao tempo da sucessão ou da interdição,
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desde que estranhos ao acervo daquela, devendo tais fatos constar do alvará que conceder a autorização."
Assim, se o incapaz continuar, seu patrimônio particular que não tiver relacionado com a atividade empresária estará sempre protegido, não podendo ser atingido caso a atividade não venha a obter êxito.
o segundo
requisito é a ausência de impedimento. Determinadas pessoas, por causa do cargo ou função que ocupam ou em virtude de algumas circunstâncias pessoais, não podem exercer atividade de empresário, mas se o fizer, responderão pelas obrigações contraídas. Como se analisará no momento oportuno, estarão impedidos de exercê-la os falidos, porém, basta a declaração de extinção das obrigações para que se consideram reabilitados. Se houve crime falimentar, deverá após o decurso do prazo legal, obter a declaração de extinção das obrigações e a sua reabilitação penal. Também são impedidos os funcionários públicos, pois a atividade que exercem é de tamanha importância que devem dedicar-se a elas sem ter que se preocupar em organizar uma atividade empresária. Os devedores do INSS também não poderão exercer atividade empresarial (Lei n° 8.212/91, art. 95, §2º, d). Deputados e Senadores também não podem ser empresários, mas é uma restrição específica para as empresas que gozem de contrato com o governo. Aqueles que foram condenados pela prática de crime que vede o acesso à atividade empresarial (art. 35, li, da Lei 8934/94) também não poderão exercer a atividade empresarial, até que concedida a reabilitação penal. Esses impedimentos, como se pode perceber; podem ser temporários ou ter um caráter permanente. 4.2. Empresário individual Muitas vezes determinada pessoa pode se interessar por, sozinha, constituir uma atividade empresária e organizá-la com seus próprios meios. Pelas regras atuais do direito brasileiro tal pessoa poderá optar por duas maneiras de exercer a atividade empresária sozinha, registrando-se como empresário individual ou constituindo uma empresa
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INTRODUÇÃO AO DIREITO EMPRESARIAL
individual de responsabilidade limitada, essa última de criação recente pela Lei 12.441/11 que entrou em vigor em 12 de janeiro de 2012. Inicialmente vamos analisar a questão do empresário individual. Toda e qualquer pessoa física que atenda aos requisitos descritos no item anterior poderá praticar a atividade empresária, criando e organizando o negócio e para isso deverá se inscrever na Junta Comercial.
o empresário individual tem que fazer sua inscrição na Junta Comercial antes de iniciar sua atividade. Esta obrigação difere das sociedades empresárias, por exemplo, e da regra geral do prazo do registro que é de 30 dias a contar da realização do ato. Essa é a regra que se depreende do art. 967 do Código Civil, e a única exceção é a pessoa que desenvolve atividade rural que estará dispensada do registro, conforme analisaremos mais a frente. Essa inscrição do empresário individual existe, pois a Junta Comercial é o órgão que controla as atividades empresárias, porém, é importante lembrar que tal registro não fará com que ele ganhe uma personalidade jurídica que será diferente da pessoa física. Ele jamais será considerado pessoa jurídica, já que não se enquadra em nenhuma das espécies de pessoa jurídica previstas no art. 44 do Código Civil, nem mesmo na recém criada Empresa Individual de Responsabilidade Limitada que será analisada adiante. Desta forma, o empresário individual é uma pessoa física que para exercer sua atividade empresária precisa de um registro no órgão competente. Assim como os advogados se registram na OAB, os médicos se registram no CRM, sem que com isso se tornem pessoa jurídica. Mas ao se registrar na Junta Comercial, será obrigatório que o empresário individual também faça sua inscrição na Receita Federal, ocupando o Cadastro Nacional Pessoas Jurídicas - CNPJ. E é justamente por causa desse fato que muitos fazem uma ideia errônea, acreditando que o empresário individual é pessoa jurídica. É importante perceber que a existência deste número no CNPJ é apenas para fins tributários, pois para o recolhimento do Imposto de Renda o empresário individual será equiparado às pessoas jurídicas. Como se vê, é apenas uma questão de pagamento de tributo, uma equiparação. 31
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~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova da Magistratura/MG/2012, organizada pela banca da EJEF, foi pedido para assinalar a alternativa correta a respeito do empresário individual. A afirmativa a ser marcada era a que dizia: NNão é pessoa jurídica e pode ingressar em juízo em nome próprio.#
Isso nos traz uma questão importante. Uma vez que o empresário individual não tem personalidade jurídica distinta da pessoa física, não há autonomia patrimonial, já que as obrigações pertencem a uma única pessoa. Sendo assim, caso o negócio não dê certo, ele irá responder pelas obrigações contraídas com todo o seu patrimônio, estando ele registrado no CPF ou no CNPJ. O inverso também poderá acontecer. Se o empresário possuir dívidas particulares e não conseguir quitá-las, poderá atingir o patrimônio que é utilizado pela atividade empresária. Esse fato faz com que muitos busquem a realização da atividade empresária em sociedade, justamente para terem a possibilidade de limitar os riscos inerentes a essa atividade. A recém-criada Empresa Individual de Responsabilidade Limitada tende a também ser uma alternativa para atender ao anseio dos empresários que querem atuar individualmente, mas sem se expor integralmente aos riscos da atividade. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Como não poderia ser diferente. o Superior Tribuna de justiça possui julgados em que reconhece que o empresário individual não é pessoa jurídica, como podemos observar no Resp REsp 594832/RO, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi: Processual civil. Recurso especial. Ação rescisória. Agravo retido. Inviabilidade. Embargos de dedarac;ão. Não demonstração da omissão, contradição ou obscuridade. Patrimônio do empresário individual e da pessoa física. Doação. Invalidade. Ausência de outorga uxória. Erro de fato. Tema controvertido. Violação a literal disposição de lei. (. .. ) - Empresário individual é a própria pessoa física ou natural, respondendo os seus bens pelas obrigações que assumiu, quer civis quer comerciais. (. ..)
Recurso parcialmente conhecido e, nesta parte, provido.
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INTRODUÇÃO AO DIREITO EMPRESARIAL
Mas há um detalhe importante: apesar de não haver a criação de um novo ente e termos apenas uma personalidade jurídica, há o entendimento de que deve ser observada a subsidiariedade prevista no art. io24 do Código Civil. Isto quer dizer que se estiver sendo cobrada uma obrigação referente à atividade empresária, quando da execução, primeiro devem ser penhorados os bens ligados à empresa, isto é, que estão registrados no CNPJ para depois, caso não haja patrimônio suficiente, faça-se a constrição dos "bens particulares" do empresário. Esse entendimento foi objeto de enunciado na 1Jornada de Direito Comercial do Conselho da Justiça Federal: • Enunciado n° 5: Quanto às obrigações decorrentes de sua atividade, o empresário individual tipificado no art. 966 do Código Civil responderá primeiramente com os bens vinculados à exploração de sua atividade econômica, nos termos do art. i.024 do Código Civil. Como foi falado anteriormente, por ter tratamento diferenciado, o empreendedor rural só será considerado empresário se fizer sua inscrição na Junta Comercial. Importante ressaltar que se ele decidir fazê-lo, não terá mais nenhum tratamento diferente e passará a ter as mesmas obrigações de qualquer outro empresário. Art. 971. O empresário, cuja atividade rural constitua sua principal profissão, pode, observadas as formalidades de que tratam o art. 968 e seus parágrafos, requerer inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede, caso em que, depois de inscrito, ficará equiparado, para todos os efeitos, ao empresário sujeito a registro.
Uma grande novidade do CC de 2002 é o previsto no art. 978 que diz que o empresário casado sob qualquer regime, não irá precisar da outorga conjugal para alienar bens imóveis que integrem o patrimônio da empresa. Para isso, é importante retomar o que foi dito anteriormente e dizer que os bens que podem ser alienados são os que estiverem em nome do empresário individual, ou seja, registrados no CNPJ. Esse assunto também foi alvo de enunciado na 1 Jornada de Direito Comercial:
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• Enunciado n° 6: O empresário individual regularmente inscrito é o destinatário da norma do art. 978 do Código Civil, que permite alienar ou gravar de ônus real o imóvel incorporado à empresa, desde que exista, se for o caso, prévio registro de autorização conjugal no Cartório de Imóveis, devendo tais requisitos constar do instrumento de alienação ou de instituição do ônus real, com a consequente averbação do ato à margem de sua inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Tema bem recorrente em concursos como no da Magistratura/PE/2011, organizado pela FCC e no da Magistratura/PB/2011, organizado pelo CESPE em que pedia para marcar a alternativa correta e em ambas as provas tal alternativa afirmava que o empresário casado pode, independente do regime de bens, alienar bens que integrem o patrimônio da empresa. O empresário individual responde com todos os seus bens (do empresário e particulares) nas dívidas que forem contraídas no exercício da atividade, já que não existe limitação de responsabilidade para ele. Aliás, esta ausência de limitação de responsabilidade se dá devido ao fato de o empresário individual não ter personalidade jurídica diferente da pessoa física. É uma única personalidade jurídica, apesar de existir um CPF e um CNPJ. Como já foi observado, esta diferenciação é apenas para fins tributários. Por fim, é importante ressaltar que é possível a falência do empresário individual, conforme art. 1° da Lei 11.101 de 2005. ~
Importante!
Empresário individual não é pessoa jurídica e não tem personalidade jurídica distinta. Sendo assim, as obrigações contraídas para a prática da atividade poderão atingir o patrimônio que não está a ela relacionado e as dívidas particulares do empresário também poderão atingir o patrimônio usado na empresa.
5. EMPRESA INDIVIDUAL DE RESPONSABILIDADE LIMITADA - EIRELI Por fim, após diversas discussões doutrinárias e projetos de lei que não foram aprovados para se introduzir no ordenamento jurídico
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INTRODUÇÃO AO DIREITO EMPRESARIAL
brasileiro alguma hipótese de constituição de pessoa jurídica por uma única pessoa natural, a Lei 12.441/2011 foi publicada no Diário Oficial da União (DJU), de 12/07/2011, e trata da Empresa Individual de Responsabilidade Limitada, "EIRELI". A possibilidade jurídica que autoriza determinada pessoa natural a constituir pessoa jurídica para a exploração de empresa, sem a necessidade de se juntar a algum sócio, é razoável e há muito tempo aguardada pelos empresarialistas e principalmente pelos empresários. Como foi mencionado no item anterior, antes da Lei 12.441/2011 o empresário individual não tinha escolha: se quisesse explorar determinada empresa, sem a colaboração de sócios, estaria arriscando todo o seu patrimônio pessoal penhorável. Isso porque a sistemática do empresário individual não o possibilita limitar sua responsabilidade. Com a EIRELI haverá uma criação de um novo ente, que irá assumir os direitos e obrigações da atividade empresária. Importante ressaltar que a EIRELI não tem natureza jurídica de sociedade empresária, ao contrário do que muitos podem imaginar, mas trata-se de uma nova categoria de pessoa jurídica de direito privado, que também se destina ao exercício da empresa. Tanto que a Lei 12.441/2011 incluiu "as empresas individuais de responsabilidade limitada" no rol de pessoas jurídicas de direito privado do art. 44 do Código Civil. Além disso, a Lei 12-441/2011, ao inserir no Código Civil o art. 980-A, teve o cuidado de também criar um novo título (Título 1-A: "Da Empresa Individual de Responsabilidade Limitada"), situado entre os Títulos 1 e li, que tratam, respectivamente, do empresário individual e das sociedades empresárias. Isso significa dizer que a criação da EIRELI não acabou com a figura do empresário individual que continuará a existir normalmente e as pessoas poderão, em alguns casos, fazer a escolha de um tipo ou outro. ~
Importante!
Aquele que quer explorar a empresa individualmente, a partir de janeiro de 2012 passou a ter duas opções: ou se registra como empresário individual ou como empresa individual de responsabilidade limitada.
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
Outrossim, também não se afigura razoável atribuir à EIRELI a natureza jurídica de "sociedade unipessoal", pois só há que se falar em sociedade se houver mais de um sócio. A criação de uma nova modalidade de pessoa jurídica de direito privado não impõe que seja classificada como "sociedade unipessoal". Nem toda pessoa poderá constituir uma EIRELI, haja vista que o caput do art. 98o-A do Código Civil exige que, no ato de constituição, no mínimo, seja estabelecido um capital não inferior a ioo (cem) salários mínimos. Com a fixação de um piso para o capital inicial, o dispositivo parece ter visado evitar que pequenos negócios gozassem da possibilidade de limitação de responsabilidade. Porém, a constitucionalidade da restrição já está sendo questionada. o Partido Popular Socialista (PPS) ingressou com Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI n°4.637) do STF contra a parte final do art. 98o-A.
o principal argumento utilizado na ADI é que "o salário mínimo não pode ser utilizado como critério de indexação para a determinação do capital mínimo necessário para a abertura de empresas individuais de responsabilidade limitada". O partido questiona ainda que "tal exigência esbarra na notória vedação de vinculação do salário mínimo para qualquer fim, prevista no inciso IV do artigo 7° da Constituição Federal". o PPS lembra ainda que a Súmula Vinculante 4, do STF, impede a utilização do salário mínimo como indexador de base de cálculo de vantagem de servidor público ou de empregado, ou sua substituição por decisão judicial, salvo os casos previstos na Constituição. Há ainda outra inconstitucionalidade apontada na ação que seria a afronta ao princípio da livre iniciativa previsto no art. 170 da Constituição, já que o capital mínimo impede que pequenos investimentos possam ser abertos com a forma de EIRELI. A ADI ainda está sendo processada e está pendente de julgamento, já tendo recebido o parecer negativo do Ministério Público Federal. A justificativa mais plausível para a existência deste capital mínimo seria dificultar que a EIRELI seja utilizada para fraudar a legislação trabalhista, tal como vem sendo utilizado o regime jurídico do
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microempreendedor individual (MEi), previsto no art. 68 da Lei Complementar 123/2oo6. É que, na prática, muitos empregadores, buscando diminuir custos com mão de obra, têm demitido seus empregados e, logo, em seguida, os têm recontratado, fraudulentamente, na condição de microempreendedores individuais. Com a fixação do piso inicial de 100 (cem) salários mínimos, espera-se que a EIRELI seja desestimulada a servir de ferramenta para fraudes trabalhistas desse tipo. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova de Juiz do Trabalho do TRT 3• região/2013, o enunciado pedia para assinalar a alternativa incorreta que era: "A empresa individual de responsabilidade limitada será constituída por uma única pessoa titular da totalidade do capital social, devidamente integralizado, que não será inferior a 50 (cinquenta) vezes o maior salário-mínimo vigente no País. " Outra crítica importante foi a própria nomenclatura do novo instituto que conflita com as mudanças implementadas pelo Código Civil de 2002. De acordo com esse o termo "empresa" deve ser usado para designar a atividade e na Lei 12.441/2011 o termo foi usado para designar aquele que exerce a atividade. Sendo assim, o nome mais correto para o novo instituto seria "empresário individual de responsabilidade limitada." A partir da vigência da Lei 12.441/2011, a empresa pode ser exercida por empresário individual, EIRELI ou sociedade empresária. E quem já exerce empresa sob alguma das três estruturas jurídicas retro mencionadas pode, eventualmente, transformar-se em alguma das outras. Por outro lado, também haverá transformação se determinada sociedade altera o tipo societário, independentemente de dissolução ou liquidação. Nesse sentido, destaque-se que o parágrafo único do art. i.033 do Código Civil, com nova redação conferida pela Lei 12.441/2011, esclarece que não há que se falar em dissolução de sociedade quando houver concentração de todas as cotas sob a titularidade de uma única pessoa, ainda que por prazo superior a 180 (cento e oitenta) dias, desde que o único titular requeira a transformação da sociedade em empresário individual ou EIRELI. Vejamos quais são as principais diferenças entre o empresário individual e a EIRELI:
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Empresário Individual
EIREU
Não forma pessoa jurídica, sendo que a personalidade jurídica é única.
Cria uma pessoa jurídica que terá personalidade jurídica distinta daquele que a forma.
Pode ter qualquer valor de investimento.
Precisa de um investimento mínimo de 100 salários mínimos.
Empresário assume os riscos do negócio e terá seu patrimônio particular penhorado em caso de dívida da atividade.
Há separação das responsabilidades patrimoniais e o empresário, regra geral, não arrisca seu patrimônio particular.
~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Apesar de ser assunto novo, a prova para Técnico da JUCEPE/2012, organizada pela UPENET já abordou o assunto e o enunciado dizia que: "Conforme a IN n° 117/2011, do Departamento Nacional do Registro do Comércio, que aprovou o Manual de Atos de Registro de Empresa Individual de Responsabilidade Limitada - EIRILI, é CORRETO afirmar que". Ea resposta correta era: "podem ser utilizados para integralização de capital de uma EIRILI quaisquer bens, desde que suscetíveis de avaliação em dinheiro."
Em virtude das divergências de entendimentos sobre a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada, na última Jornada de Estudos, o Conselho da Justiça Federal aprovou alguns enunciados sobre o tema, quais sejam: • Enunciado n° 468 - A empresa individual de responsabilidade limitada só poderá ser constituída por pessoa natural. • Enunciado n° 469 - A empresa individual de responsabilidade limitada (EIRELI) não é sociedade, mas novo ente jurídico personificado. • Enunciado n° 470 - O patrimônio da empresa individual de responsabilidade limitada responderá pelas dívidas da pessoa jurídica, não se confundindo com o patrimônio da pessoa natural que a constitui, sem prejuízo da aplicação do instituto da desconsideração da personalidade jurídica. • Enunciado n° 471 - Os atos constitutivos da EIRELI devem ser arquivados no registro competente, para fins de aquisição de
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personalidade jurídica. A falta de arquivamento ou de registro de alterações dos atos constitutivos configura irregularidade superveniente. • Enunciado n° 472 - É inadequada a utilização da expressão "social" para as empresas individuais de responsabilidade limitada. • Enunciado n° 473 - A imagem, o nome ou a voz não podem ser utilizados para a integralização do capital da EIREU. • Enunciado n° 483 - Admite-se a transformação do registro da sociedade anônima, na hipótese do art. 2o6, 1, d, da Lei n. 6.404/1976, em empresário individual ou empresa individual de responsabilidade limitada.
6. MICROEMPRESA E EMPRESA DE PEQUENO PORTE De acordo com o princípio constitucional da igualdade, visto da maneira formal, deve haver tratamento desigual para as pessoas que estão em condições de desigualdade, para que se busque o equilíbrio. Na atividade empresária percebeu-se essa necessidade de tratamento diferente para as atividades empresárias de menor porte, que por sua menor capacidade econômica, precisam de determinados incentivos, para que possam competir no mercado. Com o advento da Lei Complementar n° 123 de 2oo6, as microempresas e empresas de pequeno porte passaram a ter tratamento diferenciado e favorecido por parte da União, Estados, Distrito Federal e Municípios.
As inovações referentes ao tratamento diferenciado e favorecido mencionadas no art. 1° da Lei são basicamente relacionadas a a) apuração e recolhimento de impostos e contribuições, mediante regime único de arrecadação, incluídas aqui as obrigações acessórias; b) cumprimento de obrigações trabalhistas e previdenciárias, também incluídas aqui as obrigações acessórias e; c) acesso ao crédito e ao mercado, bem como preferência nas aquisições de bens e serviços pelos poderes Públicos, à tecnologia, ao associativismo e às regras de inclusão.
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preciso, antes de tudo, analisarmos quais são as hipóteses de enquadramento como microempresa e empresa de pequeno porte. Recentemente a Lei Complementar 123/2oo6 foi alterada pela Lei Complementar 139/2011, que alterou os valores de receita bruta para o enquadramento como ME ou EPP. Tal alteração era necessária, pois os valores originalmente colocados tomaram-se defasados. Assim, hoje os parâmetros para enquadramento como microempresas são os seguintes: a) ser empresário, pessoa jurídica, ou a ela equiparada; b) auferir, em cada ano-calendário, receita bruta igual ou inferior a RS 36o.ooo,oo. Para o enquadramento como empresa de pequeno porte deverá ser: a) empresário, pessoa jurídica, ou a ela equiparada; b) que aufira, em cada ano-calendário, receita bruta superior a RS 36o.ooo,oo e igual ou inferior a RS 3.6oo.ooo,oo. A lei ainda vai definir o que seja receita bruta, dizendo que: "considera-se receita bruta, o produto da venda de bens e serviços nas operações de conta própria, o preço dos serviços prestados e o resultado nas operações em conta alheia, não incluídas as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos." No caso de início de atividade no próprio ano-calendário, o limite dos valores será proporcional ao número de meses em que a microempresa ou a empresa de pequeno porte houver exercido atividade, inclusive as frações de meses . O principal benefício dado para as MEs e para as EPPs é a possibilidade de optar pelo enquadramento no Simples nacional que é um sistema tributário com grandes vantagens. Serão consideradas inscritas no Simples Nacional as microempresas e empresas de pequeno porte regularmente optantes pelo regime tributário de que trata a Lei n° 9.317, de 5 de dezembro de 1996, salvo as que estiverem impedidas de optar por alguma vedação imposta pelo Estatuto da Microempresa.
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A Lei prevê, ainda, as hipóteses de não enquadramento ao regime diferenciado e favorecido. Dessa forma, não poderão ser enquadradas as pessoas jurídicas: a) de cujo capital participe outra pessoa jurídica; b) que seja filial, sucursal, agência ou representação, no País, de pessoa jurídica com sede no exterior; c) de cujo capita,! participe pessoa física que seja inscrita como empresário, ou seja, sócia de outra empresa que receba tratamento jurídico diferenciado nos termos da Lei Complementar u3/2oo6, desde que a receita bruta global ultrapasse os limites definidos na própria Lei; d) cujo titular ou sócio participe com mais de ioº" (dez por cento) do capital de outra empresa não beneficiada pela Lei Complementar i23/2oo6, desde que a receita bruta global ultrapasse os limites definidos na própria lei. Exceto a participação no capital de cooperativas de crédito, bem como em centrais de compras, bolsas de subcontratação, no consórcio previsto na própria lei, e associações assemelhadas, sociedades de interesse econômico, sociedades de garantia solidária e outros tipos de sociedade, que tenham como objetivo social a defesa exclusiva dos interesses econômicos das microempresas e empresas de pequeno porte; e) cujo sócio ou titular seja administrador ou equiparado de outra pessoa jurídica com fins lucrativos, desde que a receita bruta global ultrapasse os limites definidos pela lei; f) constituída sob a forma de cooperativas, salvo as de consumo;
g) que participe do capital de outra pessoa jurídica, exceto a participação no capital de cooperativas de crédito, bem como em centrais de compras, bolsas de subcontratação, no consórcio previsto no próprio Estatuto da Microempresa, e associações assemelhadas, sociedades de interesse econômico, sociedades de garantia solidária e outros tipos de sociedade, que tenham como objetivo social a defesa exclusiva dos interesses econômicos das microempresas e empresas de pequeno porte; h) que exerça atividade de banco comercial, de investimentos e de desenvolvimento, de caixa econômica, de sociedade de crédito,
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financiamento e investimento ou de crédito imobiliário, de corretora ou de distribuidora de títulos, valores mobiliários e câmbio, de empresa de arrendamento mercantil, de seguros privados e de capitalização ou de previdência complementar;
i) resultante ou remanescente de cisão ou qualquer outra forma de desmembramento de pessoa jurídica que tenha ocorrido em um dos 5 (cinco) anos-calendário anteriores; j) constituída sob a forma de sociedade por ações. De acordo com a Lei Complementar, é vedada a instituição de qualquer tipo de exigência de natureza documental ou formal, restritiva ou condicionante, que exceda o estrito limite dos requisitos pertinentes à essência do ato de registro, alteração ou baixa da empresa. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova da banca do CESPE para a Magistratura/Pl/2012, foi pedido para assinalar a afirmativa correta sobre as microempresas e empresas de pequeno porte e a resposta correta era: UA pessoa jurídica que exerça atividade de corretora ou de distribuidora de títulos, valores mobiliários e câmbio, de empresa de arrendamento mercantil, de seguros privados e de capitalização ou de previdência complementar não poderá beneficiar-se do tratamento jurídico previsto no estatuto em apreço."
7. PRINCÍPIOS DO DIREITO EMPRESARIAL Ao se estudar uma disciplina jurídica não se pode ater-se apenas às regras, sendo necessário apontar também os princípios basilares que justificam e servem de interpretação às normas. O Direito Empresarial faz parte do Direito Privado e como tal seguirá os princípios gerais deste, porém, por ser um ramo jurídico autônomo, mantém seus princípios próprios, os quais serão analisados a seguir. 7.i. Princípio da Livre Iniciativa Trata-se de um princípio que está garantido na Constituição Federal, no art. i 0 , sendo, portanto, princípio fundamental da República e com enorme relevância para o Direito Empresarial. Além disso, o caput do art. i70 da Constituição coloca a livre iniciativa como fundamento da ordem econômica.
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Tal princípio é de extrema importância, porque as atividades empresárias estão baseadas na busca por lucratividade e isso não ocorre se os empresários não tiverem liberdade de iniciativa. Além disso, não se pode esquecer que o sistema econômico brasileiro é o capitalista e, assim,precisa das iniciativas privadas para se desenvolver.
É com base nesse princípio que qualquer pessoa que tenha a plena capacidade civil pode ingressar na atividade empresária. Salvo as proibições para determinadas pessoas, que já foram analisadas anteriormente, não é necessária nenhuma qualificação profissional para uma pessoa praticar a empresa, pois todos possuem a livre iniciativa.
o Estado irá garantir que todos tenham essa liberdade, reconhecendo a livre iniciativa como um direito titularizado por todos que é o de explorarem as atividades empresariais, decorrendo no dever, imposto a todos os demais entes, particulares ou públicos, de respeitarem o mesmo direito constitucional, bem como a ilicitude dos atos que impeçam o seu pleno exercício e que se contrapõe ao próprio Estado, que somente pode interierir na economia nos limites constitucionais definidos contra os demais particulares. Essa liberdade de iniciativa pode ser observada em dois caminhos diferentes. O primeiro que diz respeito à possibilidade de se iniciar uma atividade empresária livremente e um segundo que é o de organizar essa atividade, no seu desenrolar, da maneira como for mais conveniente ao empresário. Porém, assim como os demais princípios, o da livre iniciativa não é um princípio absoluto e poderá sofrer restrições quando for necessário. Apesar de o nosso sistema econômico ser o capitalista, já não mais vivemos a era do liberalismo econômico, portanto, o Estado poderá interferir em determinadas atividades empresárias quando elas representarem risco aos interesses sociais. Também haverá restrições ao princípio da livre iniciativa quando ele colidir com outro princípio de mesma hierarquia constitucional. A situação mais comum é quando a liberdade de iniciativa esbarra no princípio da livre concorrência que será analisado a seguir.
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Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No 13º Concurso para Procurador da República organizado pela PGR, o enunciado pedia para marcar a alternativa que dizia no que se assenta o princípio básico do liberalismo econômico. A alternativa correta referia-se mercado
à liberdade de iniciativa e na economia de
7.2. Princípio da Livre Concorrência A Constituição Federal de 1988 baseia-se em um Estado Democrático de Direito e, por isso, trata dos princípios que a ordem econômica deve observar. Dentre eles, no inciso IV do art. 170, encontra-se o princípio da livre concorrência. Para garanti-lo ainda é preciso observar que o legislador constituinte, no § 4º do art. 174, dispôs que a lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação de mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros. Para seguir o ditame da carta magna ao ordenamento jurídico brasileiro foi incorporada a Lei n° 8.884/94, que dispôs sobre o Conselho Administrativo de Defesa econômica - CADE e tratou da prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica, orientada pelos ditames constitucionais da liberdade de iniciativa e da livre concorrência, protegendo a própria estruturação do mercado e seu livre funcionamento, assim como os empresários que são vítimas de práticas lesivas, os consumidores e os trabalhadores. Importante ressaltar que a Constituição Federal não condena o exercício do poder econômico, apenas quando houver abuso é que será necessária a intervenção estatal, coibindo excessos tais como os cartéis e monopólios de fato que venham a prejudicar o livre funcionamento das estruturas do mercado. O próprio CADE busca definir o que cia, a saber:
é o princípio da livre concorrên-
"O princípio da livre concorrência está previsto na Constituição Federal, em seu artigo 170, inciso IV e baseia-se no pressuposto de que a concorrência não pode ser restringida por agentes econômicos com poder de mercado. Em um mercado em que há concorrência entre os produtores de um bem ou serviço, os
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INTRODUÇÃO AO DIREITO EMPRESARIAL
preços praticados tendem a se manter nos menores níveis possíveis e as empresas devem constantemente buscar formas de se tornarem mais eficientes, a fim de aumentarem seus lucros. Na medida em que tais ganhos de eficiência são conquistados e difundidos entre os produtores, ocorre uma readequação dos preços que beneficia o consumidor. Assim, a livre concorrência garante, de um lado, os menores preços para os consumidores e, de outro, o estímulo à criatividade e inovação das empresas."' Percebe-se que muitas vezes a livre concorrência irá garantir a livre iniciativa, mas para isso também irá restringi-la. Por exemplo, quando o CADE proíbe ou impõe restrições a uma fusão estará interferindo na livre iniciativa das sociedades empresárias que estão pretendendo tal operação, para garantir a liberdade de concorrência e com isso a iniciativa dos demais empresários. Se houver abuso de poder econômico os demais empresários não conseguirão se manter no mercado e sua liberdade de iniciativa estará violada. ~
Qual o entendimento do STF sobre o assunto?
A súmula 646 do STF preconiza que: "Ofende o princípio da livre concorrência lei municipal que impede a instalação de estabelecimentos comerciais do mesmo ramo em determinada área." Demonstra o tribunal superior uma tendência de menor intervenção estatal na economia, um caminho bastante relevante da liberdade de concorrência.
7.3. Princípio da Função Social da Empresa Em algum tempo, as sociedades empresárias não são vistas apenas como uma instituição destinada a atender apenas os interesses dos sócios, mas são vistas como importante contribuição para a circulação de riquezas, para o fornecimento de empregos e para a economia em geral. Uma vez que estas instituições ganharam relevância, tornou-se fundamental a releitura do conceito de empresa e de sua estrutura teórico-jurídica à luz do princípio constitucional da função social da propriedade privada de forma a compreendê-la como uma importante
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realizadora de direitos e detentora de uma utilidade social, além de reconhecer os meios efetivos de implementá-la no contexto social brasileiro. A função da empresa, ou seja, a função social dos bens de produção implica na mudança de concepção do próprio direito de propriedade: o princípio da função social incide no conteúdo do direito de propriedade, impondo-lhe novo conceito. Isso implica que as normas de direito privado sobre a propriedade estão conformadas pela disciplina a que a Constituição lhes impõe. Mas, em muitos casos, a empresa ainda é vista como a fabricante de lucro dos sócios, propriedade destes. Observando por este prisma, não haveria nenhuma interferência do poder público na propriedade empresarial, tendo em vista que estaríamos diante de uma propriedade privada em sua excelência. Inicialmente, é preciso ressaltar que a expressão função social é vaga, imprecisa e de difícil intelecção. A palavra função vem do latim functio, funtionis, que quer dizer trabalho, exercício, cumprimento, execução, e liga-se ao verbo latino fungi, que significa cumprir, executar, desempenhar uma função. No direito, a especificação do conteúdo da função social da propriedade é tarefa complicada, uma vez que o próprio ordenamento jurídico-constitucional simplesmente elencou o princípio, deixando de apontar vários elementos necessários à sua caracterização. Grande parte da doutrina busca o significado da função social nos autores que propuseram o conceito, originariamente, como Aristóteles, São Tomás de Aquino, Augusto Comte e Leon Duguit. A evolução do Direito, entretanto, fez com que esta divisão entre direito público e direito privado ficasse ultrapassada. A propriedade passou a ter um sentido social e não mais apenas individual, estando destinada à satisfação de exigências de cunho social. A tendência constitucional visa a social dos institutos jurídicos, a necessidade de incluir a empresa como operadora de um mercado socialmente socializado. A função social da empresa assegura a função social dos bens de produção, o poder-dever do proprietário de destinar compativelmente
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INTRODUÇÃO AO DIREITO EMPRESARIAL
com o interesse da coletividade. Entretanto, a função social não significa uma condição limitativa para o exercício da atividade empresarial, pois visa proteger a empresa contra a verocidade patrimonialista do mercado. Nesse contexto, a função social da empresa deve ser entendida como o respeito aos direitos e interesses dos que se situam em torno das empresas. O objeto da propriedade, que no Direito Civil está limitado aos bens materiais tangíveis, ganha outra dimensão no art. 5° da Constituição Federal. A função social não pode ser encarada como algo exterior à propriedade, mas sim, como elemento integrante de sua própria estrutura. Fala-se não mais em atividade limitativa, mas conformativa do legislador abrangendo todos os bens de natureza patrimonial, inclusive os de consumo e pessoais. Sendo assim, a função da empresa, ou seja, a função social dos meios de produção implica na mudança de concepção do direito de propriedade: o princípio da função social incide no conteúdo do direito de propriedade, impondo-lhe novo conceito. Isso implica que as normas de direito privado sobre a propriedade estão conformadas pela disciplina que a Constituição lhes impõe. Nesse sentido, não se pode, hoje, deixar de impor limites à empresa, conforme valores sociais e interesses que ultrapassam os interesses de lucros dos empresários. Assim conclui-se que a função social da empresa se manifesta através de um conjunto de ações, que envolvem o poder-dever da instituição de empreender suas atividades em harmonia com o interesse público. Tais notas a respeito da função social da empresa, consoante se procurou demonstrar, representam a busca de concretização das diretrizes e objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, entre os quais a construção de uma sociedade mais livre, justa e solidária, com base nos valores democráticos da cidadania, da dignidade da pessoa humana e do humanismo, necessariamente considerados também nas relações privadas.
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Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
o STJ utiliza o princípio da função social da empresa no sentido de preservar seu funcionamento como no REsp 917531 / RS, publicado em 21./02/12, cuja ementa dispõe que: (...) 1. o instituto da dissolução pardal erigiu-se baseado nas sociedades con· tratuais e personalistas, como alternativa à dissolução total e, ponanto. como medida mais consentãnea ao prináplo da preservação da sociedade e sua função social, contudo a complexa realidade das relações negociais hodiernas potencializa a extensão do referido instituto às sode· dades "circunstancialmente" anõnimas, ou seja. àquelas que, em virtude de dáusulas estatutárias restritivas à livre circulação das ações, ostentam caráter familiar ou fechado, onde as qualidades pessoais dos sócios ad· quirem relevância para o desenvolvimento das atividades sociais ('affec· tio societatis"). (Precedente: REsp m .294/PR, segunda seção, Rei. Ministro Castro Filho, DJ lO/rYJ/2007)
(. ..)
7. Recurso especial provido, restaurando-se integralmente a sentença, in· dusive quanto aos õnus sucumbendais.
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Capítulo
2
Elementos e Obrigações Empresariais sumário • l. Estabelecimento empresarial: 1.1. Conceito e natureza; 1.2. Aviamento; 1.3. Contrato de trespasse; 1.4. Penhora do estabelecimento - 2. Nome Empresarial: 2.1. Conceito e natureza jurídica; 2.2. Espécies; 2.3. Proteção ao nome empresarial - 3. Registro Empresarial - 4. Escrituração Empresarial - 5. Propriedade Industrial: 5.i. Introdução; 5.2. Bens tutelados; 5.3. Condições de Patente; 5.4. Condições de Registro: 5.4.i. Registro do Desenho Industrial; 5.4.2. Registro de Marca; 5.5. Procedimento Administrativo; 5.6. Proteção à propriedade industrial; 5.7. Extinção da propriedade industrial
Para que a empresa possa ser exercida, serão necessários dois elementos obrigatórios, pois não há atividade empresária sem um estabelecimento empresarial e nem sem nome empresarial. O primeiro é o elemento objetivo que representa o investimento realizado para a criação do negócio e o segundo é o elemento identificador do sujeito da atividade empresária. Além disso, toda vez que se tiver uma empresa esta passa a ter determinadas obrigações, sendo que as principais são o registro e a escrituração contábil. A primeira terá o caráter de dar publicidade a determinados atos em virtude do interesse público que a empresária envolve e a segunda obrigação tem um precípuo fiscalizatório, principalmente no que diz respeito ao recolhimento dos tributos. Neste capítulo também será abordado um elemento que faz parte da atividade empresária, porém, não é obrigatório: a propriedade industrial, a qual envolve a proteção dos bens imateriais que serão, na maioria das vezes, utilizados no cerne da atividade empresária.
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
1.
ESTABELECIMENTO EMPRESARIAL
1.1. Conceito
e natureza
Quando se fala na atividade empresária não há como deixar de pensar no investimento que é realizado para a sua prática. Isso porque o próprio conceito fala em organização dos meios de produção de bens ou de serviços. Sendo assim, ainda que minimamente, esse investimento necessário irá se transformar no patrimônio da empresa, constituindo o estabelecimento empresarial. O estabelecimento é o complexo organizado de bens, estruturado para o exercício da empresa, por empresário ou sociedade empresária. É uma universalidade de bens que possui uma única destinação: a realização de atividade empresária. De acordo com o art. 1142 do Código Civil, o conceito moderno de estabelecimento empresarial engloba os dois que existiam antes do diploma civil de 2002: estabelecimento comercial e fundo de comércio. Estabelecimento Empresarial
=
Estabelecimento Comercial
+
Fundo de Comércio
Assim, o estabelecimento é um bem (pode ser móvel, imóvel, material ou até imaterial). Até a clientela, que antes estava dentro do conceito de fundo de comércio, hoje faz parte do conceito de estabelecimento empresarial. Por ser um objeto unitário de direitos (art. 1143), o estabelecimento pode ser objeto de relações jurídicas próprias. Ele pode ser alienado como um todo ou em parte, pode ser locado ou cedido. O regime irá depender do negócio jurídico que o estabelecimento estiver envolvido. Que o estabelecimento pode ser visto como universalidade, não há dúvidas, já que o art. 1143 prevê: "Pode o estabelecimento ser objeto unitário de direitos e de negócios jurídicos, translativos e constitutivos, que sejam compatíveis com a sua natureza." Discussão importante é se se trata de uma universalidade de fato ou de direito. Considera-se universalidade de fato o conjunto de bens que é mantido unido, destinado a uma finalidade específica, por vontade do seu
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ELEMENTOS E OBRIGAÇÕES EMPRESARIAIS
proprietário que assim o destina. Já na universalidade de direito, esse conjunto é formado pela imposição legal. Por ter a previsão legal, inicialmente a doutrina se dividiu, sendo que houve quem acreditasse ser o estabelecimento uma universalidade de fato e quem acreditasse se tratar de uma universalidade de direito. Com a percepção cada vez maior de que o estabelecimento somente será universalmente considerado quando assim for conveniente ao seu proprietário e aos seus credores, a doutrina foi firmando entendimento que ele é uma universalidade de fato e não de direito.
o Código Civil define universalidade de fato no art. 90 como a pluralidade de bens singulares que, pertinentes à mesma pessoa, tenham destinação unitária, podendo, entretanto, ser objeto de relações jurídicas próprias. Portanto, os bens integrantes do estabelecimento podem ser objeto de relações jurídicas autônomas ou podem ser negociados de forma unitária, por meio do trespasse, como um conjunto de bens. Seguem esse entendimento, Marfon Tomazette, Fábio Ulhoa Coelho, Galdston Mamede e diversos outros doutrinadores. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No concurso para Juiz do Trabalho, realizado em 2013, e organizado pelo CESPE, solicitava-se que se marcasse a alternativa correta a respeito do estabelecimento empresarial. A alternativa era: "Conforme a doutrina majoritária, a natureza jurídica do estabelecimento comercial é de uma universalidade de fato." Importante lembrar que o estabelecimento não compreende apenas o local onde a atividade é exercida, assim, se imaginarmos uma atividade de transporte escolar, por exemplo, todos os bens utilizados farão parte do estabelecimento, tais como as vans, computadores, telefones e outros. Há algumas atividades que a parte do estabelecimento mais valoroso é imaterial, pois seu patrimônio de maior valor é a marca. Como se trata do patrimônio da sociedade empresária, do empresário individual ou da EIRELI é este estabelecimento que irá responder pelas obrigações contraídas, pelo menos a princípio e principalmente se não for possível atingir o patrimônio particular de sócio.
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O estabelecimento tem, portanto, natureza de bem patrimonial e classifica-se como universalidade de bens. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
OSTJ já vem reconhecendo o novo conceito de estabelecimento do Código Civil de 2002 como no REsp 907014 / MS, publicado em o8/11/11, cuja ementa é a seguinte: DIREITO SOCIETÁRIO. DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE. APURAÇÃO DE HAVERES. INCLUSÃO DO FUNDO DE COMtRCIO. 1. De acordo com a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, o fundo de comércio (hoje denominado pelo Código Civil de estabelecimento empresarial - art. 1.142) deve ser levado em conta na aferição dos valores eventualmente devidos a sócio exduído da sociedade. 2. O fato de a sociedade ter apresentado resultados negativos nos anos anteriores à exdusão do sócio não significa que ela não tenha fundo de comércio. 3. Recurso especial conhecido e provido.
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Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova aplicada em 2011 para advogado do Pono de Santos pela banca CODESP. o enunciado trazia a seguinte afirmativa: "Todo complexo de bens organizado, para o exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária, nos exatos termos da lei, considera-se#. A alternativa a ser marcada era: -estabelecimento.-
i.2.
Aviamento
Modernamente, o estabelecimento não é conceituado apenas no seu aspecto estático, mas também no seu elemento dinâmico, isso principalmente no que diz respeito à sua valoração. Se pensarmos numa visão mais antiga, quando da apuração de valores do estabelecimento, seria feito um cálculo simples, levando-se em consideração o somatório do complexo de bens, conforme descrito no art. 1142 do Código Civil; porém, não se pode mais fechar os olhos para a forma como estes bens são estruturados pelo empresário e como esta organização dos bens influencia na conceituação do estabelecimento. É neste contexto que surge a Teoria do Aviamento para dizer que na caracterização do estabelecimento empresarial deverá ser levando 52
ELEMENTOS E OBRIGAÇÕES EMPRESARIAIS
em consideração a maneira como os bens são estruturados, como por exemplo, a escolha do ponto comercial, as estratégias de marketing, fazendo com que a capacidade de lucros aumente ou diminua de acordo com a melhor capacidade de organização. Para entendermos de maneira simples, basta pensarmos em uma situação real. Se imaginarmos duas lanchonetes que sirvam produtos parecidos, possuindo os mesmos materiais (freezers, balcões, mesas) e localizados em uma mesma região, apesar de toda a semelhança, da questão estática, a lucratividade dessas duas lanchonetes certamente não é a mesma, pois o empresário responsável por uma delas possui uma estratégia, uma organização que é diferente da do outro. Um dispõe os bens de uma forma que atrai melhor a clientela, por exemplo, ou então pratica políticas de preços diferentes que também fazem com que a lucratividade aumente. Vê-se que o aviamento pode ser dito como subjetivo quando ligado às qualidades pessoais do empresário ou chamado de objetivo quando ligado aos bens componentes do estabelecimento na sua organização. De uma forma ou de outra, o aviamento é a aptidão da empresa para produzir lucros, decorrente da qualidade e da melhor perfeição de sua organização. • Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
O tribunal superior vem utilizando a Teoria do Aviamento, em questões relativas à apuração de haveres, como no RESP 908173/PE, publicado em i6/o6/11, em que foi colocado que: "A jurisprudência desta Corte Superior finnou-se no sentido de que o critério da apuração de haveres, no caso de sócio que se retira da sociedade, será semelhante ao da dissolução total, ou seja, induindo-se na avaliação de seus haveres o fundo de comércio, sob pena enriquecimento dos demais sócios em prejuízo do sócio falecido."
i.3. Contrato de trespasse De acordo com o conceito já analisado, é o estabelecimento empresarial que irá garantir as obrigações do empresário ou da sociedade empresária, o que faz com que sua existência seja de extrema importância para os credores destes. Assim, o contrato que tem "por objeto a alienação, o usufruto ou arrendamento do estabelecimento" vai receber um tratamento diferenciado pela lei, já que desperta o interesse de terceiros.
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Isso porque se o estabelecimento é o ativo da atividade empresária e será desse ativo que os credores irão se utilizar para receberem seus créditos. Caso este ativo possa ser vendido sem qualquer consequência, o direito estaria permitindo uma verdadeira fraude contra credores. De acordo com a doutrina, este contrato recebe o nome de contrato de trespasse e tem como objetivo a transferência onerosa do estabelecimento empresarial, ocorrendo a sucessão subjetiva. O estabelecimento passará a ter um novo titular. O contrato de traspasse tem que ser registrado e publicado. Isso é necessário para preservar o interesse dos credores. Assim essas formalidades são pressupostos de eficácia perante terceiros e não pressupostos de validade. Art. u44. Ocontrato que tenha por objeto a alienação, o usufruto ou arrendamento do estabelecimento, só produzirá efeitos quanto a terceiros depois de averbado à margem da inscrição do empresário, ou da sociedade empresária, no Registro Público de Empresas Mercantis, e de publicado na imprensa oficial. Caso tais burocracias de registro e publicação não sejam cumpridas, os terceiros que forem credores do antigo proprietário do estabelecimento não precisarão observar essa transferência de titularidade e poderão buscar a penhora dos bens para ver seu crédito satisfeito. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame para Advogado da EBC/2011, organizado pelo CESPE, foi considerada incorreta a seguinte afinnativa: "O instrumento contratual que tenha por objeto a alienação de estabelecimento empresarial produz efeitos em relação a terceiros imediatamente após sua assinatura pelas partes interessadas." Há ainda outro requisito de eficácia do contrato de trespasse, previsto no art. 1145 do Código Civil. Este vai tratar diretamente da questão do interesse dos credores do proprietário do estabelecimento cuja alienação se pretende. Diz o dispositivo que "se ao alienante não restarem bens suficientes para solver o seu passivo, a eficácia da alienação do estabelecimento depende do pagamento de todos os credores, ou do consentimento destes, de modo expresso ou tácito, em trinta dias a partir de sua notificação."
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ELEMENTOS E OBRIGAÇÕES EMPRESARIAIS
Como se falou anteriormente, é o estabelecimento que irá garantir o pagamento dos credores e, portanto, se seu proprietário o aliena poderá ficar sem recursos para arcar com as obrigações, mas pode acontecer de o valor apurado nessa alienação ser suficiente para pagar os débitos existentes, ou então a alienação ser parcial e o empresário ou sociedade empresária se manter com bens suficientes para arcar com seus débitos. Nesses casos não há necessidade de se notificar os credores, pois eles não estão sendo prejudicados com a alienação. Este estado de solvência será comprovado através da contabilidade do alienante que terá facilidade para comprovar que o valor apurado na venda é suficiente para pagar os débitos existentes. Porém, se o alienante estiver em estado de insolvência e a venda do estabelecimento não lhe render valores que façam com que ele possa arcar com todos os débitos, a eficácia da alienação irá depender da notificação dos credores do alienante que poderão concordar com a alienação de maneira expressa ou tácita, se não se manifestarem no prazo estipulado pelo dispositivo de lei. • Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No concurso da Magistratura/MS/2010, pela banca FCC, em que foi pedido para se assinalar a alternativa correta, esta era a que tinha o seguinte texto: "se ao alienante não restarem bens suficientes para solver o seu passivo, a eficácia da alienação do estabelecimento dependerá do pagamento de todos os credores. ou do consentimento destes, de modo expresso ou tácito, em trinta dias a partir de sua notificação." Já na prova organizada pelo CESPE para Magistratura Federal/5• Região/2011, o enunciado trazia a seguinte situação hipotética "Uma sociedade limitada, alienante, celebrou contrato de trespasse com uma sociedade anônima, adquirente, e, decorridos três meses, a alienante requereu a própria falência, que lhe foi deferida. Com relação a essa situação hipotética e ao con trato de trespasse como regulado pelo Código Civil, assinale a opção correta." E a alternativa a ser marcada era "Os credores da sociedade falida à época não poderão requerer a ineficácia do trespasse se, demonstrado que foram devidamente intimados da alienação, não tiverem manifestado oposição no prazo de trinta dias." Nessa segunda hipótese pode-se imaginar, a princípio, que seria impossível aos credores concordarem com a alienação se o seu devedor irá ficar insolvente. Porém, há possibilidade de o credor
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
aceitar, tendo em vista os efeitos que a lei prevê para o contrato de trespasse que serão analisados a partir de agora. O contrato de trespasse possui 3 efeitos principais: haverá cessão de crédito para o adquirente, que também assumirá as dívidas. Os contratos usados na exploração do estabelecimento também serão alterados, ocorrendo a sub-rogação do adquirente nos contratos existentes. De acordo com o art. u46 do Código Civil, aquele que adquire um estabelecimento empresarial do outro irá assumir os débitos que estiverem devidamente contabilizados. Usemos de um exemplo para que a questão fique bem entendida: se a sociedade Beta Fabricação e Comércio de Sapatos Ltda. vender o seu estabelecimento empresarial (máquinas, estoque, clientela, etc.) para o empresário individual J. P. de Oliveira, este irá assumir os débitos que estiverem contabilizados (as contas atrasadas de luz, por exemplo). Ainda de acordo com o mesmo dispositivo, a Beta permanecerá responsável por tais débitos "pelo prazo de um ano, a partir, quanto aos créditos vencidos, da publicação, e, quanto aos outros, da data do vencimento ." Então o credor poderá, nesse caso, escolher de quem irá cobrar. Exatamente em virtude desse efeito, é que não se vê problema em os credores concordarem com a alienação do estabelecimento, pois a dívida "seguirá" o patrimônio. Poder-se-ia dizer que tais débitos são como as obrigações propter rem, seguem a coisa. A dívida seria do estabelecimento e seguirá com ele independente de quem seja seu proprietário. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova do CESPE para Procurador Federal/2010, estava correta a afirmativa que dizia: "Após percuciente análise, Beta Ltda. adquiriu, em 10/12/2009, o estabelecimento empresarial de Alfa Ltda., cujo contrato foi averbado à margem da inscrição da sociedade empresária, no Registro Público de Empresas Mercantis, e publicado na imprensa oficial em 15/1/2010. O referido estabelecimento, quando de sua alienação, apresentava inúmeros débitos regularmente contabilizados, todos com vencimento no dia 2/1/2011. Nessa situação, Alfa Ltda. continuará solidariamente obrigada ao pagamento dos aludidos débitos até 2/1/2012.# Trata-se de débitos vencidos após a transferência, em que o antigo proprietário do estabelecimento ficará por l ano a contar do vencimento solidariamente responsável.
Como o novo conceito de estabelecimento envolve também a clientela, o art. 1149 prevê que os créditos referentes à exploração do
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ELEMENTOS E OBRIGAÇÕES EMPRESARIAIS
estabelecimento também passarão a ser de propriedade do adquirente. Assim, no exemplo acima, o empresário J. P. de Oliveira poderá cobrar os que antes deviam para a Beta Fabricação e Comércio de Sapatos Ltda. Uma ressalva importante do dispositivo é que se o devedor de boa fé pagar para a Beta, por desconhecer a existência do contrato de trespasse, ficará desobrigado e a Beta que terá que prestar constas ao J. P de Oliveira. • Como esse assunto foi cobrado em concurso? Na prova da Magistratura/AL/2oo8, organizada pelo CESPE, o enunciado dizia que: massagista Rogério colocou nos fundos de sua casa equipamentos voltados para a prática de exercícios físicos, que utilizou para prestar serviços onerosos ao público em geral por meio de uma academia de ginástica, identificada pela designação de Aleatória Work-Out, conforme cartaz afixado sobre a porta do imóvel. Após dois anos, a atividade alcançou substancial desempenho, o que levou Rogério a alugar um imóvel para reinstalar a academia. bem como a contratar uma secretária e dois fisioterapeutas para auxiliá-lo com os clientes. Esse sucesso chamou a atenção de Serviços do Corpo Ltda .• academia concorrente, que propôs a Rogério o trespasse de seu estabelecimento empresarial para a sociedade limitada, celebrando-se esse negócio.# Em seguida. solicitava para assinalar a alternativa correta que era: UPublicado o negócio de trespasse. os clientes da academia de Rogério deverão adimplir suas mensalidades perante o adquirente do estabelecimento. mas qualquer pagamento dessa natureza feito de boa-fé ao alienante valerá contra a sociedade limitada.#
uo
O terceiro efeito da realização de uma venda, arrendamento ou usufruto do estabelecimento empresarial diz respeito aos contratos que o alienante possuía para a exploração daquele complexo de bens. No exemplo acima, vamos imaginar que a Beta Fabricação e Comércio de Sapatos Ltda. alugue um galpão onde funciona a fábrica e tenha ainda um contrato de fornecimento com o fabricante de couro . De acordo com o art. 1148 do Código Civil, tais contratos serão sub-rogados pelo adquirente. Assim. J. P. de Oliveira passaria a assumir a posição da Beta nesses contratos. Todas as demais disposições contratuais permanecem inalteradas. Existe apenas uma exceção a essa regra, prevista no mesmo dispositivo: quando o terceiro (no exemplo seria o locador e o fornecedor de couros) pedir a rescisão do contrato num prazo de 90 dias a contar da publicação do contrato de trespasse . Porém, para que esse terceiro possa pedir tal rescisão
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terá que ter uma justa causa, como, por exemplo, o novo dono já ter ficado inadimplente, não ter as mesmas garantias. Se não tiver este motivo justificado, terá que se submeter à sub-rogação. Na 1Jornada de Direito Comercial do Conselho da Justiça Federal, foi aprovado enunciado sobre este assunto: • Enunciado n° 8: A sub-rogação do adquirente nos contratos de exploração atinentes ao estabelecimento adquirido, desde que não possuam caráter pessoal, é a regra geral, incluindo o contrato de locação. Por fim, cabe ressaltar que, segundo o art. 1.147, o alienante não poderá fazer concorrência ao adquirente pelo prazo de s anos. Isso porque a cartela de clientes também é considerada parte do estabelecimento. Poderá, entretanto, haver acordo entre as partes que permita a realização de tal concorrência, mas pela simples regra legal ela não pode ocorrer; podendo o adquirente do estabelecimento buscar judicialmente uma obrigação de não fazer para que o alienante encerre a nova atividade que constituiu e que estiver gerando a concorrência.
Contrato de trespasse Requisitos
Efeitos
Art. 1144 Registro na Junta
Os débitos contabilizados Art. 1146 são assumidos pelo adquirente.
Art. 1144 Publicação em jornal
Art. 1148
Os contratos existentes para a exploração são sub-rogados ao adquirente.
Solvência do alienante ou Art. 1145 concordância dos credores
Art. 1149
Os créditos são cedidos ao adquirente.
1.4. Penhora do estabelecimento Como se trata de um bem patrimonial, o estabelecimento pode ser penhorado para arcar com os débitos decorrentes da atividade empresária. Neste contexto, é de se notar que o estabelecimento é parte integrante do patrimônio, não se confundindo, evidentemente, com o
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total reunido pelo empresário. Porém, numa realidade que ainda se sobressai pela organização familiar e de destinação própria da renda, não é incomum perceber o estabelecimento como parcela muito próxima da totalidade do patrimônio externo, do qual o empresário se utiliza. Surge então um imponante questionamento: quando a lei cria a figura de uma universalidade destinada a propiciar a organização dos fatores de produção, estará ela criando realmente uma segurança ao exercício da atividade através de um "patrimônio de afetação", ou ao contrário, estaria ela retirando justamente a segurança e limitando o enquadramento da atividade empresária? • Qual o entendimento do STJ sobre o assunto? A súmula n° 451 dispõe que:
"t legítima a penhora da sede do estabeleci-
mento comercial." O colendo tribunal superior, através da redação simplista dada à súmula, parece ter entendido que o estabelecimento se desvincula da atividade empresarial. Se assim não fosse, não poderia ser considerada como legítima a possibilidade de penhora do estabelecimento, independente de se tratar apenas de sua sede. A possibilidade de penhora do estabelecimento representaria o fim de uma parte da organização. Como se admitir a legalidade da penhora da sede do estabelecimento quando nesta funcionar essencialmente a atividade empresária? Como se admitir a desvinculação daquilo que o nosso próprio ordenamento consagrou como conjunto de bens organizados, universalidade que em si traduz a capacidade de organização da atividade empresária, universalidade esta objeto unitário de direitos? A interpretação da Súmula 451, portanto, não pode estar ligada exclusivamente no conceito de estabelecimento como universalidade, de modo a não restar obstaculizado o exercício da atividade econômica prestigiada pelo atual direito empresarial. Atento a este pensamento, o Novo Código de Processo CiviP passará a contar com um anigo que trata da penhora do estabelecimento empresarial. Observemos:
3.
O Novo Código de Processo Civil, Lei n° 13.105/2015, foi publicado em 17/03/2015 e entrará em vigor em 17/03/2016.
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Art. 862. Quando a penhora recair em estabelecimento comercial, industrial ou agrícola, bem como em semoventes, plantações ou edifícios em construção, o juiz nomeará administrador-depositário, determinando-lhe que apresente em io (dez) dias o plano de administração. § i 0 Ouvidas as partes, o juiz decidirá. § 2° É lícito às partes ajustar a forma de administração e es-
colher o depositário, hipótese em que o juiz homologará por despacho a indicação.
em construção sob regime de incorporação imobiliária, a penhora somente poderá recair sobre as unidades imobiliárias ainda não comercializadas pelo incorporador.
§ 3° Em relação aos edifícios
§ 4º Sendo necessário afastar o incorporador da administração
da incorporação, será ela exercida pela comissão de representantes dos adquirentes ou, se se tratar de construção financiada, por empresa ou profissional indicado pela instituição fornecedora dos recursos para a obra, devendo ser ouvida, neste último caso, a comissão de representantes dos adquirentes. 2.
NOME EMPRESARIAL
2.1. Conceito e natureza jurídica
O segundo elemento obrigatório para a prática da atividade empresária é o nome empresarial, que se caracterizará como sendo o elemento de identificação do empresário individual, da EIRELI ou da sociedade empresária. Para ser reconhecido no meio empresarial e poder exercer sua atividade de forma regular, o titular da empresa precisará se identificar e para isso precisará registrar o seu nome empresarial. É uma decorrência lógica da necessidade de os seres se individualizarem, marcando, na sociedade, sua identidade. Não se pode confundir o nome empresarial com o que se denomina de "nome fantasia". Às vezes, o nome empresarial que é criado pelo empresário ou pelos sócios da sociedade empresária não é comercialmente interessante e assim é criado um nome para servir de título do estabelecimento ou de nome do produto, mas este não é registrado. Desta feita, no momento de realização dos atos oficiais, deverá ser usado o nome empresarial e este é que terá proteção
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ELEMENTOS E OBRIGAÇÕES EMPRESARIAIS
jurídica, ao menos no âmbito do direito empresarial. Como será mais bem delimitado à frente, o "nome fantasia" poderá ser protegido pelas regras do direito da concorrência. Antes do Código Civil de 2002, havia uma discussão sobre a natureza jurídica do nome empresarial. porém, atualmente, é praticamente pacífico o entendimento de que ele é um direito da personalidade. Isto é o que se depreende do art. u64 do Código Civil e também do art. u62, que dizem que a sociedade em conta de participação não terá nome empresarial. Vale lembrar que essa é uma sociedade não personificada, ou seja, se não tem personalidade jurídica não tem nome empresarial, o que nos faz concluir que esse é uma decorrência da personalidade. No art. 1162 encontra-se a proibição para a alienação do nome empresarial, característica típica dos direitos da personalidade e inadequada à natureza de bem patrimonial, como alguns querem classificar o nome empresarial. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No concurso da Magistratura/RJ/2011, realizado pela VUNESP. o assunto abordado foi o fato de, apesar de as sociedades simples, associações e fundações não praticarem atividades empresárias, suas denominações equiparam-se ao nome empresarial. O enunciado pedia para marcar a alternativa correta que era: NEquipara-se ao nome empresarial, para efeitos de proteção legal, a denominação das sociedades simples, associações e fundações.n
2.2.
Espécies
No momento de se criar o nome empresarial, duas são as espécies que o art. 1155 do Código Civil oferece para que o empresário o forme, vejamos: Considera-se nome empresarial a firma ou a denominação adotada, de conformidade com este Capítulo, para o exercício de empresa.
Art. 1.155.
Tais espécies se diferenciarão no que diz respeito à estrutura de formação do nome empresarial. Importante ressaltar que alguns autores vislumbram três espécies de nome empresarial, pois separam firma de razão social. A primeira é utilizada para o empresário individual e a segunda para quando estiver no âmbito de sociedade empresária . Porém, 61
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a maioria do entendimento é de que a espécie é a firma, sendo que ela se subdivide em firma individual e firma social (ou também chamada de razão social). Se o nome empresarial for formado na espécie de firma, terá por base o nome civil do empresário (firma individual) ou o sobrenome dos sócios da sociedade empresária (razão social). A utilização dessa espécie faz com que se conheçam as pessoas que titularizam a empresa. Por exemplo, se o Sr. Paulo da Silva Ferreira se inscrever como empresário individual ele vai ter que formar o seu nome empresarial com base no nome civil, podendo apenas abreviá-lo. Poderá, por exemplo, colocar P.S. Ferreira, ou Paulo S. Ferreira, ou ainda o nome civil completo. Já no caso de dois sócios, Maria Andrade Nogueira e Cristiano Fagundes, por exemplo, poderão colocar a razão social de Nogueira e Fagundes Ltda. A firma rege-se pelo princípio da veracidade que está positivado no art. 32 da Lei 8934-94 (Lei de Registros Públicos de Empresas mercantis e Atividades Afins), pois os nomes que constam na firma são dos responsáveis pela empresa, sendo obrigatória a alteração do nome empresarial caso haja mudança na titularidade do registro do empresário ou no quadro de sócios, no caso de sociedade empresária. Cumpre lembrar que o termo razão social não é sinônimo de nome empresarial, somente uma espécie deste. Esta confusão é comum de ocorrer, pois coloquialmente isso se tornou um hábito e, em consequência, as pessoas acabam acreditando, por exemplo, que toda sociedade terá razão social, quando na verdade, toda sociedade tem um nome empresarial que poderá ser da espécie razão social. Na denominação, o nome empresarial será formado segundo a conveniência dos sócios, podendo utilizar-se de qualquer palavra ou expressão para sua criação. São exemplos de denominação: Restau rante Tia Lola Ltda., Calçados XYZ S.A, Cia. De Seguros Minas Gerais. Esta espécie rege-se pelo princípio da novidade, também previsto no art. 32 da Lei 8934-94, significando dizer que um nome empresarial a ser registrado em uma Junta Comercial não pode ser igual a outra já registrado. No momento de compor a denominação, os empresários serão obrigados a observar determinadas limitações, quais sejam:
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ELEMENTOS E OBRIGAÇÕES EMPRESARIAIS
Não pode termos que contrariem a moral e a ordem pública"
usar nome alheio e nem apelido.
usar marca registrada.
Como se pode obsen.iar, a utilização de marca registrada alheia é uma das limitações para a criação do nome empresarial. Uma situação peculiar é se a Junta Comercial não obsen.iar tal limitação e proceder ao registro do nome com tal infração. Caso se tenha uma discussão judicial e a decisão seja considerar que o nome era indevido, o titular não perde o registro da Junta Comercial, tendo que proceder tão somente a alteração do nome. Esse entendimento foi alvo de enunciado na 1Jornada de Direito Comercial do Conselho da Justiça Federal: • Enunciado n° 2: Decisão judicial que considera ser o nome empresarial violador do direito de marca não implica a anulação do respectivo registro no órgão próprio nem lhe retira os efeitos, presentado o direito de o empresário alterá-lo. De acordo com o art. 1158, § 2°, bem como o art. 1160, sempre que o nome estiver sob a espécie de denominação, esta terá que ter uma expressão que designe o objeto, ou seja, qual é atividade empresária desenvolvida pela sociedade. Espécies de nome empresarial
Firma ou razão social
Denominação
Forma-se pelo nome civil do empresário ou pelo sobrenome dos sócios
Forma-se pela livre escolha de um elementa de composição que só não pode estar nas proibições legais
Cada tipo empresarial terá que seguir uma modalidade de nome empresarial, de acordo com os ditames legais. Os principais são: • Empresário individual - firma - art. 1156; • EIRELI - firma ou denominação - art. 980-A, § 2°; • Sociedade Limitada - razão social ou denominação - art. 1158; • Sociedade Anônima - denominação - art. n6o e 3° da Lei 6404/76; • Sociedade Cooperativa - denominação - art. 1159.
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• Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova da Magistratura/MG/2007, organizada pela EJEF. o enunciado pedia para apontar a alternativa que não continha um nome empresarial e a resposta correta era a que tinha: MPaulo Rogério Guimarães - Microempresa.w Oerro da alternativa não se encontra na expressão MmicroempresaM, mas sim no fato de o enunciado da questão é expresso ao referir-se à sociedade empresária e não à empresário individual. 2.3. Proteção ao nome empresarial Uma questão bastante relevante diz respeito à proteção ao nome empresarial. o art. u66 do Código Civil diz que: "O nome de empresário deve distinguir-se de qualquer outro já inscrito no mesmo registro." Como o empresário individual, a EIRELI e a sociedade empresária são registradas nas Juntas Comerciais e essas são entidades de âmbito estadual, a proteção do nome ocorrerá sempre no nível estadual. Isso é um diferencial para a marca que terá proteção em todo o território nacional. Desta forma, se existir uma "Estude Bem Papelaria Ltda." registrada na junta Comercial do Estado de Minas Gerais, nada impede que outra pessoa abra uma papelaria com o mesmo nome no Estado do Rio de Janeiro. É importante notar que quando a lei fala em distinguir-se proíbe que existam nomes iguais e até mesmo parecidos, mas dentro do mesmo ramo de atividade. • Importante!
A proteção ao nome empresarial está limitada ao território estadual em que a empresa está registrada. Se tiver filiais em outros Estados, passa a ter proteção também na Junta Comercial do outro Estado. Como veremos, no caso da marca a proteção é no âmbito nacional. A Junta Comercial realiza a proteção do nome empresarial no âmbito administrativo e o art. 35, V da Lei 8934-94 disciplina que o órgão está proibido de realizar arquivamentos de: "os atos de empresas mercantis com nome idêntico ou semelhante a outro já existente." Observe que não é apenas nome idêntico, mas também semelhante que está proibido para se evitar qualquer confusão entre os empresários. Assim, se existe uma distribuidora registrada com o nome de "Distribuidora Solmar Ltda.# na Junta Comercial do Estado do Paraná, não 64
ELEMENTOS E OBRIGAÇÕES EMPRESARIAIS
poderá ser registrada "Distribuidora Salmar Ltda.H devido à semelhança entre os dois nomes. Além dessa atuação da Junta Comercial, o titular também poderá reivindicar o uso indevido do seu nome empresarial. Isso porque, algumas vezes acontece de um terceiro não tentar registrar nome empresarial do outro, mas acaba utilizando nome igual ou semelhante simplesmente como nome fantasia. O titular do nome poderá requerer que quem está fazendo a utilização indevida pare de fazê-lo e, se for o caso, até mesmo pleitear danos morais ou materiais. Por se tratar de um direito da personalidade, o nome empresarial não se extingue por prescrição, não pode ser alienado e nem mesmo objeto de penhora. A única forma de se perder a proteção ao nome empresarial é com o cancelamento do seu registro na Junta Comercial, que poderá ocorrer a pedido do próprio titular nos casos específicos ou no caso de cancelamento por inatividade do art. 6o da Lei 8937-94, quando o empresário ou a sociedade permanecem por mais de io anos sem realizar qualquer ato de registro e não comunicam a manutenção do seu funcionamento. Pode-se dizer que o cancelamento do registro decreta a "morte" do titular da empresa, acarretando o fim da personalidade e, com isso, extinguindo o nome empresarial. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
O STI não deixa dúvidas de que a proteção do nome empresarial ocorre apenas no âmbito estadual. como comprova o REsp i204488/RS, publicado em 11/03/2011: (. ..) i. Apesar de as formas de proteção ao uso das marcas e do nome de empresa serem diversas, a dupla finalidade que está por trás dessa tutela é a mesma: proteger a marca ou o nome da empresa contra usurpação e e'Jitar que o consumidor seja confundido quanto à procedência c1o produto.
( ...) 5. Atualmente a proteção ao nome comercial se circunscreve à unidade federativa de jurisdição da Junta Comercial em que registrados os atos constitutivos da empresa, podendo ser estendida a todo território nacio· nal se for feito pedido complementar de arquivamento nas demais Juntas Comerciais. Precedentes.
(. .. ) 8. Recurso especial provido, para restabelecer a sentença proferida pelo juízo do primeiro grau de jurisdição, que denegou a segurança.
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3. REGISTRO EMPRESARIAL A atividade empresária desempenha um papel importante dentro do contexto econômico do país e em virtude disso, quem a pratica passa a ter determinadas obrigações que sentem para que se possa obsentar sua regularidade. A primeira obrigação é a do registro empresarial que consiste na necessidade que o empresário, a EIRELI ou a sociedade empresária leve até o órgão responsável alguns atos, sendo que o primeiro deles é o registro de constituição da atividade. A organização do registro público das empresas é dividida entre dois órgãos (DNRC e Juntas Comerciais) e é regida pela Lei 8934/94. O DNRC - Departamento Nacional de Registro do Comércio - integra o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio e é responsável pelo gerenciamento nacional do registro de empresas e para isso estabelece procedimentos e julga os recursos administrativos. Já a Junta Comercial é um órgão existente nos Estados e Distrito Federal, sendo que está submetida ao DNRC e faz o registro, os arquivamentos, as autenticações das escriturações e emite certidões. Quem efetiva os registros, portanto, são as Juntas Comerciais. • Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No concurso organizado pelo CESPE para Procurador do Estado/PB/2oo8, o enunciado pedia para marcar a alternativa correta sobre o tema registro empresarial e a resposta era: .. De acordo com a legislação, deve haver uma junta comercial em cada unidade federativa, com sede na capital e jurisdição na área da circunscrição territorial respectiva." O primeiro ato de registro é a inscrição do empresário que, de acordo com o art. 967 do Código Civil, deve ocorrer antes do início da atividade. Importante ressaltar que tal registro não implica na caracterização do empresário cujo conceito é material. Isso quer dizer que se alguém pratica a atividade empresária sem o devido registro será considerado empresário, mas informal, irregular. Salvo a inscrição como empresário, os demais atos devem ser registrados 30 dias após sua assinatura. Isso é o que está previsto no art. 36 da Lei de 8934-94 cujo texto é o seguinte:
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ELEMENTOS E OBRIGAÇÕES EMPRESARIAIS
Art. 36. Os documentos referidos no inciso li do art. 32 deverão ser apresentados a arquivamento na junta, dentro de 30 (trinta) dias contados de sua assinatura, a cuja data retroagirão os efeitos do arquivamento; fora desse prazo, o arquivamento só terá eficácia a partir do despacho que o conceder.
Importante salientar os efeitos da observância desse prazo. De acordo com o dispositivo, o essencial é que o requerimento do registro seía feito dentro dos 30 dias, pois, nesse caso, mesmo que a efetivação ocorra fora desse prazo, os efeitos do ato retroagirão para a data da assinatura. Pensemos num exemplo prático: se um sócio vende suas quotas para outro e eles assinam a alteração contratual, caso requeiram o registro dessa alteração em até 30 dias da sua assinatura, os efeitos irão retroagir ao dia que foi assinado e a cessão íá irá ser observada. Porém, se o pedido não ocorrer dentro do prazo, somente após a Junta Comercial efetivar o registro é que ele produzirá efeitos, ou seía. o sócio continuará na sociedade até então, efetivando-se a cessão das quotas somente quando sair o registro. Os atos de registro se dividem em três espécies diferentes, de acordo com o art. 32 da Lei, que são: matrícula, arquivamento e autenticação. A matrícula é ato que se refere à inscrição de pessoas que não se enquadram no conceito de empresário, mas possuem registro na Junta. São os leiloeiros, tradutores públicos, intérpretes comerciais, trapicheiros (administradores de armazéns para importação ou exportação) e administradores de armazéns-gerais. Já o arquivamento refere-se aos atos empresariais propriamente ditos, que são os atos de constituição, alteração, dissolução e extinção de empresas individuais, sociedades empresárias ou cooperativas, bem como atos relativos a consórcio e grupos de sociedade, empresas estrangeiras, a declaração de microempresa e outros documentos que possam interessar ao empresário e às sociedades empresárias. Os atos arquivados ficarão na posse da Junta e serão públicos, podendo ser consultados por qualquer interessado. Assunto importante é trazido pelo art. 35 da Lei que trata das proibições de arquivamento, veíamos:
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Art. 35. Não podem ser arquivados: 1 - os documentos que não obedecerem às prescrições legais ou regulamentares ou que contiverem matéria contrária aos bons costumes ou à ordem pública, bem como os que colidirem com o respeàivo estatuto ou contrato não modificado anteriormente; li - os documentos de constituição ou alteração de empresas mercantis de qualquer espécie ou modalidade em que figure como titular ou administrador pessoa que esteja condenada pela prática de crime cuja pena vede o acesso à atividade mercantil;
Ili - os atos constitutivos de empresas mercantis que, além das cláusulas exigidas em lei, não designarem o respectivo capital, bem como a declaração precisa de seu objeto, cuja indicação no nome empresarial é facultativa; IV - a prorrogação do contrato social, depois de findo o prazo nele fixado; V - os atos de empresas mercantis com nome idêntico ou semelhante a outro já existente; VI - a alteração contratual, por deliberação majoritária do capital social, quando houver cláusula restritiva; VII - os contratos sociais ou suas alterações em que haja incorporação de imóveis à sociedade, por instrumento particular, quando do instrumento não constar: a) a descrição e identificação do imóvel, sua área, dados relativos à sua titulação, bem como o número da matrícula no registro imobiliário; b) a outorga uxória ou marital, quando necessária; VIII - os contratos ou estatutos de sociedades mercantis, ainda não aprovados pelo Governo, nos casos em que for necessária essa aprovação, bem como as posteriores alterações, antes de igualmente aprovadas. Parágrafo único. A junta não dará andamento a qualquer documento de alteração de firmas individuais ou sociedades, sem que dos respectivos requerimentos e instrumentos conste o Número de Identificação de Registro de Empresas (Nire).
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Na autenticação de documentos a Junta irá conferir os atos de escrituração empresarial e realizar cópias dos documentos e usos e costumes assentados em seus registros. Nesse caso o documento autenticado não fica guardado na Junta, que apenas irá fazer uma anotação de que o ato foi levado a arquivamento, mas não terá publicidade. • Matrícula Atos do . . • Arquivamento RegiStro { • Autenticação
• Como esse assunto foi cobrado em concurso? Na prova para Advogado do Instituto de Pesquisas Tecnológicas/2011 realizado pela VUNESP, a questão pedia para marcar qual a alternativa que trazia os atos que o registro compreende e a correta era a que dizia: Na matrícula e seu cancelamento, o arquivamento e a autenticação dos instrumentos de escrituração das empresas mercantis."
~
Importante!
o ato de autenticação é o único que não tem o condão de dar publicidade ao ato que é levado à registro. Nesse caso a Junta Comercial irá apenas conferir a formalidade do documento levado para autenticação, mas não se terá cópia arquivada. Já nos demais atos, tem-se total publicidade, podendo qualquer pessoa requerer cópia, desde que pague a taxa do serviço. De acordo com o art. 40 da Lei de Registros, a Junta Comercial somente irá analisar a forma dos documentos que são levados a registro, não cabendo ao órgão questionar nenhuma questão material no ato. Havendo algum vício de forma, e este sendo sanável, a Junta irá pedir que o requerente apresente as correções para depois preceder ao registro .
• Como esse assunto foi cobrado em concurso? No concurso da Magistratura/Pl/2012 pela banca CESPE, pediu-se para assinalar a alternativa correta a respeito do registro empresarial que era a que dizia: "É vedado o arquivamento dos documentos de constituição ou alteração de sociedades empresárias de qualquer espécie ou modalidade em que figure como titular ou administrador pessoa condenada por crime para o qual esteja prevista pena que vede o acesso à atividade empresarial. " Tal resposta encontra-se no art. 35, li da Lei 8934/94.
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Questão de extrema relevância, no caso do registro, é que o empresário ou sociedade empresária são obrigados a fazerem registros periódicos. Se ficar por mais de 10 anos sem fazer registros e não comunicar a Junta que está em atividade terá o registro cancelado. Art. 6o da Lei 8934/94. Art. 60. A firma individual ou a sociedade que não proceder a qualquer arquivamento no período de dez anos consecutivos deverá comunicar à junta comercial que deseja manter-se em funcionamento. § 1° Na ausência dessa comunicação, a empresa mercantil será considerada inativa, promovendo a junta comercial o cancelamento do registro, com a perda automática da proteção ao nome empresarial. § 2° A empresa mercantil deverá ser notificada previamente pela junta comercial, mediante comunicação direta ou por edital, para os fins deste artigo. § 3° A junta comercial fará comunicação do cancelamento às autoridades arrecadadoras, no prazo de até dez dias. § 4º A reativação da empresa obedecerá aos mesmos procedimentos requeridos para sua constituição.
Trata-se de uma medida gravosa, mas importante para que a Junta Comercial possa ter o controle de quem efetivamente está a praticar a atividade empresária e quem, apesar da existência do registro, já não está mais em atividade. Tal formalidade evita que os órgãos fiquem abarrotados por registros sem utilização. Quando o empresário não faz os registros obrigatórios, ficará sujeito a diversas sanções, dentre as quais, as principais são: • !limitação da responsabilidade do sócio • Não pode pedir falência de outro e não pode pedir recuperação judicial • Sanções de natureza fiscal e administrativa (multas)
4. ESCRITURAÇÃO EMPRESARIAL A segunda obrigação que o praticante de atividade empresária deve observar é a de fazer sua contabilidade e manter seus livros
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ELEMENTOS E OBRIGAÇÕES EMPRESARIAIS
organizados. Tal obrigação também existe pela importância que a atividade tem no meio social. São três as funções da escrituração contábil. A primeira seria a de caráter gerencial, pois é através da regularidade contábil que o empresário poderá ter controle do negócio, dos lucros, etc. Essa função seria mais interna, mas mesmo assim importante, pois se estaria evitando a existência de atividades empresárias mal administradas que colocam em risco a estabilidade econômica. A segunda função é a documental, já que pela escrituração é possível fazer a demonstração dos resultados da empresa, tanto para o próprio empresário, como para investidores e credores. Por fim, afirma-se que a escrituração possui função fiscal, uma vez que é através da análise dos livros que se faz o controle de incidência e pagamento de tributos. • Gerencial Escrituração contábil _ - Funçoes {
• 0ocumenta 1 •Fiscal
O Código Civil estabelece a regra geral da obrigação de escrituração no seu art. 1179, vejamos: Art. 1.179. o empresário e a sociedade empresária são obrigados a seguir um sistema de contabilidade, mecanizado ou não, com base na escrituração uniforme de seus livros, em correspondência com a documentação respectiva, e a levantar anualmente o balanço patrimonial e o de resultado econômico.
Desse dispositivo retira-se que a obrigação de escrituração se subdivide em duas. A de realizar o preenchimento dos livros contábeis, de acordo com os documentos comprobatórios do movimento financeiro da empresa e a de realizar, ao menos uma vez por ano, um balanço que resuma a situação patrimonial e o resultado econômico da empresa. No que diz respeito aos livros, a escrituração é composta de livros facultativos e obrigatórios, sendo que o único que é obrigatório para todos os tipos de atividade empresária é o Livro Diário, previsto no art. 1180 do Código Civil.
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Livros contábeis Obrigatórios Para todos os empresários
Diário
Facultativos
Para alguns empresários
Registro de Duplicatas
Registro de ações nominativas
Caixa
Estoque
Patrimonial
Como o próprio nome já diz, o Livro Diário livro irá representar todo o movimento financeiro da empresa, diariamente. Ele tem que ser feito de maneira regular, sendo lançados os dias seguidos, sem ter rasuras, borrões e etc (art. 1183) e deverá ser levado para autenticação na Junta Comercial e depois ficar guardado com o empresário. Essa autenticação significa dizer que a Junta Comercial irá conferir a formalidade dos livros, ou seja, se ele segue os ditames do art. 1183 do Código Civil, mas jamais a Junta Comercial irá conferir a parte material, como, por exemplo, as contas que estão nos livros. Os livros receberão o carimbo da junta que irá anotar em seus arquivos apenas quantos livros foram levados a autenticação e a qual período eles se referiam, para evitar que se refaça o livro alterando os dados. É apenas após esta autenticação da Junta Comercial que os livros contábeis terão força probatória, pois se sabe que depois de autenticados não podem mais ser alterados e consequentemente suas informações são verdadeiras. No que diz respeito a este efeito probatório dos livros, os artigos 378 e 379 do Código de Processo Civil esclarece que eles podem fazer prov'1 a favor ou contra o empresário, mas suas informações possuem presuncão relativa de veracidade, pois o primeiro dispositivo citado oermite que o empresário comprove que as informações lançadas não correspondem à realidade. ~
Como esse assunto
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No certame organizado pela FCC para Analista do TCE/PR/2011, o enunciado pedia para marcar a alternativa correta a respeito dos livros e fichas dos empresários e sociedades e a resposta correta era: "provam contra as pessoas a que pertencem, e, em seu favor, quando, escriturados sem vício extrínseco ou intrínseco, forem confirmados por outros subsídios."
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ELEMENTOS E OBRIGAÇÕES EMPRESARIAIS
Mas nem sempre os livros contábeis poderão ser usados como prova, pois o código Civil seguiu o princípio do sigilo. Sendo assim, somente em casos especiais é que a sua exibição poderá ser requerida e autorizada por autoridade judicial. É o que dispõe os artigos 1190 e 1191 do Código Civil, vejamos: Art. 1.lCJO. Ressalvados os casos previstos em lei. nenhuma autoridade. juiz ou tribunal, sob qualquer pretexto, poderá fazer ou ordenar diligência para verificar se o empresário ou a sociedade empresária observam, ou não, em seus livros e fichas, as formalidades prescritas em lei. Art. u91. O juiz só poderá autorizar a exibição integral dos livros e papéis de escrituração quando necessária para resolver questões relativas a sucessão, comunhão ou sociedade, administração ou gestão à conta de outrem, ou em caso de falência.
Como se observa nos dispositivos, somente com autorização judicial é que o empresário será compelido a exibir seus livros e não será em todo e qualquer demanda. Somente nos casos específicos da parte final do art. 1191 é que o juiz ordenará a exibição dos livros. Claro que por se tratar de um direito disponível, o empresário poderá apresentar os livros espontaneamente nos casos que entender necessário. > Qual o entendimento do S 1 r- soiJre o assunto? O STF possui duas súmulas que tratam do princípio do sigilo dos livros contábeis: Súmula n° 160 - O exame de livros comerciais, em ação judicial, fica limitado as transações entre os litigantes. Súmula n° 390 - A exibição judicial de livros comerciais pode ser requerida como medida preventiva.
• Como esse assunto foi cobrado em concurso? Justamente buscando que o candidato tivesse conhecimento da súmula 390 do STF que a prova para Procurador Federal/2010 (CESPE) considerou como incorreta a afirmativa que dizia: "Os empregados da pessoa jurídica X Ltda., insatisfeitos com os valores que lhes eram pagos a título de participação nos lucros da sociedade, ajuizaram ação cautelar pleiteando a exibição integral dos livros e papéis da escrituração empresarial. Nessa situação, o magistrado que analisar a questão deverá julgar improcedente o pedido, tendo em vista a ausência de respaldo legal para tanto."
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Porém, em virtude da função fiscal que a escrituração contábil possui, o art. 1193 excetua o princípio do sigilo dos livros dizendo que: "As restrições estabelecidas neste Capítulo ao exame da escrituração, em parte ou por inteiro, não se aplicam às autoridades fazendárias, (. .. )." Os fiscais de fazendas, no ato de fiscalização de pagamento dos tributos, poderão exigir a apresentação dos livros, mas seguindo o procedimento administrativo que regulamenta o ato fiscalizatório. Nesse caso o empresário é obrigado a apresentar sua escrituração, pois a simples falta desta implicará em pagamento de multa. O que justifica essa exceção é o interesse público na fiscalização do pagamento dos tributos, pois a sonegação fiscal prejudica toda a coletividade. A situação de maior polêmica que envolve a escrituração contábil é a previsão do § 2° do art. 1179, cujo texto diz que: "É dispensado das exigências deste artigo o pequeno empresário a que se refere o art. 970." Inicialmente é preciso entender quem é esse pequeno empresário a que a lei se refere, pois o estatuto da microempresa (Lei Complementar n° u3/o6) separou tal figura em duas principais: o microempresário (ME) e o empresário de pequeno porte (EPP) e ainda uma terceira com criação mais recente. (Micro Empreendedor Individual). Apesar de o entendimento doutrinário majoritário ser no sentido de que a expressão "pequeno empresário" do dispositivo citado se referir às três figuras, o art. 68 da lei acima referida assim prevê: Art. 68. Considera-se pequeno empresário, para efeito de aplicação do disposto nos arts. 970 e 1.179 da Lei n° l0.4o6, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), o empresário individual caracterizado como microempresa na forma desta Lei Complementar que aufira receita bruta anual até o limite previsto no § lº do art. 18-A.
O art. 18-A, que teve sua redação alterada pela Lei Complementar 139/2011 assim preconiza: Art. 18-A. O Microempreendedor Individual - MEi poderá optar pelo recolhimento dos impostos e contribuições abrangidos pelo Simples Nacional em valores fixos mensais, independentemente da receita bruta por ele auferida no mês, na forma prevista neste artigo. (produção de efeitos: 1° de julho de 2009)
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§ i• Para os efeitos desta Lei Complementar, considera-se MEi o empresário individual a que se refere o art. 966 da Lei n• io.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), que tenha auferido receita bruta, no ano-calendário anterior, de até RS 60.000,00 (sessenta mil reais), optante pelo Simples Nacional e que não esteja impedido de optar pela sistemática prevista neste artigo.
Sendo assim, a lei só irá dispensar da escrituração o empresário individual que se enquadre como micro empreendedor individual, ou seja, que aufira uma renda anual bruta de no máximo R$ 60.000,00. Mesmo que seja microempresa, as sociedades empresárias deverão realizar a escrituração obrigatória. Porém, mesmo com o dispositivo acima, há quem sustente, com base no § 2•, do art. 26, da mesma Lei Complementar que as micro e pequenas empresas enquadradas no regime simplificado e favorecido devem manter apenas livro caixa em que será escriturada a movimentação financeira e bancária, sendo desnecessário o levantamento dos relatórios contábeis supracitados. Há que se ressaltar que a contabilidade é a base de sustentação para uma possível recuperação judicial da empresa, bem como serve para comprovar o cumprimento das obrigações trabalhistas em eventual lide, já que o ônus da prova é da empresa, que deverá se valer da perícia contábil para comprovar os registros no livro Diário. Mas ao mesmo tempo é uma questão Constitucional o tratamento favorecido a todas as MEs e EPPs, não se justificando o benefício ser dado apenas ao empresário individual que se enquadre como microempresário. Porém, até pelo interesse na fiscalização no pagamento de tributos, esse entendimento é o que vem sendo exigido pelos fiscais. 5. PROPRIEDADE INDUSlRIAL
5.1. Introdução É o ramo do direito que protege a atividade criativa humana. Não é o bem final que é protegido, mas sim a ideia. Designa um composto de direitos que visam os mesmos fins: assegurar a uma pessoa física ou jurídica o pleno exercício dos seus meios industriais e comerciais e garanti-lo contra as intromissões de terceiros através de usurpação e comportamentos ilícitos.
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A propriedade industrial decorre de outro ramo jurídico que é conhecido como direito intelectual. Tal ramo busca proteger, como um todo, a obra intelectual humana, ou seja, as ideias que tenham algum tipo de relevância para o direito de propriedade. Dois são os caminhos que a propriedade intelectual pode tomar: o primeiro que é ligado às ideias de aplicação puramente na indústria e comércio que é a propriedade industrial e o segundo que está ligado mais a obras de caráter artístico que é a propriedade autoral. Apesar de serem dois ramos que buscam tutelar a propriedade imaterial, possuem diferenças relevantes. Direito Industrial
Direito Autoral
Seu registro é constitutivo, ou seja, somente se existir a carta de patente ou o certificado de registro é que a pessoa será efetivamente considerada dona da propriedade industrial e poderá requerer seu uso exclusivo.
Seu registro é meramente declaratório, sendo que terá direito de uso exclusivo aquele que provar que é o verdadeiro autor da obra, sendo que o registro serve apenas para comprovar mais facilmente tal criação.
A proteção é de toda a obra, não podendo ser reproduzida nem mesmo em parte. Não permite que alguém se inspire da criação do outro para fazer a sua.
A proteção é apenas da forma exterior, ou seja, somente da obra final. Permite que uma pessoa se inspire na obra alheia, o que não pode haver é a reprodução idêntica da obra final sem autorização.
Neste estudo iremos tratar somente da propriedade industrial, pois o estudo do direito autoral fica a cargo do direito civil.
5.2. Bens tutelados Atualmente o direito industrial brasileiro é regulado pela Lei n° 9279/94 (Lei da Propriedade Industrial - LPI) que traz quatro bens jurídicos tutelados pela propriedade industrial: O primeiro é a invenção, que é o ato através do qual alguém cria um determinado objeto, fórmula ou qualquer outro produto que até então era desconhecido. A lei não a define, mas diz no art. 10 que não é considerado juridicamente uma invenção. Recebe concessão de patente.
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O segundo bem é o modelo de utilidade e esse sim possui uma definição legal no art. 9 da LPI que diz que este é um aperfeiçoamento técnico da invenção. Há um acréscimo na utilidade do bem, pois deve representar um avanço tecnológico, que os técnicos da área reputem como engenhoso. Também será protegido pela concessão de patente. ~
Como esse assunto foi cobnrlo em concurso?
No cename organizado pelo CESPE da Magistratura Federal 2• Região/2013 o enunciado pedia para marcar o item que é patenteável a resposta era: "um objeto de uso prático suscetível de aplicação industrial, que apresente nova forma, envolvendo ato inventivo que resulte em melhoria funcional em sua fabricação." As outras alternativas traziam itens que estão previsto no an. lo como não sendo invenção e nem modelo de utilidade. Em terceiro, aparece o desenho industrial, também chamado de design, cuja definição está no art. 95. É a alteração na forma e nas cores dos objetos, mas com mera finalidade estética, sem que represente nenhum melhoramento. Distingue-se da obra de arte já que vai ter aplicação na indústria. Este bem será protegido pelo registro. Por fim tem-se a marca que é definida no art. i22 como sendo "o sinal distintivo que identifica produtos ou serviços." É a propriedade industrial de maior utilidade nas atividades empresárias modernas. Também irá receber o registro. Bens da Propriedade Industrial
Invenção
Patenteável
Modelo de utilidade
Patenteável
Desenho Industrial
Registrável
Marca
Registrável
Como se vê, são duas as formas de proteção dos bens protegidos pelo direito industrial, ou através da patente ou através do registro. Cada uma dessas duas formas irá possuir seus requisitos e sua forma de concessão.
5.3. Condições de Patente Para se conceder uma patente é preciso que a invenção ou o modelo de utilidade atendam essas 4 condições:
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• Novidade: a invenção tem que ser desconhecida dos cientistas ou pesquisadores especializados (art. 11 da LPI) • Atividade inventiva: não decorre de modo óbvio (arts 13 e 14 da LPI) • lndustriabilidade: possibilidade de utilização ou produção do invento por qualquer tipo de indústria (art. 15 da LPI) • Desimpedimento: por razões de ordem pública, a invenção não pode ser patenteada. São 3 impedimentos atuais: invenções contrárias à moral, produtos resultantes da transformação do núcleo atômico e seres vivos (art. 18 da LPI) Como se vê, o produto pode até se enquadrar no conceito de invenção ou modelo de utilidade, mas pode não ser patenteável, ou seja, não ser reconhecido como um bem que merece a proteção legal. Uma vez que o que se quer proteger no direito industrial é a criatividade humana, o primeiro requisito é o da novidade. Somente se pode patentear aquilo que é efetivamente inédito, não só no Brasil, como em todo o mundo. Às vezes uma pessoa até acredita que está criando algo novo, pois o invento não era conhecido do grande público, mas se já for por alguém conhecido, mesmo que esse conhecimento não tenha sido difundido, não haverá novidade. Uma discussão que ainda permeia os tribunais brasileiros é a questão da patente pipeline. As patentes pipeline estão previstas nos artigos 230 e 231 da Lei 9.279/96, os quais possibilitaram depósitos de patentes em campos tecnológicos para os quais o Brasil não concedia patentes até então. Para as patentes pipeline (ou patentes de revalidação) foi criado mecanismo de processamento diferente das demais patentes solicitadas no Brasil. O depósito de pedido de patente pelo mecanismo pipeline foi aceito pelo período de um ano, entre maio de 1996 e maio de 1997. e "revalidariam" nacionalmente patentes de medicamentos, alimentos e produtos e processos químico-farmacêuticos concedidos em outros países. Estes pedidos passaram apenas por uma análise formal e seguiram os termos da patente concedida no exterior, não sendo submetidos a uma análise técnica dos requisitos de patenteabilidade pelo escritório de patentes brasileiro, o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). 78
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Como essas invenções já haviam sido depositadas em outros países, as informações contidas nas patentes já estavam publicadas em revistas de propriedade industrial e outros meios. Portanto, quando tais pedidos foram depositados no Brasil, já não cumpriam o requisito de novidade, pois as informações já estavam em domínio público. • Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
No REsp 1.145.637, publicado em 15/12/2009 podemos perceber que o STJ vê exatamente a questão do requisito da novidade nas patentes pipeline: "Para a concessão da patente pipeline, o princípio da novidade é mitigado, bem como não são examinados os requisitos usuais de patenteabilidade. Destarte, é um sistema de exceção, não previsto em tratados internacionais, que deve ser interpretado restritivamente, seja por contrapor ao sistema comum de patentes, seja por restringir a concorrência e a livre iniciativa. Quando se tratar da vigência da patente pipeline, o termo inicial de contagem do prazo remanescente à correspondente estrangeira, a incidir a partir da data do pedido de revalidação no Brasil, é o dia em que foi realizado o depósito no sistema de concessão original, ou seja, o primeiro depósito no exterior, ainda que abandonado, visto que a partir de tal fato já surgiu proteção ao invento (v.g.: prioridade unionista). (. .. ) Incidência do princípio da independência das patentes, que se aplica, de modo absoluto, tanto do ponto de vista das causas de nulidade e de caducidade patentárias como do ponto de vista da duração normal."
O tema das patentes pipeline chegou também ao STF, já que foi proposta ação direita de inconstitucionalidade contra os dispositivos da Lei 9279/96. Tal ADI é a de n° 4.345 e ainda está pendente de julgamento no tribunal superior. O segundo requisito para que a invenção ou modelo de utilidade sejam patenteáveis é a atividade inventiva. O que deve ser protegido é o trabalho de criação e não uma simples sorte em uma descoberta qualquer. O que se quer com a propriedade industrial é fomentar a pesquisa e os estudos tecnológicos.
o terceiro requisito é a industriabilidade que tem relação com a origem da propriedade industrial. Só se protege aquilo que efetivamente será utilizado na indústria e no comércio. Esse requisito é composto pela aceitação comercial e pela viabilidade econômica. Para que um produto seja industrializável ele deve agradar ao público consumidor e ser acessível, ou seja, ter preço que possa atrair os consumidores. 79
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Por fim, por questões de segurança, de proteção, a lei irá criar determinados impedimentos para que se peça a patente de produto. Atendendo aos requisitos, será possível requerer a patente da invenção ou do modelo de utilidade. 5.4. Condições de Registro Quanto às condições de registro, teremos que separar o regis· tro do desenho industrial do registro da marca. 5.4.1. Registro do Desenho Industrial O registro de desenho industrial possui 3 condições: a) Novidade: mesma novidade e~gida para as patentes. b) Originalidade: configuração visual distinta em relação aos objetos anteriores (art. 97 da LPI) e) Desimpedimento: não pode ser registrado desenho que: tem natureza puramente artística (obra de arte-direito autoral), ofende a moral e os bons costumes e apresenta forma comum (arts. 98 a ioo da LPI). Também no desenho industrial o que se quer proteger é a criatividade, devendo o desenho ser totalmente novo e diferente de algo que já foi criado. Além de ser novo, precisa ser original, ou seja, não ser semelhante a algum outro desenho que já foi criado. Não pode ter semelhanças, ser parecido com outro desenho. Também são revestidos de originalidade os objetos ou padrões que possuam aspectos próprios, exprimam nova tendência de linguagem formal ou que apresentem características peculiares e singulares. Também não poderá o desenho deixar de observar os impedimentos legais que visam proteger as liberdades religiosas e o próprio conceito do desenho, não permitindo registro de algo que não seja efetivamente criativo. Aqui, portanto, são três requisitos que se devidamente atendidos permitirão o registro do desenho industrial.
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5.4.2. Registro de Marca
o registro da marca também irá demandar 3 requisitos para a concessão: a) Novidade relativa : necessário para que a marca cumpra sua função de identificar o serviço ou produto. b) Não-colidência com marca notória: art. 126 da LPI - INPI pode indeferir de ofício pedido de registro que coincida com outra marca notória. Proibição de contratação de marcas (pirataria). c) Desimpedimento: art. 124 da LPI. No que diz respeito ao requisito da novidade, na marca será diferente das outras duas situações analisadas até aqui. Inicialmente porque se diz que aqui a novidade é relativa ao ramo de atividade. Uma marca não será igual ou semelhante à outra no mesmo ramo de atividade, o que significa dizer que a proteção da marca é limitada ao setor específico em que ela é utilizada. Assim, se existe uma marca de café chamada "Frapel", não haverá nenhum problema se alguém quiser registrar uma marca de sapatos "Frapel". ~
Quai o emend1mento do STJ sobre o assunt•.
Não deixa dúvidas de que a novidade segue o ramo de atividade como no exemplo do REsp i.u4.745, de 02/09/2012: "Na espécie, afirmou-se que, embora ambas as marcas pertençam à mesma classe de produtos, o ramo comercial em que atuam é distinto: enquanto a recorrente comercializa roupas. acessórios e calçados na linha esporte fino, a recorrida fornece roupas. acessórios e calçados de uso esportivo. Por tais razões, concluiu-se pela inexistência de colidéncia entre as marcas. Em voto-vista, a Min. Nancy Andrighi reforça importante distinção trazida pelo mencionado código entre os conceitos de marca de alto renome (art. 115) e marca notoriamente conhecida (art. 126). O primeiro é exceção ao princípio da especificidade e possui proteção absoluta em todas as classes, conquanto seja registrada no país, já que seu reconhecimento ultrapassa o ramo de atividade em que atua. O segundo, por sua vez, é exceção ao princípio da territorialidade e possui proteção restrita à classe em que adquiriu noto· riedade, independentemente de prévio depósito ou registro no país."
Porém, não se pode esquecer das marcas de alto renome previstas no art. 125 da LPI. Existem determinadas marcas que são conhecidas no âmbito nacional, têm um alcance que é muito grande e, por isso, terão uma proteção especial, em todos os ramos de atividade. 81
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Esse reconhecimento como marca de alto renome não é automático. O proprietário deverá requerê-lo junto ao INPI que fará todo um procedimento para constatar se de fato a marca é de alto renome. São exemplos de marcas reconhecidas como alto renome : Natura, Banco do Brasil, Coca-Cola, dentre outras.
• Qual o entendimento do STJ sobre o assunto? No Informativo 517/2013 a Terceira Turma do STJ publicou o seguinte julgado: DIREITO EMPRESARIAL. IMPOSSIBILIDADE DE O PODER JUDICIÁRIO RECONHECER, AN1tS DA MANIFESTAÇÃO DO INPI, A CARAC1ERIZAÇÃO DE UMA MARCA COMO DE ALTO RENOME-
Caso inexista uma dedaração administrativa do INPI a respeito da ca racterização, ou não, de uma marca como sendo de alto renome, não pode o Poder Judiciário conferir, pela via judicial, a correspondente proteção especial. A lacuna existente na Resolução n. 221/2005 - que prevê a declaração do alto renome de uma marca apenas pela via incidental - configura omissão do INPI na regulamentação do art. 225 da LPI, situação que justifica a intervenção do Poder Judiciário. Entretanto, até que haja a manifestação do INPI pela via direta, a única ilegalidade praticada será a inércia da Administração Pública. Assim, é incabível, ao menos nesse momento, a ingerência do Poder Judiciário no mérito do ato omissivo, competindo-lhe, caso provocado, a adoção de med idas tendentes a ocasionar a manifestação do INPI. Desse modo, na ausência de uma declaração administrativa da referida autarquia, a decisão judi· cial que reconhece o alto renome de uma marca caracteriza usurpação de atividade que legalmente compete àquele órgão, consistindo em violação da tripartição dos poderes do Estado, assegurada pelo art. 2° da CF/1988. REsp 1.162.281-RJ, Rei. Min. Nancy Andrighi, julgado em 29/2/2013.
O segundo requisito para que a marca seja registrável é que ela não pode coincidir com marca notória. Estas são aquelas mundialmente conhecidas que serão protegidas, mesmo sem que se tenha nenhum registro no INPI.
• Importante!
e as marcas notórias têm proteção especial. No primeiro caso terá proteção em todos os ramos de atividade e no segundo terá proteção independente de registro no Brasil
As marcas de alto renome
Por fim, para se registrar uma marca, ela não pode estar nos impedimentos legais, que para as marcas são vários. Pode-se destacar a proibição de se utilizar nome alheio, pseudônimo ou apelido conhecido de outra pessoa, sinais geográficos.
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• Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
No REsp uo5.422, de 10/05/2011 o STJ apontou um impedimento para o registro de uma marca, vejamos: "A questão está em definir se o registro anterior da marca com a uti· lização de um termo que remete ao princípio ativo do medicamento, qual seja ·sor (cloreto de sódio, popularmente conhecido como soro), garante o direito de uso exclusivo dessa expressão em favor do laboratório recorrente, o que Im pediria a utilização do mesmo radical "Sor na marca da recorrida . Na hipótese. consoante os autos, a recorrente registrou no INPI a marca nominativa sim ples ·sorine•, composta de radical designativo do componente principal do medicamento ("Sor"), qual seja, cloreto de sódio, acrescido do sufixo " ine·. A recorrente tem exclusividade na utilização da marca "Sorine", mas não a tem na utilização do radical considerado comum. o art. i24, VI. da Lei 9.279/96, também chamada Lei da Propriedade Industrial (LPI), não autoriza como marca sinal de caráter genérico, necessário, comum, vulgar ou simplesmente descritivo, quando tiver relação com o produto ou serviço a distinguir, ou aquele empregado comumente para designar uma característica do produto ou serviço, quanto à natureza, nacionalidade, peso, valor, qualidade e época de produção ou de prestação do serviço, salvo quando revestidos de suficiente forma distintiva.(. .. )
Atendendo às três condições aqui especificadas, a marca poderá ser registrada.
5.5. Procedimento Administrativo Para se obter a concessão da patente ou do registro é preciso passar por um procedimento administrativo realizado no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). O procedimento do pedido de patente será o mesmo, tan to para patentear invenção quanto modelo de utilidade e contará com 4 fases:
Depósito: art. 19 da LPI traz os requisitos para o depósito. Ele será importante para a anterioridade.
Publicação: dá aos interessados notícia da existência do pedido de patente.
INPI investiga
as condições de patenteabilidade.
Decisão: se for julgado procedente o pedido, é concedida a carta-patente. Se for desfavorável - art. 36 da LPI.
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O procedimento administrativo é inaugurado por iniciativa do interessado através do depósito do pedido que deverá conter os documentos especificados no art. i9. Este pedido é que vai delimitar quem terá prioridade em um caso que duas pessoas estejam disputando a propriedade de algo que criaram igual. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No concurso da banca CESPE para Magistratura/Pl/2012, a questão pedia que fosse assinalada a alternativa correta sobre a propriedade industrial e a resposta correta era: Ncaso duas pessoas realizem o mesmo modelo de utilidade de forma independente, o direito de obter a patente será assegurado àquela que provar o depósito do pedido mais antigo, indepen· dentemente da data da criação."
Desde o momento do depósito o requerente já passa a ter direito ao uso exclusivo do produto cuja patente se requer, mas isso não significa que já tem a propriedade definida. Feito o depósito do pedido o INPI irá analisar se o pedido atende a condições mínimas de formalidade dará prosseguimento ao procedimento. Após isso ocorrerá o período de sigilo. Antes de ser publicado o pedido de patente para que possíveis interessados possam impugnar o pedido, o requerimento será mantido em sigilo por um prazo máximo de 18o dias. Tal prazo serve para que o interessado possa provar a industriabilidade do produto e poderá ser reduzido a pedido do próprio interessado. Após o período se sigilo, portanto, haverá a publicação e depois de 6o dias da publicação o INPI passará à análise das condições de patente da invenção ou do modelo de utilidade. Nesta etapa serão observadas se o produto atende as 4 condições de patenteabilidade. Se o INPI entender que atende as condições irá conceder a patente, se entender que não preencheu as condições irá denegar o pedido. ~
Como esse assunto fo
.rado Hn concurso?
A prova da banca CESPE para Juiz Federa l/TRFs/2011 pedia para marcar a alternativa correta sobre o registro das invenções que era: #Durante o processo administrativo de registro da patente no INPI, qualquer pessoa que demonstrar interesse poderá apresentar documentos no período entre a publicação do pedido e o final do exame.w
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A alternativa b desta questão chegou a gerar polêmica. Ela afirmava que: ~os litígios judiciais sobre a validade ou a defesa de direitos protegidos por patentes têm como foro necessário a justiça federal, em razão da natureza jurídica do INPI." A afirmativa está errada, pois os litígios sobre a defesa dos direitos nem sempre serão na Justiça Federal, somente os que falam da validade que tenha como réu o INPI. FLUXOGRAMA DO PROCESSO DE PATENTE
PEDIDO
Análise Preliminar
Deferimento do processamento
Não deferimento Encerramento do procedimento
Período de sigilo - máximo de i8o meses Publicação
1
l
L
Apresentadas oposições
Não apresentadas oposições
Manifestação do requerente
[_
Análise das condições
Deferimento do pedido 1
Expedição de carta de patente
Indeferimento do pedido 1
Não concedida a patente
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Já no que diz respeito ao procedimento do registro, ele será diferente quando se quer registrar desenho industrial ou marca.
o pedido de registro de desenho industrial segue o sistema da livre concessão, ou seja, basta o pedido de depósito, a publicação e a expedição do certificado. Só ocorrerá análise da novidade e da originalidade se outro registro for feito com o mesmo desenho (art. 11 da LPI) O pedido de registro de marca será quase igual ao registro do desenho, mas aqui o INPI irá analisar a novidade e originalidade na fase após a publicação. Há a diferença de prazo, tendo em vista que no caso da marca não há período de sigilo, ou seja, logo após o depósito do pedido já haverá a publicação e a possível apresentação de oposições. Pode-se, dessa forma, observar para o procedimento do registro de marca, o mesmo fluxograma do pedido de patente, sendo que a única diferença é que entre o pedido e a publicação haverá um prazo máximo de 60 dias, não havendo para a marca o período de sigilo. 5.6. Proteção
à propriedade industrial
Quem consegue a patente ou o registro no INPI tem o direito exclusivo sobre o uso da invenção, do modelo de utilidade, do desenho ou da marca. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No certame para Advogado do Instituto de Pesquisas Tecnológicas/2011 organizado pela VUNESP, a questão pedia para apontar qual a afirmativa correta a cerca das patentes e a ser assinalada era a que dizia: "É assegurado ao titular da patente o direito de obter indenização pela exploração indevida de seu objeto, desde a data de publicação do pedido." ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
A súmula i43 trata de uma questão importante que é o prazo para reivindicar os prejuízos decorrentes de uso indevido de marca. Diz o texto da súmula: "Prescreve em cinco anos a ação de perdas e danos pelo uso de marca comercial." Assim, a pessoa que se utiliza de direito industrial alheio sujeita-se as sanções de natureza civil ou penal - art. 183 a 190 da LPI. Existe apenas uma exceção a essa regra que é quem utiliza anteriormente 86
ELEMENTOS E OBRIGAÇÕES EMPRESARIAIS
de boa-fé que poderá continuar utilizando sem qualquer remuneração para o dono do direito industrial, desde que seja nos mesmos moldes da utilização anterior. (art. 45 e 100) O usuário anterior da marca cujo registro está sendo pleiteado terá precedência na concessão do registro e por isso terá 60 dias após a publicação de quem está requerendo registro de marca idêntica para requerer o seu registro e provar que utilizava antes (art. 158 da LPI). Entendimento de extrema relevância para o caso de uso indevido de marca alheia é o que diz que haverá presunção de dano moral. Quando alguém tem a sua marca registrada usada por outrem, sem a devida autorização, isso irá gerar confusão no público consumidor e por si só representa mácula para a marca original. Sendo assim, o entendimento que prevalece é que se presume o dano moral nessas situações. Obviamente trata-se de uma presunção relativa que em casos específicos poderá haver prova em contrário e comprovar-se não ter havido o dano moral. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Apesar da doutrina não ser pacifica sobre esse entendimento, o STJ segue esse entendimento, como no REsp 1322718/SP. de relataria da Ministra Nancy Andrighi, publicado em 11/12/2012, cuja ementa é seguinte: PROCESSO CIVIL E COMERCIAL MARCA. NULIDADE. DECIARAÇÃO. COMPEJlNCIA. CONTRAFAÇÃO. DANOS MATERIAIS E MORAIS. PROVA. 1. A alegação de que é inválido o registro, obtido pela titular de marca perante o INPI, deve ser formulada em ação própria. para a qual é competente a Justiça Federal. Ao Juiz estadual não é possível, incidentalmente, considerar inválido um registro vigente perante o INPI. 2. Na hipótese de contrafação de marca, a procedência do pedido de condenação do falsificador em danos materiais e morais deriva diretamente da prova que revele a existência de contrafação. Precedentes.
3. Recurso especial a que se nega provimento.
Observemos na ementa que a Ministra entende que para haver o dano, basta a prova da existência da contrafação, do uso indevido, demonstrando qual é o seu entendimento sobre a presunção do dano moral.
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~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova da Magistratura/AC/2012, organizada pelo CESPE, o enunciado trazia o seguinte caso prático: "A empresa A ajuizou, contra a empresa B, ação ordinária indenizatória por perdas e danos, com o propósito de abstenção do uso da marca comercial Y, alegando ocorrência de prática de concorrência desleal. Com relação à situação hipotética acima apresentada e ao uso da marca em geral, assinale a opção correta." E a opção a ser marcada era a que afirmava: "De acordo com a jurisprudência, caracteriza-se violação à marca quando a imitação reflete na formação cognitiva do consumidor, que é induzido, por erro, a perceber identidade em dois produtos de fabricações diferentes, presumindo-se sempre prejudicial a quem a lei confere a titularidade o uso indevido de marca alheia." Todo direito industrial pode ser licenciado (alugado) ou cedido (vendido). A forma mais comum de se fazer tal licença é através do contrato de franquia. Há que se atentar para o fato de que a propriedade industrial envolve interesse público e, portanto, deve ser usada em acordo com os interesses sociais. O legislador se preocupou com o uso inadequado da patente e estabeleceu a possibilidade de ocorrer licença compulsória. A licença compulsória ou obrigatória de patentes significa uma suspensão temporária do direito de exclusividade do titular de uma patente. Com essa suspensão será permitida a produção, uso, venda ou importação do produto ou processo patenteado, por um terceiro, sem necessidade da autorização do titular da patente. Art. 68. Otitular ficará sujeito a ter a patente licenciada compulsoriamente se exercer os direitos dela decorrentes de forma abusiva. ou por meio dela praticar abuso de poder econômico. comprovado nos termos da lei, por decisão administrativa ou judicial. Como se pode perceber no dispositivo, esse instrumento é acionado pelo governo do país que concede a patente, intervindo sobre o monopólio de sua exploração. Essa licença é um mecanismo de defesa contra possíveis abusos cometidos pelo detentor de uma patente, ou, para os casos de interesse público.
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ELEMENTOS E OBRIGAÇÕES EMPRESARIAIS
~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame organizado pelo CESPE para a Magistratura Federal/ia Região/2011, o enunciado dizia o seguinte: "De acordo com a CF, a lei assegura aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização bem como para a proteção das criações industriais, da propriedade das marcas, dos nomes de empresas e de outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do país. Com relação à proteção da propriedade industrial, considerados o seu interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do país, assinale a opção correta." E a resposta correta era: "O titular fica sujeito a ter a patente licenciada compulsoriamente se exercer os direitos dela decorrentes de forma abusiva, ou por meio dela praticar abuso de poder econômico, comprovado nos termos da lei, por decisão administrativa ou judicial."
Os bens protegidos pela propriedade industrial são de natureza patrimonial e, por isso, sua proteção trata de um direito disponível. Assim sendo propriedade industrial pode ser alienada ou cedida pelo seu proprietário de acordo com sua autonomia privada, bastando para tanto que haja o interesse na alienação. Pode assim uma patente ou um registro serem objetos de um contrato de alienação ou de cessão de direitos e aí será um contrato regido pelo direito civil, assim como qualquer outra alienação ou cessão de direitos. ; Como esse assunto foi cobrado em concurso? Na prova da Magistratura Federal/2• Região/2011, organizada pelo CESPE, a alternativa correta a ser assinalada dizia que: "A cessão de patente rege-se pelas normas atinentes à cessão de direitos, observadas as disposições específicas da legislação sobre a propriedade industrial; nesse sentido, o cedente responde, perante o cessionário, pela existência do direito industrial à data da cessão."
5.7. Extinção da propriedade industr ial O direito industrial pode se extinguir nas seguintes hipóteses: a) decurso do prazo de duração; b) caducidade;
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c) falta de pagamento de retribuição devida ao INPI; d) renúncia do titular; e) inexistência de representante legal no país. Em relação à primeira hipótese é importante destacar que a patente de invenção dura 20 anos do depósito ou 10 da concessão, e de modelo de utilidade dura 15 anos do depósito ou 7 da concessão. São improrrogáveis (art. 40 da LPI). Oregistro do desenho industrial dura 10 anos a contar do depósito e pode ser prorrogável por 3 vezes. (art. 109 da LPI). A marca dura 10 anos da concessão podendo ser prorrogável quantas vezes o titular quiser (art. 133 da LPI). Opedido de prorrogação deve ser feito no último ano do prazo. Conclui-se, portanto, que o único dos quatro bens que poderá ser explorado sem que caia em domínio público é a marca. Os demais, quando vencer o prazo, o proprietário perde o direito do uso exclusivo. A caducidade ocorre quando o titular não explorar economicamente seu direito industrial, ou utilizá-lo de forma abusiva. Odireito de patente caduca se ficar sem utilização por 2 anos e do registro por 5 anos. Pela previsão dos art. 80 a 83 de Lei, se o titular da patente de invenção ou modelo não explorar de forma direta ou através de licença voluntária de modo a atender as demandas do mercado decorridos 3 anos da concessão, qualquer interessado poderá requerer uma licença compulsória. Passados 2 anos da concessão dessa licença compulsória, a caducidade poderá ser declarada pelo INPI, a requerimento de qualquer interessado ou até mesmo de ofício. Há que haver processo administrativo que mesmo que tenha sido requerido por algum interessado, por disposição do §2° do art. 80 "o INPI poderá prosseguir se houver desistência do requerente." Isso porque poderia ter sido iniciado o procedimento de ofício, então não há nenhuma antinomia nesse prosseguimento. No caso do registro de marca, haverá caducidade somente pelo desuso. Art. 143 - Caducará o registro, a requerimento de qualquer pessoa com legítimo interesse se, decorridos 5 (cinco) anos da sua concessão, na data do requerimento: 1-
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o uso da marca não tiver sido iniciado no Brasil; ou
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li - o uso da marca tiver sido interrompido por mais de 5 (cinco) anos consecutivos, ou se, no mesmo prazo, a marca tiver sido usada com modificação que implique alteração de seu caráter distintivo original, tal como constante do certificado de registro. Não existe caducidade de desenho industrial.
• Como esse assunto foi cobrado em concurso? No concurso da Magistratura Estadual/TJ/DFT/2014, organizada pelo CESPE, pedia-se par marcar a alternativa correta sobre a propriedade industrial que era: "No processo de caducidade de patente instaurado a requerimento de parte interessada, o INPI poderá prosseguir se houver desistência do requerente."
Uma situação relevante que envolve a propriedade industrial é a sua relação com o direito internacional. Muitas vezes, uma ideia que é tida em outro país é usada no Brasil e vice-versa. Por isso o Brasil participa e já participou de diversas convenções que tratam sobre a regulamentação internacional da propriedade industrial. Neste diapasão a LPI positivou a questão do princípio da anterioridade quando uma propriedade industrial é criada em algum país que seja signatário de convenção com o Brasil, vejamos: Art. 3° Aplica-se também o disposto nesta Lei:
1- ao pedido de patente ou de registro proveniente do exterior e depositado no País por quem tenha proteção assegurada por tratado ou convenção em vigor no Brasil; Art. 16. Ao pedido de patente depositado em país que mantenha acordo com o Brasil, ou em organização internacional, que produza efeito de depósito nacional, será assegurado direito de prioridade, nos prazos estabelecidos no acordo, não sendo o depósito invalidado nem prejudicado por fatos ocorridos nesses prazos.
> Como esse assunto foi cobrado em concurso? Na prova organizada pelo CESPE para Procurador Federal/2010, foi considerada verdadeira a seguinte afirmativa: "Determinada sociedade estrangeira, com objetivo de patentear invenção de sua titularidade, realizou o depósito de seu pedido de patente em país que mantém acordo relativo à propriedade intelectual com o Brasil, em abril de 2009. Nessa situação, dentro do prazo previsto no aludido acordo internacional, será assegurado o direito de prioridade à referida sociedade, não sendo o depósito invalidado ou prejudicado por fatos ocorridos durante esse prazo."
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Capítulo
3
Direito Societário sumário • i. Introdução - 2. Classificação das sociedades: 2.1. Quanto à natureza do ato constitutivo; 2.2. Quanto à natureza da atividade praticada; 2.3. Quanto à importância dos sócios ou do capital investido; 2.4. Quanto à responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais; 2.5. Quanto à aquisição de personalidade jurídica - 3. Sociedade em Comum - 4. Sociedade em Conta de Participação - 5. Sociedade Simples: 5.1. Introdução; 5.2. Conceito; 5.3. Constituição; 5.4. Sociedade entre cônjuges; 5.5. Responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais; 5.6. Obrigações e direitos dos sócios; 5.7. Administração; 5.8. Dissolução - 6. Sociedade Limitada: 6.1. Introdução; 6.2. Conceito; 6.3. Responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais; 6.4. Constituição; 6.5. Quotas; 6.6. Administração; 6.7. Exclusão extrajudicial de sócio; 6.8. Conselho Fiscal; 6.9. Deliberações sociais; 6.10. Aumento e redução do capital social; 6.11. Falecimento de sócios; 6.12. Dissolução da sociedade; 6.13. Liquidação das sociedades contratuais - 7. Sociedade Anônima: p. Introdução; p. Conceito e responsabilidade dos sócios pelas obrigações da sociedade: 7.3. Espécies de sociedade anônima: n.1. Mercado de capitais: n.1.1. Bolsa de Valores; n.i.2. Mercado de Balcão; 7.4. Constituição: r4.1. Requisitos preliminares; 7.4.2. Subscrição: 7.4.2.1. Subscrição Pública; 7.4.2.2. Subscrição Particular; 7.4.3. Providências complementares; 7.5. Abertura e fechamento do capital; 7.6. As ações: 7.6.1. Conceito; 7.6.2. Espécies e classes; 7.6.3. Formas; 7.6.4. Valores; 7.6.5. Negociação com as próprias ações; 7.7. Demais valores mobiliários; 7.8. Obrigações e direitos dos acionistas; 7.9. órgãos societários: 7.9.1. Assembleia geral; 7.9.2. Conselho de Administração; 7.9.3. Diretoria; 7.9.4. Conselho Fiscal; po. Poder de controle; p1. Proteção ao acionista minoritário; p2. Dissolução da companhia: p2.1. Dissolução parcial - 8. Tipos Societários Menores: 8.1. Sociedade em nome coletivo; 8.2. Sociedade em comandita simples; 8.3. Sociedade em comandita por ações - 9. Desconsideração da Personalidade Jurídica: 9.i. Aspectos Gerais; 9.2. Desconsideração no Código Civil; 9.3. Desconsideração no Código de Defesa do Consumidor; 9.4. Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica - 10. Operações societárias: 10.i. Transformação; 10.2. Fusão; 10.3. Incorporação; io.4. Cisão
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1. INTRODUÇÃO
O direito societário é a parte do direito empresarial que se dedica ao estudo das sociedades. O direito brasileiro segue o conceito tradicional de sociedade que é o de união de duas ou mais pessoas, físicas ou jurídicas, para praticarem uma atividade econômica, que busque precipuamente o lucro e que esse resultado auferido seja partilhado entre os sócios. Nem todos os ordenamentos jurídicos mantêm esse conceito, pois, em muitos, a sociedade já é vista como organização e não mais como união de pessoas. Nesse caso haverá possibilidade de a sociedade ser formada por apenas uma pessoa, pois não importa quantas pessoas fazem o investimento e nem quantas irão se valer dos resultados da atividade, mas o que importa é que a estrutura formada seja a de uma sociedade. São as conhecidas como sociedades unipessoais. Neste capítulo iremos estudar todos os tipos societários existentes na legislação brasileira. Quando as pessoas resolvem entrar em sociedade, elas terão várias opções de tipos societários para escolherem, de acordo com o tipo de atividade, com o porte do investimento e com as consequências do resultado positivo ou negativo da atuação. Vamos analisar também as operações societárias que alteram a forma de estruturação das sociedades e também a desconsideração da personalidade jurídica. r Importante! o conceito de sociedade no Brasil permanece sendo o de união de duas ou mais pessoas. Existem situações transitórias em que a sociedade irá funcionar com um sócio apenas e duas exceções de caráter permanente: empresa pública e sociedade subsidiária integral. Importante lembrar que a EIRELI não é sociedade. Sociedade X Empresa
Conceito: união de duas ou mais Conceito: atividade econômica organipessoas para a prática de uma atizada para a produção ou circulação de vidade econômica e posterior parbens ou serviços. tilha do resultado. Sociedade sem empresa = sociedaEmpresa sem sociedade = empresário de simples e cooperativa (não praindividual ou EIRELI ticam atividade empresária) Sociedade+ Empresa =sociedades empresárias
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DIREITO SOCIETÁRIO 2.
CLASSIFICAÇÃO DAS SOCIEDADES
Antes de entrarmos no estudo de cada tipo societário, é importante fazer um breve relato da classificação das sociedades, para que ao tratar-se de determinado instituto em cada tipo societário, seu fundamento seja melhor compreendido. 2.1. Quanto
à natureza do ato constitutivo
Dois são os tipos de atos constitutivos que a legislação brasileira admite quando da criação de uma sociedade: contrato social ou estatuto social. Algumas sociedades dependerão da elaboração de um contrato social para que ele seja levado a registro e constitua a sociedade. O ato terá, portanto, natureza de acordo de vontades, seguindo as regras formais do direito contratual comum. Obviamente não se pode afirmar que o contrato social seja idêntico ao das relações civis, até pela questão das partes contratuais que não são tão definidas e antagônicas.
o outro tipo de ato constitutivo é o estatuto social. Esse já terá a natureza de regulamento e não de acordo de vontades. Para se ter uma ideia da diferença formal, no estatuto não há qualificação das partes (dos sócios), muito menos assinatura deles. A aprovação do estatuto para que ele possa ser levado à registro e constitua a sociedade é feito através de ata de assembleia de sócios. Apesar das diferenças formais nos atos constitutivos, o entendimento que prevalece no Brasil é que a relação entre os sócios terá natureza contratual. Esse entendimento baseia-se na tese no autor Tullio Ascarelli, que desenvolveu a Teoria do Contrato Plurilateral. Esse autor de origem italiana desenvolveu essa teoria com base nas sociedades anônimas que é um tipo societário que se constitui por estatuto social, mas apesar disso, teria a relação dos sócios baseado num acordo de vontades, por tanto, de natureza contratual. 2.2. Quanto
à natureza
da atividade praticada
Esta classificação foi totalmente alterada após a vigência do Código Civil de 2002. Isso porque, antes se falava em atividade comercial ou não para classificar a sociedade e aquela que não tinha no seu objeto
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social um ato de comércio seria uma sociedade civil e a que tivesse seria uma sociedade comercial. Como hoje não se fala mais em ato de comércio para basear o Direito Empresarial a atividade que irá classificar as sociedades é a atividade empresária. Desta feita, as sociedades serão empresárias quando no seu objeto se encontrar a prática de uma atividade empresária, já analisada no capítulo 1 e será sociedade simples a que não contar com a prática de atividade empresária. Tal classificação pode ser encontrada no art. 982 do Código Civil, cujo parágrafo único retrata um detalhe bastante importante, vejamos: Art. 982. Salvo as exceções expressas, considera-se empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro (art. g67); e, simples, as demais. Parágrafo único. Independentemente de seu objeto, considera-se empresária a sociedade por ações; e, simples, a cooperativa.
Como se vê, a sociedade anônima sempre será empresária, sem se precisar analisar seu objeto. Isso porque, como será melhor delimitado no item específico, este tipo societário é dotado de alta complexidade e burocracia. Isso faz, por si só, com que se a atividade está sendo praticada sob o manto desse tipo societário, devido a sua complexa organização, ela terá o elemento de empresa, sendo, portanto, classificada sempre como empresária. Já a cooperativa será sempre uma sociedade simples, pois ela se caracteriza quando os sócios cooperados, reciprocamente, se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício de uma atividade econômica, de proveito comum, sem objetivo de lucro. Quem vai exercer a atividade lucrativa é o cooperado, em seu nome próprio e não a sociedade. Ora, o art. 966 pressupõe finalidade econômica para ser atividade empresária, sendo o lucro a característica principal e então, não se pode falar que a sociedade cooperativa pratica atividade empresária. Quem poderá exercer a atividade empresária são os sócios cooperados, mas não a cooperativa que será sempre sociedade simples.
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DIREITO SOCIETÁRIO
• Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova da Magistratura/PB/2011 o enunciado pedia para marcar a alternativa correta sobre direito societário e a resposta correta era: NA sociedade por ações é considerada sociedade empresária, independentemente do objeto_# Já no concurso para Advogado da Investe Rio/2011 o enunciado da questão dizia: NA sociedade cooperativa considera-se# e a resposta correta era: #sempre simples#.
2.3_ Quanto
à importância dos sócios ou do capital investido
Há sociedades em que o intuito principal é a reunião daqueles sócios especificamente e a sua participação na sociedade terá importância fundamental. O que importa não é apenas o que se investe, mas quem investe. Essa é classificada como sociedade de pessoas. Já em outros tipos societários não haverá essa importância tão grande da pessoa dos sócios, sendo muito mais relevante o capital investido. Essa é conhecida corno sociedade de capitais. Na sociedade de pessoas encontrar-se-á a affectio societaris, que pode ser entendida como a disposição do sócio em participar de uma sociedade, contribuindo ativamente na realização do objetivo e buscando lucro. A doutrina separa quatro elementos essenciais à formação da crffectio societcrtis que seriam a colaboração ativa, a colaboração consciente, a colaboração igualitária dos contratantes e a busca de lucro a partilhar. Há, dessa forma, uma relação de companheirismo entre os sócios e isso influencia no bom funcionamento da sociedade. Essa classificação traz algumas consequências importantes que serão melhor analisadas no estudo de cada tipo societário, como, por exemplo, a possibilidade de entrada de sócios com ou sem autorização dos demais, a penhora da participação societária por dívidas particulares dos sócios, dentre outras. ~
Importante!
Há alguma doutrina que entende não ser mais relevante a distinção entre sociedade de pessoas e de capitais, porém, como será demonstrado no decorrer deste estudo, essa distinção tem importância tanto no campo doutrinário como, principalmente, nos entendimentos jurisprudenciais.
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2.4. Quanto à responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais As atividades econômicas envolvem risco. Nem sempre o investi· mento realizado pelos sócios numa sociedade dá o retomo esperado e às vezes pode até mesmo acontecer de o patrimônio social não ser suficiente para arcar com as obrigações contraídas. É neste contexto que se irá analisar qual o tipo de autonomia patrimonial uma sociedade possui, se própria ou imprópria.
Há muitos anos, foi preciso limitar esses riscos naturais das atividades econômicas, sobretudo das atividades mercantis e começou-se a falar em autonomia patrimonial própria, ou simplesmente limitação de responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais. Se a sociedade possuir autonomia patrimonial própria, uma vez integralizado o capital social, o patrimônio dela será formado e, regra geral, somente este irá responder pelas obrigações da sociedade, não havendo mais nenhuma responsabilidade dos sócios. Fala-se regra geral, pois poderá haver casos excepcionais em que a obrigação irá atingir o patrimônio dos sócios, seja por sua natureza, seja por circunstâncias fáticas. Classifica-se então como sociedade em que os sócios respondem limitadamente pelas obrigações sociais. Já nas sociedades em que os sócios respondem ilimitadamente, se o patrimônio social não for suficiente para arcar com as obrigações assumidas, os credores poderão buscar o patrimônio dos sócios, ainda que já tenha havido o total da integralização. Nesse caso o sócio irá assumir a integralidade do risco da atividade. Diz-se que tais sociedades possuem autonomia patrimonial imprópria, pois apesar de poderem assumir os direitos e obrigações em seu nome próprio, a responsabilidade deles será também dos sócios. A limitação de responsabilidade é justificada pela necessidade de se incentivar a criação de investimentos econômicos. Num sistema econômico como o capitalista, a criação de atividades empresárias terá grande importância para o fortalecimento e crescimento econômico do país e uma vez que o risco estará limitado, o investidor se sentirá mais seguro para atuar.
2.5. Quanto à aquisição de personalidade jurídica Os conceitos de sociedade e de pessoa jurídica não são os mesmos. Como já se abordou anteriormente, sociedade é a de união 98
DIREITO SOCIETÁRIO
de duas ou mais pessoas, físicas ou jurídicas, para praticarem uma atividade econômica, que busque precipuamente o lucro, para que esse resultado auferido seja partilhado entre os sócios. Já as pessoas jurídicas podem ser entendidas como entidades, unidades de pessoas naturais ou de patrimônio, que visa à consecução de certos fins, reconhecida pela ordem jurídica como sujeito de direitos, tendo em vista que a Lei empresta personalidade, capacitando-as a serem sujeitos de direitos e obrigações. As sociedades estão no rol do art. 44 do Código Civil como espécies de pessoas jurídicas de direito privado, porém, nem toda sociedade irá possuir personalidade jurídica própria, formando pessoa jurídica. Essas serão as sociedades não personificadas, tem-se o conceito de sociedade, sem, porém ter a formação de pessoa jurídica. São conhecidas como sociedades não personificadas. Já outras sociedades, formam pessoa jurídica e tornam-se sujeito próprio de direitos e obrigações. Essas são as sociedades personificadas. Importante frisar que o fato de possuir personalidade jurídica, não significa que terá autonomia patrimonial própria, como foi analisado no item anterior, sendo que a existência da personalidade poderá significar apenas uma aquisição dos direitos e obrigações no nome da própria sociedade, mas que também ficará subsidiariamente sob a responsabilidade dos sócios. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No certame para Advogado do Instituto de Pesquisas Tecnológicas/2011, foi considerada correta a alternativa que dizia que a sociedade personificada: Hserá sujeito capaz de direitos e obrigações, não se confundindo com a pessoa natural dos sócios que a constituem." Classificação das sociedades Quanto à natureza do ato constitutivo
• Sociedade contratual • Sociedade estatutária
Quanto à natureza da atividade praticada
• Sociedade empresária • Sociedade simples
Quanto à imponãncia dos sócios ou do capital
• Sociedade de pessoas • Sociedade de capitais
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Classificação das sociedades
Quanto à responsabilidade dos sócios pelas dívidas da sociedade
• Sociedade limitada • Sociedade ilimitada
Quanto à aquisição de personalidade jurídica
• Sociedade personificada • Sociedade não personificada
3. SOCIEDADE EM COMUM Comecemos agora o estudo dos tipos societários e seguindo a ordem do Código Civil, comecemos pelas sociedades não personificadas. O Código Civil previu duas sociedades que não terão personalidade jurídica, a sociedade em comum e a sociedade em conta de participação. A sociedade em comum seria aquela sociedade em que inexistem contratos sociais (no caso das sociedades de fato) ou se existem não foram registrados (como no caso das sociedades irregulares). Ela é conceituada no art. 986 do Código Civil. Art. 986. Enquanto não inscritos os atos constitutivos, reger-se-á a sociedade, exceto por ações em organização, pelo disposto neste Capítulo, observadas, subsidiariamente e no que com ele forem compatíveis, as normas da sociedade simples.
Muito provavelmente em virtude da carga tributária brasileira, esse tipo de sociedade é muito encontrado na nossa realidade. São aqueles dois amigos que resolvem montar um negócio de entrega de refeições, por exemplo, mas não fazem sequer um contrato social, ou até o fazem, mas não levam a registro. Existem também muito no âmbito familiar, por exemplo, três irmãos que montam um salão de beleza, mas não fazem nenhum tipo de registro. Também haverá sociedade em comum quando houver atraso no pedido de registro do ato constitutivo . O prazo normal para se requerer o registro é de 30 dias e se esse prazo não for observado, os efeitos do registro só irão ocorrer quando este for efetivado. Antes da efetivação, se a sociedade praticar atos, ela será considerada como sociedade em comum. Como o art. 985 do Código Civil coloca como condição de aquisição de personalidade jurídica o registro do ato constitutivo no .. órgão ](){)
DIREITO SOCIETÁRIO
próprio", caso o contrato ou estatuto de uma sociedade seja levado a registro no órgão errado, ela também será considerada uma sociedade em comum. É o caso muito comum das sociedades de advogados, que o estatuto da OAB exige que elas sejam registradas na própria entidade e muitas vezes os sócios registram apenas no Cartório do Registro Civil das Pessoas Jurídicas. • Inexistência de ato constitutivo Sociedade • Ato constitutivo não foi levado à registro em comum { , • Ato constitutivo registrado no orgão errado Há um detalhe importante para ser observado nesse tipo de sociedade. Muitos, ao se depararem com o conceito da sociedade em comum se perguntam: mas essa sociedade não é ilegal, pois se não se registra, não paga tributos? Sim, do ponto de vista tributário há total irregularidade nessas sociedades, podendo ser alvo de fiscalização fazendária e de aplicação de multas. Porém, o direito empresarial a regulamenta no que diz respeito à relação entre os sócios e entre sociedade e terceiros. Já que não existe uma pessoa jurídica, sujeito de direitos, que poderia assumir os direitos e obrigações, nessa sociedade, cada sócio irá assumi-los em seu próprio nome. Porém, as dívidas e o patrimônio adquirido com a exploração da atividade constituirão patrimônio especial que os sócios irão partilhar. Isso significa dizer que apesar da dívida estar em nome de apenas um sócio, por exemplo, provando-se que se trata de uma obrigação que foi assumida para a sociedade, esse sócio poderá requerer que tal débito seja partilhado com os demais sócios. o mesmo acontece se for adquirido patrimônio. Em termos formais, ele estará no nome de um sócio, mas pertencerá a todos
e em caso se extinção da sociedade
tudo isso vai ter que ser partilhado entre os sócios, ônus e bônus. Em relação aos terceiros, credores desse tipo de sociedade, a responsabilidade entre os sócios será solidária. Quer dizer que, se o credor provar que a dívida era da sociedade, poderá demandar todos os sócios e não apenas em cujo nome a obrigação estiver formalizada.
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Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame organizado pelo CESPE da Magistratura Federal/3• Região/2011, o enunciado da questão trazia o seguinte caso prático e pedia para ser marcada a alternativa correta : "Três pessoas uniram-se e passaram a desenvolver atividade econômica informal - venda de camisetas com pinturas exclusivas. Uma passou a cuidar das compras e administração (o administrador). outra, das pinturas (o artista) e a outra, das vendas (o vendedor). o negócio cresceu e, após o vendedor dar expressamente sua aceitação a determinada encomenda, não foi possível cumprir os prazos estipulados para a entrega. O comprador, então, decidiu ajuizar ação para reaver os prejuízos. Com base nessa situação, é correto afirmar que a responsabilidade cabe". A resposta correta era a que dizia "aos três, pois são solidários no negócio." Caso o sócio seja demandado por uma dívida que pertence à sociedade, terá direito ao benefício de ordem (primeiro ser penhorado os bens do patrimônio especial para depois penhorar os bens particulares), com exceção daquele que emprestou seu nome para a sociedade. É o que dizem os arts. 989 e 990 do Código Civil. A explicação para tal fato é para incentivar os sócios a regularizarem a situação da sociedade, ou seja, fazer o devido registro dos atos constitutivos. Também nesse viés de fazer com que os sócios percebam a importância de formalizar a sociedade em comum é que o art. 987 do Código Civil preconiza que: "Os sócios, nas relações entre si ou com terceiros, somente por escrito podem provar a existência da sociedade, mas os terceiros podem prová-la de qualquer modo." Neste contexto, se um sócio que está com a dívida da sociedade em seu nome quiser dividir o prejuízo com os demais, somente poderá se valer de documentos para provar que a obrigação era da sociedade e não apenas dele. Evita-se, assim, que a sociedade em comum seja exageradamente informal. • Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No concurso da Magistratura do Trabalho/23• Região/2011, a alternativa considerada correta a respeito da sociedade em comum foi: " os bens e dívidas sociais constituem patrimônio especial, do qual os sócios são titulares em comum." Duas outras alternativas que foram consideradas incorretas merecem destaque. Uma que afirmou "a existência da sociedade em comum
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DIREITO SOCIETÁRIO
pode ser provada apenas por escrito.# Está incorreta, pois se for um terceiro, não sócio que quiser provar a existência da sociedade poderá fazê-lo por qualquer meio. Outra afirmou que Nos bens sociais respondem pelos atos de gestão praticados por qualquer dos sócios, ainda que exista pacto expresso limitativo de poderes.# Se ficar provado que o terceiro conhecia o pacto limitativo de poderes, os bens sociais não responderão pelo ato, mas somente a pessoa que o praticou indevidamente.
4. SOCIEDADE EM CONTA DE PARTICIPAÇÃO O segundo tipo societário previsto no Código Civil que não possui personalidade jurídica é a sociedade em conta de participação e a sua
falta de personalidade se dá devido
à sua
natureza e não pela falta
de registro. ~
Importante!
Diferente da sociedade em comum que não tem personalidade jurídica pela falta do registro do ato constitutivo, a conta de participação não a tem por questão de natureza e mesmo que registre o contrato não adquirirá personalidade própria. Justamente por esse fato, é muito grande o número de doutrinadores que afirmam que na verdade a conta de participação não é uma sociedade e sim um contrato de investimento. Em que pesem tais afirmações, o legislador do Código Civil de 2002 optou por mantê-la no rol das sociedades, até levando-se em conta que o conceito de sociedade não é o mesmo de pessoa jurídica corno já se afirmou anteriormente. Vamos então ao conceito de sociedade em conta de participação .
É a sociedade formada por dois tipos de sócios: sócio ostensivo e sócio participante (ou também chamado de sócio oculto). A atividade da sociedade é desenvolvida apenas pelo sócio ostensivo , em seu nome e sob sua exclusiva responsabilidade, cabendo aos sócios ocultos a participação nos resultados correspondentes . Importante observar como o Código Civil traz esse conceito: Art. 991. Na sociedade em conta de participação, a atividade constitutiva do objeto social é exercida unicamente pelo sócio ostensivo, em seu nome individual e sob sua própria e exclusiva responsabilidade, participando os demais dos re sultados correspondentes.
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
Parágrafo único. Obriga-se perante terceiro tão-somente o sócio ostensivo; e, exclusivamente perante este, o sócio participante, nos termos do contrato social. O sócio ostensivo terá, portanto responsabilidade ilimitada pelos negócios, até porque as obrigações foram contraídas em seu nome, enquanto o sócio participante só tem responsabilidade perante o ostensivo e nos limites do contrato . ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No concurso da Magistratura do Trabalho/ia região/2010, o enunciado pedia para que fosse assinalada a alternativa verdadeira que tinha a seguinte redação: NNa sociedade em conta de participação, o sócio ostensivo responde de maneira ilimitada pelas dívidas sociais. Nos dias atuais, esse tipo de sociedade é muito encontrado no ramo imobiliário, por exemplo, quando uma construtora busca um investidor para financiar uma obra, um projeto mais dispendioso, mas ela que realiza toda a atividade. Quando começa a receber os lucros, este é repassado ao investidor, o sócio participante, de acordo com o que tiver sido estabelecido entre eles. O sócio participante também terá riscos no negócio, pois se este não vier a dar lucros, ele poderá perder o investimento que realizou, mas seu risco ficará limitado apenas ao que ficou estabelecido em contrato. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Nosso tribunal superior não deixa dúvidas de que a responsabilidade perante terceiros em uma sociedade em conta de participação é apenas do sócio ostensivo, como neste exemplo do REsp 192603 / SP, publicado em 01/07/2004 cuja ementa é a seguinte: DUPLICATA. EMISSÃO POR FORNECEDORA DE MOBILIÁRIO CONTRA O PROPRIETÁRIO DE UNIDADE AUTÔNOMA DE EOIFfclO. SOCIEDADE EM CONTA OE PAllTICIPAÇÃO. RESPONSABILIDADE PERANTE TERCEIROS. SÓCIO OSTENSIVO.
"Na sociedade em conta de panicipação o sócio ostensivo é quem se obriga para com terceiros pelos resultados das transações e das obrigações sociais, realizadas ou empreendidas em decorrência da sociedade, nunca o sócio panicipante ou oculto que nem é conhecido dos terceiros nem com estes nada trata.· (REsp no i68.028-SP). Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa pane, provido.·
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DIREITO SOCIETÁRIO
Tal contrato não possui qualquer formalidade , não precisando nem mesmo da forma escrita . Claro que nesse caso o teor dos termos que ficaram acordados entre sócio ostensivo e sócio oculto ficará muito difícil de ser provado, então é muito raro encontrar uma sociedade dessas que não tenha ao menos um contrato escrito. Ele irá delimitar a relação entre os sócios, sem ter nenhuma utilização por terceiros para quem a sociedade sequer existe. Por ser uma sociedade sem personalidade jurídica, ela não pode ter seu contrato registrado na Junta Comercial e um possível registro, que se daria no Cartório de Registro de Títulos e Documentos, seria apenas para dar publicidade e força probatória, mas jamais para conferir personalidade jurídica
à sociedade . Essa
previsão encontra-se no
art. 993 do Código Civil. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova da Defensoria pública da União/2007, foi considerada incorreta a asseniva que dizia: "Os sócios de cena sociedade em conta de panicipação lavraram o seu ato constitutivo em janeiro de 2007, mas o referido instrumento foi levado a registro apenas após cerca de seis meses. Nessa situação, a sociedade somente passou a ter personalidade jurídica no momento da inscrição de seu contrato social no registro público de empresas mercantis."
Já no concurso organizado pelo CESPE para Procurador do TCE/BA/2010, foi considerada correta a asseniva que dizia: "O contrato social da sociedade em conta de panicipação produz efeito somente entre seus sócios, e a eventual inscrição de seu instrumento em qualquer registro não confere personalidade jurídica à sociedade." Uma situação que o Código Civil preocupou-se em regulamentar foi o caso de falência de um dos sócios da sociedade em conta de participação. De acordo com o an. 994, §§ 3° e 4°, a falência do sócio ostensivo ocasiona a dissolução da sociedade, bem como, a liquidação da respectiva conta, cujo saldo constituirá crédito quirografário, ou seja, ausência de garantia real ou especial. Uma das consequências da falência é o encerramento das atividades, portanto, se o sócio ostensivo é quem praticava a atividade e ele estará impossibilitado de fazê-lo pela decretação da quebra, a conta de participação terá que ser encerrada. Na hipótese da falência do sócio participante, o
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
contrato social estará sujeito ao disposto nas normas que regem os efeitos da falência (Lei 11.101/2005) que ainda será analisada no momento oportuno.
5. SOCIEDADE SIMPLES 5.1. Introdução
Com a filiação do Código Civil de 2002 à Teoria da Empresa, a divisão do direito societário sofreu uma grande modificação. Antes as sociedades, no que diz respeito à natureza da atividade praticada, eram divididas em sociedade comercial e civil, sendo que se houvesse prática de ato de comércio seria a primeira e se não tivesse seria a segunda. Como não se fala mais em atos de comércio, e sim em empresa, esta atividade é que passou a ser o marco divisório das sociedades, ou seja, se pratica atividade empresária será sociedade empresária e se não praticar tal atividade será sociedade simples. Nesse contexto, é muito comum vermos entendimentos equivocados de que a sociedade simples é a mesma sociedade civil do Código Civil de 1916, o que mudou foi apenas a nomenclatura. Isso não é verdadeiro, pois os conceitos são diferentes, apesar do objetivo de ambas ser o mesmo: ser o tipo societário das atividades não comerciais/empresárias. Se tal afirmativa fosse verdade, todas as sociedades civis teriam se transformado em sociedade simples, mas isso não é verdade, pois se pode encontrar determinadas sociedades civis que com o conceito mais abrangente da atividade empresária, são hoje sociedades empresárias. • Importante! o Código Civil de 2002 criou um novo tipo societário para adaptar a nova base do direito empresarial: a existência ou não de atMdade empresária.
5.2. Conceito A sociedade simples é aquela em que a atividade desenvolvida é uma atividade não empresária, conforme parágrafo único do art. 966, 106
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ou seja, as atividades intelectuais de natureza artística, científica ou literária. Se, portanto, dois advogados querem praticar sua atividade em sociedade terão que escolher a sociedade simples, assim como os médicos, um grupo de teatro, enfim, todas aqueles que praticam as atividades que foram analisadas no capítulo 1, item 2. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova organizada pelo CESPE para Analista do CNPQ/2011, foi considerada errada a afirmativa Numa sociedade de natureza artística cons tituída por dois músicos deve ser classificada como sociedade empresária ", justamente porque neste caso não há atividade empresária e a sociedade será simples.
Há que se ressaltar que excepcionalmente tais atividades poderão ser praticadas em sociedade empresária, se o exercício delas constituir o elemento de empresa, conforme a previsão da parte final do parágrafo único do art. 966. Tal situação também já foi analisada no capítulo 1, item 2. Outra ressalva importante diz respeito às sociedades cooperativas. De acordo com o parágrafo único do art. 982 do Código Civil, independente da atividade praticada, a cooperativa será sempre considerada sociedade simples. Duas seriam as justificativas para esta escolha do legislador. A primeira vai dizer que a sociedade cooperativa não circula bens ou serviços, pois que o faz na verdade são os cooperados e não a sociedade e, por isso, não se pode falar em prática da atividade empresária conforme está estabelecido no art. 966. A segunda justificativa é bem mais simplória e diz que a cooperativa não é considerada sociedade empresária para que ela não fique abarcada pela Lei de Falência. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No certame da Magistratura Federal/3• Região/2011, organizado pelo CESPE, foi requerido que se assinalasse um exemplo de sociedade simples e a alternativa correta era aquela que dizia: "sociedade cooperativa de produtores rurais."
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• Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
o tribunal já negou que uma cooperativa seja alvo de procedimento de falência, pois este é exclusivo para empresários e sociedades empresárias, como se vê na ementa do AgRg no REsp 8o8241/SP: "TRIBUTÁRIO. COOPERATIVA. LIQUIDAÇÃO JUDICIAL Lei 5.764/1971. EXCLUSÃO DA MULTA E DOS JUROS MORATÓRIOS. IMPOSSIBILIDADE. 1. As cooperativas são sociedades simples - nos termos do art. 982, parágrafo único, do Código Civil - que, por definição, não exercem atividade empresarial (art. 1.093 do mesmo diploma legal). Por essa razão, não se sujeitam à legislação falimentar, mas sim ao procedimento de liquidação previsto pelos arts. 63 a 78 da Lei 5.764/1971, que não contempla o benefício de exclusão das multas e dos juros moratórias. Precedentes do STJ.
2.
Agravo Regimental r.ão provido.
5-3· Constituição Sua constituição se dá por contrato social que deve conter no mínimo os requisitos do art. 997 e deve ser registrado no Cartório de Registro Cívil de Pessoas Jurídicas. O caput do artigo supracitado começa exigindo que o contrato social seja feito de maneira escrita, podendo ser feito de maneira particular pelos sócios ou por instrumento público, no cartório . Em seguida, o dispositivo determinará as cláusulas mínimas que o contrato vai ter que obrigatoriamente conter, sendo certo que os sócios poderão incluir outras questões que lhe forem pertinentes. O inciso 1 do art. 997 vai exigir que o contrato faça a qualificação dos sócios. Não se pode esquecer que muito se discutiu a natureza do contrato de sociedade, pois é certo que ele não se enquadra na classificação contratual comum do Direito Civil. Foi o autor italiano Tulio Ascareli quem encontrou a classificação ideal do contrato de sociedade quando o qualificou como sendo plurilateral. Sendo contrato, portanto, é preciso qualificar as partes que o compõe. Em seguida, o inciso li vai exigir que o contrato trate da qualificação da própria sociedade ao exigir a menção de: denominação, objeto, sede e prazo da sociedade. Apesar de não ser atividade empresária, a sociedade simples também precisa ter seu elemento identificador que é a denominação, 108
DIREITO SOCIETÁRIO
sendo importante ressaltar que o parágrafo único do art. 1155 do Código Civil preconiza que: "Equipara-se ao nome empresarial, para os efeitos da proteção da lei, a denominação das sociedades simples, associações e fundações." Sendo assim, a denominação da sociedade simples terá proteção no território estadual e será de uso exclusivo de quem o registra. A descrição do objeto social, ou seja, a atividade fim da sociedade deve ser feita de forma clara e precisa. Mais à frente iremos analisar que essa descrição irá pautar a atuação do administrador da sociedade, limitando inclusive seus poderes. A sede da sociedade não necessariamente é o local onde a atividade será exercida, mas sim o local em que se terá a concentração da parte de organização e administração da sociedade. Apesar do dispositivo legal ter falado que o contrato tem que mencionar o prazo de funcionamento da sociedade, este não precisa ser determinado. Poderá ser colocado tão somente que a sociedade irá vigorar por prazo indeterminado. No curso da sociedade serão observadas importantes diferenças se ela for de prazo determinado ou indeterminado. Os incisos Ili, IV e V do art. 997 exigem que o contrato mencione como se dará o investimento na sociedade. O valor do capital social representa qual o montante financeiro os sócios pretendem investir, devendo estar em moeda corrente. Trata-se de um investimento inicial que a qualquer momento poderá ser alterado de acordo com o interesse dos sócios. Esse investimento será dividido entre os sócios através da aquisição de quotas e da sua integralização. Dessa forma, o contrato também vai ter que mencionar qual o número de quotas que cada sócio irá adquirir e qual será sua forma de integralizá-las, ou seja, como ele irá efetivar esse investimento. Na sociedade simples é permitido que o sócio integralize através da prestação de serviços. Tal sócio ficará conhecido como sócio de serviço e o ato constitutivo vai ter que detalhar qual será esse serviço que representará a integralização. O inciso VI deve ser interpretado em conjunto com o an. 1012. Isso porque, o primeiro dispositivo menciona que o contrato deve contar as pessoas incumbidas da administração da sociedade, seus
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
poderes e atribuições, porém, o segundo dispositivo dispõe que: "O administrador, nomeado por instrumento em separado, deve averbá-lo à margem da inscrição da sociedade, e, pelos atos que praticar, antes de requerer a averbação, responde pessoal e solidariamente com a sociedade." Como se vê, há uma permissão para que o administrador seja nomeado em um instrumento em separado. Conclui-se, portanto, que o contrato poderá dizer apenas que o administrador será nomeado em ato separado, mas sem necessidade de nomeá-lo. O que não pode acontecer é o contrato não fazer nenhuma menção à nomeação do administrador. Apesar de pouco utilizado na prática, o inciso VII traz uma situação importante. Normalmente os sócios optam por dividirem os lucros e as perdas na proporção do que cada um integralizou no capital social. Ocorre que a obediência a esta proporcionalidade não é obrigatória. Imaginemos um escritório de advocacia que foi constituído por 3 advogados, sendo que um deles possuía uma reserva maior de dinheiro e investiu 50°&. do capital. Esse investimento contribuiu muito para a montagem da sociedade, porém, pode ocorrer de a lucratividade estar mais ligada ao trabalho cotidiano desenvolvido por cada sócio do que a esse investimento e como todos os 3 sócios irão trabalhar de forma igualitária na captação de clientes, no atendimento a estes, eles optam por dividir igualmente os lucros e as perdas. É essa situação que o contrato poderá prever, excetuando aquela situação corriqueira em que os lucros e as perdas são divididos na proporção do investimento que cada sócio realizou. O último requisito obrigatório do contrato social é o previsto no inciso VIII que será tratado separadamente no próximo item por ser extremamente controvertido. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame para advogado do BDMG/2011, da banca da FUMARC, pedia-se para encontrar a alternativa que não correspondia a um requisito obrigatório do contrato previsto no art. 997 do Código Civil e a opção a ser assinalada era: "A declaração dos sócios assumindo a obrigação de recolher tempestivamente os impostos, não manter empregados sem registro e observar as normas de preservação ambiental, sob pena de responder com seus bens pessoais pelos prejuízos que causar".
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De acordo com o interesse dos sócios, outras cláusulas poderão ser colocadas no contrato que, segundo o art. 998 do Código Civil, deverá ser levado à registro no Cartório do Registro Civil das Pessoas Jurídicas dentro de um prazo de 30 dias. Nota-se que tal dispositivo não menciona as consequências da observância ou não desse prazo e em assim sendo deverá ser usado analogicamente o art. 36 da Lei 893494, ou seja, se o registro for requerido dentro do prazo os efeitos retroagem e a sociedade terá adquirido personalidade jurídica desde o momento da assinatura do contrato. Se não for requerido nos 30 dias, o efeito do registro somente será observado após a sua efetivação e durante esse período a sociedade será uma sociedade em comum. ~
Importante!
Apesar de ter sido alvo de críticas da doutrina, o Código Civil de 2002 preferiu manter a dualidade de registro para as sociedades e, apesar de ter colocado a sociedade simples dentro do Livro "Do Direito de Empresa", optou pelo seu registro de constituição no Cartório do Registro Civil das Pessoas Jurídicas. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No concurso Para Titular de Serviços de Notas e de Registros do TJ/MA/2011, organizada pelo IESES, foi pedido para assinalar a alternativa correta sobre a sociedade simples que era: "Nos trinta dias subsequentes à sua constituição, a sociedade deverá requerer a inscrição do contrato social no Registro Civil das Pessoas Jurídicas do local de sua sede." Uma situação que oferece grande controvérsia quando se fala na constituição da sociedade simples é a previsão do art. 983 caput do Código Civil que dispõe que: Art. 983. A sociedade empresária deve constituir-se segundo um dos tipos regulados nos arts. i.039 a i.092; a sociedade simples pode constituir-se de conformidade com um desses tipos, e, não o fazendo, subordina-se às normas que lhe são próprias. A primeira parte do dispositivo é de fácil compreensão e nos leva
à conclusão de que a sociedade empresária tem o dever de adotar a forma de sociedade em nome coletivo (arts. 1039/1044), em comandita simples (arts. 1045/1051), limitada (arts. 1052/1087), anônima (arts.
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lo88/1o89) ou em comandita por ações (arts. lrY;J0/1092). Desta feita, não pode a sociedade empresária adotar o tipo sociedade simples. Na segunda parte do artigo supracitado, o legislador usou a expressão '"sociedade simples", porém, não se pode interpretá-la em sentido estrito, ou seja, como sinônimo de tipo societário regulado nos artigos 997 ao 1038 do CC/2002, mas sim em sentido amplo, ou seja, como sinônimo de sociedade não empresária (aquela sociedade que explora uma atividade econômica, mas não de forma organizada, isso é, não exerce empresa). Nesse sentido, pode-se afirmar que a sociedade não empresária (simples em sentido amplo) configura o gênero, sendo a sociedade simples em sentido estrito, regulada nos artigos 997 ao 1038 do CC. uma espécie, mas não a única. Apesar do art. 983, em sua primeira parte, fazer menção aos artigos 1039 a 1092 e na segunda parte dispor que a sociedade simples em sentido amplo (não empresária) tem a faculdade de adotar '"um desses tipos", possibilitando assim a adoção dos tipos previstos nos artigos lo88 e lCYiJO do Código Civil, na realidade deve-se abandonar a interpretação literal e adotar a sistemática, pois o artigo 982, parágrafo único, ia parte, do Código Civil, é claro quando preceitua que as sociedades por ações (anônima e em comandita por ações), independentemente do objeto, são empresárias. Neste diapasão, pode-se concluir que a sociedade não empresária (simples em sentido amplo) não poderá adotar a forma de sociedade por ações, mas poderá adotar a forma de sociedade em nome coletivo, em comandita simples e limitada, mas caso não adote um desses tipos, pois é faculdade, será considerada sociedade simples em sentido estrito, sendo regulada pelos artigos 997 ao 1038. Portanto, as sociedades por ações são sempre sociedades empresárias por determinação legal, porém as sociedades em nome coletivo, em comandita simples e limitada, poderão se consideradas empresárias ou não empresárias (simples em sentido amplo), dependendo da forma pela qual o objeto for explorado, ou seja, se o mesmo pode ser considerado ou não empresa (atividade economicamente organizada). Agora, mesmo que a sociedade simples adote uma das formas possíveis de sociedade empresária, seu registro de constituição continuará ocorrendo no Cartório do Registro Civil das Pessoas Jurídicas.
112
DIREITO SOCIETÁRIO
~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No concurso organizado pelo CESPE para Procurador Federal/2011 foi considerada incorreta a seguinte afirmativa: #Marcelo e Antônio decidiram constituir sociedade simples adotando a forma de sociedade limitada. Nessa situação, o registro de seus atos deverá ser feito no Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das juntas comerciais.#
5.4. Sociedade entre cônjuges Preconiza o art. 977 do Código Civil que os cônjuges que sejam casados sob o regime da comunhão universal de bens, ou no da separação obrigatória não poderão criar sociedade entre si. No que diz respeito às sociedades empresárias, tal situação não gera dúvida e a proibição é válida. Questiona-se, porém, se tal proibição se estende também à sociedade simples. Inicialmente vamos entender o motivo da proibição legal. Na primeira hipótese, a da comunhão universal, a sociedade seria uma espécie de ficção, já que a titularidade das quotas do capital de cada cônjuge na sociedade não estaria patrimonialmente separada no âmbito da sociedade conjugal.
Já no que diz respeito ao regime da separação obrigatória, não seria lógico as partes contratarem sociedade se a lei não lhes permite misturar seus patrimônios no âmbito do casamento. Agora, o questionamento importante é se tal proibição aplica-se às sociedades simples. Isso porque, se formos pensar na sistemática do Código Civil, o art. 997 está inserido no Capítulo li - Da Capacidade, do Título 1- Do Empresário, do Livro li - Do Direito de Empresa e, portanto, estaria ligado diretamente ao assunto da atividade empresária, o que a princípio não se estende à sociedade simples que não pratica atividade empresária. Porém, há que se atentar aos motivos que levaram à estipulação do dispositivo legal e ao fato de ele se referir às sociedades, sem especificar apenas as sociedades empresárias. Assim, deve-se dar maior atenção à interpretação teleológica do texto de lei e estender a proibição às sociedades simples. 113
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
No REsp 2058165/RS, publicado em 21/oS/2009 o tribunal mostrou que a proibição de sociedade entre cônjuges também se aplica às sociedades simples: Direito Empresarial e Processual Civil. Recurso especial. Violação ao art. 535 do CPC. Fundamentação deficiente. Ofensa ao art. 5• da UCC. Ausência de prequestionamento. Violação aos arts. 421 e 977 do CC/02. Impossibilidade de contratação de sociedade entre cônjuges casados no regime de comunhão universal ou separação obrigatória. Vedação legal que se aplica tanto às sociedades empresárias quanto às simples. (.. .)
- O art. 977 do CC/02 inovou no ordenamento jurídico pátrio ao permitir expressamente a constituição de sociedades entre cônjuges, ressalvando essa possibilidade apenas quando eles forem casados no regime da comunhão universal de bens ou no da separação obrigatória.
- As restrições previstas no art. 977 do CC/02 impossibilitam que os cônjuges casados sob os regimes de bens ali previstos contratem entre si tanto sociedades empresárias quanto sociedades simples. Negado provimento ao recurso especial.
5.5. Responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais De acordo com o que foi tratado na classificação das sociedades, estas podem ter autonomia patrimonial própria (limitação de responsabilidade para os sócios) ou imprópria (sócios respondem pelas obrigações da sociedade de forma subsidiária). No caso da sociedade simples, há uma pequena controvérsia sobre como ela seria classificada. Isso porque, o art. 997, no seu inciso VIII dispôs que o contrato social mencionará: VIII - se os sócios respondem, ou não, subsidiariamente, pelas
obrigações sociais. Esse dispositivo legal está fazendo com que a doutrina crie uma dupla interpretação sobre ele. Alguns autores, em uma leitura mais direta do texto da lei, irão dizer que ele permitiu que os sócios escolham qual o tipo de responsabilidade terão. Isso se deve ao fato de que essa expressão "ou não" do dispositivo seria para que os sócios pudessem afirmar que não teriam nenhuma responsabi lidade. Assim, os sócios poderiam, de acordo com a previsão contratual, assumir responsabilidade limitada, ilimitada, subsidiária ou
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DIREITO SOCIETÁRIO
solidária, destacando que dificilmente se encontraria uma sociedade simples em que os sócios assumam responsabilidade ilimitada, arriscando o seu patrimônio pessoal em caso de inadimplemento das obrigações sociais. Porém, surgiu um segundo entendimento que vai ponderar que deixar a cargo dos sócios a escolha da sua própria responsabilidade, ou seja, dos riscos que o seu patrimônio particular irá sofrer com a realização do negócio, não está de acordo com a função social do contrato da sociedade e muito menos com os objetivos do legislador. Isso porque esse instrumento será sempre usado para proteger os sócios, deixando de lado o interesse de terceiros que contratam com a sociedade. Obviamente, se os sócios podem escolher entre a responsabilidade limitada ou ilimitada, ficarão com a primeira e os terceiros ficarão a cargo dessa escolha. Por isso que a doutrina mais tradicional aponta um erro de técnica da elaboração do inciso VIII do art. 997, afirmando que ao invés da expressão "subsidiariamente", deveria ter sido usada a expressão "solidariamente". Esta é a interpretação defendida na 1Jornada de Direito Civil~ promovida pelo Centro de Estudos da Justiça Federal nos dias 11 a 13 de setembro de 2002, cujo enunciado n° 61 dispõe que: Enunciado n° 61 - Art. i.023: o termo "subsidiariamente" constante do inc. VIII do art. 997 do Código Civil deverá ser substituído por "solidariamente" a fim de compatibilizar esse dispositivo com o art. i.023 do mesmo Código.
O art. 1023 do Código Civil determina que: "Se os bens da sociedade não lhe cobrirem as dívidas, respondem os sócios pelo saldo, na proporção em que participem das perdas sociais, salvo cláusula de responsabilidade solidária." Dessa forma, não se pode admitir que dois dispositivos legais tratem do mesmo assunto de forma diferente. Isso geraria uma antinomia do ordenamento jurídico, o que não se pode aceitar. 4.
Todos os enunciados das quatro )ornadas podem ser encontrados no site do Conselho da justiça Federal: http://www.cjf.gov.br
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Uma vez que a limitação de responsabilidade atinge interesses de terceiros de boa-fé, não é possível deixar essa decisão nas mãos dos sócios. No caso das sociedades limitada e anônima, há uma disposição legal expressa autorizando que os sócios respondam de forma limitada. Nesses casos o legislador optou por incentivar a criação de negócios, com a consequente circulação de riquezas que esses proporcionam. Mas essa deve ser uma opção do legislador e não dos sócios. Ricardo Negrão, de forma objetiva, ao apresentar quadro dos diversos tipos de responsabilidade do sócio, afirma simplesmente que na sociedade simples a responsabilidade do cotista é "pelo saldo, na proporção em que participe das perdas sociais, subsidiariamente ao patrimônio social." Esse segundo entendimento, portanto, é o que vem prevalecendo na doutrina e na jurisprudência também. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Na maioria dos julgados do STJ o entendimento é de que a responsabilidade dos sócios é ilimitada, conforme se pode observar na ementa do REsp 895792/RJ, publicado em 25/04/2011: "RECURSOS ESPECIAIS. CIVIL E EMPRESARIAL EXTINTA RIO 2004 S/C. CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS DE MARKETING. AÇÃO DE COBRANÇA E DE RESSARCIMENTO AJUIZADA EM FACE DAS SUAS ANTIGAS SÓCIAS. (...) li - Condenação das suas antigas sócias ao pagamento dos valores devidos em razão da confecção, pela prestadora dos serviços, da parte relativa ao ma™eting do texto entregue ao Comitê Olímpico e, ainda, ao ressarcimento de quantias adiantadas. (...)
IV - Nas sociedades em que a responsabilidade dos sócios perante as obrigações sociais é ilimitada, como ocorre nas sociedades simples (art. io23 do CC/02), não se faz necessária, para que os bens pessoais de seus sócios respondam pelas suas obrigações. a desconsideração da sua personalidade. Doutrina. V - Consequente legitimidade passiva 'ad causam' das antigas sócias da RIO 2004 S/C para responderem pelas obrigações contratuais assumidas pela sociedade. (...)
Vlll - RECURSOS ESPECIAIS DESPROVIDOS.
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O que é permitido em termos de limitação de responsabilidade dos sócios na sociedade simples é que ela ocorra entre os sócios, atendendo ao que dispõe o art. 997, VII, do Código Civil, que determina que o contrato mencionará "a participação de cada sócio nos lucros e nas perdas". Se se estipula, portanto, que um sócio ficará responsável, por exemplo, por 10°k. das perdas, isso não significa limitação para terceiros, mas quando do direito de regresso, este sócio somente arcará com este percentual das obrigações da sociedade. Esse entendimento foi explanado na 1Jornada de Direito Comercial do Centro de Estudos da Justiça Federal. Enunciado n•10: Nas sociedades simples, os sócios podem limitar suas responsabilidades entre si, à proporção da participação no capital social, ressalvadas as disposições específicas.
Importante lembrar que essa limitação da responsabilidade não pode afrontar o previsto no art. 1oo8 de que "é nula a estipulação contratual que exclua qualquer sócio de participar dos lucros e das perdas_" Não pode haver ausência total de responsabilidade. 5.6. Obrigações e direitos dos sócios Constituída a sociedade ela vai passar a exercer a sua atividade e aí surgem várias relações entre os sócios e dos sócios para com a sociedade. Iniciemos o estudo dessas relações pelas principais obrigações. A principal obrigação dos sócios da sociedade simples é integralizar o capital social. ou seja, efetivar a parte que lhe compete na formação do capital, pagando o valor em dinheiro, transferindo o patrimônio ou prestando o serviço, de acordo com o que ficou estipulado em contrato. Isso porque, neste tipo societário o capital pode ser integralizado com dinheiro, bens ou serviços. O sócio que não integraliza suas cotas é chamado se sócio remisso e poderá, de acordo com o art. 1004 e seu parágrafo único, ocorrer as seguintes hipóteses: os sócios optarem por realizar a cobrança judicial do sócio remisso; exclui-lo, devolvendo-lhe o que ele houver pago e fazendo a consequente redução no capital social; ou, no caso de ele já ter integralizado alguma parte, reduzir sua participação ao montante já realizado, também fazendo a devida redução no capital. 117
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O Código Civil foi bastante complacente com o sócio remisso, pois o caput do art. ioo4 vai exigir que para que o sócio seja efetivamente constituído em mora, a sociedade terá que notificá-lo para fazer a integralização do capital social em 30 dias, sendo que somente após esse fato é que as alternativas acima poderão ser tomadas. Ser executado pela sociedade e pagar o devido Ter sua participação reduzida ao que já foi integralizado, caso já tenha realizado algo Ser excluído da sociedade
Se o sócio for integralizar com serviços ele deverá fazê-lo com exclusividade para a sociedade e é por isso que o art. ioo6 dispõe que: "O sócio, cuja contribuição consista em serviços, não pode, salvo convenção em contrário, empregar-se em atividade estranha à sociedade, sob pena de ser privado de seus lucros e dela excluído." Além dessas obrigações legais, pode-se afirmar que os sócios terão obrigação de participarem efetivamente da sociedade simples. Não se quer dizer aqui que todos os sócios precisam participar da gestão, mas ao menos participar das deliberações dos sócios, das ideias para a boa continuidade da sociedade. Se o sócio se omite de tal participação e são tomadas decisões que contrariem a lei, ele poderá ser responsabilizado por esse ato omisso, pois não é característica da sociedade simples o sócio ser um mero investidor. Passemos agora a análise dos principais direitos dos sócios. O objetivo principal de se estar em uma sociedade é a divisão de esforços e investimentos para buscar uma maior lucratividade e em sendo assim, a participação dos sócios nos lucros é um direito que não pode ser retirado nem por votação, muito menos pelo contrato social. O art. ioo8 do Código Civil diz que é nula a cláusula que exclua o sócio de participar dos lucros e das perdas. Houve uma modificação interessante em relação às legislações anteriores que anulavam todo o contrato caso ele contivesse uma cláusula desse gênero. Agora se anula apesar da cláusula.
Ao sócio também deve ser dado o direito de sair da sociedade. Isso porque a própria Constituição Federal, em seu art. 5, XX preconiza que
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ninguém será obrigado a se associar ou manter-se associado contra a sua vontade. Serão duas formas diferentes que o sócio poderá sair da sociedade: através da cessão das suas quotas ou através do exercício do direito de retirada. Por ser a sociedade simples considerada de pessoas, a cessão de quotas depende do consentimento de todos os sócios (art. ioo3) e no caso de ocorrer a venda, o sócio que sair da sociedade permanecerá por até 2 anos co-responsável pelas dívidas sociais. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame organizado pela FCC para Advogado do Metrô/SP/2012, o enunciado da questão começava afirmando HNo tocante à sociedade simples, na cessão total ou parcial de quota, responde o cedente solidariamente com o cessionário, perante a sociedade e terceiros, pelas obrigações que tinha como sócio até". E a resposta a ser assinalada era "dois anos depois de averbada a modificação do contrato." Em virtude da affectio societatis, não se pode obrigar o sócio da sociedade simples estar em sociedade com alguém que ele não queira, desta forma para alterar o quadro societário é preciso de autorização de todos os sócios, mesmo daquele que tenha uma participação pequena na sociedade. Mesmo que seja para transferir a quota para outro sócio essa autorização será necessária. Como a saída do sócio através de cessão de quotas se dá de forma restrita, o direito de retirada, nas sociedades de prazo indeterminado, se dá de forma livre, com a simples notificação do sócio retirante aos demais sócios, com antecedência mínima de 60 dias. Isso para que seja atendido o direito constitucional previsto no art. 5°, XX da Constituição Federal mencionado acima. É óbvio que essa questão somente possui relevância nas sociedades de prazo indeterminado, já que nas de prazo determinado foi o sócio quem escolheu livremente o tempo em que permaneceria vinculado. No direito de retirada haverá a liquidação da quota do sócio retirante, ou seja, ele irá sair e levará com ele o correspondente patrimonial das suas quotas. Para tanto deverá ser feito um balanço patrimonial para aferir o patrimônio líquido do momento da retirada. O sócio
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receberá de acordo com a porcentagem que possui no capital social que deverá ser reduzido proporcionalmente. Também pelo fato de ser a sociedade simples uma sociedade de pessoas, os sócios têm o direito de participar das deliberações sociais. Qualquer decisão que vá trazer alterações de maior profundidade no funcionamento da sociedade deve contar com a participação de todos os sócios. Inclusive, para alterar o contrato social, no que diz respeito às matérias básicas que estão previstas no art. 997 do Código Civil, o art. 999 exige aprovação unânime dos sócios. As demais deliberações serão aprovadas se houver maioria absoluta do capital, lembrando que as deliberações de sócios no direito societário seguirão sempre a proporção de capital que o sócio detenha, não sendo apurado voto per capita. Nem todos os sócios participarão da administração da sociedade simples, mas são os administradores quem irão contrair as obrigações que poderão recair sobre o patrimônio dos sócios, segundo entendimento majoritário. Dessa forma, será fundamental dar ao sócio o direito de fiscalizar a gestão da sociedade. 5.7. Administração Como estamos a estudar o primeiro tipo societário deste trabalho, cumpre observar que a administração da sociedade é a gestão da mesma. Ser administrador é ser responsável pelo funcionamento da sociedade para que ela possa alcançar seu objeto social e, portanto, será essa pessoa que irá ser o representante legal da pessoa jurídica. A administração das sociedades simples pode competir a pessoas físicas ou pessoas jurídicas, tendo em vista a inexistência de proibição em relação a essas últimas. Em se tratando de pessoas físicas, as mesmas devem demonstrar sua idoneidade para administrar a sociedade. Há que se impor restrições, protegendo à própria sociedade e o mercado consumidor. Caso a administração compita a todos os sócios, a regra geral que esta se dará separadamente.
é
Os sócios administradores nomeados no contrato social não poderão ser destituídos, salvo justa causa reconhecida judicialmente, a pedido de qualquer dos sócios (art. i.019). Tal solução se justificaria pelo fato de que a destituição desse sócio administrador implicaria a
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alteração do contrato social, o qual exige a unanimidade dos sócios, que não seria alcançada. Por isso, exige-se que a justa causa seja reconhecida em juízo, porquanto autorizaria a exceção à regra da unanimidade. Assegura-se, pois, um direito ao cargo de administrador àqueles nomeados no contrato social, que não descumpram seus deveres. • Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame organizado pelo CESPE da Magistratura Federal/3• Região/2010 a afirmativa correta a ser marcada dizia que: "Em qualquer hipótese, o sócio administrador pode ser destituído mediante decisão judicial, que reconheça a ocorrência de justa causa para esta destituição". Ocontrato social pode organizar o poder de administração, dividindo as atribuições entre diversas pessoas, definindo a competência de cada um, ou exigindo que os atos sejam praticados em conjunto. Nesse último caso, há que se obedecer ao estipulado no contrato social, salvo casos de urgência, nos quais um sócio poderá praticar os atos isoladamente a fim de evitar danos à própria sociedade (art. i.014). O Código Civil de 2002 inovou no que tange à responsabilidade do administrador quando atua fora de seus poderes. Art. 1.015. No silêncio do contrato, os administradores podem praticar todos os atos pertinentes à gestão da sociedade; não constituindo objeto social, a oneração ou a venda de bens imóveis depende do que a maioria dos sócios decidir. Parágrafo único. O excesso por parte dos administradores somente pode ser oposto a terceiros se ocorrer pelo menos uma das seguintes hipóteses: 1 - se a limitação de poderes estiver inscrita ou averbada no registro próprio da sociedade; li - provando-se que era conhecida do terceiro; Ili - tratando-se de operação evidentemente estranha aos negócios da sociedade. Assim, o parágrafo único do artigo acima se filia à Teoria dos Atos Ultra Vires e responsabiliza apenas o administrador pelos atos pratica-
dos fora dos seus limites de poder. A sociedade não é responsabilizada. Essa foi uma inovação do Código Civil de 2002 que vem recebendo críticas, pois deixa o terceiro de boa-fé em uma situação de dificuldade para receber seu crédito. O que se diz é que o legislador fechou os 121
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olhos para a evolução do mercado, em que os negócios são praticados com menos formalidade e maior celeridade. Nesse contexto, mostra-se incompatível exigir de quem contrate com a sociedade que sempre analise seu contrato social para saber exatamente quais são os poderes do administrador. A doutrina tenta compatibilizar o dispositivo citado com a realidade prática e por isso a 1Jornada de Direito Comercial do Conselho da Justiça Federal aprovou anunciado sobre o tema: • Enunciado n° 11 : A regra do art. i.015, parágrafo único, do Código Civil deve ser aplicada à luz da teoria da aparência e do primado da boa-fé objetiva, de modo a prestigiar a segurança do tráfego negocial. As sociedades se obrigam perante terceiros de boa-fé. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
A tendência do tribunal é criticar a inovação do Código Civil no que diz respeito ao art. io15 e seu parágrafo único. No REsp 704546/DF. publicado em o8/o6/2010, ficou demonstrado este entendimento: DIREITO COMERCIAL SOCIEDADE POR QUOTAS OE RESPONSABILIDADE LIMITADA. GARANTIA ASSINADA POR SÕCIO A EMPRESAS DO MESMO GRUPO ECONÔMICO. EXCESSO DE PODER. RESPONSABILIDADE DA SOCIEDADE. TEORIA DOS ATOS ULTRA VIRES. INAPLICABILIDADE. RELEVÂNCIA DA BOA-Ft E DA APAR~NCIA. ATO NEGOCIAL QUE RETORNOU EM BENEFÍCIO DA SOCIEDADE GARANTIDORA. (...)
3. A pa11ir do Código Civil de 2002, o direito brasileiro, no que concerne às sociedades limitadas, por força dos a11s. 1.015, § único e i.053, adotou expressamente a ultra vires doctrine. 4. Contudo, na vigência do antigo Diploma (Decreto n.0 3.7o8/19, art. 10), pelos atos ultra vires, ou seja, os praticados para além das forças contratualmente conferidas ao sócio, ainda que extravasassem o objeto social, deveria responder a sociedade. 4. No caso em julgamento, o acórdão recorrido emprestou, corretamente, relevância à boa-fé do banco credor. bem como à aparência de quem se apresentava como sócio contratualmente habilitado à prática do negócio jurídico. 5. Não se pode invocar a restrição do contrato social quando as garantias prestadas pelo sócio, muito embora extravasando os limites de gestão previstos contratualmente, retomaram, direta ou indiretamente. em pro· veito dos demais sócios da sociedade fiadora, não podendo estes, em absoluta afronta à boa-fé, reivindicar a ineficácia dos atos outrora praticados pelo gerente. 6. Recurso especial improvido.
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Pode-se citar ainda julgado constante do Informativo 437/2012: GARANTIA HIPOTECÁRIA. SÓCIO-GERENTE. Não se pode invocar a restrição do contrato social quando as garantias prestadas pelo sócio, muito embora extravasando os limites de gestão previstos contratualmente, retornaram, direta ou indiretamente, em proveito dos demais sócios da sociedade fiadora, não podendo eles, em absoluta afronta à boa-fé, reivindicar a ineficácia dos atos outrora praticados pelo gerente. Rfsp 704.546, rei. Min. luis f. salomão, i 0 .6.10. 4• T.
• Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No prova para Advogado da INVESTE RI0/2011, foi abordado o assunto no que diz respeito às qualidades do administrador nomeado na sociedade e foi requerido que se assinalasse a alternativa correta, que era a que dizia: "não podem ser administradores os condenados por crime falimentar, por até 10 (dez) anos após a cessação dos efeitos da condenação". Tal proibição encontra-se no parágrafo único do art. 1011 do Código Civil.
5.8. Dissolução A sociedade tem começo meio e fim. Este encerramento é dividido em três etapas. A primeira é a dissolução, que é marcada pelo encerramento das atividades e posterior passagem para a fase da liquidação, que é a segunda etapa do encerramento, sendo que a terceira é a baixa definitiva do registro. A dissolução da sociedade simples ocorre nos casos previstos nos art. 1033 (dissolução de pleno direito) e io34 (dissolução judicial): Art. i.033. Dissolve-se a sociedade quando ocorrer: 1- o vencimento do prazo de duração, salvo se, vencido este e sem oposição de sócio, não entrar a sociedade em liquidação, caso em que se prorrogará por tempo indeterminado; li - o consenso unânime dos sócios;
Ili - a deliberação dos sócios, por maioria absoluta, na sociedade de prazo indeterminado;
IV - a falta de pluralidade de sócios, não reconstituída no prazo de cento e oitenta dias; V - a extinção, na forma da lei, de autorização para funcionar.
Sendo a sociedade de prazo determinado, ela será dissolvida plenamente quando vencer o prazo que foi inicialmente estipulado. 123
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Isso porque, estaremos diante de um acordo de vontades que estipulou o limite temporal para o funcionamento do contrato. Porém, a sociedade poderá, de forma tácita, ser "transformada" em sociedade de prazo indeterminado se após o vencimento do prazo ela continua normalmente com suas atividades, sem que nenhum sócio reivindique sua paralisação. Poder-se-ia, nesse caso, fazermos uma analogia com o contrato de locação de bens imóveis que, se no vencimento nenhuma das partes efetivar o encerramento do contrato, passa a ser de prazo indeterminado. O inciso li trata do consentimento unânime dos sócios para dissolver a sociedade. Ora, se a sociedade é formada por um acordo de vontades, esse mesmo acordo poderá encerrá-la, sendo de prazo determinado ou indeterminado. É a autonomia da vontade que irá prevalecer nesse caso. Já o inciso Ili orienta-se pelo princípio da maioria societária que é algo que só ocorrerá nas sociedades de prazo indeterminado. Tendo aprovação da maioria, a sociedade poderá ser dissolvida a qualquer tempo. Dentro da base do direito brasileiro que é a de sociedade pluripessoal, o inciso IV diz que a sociedade deverá ser dissolvida se não for reconstituída a pluralidade de sócios num prazo de 180 dias. Isso significa que poderá haver a unipessoalidade de modo temporário, mas não de forma permanente. Por fim o último inciso vai tratar das atividades que dependem de autorização para funcionar (atividade de ensino, por exemplo). Caso essa autorização seja perdida, não se justifica a continuação da sociedade, pois ela não tem mais objeto e, portanto, deverá ser dissolvida. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No concurso do MPE/PR/2011, foi requerido que se assinalasse a alternativa correta sobre a sociedade simples e a alternativa a ser marcada era a que dizia que: "o Ministério Público pode postular a dissolução da sociedade no caso de cessação de sua autorização de funcionamento".
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Agora, no art. 1034 do Código Civil encontram-se as hipóteses de dissolução judicial, vejamos: Art. i.034. A sociedade pode ser dissolvida judicialmente, a requerimento de qualquer dos sócios, quando: J-
anulada a sua constituição;
li - exaurido o fim social, ou verificada a sua inexequibilidade.
Inicialmente é preciso ressaltar que a ação pode ser proposta por qualquer sócio, independente de qual a participação que ele possui no capital social. Apesar de serem dois incisos, três são os motivos que podem ser levantados para o pedido de dissolução judicial. A anulação da constituição se refere ao fato de a sociedade ser constituída por um contrato e este estar sujeito a qualquer invalidade dos negócios jurídicos. Porém, por se tratar de um contrato sui generis, sua anulação não vai ter efeitos retroativos e sim a dissolução da sociedade. O segundo argumento que pode ser levantado é o exaurimento do fim social. Este pode ser entendido sob dois prismas diferentes. O primeiro é quando o objeto social não tem mais como ser realizado, por exemplo, por ser uma atividade que não tem mais lugar no mercado e o outro ponto de vista é o fim social ser entendido como a própria affectio societatis, ou seja, nos casos em que os sócios não estão mais se entendendo e não têm condições de continuarem dividindo o negócio. A terceira hipótese que pode embasar o pedido da dissolução é se a sociedade estiver inexequível, ou seja, ainda não se encontra em situação de insolvência, mas se continuar o funcionamento vai acabar chegando a essa situação. Para evitar tal extremo, o sócio pode provar que esta possibilidade é real e pedir para acabar com a sociedade, antes que ele tenha prejuízos com ela. Na dissolução de pleno direito, ocorrendo uma das hipóteses, a sociedade encerra suas atividades e passa para a liquidação. Já na dissolução judicial, somente após o trânsito em julgado da sentença é que terá início a próxima fase.
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Após a dissolução a sociedade entrará em liquidação, cujo procedimento é o mesmo para todas as sociedades contratuais e, por isso, será estudada mais adiante. ~
Como
esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame organizado pela FCC para Advogado do Metrô/SP/2011, deveriam ser analisadas três alternativas, a primeira dizia "a sociedade por prazo indeterminado pode ser dissolvida por deliberação dos sócios, por maioria absoluta" e foi considerada correta. A segunda afirmava que "dissolvida de pleno direito a sociedade, pode o sócio requerer, desde logo, a liquidação judicial" também estava correta. Já a terceira era incorreta, pois afirmava que "além das hipóteses previstas em lei, o contrato não pode prever outras causas de dissolução."
6. SOCIEDADE LIMITADA 6.1. Introdução Se a sociedade simples é a única espécie de sociedade não empresária, quando o objeto da sociedade for uma atividade empresária, cinco serão os tipos que poderão ser escolhidos pelos sócios: sociedade em nome coletivo, sociedade em comandita simples, sociedade em comandita por ações, sociedade limitada e sociedade anônima. A sociedade limitada surgiu da necessidade de se criar um tipo societário que oferecesse o benefício da limitação de responsabilidade aos sócios, mas que tivesse menor complexidade que a única sociedade que oferecia tal limitação à época que é a sociedade anônima. Esta, como será visto no próximo item, demanda a existência de grande investimento, tendo em vista se tratar se uma sociedade que exige grande burocracia. Sendo assim começou-se a demandar por um tipo societário que atendesse aos investimentos de pequeno e de médio porte e com isso surgiu inicialmente o tipo que foi chamado de "sociedade por quotas de responsabilidade limitada." Tal nomenclatura sempre foi alvo de críticas, tendo em vista que passava a ideia que as quotas é que tinham responsabilidade limitada, quando na verdade quem a tem são os sócios.
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Em 2002, o Código Civil alterou completamente o regulamento dessa sociedade, tendo em vista que revogou de forma completa o decreto 3.708/19 que a criou. Várias mudanças foram implementadas, inclusive a nomenclatura do tipo que agora é apenas "sociedade limitada". Nos dias atuais a sociedade limitada é o tipo societário de maior utilidade na prática da atividade empresária. Certamente tal fato se dá pela possibilidade de o tipo societário atender a todos os portes de atividade. Tanto um pequeno investimento pode ser constituído sob a forma de limitada quanto um investimento de porte muito superior. É um tipo que dá o benefício da limitação de responsabilidade, mas que não oferece muita burocracia e nem controle por parte de órgãos governamentais. 6.2. Conceito A sociedade limitada é o tipo de sociedade que tem como objeto social a prática de uma atividade empresária, que tem seu capital dividido em quotas e na qual cada sócio responde pelo valor de sua quota, porém, todos terão responsabilidade solidária pela integralização do capital social. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova da Magistratura/RJ/2011, a questão envolvia diversos assuntos sobre sociedade limitada, pois pedia para analisar 4 afirmativas e depois encontrar a resposta correta. A primeira assertiva dizia: "A sociedade limitada rege-se, no que for omisso o Código Civil, pelas normas da sociedade simples ou, havendo previsão expressa no contrato social, pelas normas da sociedade anônima", que está correta. A segunda afirmativa também se encontrava correta e tinha o seguinte texto: "Tratando-se de sócio nomeado administrador no contrato social, sua destituição somente se opera pela aprovação de titulares de quotas correspondentes, no mínimo, a dois terços do capital social, salvo disposição contratual diversa." Também correta era a terceira assertiva cujo texto era: "Omisso o contrato social, o sócio pode ceder suas quotas,total ou parcialmente: (1) a quem seja sócio, sem a necessidade de prévia audiência dos demais sócios, ou (11) a pessoa estranha, se não houver oposição de titulares de mais da metade do capital social." Já a quarta era incorreta já eu afirmava que "O capital social divide-se em cotas, todas elas iguais, cabendo uma ou diversas a cada sócio."
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6.3. Responsabilidade dos sócios pelas obrigações sociais Corno já mencionado, urna das principais características da sociedade limitada, que inclusive justificou sua criação, é a limitação de responsabilidade dos sócios pelas obrigações contraídas pela pessoa jurídica. Tal limitação encontra-se positivada atualmente no art. 1052 do Código Civil. Art. i.052. Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social.
A primeira parte do dispositivo trata da limitação de responsabilidade, também conhecida corno autonomia patrimonial própria, cuja explicação do funcionamento remete o leitor ao que já foi estudado no item 2.4. A sociedade será formada pela integralização das quotas pelos sócios e a partir de então passa a ser a responsável pelas suas obrigações. Salvo algumas exceções, não terão mais os sócio corno serem responsabilizados por tais compro metimentos. • Importante! A sociedade limitada oferece a limitação da responsabilidade, mas os sócios irão responder solidariamente pela integralização do capital soàal. se um não integralizar o outro poderá ser demandado. • Como esse assunto foi cobrado em concurso? No concurso de organização da FCC para Notário/TJAP/2011, o enunciado da questão afirmava: ·uma vez totalmente integralizado o capital social, a responsabilidade dos sócios, por dívidas sociais, nas sociedades limitadas· e a resposta correta era: •é excepcional e depende de disposição legal específica, como no caso de desconsideração da personalidade jurídica." A segunda parte do art. 1052 traz urna questão importante que é a solidariedade pela integralização. Isso quer dizer que mesmo aquele sócio que já integralizou poderá ser demandando pela integralização do outro caso haja necessidade. Sendo assim, a responsabilidade solidária nesse tipo de sociedade se dá no caso de integralização do capital social no caso dos credores cobrarem o que
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falta
à integralização
do capital social a qualquer um dos sócios, ten-
do o sócio que pagou as quotas não integralizadas pelo seu titular o direito de regresso . ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova da Magistratura/PB/2011, a alternativa correta a ser assinala era a que dizia: MNa sociedade limitada, a responsabilidade dos sócios pela integralização do capital é solidária.#
~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Diversos acórdãos são encontrados comprovando que a sociedade limitada possui autonomia patrimonial própria e que, salvo as exceções, o patrimônio do sócio não pode ser utilizado para pagar dívidas da sociedade. Um acórdão que pode ser usado como exemplo é o do Resp 757.865/SP, publicado em 12/o6/2006 cuja ementa é a seguinte: RECURSO ESPECIAL EXECUÇÃO. DivloA DA SOCIEIW>E DE RESPONSABILIDADE LIMITADA. PENHORA DAS QUOTAS SOCIAIS, PERTENCENTES AOS SÓCIOS. INEXIS· rtNCIA DE QUALQUER HIPÕTESE QUE AUTORIZE A CONFUSÃO DOS PATRIMÔNIOS. IMPOSSIBILIDADE. - Salvo em hipóteses taxativamente previstas em lei, o patrimônio dos sócios não responde por dívidas da sociedade. Por isso, não é lícita a penhora das quotas sociais em execução movida contra a pessoa jurídica.
Responsabilidade dos sócios na sociedade limitada capital totalmeme Integralizado Regra: nenhum sócio responde mais pelas obrigações da sociedade que são apenas da pessoa jurídica
Exceção: se houver desconsideração da personalidade jurídica ou se tratar de determinas espécies de dívida, pode responsabilizar os sócios.
capital não Integralizado Regra: qualquer dos sócios pode ser demandado somente pelo que falta a integralizar.
Exceção: se houver desconsideração da personalidade jurídica ou se tratar de determinas espécies de dívida, pode responsabilizar os sócios, além do que falta para integralizar.
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6.4. Constituição A sociedade limitada também será constituída por contrato social, que de acordo com o art. 1054 deverá utilizar, no que for compatível, os requisitos do art. 997 (sociedade simples), porém, aqui, por ser sociedade empresária, o contrato será levado à registro na Junta Comercial. Os requisitos do art. 997 já foram analisados no item referente à sociedade simples, mas tem um detalhe importante que é o fato de na sociedade limitada não poder haver integralização com serviços, portanto, o inciso V não tem aplicabilidade aqui. O prazo para o registro também será de 30 dias, de acordo com o art. 36 da Lei 8934-94 e se não houver o registro no prazo a sociedade não adquirirá personalidade jurídica. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova da Magistratura/PA/2012, organizada pelo CESPE, pedia-se para assinalar a afirmativa correta que era "O contrato social, instrumento assinado pelos sócios para ajustamento de seus interesses recíprocos, é o ato celebrado entre os sócios da sociedade limitada." Tema importante na Ltda. é sobre sua regência supletiva. A regra geral com o Código Civil passou a ser de que a regência será pelas regras da sociedade simples, mas o parágrafo único do art. 1053 permite que o contrato possa prever regência supletiva pela Sociedade Anônima. Essa previsão contratual se mostra importante na medida em que a sociedade limitada tem a característica de ser um tipo societário que atende a diversos portes de investimento. Dessa forma, essa previsão contratual facilita a delimitação das características principais da limitada, aproximando-a mais de uma sociedade simples ou de uma sociedade anônima. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame organizado pelo CESPE para Advogado da EBC/2011, foi considerada correta a seguinte afirmativa: "Caso três irmãos se reúnam e constituam a sociedade KLM Serviços Gerais Ltda., o contrato social poderá prever a regência supletiva da referida sociedade limitada pelas normas da sociedade anônima."
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6.5. Quotas
As quotas dividem o capital social da sociedade limitada e o art. 1055 do Código Civil permite que elas tenham valores iguais ou desiguais. Poderemos ter, por exemplo, uma sociedade que tenha o capital social de RS 40.000,00 e três sócios. Imaginemos que o sócio A irá integralizar RS 5.000,00, o sócio B RS 15.000,00 e o sócio C RS 20.000,00. O contrato poderá prever que o capital será dividido em apenas 3 quotas, a quota "Q1" que vale RS 5.000,00 e será adquirida pelo sócio A, a quota "Q2" que irá valer RS 15.000,00 e será adquirida pelo sócio B e a quota "Q3" de valor de RS 20.000,00 e que será adquirida pelo sócio e. Essa situação não é muito comum, talvez pela previsão do art. 1056 que prevê que as quotas são indivisíveis. Isso quer dizer que
ninguém poderá ser titular de Y2 quota ou ~ de quota. Nesse contexto, se a pessoa é titular de apenas uma quota e vem a falecer e seus herdeiros lhe substituem, eles terão que ficar em condomínio com a quota. Perante a sociedade eles representarão um sócio e a única forma de se desfazer de tal condomínio é através da venda da quota e partilha do resultado obtido. Por falar em venda de quota, a cessão de quotas é um pouco mais livre que a sociedade simples. Art. i.057. Na omissão do contrato, o sócio pode ceder sua quota, total ou parcialmente, a quem seja sócio, independentemente de audiência dos outros, ou a estranho, se não houver oposição de titulares de mais de um quarto do capital social. Parágrafo único. A cessão terá eficácia quanto à sociedade e terceiros, inclusive para os fins do parágrafo único do art. i.003, a partir da averbação do respectivo instrumento, subscrito pelos sócios anuentes.
Primeiramente é importante observar que o dispositivo começa com a expressão "na omissão do contrato". Isso nos dá a ideia de que o ideal em uma sociedade limitada é que o próprio contrato social preveja como se dará a cessão de quotas, reforçando o que foi dito anteriormente que a ltda. é um tipo societário que se adapta a vários portes de investimento. Essa é uma das características que faz com que, na classificação entre sociedade de pessoas e de capitais, a sociedade limitada seja 131
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chamada de híbrida, ou seja, algumas serão consideradas de pessoas, caso o contrato limite a venda de quotas, por exemplo, enquanto outras serão consideradas de capitais, quando o contrato liberar a venda de quotas. Uma ressalva importante é a de que se a cessão seguir a regra legal, quando ela for feita a terceiros, o dispositivo legal fala em não haver oposição de titulares de mais de Y. do capital. Assim, não há necessidade que os sócios assinem dando a concordância, mas apenas não se manifestem contrariamente à cessão. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova da Magistratura/MG/2012 organizada pela EJEF. o enunciado pedia para marcar a alternativa correta a respeito da sociedade limitada e a resposta era exatamente o texto de lei e dizia: HNa omissão do contrato, o sócio pode ceder sua quota, total ou parcialmente, a quem seja sócio, independentemente de audiência dos outros, ou a estranho, se não houver oposição de titulares de mais de um quarto do capital social." A integralização das quotas da ltda. pode ser feitas com bens, créditos ou com dinheiro, devendo estar bem detalhado no contrato social o modo como será feita essa realização do capital, informando qual será a forma, o prazo, se será feita de forma parcelada ou de uma única vez. Lembrando o que foi explicado anteriormente, quando tratávamos da responsabilidade dos sócios pelas obrigações da sociedade limitada, a integralização do capital é que vai ser responsável pela formação do patrimônio da pessoa jurídica e uma vez realizado integralmente, passa-se a ter a regra que somente ele quem irá ser utilizado para arcar com as obrigações sociais. Com isso, é importante que o valor do capital social seja efetivamente integralizado tal qual descrito no contrato e que não ocorra uma subcapitalização. Isso poderá ocorrer no caso da integralização ser realizada com bens e o legislador se preocupou em proteger tal fato. Quando se tem a integralização com dinheiro ou créditos basta observar a contabilidade para saber se o valor foi direcionado corretamente para os cofres da sociedade. Já no caso dos bens, eles terão que ser estimados, valorados e quem faz tal estimativa são os sócios
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no contrato. Por exemplo, uma transportadora que um sócio integralize sua parte com dois caminhões usados. Claro que existem tabelas de parâmetro para o preço dos caminhões, mas são os sócios que irão estipular em contrato qual o valor será designado para esses bens. Imaginemos que seja colocado um valor muito superior ao de mercado, v.g, R$5omil cada um, sendo que o valor médio é R$3omil, estará ocorrendo a subcapitalização, já que no contrato irá constar que o sócio integralizou R$1oomil com os dois caminhões quando na verdade somente se efetivou R$6omil. o §10 do art. 1055 regulamenta tal situação, vejamos: § lº Pela exata estimação de bens conferidos ao capital social respondem solidariamente todos os sócios, até o prazo de cinco anos da data do registro da sociedade.
Significa dizer que se for questionado o valor dado aos bens integralizados e de fato eles estiverem sido supervalorizados, haverá a necessidade de complementação do valor e essa obrigação irá recair solidariamente para todos os sócios. Consequência plausível já que ao assinar o contrato, todos os sócios concordaram com a estimativa de bens e havendo erro devem responder solidariamente. Voltando ao exemplo dado acima, comprovada a superestimação dos caminhões em R$6omil, tal valor pode ser cobrado de qualquer sócio solidariamente, independente de quem já realizou toda sua parte capital. A 1 Jornada de Direito Comercial trouxe dois enunciados sobre o tema: Enunciado n° 12: A regra contida no art. 1.055, § lº, do Código Civil deve ser aplicada na hipótese de inexatidão da avaliação de bens conferidos ao capital social; a responsabilidade nela prevista não afasta a desconsideração da personalidade jurídica quando presentes seus requisitos legais. Enunciado n° 18: O capital social da sociedade limitada poderá ser integralizado, no todo ou em parte, com quotas ou ações de outra sociedade, cabendo aos sócios a escolha do critério de avaliação das respectivas participações societárias, diante da responsabilidade solidária pela exata estimação dos bens conferidos ao capital social, nos termos do art. i.055, § i 0 , do Código Civil.
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Cada sócio terá que integralizar sua parte no capital social de acordo com o contrato e na ltda. não é possível a integralização com serviços. (art. 1055, § 2°) • Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No cename organizado pelo CESPE para Oficial da ABIN/2010, foi considerada incorreta a seguinte afirmativa: "Nas sociedades limitadas, cujo capital social divide-se em quotas, iguais ou desiguais, há possibilidade de a contribuição de um sócio ser feita mediante a prestação de serviços." O sócio que não integraliza sua parte no capital social também é chamado de sócio remisso . O art. 1058 diz que as hipóteses do art. ioo4 também são aplicadas às limitadas, mas cria uma quarta possibilidade, de os sócios tomarem para si ou transferirem a terceiros as quotas do sócio remisso. Estabelece uma espécie de alienação compulsória. Assim, por disposição expressa, as hipóteses de sócio remisso da sociedade simples também podem ser aplicadas na limitada. O que o legislador fez foi acrescentar duas novas possibilidades quando os demais sócios optam por excluir o remisso, vejamos: Opções para o sócio remisso
Ser executado pela sociedade e pagar o devido Ter sua pallicipação reduzida ao que já foi integralizado, caso já tenha realizado algo Com redução do capital Ser excluído da sociedade
Tomando os sócios as quotas para si Transferindo a quota para terceiros
Ainda sobre as quotas, uma questão de grande importância é a possibilidade de penhora de quotas por dívidas particulares de sócios.
As quotas são bens patrimoniais e, por isso, têm possibilidade de serem utilizadas para atender aos interesses dos credores particulares dos sócios, porém, se foram penhoradas, as quotas irão à hasta pública e ao serem arrematadas passarão para a propriedade do arrematante que adquirirá a condição de sócio da sociedade. E esse é o ponto
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que gera polêmica, pois nem sempre uma sociedade limitada permite a entrada livre de um novo sócio na sociedade. Em 2oo6 o Código de Processo Civil foi alterado pela Lei 11.382, sendo que seu art. 655 passou a vigorar com o seguinte texto: Art. 655. A penhora observará, preferencialmente, a seguinte ordem: 1- dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira; li - veículos de via terrestre; Ili - bens móveis em geral;
IV - bens imóveis; V - navios e aeronaves; VI - ações e quotas de sociedades empresárias; VII - percentual do faturamento de empresa devedora; VIII - pedras e metais preciosos; IX - títulos da dívida pública da União, Estados e Distrito Federal com cotação em mercado; X - títulos e valores mobiliários com cotação em mercado; XI - outros direitos.
Em virtude disso, alguns entenderam que a polêmica da possibilidade de penhora de quotas estava resolvida, pois agora havia o permissivo legal. Mas não é bem assim. A sociedade limitada continua sendo híbrida, ou seja, algumas são classificadas como sendo sociedade de pessoas e outras de capitais. Isso irá depender da liberdade para cessão de quotas, da regra de regência supletiva, da relação existente entre os sócios, dentre outros detalhes. Devido a essa distinção inicial, muitos afirmam que, identificada a sociedade como de capital, será admitida a penhora de cotas, e o exequente ingressará nos quadros sociais, no lugar do executado. Mas se sociedade for classificada como de pessoas, o entendimento que prevaleceu por um tempo era no sentido de que não seria possível a penhora, sob argumento de que as quotas integram o patrimônio da sociedade, e esse não se confunde com o do sócio. 735
ESTEFÂNIA ROSSICNOLI
Atualmente, essa tese está praticamente superada pelo entendimento de que é possível a penhora, de acordo com decisões do STJ. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Como dito acima a posição dominante no STJ é pela possibilidade da penhora de quotas. como no AgRg no Ag 1164746/SP cuja ementa publicada em 26/10/2009 preconiza: LOCAÇÃO E PROCESSUAL CML EXECUÇÃO. PENHORA DE QUOTAS. SOCIEDADE LI· MrTADA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. PRETENSÃO DE PREQUESTIONAR DISPOS!· TIVOS CONSTITUCIONAIS. IMPOSSIBILIDADE NA VIA ESPECIAL. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que é possível a penhora de cotas de sociedade limitada, seja porque tal constrição não implica, necessariamente, a inclusão de novo sócio; seja porque o devedor deve responder pelas obrigações assumidas com todos os seus bens presentes e futuros, nos termos do art. 591 do Código de Processo Civil. 1.
(. ..)
3. Agravo regimental desprovido.
O Novo Código de Processo Civil 5 estabelecerá algumas mudanças na ordem de penhora que ficará da seguinte forma: Art. 835. A penhora observará, preferencialmente, a seguinte ordem: 1- dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em insti· tuição financeira; li - títulos da dívida pública da União, dos Estados Federal com cotação em mercado; Ili - títulos
e do Distrito
e valores mobiliários com cotação em mercado;
IV - veículos de via terrestre;
V - bens imóveis; VI - bens móveis em geral;
VII - semoventes; VIII - navios e aeronaves;
5.
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O Novo Código de Processo Civil, Lei n• 1p05/2015, foi publicado em 17/03/2015 e entrará em vigor em 17/03/2016.
DIREITO SOCIETÁRIO
IX - ações e quotas de sociedades simples e empresárias; X - percentual do faturamento de empresa devedora;
XI - pedras e metais preciosos; XII - direitos aquisitivos derivados de promessa de compra e venda e de alienação fiduciária em garantia;
XIII - outros direitos. A penhora de quotas e ações foi colocada posteriormente à possibilidade de penhora de outros bens, demonstrando que há diversas outras preferências de penhora. Todavia, devem ser feitas duas ponderações. A primeira é que se deve atentar ao princípio da execução menos gravosa, encontrado no art. 620 do CPC, ou seja, as quotas só serão penhoras na absoluta falta de outros bens penhoráveis. Em segundo lugar, o exequente, embora possa realizar a penhora sem a anuência dos demais sócios, não poderá ingressar no quadro social, pois deve ser respeitada a affectio societatis. Para resolver essa situação, já que não se pode impor o ingresso do terceiro, a doutrina e jurisprudência vêm apontando algumas alternativas: A sociedade pode remir a execução; os demais sócios podem adquirir as quotas do executado, exercendo direito de preferência, pela aplicação dos artigos 1117 a 1119 do CPC; a execução poderia recair sobre os lucros a que teria direito o sócio-executado, até o montante da dívida (hipótese prevista no art. 1026 do Código Civil); ou ainda poderia ocorrer uma dissolução parcial da sociedade, sendo liquidadas as quotas do sócio-executado, e o respectivo valor depositado em juízo (hipótese prevista no art. 1026, parágrafo único, do Código Civil). Essa opção tem um porém, pois haverá perda patrimonial para a sociedade e se não for feita com cautela, poderá comprometer a preservação da empresa. Qualquer dessas alternativas deverá buscar a adequada conciliação entre interesses opostos: o do credor, que faz jus ao recebimen to do seu crédito; e o interesse dos demais sócios, que não podem ser compelidos à aceitação de um terceiro estranho, o que comprometeria a busca dos objetivos comuns da sociedade.
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
Outra novidade do Novo Código de Processo Civil é que ele passará a contar com regras bastante específicas para a penhora de quotas, vejamos: An. 861. Penhoradas as quotas ou as ações de sócio em sociedade simples ou empresária, o juiz assinará prazo razoável, não superior a 3 (três) meses, para que a sociedade: 1- apresente balanço especial, na forma da lei; li - ofereça as quotas ou as ações aos demais sócios, observado o direito de preferência legal ou contratual; Ili - não havendo interesse dos sócios na aquisição das ações,
proceda à liquidação das quotas ou das ações, depositando em juízo o valor apurado, em dinheiro. i 0 Para evitar a liquidação das quotas ou das ações, a sociedade poderá adquiri-las sem redução do capital social e com utilização de reservas, para manutenção em tesouraria.
§
não se aplica à sociedade anônima de capital abeno, cujas ações serão adjudicadas ao exequente ou alienadas em bolsa de valores, conforme o caso.
§ 2° O disposto no caput e no §
i
0
§ 3° Para os fins da liquidação de que trata o inciso Ili do caput,
o juiz poderá, a.requerimento do exequente ou da sociedade, nomear administrador, que deverá submeter à aprovação judicial a forma de liquidação. § 4° Oprazo previsto no caput poderá ser ampliado pelo juiz, se
o pagamento das quotas ou das ações liquidadas: 1- superar o valor do saldo de lucros ou reservas, exceto a legal, e sem diminuição do capital social, ou por doação; ou li - colocar em risco a estabilidade financeira da sociedade sim-
ples ou empresária. § 5° Caso não haja interesse dos demais sócios no exercício de
direito de preferência, não ocorra a aquisição das quotas ou das ações pela sociedade e a liquidação do inciso Ili do caput seja excessivamente onerosa para a sociedade, o juiz poderá determinar o leilão judicial das quotas ou das ações.
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~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na fase dissertativa da prova da magistratura Estadual/RJ/2oo8, organizada pelo TJ/RJ encontrávamos a seguinte questão: "A sociedade Xavante Amarelo é constituída por 3 sócios: Alfonso, com i quota no valor de RS10.ooo,oo (dez mil reais); Trigesto, com i quota no valor de RS12.ooo,oo (doze mil reais) e Cadeirante, com i quota no valor de RS18.ooo,oo (dezoito mil reais). o capital social está integralizado no montante de RS40.ooo,oo (quarenta mil reais). Cadeirante é o administrador da sociedade, por ser o sócio majoritário no valor de sua quota. Em razão de dívidas particulares, Trigesto sofreu penhora de 50°k (cinqüenta por cento) em sua quota. Preocupado com as repercussões na vida social, Cadeirante opôs embargos de terceiro, aduzindo que a penhora seria nula de pleno direito. Responda: a) os embargos são cabíveis? b) a penhora da cota é possívelr
6.6. Administração Para sua administração, a sociedade limitada pode ter como administradores (diretores ou gerentes) pessoas que são sócias ou não. A administração (ou diretoria) é um órgão da sociedade, em que há participação de uma ou mais pessoas físicas, e que além de administrar internamente, manifesta externamente as vontades da sociedade . Para tanto, podem ser nomeados no ato do contrato ou em ato posterior, às vezes podendo depender do quorum tanto para escolha como para destituição do cargo. Designação dos administradores Não sócio
Sócio
Capital não iooºk integralizado
Capital já integralizado
Em contrato social
Em ato separado
Unanimidade
Mínimo de 2/3 do capital
3.4 do capital
Mais da metade do capital
O administrador da sociedade tem de agir com diligência nos negócios e lealdade perante a sociedade e os sócios. Se não agir da maneira que é esperada, ou seja, não cumprindo com seus deveres
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ou até prejudicando a sociedade, ele será responsabilizado por todos os danos provenientes de sua ação, já que a sociedade se manifestará através de sua pessoa. Assim, como na sociedade simples, o legislador deu uma proteção especial ao administrador que também é sócio e que é nomeado em contrato. Preconiza o §1° do art. lo63 que para destituir esse administrador, deverá ser necessário o voto de 2/3 do capital social. Vale a pena destacar que na sociedade simples a proteção é ainda maior; pois o art. 1019 diz que o administrador sócio nomeado em contrato somente pode ser destituído por decisão judicial. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No certame organizado pelo CESPE para Defensor Público da União/2007, a questão tentou misturar a situação da sociedade simples com a limitada, pois a afirmativa colocada era falsa, vejamos: "Lino. Simão e Nivaldo são sócios de determinada sociedade limitada. Lino foi investido na administração da sociedade por cláusula expressa do contrato social. Nessa situação, os poderes conferidos a Lino são irrevogáveis, salvo justa causa, reconhecida judicialmente e a pedido de Simão ou de Nivaldo." No que diz respeito à responsabilidade do administrador por prática de ato ultra vires, não há nenhuma previsão legal no capítulo da sociedade limitada, sendo necessário ser observada a regra de regência supletiva. Se essa for pela sociedade simples, aplica-se o parágrafo único do art. 1015 do Código Civil e a sociedade poderá se eximir de responsabilidade do ato do administrador. Já se a regência supletiva for pelas normas da sociedade anônima. o art. 158 da Lei 6404-76 disporá que a sociedade responde pelos atos do seu administrador; podendo apenas entrar com o direito de regresso em caso de extrapolação dos poderes. ~ Qual o entendimento do STJ sobre o assunto? Otribunal tem firmado entendimento de que as questões da administração da sociedade limitada devem ficar a cargo dos sócios decidirem e que o poder judiciário deve intervir o mínimo possível. Vejamos o exemplo do MC 14561/BA, publicado em o8/10/2oo8:
MEDIDA CAUTELAR. PEDIDO DE ATRIBUIÇÃO DE EFEITO SUSPENSIVO A RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. AFASTAMENTO DE SÓCIO MAJORITÁRIO DA ADMINISTRAÇÃO DA SOCIEDADE. (. ..)
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- As discussões judiciais acerca administração de sociedades limitadas deve caminhar, via de regra, não para a intervenção judicial na empresa, que só ocorrerá em hipóteses excepcionais. mas para a responsabilização do administrador improbo, para a anulação de negócios específicos que prejudiquem a sociedade ou, em última análise, para a retirada do sócio dissidente ou dissolução parcial da empresa. - A atuação do Poder Judiciário em causas que versem sobre a administração das sociedades deve pautar-se sempre por um critério de intervenção mínima. A Lei permite o afastamento de sócio majoritário da administração da sociedade, mas isso não implica que ele perca os poderes inerentes à sua condição de sócio, entre os quais está o poder de nomear administrador. (...) Medida liminar indeferida, com as ressalvas acima.
6.7. Exclusão extrajudicial de sócio Três são as hipóteses em que o contrato de sociedade se resolve em relação a um sócio, provocando a dissolução parcial. Uma delas já foi tratada neste trabalho, que
é o direito de retirada. Uma segunda
hipótese seria no caso de falecimento de sócio, quando a regra geral seja a liquidação de sua participação e não sua substituição por seus herdeiros. E o terceiro caso
é quando
um ou mais sócios são excluídos
da sociedade. De acordo com o atual Código Civil, essa exclusão pode ocorrer de duas formas, quais sejam, a judicial ou a extrajudicial. Veja-se inicialmente os dispositivos que são pertinentes possível proceder
à
questão para depois ser
à analise:
Art. i.004. Os sócios são obrigados, na forma e prazo previstos, às contribuições estabelecidas no contrato social, e aquele que deixar de fazê-lo, nos trinta dias seguintes ao da notificação pela sociedade, responderá perante esta pelo dano emergente da mora. Parágrafo único. Verificada a mora, poderá a maioria dos demais sócios preferir, à indenização, a exclusão do sócio remisso, ou reduzir-lhe a quota ao montante já realizado, aplicando-se, em ambos os casos, o disposto no § 1° do art. i.031. Art. i.030. Ressalvado o disposto no art. i.004 e seu parágrafo único, pode o sócio ser excluído judicialmente, mediante iniciativa da maioria dos demais sócios, por falta grave no
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cumprimento de suas obrigações, ou, ainda, por incapacidade superveniente. Parágrafo único. Será de pleno direito excluído da sociedade o sócio declarado falido, ou aquele cuja quota tenha sido liquidada nos termos do parágrafo único do art. 1.026. Art. 1.o85. Ressalvado o disposto no art. i.030, quando a maioria dos sócios. representativa de mais da metade do capital social, entender que um ou mais sócios estão pondo em risco a continuidade da empresa, em virtude de atos de inegável gravidade, poderá excluí-los da sociedade, mediante alteração do contrato social, desde que prevista neste a exclusão por justa causa. Parágrafo único. A exclusão somente poderá ser determinada em reunião ou assembléia especialmente convocada para esse fim, ciente o acusado em tempo hábil para permitir seu comparecimento e o exercício do direito de defesa.
Com esses três artigos é possível visualizar que no caso da sociedade limitada o sócio pode ser excluído judicialmente se cometer falta grave ou for interditado (incapacidade superveniente) e extrajudicialmente, quando for remisso, declarado falido ou, por iniciativa da maioria do capital social, praticar atos que coloquem em risco a continuidade da empresa. É essa última possibilidade que será analisada neste momento. A exclusão extrajudicial de sócio por decisão da maioria, conforme está prevista no art. 1085, é uma inovação do Código Civil de 2002, apesar de que antes disso, mesmo sem a existência de um permissivo legal já se discutia essa possibilidade. E como toda novidade, gera discussões e opiniões contrárias e favoráveis ao novo dispositivo. O primeiro problema é possível detectar na própria redação do texto legal, na expressão "ato de inegável gravidade" que se mostra como uma verdadeira cláusula geral, comportando várias interpretações. Antes mesmo da atual legislação, várias eram as opiniões doutrinárias do que seria essa justa causa que poderia dar ensejo à exclusão do sócio, sendo tal conceito importante também no caso de exclusão extrajudicial. A relação entre os sócios é contratual e através do contrato eles se comprometem a realizar atos que colaborem para a realização do fim comum da sociedade. Assim, a maioria da doutrina irá entender que o 142
DIREITO SOCIETÁRIO
ato de inegável gravidade que configura a justa causa ocorre quando o sócio falta com o seu dever de colaboração, não contribuindo para a busca do objeto comum ou até mesmo prejudicando-o. Mas essa interpretação ainda deixa o conceito de justa causa por demais aberto já que em cada sociedade o dever de colaboração pode se mostrar de um modo diferente. Surgem então as opiniões que buscam descrever de forma mais minuciosa os atos que ensejam a exclusão. Assim é que surge o seguinte questionamento: o legislador de 2002 agiu corretamente quando deixou a cargo dos sócios majoritários a definição do ato de inegável gravidade, configurador da justa causa, para possibilitar a exclusão do sócio minoritário? Para que a resposta seja positiva, é preciso fazer uma interpretação restritiva do art. 1085. Isso porque tal dispositivo diz que para haver a exclusão extrajudicial de sócio, essa possibilidade tem que estar prevista no contrato, mas se for feita uma interpretação meramente literal dessa exigência, uma simples cláusula genérica de permissão de exclusão extrajudicial já seria suficiente. Ocorre que, nesse caso, tal cláusula poderia ser usada como um elemento de pressão dos majoritários sobre os minoritários e isso vai de encontro à função social do contrato de sociedade. Primeiramente é preciso esclarecer que antes do Código Civil de 1.8oo de 19966 deixava claro que poderia haver a exclusão extrajudicial de sócio sem que essa possibilidade estivesse prevista no contrato. Alguns autores até se mostravam favorável a esse posicionamento, mas a necessidade de previsão contratual mostra-se uma providência bastante importante para as relações societárias. 2002, o art. 54 do decreto no
Era por demais arbitrário que se permitisse a exclusão extrajudicial do sócio minoritário sem a devida previsão contratual e gerava certa insegurança jurídica para uma parte dos sócios que não tinham nenhuma autonomia na decisão da exclusão. Sem a cláusula, os minoritários 6.
Este decreto regulamenta a lei de registros públicos de empresas mercantis (Lei n• 8934/94) e o artigo citado tem a seguinte redação: Art. 54. A deliberação majoritária, não havendo cláusula restritiva, abrange também as hipóteses de destituição da gerência, exclusão de sócio, dissolução e extinção de sociedade.
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não têm a possibilidade de saber se desejam ou não participar da sociedade que tenha a exclusão extrajudicial. Até porque, a previsão contratual garante o direito de ampla defesa do sócio cuja exclusão se pretende já que se ninguém pode ser privado de seus bens sem que haja o devido processo legal, é indispensável que, pretendendo-se excluir um sócio de uma sociedade por quotas, mesmo que minoritário, se abra a oportunidade de defesa para que ele rebata os fatos que lhe estão sendo imputados como sendo a causa da sua exclusão. Além disso, há que se ter em mente que prevalecendo a tese da livre exclusão facilmente se verificariam ações judiciais do minoritário excluído em busca da reversão da sua situação o que causaria instabilidade no próprio desenvolvimento da sociedade. Pior seria se a exclusão fosse realizada sem preocupação com a descrição precisa de justa causa condizente com os termos do contrato, elementos que, se previamente exteriorizados, informam o juízo competente evitando, da parte deste, decisões meramente impulsivas, baseadas somente no perigo da demora. Assim, a previsão contratual da possibilidade de exclusão de sócio tende a beneficiar o andamento da sociedade e não prejudicá-lo como querem alguns doutrinadores. Pode-se concluir então que a previsão do art. i.o85 está em de acordo com o princípio da operabilidade que norteou o atual Código, ou seja, com a ideia de que os institutos jurídicos devem ser executados ou realizados em sua plenitude, assim, a admissão da exclusão extrajudicial com previsão prévia e regramento expresso dá segurança à execução do próprio instituto. Também se pode ressaltar que a necessidade de cláusula expressa para a exclusão extrajudicial se coaduna com o princípio da sociabilidade, tão defendido por Miguel Reale, fazendo prevalecer os valores coletivos sobre os individuais, é verdade, mas, sem perda, porém, do valor fundante da pessoa humana. E assim, o contrato de sociedade se coadunará com a função social que exerce. E como foi falado alhures para que a cláusula contratual permissiva da exclusão extrajudicial não dê margem a práticas abusivas da maioria, o ideal seria que ela especificasse, ao menos de forma exemplificativa quais são os atos que configuram justa causa. 144
DIREITO SOCIETÁRIO
Mas como a maioria dos contratos sociais não especifica quais seriam os atos que ensejam a exclusão extrajudicial por justa causa, é importante que não se afaste o controle do poder judiciário sobre a decisão que é tomada pelos sócios. Tal fato é um direito garantido pela Constituição em seu art. 5°, inciso X:XXV, in verbis: "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito." A lesão nesse caso pode ocorrer quando não for comprovado o ato de inegável gravidade cometido pelo sócio excluído, demonstrando a abusividade da deliberação dos majoritários. Nesse caso o sócio poderá buscar sua reintegração aos quadros societários com base em uma ação que declare nula a reunião ou assembleia que o excluiu. Na 1Jornada de Direito Comercial foi aprovado enunciado que não se aprofundou muito no assunto, limitando-se a tratar da parte burocrática da exclusão extrajudicial de sócio. Enunciado n° i7: Na sociedade limitada com dois sócios, o sócio titular de mais da metade do capital social pode excluir extrajudicialmente o sócio minoritário desde que atendidas as exigências materiais e procedimentais previstas no art. i.o85, caput e parágrafo único, do CC. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No 3° exame unificado da OAB, organizado pela FGV, a questão abordou a exclusão extrajudicial do sócio e pedia para marcar a alternativa correta, que era: "A justa causa é a violação ou falta de cumprimento das obrigações sociais, sendo que o sócio excluído não perde o valor patrimonial de sua participação societária." Outra abordagem relevante encontra-se na prova da Magistratura/ R0/2011, organizada pela PUC-PR, em que o enunciado contava o seguinte: "Um sócio de uma sociedade limitada foi dela excluído extrajudicialmente por deliberação da maioria absoluta do capital social. Havia previsão contratual para a exclusão extrajudicial e todo o procedimento legal para o ato foi observado, tendo sido arquivada a alteração de contrato social retratando a exclusão do sócio no órgão de registro competente. Diante disso, ele lhe pergunta como serão calculados e pagos os seus haveres. Considerando o contido no Código Civil a respeito da resolução da sociedade em relação a um sócio, sua resposta à referida indagação deveria ser uma das alternativas abaixo ." E a resposta era: "Os haveres do sócio excluído serão calculados e pagos de acordo com o contido no contrato social. Caso o contrato social seja omisso,
145
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
os haveres do sócio excluído deverão ser calcula dos com base na situação patrimonial da sociedade, à data da exclusão, verificada em balanço especialmente levantado. Neste último caso (omissão do contrato social acerca de regras sobre o pagamento dos haveres), a quota liquidada deverá ser paga em dinheiro, no prazo de 90 (noventa) dias, a partir da apuração de seu valor em balanço especial. Na prova dissertativa da Magistratura Estadual AM/2013, também de responsabilidade da FGV, havia a seguinte pergunta: "O sócio majoritário de uma sociedade limitada pode ser excluído da sociedade em razão de atos que põem em risco a continuidade da empresa?" 6.8. Conselho Fiscal De acordo com o art. 1066, a sociedade limitada poderá criar um Conselho Fiscal, mas esse não
é
de existência obrigatória. Se existir; ele
irá fiscalizar a atuação dos administradores. Os sócios têm o direito e o dever de fiscalizar a administração da sociedade. A finalidade do Conselho Fiscal dentre outras,
é:
controlar
das contas da sociedade; analisar documentos e livros contábeis; verificar a idoneidade de notas fiscais; acompanhar as operações bancárias, etc. Tais funções estão previstas no art. io69 do Código Civil: Art. i.o69. Além de outras atribuições determinadas na lei ou no contrato social. aos membros do conselho fiscal incumbem, individual ou conjuntamente, os deveres seguintes: 1 - examinar, pelo menos trimestralmente, os livros e papéis da sociedade e o estado da caixa e da carteira, devendo os administradores ou liquidantes prestar-lhes as informações solicitadas;
li - lavrar no livro de atas e pareceres do conselho fiscal o resultado dos exames referidos no inciso 1 deste artigo; Ili - exarar no mesmo livro e apresentar à assembléia anual dos sócios parecer sobre os negócios e as operações sociais do exercício em que servirem, tomando por base o balanço patrimonial e o de resultado econômico;
IV - denunciar os erros, fraudes ou crimes que descobrirem, sugerindo providências úteis à sociedade; V - convocar a assembléia dos sócios se a diretoria retardar por mais de trinta dias a sua convocação anual, ou sempre que ocorram motivos graves e urgentes;
146
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VI - praticar, durante o período da liquidação da sociedade, os
atos a que se refere este artigo, tendo em vista as disposições especiais reguladoras da liquidação. O Conselho Fiscal deve exercer uma fiscalização permanente da gestão da sociedade empresária, sobretudo, dos atos do administrador. Sua criação não é obrigatória sendo interessante a sua instituição para sociedades limitadas de maior porte. • Importante!
o Código Civil permitiu a criação de Conselho Fiscal para sociedade limitada, mas ele será de criação facultativa. No exercício da sua função fiscalizadora tem o Conselho Fiscal poderes de formular questões ao administrador, promover perícias, ter acesso a quaisquer documentos da sociedade. No intuito de proteger os sócios minoritários, o art. io66, § 2° prevê que: "É assegurado aos sócios minoritários, que representarem pelo menos um quinto do capital social, o direito de eleger, separadamente, um dos membros do conselho fiscal e o respectivo suplente." Os membros podem ser sócios ou não e é até melhor que não sejam sócios para que possam atuar com total imparcialidade e serão remunerados pelos seus serviços. • Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No certame organizado pela FCC para Advogado do Metrô/SP/2010, a questão pedia para marcar a alternativa que representasse uma função do conselho fiscal e a correta era: "denunciar os erros, fraudes ou crimes que descobrirem, sugerindo providências úteis à sociedade."
6.9. Deliberações sociais As decisões a serem tomadas na Ltda., via de regra, são de duas espécies: aquelas relativas ao dia a dia operacional da empresa, a exemplo de comprar, vender, receber, admitir funcionários, que são tomadas pela diretoria ou gerência no âmbito da administração da sociedade; as outras decisões de cunho mais estrutural que refletem de forma mais expressiva nos destinos da empresa, tais como, ingresso de novos sócios, exclusão ou saída de sócios, incorporação, aumento de capital, são tomadas por deliberação dos sócios. 147
ESTEFÂNIA ROSSIGNOU
As decisões de natureza deliberativa são tomadas somente pelos sócios ou pelos seus representantes legais com poderes específicos para tal fim. Na deliberação sobre matérias específicas, estas são votadas, obedecido o que dispõe o código quanto ao quorum e à contagem de votos. Como regra geral, as deliberações obedecem ao disposto no artigo i.010. Assim, quando, por lei ou pelo contrato social, competir aos sócios decidir sobre os negócios da sociedade, as deliberações serão tomadas por maioria de votos, contados segundo o valor das quotas de cada um. Observemos que o importante não é a quantidade de sócios, mas o peso de sua participação no capital social. Dessa forma, um único sócio poderá ter poder de deliberação que prevalecerá sobre os demais, sendo suficiente para a decisão o percentual ou a fração do capital estabelecido para cada caso concreto. • Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame organizado pelo CESPE da Magistratura Federal/3• região/2010, a alternativa correta sobre deliberações sociais na sociedade limitada afirma· va que: •Havendo conflito, a respeito dessa alteração, entre majoritários e minoritários, atua, na espéàe, o princípio que tutela o direito da maioria."
As matérias que dependem de deliberação de sócios encontram-se no art. 1071 do Código Civil, mas o contrato poderá estabelecer outras hipóteses. Uma inovação do Código Civil de 2002 foi o estabelecimento de diversos quóruns diferentes para aprovação das deliberações de sócios. O art. io76 traz uma boa parte desses quóruns que também estarão espalhados pelo capítulo das sociedades limitadas. Esses quóruns criam certa burocracia para um tipo societário que deve buscar a simplicidade, mas ao mesmo tempo, servem para proteger os sócios minoritários. Duas são as formas de se realizar uma deliberação de sócios. Ela pode ocorrer por reunião ou assembleia. Esta terá mais formalidades a serem observadas do que aquela, no que diz respeito à convocação, antecedência da convocação, elaboração de ata, dentre outras. A princípio o Código Civil deixou a cargo dos sócios a escolha de se a deliberação será feita em reunião ou assembleia, bastando estar previsto em
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DIREITO SOCIETÁRIO
contrato a forma escolhida; porém, o §1° do art. 1072 preconiza que: "A deliberação em assembleia será obrigatória se o número dos sócios for superior a dez." Entendeu o legislador que com o número maior de sócios a formalidade da assembleia se faz necessária. No entanto, independente da forma que a deliberação é realizada, o § 3° desse mesmo art. 1072 vai permitir que a reunião ou a assembleia possam ser dispensadas quando todos os sócios decidirem, por escrito, sobre a matéria que seria objeto delas. Se o documento escrito comprova que todos os sócios participaram da decisão, não seria justificável realizar reunião ou assembleia. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova da Magistratura Federal/3• Região/2011, organizada pelo CESPE, o enunciado da questão afirmava: "Os dez sócios que detêm o capital social de determinada empresa limitada pretendem promover fusão com outra empresa. Nessa situação, em conformidade com o Código Civil". A alternativa correta era a que dizia: "não há necessidade de reunião ou assembleia para a tomada de decisão, se todos os sócios decidirem por escrito." Quóruns de deliberação da sociedade limitada Unanimidade
Nomear administrador não sócio quando capital não está integralizado
Art. 1061
•/. do capital
A modificação do contrato social e aprovação de incorporação, a fusão e a dissolução da sociedade, ou a cessação do estado de liquidação
Art. 1076 1 c/c Art. 1071 V e VI
Mínimo de 2/3 do capital
Nomear administrador não sócio quando capital está integralizado
Art. 1061
Mínimo de 2/3 do capital
Destituir administrador sócio quando nomeado em contrato
Art. 1063, §10
Mais da metade do capital
A designação dos administradores, quando feita em ato separado; a destituição dos administradores; o modo de sua remuneração, quando não estabelecido no contrato e pedido de recuperação judicial
Art. 1076 li c/c Art. 1071, li, Ili, IV e VIII
Todas as demais deliberações
Art. 1076, Ili
Maioria dos presentes
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
6.10. Aumento e redução do capital social
Como já foi abordado no início deste item, a sociedade limitada, ao ser criada, tem que constituir seu capital social, que vai representar o investimento realizado na sociedade, sendo parte dele transformado no patrimônio da sociedade que irá arcar com as suas obrigações, em virtude da limitação de responsabilidade dos sócios. O capital social deve ser totalmente subscrito por ocasião da criação da sociedade, na assinatura do contrato social, podendo, no entanto, ser integralizado, no prazo, forma e nas condições estabelecidos pelos sócios com dinheiro ou bens, móveis ou imóveis, sendo todos os sócios responsáveis solidariamente, pelo prazo de cinco anos, contados da data da criação da sociedade, pela avaliação de tais bens. Quando o capital social já estiver totalmente integralizado, pode ser aumentado, o que só ocorrerá se aprovado pelos sócios detentores de pelo menos '/• (75°1,,) das suas quotas, os quais, no prazo de 30 dias da referida deliberação, terão preferência para subscrever e integralizar as novas quotas, na proporção da sua participação na sociedade, podendo, também, nesse caso, ser feita com bens, respondendo os sócios solidariamente pela avaliação dos mesmos como atrás já referido. Se o contrato social não dispuser de forma diferente, pode um sócio ceder seu direito de preferência a outro sócio, independente do consentimento dos demais sócios, como poderá fazê-lo para terceiros não-sócios, desde que não haja expressa oposição de sócios que detenham mais de Y. (25ºk) do capital social, devendo o aumento do capital social, ultrapassado os 30 dias antes referidos, constar de alteração contratual, a qual deve ser formalizada em reunião ou assembleia convocada para tal fim. O capital social também pode ser reduzido, desde que os sócios detentores de pelo menos 75º/,, do capital social assim o desejem, o que poderá ocorrer, no entanto, só se, depois de totalmente integralizado, houver perdas irreparáveis ou, independentemente se o mesmo já esteja totalmente integralizado ou se for considerado excessivo em relação ao objeto da sociedade, devendo, na primeira hipótese, cada sócio ter diminuído o valor nominal das suas quotas, atribuído no contrato social, proporcionalmente ao número de quotas que tem na sociedade, e na segunda, os sócios receberão de volta da empresa, também de
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DIREITO SOCIETÁRIO
forma proporcional, o valor que contribuíram à maior, reduzindo-se igualmente o valor nominal das cotas que cada um possui na empresa, ou poderão, se for o caso, deixar de contribuir, também proporcionalmente, com o que eventualmente estaria faltando para integralizar a sua cota parte. A deliberação para a redução do capital social deve ser feita em assembleia especialmente convocada para tal fim, devendo a Ata correspondente ser publicada em jornal de grande circulação ou em Diário Oficial, decorrendo da publicação o prazo de 90 (noventa) dias para que eventuais credores possam impugnar a decisão assemblear, que, se não ocorrer, ou se for provado o pagamento da dívida ou o depósito judicial do respectivo valor, poderá a sociedade formalizar a diminuição através o registro, perante a Junta Comercial, da Ata e da alteração do contrato social. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No concurso organizado pelo CESPE para Magistratura Federal/2• Região/2011, no que diz respeito à sociedade limitada, foi considerada correta a seguinte afirmativa: #Com o objetivo de evitar lesão aos credores da sociedade cujo capital seja reduzido por excesso, determina o legislador que, se houver impugnação por parte do credor quirografário, portador de título líquido anterior à deliberação, no prazo de noventa dias a contar da data de publicação da ata da assembleia que a aprovar, a redução somente poderá realizar-se se provado o pagamento ao referido credor ou o depósito do valor em juízo." Tal assertiva se coaduna com o disposto no art. io84, §§ 1° e 2° do Código Civil.
6 . 11.
Falecimento de sócio
Não há tratamento legislativo específico para o caso de falecimento de sócio na sociedade limitada. De acordo com o art. 1053 do Código Civil, caso não exista nenhum previsão contratual, a limitada deverá se valer das regras da sociedade simples caso haja lacunas na sua legislação própria, mas o contrato poderá prever a regência supletiva pelas normas da sociedade anônima. Se seguir a sociedade simples, deverá ser observado o art. 1028 do Código Civil em que a regra é que a quota do sócio falecido será liquidada e o fruto entregue no inventário, mas os incisos permitem que se 757
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
tenha solução diferente, como, por exemplo, quando o contrato prevê de forma diversa. Já se a sociedade limitada tiver a regência supletiva pela lei de S.A., ocorrerá a sucessão dos herdeiros nas quotas do sócio falecido, já que na sociedade anônima, por ser sociedade de capitais, não se fala em liquidação parcial da sociedade. FALECIMENTO DE SÓCIO NA SOCIEDADE UMITADA Regência supletiva pela sociedade simples
Regência supletiva pela sociedade anônima
Regra: liquidação da quota Contrato pode prever substituição do sócio pelos herdeiros, os sócios remanescentes podem fazer acordo ou podem encerrar a sociedade.
Regra: sucessão da quota pelos herdeiros do sócio falecido.
Porém, não serão observadas essas regras se o contrato social da sociedade limitada dispuser a respeito de falecimento de sócio, o que é bastante recomendável, já que dessa maneira a vontade daqueles que são diretamente envolvidos prevalecerá sobre a do legislador. Aliás, o contrato social é um instrumento muito importante para que os sócios da limitada possam criar a direção que desejam para a sociedade, dando o enfoque naquilo que lhes for mais importante fazendo valer o que for o interesse próprio. Tal cláusula tem natureza de acordo de vontades que é estipulada de forma prévia entre os sócios a respeito de um evento futuro e imprevisível. Pode-se prever que o sócio falecido será substituído por seus herdeiros e, nesse caso, essa será a regra para a sociedade, sendo que não haverá necessidade de concordância dos sócios remanescentes, tendo em vista que esta aprovação já foi dada quando da inclusão da cláusula. Já para os herdeiros há um direito de escolha, vez que não há qualquer lógica de alguém ingressar em uma sociedade contra a sua vontade, já que seria uma infração à liberdade de associação que está prevista na Constituição (art. 5, XX)
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DIREITO SOCIETÁRIO
Assim sendo, existindo a cláusula de sucessão, os herdeiros que não optarem pelo ingresso na sociedade terão o direito de pedir a liquidação das quotas do falecido para receberem o seu correspondente patrimonial. A sociedade não tem como se opor a esse pedido e deverá proceder ao balanço previsto no art. 1031 para realizar a liquidação da quota. Entretanto, o contrato também poderá prever outras possibilidades, como algum tipo de condição para a entrada dos herdeiros ou já estipular que sempre irá ocorrer a liquidação, caso característico de quando se tem uma sociedade de pessoas. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova aberta da Defensoria Pública Estadual DF/2013, organizada pelo CESPE, encontrava-se a seguinte questão: Considerando que no contrato social de determinada sociedade de responsabilidade Ltda. haja cláusula prevendo o prosseguimento da sociedade com os herdeiros no caso de falecimento do sócio, redija um texto dissertativo abordando, de forma fundamentada, os seguintes aspeáos: -
natureza jurídica da cláusula que estabelece a possibilidade da continuação da sociedade com os herdeiros;
-
necessidade de, a despeito da existência da cláusula, da anuência dos sócios remanescentes para que os herdeiros possam participar da sociedade;
-
se procede ou não eventual defesa da sociedade contrária à pretensão dos herdeiros da liquidação da quota fundada na referida cláusula.
6.12. Dissolução da sociedade O regulamento da sociedade limitada só irá tratar da dissolução de pleno direito que, de acordo com o art. 1087, irá ocorrer nos casos previstos no art. 1044. Porém, esse dispositivo, que está no capítulo da sociedade em nome coletivo, dispõe que: "A sociedade se dissolve de pleno direito por qualquer das causas enumeradas no art. i.033 e, se empresária, também pela declaração da falência." O art. 1033 traz as causas de dissolução da sociedade simples, já analisadas. Sendo assim, a limitada se dissolve de pleno direito pelas causas da sociedade simples e pela falência. Há, porém, uma situação peculiar na dissolução da sociedade limitada por decisão da maioria (inciso Ili do art. 1033). Por se tratar de
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
atividade empresária, muito se fala na função social da empresa (princípio norteador do Direito Empresarial que já foi abordado no item 5.3 do Capítulo 1) e em consequência surge a ideia de preservação da empresa para que se possa manter a fonte geradora de empregos e de circulação de renda. Desta feita, a doutrina e a jurisprudência vêm defendendo que se houver votos majoritários para dissolver uma sociedade de prazo determinado, porém, os minoritários tiverem interesse e condições econômicas para continuar com a sociedade, dá-se ao majoritário o direito de se retirar, mas a sociedade não será dissolvida. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Vários são os acórdãos do STJ que demonstram essa tendência de preservar a empresa, mesmo contra a vontade da maioria, como no REsp 1121530/RN, publicado em 26/04/2012: PROCESSUAL CIVIL COMERCIAL AÇÃO DE DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE LIMITADA. CITAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA. DESNECESSIDADE. PARTICIPAÇÃO DE TODOS OS SÓCIOS. ALEGAÇÃO DE OFENSA A DISPOSITIVOS DE LEI FEDERAL AUS~NCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INCIDtNCIA DAS SÚMUlAS n• 282 e 356/STF. EXCLUSÃO DO SÓCIO MAJORITÁRIO. POSSIBILIDADE NO CASO CONCRETO. PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA. TEORIA DO FATO CONSUMADO. ALEGAÇÃO DE VIOlAÇÃO DOS PRINCfPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. IMPOSSIBILIDADE.
(...)
3. Em circunstâncias excepcionais, é possível a exclusão do sócio majoritário a pedido de minoritário, a fim de prestigiar o princípio da preservação da empresa. Teoria do fato consumado que se adota como fundamento para manter o sócio minoritário no quadro societário. (. ..)
5. Recursos especiais não conhecidos.
Outro detalhe importante aqui é sobre o parágrafo único do art. 1033, que foi acrescentado pela lei complementar 128 de 2008 e recentemente alterado pela Lei 12441-11. O texto do parágrafo diz que: Parágrafo único. Não se aplica o disposto no inciso IV caso o sócio remanescente, inclusive na hipótese de concentração de todas as cotas da sociedade sob sua titularidade, requeira, no Registro Público de Empresas Mercantis. a transformação do registro da sociedade para empresário individual ou para empresa individual de responsabilidade limitada, observado, no que couber, o disposto nos arts. 1.113 a 1.115 deste Código.
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DIREITO SOCIETÁRIO
Não mencionamos esse dispositivo quando tratamos da dissolução da sociedade simples, pois, apesar de ele estar situado no seu capítulo, não terá aplicabilidade nesse tipo de sociedade, já que, se sua atividade é não empresária, seu sócio não poderá ser empresário. Já para a limitada, sua aplicação é comum. Se o sócio ficar sozinho na sociedade e não encontrar outro sócio em 180 dias, ao invés de dissolver, poderá se transformar em empresário individual ou EIRELI. No que diz respeito à dissolução judicial, o capítulo da sociedade limitada não trata sendo, portanto, mais uma situação que deverá ser observada a regência supletiva. Se for pela simples, aplica-se o art. 1034 do Código Civil, mas, se for pela sociedade anônima, utiliza-se o art. 2o6, li da Lei de S.A. 6.13. Liquidação das sociedades contratuais A liquidação é a segunda etapa do encerramento da sociedade e o Código Civil, nos art. 1102 a 1112 trata do seu procedimento que é o mesmo para todas as sociedades contratuais. A etapa da liquidação consiste basicamente no levantamento do ativo e pagamento do passivo para que depois possa ser dada baixa no registro da pessoa jurídica. Essa liquidação pode ocorrer no âmbito judicial ou extrajudicial e é dividida em 3 etapas. A primeira é a nomeação do liquidante, que será feita pelos próprios sócios se for extrajudicial ou pelo juiz no caso de liquidação judicial. o liquidante é quem passará a ser o representante legal da pessoa jurídica e tem seus deveres especificados no art. 1103. A segunda fase é quando ocorre a liquidação propriamente dita. O liquidante irá vender o patrimônio, cobrar os devedores para poder fazer o pagamento de todo o passivo existente. Caso nessa etapa o liquidante perceba que a sociedade não terá como pagar todo seu passivo, tem a obrigação de confessar o estado de insolvência ou a falência, pois não conseguirá encerrar a liquidação se não fizer todos os pagamentos.
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Se conseguir pagar todo o passivo o liquidante irá fazer um balanço final e apresentar aos sócios ou ao juiz que irão analisar as contas e aprová-las ou não. • Nomeação do liquidante Liquidação
• Levantamento do ativo e pagamento do passivo { • Apresentação do balanço final
Com as contas aprovadas, estará encerrada a liquidação e poderá ser dada a baixa no registro da sociedade, seja no Cartório ou na Junta Comercial. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame organizado pelo CESPE para a Magistratura/PA/2012, a alternativa a ser marcada tratava do fim da sociedade empresária e afirmava que "A personalidade jurídica da sociedade empresária termina com o procedimento dissolutório, que compreende obrigatoriamente a dissolução, a liquidação e a partilha."
Liquidação
Judicial
Extrajudicial
Nomeação do liquidante
Feita pelo juiz
Feita pelos sócios em escolha da maioria dos presentes
Levantamento do ativo e pagamento do passivo
Venda de bens feita particularmente
Venda pode ser feita por hasta pública
Balanço final e apresentação das contas
Apresentação ao juiz que irá aprovar ou não
Apresentação em reu nião ou assembleia de sócios que irá aprovar ou não
7. SOCIEDADE ANÔNIMA 7.1. Introdução A origem da sociedade anônima remonta das antigas companhias marítimas, o que faz com que até hoje ela seja considerada o tipo societário mais complexo do ordenamento jurídico brasileiro.
156
DIREITO SOCIETÁRIO
Por sempre estar ligada a grandes empreendimentos, houve tempo que a sociedade anônima estava totalmente submetida ao controle estatal, necessitando que autorização para ser constituída e sendo fiscalizada no seu funcionamento. Caracteriza-se até nos dias atuais por permitir a atração de investimentos dos mais diversos interesses, facilitando que sua constituição ocorra com um volume maior de capital. A sociedade anônima é atualmente regida pela Lei 6.404, de is de dezembro de i976 (Lei das SA), e assim permaneceu quando entrou em vigor o novo Código Civil, já que o art. io89 ressaltou que ela continuaria sendo tratada pela lei especial. AS.A tem como uma das características principais ser uma sociedade empresária, independente da atividade que pratique (artigo 2°, § i 0 da Lei de S.A e artigo 982, parágrafo único do Código Civil). Além disso, ela é considerada sempre uma sociedade de capitais, o que faz com que haja liberdade total para os acionistas alienarem sua participação, vender suas ações. Dentre as sociedades já estudadas, a sociedade anônima é a primeira cujo ato constitutivo é um estatuto e não um contrato. Tal fato traz consequências principalmente no campo formal, pois em termo de relações entre os sócios é possível vislumbrar a natureza contratual. 7.2. Conceito e responsabilidade dos sócios pelas obrigações da sociedade Sociedade anônima é a que possui o capital dividido em panes iguais chamadas ações, e tem a responsabilidade de seus sócios ou acionistas limitada ao preço de emissão das ações subscritas ou adquiridas. Isso é o que se depreende do art. i 0 da Lei das SA. Art. i• A companhia ou sociedade anônima terá o capital dividido em ações, e a responsabilidade dos sócios ou acionistas será limitada ao preço de emissão das ações subscritas ou adquiridas.
Aqui não há qualquer tipo de solidariedade entre os sócios pela integralização do capital. Cada um responde pela sua parte, mas esta foi a primeira sociedade a dar limitação de responsabilidade aos sócios e por isso sua grande importância nos dias atuais, em que cada vez mais o investimento nas atividades mercadológicas se torna um negócio de risco. 157
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
Na sociedade anônima, portanto, o acionista ficará com seu risco limitado, pois sua única responsabilidade, regra geral, é integralizar as ações de acordo com o valor de emissão. Após isso, em regra, não mais poderá ser cobrado pelas obrigações da sociedade. Dependendo da participação que o sócio tenha na sociedade, nem mesmo poderá ser atingido pela desconsideração da personalidade jurídica, se não teve nenhuma envolvimento com o ato abusivo que a ensejou. ~
Importante!
Na sociedade anônima não há solidariedade entre os sócios pela integralização do capital. Aqui cada um é responsável pela sua integralização.
7.3. Espécies de sociedade anônima De acordo com o art. 4º da Lei de S.A., esta pode ser fechada se não negociar seus valores mobiliários (ações, debêntures. partes beneficiárias e bônus de subscrição) no mercado de capitais ou ser aberta , caso faça a venda desses valores no mercado. AS.A. de capital aberto vai ser fiscalizada por uma autarquia federal chamada de Comissão de Valores Mobiliários (CVM), criada pela Lei n° 6.385/76, pois o movimento de venda de ações gera um grande interesse social e principalmente econômico. Estruturalmente os dois tipos de sociedade anônima terão diferenças que serão analisadas no decorrer do estudo. .
Sociedade Anônima
Capital Abeno
Capital Fechado
Negocia os valores mobiliários no mercado de capitais
Não pode se valer do mercado para negocias seus valores
7.3.1. Mercado de capitais
o mercado de capitais é o local em que a sociedade anônima de capital aberto negocia seus valores mobiliários. o sítio da BMFaBovespa cita uma interessante definição do que seja o mercado de capitais, vejamos: "O mercado de capitais é um sistema de distribuição de valores mobiliários, que tem o propósito de 158
DIREITO SOCIETÁRIO
proporcionar liquidez aos títulos de emissão de empresas e viabilizar seu processo de capitalização. É constituído pelas bolsas de valores, sociedades corretoras e outras instituições financeiras autorizadas. No mercado de capitais, os principais títulos negociados são os representativos do capital de empresas - as ações - ou de empréstimos tomados, via mercado, por empresas - debêntures conversíveis em ações, bônus de subscrição e "commercial papers" -, que permitem a circulação de capital para custear o desenvolvimento econômico. O mercado de capitais abrange, ainda, as negociações com direitos e recibos de subscrição de valores mobiliários, certificados de depósitos de ações e demais derivativos autorizados à negociação."7 Em virtude do sistema econômico que vivemos nos dias atuais, o mercado de capitais tem grande importância para a manutenção do equilíbrio econômico e, por isso, existe uma autarquia federal que busca regular tal mercado. É a já acima mencionada Comissão de Valores Mobiliários (CVM) que é tratada na Lei n° 6.385/76. A CVM tem funções fiscalizadora, de registro, regulamentar, de fomento e também de consulta, porém, sempre ligada à atividade das companhias abertas, pois sua intenção é estar presente apenas onde estiver o mercado de capitais.
O mercado de capitais é formado por dois tipos diferentes de entidades que serão responsáveis pelas suas atuações: bolsa de valores e mercado de balcão.
7.3.1.1. Bolsa de Valores A mais conhecida entidade responsável pelo movimento do mercado de capitais são as bolsas de valores que são centros de negociação em que se reúnem compradores e vendedores de valores mobiliários (ações, títulos de créditos, moedas e mercadorias) para realizarem operações. As bolsas são constituídas como associações civis e, portanto, sem finalidade lucrativa, tendo por finalidade oferecer uma infraestrutura adequada às negociações.
Trata-se de um mercado secundário, pois negocia apenas ações que já foram adquiridas por algum acionista, mas que agora pretendem Disponível em: http://www.bmfbovespa.corn.br/Pdf/merccap.pdf.
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
negociá-las, ou seja, quem faz a operação de venda e não a sociedade.
é o titular da ação
As bolsas funcionam sob a supervisão e fiscalização da CVM, sendo que qualquer operação que for contrária às normas específicas, será objeto de análise deste órgão.
7.3.1.2. Mercado de Balcão A outra entidade responsável pelo movimento do mercado de capitais é o mercado de balcão que se caracteriza pelo fato de as negociações ocorrem diretamente entre comprador e vendedor de uma forma privada, sem que os demais participantes do mercado tenham infonnações sobre o preço, as condições de entrega, de pagamentos, a qualidade negociada. Assim sendo, nenhuma das partes tem a infonnação de como está ocorrendo a formação de preço, portanto, cada agente não sabe se está negociando pelo preço mais justo possível. Aqui os riscos devem ser totalmente assumidos pelos agentes. Não se tem garantia de que o negócio será liquidado, bem como não se sabe ao certo que tanto o pagamento será honrado e a qualidade acertada será entregue. Se se enquadrar na Instrução n° 461/2007 da CVM, o mercado de balcão passa a ser conhecido como mercado de balcão organizado e passará a ter a mesma fiscalização que ocorre para as bolsas de valores. Traz, assim, um pouco mais de segurança ao investidor. Bolsa de Valores
Mercado de Balcão
Deve ser constituída como associação civil, sem fins lucrativos.
Pode ser constituída sob a forma de sociedade e, portanto, com fins lucrativos.
As negociações são realizadas publicamente.
São negociações realizadas privadamente.
As operações são realizadas por intermédio de corretores.
Envolvem a presença física de um vendedor e comprador.
Os preços são justos, vez que são ditados pelo mercado.
Falta de transparência na formação de preços.
Diversos sistemas de garantias.
Riscos devem ser assumidos pelas partes envolvidas no negócio.
160
DIREITO SOCIETÁRIO
7.4. Constituição A constituição da sociedade anônima ocorrerá de duas formas diferentes, dependendo do tipo: S.A. aberta ou S.A. fechada. Já se observa aqui uma diferença importante para a sociedade limitada, pois somente a burocracia necessária para se constituir uma S.A. demonstra uma maior complexidade. Porém, independente de ser a constituição de uma S.A aberta ou fechada, terão que ser observadas três etapas que passaremos a analisar.
7.4.1. Requisitos preliminares Inicialmente é preciso destacar que seja qual tipo de sociedade anônima que se esteja sendo constituído, deverão ser observados os requisitos gerais do an. 80 da LSA (Lei das Sociedades Anônimas). Ele vai estabelecer a observância de 3 requisitos preliminares, quais sejam: subscrição, pelo menos por 2 (duas) pessoas, de todas as ações em que se divide o capital social fixado no estatuto; realização, como entrada, de ioºk (dez por cento), no mínimo, do preço de emissão das ações subscritas em dinheiro; depósito, no Banco do Brasil S/A., ou em outro estabelecimento bancário autorizado pela Comissão de Valores Mobiliários, da parte do capital realizado em dinheiro. O primeiro requisito demonstra o que aqui já foi abordado que é o fato de não ser a regra do direito brasileiro a existência de sociedade unipessoal, portanto, será preciso ter os dois sócios para iniciar. Haverá possibilidade na S.A. de transitoriamente ter-se apenas um sócio, mas um detalhe importante aqui é que há uma exceção de caráter permanente. São as sociedades previstas no art. 251 da LSA, conhecidas por subsidiárias integrais. Art. 251. A companhia pode ser constituída, mediante
escritura pública, tendo como único acionista sociedade brasileira.
Desde a sua constituição e durante todo o seu funcionamento a subsidiária integral funcionará com um sócio apenas desde que este seja outra sociedade brasileira. O segundo requisito preliminar guarda relação com os próprios gastos iniciais que se tem para constituir uma sociedade anônima 161
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
que às vezes são muitos. A integralização, regra geral, não precisa acontecer no momento de constituição de uma sociedade, podendo o ato constitutivo estabelecer que ela se dará posteriormente, porém, aqui na S.A. 10°k do valor do capital deve ser integralizado à vista e em dinheiro para que se possa garantir que a sociedade irá efetivamente "sair do papel". O terceiro requisito existe para se evitar a burla do segundo. Não basta alegar que haverá a integralização de 10ºk à vista e em dinheiro, esse valor deverá ser depositado para comprovar que ele está realmente à disposição da sociedade. Se os três requisitos estiverem devidamente preenchidos, passa-se à próxima etapa que é conhecida como subscrição.
7.4.2. Subscrição Em seguida passa-se a criação da companhia que será por subscrição pública se ela for de capital aberto ou por subscrição particular se ela for de capital fechado.
7.4.2.1. Subscrição Pública Se a constituição for de uma companhia de capital aberto, esta etapa é conhecida como por subscrição pública e contará com três etapas: 1ª etapa
2ª etapa
3ª etapa
Registro de emissão: avaliação de uma underwriting e registro na CVM
Colocação das ações no mercado.
Assembleia de constituição. (ans. 121 a 131 da LSA)
Vamos analisar cada uma dessas etapas. Como já mencionado anteriormente, a companhia aberta gera interesse público, pois ela terá grande responsabilidade sobre o movimento do mercado de capitais e, consequentemente, sobre o sistema econômico do país. Nesse contexto, não se pode permitir que sejam constituídas sociedades que já nasçam sem boas perspectivas e, portanto, a primeira etapa da subscrição pública é a análise da CVM da viabilidade econômica da sociedade. Os fundadores deverão apresentar o projeto de estatuto e um prospecto narrando as principais 162
DIREITO SOCIETÁRIO
características, valor dos investimentos, forma de captação de recursos, objeto social, ou seja, as informações mais importantes para a análise da CVM. Tais documentos deverão ser acompanhados de um parecer de uma sociedade especializada em análise de perspectivas empresariais (é chamada de underwriting, sem uma tradução para o português). Com base em tais documentos a CVM irá autorizar ou não o prosseguimento da constituição da S.A., de acordo com a viabilidade econômica que for possível perceber. Se for efetivado o registro pela CVM passa-se para a segunda etapa da constituição que é a captação de investidores no mercado de capitais. Como a característica principal da S.A. aberta é a negociação dos seus valores mobiliários no mercado, na sua constituição não seria diferente. Nessa etapa será elaborado o boletim de subscrição, que é o documento a ser assinado por aqueles que pretendem adquirir as ações e ele será levado a algum órgão do mercado de capitais para captar os investidores. Tal etapa só estará concluída quando os 100°k. das ações estiverem subscritas. Chama-se de mercado primário a venda das ações, pois aqui é a própria sociedade que a está negociando. Feita a subscrição já está definido o quando de sócios da sociedade e então eles se reunirão em Assembleia para votarem o estatuto definitivo e elegerem os membros para os cargos que tiverem sido criados. É a partir desse momento que já se pode dizer que a sociedade está criada, encerrando a subscrição pública e partindo para as providências complementares. Antes de estudarmos quais são essas providências, analisemos a constituição por subscrição particular.
7.4.2.2. Subscrição Particular Já se a intenção for criar uma companhia de capital fechado, essa etapa será chamada de subscrição particular e terá apenas uma etapa que é a realização de uma assembleia de fundação nos moldes da subscrição pública. A única diferença é que esta assembleia poderá ser substituída pela lavratura de uma Escritura Pública - art. 88. A justificativa para a existência dessa etapa única é muito simples. Não há que se falar em intervenção da CVM para sua constituição tendo em vista que a companhia fechada não movimenta o mercado de capitais e exatamente por isso não tem como captar os investidores no mercado, ou seja, para criar a S.A. Fechada, os fundadores irão buscar 163
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
os investidores de modo particular, apresentado diretamente a proposta para a criação da sociedade . • Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova de organização da FGV para Fiscal de Rendas/SEFAZ/RJ/2010, a questão pedia para analisar três itens sobre a constituição de sociedade anônima . o primeiro estava incorreto, pois afirmava que upara a validade da constituição da sociedade anônima, são necessários, no mínimo, sete subscritores iniciais de todas as ações em que se divide o capital social fixado no estatuto." Já a segunda estava correta e dizia que "ara a constituição por subscrição pública, é necessário o prévio pedido de registro da emissão de ações na Comissão de Valores Mobiliários, assinado pelo fundador e por uma instituição financeira intermediária." Também correta estava a terceira afirmativa já que tinha o seguinte dizer: "É possível a constituição de uma companhia fechada por meio de escritura pública lavrada em cartório de notas."
7.4.3. Providências complementares Após a subscrição, seja pública ou privada, deverão ser observadas as providências complementares: a primeira providência é levar o estatuto ao registro na Junta Comercial. Esse é o requisito para a aquisição de personalidade jurídica. Depois de levado a registro na Junta Comercial, o estatuto tem que ser publicado em até trinta dias depois em jornal de grande circulação local. Passadas todas essas etapas a sociedade anônima estará constituída e regularizada. Observe que é um procedimento bem mais burocrático do que os já analisados até aqui. • Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame organizado pela FGV para Auditor Fiscal/SEFAZ/RJ/2011, o enunciado da questão contava a seguinte história para depois perguntar quando a sociedade seria considerada constituída e regular: UA Companhia CBA Tintas, sociedade anônima cujo capital social fixado no projeto do estatuto, no valor de RS 100.000,00 (cem mil reais), foi dividido em oitenta ações ordinárias no valor total de RS So.000,00 (oitenta mil reais) a serem subscritas pelos sócios João e José, em partes iguais, e vinte ações preferenciais no valor total de RS 20.000,00 (vinte mil reais) a serem subscritas pelo sócio Joaquim, é considerada
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regularmente constituída somente a partir". A resposta correta era a que afirmava: #do arquivamento dos documentos relativos à constituição no Registro Público de Empresas Mercantis e a sua subsequente publicação, em até trinta dias, em órgão oficial do local de sua sede."
7.5. Abenura e fechamento do capital Como se analisou no item anterior, a constituição da sociedade anônima poderá ser como aberta ou fechada, porém, a sociedade não é obrigada a se manter sempre sob a mesma espécie, podendo a qualquer momento mudar sua espécie. Se a sociedade anônima era de capital fechado e quiser mudar para capital aberto, diz-se que ela fará abertura do capital e se for inverso, diz-se que ela irá realizar o fechamento do capital. O primeiro procedimento formal para a empresa abrir o capital é protocolar um pedido de registro de companhia na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) que, como já foi mencionado, é o órgão regulador e fiscalizador do mercado de capitais brasileiro. Esse pedido de registro deverá ser instruído de acordo com a instrução 480 da CVM. Uma vez que a sociedade anônima possui capital aberto, através do registro na CVM ela está apta a ter seus valores mobiliários, sendo o mais comum suas ações, negociados no mercado regulamentado. Simultaneamente ao pedido perante a CVM, a sociedade também pode solicitar a listagem na BMtlFBOVESPA. Somente as empresas que obtêm esse registro podem ter suas ações e debêntures negociadas na Bolsa. Dentre os requisitos da instrução 48o da CVM para o registro da companhia está a deliberação societária aprovando a transformação da sociedade em companhia aberta e uma série de outros documentos contábeis que são necessários para assegurar que os novos investidores não serão induzidos a quaisquer erros, caso optem em adquirir valores mobiliários dessa empresa em uma eventual oferta. Por serem as empresas abertas, forçadas a cumprirem com normas de transparência mais amplas que as fechadas, as concessionárias de serviços públicos bem como as que foram adquiridas em privatizações, são companhias abertas. Os editais assim obrigavam, como mais um mecanismo de assegurar que essas empresas possam sempre
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ser acompanhadas pelos maiores interessados que são os cidadãos comuns. Por outro lado, para algumas empresas, diversos motivos levam à decisão de deixar de comercializar valores mobiliários no mercado regulamentado. Isso se dá por vários fatores, contudo, o mais comum é a falta de necessidade de levantamento de recursos no mercado. Não havendo tal necessidade, a manutenção da sociedade como capital aberto passa a ser bastante dispendiosa e, portanto, os acionistas optam por fechar o capital da empresa. No fechamento de capital, as ações não estarão mais disponíveis aos investidores. O maior cuidado resta sobre a situação dos acionistas minoritários de tais empresas (e a Lei está bem atenta nesse sentido). É importante que durante esse processo os minoritários não tenham prejuízos causados pelos acionistas majoritários que continuarão na empresa. Assim a empresa deverá requerer o cancelamento do registro na CVM. O pedido de cancelamento de registro deverá ser precedido de uma oferta pública de aquisição de ações ("OPA") específica para o fechamento de capital. É a OPA que trata o Artigo 4º da Lei 6404 de i976. Existem outras situações em que é necessária a OPA ex vi legis. Essa OPA pode ser formulada pelo acionista controlador ou pela própria companhia, tendo por objeto todas as ações por ela emitidas. o cancelamento apenas acontecerá se mais de 2/3 das ações em circulação aceitarem a OPA ou concordarem expressamente com o cancelamento do registro. Para fins de fechamento de capital, considera-se "ações em circulação" apenas as ações cujos titulares concordarem expressamente com o cancelamento do registro ou se habilitarem para o leilão da OPA. Assim, é possível promover o cancelamento de registro mediante aquisição de um número reduzido de ações. Sobre o preço ofertado para as ações objeto da OPA, este deve ser ao menos igual ao valor de avaliação da Companhia, apurado com base em critérios isolados ou combinados, desde que aceitos pela CVM. Importante ainda ressaltar que, se restarem em circulação, após a realização da OPA, menos de 5ºk do total de ações emitida, a Assembleia Geral da Companhia poderá aprovar o resgate de tais ações mediante o pagamento do valor por ação definido na OPA.
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~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame organizado pelo CESPE para a Magistratura/PB/2011, o enunciado da questão pedia para assinalar a resposta correta, no que diz respeito às sociedades anônima de capital aberto e a alternativa correta era a que dizia: "permite-se o fechamento do capital da sociedade anônima desde que precedido de oferta pública para a aquisição de todas as ações em circulação por preço justo." 7.6. As ações 7.6.1. Conceito AS.A tem seu capital social dividido em ações. A ação é o valor mobiliário representativo de uma parcela do capital social da sociedade anônima emissora que atribui ao seu titular a condições de sócio desta. A ação é considerada um bem móvel, por isso chamada de valor mobiliário e assim terá liberdade de circulação. Já foi considerada como título de crédito, mas hoje não se pode atribuir tal natureza por contradizer um requ isito básico dos títulos que é o de representar um crédito liquido e certo. Otitular da ação adquirirá direitos e obrigações de sócio, mas não significa que terá valores líquidos e certos a receber da sociedade. O acionista não é credor da companhia. 7.6.2. Espécies e classes Os acionistas são os investidores principais da sociedade anônima, pois é através da integralização de suas ações que o capital e consequentemente o patrimônio da sociedade será formado. Como muitas vezes esse investimento de capital na S.A. exige valores altos, surge a necessidade de se atrair diferentes tipos de investidores e é, por isso, que as ações poderão ser divididas em espécies diferentes. A espécie da ação é que leva em consideração a natureza dos direitos e vantagens do acionista e se manifesta em três critérios: ações ordinárias, ações preferenciais e ações de fruição. A ordinária é ação que confere ao acionista os direitos de um sócio comum. Otitular dessa espécie de ação não possui nenhuma vantagem nem se submete a qualquer tipo de restrição aos direito atribuídos aos sócios.
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A ação preferencial é aquela que dá ao seu detentor um tratamento diferenciado em relação ao acionista possuidor de ação ordinária, cuja definição deve se fazer presente no estatuto da sociedade, fixando a preferência nesse tipo de ação. O que acontece aqui é que se retira algum direito do acionista, que poderá ser qualquer um que não esteja no rol dos direitos fundamentais do art. 109 da LSA, mas em compensação dá-se uma vantagem de caráter pecuniário, de acordo com o que está previsto no art. 17: Art. 17. As preferências ou vantagens das ações preferenciais podem consistir: 1-
em prioridade na distribuição de dividendo, fixo ou mínimo;
li - em prioridade no reembolso do capital, com prêmio ou sem ele; ou Ili - na acumulação das preferências e vantagens de que tratam os incisos 1e li.
Vamos criar alguns exemplos para que a compreensão se torne mais fácil. É muito comum nas sociedades anônimas os sócios fundadores pensarem em atrair investidores que estejam mais interessados em recebimentos de lucros do que participar das decisões societárias, então criam ações preferenciais sem direito a voto, mas com recebimento de 5ºk de preferência na hora da distribuição de lucros. Outra situação seria quando a sociedade quer evitar a circulação das ações, então cria ações preferenciais com limitação para a venda, mas com uma preferência de lOºk no caso de reembolso de capital. Várias são as hipóteses de ações preferenciais que poderão ser criadas de acordo com o interesse da sociedade. De acordo com o art. 18, as ações preferenciais também poderão conceder vantagens políticas, concernentes no direito de eleger, em votação em separado, um ou mais membros dos órgãos de administração. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No certame de organização da FCC para Magistratura/PE/2011, pedia-se para assinalar a alternativa correta que era: "o estatuto poderá prever vantagens políticas, assegurando a uma ou mais classe de ações preferenciais o direito de eleger, por votação em separado, um ou mais membros dos órgãos de administração."
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As ações de fruição são atribuídas aos acionistas cujas ordinárias ou preferenciais foram totalmente amortizadas. Por amortização entende-se: a antecipação ao sócio do valor que ele provavelmente receberia, na hipótese de liquidação da companhia. Art. is. As ações, conforme a natureza dos direitos ou vantagens que confiram a seus titulares, são ordinárias, preferenciais, ou de fruição. § i• As ações ordinárias da companhia fechada e as ações pre-
ferenciais da companhia aberta e fechada poderão ser de uma ou mais classes. § 2° o número de ações preferenciais sem direito a voto, ou sujeitas a restrição no exercício desse direito, não pode ultrapassar 5oºk (cinquenta por cento) do total das ações emitidas.
Espécies de ações Ordinárias
Preferenciais
São as ações comuns São as ações que retique não dão nenhuma ram algum direito do vantagem, mas conce- acionista, mas concede dem todos os direitos uma vantagem pecuniáaos acionistas. ria ou política.
De fruição São as ações que foram amortizadas e o acionista passa apenas a fruir dela. 988
As ações ainda podem ser divididas em classes. Essas serão subespécies de ações em que se separam alguns detalhes de outros. No caso das ações ordinárias, somente nas companhias fechadas é que elas poderão ser divididas em classes que deverão seguir as possibilidades restritas do art. 16 da LSA, ou seja, somente poderão ser divididas em classes para prever: conversibilidade em ações preferenciais; exigência de nacionalidade brasileira do acionista ou direito de voto em separado para o preenchimento de determinados cargos de órgãos administrativos. Já as ações preferenciais podem ser divididas em classes na companhia aberta ou fechada e poderão ter diversas em cada sociedade. São normalmente designadas por letras, nos exemplos acima mencionados, o estatuto poderia estabelecer que as ações preferenciais de classe A serão ações sem direito a voto, mas com recebimento de 5°k de preferência na hora da distribuição de lucros, e
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as ações preferenciais de classe B não poderão ser renegociadas em menos de 3 anos, mas terão uma preferência de ioºk no caso de reembolso de capital.
Espécies de ações Ordinárias
Preferenciais
De fruição
São as ações comuns que não dão nenhuma vantagem, mas concedem todos os direitos aos acionistas.
São as ações que retiram algum direito do acionista, mas concedem uma vantagem pecuniária ou política.
São as ações que foram amortizadas e o acionista passa apenas a fruir dela.
7.6.3. Formas Quanto
à forma, a teor do art.
20 da Lei de S.A., temos que as ações
devem ser nominativas, e quanto a esse aspecto dividem-se em nominativas e escriturais, cuja classificação se dá pela forma de transferência da sua titularidade. As ações nominativas ficam em cautela. Por definição, esse tipo de
ação é aquele que identifica o proprietário. A propriedade presume-se pela inscrição do nome do acionista no livro de Registro de Ações Nominativas ou pelo extrato fornecido pela instituição custodiante. As ações escriturais são aquelas cuja propriedade é caracterizada
por extrato de conta de depósito do titular, em instituição financeira depositária que for designada e não emite certificado.
• Como esse assunto foi cobrado em concurso? Na prova da Magistratura/Pl/2012 organizada pelo CESPE, no que diz respeito à fonna das ações, foi requerido que fosse assinalada a afirmativa verdadeira que era a que afinnava: "Nos certificados das ações devem constar a denominação da companhia, sua sede e prazo de duração, e a omissão dessas declarações confere ao acionista direito a indenização por perdas e danos contra a companhia e contra os diretores na gestão dos quais os certificados hajam sido emitidos.# Após reforma realizada na Lei de S.A. em 1990, pela Lei 8.021, não existem mais ações endossáveis ou ações ao portador. Isso acabou com qualquer possibilidade de os acionistas serem totalmente
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desconhecidos pela sociedade. Desta forma, as ações terão que ser sempre nominativas. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No certame de organização da CESGRANRIO para Advogado da Petrobrás/2011, o enunciado da questão trazia a seguinte informação: UAo folhear uma revista jurídica, um advogado identificou uma incorreção em uma matéria escrita que versava sobre sociedade anônima. Qual das afirmações abaixo foi a identificada pelo advogado?". A afirmativa que estava incorreta e deveria ser marcada era a que dizia: "As ações podem ser classificadas, quanto à forma, em nominativas, endossáveis, ao portador e escriturais."
7.6.4. Valores Diversos são os valores que as ações poderão ter. O mais relevante e que sempre vai existir para qualquer ação é o valor de emissão. Toda vez que uma ação for criada, seja porque a própria sociedade está em constituição, seja porque está sendo realizado aumento de ações, deverá ser estipulado um valor que o interessado irá pagar pela integralização caso venha a subscrevê-la. Normalmente, em outros tipos societários, este é o valor nominal, ou seja, o valor total do capital dividido pelo número de ações. Porém, estamos diante de uma sociedade de capitais, em que o investimento se torna fundamental. Sendo assim, se a sociedade acreditar que haverá interesse dos investidores, poderá dizer que a ação não terá valor nominal e cobrar qualquer outro valor pela integralização da ação, que será o valor de emissão. O art. i3 da LSA preconiza, com propriedade, que o valor de emissão não poderá ser inferior ao valor nominal, pois se assim for, após a integralização de todas as ações, não se apurará o valor docapital social, o que não é permitido. O valor de capital que é declarado no estatuto tem que ser efetivamente integralizado. Poderá ainda a ação ser observada pelo prisma do seu valor patrimonial. Aqui também se tem uma simples conta matemática para se aferir tal valor. Basta contabilizar o patrimônio liquido da sociedade e
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dividi-lo pelo número de ações. Esse valor que será usado para o caso de amortização das ações ou nos casos de direito de retirada que provoca a dissolução parcial da sociedade. No que diz respeito à venda da ação por seu titular, o valor poderá ser o "de negociação" se a cessão for feita no âmbito particular e será "valor de mercado" se a ação for negociada no mercado de capitais.
7.6.5. Negociação com as próprias ações No caput do art. 30 o legislador pareceu ser taxativo quando proibiu que a sociedade negocie com suas próprias ações, parecendo ter o objetivo de evitar práticas especulativas, porém, no parágrafos que sequenciam enumera uma série de exceções a essa proibição e as condições para que possa ocorrer. Como vamos observar, a maioria das possibilidades de a sociedade negociar com suas próprias ações estão ligadas a medidas que conduzem à extinção dos papéis, sendo apenas uma hipótese em que as ações permanecerão integrando o patrimônio social. Art. 30. A companhia não poderá negociar com as próprias ações. § i• Nessa proibição não se compreendem: a) as operações de resgate, reembolso ou amortização previstas em lei; b) a aquisição, para permanência em tesouraria ou cancelamento, desde que até o valor do saldo de lucros ou reservas, exceto a legal, e sem diminuição do capital social, ou por doação; c) a alienação das ações adquiridas nos termos da alínea b e mantidas em tesouraria; d) a compra quando, resolvida a redução do capital mediante restituição, em dinheiro, de parte do valor das ações, o preço destas em bolsa for inferior ou igual à importância que deve ser restituída. § 2° A aquisição das próprias ações pela companhia aberta obedecerá, sob pena de nulidade, às normas expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários. que poderá subordiná-la à prévia autorização em cada caso.
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§ 3º A companhia não poderá receber em garantia as próprias ações, salvo para assegurar a gestão dos seus administradores. § 4° As ações adquiridas nos termos da alínea b do §
i 0 , enquanto mantidas em tesouraria, não terão direito a dividendo nem a voto.
§ 5° No caso da alínea d do §
as ações adquiridas serão retiradas definitivamente de circulação. i 0,
A negociação da sociedade com as próprias ações acontece de fato no caso de ações em tesouraria. Nesse caso, as ações passam a integrar o ativo da companhia que se torna acionista de si própria. A sociedade irá investir em seus próprios papéis. Para ocorrer tal operação, devem ser atendidas duas condições: primeira é que a sociedade somente poderá utilizar para a compra das ações o saldo de lucros e reservas livres e o segundo é que o capital social deverá permanecer o mesmo. Exige-se que a aquisição seja feita com as reservas ou lucros para preservar o capital social, pois senão a compra iria implicar na anulação do ativo correspondente ao capital. Realizada a compra das ações, a companhia irá definir se permanecerá com elas ou irá recolocá-las em circulação. A venda poderá trazer resultado positivo e será contabilizado como reserva de capital ou trazer prejuízo que será debitado da conta de reserva. As ações em tesouraria também poderão ser canceladas, fazendo o débito definitivo na correspondente reserva, realizando o aumento do valor nominal das demais ações, se o tiverem, já que nesse caso teremos menos ações e o mesmo valor de capital. Notemos que o §4° determina que as ações em tesouraria, enquanto assim permanecerem, não terão direito a voto nas assembleias gerais e também não participarão dos dividendos. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova para Magistratura do Trabalho/6- região/2013, exame organizado pelo FCC, a questão pedia para assinalar a afirmativa correta sobre a sociedade anônima que era a seguinte: ·a companhia pode adquirir as próprias ações para permanência em tesouraria. w
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7.7. Demais valores mobiliários Além das ações, as S.A podem emitir debêntures, bônus de subscrição e partes beneficiárias. Debêntures são valores mobiliários emitidos pelas sociedades anônimas, que representam empréstimos contraídos pelas mesmas, cada título dando, ao debenturista, idênticos direitos de crédito contra as sociedades, estabelecidos na escritura de emissão. Não dá direito de ser acionista, apesar de a debênture poder ser convertida em ações. Elas vêm tratadas no art. 52 ao art. 74 da Lei de S.A.
As partes beneficiárias são títulos que conferem aos seus titulares direito de crédito eventual contra a sociedade, consistente na participação nos lucros. É um negócio de alto risco, pois o detentor desse valor mobiliário somente obterá vantagens se a sociedade der lucros, o que pode não ocorrer. É tratada do art. 46 ao art. 51 da Lei de S.A.
Já os bônus de subscrição são valores mobiliários que a companhia pode emitir, dentro do limite de aumento de capital autorizado pelo estatuto, que dão direito de preferência aos seus titulares de subscrever ações do capital social mediante apresentação e pagamento do preço de emissão. Assim, quando a sociedade decide aumentar o número das suas ações, ela poderá vender antes o direito de preferência na subscrição dessas novas ações. Esse valor mobiliário vem tratado do art. 75 ao art. 79 da Lei de S.A. ~
Como esse as.sunto foi cobrado em concurso?
No exame organizado pelo CESPE da Magistratura do Trabalho/1• região/2011. a questão pedia para assinalar a afirmativa correta sobre a sociedade anônima que era a seguinte: ·eõnus de subscrição são valores mobiliários que conferem ao seu titular, nas condições constantes do certificado, direito de subscrever; em momento futuro, ações do capital social da companhia emissora."
Tema que tem tido relevância no que diz respeito aos valores mobiliários é a existência dos comercial papers. O commercial paper tem sido utilizado para permitir a captação de recursos financeiros para o custeio de sociedades anônimas,
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geralmente com problemas momentâneos de liquidez, como uma alternativa além dos empréstimos bancários. Esse título tem como objetivo principal a obtenção de recursos reclamados pelo desenvolvimento da atividade econômica de uma sociedade anônima, constituindo-se como instrumento para financiamento do capital de giro e contribuindo para a redução dos custos que oneram as atividades econômicas. Ocorre que o commerciol poper não é regulamentado no direito brasileiro como um tipo de título de crédito distinto dos já existentes. Os juristas da Comissão de Valores Mobiliários, quando da sua criação, optaram pela nota promissória, não apenas por ser título de largo uso no mercado interno, mas, ainda, porque para criar um novo título de crédito seria necessária a aprovação do Congresso Nacional. Esse novo valor mobiliário é, na verdade, uma nota promissória garantida ou não, negociável, de curto prazo, valor fixo e vencimento em data certa. Importante observar ainda que o commerciol poper tem como particularidade o fato de que ele é uma nota promissória que só pode ser emitida por uma S.A., enquanto a nota promissória pode ser emitida por pessoas físicas ou jurídicas, podendo ainda ser civil ou comercial. Neste panorama, disciplina o art. 7° da Instrução Normativa i34 da
CVM: Art. 7° - o prazo de vencimento das notas promissórias, conta· do a partir da data da emissão, será de: 1- trinta dias, no mínimo, e cento e oitenta dias, no máximo, quando emitidas por companhia fechada; li - trinta dias, no mínimo, e trezentos e sessenta dias, no máximo, na hipótese de emissão por companhia aberta.
( ...) § 2° A emissora pode, havendo anuência expressa do titular, resgatar antecipadamente as notas promissórias.
(. .. ) § 4º o resgate parcial deve ser efetivado mediante sorteio ou leilão, observado o prazo mínimo deste artigo.
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Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No concurso para a Magistratura Federal/2• região/2011, de responsabilidade do CESPE, o enunciado da questão afirmava que NO modelo da sociedade anônima foi concebido originalmente para viabilizar grandes empreendimentos, constituindo instrumento próprio para a captação de recursos perante número expressivo de investidores. Com relação a esse tipo de sociedade, assinale a opção correta.# E a opção correta era a que dizia "O commercial paper, por constituir título de curto prazo, deve ser emitido com vencimento mínimo de trinta dias contados da emissão do título. Em se tratando de companhia fechada, o prazo máximo será de cento e oitenta dias; tratando-se de companhia aberta, o prazo poderá chegar a trezentos e sessenta dias. Existe a possibilidade de resgate antecipado do referido título, desde que com anuência do titular; se o resgate for parcial, deverá ser realizado sorteio ou leilão entre os titulares. N
7.8. Obrigações e direitos dos acionistas Constituída a companhia, surgem para os soc1os a sua principal obrigação, que é a de integralizar as ações que subscreveram. O art. 107 da Lei de S.A. irá tratar sobre a mora do acionista, ou seja, daquele acionista que não integralizou sua parte do capital social, tornando-se remisso: Art. 107. Verificada a mora do acionista, a companhia pode, à sua escolha: 1- promover contra o acionista, e os que com ele forem solidariamente responsáveis (artigo io8), processo de execução para cobrar as importâncias devidas, servindo o boletim de subscrição e o aviso de chamada como título extrajudicial nos termos do Código de Processo Civil; ou li - mandar vender as ações em bolsa de valores, por conta e risco do acionista. Veja que a sociedade irá possui então duas alternativas, sendo que não existe a possibilidade de redução do capital. Ainda que o acionista primitivo seja excluído, não haverá liquidação da sua parte, pois em se tratando de uma sociedade de capitais, o investimento previsto deve ser efetivado. Em relação à companhia aberta, essa situação ainda ganha outra relevância, pois a CVM aprovou seu projeto com um
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determinado valor de investimento. Se se permitisse que tal valor fosse reduzido por causa da remissão de um dos sócios, estar-se-ia burlando a autorização da CVM.
É importante ressaltar que o § 3° desse mesmo artigo diz que mesmo que a sociedade tenha iniciado uma das opções, se perceber que ela não surte efeitos poderá desistir e passar para a outra. , Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova organizada pela CESGRANRIO para advogado do BNDES/2013, a enunciado dizia: HO Sr. X subscreveu ações da GH a J Indústria S/A, porém não efetuou o pagamento do valor das ações subscritas, o que configurou o inadimplemento de sua obrigação, além de descumprir, nesse sentido, condição prevista no estatuto social da respeaiva empresa. À vista disso, com base na Lei nº 6.404/1976, a companhia, verificada a mora do respeaivo acionista, podeH. Ea resposta era a seguinte: "promover contra ele processo de execução, a fim de cobrar-lhe as importâncias devidas, servindo o boletim de subscrição e o aviso de chamada como título extrajudicial nos termos do Código de Processo Civil.H A Lei de S.A., em seu artigo 109 enumera os direitos fundamentais dos acionistas, que são aqueles que não podem ser supridos nem pelo estatuto nem pela assembleia geral. Art. 109. Nem o estatuto social nem a assembléia-geral poderão privar o acionista dos direitos de: 1-
participar dos lucros sociais;
li - participar do acervo da companhia, em caso de liquidação;
Ili - fiscalizar, na forma prevista nesta Lei, a gestão dos negócios sociais; IV - preferência para a subscrição de ações, partes beneficiárias conversíveis em ações, debêntures conversíveis em ações e bônus de subscrição, observado o disposto nos artigos 171 e i72; V - retirar-se da sociedade nos casos previstos nesta Lei. A participação dos lucros é direito essencial em todas as sociedades. Isso não significa dizer que é obrigatória a distribuição de lucros sempre, mas que um sócio não pode ser privado, discriminadamente dessa distribuição. Se não houver distribuição em um dado exercício social, isso irá valer para todos os acionistas. 177
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Também terá o acionista o direito sobre o patrimônio da sociedade, pois ao integralizar ele contribuiu para a sua formação e se a sociedade for liquidada ele receberá sua proporção. Sobre a questão da fiscalização, trataremos com mais vagar quando falarmos do Conselho Fiscal. O direito de preferência se refere a todas as formas de criação de novos investimentos na sociedade, pois o acionista deve ter o direito de buscar manter a porcentagem no capital caso sejam aumentadas as ações. Quando do estudo da sociedade simples, falamos que o direito de retirada estava ligado ao direito constitucional previsto no art. 5°, XX de ninguém ser obrigado a ser manter associado. Aqui na sociedade anônima essa situação é diferente, pois a venda pela cessão das ações é livre, não sendo necessário o direito de retirada para garantir a liberdade constitucional. Seja a Sociedade Anônima aberta ou fechada, o acionista tem liberdade para vender suas ações seja para terceiro sócio ou mesmo não sócio, sem nenhuma necessidade de consultar os acionistas remanescentes. Isso porque, a Sociedade Anônima é um tipo societário classificado como sociedade de capitais. Nesse tipo de sociedade, o dinheiro investido pelos sócios é mais importante do que a própria pessoa deles. Assim, não importa se o sócio deixe a sociedade, porque o mais importante foi o investimento que ele realizou. Como na venda de ações não há influência no capital da sociedade, pois o negócio envolve apenas o sócio que está vendendo e a pessoa que está comprando as ações, a alienação das ações é livre. Existe apenas uma troca do quadro societário. Sendo assim, em contrapartida o direito de retirada será bastante restrito, já que o direito constitucional de liberdade de associar-se ou manter-se associado está garantido pela possibilidade de alienação da participação societária. As hipóteses em que o acionista terá o direito de retirada limitam-se às elencadas no art. 137 da Lei 6.404/76 (Lei de S.A.), vejamos: An. 137. A aprovação das matérias previstas nos incisos 1 a VI e IX do an. 136 dá ao acionista dissidente o direito de retirar-se
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da companhia, mediante reembolso do valor das suas ações (art. 45), observadas as seguintes normas:
(. ..)
Como se vê, são apenas algumas hipóteses em que os acionistas poderão retirar-se da sociedade mediante o reembolso. No entanto, é importante analisar as possibilidades que dão ensejo ao direito de retirada, lembrando que nas companhias o direito de recesso tem sua origem da discordância do acionista em relação a uma deliberação adotada pela assembleia no exame de determinadas matérias, especificadamente definidas em lei. Algumas dessas matérias, previstas no artigo 136, 1 a VI, da Lei de Sociedades Anônimas, exigem o quorum qualificado de metade, no mínimo, das ações com o direito de voto. Esse quorum pode ser aumentado no caso de previsão expressa no estatuto da companhia em que as ações da sociedade anônima não estejam admitidas em bolsa ou em mercado de balcão. Sendo, portanto, estas referentes às companhias fechadas e abertas, sendo que esta última não apresenta valores mobiliários admitidos pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) ou no caso de terem suas negociações suspensas. A primeira possibilidade que existe do sócio retirar-se é quando ocorre a criação de ações preferenciais ou aumento de classes existentes, sendo que o direito que o só existirá se houver uma desproporção entre espécies e classes de ações. Porém, só os acionistas prejudicados terão o direito de retirada. No caso de ocorrer alteração nas preferências, vantagens ou condições de resgate ou amortização de uma ou mais classes de ações preferenciais ou a criação de classe mais favorecida, também existirá o direito de recesso, para aquele preferencialistas que tiveram seu direito modificado. Aqui também deverá haver prova do prejuízo. A terceira hipótese é a da redução do dividendo obrigatório. Nessa hipótese, a alteração estatutária será prejudicial a todos os acionistas, independente de classe ou espécie que titularizam. Não será, portanto, necessário, haver a demonstração de que a alteração gerou redução nas perspectivas de retorno do investimento. Quando ocorrer aprovação de fusão da companhia, sua incorporação em outra ou participação em grupo de sociedades, poderá surgir
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o direito de recesso, mas este é mitigado, porque não há direito de recesso se a companhia é aberta e o acionista pode facilmente negociar suas ações no mercado de capital. A lei impede a retirada do titular de ações de boa liquidez cuja cotação integra o índice admitido à negociação em bolsas de futuro. A lei também obsta a retirada do titular de ações dispersas, ou seja, quando o controlador é titular de menos da metade das ações emitidas. Nessas hipóteses, a lei entende que é mais fácil o acionista se retirar da sociedade alienando sua participação societária e sem desinvestir os recursos alocados na empresa. Concluindo, o acionista dissidente terá o direito à retirada e ao reembolso se a companhia for fechada ou se for aberta, mas suas ações não possuírem liquidez e dispersão. A quinta possibilidade é a mudança de objeto da companhia de modo a restringi-lo ou ampliá-lo. Nessa hipótese também, a alteração estatutária é prejudicial a todos aos acionistas, independentemente da espécie ou classe que titularizam. Também poderá retirar-se da sociedade o sócio que discordou de uma aprovação de cisão ou da transformação da sociedade anônima em sociedade limitada (art. 221, da Lei das Sociedades Anônimas). A lei só permite direito de recesso quando há autorização estatutária, se os sócios dele não renunciaram no contrato. Se não há essa previsão, a lei condiciona a operação à concordância de todos os acionistas. Nesse caso, se um acionista discorda, não se opera a transformação do tipo societário. A sétima hipótese é a da incorporação de ações (art. 252 da Lei das Sociedades Anônimas). Refere-se à incorporação pela qual uma sociedade se torna subsidiária integral de outra. A Diretoria da sociedade incorporadora aumenta o seu capital emitindo novas ações, que são subscritas pela sociedade incorporada (a futura subsidiária) ao mesmo tempo em que ocorre a transferência da titularidade de toda a participação societária representativa do capital da incorporada para a incorporadora. Os titulares das ações da sociedade incorporada receberão as ações diretamente da incorporadora na proporção que lhes couberem . Tanto os sócios da incorporadora como os da incorporada têm o direito de recesso. Assim, como na quarta hipótese, a Lei nega o direito de retirada aos acionistas que possuem ações com liquidez e dispersão.
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DIREITO SOCIETÁRIO
A última possibilidade é a da transferência de controle acionário para o poder público em razão de desapropriação (art. 236 da Lei das Sociedades Anônimas). É o caso em que a sociedade anônima se transforma em sociedade de economia mista em razão da desapropriação das ações do controlador. Os acionistas dissidentes têm sessenta dias após a publicação da ata da primeira assembleia geral seguinte à operação, para exercer o direito de recesso. Não haverá o direito de retirada, se a companhia se encontrava sob o controle direto ou indireto de outra pessoa jurídica de Direito Público ou no caso da cessionária de serviço público. Essa é a única hipótese em que o direito de recesso não se relaciona à divergência quanto à deliberação assemblear; mas a mudança de condição da companhia. A doutrina ainda coloca a possibilidade de direito de retirada quando ocorre fechamento do capital, posição da qual se discorda, já que nesse caso haverá oferta pública das ações, oportunidade em que o sócio discordante da decisão poderá facilmente sair da companhia através da venda das ações. Como foi possível analisar, as hipóteses em que o sócio terá o direito de retirada nas Sociedades Anônimas são muito restritas, por isso, os problemas com reembolso são menores. Mesmo assim, já nessa possibilidade de prejuízo, a Lei 10.303/01 criou o § 3° do art. 137 da Lei de S.A para possibilitar aos sócios que aprovaram a medida que deu ensejo à retirada de determinado sócio, não a confirmarem caso entendam que sua saída, e o consequente pagamento do reembolso, irá prejudicar a preservação da empresa. § 3° Nos 10 (dez) dias subseqüentes ao término do prazo de que tratam os incisos IV e V do caput deste artigo, conforme o caso, contado da publicação da ata da assembléia-geral ou da assembléia especial que ratificar a deliberação, é facultado aos órgãos da administração convocar a assembléia-geral para ratificar ou reconsiderar a deliberação, se entenderem que o pagamento do preço do reembolso das ações aos acionistas dissidentes que exerceram o direito de retirada porá em risco a estabilidade financeira da empresa .
Assim, os sócios poderão desistir da aprovação e fazer com que o sócio que iria se retirar perca esse direito. Mesmo que ele continue 181
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com o intento de não mais permanecer na companhia, terá que sair através da venda de suas ações e não causará nenhum prejuízo ao prosseguimento do negócio. Até porque, o grande problema que o direito de retirada causa nas sociedades anônimas é o fato de retirar o investimento da mesma. Como se falou anteriormente, a companhia é em sua enorme maioria tida como uma sociedade de capitais, em o que importa é o investimento que o sócio realiza, ou seja, o capital que ele coloca para o funcionamento da mesma e não a suas pessoas em si, como ocorre na maioria das limitadas e nas simples. Sendo assim, parece que a modificação de 2001 veio resolver, pelo menos em parte, o problema do direito de retirada nas sociedades anônimas, devendo o acionista utilizá-lo de maneira adequada para que se possa preservar o funcionamento da empresa. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova da Magistratura Federal/io região/2011, organizada pelo CESPE, o anunciado afirmava que "A lei que dispõe sobre as sociedades por ações reconhece como essencial o direito de o acionistan e a resposta correta era Mfiscalizar a gestão dos negócios sociais e retirar-se da sociedade nos casos previstos em lei. n Observem que não há nos direitos fundamentais o direito de voto e, exatamente por isso, que é muito comum esse direito ser restringido ou até totalmente retirado nas ações preferenciais. Porém, há uma situação que se deve ter atenção. o acionista que não tem direito a voto ou o tem de maneira restrita e recebe preferência na distribuição de lucros, esta sendo dúvida é sua principal vontade, receber valores maiores. Porém, como ele não vota, fica sujeito à decisão dos ordinaristas sobre a partilha dos lucros e, por isso há a previsão do art. 111 da LSA: Art. ni. O estatuto poderá deixar de conferir às ações preferenciais algum ou alguns dos direitos reconhecidos às ações ordinárias, inclusive o de voto, ou conferi-lo com restrições, observado o disposto no artigo 109. § 1° As ações preferenciais sem direito de voto adquirirão o
exercício desse direito se a companhia, pelo prazo previsto no estatuto, não superior a 3 (três) exercícios consecutivos, deixar 182
DIREITO SOCIETÁRIO
de pagar os dividendos fixos ou mínimos a que fizerem jus, direito que conservarão até o pagamento, se tais dividendos não forem cumulativos, ou até que sejam pagos os cumulativos em atraso. Se os lucros não estiverem sendo distribuídos, os preterencialistas passarão a ter o direito de voto, pois assim poderão fazer valer o direito de recebimento que é seu principal objetivo. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
No REsp 8185o6/SP. publicado em 17/03/2010, o tribunal reconhece que o acionista preterencialista poderá passar a ter o direito de voto no caso de falta de distribuição de dividendos: 1. Não é ilegal a supressão do direito de voto das ações preferenciais, desde que se lhes atribua alguma das vantagens ou preferências previstas em lei.
( ...)
6. Também não há atribuição de voto definitivo às ações preferenciais, nem sua conversão em ordinárias se os acionistas preferencialistas não anuírem com as alterações de suas vantagens ou preferências. Nesta hipótese. as alterações são apenas ineficazes em relação às dasses de ações preferenciais que não as aprovarem. (...)
8. A aquisição temporária do direito de voto pelas ações preferenciais, nos termos do § lº do art. u1 da LSA (voto contingente), é restrita às ações preferenciais que fazem jus a dividendos fixos ou mínimos. Ausência de violação ao referido dispositivo legal. 9. Não é ilegal disposição de acordo de acionistas que prevê que as ações preferenciais não gozarão de direito de voto, conforme admite o caput do art. n1 da lSA. Ausência de violação dos arts. 82 e 145, li, do Código Civil de 1916. 10. Recurso conhecido em parte e, nessa parte, improvido
7.9. Órgãos societários A companhia se desdobra em vários órgãos, vezes por exigência jurídica, vezes por objetivos administrativos. Como se trata de um tipo societário ligado a negócios de grande complexidade e grande investimento, optou o legislador por exigir uma organização maior e por isso há a presença dos órgãos, alguns obrigatórios, outros facultativos.
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Órgãos societários
ConseIho Assembleia Geral
de Administra-
Diretoria
Conselho Fiscal
ção Obrigatório em todas as S.As.
Obrigatório para a S.A de capital aberto e capital autorizado.
Obrigatório em todas as S.As.
Existência obrigatória, mas funcionamento facultativo.
Exclusivamente deliberativo, composto por todos os acionistas.
Delibera sobre as diretrizes da administração. Composto por mínimo de 3 membros acionistas ou não.
Realiza a representação legal da companhia e efetiva as deliberações dos demais órgãos. Composto por mínimo de 2 membros acionistas ou não.
Fiscaliza os órgãos de administração. Camposto por mínimo de 3 e máximo de 5 membros acionistas ou não.
Vamos
à analise
de cada um deles.
7.9.1. Assembleia geral A assembleia geral
é
o órgão deliberativo máximo da sociedade
anônima. Ela somente é reunida de fato nos casos nos quais a lei das sociedades anônimas estabelece sua competência privativa. Tais casos de competência privativa estão descritos no Art. 122 da LSA, porém, existem outras hipóteses espalhadas pela lei, bem como o estatuto poderá exigir deliberação de sócios para alguns atos, o que só pode ser feito através de assembleia.
• Como esse assunto foi cobrado em concurso? Sobre a competência privativa da Assembleia geral da S.A., a prova organizada pelo CESPE para Magistratura Federal/ia região/2011 considerou verdadeira a seguinte afirmativa: "Nas sociedades anônimas, a assembleia geral possui competência privativa para deliberar sobre transformação, fusão, incorporação e cisão da companhia, sua dissolução e liquidação, eleger e destituir liquidantes assim como para julgar-lhes as contas."
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DIREITO SOCIETÁRIO
Assim, como nas demais sociedades, na S.A. também se terá o poder de gestão, que ficará a cargo da Diretoria e o poder de deliberação que será de competência da Assembleia geral. A Assembleia Geral pode ser ordinária ou extraordinária. A ordinária é a que ocorre pelo menos uma vez ao ano e tem que deliberar ao menos as matérias contidas no art. 132 e a extraordinária poderá ser convocada sempre que haja a necessidade de deliberação dos sócios. Como esse assunto foi cobrado em concurso? No concurso da Magistratura/MG/2012 de organização da EJEF, o enunciado da questão dizia HÉ correto afirmar que compete à assembleia geral da sociedade anônima# e a resposta correta era a que afirmava #suspender o exercício dos direitos do acionista." ~
Os quóruns de deliberação da Sociedade Anônima são bem mais simples do que os vistos para a Sociedade Limitada. São apenas dois artigos a serem observados, o art. 129 da Lei de S.A prevê o quorum de maioria simples: "As deliberações da assembleia-geral, ressalvadas as exceções previstas em lei, serão tomadas por maioria absoluta de votos, não se computando os votos em branco." É a regra geral do quórum de deliberação. Já no art. 136 serão listados assuntos que só podem ser aprovados pelos votos da maioria do capital com direito a voto, sendo que tal dispositivo permite que o estatuto preveja quórum maior. Quóruns de deliberação na S.A. Votação de matérias previstas no art. 136
Demais deliberações - art. 129
Previsão estatutária
Maioria do capital com direito a voto
Maioria dos votos presentes
Qualquer quórum
7.9.2. Conselho de Administração
O segundo órgão da sociedade anônima que mereceu tratamento jurídico é o conselho de administração. Tal conselho é facultativo à maioria das sociedades anônimas, sendo obrigatório apenas à companhia aberta, à sociedade com capital autorizado e à de economia mista. 185
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Assim como a assembleia geral o conselho de administração é órgão deliberativo e deve ser composto por número ímpar de acionistas sempre maior que um. O principal objetivo desse órgão é tomar decisões rapidamente e ao mesmo tempo representar a verdadeira vontade dos acionistas, uma vez que, para reunir a assembleia geral são necessárias muitas formalidades. Quando se tem um Conselho de Administração, diz-se que a administração é dual. Quanto à capacidade de deliberação desse conselho, ele pode deliberar sobre qualquer matéria que não tenha sido apontada como de competência privativa da assembleia geral. Uma competência do conselho de administração que merece ser citada é a de eleger os membros da diretoria. Esse órgão é regido nos artigos 140 a 142 da Lei de S.A. A obrigatoriedade da existência do Conselho de Administração é uma diferença importante entre a companhia aberta e a fechada. De acordo com o §2° do art. 138: "As companhias abertas e as de capital autorizado terão, obrigatoriamente, conselho de administração", ou seja, as sociedades de capital fechado poderão escolher se terão o conselho de administração e se ele não existir, sua competência será deslocada para a assembleia geral. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No certame para Procurador do MP junto ao TSE/SC/2011, organizado pela FEPESE, o enunciado pedia para assinalar a alternativa correta no que diz respeito à Sociedade Anônima e a afirmativa a ser marcada era a que afirmava: "As companhias abertas e as de capital autorizado terão, obrigatoriamente, Conselho de Administração." Também na prova organizada pela FGV para Advogado do BADESC/2010, a questão se referia ao conselho de administração sendo que a afirmativa correta dizia que ele é: "obrigatório nas sociedades de economia mista e facultativo nas sociedades de capital fechado." A obrigatoriedade do conselho de administração da sociedade de economia mista está prevista no art. 239 da Lei de SA.
7.9.3. Diretoria
O terceiro órgão que mereceu regramento legal foi a diretoria. Esta tem atribuições tanto no plano externo como no interno. Externamente falando é ela que manifesta a vontade da pessoa jurídica, ou seja, da 186
DIREITO SOCIETÁRIO
companhia, praticando atos e negócios jurídicos. São os diretores que irão administrar a sociedade e consequentemente terão o poder de representação. Já no plano interno, como órgão executivo, deve dirigir a companhia, visando ao melhor resultado econômico. É tratada do art. i43 ao 16o. A diretoria é o órgão responsável pela administração da sociedade anônima. Optou o legislador, pela complexidade do tipo societário, que não se tenha apenas um administrador na S.A., mas um órgão com pelo menos dois componentes. Não é preciso ser sócio para ser diretor; mas é preciso se atentar para as responsabilidades que a nomeação acarreta. A lei de S.A. irá falar no dever de diligência, lealdade e de informação.
o administrador responde pelos prejuízos que vier a causar à sociedade, mas aqui na S.A. há uma diferença bem importante para o que foi visto na sociedade simples. Lá, o Código Civil de 2002 optou por filiar-se à Teoria dos Atos Ultra Vires e permitiu que a sociedade se exima da responsabilidade dos atos do seu administrador; quando ele agir fora dos seus poderes. Para a S.A. há que ser observado o art. 158 da lei especial: Art. 158. o administrador não é pessoalmente responsável pe-
las obrigações que contrair em nome da sociedade e em virtude de ato regular de gestão; responde, porém, civilmente, pelos prejuízos que causar, quando proceder: 1- dentro de suas atribuições ou poderes, com culpa ou dolo; li - com violação da lei ou do estatuto.
Como se percebe, aqui o administrador não responde pessoalmente perante os terceiros. Sempre será a sociedade que irá assumir os atos do administrador que escolheu. Nota-se a preferência pela Teoria da Aparência, pois se o diretor aparenta, perante terceiros ser legitimo para o ato, deverá a sociedade se responsabilizar e depois, se for o caso, entrar com o regresso contra o administrador. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Reconhece que no caso da soáedade anônima, ela deve responder perante terceiros pelos atos do seu administrador, conforme demonstra o REsp 887277/SC, publicado em 09/11/2010 e cuja ementa é a seguinte:
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DIREITO EMPRESARIAL NEGÓCIO JURÍDICO CELEBRADO POR GERENTE OE SOCIEDADE ANÔNIMA. AUSÊNCIA OE PODERES. ATO CONEXO COM A ESPECIALIZAÇÃO ESTATUTÁRIA DA EMPRESA. LIMITAÇÃO ESTATUTÁRIA. MATÉRIA, EM PRINCÍPIO, INTERNA CORPORIS. TERCEIRO OE BOA-FÉ. TEORIA DA APARÊNCIA. APLICABILIDADE. 1. No caso em exame, debatem as partes em torno de aditivo que apenas estabeleceu nova forma de reajuste do contrato original - em relação ao qual não se discute a validade - , circunstância a revelar que o negócio jurídico levado a efeito pelo então Gerente de Suprimentos, que é acessório, possui a mesma natureza do principal - prestação de serviços - • o qual. a toda evidência, poderia ser celebrado pela sociedade recorrente por se tratar de ato que ser conforma com seu objeto social.
2. Na verdade, se a pessoa jurídica é constituída em razão de uma finalidade específica (objeto social), em princípio, os atos consentâneas a essa finalidade, não sendo estranho ao seu objeto, praticados em nome e por conta da sociedade, por seus representantes legais, devem ser a ela imputados.
3. As limitações estatutãrias ao exercício de atos por parte da Diretoria da Sociedade Anônima, em princípio, são, de fato, matéria interna corporis, inoponíveis a terceiros de boa fé que com a sociedade venham a contratar.
( ...) 6. Com efeito, não obstante o fato de o subscritor do negócio jurídico não possuir poderes estatutãrios para tanto, a circunstância de este comportar-se, no exercício de suas atribuições - e somente porque assim o permitiu a companhia-. como legítimo representante da sociedade atrai a responsabilidade da pessoa jurídica por negócios celebrados pelo seu representante putativo com terceiros de boa-fé. Aplicação da teoria da aparência. 7. Recurso especial improvido.
A Lei de S.A. regula ainda como se dá essa responsabilização da sociedade frente ao administrador que não observa seus deveres no exercício do poder de gestão. O art. 159 trata da ação de responsabilidade que será proposta contra o diretor que causar prejuízos à sociedade. Essa ação terá como condição a prévia deliberação da assembleia geral com a concordância da maioria dos sócios. Se não houver essa concordância, ainda sim a ação poderá ser proposta por sócios que detenham ao menos 5°/o do capital social. No que diz respeito à responsabilidade entre os diretores, essa em regra será solidária, conforme prevê o art. 158, § 2°, já que também existe um dever de fiscalização ente eles.
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~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame da banca da FCC para Procurador do TCE/BA/2011, foi considerada como a alternativa correta a que afirmava: "Os administradores nas sociedades anônimas são solidariamente responsáveis pelos prejuízos causados em virtude do não cumprimento dos deveres impostos por lei para assegurar o funcionamento normal da companhia, ainda que estatutariamente tais deveres não caibam a todos eles." Uma situação que merece atenção é a responsabilidade dos administradores em relação às contas da sociedade. A princípio são os diretores quem têm responsabilidade sobre a realização da contabilidade da sociedade. Porém, nas Assembleias Gerais Ordinárias essas contas serão apresentadas aos acionistas e uma vez aprovadas, retiram qualquer responsabilidade dos administradores. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
No Resp 1.313.725 que foi incluído no informativo 500/2012, o enunciado dispõe: "Sociedade anônima. Responsabilidade dos administradores. Contas aprovadas pela AGO. Salvo se anulada, a aprovação das contas sem reservas pela assembleia geral exonera os administradores e diretores de quaisquer responsabilidades"
7.9.4. Conselho Fiscal O último órgão a ser aqui tratado é o conselho fiscal. Este atua como órgão de suporte à assembleia geral no tocante à votação para a aprovação de atos dos administradores. Ele é de existência obrigatória na S.A., mas seu funcionamento é facultativo, ou seja, toda sociedade precisará ter seu conselho fiscal delimitado, com o número de membros e forma de eleição delimitados, porém, o funcionamento poderá ficar condicionado ao pedido de acionistas em determinados exercícios sociais. Caso o funcionamento não seja permanente, estabelece o §1 do art. 161 dispõe que: "O conselho fiscal, quando o funcionamento não for
permanente, será instalado pela assembleia-geral a pedido de acionistas que representem, no mínimo, 0,1 (um décimo) das ações com direito a voto, ou 5ºk (cinco por cento) das ações sem direito a voto, e cada período de seu funcionamento terminará na primeira assembleia-geral ordinária após a sua instalação."
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Sendo assim, não será qualquer acionista que poderá requerer a instalação do conselho, pois deverá ter uma mínima participação na sociedade para fazê-lo. Este regulamento evita que o bom funcionamento da sociedade seja atrapalhado pela instalação desnecessária do conselho fiscal.
As funções do conselho fiscal na sociedade anônima são as mesmas que já foram estudadas para a sociedade limitada. ~
Importante!
Diferente da sociedade limitada, na anônima o Conselho Fiscal é de existên~ eia obrigatória, mas seu funcionamento poderá ser facultativo.
7.10. Poder de controle
Quando se menciona controle em uma sociedade anônima, a doutrina separa em poder de controle externo e interno. Os controladores externos não têm participação no capital social da companhia. Esses agentes são, geralmente, credores da sociedade ou do acionista controlador, podendo vir a explorar a atividade empresarial da sociedade e executar o seu direito de crédito. Um exemplo bastante encontrado na doutrina são os contratos de empréstimo a uma sociedade com caução ao mutuante. como garantia do crédito, das ações do bloco de controle. O controle externo pode ser exercido, ainda. quando os credores, embora sem a caução das ações de controle, impõem condições à sociedade devedora que dificultem a melhora da sua situação financeira, ou quando a companhia. devido a dificuldades financeiras, emite debêntures em favor dos credores, e em razão da natureza preferencial desse valor mobiliário, que normalmente representa importâncias elevadas. acabam "controlando" a sociedade emissora. Modernamente a doutrina leciona que a dependência econômica é um conceito útil para identificar situações de controle externo. Trocando em miúdos. existem determinados débitos que a sociedade fica muito vulnerável ao seu credor e acaba por sofrer um controle deste. Agora o que nos interessa neste tópico é tratarmos do controle interno.
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Como na sociedade anônima as deliberações dependem de aprovação de maioria dos presentes ou de maioria do capital com direito a voto (art. 136 e 129), aquele que possui maioria no capital será considerado acionista controlador, se usar deste poder majoritário para efetivamente comandar os negócios da sociedade. O acionista controlador surgiu no direito brasileiro com o advento da Lei n. 6.404/76, uma vez que o Decreto-Lei n. 2.627/40 fundava-se no critério de acionista majoritário, e deixava de fixar-lhe responsabilidades específicas, fazendo-o apenas em relação aos administradores.
o art.
116 conceitua da seguinte forma a figura do acionista controlador: Art. 116. Entende-se por acionista controlador a pessoa, natural ou jurídica, ou o grupo de pessoas vinculadas por acordo de voto, ou sob controle comum, que:
a) é titular de direitos de sócio que lhe assegurem, de modo permanente, a maioria dos votos nas deliberações da assembléia-geral e o poder de eleger a maioria dos administradores da companhia; e b) usa efetivamente seu poder para dirigir as atividades sociais e orientar o funcionamento dos órgãos da companhia.
Podemos observar dois critérios para falar na existência do controlador, um de caráter objetivo e outro subjetivo. Na alínea "a" encontra-se o critério objetivo, já tratado anteriormente que é o poder majoritário de votos, a possibilidade do acionista ver sua vontade prevalecendo em todas as decisões, inclusive na nomeação dos administradores. Já na alínea "b" tem-se o critério subjetivo que é a vontade de exercer esse poder majoritário dos votos. Para ser considerado controlador o acionista ou grupo de acionista tem que de fato exercer o poder, isso é, participar de todas as deliberações e comandar as decisões da companhia. Caso o acionista tenha a maioria das ações com direito a voto, mas não utilize dessa prerrogativa para de fato comandar a companhia, não participando das deliberações, ele será considerado sócio majoritário, mas não sócio controlador. 191
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• Como esse assunto foi cobrado em concurso? No exame organizado pela FCC para Notário do TJ/AP/2011, o enunciado afirmava que #Nas Sociedades Anônimas, é considerado controlador aquele queH e a resposta correta a ser assinalada era a que dizia: ufaz o poder de voto de suas ações prevalecer, de maneira permanente, nas deliberações sociais e nas eleições de administradores, orientando os negócios da companhia.# Apesar de toda a vantagem do exercício do poder de controle, essa posição traz ao acionista algumas responsabilidades, a começar aciopela regra do parágrafo único do art. 116 que determina que: nista controlador deve usar o poder com o fim de fazer a companhia realizar o seu objeto e cumprir sua função social, e tem deveres e responsabilidades para com os demais acionistas da empresa, os que nela trabalham e para com a comunidade em que atua, cujos direitos e interesses deve lealmente respeitar e atender."
uo
O legislador mencionou aqui um princípio do direito empresarial que foi trabalhado no nosso primeiro capítulo que é a função social da empresa, demonstrando o reflexo externo da responsabilidade do acionista controlador. Além disso, esse acionista controlador terá que obedecer às responsabilidades estipuladas no art. 117, já que apesar de ter o poder decisório, deverá sempre pensar no interesse da sociedade e não apenas no seu. Ele irá responder civilmente pelos prejuízos que causar quando agir com abuso de poder e o §1° do mesmo artigo irá exemplificar quais seriam os atos considerados como abusivos. Art. 117. O acionista controlador responde pelos danos causados por atos praticados com abuso de poder. § lº São modalidades de exercício abusivo de poder:
a) orientar a companhia para fim estranho ao objeto social ou lesivo ao interesse nacional, ou levá-la a favorecer outra sociedade, brasileira ou estrangeira, em prejuízo da participação dos acionistas minoritários nos lucros ou no acervo da companhia, ou da economia nacional; b) promover a liquidação de companhia próspera, ou a transformação, incorporação, fusão ou cisão da companhia, com o fim de obter, para si ou para outrem, vantagem indevida, em
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prejuízo dos demais acionistas, dos que trabalham na empresa ou dos investidores em valores mobiliários emitidos pela companhia; c) promover alteração estatutária, emissão de valores mobiliários ou adoção de políticas ou decisões que não tenham por fim o interesse da companhia e visem a causar prejuízo a acionistas minoritários, aos que trabalham na empresa ou aos investidores em valores mobiliários emitidos pela companhia; d) eleger administrador ou fiscal que sabe inapto, moral ou tecnicamente; e) induzir, ou tentar induzir, administrador ou fiscal a praticar ato ilegal, ou, descumprindo seus deveres definidos nesta Lei e no estatuto, promover, contra o interesse da companhia, sua ratificação pela assembléia-geral; f) contratar com a companhia, diretamente ou através de outrem, ou de sociedade na qual tenha interesse, em condições de favorecimento ou não equitativas;
g) aprovar ou fazer aprovar contas irregulares de administradores, por favorecimento pessoal, ou deixar de apurar denúncia que saiba ou devesse saber procedente, ou que justifique fundada suspeita de irregularidade. h) subscrever ações, para os fins do disposto no art. 170, com a realização em bens estranhos ao objeto social da companhia.
Note-se que o § lº do referido dispositivo elenca somente modalidades abusivas dolosas, não havendo previsão de abuso por omissão no exercício do controle da companhia. Porém, o entendimento jurisprudencial dominante é no sentido de que não é preciso provar a intenção do ato, apenas sua prática e o dano para a companhia. Além disso, a doutrina é uníssona em considerar esse rol como exemplificativo, sendo que o abuso de direito pode ser utilizado como base para que outros atos também sejam enquadrados nessa responsabilidade. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na fase discursiva do concurso da Magistratura Estadual DF/2007, concurso organizado pelo TJ/DF. foi feita a seguinte pergunta: "O que é necessário para a caracterização do abuso de poder do acionista controlador, de que trata o artigo 117 da Lei das Soàedades por Ações, de acordo com a jurisprudência? Ese o ato ilícito não estiver desaito no § 2º, do mesmo artigo?"
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Esse poder de controle também poderá ser alcançado através de um acordo de acionistas. Este representa um contrato concluído por acionistas da companhia com o objetivo de compor seus interesses individuais relacionados à negociabilidade de suas participações na companhia, exercício do direito de voto ou poder de controle, no intuito de harmonizar os seus interesses societários e implementar o próprio interesse social. De acordo com o art. 118, toda vez que este acordo for registrado na sede da companhia, deverá ser por ela respeitado. ~
Como esse assunto foi cobrado em cona.irso?
No exame organizado pela FCC para Notário do TJ/AP/2.011 o enunciado afirmava que "Nas Sociedades Anônimas, é considerado controlador aquele que" e a resposta correta a ser assinalada era a que dizia: "faz o poder de voto de suas ações prevalecer, de maneira permanente, nas deliberações sociais e nas eleições de administradores, orientando os negócios da companhia."
7.11. Proteção ao acionista minoritário Uma vez que na sociedade anônima se tem a figura do acionista controlador, que é aquele que tem o poder majoritário do voto e pode decidir sozinho, ou por acordo de acionistas os rumos da companhia, foi preciso estabelecer mecanismos de proteção ao minoritário. Pode-se enumerar os seguintes direitos previstos da Lei de S.A. que servem de proteção ao acionista minoritário: Ações preferenciais: proporção, preferências e vantagens. A disciplina desse assunto está prevista nos artigos 15 e 17 da Lei das S.A. Esses dispositivos legais procuram conferir equilíbrio às ações com e sem direito a voto, determinando que o número de ações preferenciais sem direito a voto, ou sujeitas à restrição no exercício desse direito, não ultrapasse 5oºk do total das ações emitidas. Direito de recesso. O assunto está tratado nos artigos 136 e 137 da Lei das S.A. É um dos instrumentos de maior proteção do acionista minoritário, consistente na faculdade de o acionista retirar-se da sociedade em circunstâncias legalmente previstas, recebendo o valor de suas ações. A perda de patrimônio pela retirada pode fazer com que o minoritário pressione o majoritário a mudar sua posição.
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DIREITO SOCIETÁRIO
Proteção do minoritário no caso de fechamento do capital de companhia abena. Proteção prevista nos artigos 4º e 4º A da Lei. O fechamento de capital da companhia aberta somente poderá se dar caso o controlador, a própria companhia ou aquela que a controle formule oferta pública para adquirir a totalidade das ações em circulação. Direito ao "tag along" no caso de alienação do controle. Previsto no artigo 254-A da Lei. Obrigatoriamente, o adquirente do controle acionário de companhia aberta deverá pagar aos acionistas minoritários valor no mínimo igual a 8oºk da importância paga por ação do bloco integrante do controle. Os destinatários da oferta são unicamente os titulares de ações com direito de voto. Porém, os preferencialistas sem direito a voto, ou com voto restrito, terão o direito de ser incluídos na oferta pública legalmente prevista nos casos em que o estatuto da companhia for omisso sobre a fixação do dividendo prioritário, ou do dividendo 10°k maior do que o atribuído à ação ordinária. Panicipação dos acionistas minoritários e preferencialistas na composição do conselho de administração e do conselho fiscal. Disposições legais específicas contidas nos artigos 141, 161, 163, 164 e 165 da Lei. Os acionistas minoritários, bem como os titulares de ações preferenciais, terão a faculdade de participar na composição do conselho de administração da companhia por meio de eleição de um conselheiro. Acordo de acionistas. Previsto no artigo n8 da Lei. o acordo de acionistas poderá servir como valioso meio para proteger os interesses dos minoritários, estabelecendo prévias condições no relacionamento com os controladores, assim como permitindo que os minoritários se congreguem para atingir determinados percentuais necessários para fazer valer certos direitos. 7.12. Dissolução da companhia
A S.A será dissolvida pelas causas previstas nos art. 2o6 da LSA. Art. 2o6. Dissolve-se a companhia: 1- de pleno direito: A) pelo término do prazo de duração; B) nos casos previstos no estatuto; C) por deliberação da assembléia-geral (art. i36, X);
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D) pela existência de 1 (um) único acionista, verificada em assembléia-geral ordinária, se o mínimo de 2 (dois) não for reconstituído até à do ano seguinte, ressalvado o disposto no artigo 251; E) pela extinção, na forma da lei, da autorização para funcionar.
li - por decisão judicial:
A) quando anulada a sua constituição, em ação proposta por qualquer acionista;
B) quando provado que não pode preencher o seu fim, em ação proposta por acionistas que representem 5ºk (cinco por cento) ou mais do capital social; C) em caso de falência, na forma prevista na respectiva lei; Ili - por decisão de autoridade administrativa competente, nos casos e na forma previstos em lei especial.
As hipóteses de dissolução, seja de pleno direito, seja judicial, são bastante semelhantes com a previsão para a sociedade simples e consequentemente também para a sociedade limitada. 7.12.1.
Dissolução da companhia
Por se tratar de uma sociedade de capitais, a princípio não comportaria dissolução parcial para a sociedade anônima, pois ela precisaria de todo o seu capital e seu patrimônio para realizar plenamente seu objeto social. Porém, o direito não pode fechar os olhos para determinadas realidades e começou-se a perceber a possibilidade de algumas sociedades anônimas terem características de affectio societatis. Do ponto de vista formal não se reconhece a affectio em sociedades anônimas uma vez que essa estrutura societária consistiria, necessariamente, em uma sociedade de capitais. Parte-se da premissa de que, como o colégio de acionistas pode ser total ou parcialmente substituído ou modificado pela simples transferência de ações a sociedade anônima seria, necessariamente, uma sociedade de capitais, pouco importando as pessoas de seus sócios para a consecução do objeto social, o que demonstraria seu caráter institucional, revelando-se, pura e simplesmente, de uso para o desenvolvimento da grande empresa. Todavia, apesar de concordarmos que a sociedade anônima foi criada para ser o instrumento de desenvolvimento da grande
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empresa, não se pode olvidar que o instituto veio, também, preencher os anseios dos empresários; isso no que se refere, especialmente, ao conceito de patrimônio separado e continuidade das empresas depois da morte dos fundadores. Sendo assim, as sociedades anônimas fechadas foram (e são) constituídas, basicamente, por grupos de pessoas, com interesses convergentes; não possuem "vida própria", pois têm o seu funcionamento e existência relacionados, diretamente, a pessoa dos sócios fundadores; são verdadeiramente intuito personae, e possuem, deste modo, inegável affectio societatis. Não fossem esses casos, a antiga ordem econômica deu lugar a um ambiente extremamente competitivo e dinâmico, e o mundo dos negócios que estava governado por uma dicotomia entre grandes corporações e pequenas empresas, sofreu com a reviravolta da revolução tecnológica . Hoje as pequenas e médias sociedades encontraram-se diante de uma economia globalizada necessitando de uma estrutura societária que acompanhe sua evolução. Nesse contexto, a Lei 6.404/76 oferecia a possibilidade de se criar sociedades anônimas fechadas, com a vantagem de oferecer, às pequenas e médias empresas, uma estrutura societária muito mais moderna que a oferecida pela estrutura de sociedade limitada. Diante desse novo quadro jurídico e econômico o empresário leva em consideração diversos fatores para a escolha do tipo societário. Dentre eles está uma maior facilidade para buscar recursos no mercado, o que possibilita a utilização das ferramentas de alavancagem, postas a disposição pelas instituições financeiras primordialmente para as anônimas em razão dos deveres que elas têm de prestar informação, estatuídos em lei. Tais normas, por óbvio, dão muito mais segurança aos investidores e às instituições financiadoras, o que possibilita a maior disposição de recursos às sociedades anônimas, e isso justifica, em parte, a utilização desse tipo societário, por parte dos empresários, quando da constituição das sociedades. Além disso, há outros aspectos que os empresários levam em consideração na criação de uma sociedade que influenciam no tipo societário a ser escolhido.
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Assim, pode-se perceber que a escolha do tipo societário está muitas vezes atrelada a fatos diversos de uma mera distinção entre sociedades de capitais e sociedades de pessoas . Essa escolha está muito além desses conceitos que não devem se sobrepor ao interesse empresarial. Nessas sociedades, portanto, a manutenção da affectio societatis revela-se imprescindível à continuação da atividade empresarial, e, desse modo, o desentendimento entre os sócios pode tornar inviável o seu prosseguimento. Dentre os recursos disponíveis para a solução desse impasse encontra-se o procedimento judicial de dissolução de sociedade. Temos, assim, o insanável rompimento da affectio societatis, elemento caracterizado pela vontade de colaboração dos sócios. Quebrado tal vínculo representado pela affectio societatis e, portanto, deixando de existir os elementos essenciais de confiança e colaboração à permanência da sociedade, torna -se inevitável a sua dissolução . ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Apesar de alguma resistência inicial, hoje o STJ reconhece a possibilidade de dissolução parcial da sociedade anônima por quebra de affertio societaris, como no REsp 917531/RS, publicado em 01/02/2012: DIREITO SOCIETÁRIO E EMPRESARIAL. SOCIEDADE ANÔNIMA DE CAPITAL FECHADO EM QUE PREPONDERA A AFFECTIO SOCIETATIS. DISSOLUÇÃO PARCIAL EXCLUSÃO DE ACIONISTAS. CONFICURAÇÃO DE JUSTA CAUSA. POSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DO DIREITO À ESPÉCIE. AIU. 257 DO RISlJ E SÚMULA 456 DO STF. 1. O instituto da dissolução parcial erigiu-se baseado nas sociedades contratuais e personalistas, como alternativa à dissolução 1otal e, ponanto, como medida mais consentânea ao princípio da preservação da sociedade e sua função social, contudo a complexa realidade das relações negociais hodiernas potencializa a extensão do referido instituto às sociedades "circunstancialmente• anônimas, ou seja, àquelas que, em vinude de cláusulas estatutárias restritivas à livre circulação das ações, ostentam caráter familiar ou fechado, onde as qualidades pessoais dos sócios adquirem relevância para o desenvolvimento das atividades sociais ("affectio societatis"). (Precedente: EREsp 111.294/PR, Segunda Seção, Rei. Ministro Castro Filho, DJ l0/09/2007).
(...)
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DIREITO SOCIETÁRIO
5. caracterizada a sociedade anônima como fechada e personalista, o que tem o condão de propiciar a sua dissolução parcial - fenômeno até recentemente vinculado às sociedades de pessoas - , é de se entender também pela possibilidade de aplicação das regras atinentes à exclusão de sócios das sociedades regidas pelo Código Civil, máxime diante da previsão contida no art. 1.0S9 do CC: "A sociedade anônima rege-se por lei especial, aplicando-se-lhe, nos casos omissos, as disposições deste Código.· ( ...)
7. Recurso especial provido, restaurando-se integralmente a sentença, inclusive quanto aos ônus sucumbenciais.
~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova para o MP/R0/2010, organizada pelo CESPE, o enunciado da questão dispunha "Acerca do ordenamento civil codificado e extravagante, especialmente o que dispõe sobre os negócios jurídicos e os registros públicos, as sociedades anônimas, o parcelamento do solo urbano, as falências e a recuperação de empresas e a investigação de paternidade, assinale a opção correta." E a opção correta era a que afirmava que Mde acordo com o regime da Lei das Sociedades Anônimas, é possível a dissolução parcial da sociedade anônima familiar fechada quando houver quebra da affectio societatis, ainda que tal requisito não esteja necessariamente conjugado com a perda de lucratividade e a ausência de distribuição de dividendos."
8_ TIPOS SOCIETÁRIOS MENORES O Código Civil de 2002 optou por manter em vigor três tipos societários de pouca utilidade prática, devido ao fato de não dar limitação de responsabilidade aos sócios. 8.i. Sociedade em nome coletivo Sociedade em nome coletivo é o tipo societário em que somente pessoas físicas podem tomar parte na sociedade, respondendo todos os sócios, solidária e ilimitadamente, pelas obrigações sociais. Esse tipo societário, antes regulado pelo Código Comercial (arts. 315 e 316), passa a ser regido pelos arts. 1039 a 1044 do Código Civil. Conforme dispõe o art. 1042 do Código Civil a administração da sociedade compete exclusivamente aos sócios, sendo o uso da firma, nos limites do contrato, privativo dos que tenham os necessários poderes. 199
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• Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame do MP/R0/2010 organizado pelo CESPE, o enunciado afirmava "Uma sociedade voltada à consecução de atividade econômica em que todos os sócios sejam pessoas físicas, empresárias ou não, que respondam, solidária e ilimitadamente, pelas obrigações sociais, é regulada pelo Código Civil como uma sociedade". Ea resposta era "em nome coletivo."
8.2. Sociedade em comandita simples É a sociedade que possui dois tipos de sócios: os comanditados, somente pessoas físicas, os quais respondem ilimitadamente pelas obrigações sociais e são encarregados da administração da sociedade; e os comanditários, que respondem apenas nos limites do capital investido e não tem poderes para participar da gerência. (art. 1.045) Aos comanditados cabem os mesmos direitos e obrigações dos sócios da sociedade em nome coletivo. (art. i.046, par. Único). Se o sócio comanditário intervier na administração da sociedade ou se seu nome constar na firma social, responderá solidariamente com o sócio comanditado, sendo-lhe facultado, porém, fiscalizar as operações e ser nomeado procurador da sociedade para fim específico. (art. i.047 e parágrafo único). • Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No prova organizada pelo CESPE para a Magistratura/ES/2011, pedia-se para assinalar a alternativa correta no que diz respeito ao direito societário e a resposta era a que afirmava: "A sociedade em comandita simples é composta por sócios comanditários e comanditados, estes, necessariamente, pessoas físicas com responsabilidade solidária e ilimitada pelas obrigações sociais."
8.3. Sociedade em comandita por ações
É regida pelas normas relativas às sociedades anônimas (artigos 280 e seguintes da Lei 6.404/76), salvo a restrição de que somente os acionistas podem ser diretores, respondendo ilimitadamente pelas obrigações da sociedade empresária, enquanto os sócios que não participam da administração possuem responsabilidade limitada ao
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capital social. Assim como as S/As, pode ser empresa de capital aberto (ações em Bolsa de Valores). A sociedade comandita por ações é um tipo societário no qual o capital está igualmente dividido em ações e que se rege pelas normas aplicáveis à sociedade anônima. Seu capital social é formado pela retirada do patrimônio do sócio, seja dinheiro, bens suscetíveis de valor econômico ou direitos, transferindo-os para o sustento da sociedade. É, portanto, intangível, por isso toma-se elemento garantidor dos credores. Diferencia-se da sociedade anônima pela questão dos diretores terem que ser acionistas e responderem ilimitadamente pelas obrigações sociais, e talvez este seja justamente o motivo pelo qual sua utilidade prática nos dias atuais seja quase inexistente.
9. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA 9.1. Aspectos Gerais A criação da pessoa jurídica, juntamente com a limitação de responsabilidade, são dois importantes institutos jurídicos, cujo uso, todavia, nem sempre atendeu às finalidades a que se destinava originalmente, quando de sua concepção. Tal fato gerou uma reação que permite excepcionalmente desconsiderar a autonomia patrimonial das pessoas jurídicas. O direito reconhece a pessoa jurídica como um importante instrumento para o exercício da atividade empresarial, não a transformando, porém num dogma intangível. A personalidade jurídica das sociedades deve ser utilizada com fins legítimos e não deve ser desvirtuada. Dessa forma, caso tais fins sejam desvirtuados, não se pode fazer prevalecer a separação patrimonial entre a pessoa jurídica e os seus membros. A desconsideração é pois a maneira de adequar a pessoa jurídica aos fins para os quais ela foi criada; é uma forma de reconhecer a relatividade da personalidade jurídica das sociedades. Esta separação patrimonial somente se justifica quando a pessoa jurídica é usada 201
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adequadamente, o desvio da função faz com que deixe de existir razão para a separação patrimonial. Há muito tempo que várias legislações extravagantes tratavam sobre a desconsideração da personalidade jurídica, sendo que uma das mais importantes foi o Código de Defesa do Consumidor. Nesse caso, por exemplo, a desconsideração era utilizada somente quando havia relação de consumo.
9.2. Desconsideração no Código Civil Por isso, o Código Civil de 2002 filou-se à Teoria da Desconsideração da Personalidade Jurídica e possibilitou a sua utilização em qualquer tipo de relação civil. Vejamos o que diz o art. 50: Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, o juiz pode decidir, a requerimento da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.
A desconsideração como se pode perceber vem claramente positivada visando a repressão ao abuso na utilização da personalidade jurídica das sociedades, fundamento primitivo da própria teoria. Tal abuso poderá ser caracterizado de duas formas diferentes, pelo desvio da finalidade ou pela confusão patrimonial. É importante perceber que o código não acolhe a concepção objetiva da teoria, já que a confusão patrimonial não é fundamento suficiente para a desconsideração da personalidade jurídica, sendo simplesmente um meio importantíssimo de comprovar o abuso da personalidade. Destarte, o necessário para a desconsideração é o abuso da personalidade jurídica, que pode ser provado inclusive pela configuração de uma confusão patrimonial. Porém, há que se ressaltar que não pode haver dúvidas sobre o ato abusivo para que possa ser aplicada a desconsideração, tendo em vista que ela é uma excepcionalidade. O normal é a personalidade
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jurídica da sociedade ser utilizada da forma correta e servir de incentivo à pratica de atividades empresárias, e não servir como blindagem do patrimônio particular dos sócios. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Não deixa dúvidas de que é preciso haver prova cabal do ato de abuso da personalidade jurídica, como demonstra o REsp i098712 / RS, publicado em 04/o8/2010 cuja ementa é a seguinte: CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO MONITÓRIA. CONVERSÃO. EXECUÇÃO. PERSONALIDADE JURÍDICA. DESCONSIDERAÇÃO. REQUISITOS. AUSÊNCIA. CONHECIMENTO E PROVIMENTO.
1. Nos tennos do Código Civil, para haver a desconsideração da personalidade jurídica, as instâncias ordinárias devem, fundamentadamente, con· cluir pela ocorrência do desvio de sua finalidade ou confusão patrimonial desta com a de seus sócios, requisitos objetivos sem os quais a medida torna-se incabível. li. Recurso especial conhecido e provido.
Além disso, o Código Civil deixa claro que a desconsideração não extingue a pessoa jurídica, mas estende os efeitos de determinadas obrigações aos sócios e administradores. Vale dizer, há uma suspensão pontual da autonomia da pessoa jurídica, somente no caso específico. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No certame para Advogado da EBC/2011, de responsabilidade do CESPE, foi considerada correta a seguinte afirmativa: "Caso um juiz de direito tenha determinado a desconsideração da personalidade jurídica de cena sociedade empresária, a fim de garantir o pagamento de um credor vítima de fraude, tal desconsideração não atingirá a validade do ato constitutivo da sociedade empresária." Quando a desconsideração for deferida surge uma dúvida: todos os sócios e administradores irão responder com seu patrimônio particular, independente da sua participação na sociedade?
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A princípio a doutrina entendia que sim, todos iriam responder de forma solidária, principalmente os sócios já que perante terceiros não há que se limitar a participação de cada sócio nas perdas. Essa estipulação poderia ocorrer em contrato, mas somente teria valor na relação interna da sociedade, não frente a terceiros.
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Porém, com o passar do tempo começou-se a perceber que no caso da desconsideração da personalidade jurídica, os sócios passam a responder com seu patrimônio particular não em virtude do risco do negócio, mas em consequência de um ato de abuso de direito, no qual nem todos os sócios tiveram participação. Às vezes um sócio que é apenas investidor e não participa da organização da sociedade, não teve sequer conhecimento dos atos abusivos que vinham sendo praticados e não seria justo ele responder por eles. Há situações excepcionais em que todos os sócios irão ser responsabilizados, mas a jurisprudência tem como regra, hoje, que somente o sócio ou o administrador que praticou ou de alguma forma participou do ato abusivo terá seu patrimônio particular usado para pagar a dívida da sociedade.
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Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
No Informativo de Jurisprudência 524/2013 constou o seguinte acórdão: DIREITO CIVIL DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA DE SOCIEDADE LIMITADA.
Na hipótese em que tenha sido determinada a desconsideração da personalidade jurídica de sociedade limitada modesta na qual as únicas sócias sejam mãe e filha, cada uma com metade das quotas sociais, é possível responsabilizar pelas dívidas dessa sociedade a sócia que, de acordo com o contrato social, não exerça funções de gerência ou administração. É certo que, a despeito da inexistência de qualquer restrição no art. 50 do CC/2002, a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica apenas deve incidir sobre os bens dos administradores ou sócios que efetivamente contribuíram para a prática do abuso ou fraude na utilização da pessoa jurídica. Todavia, no caso de sociedade limitada modesta na qual as únicas sócias sejam mãe e filha, cada uma com metade das quotas sociais, a titularidade de quotas e a administração da sociedade se confundem, situação em que as deliberações sociais, na maior parte das vezes, ocorrem no dia a dia, sob a forma de decisões gerenciais. Nesse contexto, torna-se difícil apurar a responsabilidade por eventuais atos abusivos ou fraudulentos. Em hipóteses como essa, a previsão no contrato social de que as atividades de administração serão realizadas apenas por um dos sócios não é suficiente para afastar a responsabilidade dos demais. Seria necessária, para tanto, a comprovação de que um dos sócios estivera completamente distanciado da administração da sociedade. REsp i.315.110-SE, Rei. Min. Nancy Andrighi, julgado em 28/5/2013.
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9.3. Desconsideração no Código de Defesa do Consumidor Na verdade, o primeiro dispositivo expresso sobre a desconsideração da personalidade jurídica no direito positivo brasileiro foi o artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor.
É um dispositivo hoje, em virtude do art. 50 do Código Civil, de aplicação exclusiva às relações de consumo, não havendo que se cogitar de sua aplicação extensiva, a menos que se afigurem presentes os elementos de uma eventual aplicação analógica. A primeira hipótese de desconsideração, trazida pelo artigo 28 do
coe, é a mesma do Código Civil que é o abuso de direito, que representa o exercício não regular de um direito. Como dito acima, a personalidade jurídica é atribuída visando determinada finalidade social. Se qualquer ato é praticado em desacordo com tal finalidade, causando prejuízos a outrem, tal ato é abusivo e, por conseguinte atentatório ao direito, sendo a desconsideração um meio efetivo de repressão a tais práticas. Neste diapasão, o coe acolheu a doutrina que embasou e sistematizou a desconsideração. Em seguida, o código refere-se ao excesso de poder, que diz respeito aos administradores que praticam atos para os quais não têm poder. Assim, pode-se reunir em um grupo o excesso de poder, a violação ao contrato social ou ao estatuto, a infração à lei e os fatos ou atos ilícitos. Tem-se ainda no caput do artigo 28, a falência, insolvência, encerramentos das atividades provocados por má administração. Nesse particular, pode-se destacar uma infelicidade do legislador, na medida em que a definição do que vem a ser má administração, é tão abstrata e subjetiva, que poderá levar a inaplicabilidade do dispositivo. A definição propriamente da desconsideração no âmbito da relação de consumo está, portanto, no caput do art. 28. Os parágrafos 2°, 3° e 4° do mesmo artigo referem-se à responsabilidade pelos danos causados ao consumidor no caso de grupos societários, consórcios e sociedades coligadas, no caso de sociedades que mantêm entre si alguma relação. Nos grupos há responsabilidade subsidiária, ou seja, se a sociedade causadora do dano ao consumidor, não tiver condições de ressarci-lo,
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o consumidor poderá se socorrer do patrimônio das demais integrantes do grupo. Já nos consórcios a responsabilidade é solidária, podendo desde o início buscar a responsabilidade de todos os participantes. No caso das sociedades coligadas, exigiu-se a culpa para responsabilização da sociedade que não agiu perante o consumidor. Tais hipóteses não se referem à desconsideração, mas a instituto diverso, no sentido da extensão da responsabilidade das sociedades que mantêm relações entre si. Já o § 5° do art. 28 volta a tratar especificamente da desconsideração, preconizando que "também poderá ser desconsiderada a personalidade jurídica, sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores." A extensão de tal dispositivo deu e dá margem a diversas controvérsias de interpretação e críticas. Isso porque, trata-se de uma regra que praticamente excepciona a autonomia patrimonial das pessoas jurídicas, sempre que houver algum consumidor sem receber seu crédito. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova da Promotoria de Justiça/MG/2012, de banca do próprio MPE/MG, o enunciado trazia a seguinte afirmativa: "Desde os primórdios o homem buscou a satisfação de suas necessidades através da troca de mercadorias. Então concebeu-se a relação de consumo entre consumidor e fornecedor, a qual, primeiramente, se instalou de modo individual e pessoal. Com a Revolução Industrial, ocorrida na Inglaterra do século XVIII, operou-se fundamental ruptura no modelo econômico na produção dos bens de consumo fazendo surgir a preocupação de se estabelecer mecanismos de tutela dos consumidores. Além disso, o movimento social que culminou na Revolução Francesa em 176o provocou intensas mudanças na estrutura social, impulsionando a humanidade a viver em função da sociedade de consumo. No Brasil, o legislador pátrio fez publicar o Código de Defesa do Consumidor em 1990 através da Lei 8.078, inserindo no ordenamento pátrio o instituto da desconsideração da personalidade jurídica da sociedade, quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade
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da pessoa jurídica provocados por mâ administração. Nesses termos, é CORRETO afirmar"'. A Afirmativa correta a ser marcada era: "As sociedades consorciadas são solidariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes das relações de consumo."
9.4. Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica
o procedimento para o pedido da desconsideração da personalidade jurídica sempre foi alvo de discussão doutrinária, pois havia quem defendesse que o pedido poderia ser realizado dentro dos próprios autos da execução ou cumprimento de sentença por petição simples, mas havia quem entendesse que era necessário um procedimento autônomo. Apesar de o entendimento majoritário ser no primeiro sentido, o Novo Código de Processo CMI irá prever o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, dizendo inicialmente, no art. 133 que ele será instaurado a pedido da parte ou do Ministério Público quando couber intervir no processo. Tal providência atenta para o disposto no art. 50 do Código Civil que estabelece o requerimento para a desconsideração. Apesar da doutrina dominante do tema defender que a desconsideração deve ser requerida na fase de execução ou cumprimento de sentença, o art. 134 trouxe a seguinte previsão: Art. 134. Oincidente de desconsideração é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial.
Assim, caso o autor da demanda entende, desde o início da lide que já possui provas dos requisitos para a desconsideração, poderá se valer do incidente. Em relação ao procedimento, o legislador não foi muito abrangente, vejamos: Art. 135. Instaurado o incidente, o sócio ou a pessoa jurídica será citado para manifestar-se e requerer as provas cabíveis no prazo de 15 (quinze) dias.
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Art. 136. Concluída a instrução, se necessária, o incidente será
resolvido por decisão interlocutória. Parágrafo único. Se a decisão for proferida pelo relator, cabe agravo interno. Art. 137. Acolhido o pedido de desconsideração, a alienação ou a oneração de bens, havida em fraude de execução, será ineficaz em relação ao requerente. O que se entende é que haverá um procedimento ordinário, até pela necessidade de dilação probatória, para que o juiz possa analisar se de fato houve ou não o ato abusivo que enseja a desconsideração. O incidente não será de utilização obrigatória em todos os pedidos de desconsideração da personalidade jurídica já que o §2º do art. 134 determina que será dispensada a uinstauração do incidente se a desconsideração da personalidade jurídica for requerida na petição inicial, hipótese em que será citado o sócio ou a pessoa jurídica." Nestes casos a extensão da responsabilidade ao patrimônio particular dos sócios será um dos pedidos da ação a ser decidido em sentença. Por fim, cabe ressaltar que pela primeira vez o legislador brasileiro mencionou a Teoria Inversa da Desconsideração da Personalidade Jurídica já que o §2° do art. 133 determina que o incidente poderá ser utilizado também nestes casos. 10. OPERAÇÕES SOCIETÁRIAS
Ao se constituir uma sociedade não se tem como prever como será o seu desenvolvimento e como ela irá atuar no mercado. Por isso a estrutura societária nem sempre irá se manter intacta, sendo que por vezes os sócios se veem na necessidade de alterar o formato da sociedade, unindo-se a outra, alterando o tipo societário, dentre outras situações. Essas modificações pelas quais as sociedades podem passar são conhecidas como operações societárias, que nós iremos analisar uma a uma. A lei de S.A. trata das operações societárias no âmbito das sociedades por ações e o Código Civil regulamenta a dos tipos societários que estão sob sua égide, porém, cumpre ressaltar que ambas as legislações possuem textos muito parecidos sobre o assunto.
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DIREITO SOCIETÁRIO 10.1.
Transformação
A transformação se caracteriza pela alteração do tipo societário, a troca de um tipo pelo outro. Por exemplo, imaginemos que dois sócios criaram uma pequena loja de departamento, e escolheram a sociedade limitada como o tipo societário que mais se adequava ao tipo de atividade. Mas com o tempo tal negócio começa a crescer, à ponto de eles perceberem a necessidade de uma maior capitação de investimentos. Procuram um advogado que os sugere uma transformação para sociedade anônima de capital fechado, pois assim poderão emitir debêntures e ter uma forma mais viável de conseguir o investimento necessário. A sociedade poderá, assim, sem alterar sua personalidade jurídica, mudar tão so· mente o seu tipo societário. Por se tratar de uma mudança de grande profundidade na sociedade, tanto o art. 221 da Lei de S.A. quanto o art. 1114 do Código Civil, exigem o consentimento unânime dos sócios para que a transformação societária seja aprovada. Os terceiros não podem ser prejudicados pela transformação, assim, se a sociedade sai de um tipo em que os sócios tinham responsabilidade ilimitada pelas obrigações para um tipo em que a responsabilidade é limitada, as obrigações anteriores à transformação permanecerão regidas pelo que era no tipo societário anterior. Todo o ato constitutivo deverá ser refeito para se adaptar ao novo tipo societário, sendo que é possível até mesmo a transformação de uma sociedade simples para uma empresária ou vice-versa, caso haja mudança no objeto social. Em virtude da recente mudança que foi feita no Código Civil foram alterados o art. 968 e o 1033. O primeiro dispositivo passou a contar com um § 3° que tem a seguinte redação: § 3° Caso venha a admitir sócios, o empresário individual poderá solicitar ao Registro Público de Empresas Mercantis a transformação de seu registro de empresário para registro de sociedade empresária, observado, no que couber, o disposto nos arts. i.113 a i.115 deste Código.
Já no art. 1033 foi acrescentado um parágrafo único que dispõe: 209
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Parágrafo único. Não se aplica o disposto no inciso IV caso o sócio remanescente, inclusive na hipótese de concentração de todas as cotas da sociedade sob sua titu laridade, requeira, no Registro Público de Empresas Mercantis, a transformação do registro da sociedade para empresário individual ou para empresa individua l de responsabilidade limitada, observado, no que couber. o disposto nos arts. i.113 a i.115 deste Código . Dessa forma, a transformação passou a ser permitida não apenas dentro dos tipos societários, como também de sociedade para empresário individual ou EIREU e ao contrário. Mantém-se a personalidad e jurídica, as obrigações, mas altera a forma de constituição da atividade. • Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova para Técnico da JUCEPE/2012, organizada pela UPENET, o enunciado dispunha que: HÀ luz da IN n• 118/2011, do Departamento Nacional do Registro do Comércio, que dispõe sobre o processo de transformação de registro de empresário individual em sociedade empresária, contratual ou em empresa individual de responsabilidade limitada e vice-versa, assinale a alternativa correta . E a alternativa a ser assina lada afirmava que: HA transformação de registro deverá ser formaliza da em dois processos, sendo um para a natureza jurídica em transformação e outro para a natureza jurídica transformada." Observe-se que a questão já faz menção a inovação do ano de 2012 que é a empresa individual de responsabilidade limitada - EIRELI. H
10.2. Fusão A fusão Irá ocorrer quando uma ou mais sociedades unem-se, criando uma nova sociedade e extinguindo as anteriores. Essa nova sociedade irá suceder as anteriores em todos seus direitos e obrigações. Para compreender melhor o conceito de fusão, pensemos em um exemplo prático. Imaginemos assim que eu tenho a sociedade A, produtora de leite e a sociedade B que faz pasteurização de produtos derivados do leite. Essas duas sociedades percebem que estão perdendo espaço para uma concorrente que faz as duas atividades e então surge a proposta para que elas se fundam . Irão desaparecer, como pessoa jurídica, tanto a sociedade A, quanto a sociedade B e será criada a sociedade C que irá sucedê-las em todos os direitos e obrigações.
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DIREITO SOCIETÁRIO
A fusão pode ocorrer entre sociedades de diversos tipos societários, inclusive entre sociedades simples e empresárias. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No que diz respeito à fusão de sociedade em virtude de mudança do objeto social, a prova organizada pelo CESPE para Magistratura Federal/5• região/2011, o enunciado da questão afirmava: HSuponha que uma sociedade simples abandone o seu objeto social e passe a exercer como principal atividade a compra de bens móveis e sua posterior revenda no mercado, auferindo, após um ano, lucro de um milhão de reais. Em face dessa situação hipotética, assinale a opção correta consoante o Código Civil." A alternativa correta era a seguinte: #Caso os sócios queiram extinguir a sociedade, poderão fazê-lo por meio de fusão com uma sociedade empresarial que já exerça a atividade citada."
Normalmente o interesse em se realizar a fusão é para que a sociedade nova seja mais forte e competitiva no mercado, mas tal operação irá depender de aprovação do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), pois poderá representar risco à liberdade de concorrência, se se configurar domínio de mercado. Para que ocorra a fusão, deverá haver a aprovação dos sócios em cada sociedade que está sendo proposta. Tal operação e o quórum para aprovação irá depender de cada tipo societário. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No certame de responsabilidade da FCC para Notário/TJ/AP/2011, a resposta correta que completava o enunciado "como consequência da fusão das sociedades "K' e MB" era a que afirmava que #extinguem-se as sociedades "K' e "B", surgindo com a fusão uma nova sociedade que as sucederá nos direitos e obrigações."
10. 3. Incorporação
A incorporação segue uma ideia parecida com a da fusão que é a união de sociedades, porém, aqui, uma sociedade será mantida e as demais serão absorvidas e irão desaparecer. Se pensarmos no exemplo que foi dado no item acima, ao invés de se criar a sociedade C. na incorporação a sociedade B, por
211
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
exemplo, desapareceria e seria absorvida pela A que assumiria todas as obrigações da extinta B, tornando-se de porte maior. A sociedade incorporadora passará a abarcar tudo que pertencia à ou às sociedades incorporadas que desaparecerão. Não terá uma sociedade nova, mas a incorporadora irá ser profundamente alterada para absorver as demais. Os sócios das incorporadas passarão a ser sócios da incorporadora. Também por ser um possível ato de concentração, a incorporação deverá passar pelo crivo do CADE para que se analise possível infração à concorrência. Para haver a incorporação, esta deverá ser aprovada em cada uma das sociedades que irão ser participantes da operação. • Qual o entendimento do STJ sobre o assunto? No REsp 119148o/SC, publicado em 14/10/2011 o STJ demonstra o entendimento a respeito das consequências da incorporação, vejamos: RECURSO ESPECIAL PROCESSO CIVIL INCORPORAÇÃO. EXTINÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA DA INCORPORADA. DIREITOS E OBRIGAÇÕES TRANSMmDOS À INCORPORADORA. BRASIL TELECOM S/A. SUBSTITUTA. POR INCORPORAÇÃO, DA TELESC. LEGmMIDADE PASSIVA RECONHEODA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. MUL· TA POR CARÁTER PROTELATÕRIO. AFASTAMENTO. FINS DE PREQUESTIONAMENTO. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO NO PONTO. i . A sucessão, por incorporação, de empresas. implica a extinção da personalidade jurídica da incorporada e a transmissão de seus direitos e obrigações à incorporadora. 2. Legitimidade passiva da Brasil Telecom S/A para responder pelos atos anteriormente praticados pela Telesc, ante sua sucessão, oconida por incorporação. (...) 4. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.
io.4. Cisão Ao contrário das duas operações anteriores, a cisão tem o objetivo de diminuir o porte de uma sociedade. A cisão das sociedades é uma forma de reorganização societária que normalmente tem por objetivo maior organização administrativa, otimizando assim diversas funções da sociedade, tornando-as
212
DIREITO SOCIETÁRIO
mais compet1t1va no mercado através da transferência de capital de uma sociedade para outra ou outras, sendo que, a sociedade que absorve tal capital sucede a cindida nos direitos e obrigações correspondentes à parcela absorvida, dependendo de se estar tratando de cisão total ou cisão parcial. Cisão total ocorre quando todo o capital de uma sociedade é dividido entre duas ou mais sociedades, que absorvem o capital e a sucedem em direitos e obrigações, extinguindo -se a sociedade cindida. Já na cisão parcial apenas uma parcela do patrimônio é distribuída para outras sociedades, sendo que cada uma será responsável em relação à parte absorvida do patrimônio. Destacamos que para a absorção da parcela de capital que receberá, a sociedade empresária pode ser preexistente ou ainda pode ser criada exclusivamente para receber tal capital. No que diz respeito
à responsabilidade, o legislador se preocu-
pou em proiblr qualquer possibilidade de a cisão se transformar em instrumento de fraude contra os credores. A Lei de S.A. determina em seu art. 234 que na cisão total, os direitos e obrigações se transferem para a nova sociedade, legítima sucessora daquela que se extinguiu. Caso o capital tenha sido dividido em diversas sociedades, cada qual responderá na proporção do capital absorvido. Na cisão parcial, isso é, quando subsiste a em presa cindida, as em presas que absorveram o capital, passam a sucedê-la apenas nos direitos e obrigações que serão relacionados quando da efetivação da cisão. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
O STJ se preocupa em proteger o direito dos credores no caso de cisão da sociedade e não permite que o instrumento da cisão possa limitar a responsabilidade da sociedade cindida, como no REsp i29496o/RJ, publicado em 26/04/2012, cuja ementa é a seguinte: "i. Na cisão parcial, a companhia que adquire o patrimônio da cindida sucede-a, por disposição de lei, nos direitos e obrigações. Essa sucessão se dá quanto aos direitos e obrigações mencionados no ato da cisão, em caso de cisão parcial, ou na proporção dos patrimônios transferidos mesmo sobre atos não relacionados, na hipótese de ci são com extinção.
2. Apurar se a hipótese é de cisão parcial ou cisão com extinção, bem como verificar se a obrigação pleiteada no processo está incluída no bojo do patrimônio transferido, é matéria de mérito que deve ser apreciada pelo juízo no momento da prolação da sentença.
273
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
sn
3. O vem se posicionando no sentido de considerar insubsistente a cláusula de exclusão de solidariedade aposta no instrumento de cisão, nos termos do art. 233, §1•, da Lei das S/A, quanto a credores cujo título não tiver sido constituído até o ato de cisão, independentemente de se referir a obrigações anteriores. 4. A sucessão disposta na Lei das Sociedades Anônimas quanto às obrigações relacionadas ao patrimônio transferido comporta-se, quanto ao processo, da mesma forma que a alienação do objeto litigioso, de modo que não se pode opor à inclusão da sucessora no pólo passivo o princípio da estabilidade da demanda. 5. Recurso especial conhecido
~
e provido#
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova da Magistratura do Trabalho/2010, organizada por banca própria a questão pedia para identificar as operações societárias, sendo que o enunciado era o seguinte: HA sociedade anônima pode, por deliberação dos acionistas, sofrer modificações na sua estrutura e configuração societária, transformando o tipo de sociedade, transferindo patrimônio e alterando o corpo acionário. As mudanças trazem características próprias. Observando a ordem das assertivas abaixo, indique a alternativa que aponta os institutos jurídicos mencionados.
operação pela qual a companhia transfere parcelas de seu patrimônio para uma ou mais sociedades, extinguindo-se a companhia, se houver versão de todo o seu patrimônio, ou dividindo-se o seu capital, se parcial a versão; 1-
li - operação pela qual a sociedade passa, independentemente de dissolu-
ção e liquidação, de um tipo para outro; Ili - operação pela qual uma ou mais sociedades são absorvidas por outra, que lhes sucede em todos os direitos e obrigações;
IV - operação pela qual se unem duas ou mais sociedades para formar sociedade nova, que lhes sucederá em todos os direitos e obrigações.H A resposta correta era: Hcisão, transformação, incorporação e fusão.#
214
Capítulo
4
Falência e Recuperação de Empresas sumário • i. Introdução - 2. Aplicabilidade da Lei 11.101/05 - 3. Disposições comuns à Falência e à Recuperação: 3.i. Obrigações não exigíveis; p. Suspensão da prescrição, ações e execuções contra o devedor: 3.2.1. Ações que não serão suspensas; 3.3. Prevenção da jurisdição; 3-4· Verificação e habilitação dos créditos - 4. Administrador Judicial: 4.1. Conceito; 4.2. Nomeação; 4.3. Atribuições do administrador - 5. Comitê de credores - 6. Assembleia Geral de credores 7. Recuperação Judicial de Empresas: 7.1. Introdução; 7.2. Requisitos para requerer a recuperação judicial; 7.3. Pedido inicial da recuperação judicial; 7.4. Plano de recuperação judicial: 7.4.1. Créditos sujeitos à recuperação; 7.4.2. Meios de recuperação; 7.4.3. Plano especial das Microempresas; 7.5. Deliberação sobre o plano de recuperação 7 6.5. Execução da recuperação; 7.7. Convolação da recuperação em falência; 7.8. Encerramento da recuperação - 8. Recuperação Extrajudicial - 9. Falência: 9.i. Introdução; 9.2. Processamento da falência: 9.2.i. Fase pré-falimentar: 9.2.i.1. Legitimados ativos; 9.2.1.2. Atos de falência; 9.2.i.3. Procedimento; 9.2.1.4. Participação do Ministério Público 9.2.2. Fase falimentar: 9.2.2.1. Sentença de falência; 9.2.2.2. Levantamento do ativo; 9.2.2.3. Ação Revocatória; 9.2.2.4. Atos Ineficazes; 9.2.2.5. Pedidos de restituição; 9.2.2.6. Pagamento do passivo: concurso de credores; 9.2.3. Fase pós-falimentar
1.
INTRODUÇÃO
O êxito da atividade empresária não depende apenas da boa atuação do empresário, dos administradores e dos investidores que cercam a empresa. Como já foi tratado em itens anteriores neste estudo, a atividade empresária está sujeita ao risco natural do mercado e do mundo globalizado. 215
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
Desta feita, nem sempre os negócios empresariais saem como previsto pelas pessoas responsáveis pela sua criação e manutenção e eles poderão entrar em crise. O direito preocupou-se em regulamentar esse momentos de crise, separando-os em dois âmbitos diferentes. A crise que não tem solução e leva ao encerramento da atividade empresária e a crise que se vislumbra solução, mas que precisa de alguns mecanismos para ser superada. No ordenamento jurídico brasileiro, a primeira legislação a se preocupar com o assunto foi o Código Comercial de 1850, que tratava da insolvência comercial. A seguir, vários foram os decretos que tentaram especificar o procedimento de crise das atividades comerciais, até que em 1945 o decreto-lei 7661 especificou bem mais as situações de crise, disciplinando o procedimento falimentar com mais detalhes, para o caso de crise sem solução e criando o procedimento da concordata (preventiva e suspensiva) para o caso de se tentar sair da situação de crise. No momento em que foi criado, o decreto atendeu às necessidades da época, mas sempre foi alvo de muitas críticas, principalmente no que diz respeito ao procedimento da concordata. Assim, principalmente com a proximidade do final dos governos militares, começou-se a ver a necessidade de reforma do decreto-lei 7661/45 e em 1993 foi apresentado um projeto de lei que somente veio a ser aprovado em 2005, com a edição da Lei 11.101 que revogou o antigo decreto-lei. A Lei 11.101/05 reformulou todo o procedimento de falência, que continuou tratando das situações de crise insuperável, mas com contornos diferentes e foi criado o procedimento da recuperação de empresas (que poderá ser judicial ou extrajudicial) para as crises sanáveis, acabando com a tão criticada concordata. Ressalta-se que não foi apenas uma mudança na nomenclatura, mas sim uma revisão de todos os conceitos e procedimentos. É essa legislação atual que iremos estudar a partir de agora. Antes de mais nada é preciso pontuar que a atual lei revela a preocupação do legislador com a imponância que representa a empresa no contexto social, em face da sua preservação, da manutenção dos reflexos da exteriorização de sua função social, de estímulo 216
FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
às atividades econômicas e de alavancagem dos princípios constitucionais da livre iniciativa e da livre concorrência. ~
Importante!
A atual lei que trata dos momentos de crise da empresa é a Lei 11.101/2005 que modificou o procedimento de falência e criou a recuperação de empresas, acabando com o instituto da concordata. 2. APLICABILIDADE DA LEI 11.101/05 Nem todas as atividades econômicas poderão se valer da atual Lei de Falência para os seus momentos de crise. De acordo com o art. lº dessa lei, ela é aplicada ao empresário individual e às sociedades empresárias, o que exclui deste procedimento as sociedades simples e as cooperativas. No art. 1°, esta Lei disciplina a recuperação judicial, a recuperação extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, doravante referidos simplesmente como devedor. Como foi falado anteriormente, o objetivo da regulamentação da falência e da recuperação está ligado ao risco da atividade empresária, a qual sofre bastante com as influências externas. No caso das atividades não empresárias há até o risco, mas ele é bem menor e, por isso, não precisam de uma lei especial para regulamentar seus momentos de crise. A expressão "sociedade empresária" que está no dispositivo supracitado deve ser entendida de forma ampla, ou seja, refere-se a toda sociedade que tem como atividade fim uma atividade empresária, independente de estar regularmente constituída sob a forma de uma sociedade empresária. Assim, pode-se incluir no procedimento de falência e recuperação as sociedades não personificadas e aos empresários irregulares. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No certame organizado pela FCC para Notário/TJAP/2011, o enunciado da questão continha a seguinte afirmativa: "Empresário que exerce atividade empresária sem prévia inscrição no Registro do Comércio." Ea alternativa correta completava "estará sujeito à decretação de sua falência no caso de impontualidade."
277
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
Outra ressalva importante diz respeito à EIRELI. Como a 11.101 é de 2005, ela falou apenas em sociedade empresária e empresário, pois não existia a figura da empresa individual de responsabilidade limitada. Porém, como foi dito anteriormente, o objetivo da lei é tratar da atividade empresária, em regra, como um todo, então, não se tem dúvidas que a EIRELI também poderá se valer da falência e da recuperação. No entanto, existem determinadas atividades empresárias que foram excluídas do uso da lei, conforme vai dispor o art. 20, vejamos: Art.
2°
Esta Lei não se aplica a:
1- empresa pública e sociedade de economia mista; li - instituição financeira pública ou privada, cooperativa de crédito, consórcio, entidade de previdência complementar; sociedade operadora de plano de assistência à saúde, sociedade seguradora, sociedade de capitalização e outras entidades legalmente equiparadas às anteriores.
Como se sabe do conceito do direito administrativo, as empresas públicas e as sociedades de economia mista são entidades controladas por algum poder governamental, mas que atuam com a liberdade de uma atividade privada. No caso, considerada pela lei, é totalmente pertencente a alguma esfera do Governo, podendo revestir-se de qualquer forma societária prevista na lei, embora a maioria conhecida seja S/A. Esta fica fora dos procedimentos concursais. São sociedades empresárias com interesses vinculados ao Governo, sobre as quais o Estado exerce o controle administrativo e diretivo. Já que têm elas muita ligação com a administração pública, caso necessitem da recuperação judicial, terão elas solução própria, vale dizer, dentro do Poder Executivo. Como representam tais sociedades uma intervenção do Estado nas atividades empresariais, a princípio caberia à iniciativa privada, mas não seria lógico que o Estado desse prejuízo à praça, sob proteção de lei de ordem privada. Já o inciso li do art. 20 trata de alguns tipos de atividades que merecerão proteção especial e diferenciada para os momentos de crise financeira.
278
FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
De acordo com a Lei Complementar 109/01, as companhias de seguro passam pela liquidação compulsória e não pela falência. Porém a Lei l0.190/01 alterou o art. 26 do Decreto-Lei 73/66 que passou a ter a seguinte redação: Art. 26. As sociedades seguradoras não poderão requerer concordata e não estão sujeitas à falência, salvo, neste último caso, se decretada a liquidação extrajudicial, o ativo não for suficiente para o pagamento de pelo menos a metade dos credores quirografários, ou quando houver fundados indícios da ocorrência de crime falimentar. Sendo assim, nos dois casos previstos, somente o liquidante poderá pedir a falência das seguradoras que estiverem em liquidação compulsória. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova organizada pelo CESPE para a Magistratura/PA/2012, requereu-se que fosse assinalada a afirmativa correta que era "As companhias de seguro estão relativamente excluídas do direito falimentar." O mesmo ocorre com as operadoras de plano de saúde que só vão
à falência quando, no concurso da liquidação extrajudicial decretada pela ANS (Agência Nacional de Saúde), verifica-se que o ativo não é suficiente para pagar pelo menos metade dos créditos quirografários ou se houver fundados indícios de crime falimentar (Lei 9656-98, art. 23 e Med. Prov. 2177/44-01). As instituições financeiras também estão sujeitas à liquidação judicial prevista na Lei 6o24/74. Porém, se essas sociedades se encontrarem no exercício regular da atividade financeira, estarão sujeitas à falência. ~
Resumindo
Regra geral a Lei 11.101/05, atual Lei de Falências e Recuperação de Empresas aplica-se às atividades empresárias como um todo, independente da sua regularidade. Porém, existem determinadas atividades empresárias, que por seu caráter, terão regulamento próprio para os momentos de crise e não se valerão da lei em comento.
219
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3. DISPOSIÇÕES COMUNS À FALÊNCIA E À RECUPERAÇÃO Antes de estudarmos separadamente os institutos da Falência e da Recuperação, a lei tratou de alguns aspectos que serão comuns para ambos os procedimentos. 3.i. Obrigações não exigíveis Dispõe o art. 5° da Lei de Falência que não serão exigíveis do devedor, nem na falência e nem na recuperação as obrigações a título gratuito, bem como as despesas que os credores fizerem para tomar parte na recuperação judicial ou na falência, com exceção das custas judiciais decorrentes de litígio com o devedor. No que diz respeito à primeira situação, obviamente não seria razoável se exigir na recuperação judicial ou na falência as obrigações a título gratuito. Os contratos gratuitos são caracterizados como liberalidades, motivo porque não podem ser adimplidos em detrimento das obrigações onerosas. Já a previsão do inciso li, o legislador excetuou as despesas realizadas pelos credores com o objetivo de tomar parte na recuperação judicial ou na falência . Dessa forma, as despesas realizadas com honorários advocatícios, gastos com impugnações ou habilitações de créditos, dentre outras, não podem ser contempladas. As únicas despesas que podem ser cobradas são as custas judiciais que porventura decorreram de litígio com o devedor. ~
Atenção!
Não se pode confundir honorários advocatícios originados de despesas efetuadas pelos credores para tomar parte na recuperação judicial ou falência (inc. 11) com os honorários advocatícios devidos pelo devedor. Estes últimos fazem parte dos créditos a ser exigidos, tendo inclusive, conforme jurisprudência do STJ, natureza alimentar. Porém, decisões mais recentes do STJ, muito embora confirmem a natureza alimentar dos honorários advocatícios, afastam a equiparação aos créditos trabalhistas, sustentando que possuem privilégio geral no concurso de credores. A questão ainda gera polêmica e não está pacificada.
220
FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
3.2. Suspensão da prescrição, ações e execuções contra o devedor Sabe-se pelas normas do direito civil que, violado um direito, nasce a pretensão jurídica que se extinguirá com a prescrição, que retira do titular do direito a possibilidade de pleitear judicialmente o reconhecimento de seu direito violado. Os art. 205 e 2o6 do Código Civil estipulam, de forma geral, os prazos prescricionais do direito privado. Porém, esses prazos prescricionais estão sujeitos à suspensão e a interrupção. A Lei iuo1/05 preocupou-se com o curso da prescrição de quando se envolve direitos e deveres do legitimado passivo da falência ou da recuperação. Sendo assim o art. 6° determina: Art. 6°. A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário. O dispositivo envolve suspensão da prescrição mos primeiro da prescrição.
e das
ações. Trate-
Há uma imprecisão técnica da redação do dispositivo, pois se questiona se a expressão "em face do devedor" refere-se tão somente as ações e execuções ou também à prescrição. O entendimento que vem prevalecendo é que no que tange à prescrição, haverá suspensão não apenas das ações em face do devedor, ou seja, dos direitos de terceiros perante o devedor, como também estará suspensa a prescrição dos direitos pertencentes ao empresário ou sociedade legitimados passivos. ~
Importante!
Suspensão da prescrição é diferente de interrupção, ou seja, o curso do prazo é apenas sobrestado temporariamente, voltando a ter curso quando a causa suspensiva acabar, retomando-se a contagem do tempo de onde parou. Conforme o mesmo art. 6° já citado, serão também suspensas as ações e execuções, tão somente que tiverem como réu o devedor. Trata-se de regra geral que tem por objetivo concretizar o princípio do par conditio creditorum, evitando que credores possam individualmente discutir e executar o crédito diante do empresário ou sociedade empresária. 221
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
O marco inicial para a suspensão é: a) Na recuperação judicial: o despacho de processamento da recuperação judicial. b) Na falência: a decretação da quebra do devedor. O processamento da recuperação judicial ou mesmo a aprovação do plano de recuperação não suspende ações de execução contra fiadores e avalistas do devedor principal recuperando. Esse é o entendimento que vem prevalecendo tanto na doutrina como na jurisprudência. Tratava-se de um assunto bastante polêmico que desde a vigência da atual legislação permeia as decisões dos nosso tribunais e as teses doutrinárias. Após o deferimento da recuperação judicial e, mais adiante, com a aprovação do plano pela assembleia de credores, surgem discussões acerca da posição a ser assumida por quem, juntamente com o devedor em recuperação, figurou como coobrigado em contratos ou títulos de crédito submetidos à recuperação. Os devedores solidários garantidores do devedor em recuperação pedem a suspensão de execuções contra eles invocando a redação do já mencionado art. 6o da Lei 11.101/05. O entendimento que prevalece é que o artigo alcança os sócios solidários, pois na eventualidade de decretação de falência da sociedade, os efeitos da quebra estendem-se a eles. Porém, a situação é diversa em relação aos devedores solidários ou coobrigados. Para eles, a disciplina é exatamente inversa, prevendo a lei expressamente a preservação de suas obrigações na eventualidade de ser deferida a recuperação judicial do devedor principal. Isso porque o art. 49, § 1°, estabelece que "os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso". Assim, não há suspensão da execução direcionada a codevedores ou devedores solidários pelo simples fato de o devedor principal ser sociedade cuja recuperação foi deferida, pouco importando se o executado é também sócio da recuperanda ou não, uma vez não se tratar de sócio solidário. Esse entendimento foi explanado na 1Jornada de Direito Comercial do Conselho da Justiça Federal, reforçando o entendimento doutrinário sobre o tema:
222
FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
Enunciado n° 43 : A suspensão das ações e execuções previstas no art. 6° da Lei n. 11.101/2005 não se estende aos coobrigados do devedor. • Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
O entendimento do STJ é é exatamente o que foi mencionado acima como se pode observar no REsp 1326888/RS, publicado em 05/05/2014 cuja ementa é a seguinte: "DIREITO CIVIL E EMPRESARIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. HOMOLOGAÇÃO DO PLANO. NOVAÇÃO SUi GENERIS. EFEITOS SOBRE TERCEIROS COOBRIGADOS. EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO. DESCABIMENTO. MANUTENÇÃO DAS GARANTIAS. ARTS. 49. § lº E 59. CAPUT, DA LEI N. 11.101/2005. 1. A novação prevista na lei civil é bem diversa daquela disciplinada na Lei n. 11.101/2005. Se a novação civil faz. como regra, extinguir as garantias da dívida, inclusive as reais prestadas por terceiros estranhos ao pacto (art. 364 do Código Civil), a novação decorrente do plano de recuperação traz como regra, ao reverso, a manutenção das garantias (art. 59, caput, da Lei n. 11.101/2005), sobretudo as reais, as quais só serão suprimidas ou substituídas "mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia", por ocasião da alienação do bem gravado (art. 50, § 1°). Assim, o plano de recuperação judicial opera uma nevação sui generis e sempre sujeita a uma condição resolutiva, que é o eventual descumprimento do que ficou acertado no plano (art. 61, § 2°. da Lei n. 11.101/2005). 2. Portanto, muito embora o plano de recuperação judicial opere nevação das dívidas a ele submetidas, as garantias reais ou fidejussórias, de regra, são preservadas, circunstância que possibilita ao credor exercer seus direitos contra terceiros garantidores e impõe a manutenção das ações e execuções aforadas em face de fiadores, avalistas ou coobrigados em geral. 3. Deveras, não haveria lógica no sistema se a conservação dos direitos e privilégios dos credores contra coobrigados, fiadores e obrigados de regresso (art. 49, § 1°, da Lei n. 11.101/2005) dissesse respeito apenas ao interregno temporal que medeia o deferimento da recuperação e a aprovação do plano, cessando tais direitos após a concessão definitiva com a homologação judicial. 4. Recurso especial não provido." ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova discursiva da Magistratura Estadual AM/2013, sob a responsabilidade da FGV, foi feita a seguinte pergunta: "Deferido o processamento da recuperação judicial de uma sociedade empresária, os seus sócios postulam a suspensão de uma ação de execução em que figuram como executados, na qualidade de avalistas da sociedade recuperanda, no Juízo de uma das Varas Cíveis de Manaus. Qual deve ser a decisão do juízo competente para processar e julgar o processo de recuperação judicial?."
223
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
Para que se possa fazer corretamente o concurso de credores e o processamento da recuperação será necessário constituir o juízo universal, para impedir que os credores que têm processos em estágio mais avançado tenham vantagens sobre aqueles que estão no início da demanda ou que ainda sequer deram entrada nas suas ações. Com a decretação da falência ou o processamento da recuperação judicial todas as ações e execuções contra o legitimado passivo serão reunidas no juízo universal, para permitir que a solução seja dada de maneira uniforme em todas as demandas. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame de responsabilidade do CESPE para Defensor Público/BA/2012, foi considerada correta a afirmativa: uo juízo da falência é indivisível e competente para conhecer todas as ações sobre bens, interesses e negócios do falido, ressalvadas as causas trabalhistas, fiscais e aquelas não reguladas na lei de regência, caso o falido figure como autor ou litisconsorte ativo." De acordo com o art. 266 do Código de Processo Civil, durante a suspensão do feito, a princípio não se podem praticar atos processuais, porém, será permitida a prática de atos urgentes, necessários manutenção de direitos.
à
3.2.1. Ações que não serão suspensas A regra do caput do art. 6° não é, porém, absoluta, sendo que os parágrafos desse mesmo dispositivo irão trazer as exceções, tratando das ações que não serão suspensas e continuarão pelo seu próprio rito. A primeira exceção é a que está prevista no § 1° que prevê que: "terá prosseguimento no juízo no qual estiver se processando a ação que demandar quantia ilíquida." Trata-se das ações em que ainda se está discutindo se o crédito existe ou não e qual é o seu valor. É uma situação bastante lógica, pois entrará no juízo universal somente aquilo que já está definido como crédito existente e devido. Com a definição do crédito, a ação será atraída para o juízo universal.
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FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
Apesar de não estar especificado na lei, tem-se entendimento de que é obrigação do empresário ou o administrador da sociedade falida ou em recuperação comunicar ao juiz da ação que esteja em curso que teve sua falência decretada ou o processamento da recuperação, para que se possa analisar se é o caso de suspensão da ação.
o§ 20 do art. 60 trata, de maneira específica, das ações de natureza trabalhista, que permanecerão sob a égide da justiça especializada e somente após a apuração do crédito será habilitada na falência. Poderá, entretanto, nesses dois casos, haver reserva de valores no juízo universal para garantir o pagamento dos créditos que poderão ser constituídos nas ações próprias. ~ o que diz o §3° do art. 6°, verbis: § 3° O juiz competente para as ações referidas nos §§ i• e 2° deste artigo poderã determinar a reserva da importância que estimar devida na recuperação judicial ou na falência, e, uma vez reconhecido líquido o direito, serâ o crédito incluído na classe própria.
As execuções de natureza fiscal e a cobrança dos adiantamentos
de contrato de câmbio não são suspensas pelo deferimento da recuperação judicial. No procedimento especial, as ações e execuções por créditos não abrangidos pelo plano não são suspensas. (§7°) Também não estão suspensas as ações relativas a créditos decorrentes de financiamento de valores a receber, garantidos por penhor sobre direitos creditórios, por títulos de crédito, valores mobiliários e aplicações financeiras. 3.3. Prevenção da jurisdição Prevê o §80 do art. 6• que: "A distribuição do pedido de falência ou de recuperação judicial previne a jurisdição para qualquer outro pedido de recuperação judicial ou de falência, relativo ao mesmo devedor." Há apenas que se observar que somente haverá prevenção se a primeira ação foi corretamente distribuída, de acordo com a regra de competência do art. 3°, que é o local do principal estabelecimento do devedor. 225
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova da Magistratura/MG/2012, organizada pela EJEF, a alternativa correta a ser assinalada na questão afirmava que: "É competente o juízo do local da filial para decretar falência ou deferir processamento da recuperação judicial de empresa que tenha sede fora do Brasil." Essa prevenção também irá determinar a competência do processamento da falência ou recuperação, pois no caso do réu possuir várias sedes, será competente o do local onde primeiro foi proposto. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
No informativo 506 de 2012 o tribunal explanou que: "Direito processual civil e empresarial. Competência. Falência e recuperação judicial. Prevenção. A competência para apreciar pedido de recuperação judicial de grupo de empresas com sedes em comarcas distintas, caso existente pedido anterior de falência ajuizado em face de uma delas, é a do local em que se encontra o principal estabelecimento da empresa contra a qual foi ajuizada a falência, ainda que esse pedido tenha sido apresentado em local diverso. cc 116.743, Rei. p/ac. Min. Luís f. Salomêlo, j. 10.10.12. 2° S. (lnfo 506, 2012)
3.4. Verificação e habilitação dos créditos Para se processar a falência ou a recuperação judicial será preciso verificar quais são exatamente os créditos que o devedor tem que adimplir. o artigo 7° da Lei de Falência irá tratar dessa verificação que fica a cargo do administrador judicial, através da análise dos livros contábeis do empresário ou da sociedade empresária, dos documentos fiscais e comerciais. No entanto, a listagem dos créditos não depende apenas da atuação do administrador, tendo em vista que a lei permite que os credores possam habilitar seus créditos, ou seja, terão a possibilidade de se apresentarem no juízo universal para ter sua pretensão de crédito acrescida ao processo. Após essas habilitações o administrador judicial fará publicar edital (art. 7°, § 2°) contendo nova relação de credores no prazo de 45 dias, contado do fim do prazo concedido aos credores. Nesse edital deverá
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FAL~NCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
indicar local, horário e prazo comum em que as pessoas indicadas no art. 8° (o Comitê, qualquer credor, o devedor ou seus sócios ou o Ministério Público) terão acesso aos documentos que a fundamentaram. Os credores, com vistas a fundamentar suas habilitações e impugnações de créditos, podem solicitar ao Administrador Judicial o fornecimento de extrato dos livros do devedor, que merecerão fé de ofício (art. 22, 1, c). Importante lembrar que os credores devem se dirigir diretamente ao administrador judicial, no endereço constante do edital. Se for determinado pelo Juiz da causa, as habilitações/divergências podem ser apresentadas em cartório do Ofício Cível da Vara em que tramita a respectiva recuperação judicial ou falência. Todavia, frise-se, a petição deve ser sempre endereçada ao administrador judicial já que ela não será juntada aos autos do processo. A habilitação de crédito deverá ainda observar os requisitos ditados pelo art. 9°, essenciais ao reconhecimento do crédito reclamado, sendo desnecessária a subscrição por advogado, muito embora isso seja recomendável, até para uma melhor formalização do pleito. Após tais atos, passa-se a uma nova fase das habilitações, essa sim feita no âmbito judicial. Como foi dito acima, o Comitê, qualquer credor, o devedor ou seus sócios ou o Ministério Público, no prazo de 10 (dez) dias contados da publicação da relação elaborada pelo administrador judicial (art. 70, § 2°), podem apresentar ao juiz impugnação contra a relação de credores , apontando a ausência de qualquer crédito ou manifestando-se contra a legitimidade, importância ou classificação de crédito relacionado. Os credores que tiverem seus créditos impugnados poderão apresentar defesa, mas de acordo com o art. 11 deverá ser feita em apenas 5 dias, apresentando-se os documentos que entender necessários. Essa impugnação, autuada em separado, será processada nos termos dos arts. 13 a 15. Nessa fase, em se tratando de impugnação formulada por credor, é obrigatória a constituição de advogado, uma vez que agora a petição deverá ser endereçada ao Juiz do feito, que irá decidir as impugnações, tornando definitiva a listagem dos créditos.
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No certame da Magistratura/DF/2011, de organização da banca TJ-DFT, a questão requeria que fosse assinalada a afirmativa correta que era a seguinte: #Posto que a Lei de Falências preconize que podem contestar a impugnação os credores cujos créditos foram impugnados, o moderno entendimento se direciona no sentido de que qualquer interessado, provando essa sua condição, pode contestar a impugnação no prazo de cinco dias, carreando os documentos que tiver e indicando outras provas que reputar necessárias"
4. ADMINISTRADOR JUDICIAL 4.i. Conceito Os procedimentos da falência e da recuperação judicial necessitam de atos de fiscalização, acompanhamento e até mesmo de gestão. Para isso, a Lei 1uo1/05 constituiu a figura do administrador judicial que terá diferentes funções na falência e na recuperação, mas que pode ser conceituado como aquele que irá auxiliar o magistrado na condução dos procedimentos. 4.2. Nomeação Como o administrador é auxiliar do magistrado, é ele quem irá escolhê-lo e nomeá-lo e o art. 21 preconiza que deverá ser "profissional idôneo, preferencialmente advogado, economista, administrador de empresas ou contador, ou pessoa jurídica especializada." Critica-se o dispositivo supracitado pela especificidade apresentada no seu caput quando deixa de mencionar outros profissionais que poderiam exercer tal mister. A expressão "preferencialmente" dá a entender que o administrador, pessoa física, estará constrito a essas profissões, mas essa não é a melhor interpretação, na medida em que, nos dias atuais, muitas pessoas que não tenham a formação indicada no dispositivo podem ter a experiência necessária para desenvolver bem o trabalho que se espera do administrador judicial, sendo profundo conhecedor das necessidades empresariais. Caso o administrador judicial seja uma pessoa jurídica, ela ao assinar o termo de compromisso deverá indicar o nome do profissional responsável pela devida condução do processo de falência ou de
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FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
recuperação judicial, que não poderá ser substituído sem previa autorização do juiz. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova unificada da OAB/Out. 2011, organizada pela FGV, foi considerada correta a seguinte afirmativa a respeito do administrador judicial: "o Administrador Judicial. pessoa física, pode ser formado em Engenharia." 4.3. Atribuições do administrador Como já mencionado alhures, o administrador judicial terá funções diferentes na recuperação e na falência. Oart. 22 trata das atribuições do administrador em ambos os procedimentos e depois separa quais são as atribuições em cada um deles. Na recuperação judicial os principais participantes do procedimento são o administrador e o próprio devedor. Como consequência lógica ambos visam vencer a crise financeira e manter a viabilidade do negócio e a preservação da atividade econômica. Na visão dos credores, a superação da crise financeira da empresa aumenta as perspectivas de recuperação dos créditos concedidos, a manutenção ou mesmo a realização de novos negócios. Sendo assim, o administrador judicial ao conduzir um plano de recuperação necessita vislumbrar a eficiência do mesmo. Além disso, o administrador judicial diante do processo de falência ou da recuperação judicial tem fundamental importância, portanto, deverá atentar para as seguintes regras: a) enviar correspondência aos credores constantes na relação enviada pelo devedor comunicando a data do pedido de recuperação judicial ou da decretação da falência, a natureza, o valor e a classificação dada ao crédito; b) fornecer, com presteza, todas as informações pedidas pelos credores interessados; c) dar extratos dos livros do devedor, que merecerão fé de ofício, a fim de servirem de fundamento nas habilitações e impugnações de créditos; 229
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
d) exigir dos credores, do devedor ou seus administradores quaisquer informações; e) elaborar a relação de credores e publicar, indicando o local, o horário e o prazo comum em que as pessoas indicadas terão acesso aos documentos que fundamentaram a elaboração dessa relação; f) consolidar o quadro geral de credores que será homologado pelo juiz com base na relação de credores e nas decisões proferidas nas impugnações oferecidas;
g) requerer ao juiz a convocação da assembleia geral de credores nos casos previstos na lei ou quando entender necessária sua ouvida para tomada de decisões; h) contratar mediante autorização judicial, profissionais ou empresas especializadas para, quando necessário, auxiliá-lo no exercício de suas funções;
i) manifestar-se nos casos previstos na lei. No caso do administrador judicial, especificamente, liderar o plano de recuperação judicial deverá primar pela fiscalização das atividades do devedor e o respectivo cumprimento do plano de recuperação judicial. E no caso de efetivo descumprimento das obrigações devidamente assumidas no referido plano de recuperação judicial ele deverá requerer a falência. Deverá também apresentar ao juiz os seguintes relatórios: um mensal das atividades do devedor para ser juntado aos autos e outro sobre a execução do plano de recuperação, quando da sentença de encerramento da recuperação judicial. Por ter maior complexidade, no processo de falência, o administrador judicial terá uma panicipação mais efetiva, sendo que a lei ressalta que deverá observar as seguintes questões: a) avisar, pelo órgão oficial, o lugar e hora em que, diariamente, os respectivos credores terão á sua disposição os livros e documentos do falido; b) examinar a escrituração do devedor;
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FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
c) relacionar os processos e assumir a representação judicial da massa falida; d) receber e abrir a correspondência dirigida ao devedor. entregando a ele o que não for assunto de interesse da massa; e) apresentar. no prazo de 40 (quarenta) dias, contado da assinatura do termo de compromisso, havendo a possibilidade de prorrogação por igual período, e mais, um relatório sobre as causas e circunstâncias que conduziram à situação de falência, no qual apontará a responsabilidade civil e penal dos envolvidos, se for o caso;
f) arrecadar os bens e documentos do devedor e elaborar o auto de arrecadação; g) avaliar os respectivos bens que foram arrecadados; h) realizar a contratação de avaliadores, preferencialmente avaliadores oficiais, mediante autorização do juiz, para a avaliação dos bens caso entenda não ter condições técnicas para a referida tarefa; i) praticar os atos necessários à realização do ativo e ao pagamento dos credores;
j) requerer ao juiz a venda antecipada de bens perecíveis, deterioráveis ou sujeita a considerável desvalorização ou de conservação arriscada ou ainda considerada muito dispendiosa; 1) praticar todos os atos conservatórios de direitos e ações, diligenciar a cobrança de dívidas e dar a respectiva quitação;
m)remir, em benefício da massa e mediante autorização judicial, bens apenhados, penhorados ou legalmente retidos; n) representar a massa falida em juízo, contratando, se necessário, advogado, cujos honorários serão previamente ajustados e aprovados pelo Comitê de Credores; o) requerer todas as medidas e diligências que forem necessárias para o cumprimento da Lei, a proteção da massa ou a eficiência da administração; p) apresentar ao juiz para a devida juntada aos autos, até o décimo dia do mês seguinte ao vencido, a conta demonstrativa 237
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
da administração que especifique com clareza a receita e a despesa; q) entregar ao seu substituto, se for o caso, todos os bens e documentos pertencentes à massa que se encontrarem sob o seu poder; sob pena de responsabilização; e r) realizar a prestação de contas ao final do processo, e também se ocorre a sua substituição, destituição ou se renunciará ao cargo de administrador judicial. Por todas essas atribuições podemos notar a importância da escolha do referido profissional para permitir o desenvolvimento positivo da recuperação judicial ou da falência, de acordo com o caso concreto. Não se pode negar que o exercício de tal administração exige competência do profissional nomeado, haja vista a situação delicada que passa a empresa, pois a continuação da atividade econômica dependerá, como consequência lógica, de uma administração feita com todo o cuidado necessário. Competirá ao devedor ou à massa falida arcar com as despesas relativas à remuneração do administrador judicial e da equipe multidisciplinar que eventualmente venha a ser contratada para auxiliá-lo. E o administrador judicial que não apresentar; no prazo estabelecido, suas contas ou qualquer dos relatórios será intimado pessoalmente a fazê-lo no prazo de 5 (cinco) dias, sob pena de desobediência. No caso de ser concretizada a destituição do administrador judicial, o juiz no mesmo ato deverá nomear novo profissional para ocupar o cargo. Cabe destacar ainda, que o administrador judicial responde a título de dolo ou de culpa pelos possíveis danos causados a massa falida, ao próprio devedor ou aos credores.
5. COMílt DE CREDORES Caso se entenda necessário, a assembleia geral de credores (que será estudada no próximo item), poderá votar pela constituição do comitê de credores tanto na falência quanto na recuperação judicial, que será composto por representantes de cada classe de credores do devedor submetidos ao processo. A principal finalidade da criação de
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FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
tal comitê é zelar pelo bom andamento do procedimento judicial, seja da falência ou da recuperação. Caso seja constituído o comitê será composto por: a) um representante indicado pela classe de credores trabalhistas, com dois suplentes; b) um representante indicado pela classe de credores com direitos reais de garantia ou privilégios especiais, com dois suplentes; c) um representante indicado pela classe de credores quirografários e com privilégios gerais, com dois suplentes. Se uma das classes decidir não apresentar representante para compor o Comitê em evidência, mesmo assim este poderá ser constituído e funcionar normalmente. Ressalta-se que o juiz da falência poderá, mediante requerimento assinado por credores que representem a maioria dos créditos de uma classe, independentemente da realização de assembleia, nomear o representante e suplentes dessa classe, se porventura ainda não representada no Comitê, ou substituir o seu representante ou suplentes. Após a escolha dos membros do comitê, estes serão nomeados pelo juiz da falência, que determinará a intimação pessoal dos mesmos para, em 48 (quarenta e oito) horas, assinarem, na sede do juízo, o termo de compromisso de bem e fielmente desempenhar o cargo e assumir todas as responsabilidades a ele inerentes. Os próprios membros do Conselho escolherão, entre eles, quem irá presidi-lo. As atribuições do comitê estão previstas no art. 27. Na recuperação judicial e na falência, o Comitê de Credores terá, dentre outras, as seguintes atribuições: a) fiscalizar as atividades e examinar as contas do administrador judicial; b) zelar pelo bom andamento do processo e pelo cumprimento da lei; c) comunicar ao juiz, caso detecte violação dos direitos ou prejuízo aos interesses dos credores; d) apurar e emitir parecer sobre quaisquer reclamações dos interessados;
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
e) requerer ao juiz a convocação da assembleia-geral de credores; f) manifestar-se nas hipóteses previstas na lei de falência. Especificamente na recuperação judicial, o Comitê terá, dentre outras, as seguintes atribuições: a) fiscalizar a administração das atividades do devedor; apresentando, a cada 30 (trinta) dias, relatório de sua situação; b) fiscalizar a execução do plano de recuperação judicial; c) submeter à autorização do juiz, quando ocorrer o afastamento do devedor nas hipóteses previstas na lei, a alienação de bens do ativo permanente, a constituição de ônus reais e outras garantias, bem como atos de endividamento necessários à continuação da atividade empresarial durante o período que antecede a aprovação do plano de recuperação judicial. Caso não haja Comitê, na recuperação judicial ou na falência, as atribuições deste serão exercidas pelo administrador judicial ou, na incompatibilidade deste, pelo juiz. Não será paga qualquer remuneração aos membros do Comitê pelo devedor ou pela massa falida. Daí se entendendo que estes não terão remuneração (serão voluntários não remunerados) ou que tal despesa será assumida pelos membros de cada classe no tocante ao seu respectivo representante.
6. ASSEMBLEIA GERAL DE CREDORES Diferente do órgão anterior que é de existência facultativa, o terceiro elemento do sistema de administração da falência e recuperação de empresa é de existência obrigatória e é a assembleia geral de credores, que como o próprio nome indica, é o órgão máximo de representação dos credores, possuindo funções notadamente deliberativas a respeito de qualquer matéria que possa afetar os interesses dos credores. Entre as funções da assembleia está a de eleger e constituir o comitê de credores, o que outorga ainda mais, legitimidade para o segundo órgão. O art. 35 da Lei 1i.101/05 irá tratar da competência da assembleia geral de credores. Na recuperação judicial ela deverá deliberar sobre:
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FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
a) aprovação, rejeição ou modificação o plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor; b) constituição do Comitê de Credores, escolher seus membros e sua substituição; c) pedido de desistência do devedor, nos termos do § 4° do art. 52 da lei; d) o nome do gestor judicial, quando do afastamento do devedor; e) qualquer outra matéria que possa afetar os interesses dos credores. Já na falência a assembleia irá deliberar sobre: a) a constituição do Comitê de Credores, a escolha de seus membros e sua substituição; b) a adoção de outras modalidades de realização do ativo, na forma do art. 145 da lei; c) qualquer outra matéria que possa afetar os interesses dos credores. A realização de assembleia-geral de credores poderá ser solicitada pelo administrador judicial, pelo Comitê de Credores ou pelos próprios credores representantes de no mínimo 25°k (vinte e cinco por cento) dos créditos de determinada classe, porém, caberá ao juiz a sua convocação respeitando o prazo de 15 (quinze) dias em primeira convocação e 05 (cinco) dias em segunda. Para sua instalação, necessário se faz a presença de representantes de mais da metade dos créditos de cada classe em primeira convocação e de qualquer número em segunda convocação. Como se trata de um ato solene e formal, caberá ao administrador judicial presidir o evento e nomear, entre os credores, alguém para exercer a função de secretário. Porém, caso a assembleia tenha sido convocada para deliberar sobre o afastamento do próprio administrador judicial, caberá ao credor representante do maior crédito presidir o evento. Importante observação é a divisão das classes de credores que será relevante quando da observação dos quóruns de aprovação das deliberações da assembleia. Tal divisão encontra-se no art. 41:
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
Art. 41. A assembléia-geral será composta pelas seguintes classes de credores: 1- titulares de créditos derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidentes de trabalho;
li - titulares de créditos com garantia real; Ili - titulares de créditos quirografários, com privilégio especial, com privilégio geral ou subordinados. IV - titulares de créditos enquadrados como microempresa ou empresa de pequeno porte.
A divisão das classes é muito semelhante a ordem de pagamento dos credores na falência previsto no art. 83, sendo que alguns foram unidos alguns créditos em uma única classe. Importante notar que o §1° do artigo chama a atenção que os credores trabalhistas que votarão nesta classe independente do valor do seu crédito, já que para a ordem de preferência há a limitação de 159 salários mínimos. Já o §2° estipula que os credores com garantia real votam com a segunda classe até o limite do valor do bem gravado e com terceira classe pelo restante do valor de seu crédito, seguindo a limitação da ordem de preferência. A quarta classe de credores foi criada pela Lei Complementar n° 147/2014 que tratou de direitos da micro empresa e empresa de pequeno porte e provocou importantes mudanças na Lei de Falência, principalmente no que tange ao plano especial de recuperação de micro empresas e empresas de pequeno porte.
A grande crítica que se faz ao instituto da assembleia é que ela possui funções notadamente econômicas, haja vista ter preservado o voto à proporcionalidade de representação do crédito conforme determina o art. 38. Art. 38. O voto do credor será proporcional ao valor de seu crédito, ressalvado, nas deliberações sobre o plano de recuperação judicial, o disposto no § 2° do art. 45 desta Lei.
Embora tal critério respeite a função econômica da lei, em termos democráticos pode renegar o papel do pequeno credor a de mero
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FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
expectador do processo, já que não existe limitação dos poderes do maior credor, tampouco de obrigatoriedade de participação do menor credor. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova organizada pelo CESPE para a Magistratura/Pl/2012, pedia-se para assinalar a alternativa correta que era a que afirmava: "O juízo competente convocará a assembleia geral de credores por edital publicado no órgão oficial e em jornais de grande circulação nas localidades da sede e filiais, com antecedência mínima de quinze dias."
7. RECUPERAÇÃO JUDICIAL DE EMPRESAS
7.1. Introdução Como fonte geradora de empregos, de circulação de riquezas e de crescimento econômico, a atividade empresarial que está passando por um momento de crise, terá mecanismos para buscar sua recuperação. Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a su-
peração da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica. Como já mencionado anteriormente neste estudo, poderá haver situações em que a atividade empresária está passando por dificuldades, mas que se consiga vislumbrar solução para o momento de crise. Nesse contexto é importante buscar sua preservação, pelos motivos explanados no art. 47. O mecanismo anterior que bus.cava a solução para a crise sanável, a concordata, era muito criticado, pois permitia que seu uso indevido gerasse inadimplementos baseados em atos de má-fé e insegurança para os credores. A atual lei criou então o mecanismo da recuperação de empresas que busca uma viabilidade bem maior da solução para a crise econômico financeira do empresário ou da sociedade empresária. Essa recuperação poderá ocorrer nas vias judiciais ou fora dela e o nosso estudo inicial concentra-se na judicial.
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
7.2. Requisitos para requerer a recuperação judicial
Além dos requisitos gerais para utilização da 11.101/05 já analisados, o art. 48 traz requisitos específicos para que este empresário ou sociedade empresária possa pedir a recuperação judicial. O devedor deve exercer regularmente suas atividades há mais de (dois) anos, não pode ter sido declarado falido e, se tiver sido, suas responsabilidades têm que ter sido extintas. Não poderá ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de recuperação judicial. Até 2014 o terceiro requisito era não ter obtido recuperação com base em plano especial de microempresa e empresa de pequeno porte há menos de 8 anos, porém, a Lei Complementar 147 de 2014 alterou o inciso Ili do art. 48 igualando o prazo com a concessão de recuperação comum. Hoje, portanto, o requerente desse procedimento não pode ter obtido outra recuperação com base em plano especial a menos de 5 anos. O quarto requisito é não ter como administrador ou sócio controlador, pessoa condenada por qualquer dos crimes falimentares. Esses requisitos são cumulativos, assim só pode pedir a recuperação quem atender a todos eles. 2
Tais requisitos específicos estão previstos no art. 48 da Lei 11.101/05.
o parágrafo único desse mesmo dispositivo legitima ainda para requerer a recuperação o "cônjuge sobrevivente, herdeiros do devedor, inventariante ou sócio remanescente." ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova da Magistratura/MG/2012, de organização da EJEF, o enunciado da questão dizia que Né correto afirmar que pode requerer recuperação judicial o devedor que". E a alternativa correta era: Nnão tenha, há menos de cinco anos, obtido concessão de recuperação judicial."
7.3. Pedido inicial da recuperação judicial O processo de recuperação judicial se divide em 3 fases:
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FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
A fase postulatória compreende, via de regra, dois atos apenas: a petição inicial (instruída com os documentos previstos em lei) e o despacho do juiz mandando processar a recuperação. O processo da recuperação judicial pode ser iniciado de duas formas: a) Através de um pedido feito por qualquer dos legitimados descritos no item anterior, através de petição inicial, sendo que junto a essa o requerente vai ter que juntar todos os documentos requeridos no art. 51 da Lei de Falência. É uma lista grande de documentos que tenta evitar que a recuperação seja requerida sem o devido fundamento e sirva apenas para "enrolar" os credores. b) Dentro de um pedido de falência. Caso o empresário ou a sociedade empresária tenham sua falência requerida poderão, no prazo de contestação requerer a conversão da falência em recuperação. Art. 95. Dentro do prazo de contestação, o devedor poderá
pleitear sua recuperação judicial. Observemos que para o devedor é uma faculdade pedir a recuperação, pois se não entender que tenha essa condição poderá contestar o pedido de falência ou com ele concordar. Importante ressaltar que o entendimento que vem prevalecendo nesse caso é que o juiz estará vinculado a autorizar o processamento da recuperação. Independente de como tenha sido feito o pedido de recuperação, seja por petição inicial, seja no prazo da contestação da falência, o juiz terá que se pronunciar para conceder ou não o processamento da recuperação. Se o despacho for pelo prosseguimento, começará a correr o prazo para a apresentação do plano de recuperação. 7.4. Plano de recuperação judicial Parte mais importante da recuperação é o plano de recuperação que tem que ser apresentado no prazo de 60 dias da decisão que deferir o processamento da recuperação e vai conter a demonstração de como a empresa pretende ser recuperada.
239
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
Como será mais bem analisado
à frente,
esse prazo da apresenta-
ção do plano deve ser observado atentamente, pois se não for apresentado o plano, a recuperação será convolada em falência. O plano deverá passar pelo crivo da Assembleia de credores e será aprovado quando obtiver o quórum deliberativo qualificado. Quando não atingir esse quórum, mas algo próximo a ele, o plano pode ser adotado. No primeiro caso, o plano aprovado pelos credores
é sim-
plesmente homologado pelo juiz. Já no segundo caso o juiz irá decidir se o plano será aprovado ou não. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
O STJ, através do informativo 498/2012 explanou o seguinte entendimento: "Plano de recuperação judicial. Aprovação pela AGC. Controle judicial. A assembleia geral de credores (AGC) é soberana em suas decisões quanto ao conteúdo do plano de recuperação judicial. Contudo, as suas deliberações - como qualquer outro ato de manifestação de vontade - estão submetidas ao controle judicial quanto aos requisitos legais de validade dos atos jurídicos em geral. Rfsp 1.314.209, rei. Min. Nancy Andrighi, j. 22.5.12. 3" T. (lnfo 498, 2012)"
~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na fase dissertativa da prova da Magistratura Estadual G0/2012, organizada pelo TJ/DF, a pergunta tratava exatamente do entendimento jurisprudencial mencionado acima. A questão era a seguinte: "A assembleia-geral de Credores é soberana em suas decisões quanto aos planos de recuperação. Tais deliberações estão sujeitas ao controle judicial?" A concessão da recuperação judicial obriga todos os credores anteriores ao pedido, mesmo os que não tenham aprovado o plano. 7.4.1. Créditos sujeitos
à
recuperação
De acordo com o art. 49 da Lei, estão sujeitos à recuperação todos os créditos existentes na data do pedido, inclusive os vincendos. Apesar dessa afirmativa do caput do dispositivo, a regra não é assim tão severa, pois os parágrafos vão trazer exceções que se podem numerar: créditos nos quais o credor tenha posição de fiduciário, seja de bens móveis ou imóveis; créditos decorrentes de arrendamento
240
FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
mercantil; créditos no qual o credor seja promitente vendedor em cujo contrato contenha cláusula de irrevogabilidade; créditos decorrentes de venda com reserva de domínio; créditos decorrente de adiantamento de contrato de câmbio e créditos fiscais. • Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame da Magistratura Federal/2• Região/2011, foi considerada correta a alternativa que afirmava: NDe acordo com essa lei, os débitos tributários não estão sujeitos à recuperação judicial, ou seja, independentemente do que frear estabelecido no plano de recuperação, os tributos devidos pelo empresário devem sempre ser quitados de acordo com as normas tributárias, cabendo ao devedor apresentar as certidões negativas de débito tributário." ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
o informativo 518/2013 do STJ trouxe um julgado que trata exatamente de uma situação em que o crédito não poderá estar abrangido no plano, por não estar sujeito à recuperação judicial: DIREITO EMPRESARIAL. NÃO SUJEIÇÃO DO CRÉDITO GARANTIDO POR CESSÃO FIDUCIÁRIA DE DIREITO CREDITÓRIO AO PROCESSO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL.
o crédito garantido por cessão fiduciária de direito creditório não se sujei· ta aos efeitos da recuperação judicial, nos termos do art. 49, § 3°, da Lei n. 11.101/2005. Conforme o referido dispositivo legal. os créditos decorrentes da propriedade fiduciária de bens móveis e imóveis não se submetem aos efeitos da recuperação judicial. A cessão fiduciária de títulos de crédito é definida como "o negócio jurídico em que uma das partes (cedente fiduciante) cede à outra (cessionária fiduciária) seus direitos de crédito perante terceiros em garantia do cumprimento de obrigações". Apesar de, inicialmente, o CC/2002 ter restringido a possibilidade de constituição de propriedade fiduciária aos bens móveis infungíveis, a Lei n. 10.931/2004 contemplou a possibilidade de alienação fiduciária de coisa fungível e de cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis ou de títulos de crédito, hipóteses em que, salvo disposição contrária, é atribuída ao credor a posse direta e indireta do bem objeto da propriedade fiduciária ou do título representativo do direito ou do crédito. Além disso, a Lei n. 10.931/2004 incluiu o art. i.368-A ao CC/2002, com a seguinte redação: "as demais espécies de propriedade fiduciária ou de titularidade fiduciária submetem-se à disciplina específica das respectivas leis especiais, somente se aplicando as disposições deste Código naquilo que não for incompatível com a legislação especial". Desse modo, pode-se concluir que a propriedade fiduciária contempla a alienação fiduciária de bens móveis, infungíveis (arts. 1.361 a 1.368-A do CC) e fungíveis (art. 66-B da Lei n. 4.728/1965), além
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
da cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis ou de títulos de crédito. Assim, o crédito garantido por cessão fiduciária de direito creditório, espécie do gênero propriedade fiduciária, não se submete aos efeitos da recuperação judicial. Como consequência, os direitos do proprietário fiduciário não podem ser suspensos na hipótese de recuperação judicial, já que a posse direta e indireta do bem e a conservação da garantia são direitos assegurados ao credor fiduciário pela lei e pelo contrato. REsp 1.202.918-SP. Rei. Min. Villas Bôas Cueva, julgado em 7/3/2013_
7.4.2. Meios de recuperação A parte fundamental do plano de recuperação é o requerente provar que tem meios para sair do momento de crise econômico-financeira. O art. 50 trará exemplos de quais são esses meios que o empresário ou a sociedade poderão utilizar-se para que possam sanar seus problemas. Art. 50. Constituem meios de recuperação judicial, observada a legislação pertinente a cada caso, dentre outros: 1- concessão de prazos e condições especiais para pagamento das obrigações vencidas ou vincendas; li - cisão, incorporação, fusão ou transformação de sociedade, constituição de subsidiária integral, ou cessão de cotas ou ações, respeitados os direitos dos sócios, nos termos da legislação vigente; Ili - alteração do controle societário;
IV - substituição total ou parcial dos administradores do devedor ou modificação de seus órgãos administrativos; V - concessão aos credores de direito de eleição em separado de administradores e de poder de veto em relação às matérias que o plano especificar; VI - aumento de capital social; VII - trespasse ou arrendamento de estabelecimento, inclusive à sociedade constituída pelos próprios empregados; VIII - redução salarial, compensação de horários e redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva;
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IX - dação em pagamento ou novação de dívidas do passivo, com ou sem constituição de garantia própria ou de terceiro; X - constituição de sociedade de credores; XI - venda parcial dos bens; XII - equalização de encargos financeiros relativos a débitos de qualquer natureza, tendo como termo inicial a data da distri· buição do pedido de recuperação judicial, aplicando-se inclusi· ve aos contratos de crédito rural, sem prejuízo do disposto em legislação específica; XIII - usufruto da empresa; XIV - administração compartilhada; XV - emissão de valores mobiliários; XVI - constituição de sociedade de propósito específico para adjudicar, em pagamento dos créditos, os ativos do devedor. Como se pode observar os meios criados pela lei vão de modificações meramente administrativas até a venda ou usufruto do patrimô· nio da empresa. Por se tratar de um rol exemplificativo, outros meios poderão ser buscados pelo devedor, desde que não contrariem nenhum outro di· reito dos envolvidos nos créditos. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No concurso da Magistratura/ES/2011, organizada pelo CESPE, foi pedido para assinalar a alternativa correta que era a que dizia "Prevê a legislação que a dilação do prazo ou a revisão das condições de pagamento são meios de recuperação da atividade econômica." Questão de extrema relevância diz respeito
à hipótese de se optar
por algum tipo de venda do estabelecimento empresarial. Como já foi abordado neste estudo, no item i.3 do Capítulo 2, caso o estabe· lecimento empresarial seja alienado, será feito por um contrato de trespasse que é devidamente regulamentado pelo Código Civil. E a le· gislação Civil preconiza que haverá assunção de dívidas por parte do adquirente do estabelecimento, no que tange aos débitos devidamente contabilizados.
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Aqui na recuperação, entretanto, temos um dispositivo especifico a tratar dessa situação que é o art. 6o e seu parágrafo único da Lei 11.101/05. A regra disposta é que se o plano de recuperação judicial aprovado envolver alienação judicial de filiais ou de unidades produtivas isoladas do devedor, o juiz ordenará a sua realização, observado o disposto no art. 142 e que o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária, observado o disposto no § 1° do art. 141. Logo após a aprovação da atual lei, o PDT entrou com Ação Direita de Inconstitucionalidade, ADI 3934, não apenas contra esse dispositivo, mas contra os art. 83, 1e IV, c, e 141, li. Todos os dispositivos, porém, foram considerados constitucionais pelo STF. "Considerou-se que a Constituição Federal não abrigaria nenhuma regra expressa sobre o eventual direito de cobrança de créditos trabalhistas em face daquele que adquire ativos de empresa em processo de recuperação judicial ou cuja falência tenha sido decretada. Além disso, não haveria ofensa direta a quaisquer valores implícita ou explicitamente protegidos pela Constituição Federal, podendo ocorrer, no máximo, uma colisão entre diferentes princípios constitucionais, sendo que, ainda assim, não se poderia falar em declaração de invalidade de um deles ou de instituição de uma cláusula de exceção, já que o legislador ordinário teria apenas estabelecido relações de precedência condicionada. Registrou-se que, no caso, o papel do legislador infraconstitucional teria se restringido a escolher dentre os distintos valores e princípios constitucionais, igualmente aplicáveis à espécie, aqueles que reputara mais idôneos para disciplinar a recuperação judicial e a falência das empresas, de forma a garantir-lhes a maior expansão possível, tendo em conta o contexto tático e jurídico com o que se defrontara. No ponto, observou-se que a Lei 11.101/2005 resultou de amplo debate com os setores socais diretamente afetados por ela, tendo surgido, também, da necessidade de se preservar o sistema produtivo nacional inserido em uma ordem econômica mundial caracterizada pela concorrência predatória entre seus principais agentes e pela eclosão de crises globais cíclicas altamente desagregadoras. Oestarte, nesse contexto, o legislador teria optado por estabelecer que adquirentes de
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empresas alienadas judicialmente não assumiriam os débitos trabalhistas, por sucessão, porquanto isso não ensejaria prejuízo aos trabalhadores, já que a exclusão da sucessão tornaria mais interessante a compra da empresa e tenderia a estimular maiores ofertas pelos interessados na aquisição, o que aumentaria a garantia dos trabalhadores, em razão de o valor pago ficar à disposição do juízo da falência e ser utilizado para pagar prioritariamente os créditos trabalhistas. Além do mais, a venda em bloco da empresa possibilitaria a continuação da atividade empresarial, preservando empregos. (ADI 3934/DF, rei. Min. Ricardo Lewandowski, 27.5.2009).
Para não haver dúvidas sobre esse entendimento, houve enunciado na 1Jornada de Direito Comercial contemplando o assunto: • Enunciado n° 47: Nas alienações realizadas nos termos do art. 6o da Lei n. li.101/2005, não há sucessão do adquirente nas dívidas do devedor, inclusive nas de natureza tributária, trabalhista e decorrentes de acidentes de trabalho. 7.4.3. Plano especial das Microempresas No afã de facilitar a recuperação das microempresas, bem como as empresas de pequeno porte que se encontrem em crise, a Lei de Falência estabeleceu um plano especial de recuperação. Observemos que não é um processo diferenciado para as empresas de porte modesto, apenas faculta-lhes apresentar um plano de recuperação especial. Somente podem apresentar o plano especial os empresários que estejam enquadrados como microempresa ou empresa de pequeno porte. A Lei Complementar 147 de 2014 trouxe importantes alterações para a recuperação realizada com base no planos especial, desde as condições como o cumprimento do plano. O artigo 71 da lei dita as condições essenciais que o plano especial irá observar, quais sejam: Até 2014 o plano de recuperação somente poderia abranger os créditos quirografários, excetuados os decorrentes de repasse de recursos oficiais e os previstos nos§§ 3° e 4° do art. 49 (leasing. alienação, negócio fiduciário etc.). Após a citada Lei Complementar o inciso 1do 245
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art. 71 passou a prever que o plano abrangerá: "abrangerá todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos, excetuados os decorrentes de repasse de recursos oficiais, os fiscais e os previstos nos §§ 3º e 4º do art. 49." Como se pode observar, as exceções continuam as mesmas, mas agora não apenas os créditos quirografários podem ser abrangidos, mas créditos de qualquer natureza. Essa limitação aos créditos quirografários gerava uma situação prejudicial às microempresas e empresas de pequeno porte e fugia a ideia do plano especial que era facilitar a recuperação de atividades desse porte. A alteração legislativa corrigiu o erro. Como se pode observar, as exceções continuam as mesmas, mas agora não apenas os créditos quirografários podem ser abrangidos, mas créditos de qualquer natureza. Essa limitação aos créditos quirografários gerava uma situação prejudicial às micro empresas e empresas de pequeno porte e fugia a ideia do plano especial que era facilitar a recuperação de atividades desse porte. A alteração legislativa corrigiu o erro. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame organizado pelo CESPE da Magistratura Federal/ia Região/2011, a questão pedia para assinalar a alternativa correta no que diz respeito à recuperação especial das microempresas e empresas de pequeno porte. A alternativa a ser marcada era a que afirmava: "O devedor empresário pode requerer a recuperação especial apenas em face dos credores quirografários, excluindo-se os decorrentes do repasse de verbas oficiais e os credores titulares da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil." A lei irá prever ainda parcelamento em até 36 (trinta e seis) parcelas mensais, iguais e sucessivas, e essa quantidade de parcelas permanece a mesma, sendo que antes elas deviam ser corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de i2°k a.a. (doze por cento ao ano). O inciso li do art. 72, após a modificação da já citada Lei Complementar, passou a prever que as parcelas serão "acrescidas de juros equivalentes à taxa Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - SELIC."
A parte final do citado inciso ainda passou a prever que o plano poderá conter proposta de abatimento do valor da dívida, o que não era expressamente permitido antes da alteração legislativa.
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Também preverá o pagamento da primeira parcela no prazo máximo de i8o (cento e oitenta) dias, contado da distribuição do pedido de recuperação judicial. Irá estabelecer a necessidade de autorização do juiz, após ouvido o administrador judicial e o Comitê de Credores, para o devedor aumentar despesas ou contratar empregados. Um detalhe é que se a recuperação for requerida com base em plano especial não acarreta suspensão do prazo prescricional como nos outros casos de recuperação ou no caso da falência. O plano especial deverá ser aprovado pelo juiz, que seguirá critério objetivos e não ficará sujeito à decisão da Assembiea Geral de Credores. 7.5. Deliberação sobre o plano de recuperação Apresentado o plano de recuperação, teremos o momento de discussão sobre sua aprovação ou não. Determina o art. 55 que dentro do prazo de 30 dias após a publicação do edital do rol de credores feita pelo administrador judicial (art. 7°, §2°), qualquer credor poderá apresentar oposição ao plano re recuperação. Para garantir que todos os credores tomem conhecimento da apresentação do plano, temos a regra do parágrafo único do art. 53: Parágrafo único. o juiz ordenará a publicação de edital conten· do aviso aos credores sobre o recebimento do plano de recuperação e fixando o prazo para a manifestação de eventuais objeções, observado o art. 55 desta Lei.
Caso haja alguma objeção o juiz irá convocar a assembleia-geral de credores e aí surgem diferentes caminhos, de acordo com o que for votado. A aprovação ocorrerá se atender ao previsto no art. 45, vejamos: Art. 45. Nas deliberações sobre o plano de recuperação judicial, todas as classes de credores referidas no art. 41 desta Lei deverão aprovar a proposta.
§ lº Em cada uma das classes referidas nos incisos li e Ili do art. 41 desta Lei, a proposta deverá ser aprovada por credores que representem mais da metade do valor total dos créditos
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presentes à assembléia e, cumulativamente, pela maioria simples dos credores presentes. § 2° Nas classes previstas nos incisos 1 e IV do art. 41 desta
Lei, a proposta deverá ser aprovada pela maioria simples dos credores presentes, independentemente do valor de seu crédito. § 3° O credor não terá direito a voto e não será considerado
para fins de verificação de quorum de deliberação se o plano de recuperação judicial não alterar o valor ou as condições originais de pagamento de seu crédito. Como se observa, a regra do quórum de aprovação do plano de recuperação é especifica e até excepciona a previsão do art. 38. Inicialmente é preciso observar que a aprovação será obervada separadamente em cada classe. Para a primeira classe, que é a de credores de verbas trabalhistas e decorrentes de acidente de trabalho, o voto será contado per capita e se a maioria dos credores presentes estiver de acordo, haverá aprovação. O mesmo acontece para os credores enquadrados corno microempresa ou empresa de pequeno porte. Já no caso dos credores com garantia real; quirografários, com privilégio especial, com privilégio geral ou subordinados, são dois quoruns que devem ser observados cumulativamente: ter a maioria dos presentes no que tange ao valor do crédito, bem como a maioria dos presentes no critério per capita. Observado cada uma das classes separadamente e atingindo o requisito necessário o plano está aprovado, cabendo o juiz apenas homologar. Ele não pode rejeitar plano devidamente aprovado em assembleia. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Vários julgados confirmam que a decisão do juiz neste caso deve seguir a assembleia como demonstra o REsp 1359311/SP de 30/092014: "DIREITO EMPRESARIAL. PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL. APROVAÇÃO EM ASSEMBLEIA. CONTROLE DE LEGALIDADE. VIABILIDADE ECONÔMICO-FINANCEIRA. CONTROLE JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE. 1. cumpridas as exigências legais, o juiz deve conceder a recuperação judicial do devedor cujo plano tenha sido aprovado em assembleia (art. 58, caput, da Lei n. 11.101/2005), não lhe sendo dado se imiscuir no aspecto da viabilidade econômica da empresa, uma vez que tal questão é de exclusiva apreciação assemblear.
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2. Omagistrado deve eKercer o controle de legalidade do plano de recuperação - no que se insere o repúdio à fraude e ao abuso de direito-. mas não o controle de sua viabilidade econõmica. Nesse sentldo, Enunciados n. 44 e 46 da 1Jornada de Direito Comercial QF/Sl]. 3. Recurso especial não provido.~
Os enunciados a que o acórdão faz referência são: Enunciado n° 44: A homologação de plano de recuperação judicial aprovado pelos credores está sujeita ao controle judicial de legalidade. Enunciado n° 46: Não compete ao juiz deiKar de conceder a recuperação judicial ou de homologar a extrajudicial com fundamento na análise econômico-financeira do plano de recuperação aprovado pelos credores.
Visando atender o objetivo principal da recuperação, previsto no art. 47, que é a preservação da atividade empresária em virtude da sua função social, o §1° do art. 58 previu possibilidade de o juiz homologar o plano mesmo sem terem sido atingidos os quóruns do art. 45 analisados acima. Para isso terão que ser observados critério cumulativos:
o juiz poderá conceder a recuperação judicial com base em plano que não obteve aprovação na forma do art. 45 desta Lei, desde que, na mesma assembléia, tenha obtido, de forma cumulativa:
§ iº
1- o voto favorável de credores que representem mais da me· tade do valor de todos os créditos presentes à assembléia, independentemente de classes; li - a aprovação de 2 (duas) das classes de credores nos termos do art. 45 desta Lei ou, caso haja somente 2 (duas) classes com credores votantes, a aprovação de pelo menos l (uma) delas; Ili - na classe que o houver rejeitado, o voto favorável de mais de i/3 (um terço) dos credores, computados na forma dos §§ i º e 2° do art. 45 desta Lei.
Agora o legislador falou em " poderá conceder" não havendo mais a obrigatoriedade de quando o plano passou pelos quóruns de cada classe. Nesse caso o juiz poderá analisar a conveniência e a real possibilidade de êxito da recuperação. E somente concedê-la se entender que há viabilidade do plano.
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O §2° do mesmo art. 58 observa que "a recuperação judicial somente poderá ser concedida com base no§ lº deste artigo se o plano não implicar tratamento diferenciado entre os credores da classe que o houver rejeitado." Tem-se, então, na verdade, quatro requisitos cumulativos para que o juiz aprove o plano nesta situação. Da decisão que concede a recuperação, caberá agravo que poderá ser proposto inclusive pelo Ministério Publico (art. 59, §2º). Se o plano for rejeitado pela assembleia e não atender à possibilidade de aceitação do juiz reto mencionada, será decretada a falência do devedor. Com a aprovação do plano o art. 57 da Lei de Falência impõe uma condição para que o processo siga seu curso exigindo que "o devedor apresentará certidões negativas de débitos tributários nos termos dos arts. 151, 205, 206 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional." Há muito que a doutrina e jurisprudência entendem ser esta uma exigência demasiadamente rigorosa que vai de encontro ao objetivo da recuperação. Ora, se há uma crise econômico-financeira, muitas são as chances de existirem débitos tributários, pois dificilmente o devedor dará preferência a esses pagamentos do que a outros de natureza diversa. Demonstrando esse entendimento, também foi aprovado enunciado na 1 Jornada de Direito Comercial: Enunciado n° 55: O parcelamento do crédito tributário na cuperação judicial é um direito do contribuinte, e não uma culdade da Fazenda Pública, e, enquanto não for editada específica, não é cabível a aplicação do disposto no art. 57 Lei n. 11.101/2005 e no art.191-A do CTN.
refalei da
• Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No concurso para Magistratura Estadual/MG/2014, de responsabilidade do TJ/MG, foram apresentadas afirmativas para analisar quais estavam corretas e quais não. Entre as corretas tínhamos a seguinte: "De acordo com a jurisprudência dominante, "o parcelamento do crédito tributário na recuperação judicial é um direito do contribuinte, e não uma faculdade da Fazenda Pública". Por isso, enquanto não for editada lei específica, não se faz necessária para a concessão da recuperação judicial do devedor, cujo plano tenha sido aprovado pela assembleia-geral dos credores, a juntada das certidões negativas de débitos tributários."
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7.6. Execução da recuperação Aprovado o plano de recuperação judicial, passar-se-á a fase do seu cumprimento. Durante a fase de execução da recuperação judicial, a devedora deve apresentar-se em todos os seus atos com a denominação acrescida da expressão "em recuperação judicial". Em princípio ela continuará sob a direção de seus administradores anteriores, não sendo assim apenas se o pleno previa a reestruturação da administração ou se estes incorrerem em conduta indevida. Art. 64. Durante o procedimento de recuperação judicial, o devedor ou seus administradores serão mantidos na condução da atividade empresarial, sob fiscalização do Comitê, se houver, e do administrador judicial, salvo se qualquer deles: 1- houver sido condenado em sentença penal transitada em julgado por crime cometido em recuperação judicial ou falência anteriores ou por crime contra o patrimônio, a economia popular ou a ordem econômica previstos na legislação vigente; li - houver indícios veementes de ter cometido crime previsto
nesta Lei; Ili - houver agido com dolo, simulação ou fraude contra os inte· resses de seus credores; IV - houver praticado qualquer das seguintes condutas: A) efetuar gastos pessoais manifestamente excessivos em relação a sua situação patrimonial; B) efetuar despesas injustificáveis por sua natureza ou vulto, em relação ao capital ou gênero do negócio, ao movimento das operações e a outras circunstâncias análogas; C) descapitalizar injustificadamente a empresa ou realizar operações prejudiciais ao seu funcionamento regular; D) simular ou omitir créditos ao apresentar a relação de que trata o inciso Ili do caput do art. 51 desta Lei, sem relevante razão de direito ou amparo de decisão judicial; V - negar-se a prestar informações solicitadas pelo administrador judicial ou pelos demais membros do Comitê; VI - tiver seu afastamento previsto no plano de recuperação judicial.
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O administrador judicial nessa fase também terá um importante papel fiscalizador do cumprimento do plano e informará ao juiz caso esteja havendo algum desvirtuamento do que foi planejado. 7.7. Convolação da recuperação em falência A recuperação judicial, principalmente nos casos em que o devedor descumpre o plano, poderá ser transformada em falência nos casos previstos no art.
n
Art. n o juiz decretará a falência durante o processo de recuperação judicial: 1 - por deliberação da assembléia-geral de credores, na forma do art. 42 desta Lei;
li - pela não apresentação, pelo devedor, do plano de recuperação no prazo do art. 53 desta Lei; Ili - quando houver sido rejeitado o plano de recuperação, nos termos do § 4º do art. 56 desta Lei;
IV - por descumprimento de qualquer obrigação assumida no plano de recuperação, na forma do § lº do art. 61 desta Lei. Convolar significa que a recuperação será transformada diretamente na decretação da falência. Como se verá mais adiante, se a falência seguir seu procedimento normal, haverá a fase de contestação do pedido em que o devedor poderá comprovar que não se encontra em situação de falência, mas aqui já é decretada a falência, sem mais qualquer tipo de contestação. O legislador foi rigoroso com essas situações para evitar que a recuperação seja usada apenas para retardar o adimplemento das obrigações. Se não houvesse uma sanção grave, que é a decretação da falência, a recuperação poderia ser usada de maneira irresponsável e causaria prejuízo aos credores, se desvirtuando do seu objetivo. ~ Como esse assunto foi cobrado em concurso? Na prova para o Ministério Público/PB/2010, todas as afirmativas apresentadas sobre a convolação da recuperação em falência eram verdadeiras e eram as seguintes: NI - Na fase postulatória, o juiz decretará a falência do devedor. por deliberação da assembléia geral de credores.
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li - Na fase postulatóría, o juiz decretará a falência se o devedor não apre-
sentar o plano de recuperação no prazo legal. Ili - Ojuiz decretará a falência durante o processo de recuperação judicial,
quando houver rejeição do plano de recuperação judicial, nos termos previstos em lei. IV - Na fase executória, o juiz decretará a falência, quando houver descumprimento de qualquer obrigação assumida no plano de recuperação." 7.8. Encerramento da recuperação Caso o plano seja cumprido corretamente, o juiz decretará por sentença o encerramento ela recuperação judicial. Se todas as obrigações forem cumpridas corretamente, significa que o plano de recuperação foi eficaz e que a atividade empresária está apta a voltar à sua normalidade. A recuperação foi, então, bem sucedida. Quadro da evolução do procedimento da recuperação judicial: PEDIDO DA RECUPERAÇÃO
1
_[ Deferimento do pedido
L Indeferimento do pedido
1 Apresentado o plano
Não apresentado o plano
1
1
Plano aprovado
Encerramento do processo
Plano rejeitado
Convolação em falência
1
Plano cumprido
Plano descumprido
j Encerramento da recuperação
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8. RECUPERAÇÃO EXTRAJUDICIAL
Se o empresário ou a sociedade empresária em crise procura seus credores (ou parte deles) e os consegue convencer de que a renegociação de suas obrigações é indispensável para a superação do estado crítico, o acordo de vontades é suficiente para realizar-se o desiderato. Art. 161. Odevedor que preencher os requisitos do art. 48 desta Lei poderá propor e negociar com credores plano de recuperação extrajudicial.
Observemos que para se valer da recuperação extrajudicial o devedor também terá que observar requisitos, ou seja, não são todos os devedores, os praticantes de atividade empresária que poderão se valer desse meio de solução de crise. Assim como na recuperação judicial, na extrajudicial também será feito um plano de recuperação. Tal plano poderá ser levado a homologação judicial, mas é facultativo. Se o plano não tiver a aprovação de iooºk de credores, mas tiver aprovação de 3/5 dos credores, deverá ser levado à homologação, para vincular todos os credores. Art. 162. O devedor poderá requerer a homologação em juízo do plano de recuperação extrajudicial, juntando sua justificativa e o documento que contenha seus termos e condições, com as assinaturas dos credores que a ele aderiram. Art. 163. o devedor poderá, também, requerer a homologação de plano de recuperação extrajudicial que obriga a todos os credores por ele abrangidos, desde que assinado por credores que representem mais de 3/5 (três quintos) de todos os créditos de cada espécie por ele abrangidos.
A recuperação extrajudicial, como pode ser percebido, é uma tentativa do devedor em resolver seus problemas com os credores sem que haja grande necessidade da intervenção judicial.
o empresário individual ou a sociedade empresária que propõe dilatar o prazo de pagamento de suas dívidas e pede remissão de seu débito pode ter sua falência declarada e isso não ocorrerá mais com a nova legislação já que os credores serão chamados extrajudicialmente para negociar seus créditos com o devedor. 254
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Na prática o processo de recuperação extrajudicial representa a primeira tentativa de solução amigável das dívidas do empresário, sendo que de acordo como art. 162 supra, não será necessário que todos os credores concordem com a negociação e se não for o caso do art. 163 o plano vinculará somente os que a ele aderirem. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No prova para Notário/TJAP/2011, de responsabilidade da FCC, o enunciado pedia para marcar a alternativa correta no que diz respeito à recuperação extrajudicial e a resposta era a que afinnava "O plano pode abranger somente os credores signatários, hipótese em que pode tratá-los de modo heterogêneo."
As ações e execuções contra o devedor não são suspensas no caso de pedido de recuperação extrajudicial, somente são suspensas, de forma geral, por ocasião do deferimento do processamento da recuperação judicial e da decretação da falência. As execuções de natureza fiscal e a cobrança dos adiantamentos de contrato de câmbio não são suspensas pelo deferimento da recuperação judicial. No procedimento especial, as ações e execuções por créditos não abrangidos pelo plano não são suspensas. Não estão obrigados a participar do processo de recuperação extrajudicial os créditos derivados da legislação do trabalho, acidentes de trabalho e de natureza tributária, o crédito decorrente de adiantamento de contrato de câmbio destinado à exportação, o credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio, pois não terão seu crédito submetido aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação respectiva, não se permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão das ações e execuções, a venda ou retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial. Importante lembrar que não é qualquer devedor que poderá buscar a recuperação extrajudicial. E quando buscar a homologação do
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seu plano haverá restrições para tal. O § 3º do art. 161 preconiza que não poderá pedir homologação do plano de recuperação extrajudicial o devedor "se estiver pendente pedido de recuperação judicial ou se houver obtido recuperação judicial ou homologação de outro plano de recuperação extrajudicial há menos de 2 (dois) anos." Evita-se assim o uso abusivo da recuperação. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova da Magistratura do Trabalho/23• Região, organizada por banca própria, o enunciado pedia para marcar a alternativa correta no que diz respeito à recuperação judicial e a assertiva correta era a que dizia: "o devedor não poderá requerer a homologação de plano extrajudicial, se estiver pendente pedido de recuperação judicial ou se houver obtido recuperação judicial ou homologação de outro plano de recuperação extrajudicial há menos de 2 (dois) anos."
9. FALÊNCIA 9.i. Introdução O conceito de falência abrange dois sentidos. o primeiro seria o econômico, que representa um estado patrimonial de insolvência, ou seja, quando um empresário ou sociedade empresária possua mais passivo do que ativo. o segundo conceito é o jurídico que representa um processo de execução coletiva contra o devedor insolvente. É desse segundo conceito que trata a Lei 11.101/05, ou seja, para ser legitimado passivo em um processo de falência, não necessariamente o empresário, a sociedade empresária ou a EIRELI estarão em estado de insolvência, com passivo maior que ativo. Bastará que fique configurado o estado de falência.
As principais finalidades do processo de falência são as seguintes: a realização do concurso de credores, ou seja, fazer com que todos os credores fiquem em uma situação igual, de forma a que todos sejam satisfeitos proporcionalmente aos seus créditos; sanear o meio empresarial, já que uma sociedade falida é causa de prejuízos aos credores do meio social, sendo prejudicial às relações negociais e à circulação das riquezas; e, por fim, tem o objetivo de proteger não somente o crédito individual de cada credor do devedor, mas o crédito público, e assim, auxiliar e possibilitar o desenvolvimento e a proteção da economia nacional.
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~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame para Advogado da GEAGESP/2010, sob organização da VUNESP, o enunciado tratava do conceito de falência e dizia que: "a falência corresponde ao concurso universal dos credores de empresário ou sociedade empresária.n A falência é dividida em três etapas. A primeira, que será aqui chamada de fase pré-falimentar é uma fase investigatória, em que o juiz irá analisar se de fato há estado de falência. A segunda só ocorrerá se tal estado ficar configurado e será a etapa em que ocorrerá propriamente o concurso de credores. Aqui nós chamaremos de fase falimentar. t nessa etapa que se terá a preocupação com os objetivos primordiais da falência, que é fazer os pagamentos dos credores, de acordo com a relevância do seu crédito. Por fim, ocorrerá a fase pós-falimentar que é uma etapa meramente processual em que serão observados os efeitos finais do processamento da falência. Vamos então passar ao estudo dessas etapas. 9.2. Processamento da falência 9.2.i. Fase pré-falimentar Nessa primeira fase será feita a análise se de fato o legitimado passivo é passível de falência. Poderá ser um procedimento contencioso ou voluntário, dependendo de corno ele se inicia. 9.2.1.1.
Legitimados ativos
O início do procedimento da falência poderá se dar de forma voluntária ou de forma contenciosa, dependendo de quem faz o requerimento inicial do processo. Podem requerer a falência, além dos credores, a própria sociedade devedora (autofalência) e seus sócios. Art. 97. Podem requerer a falência do devedor: 1- o próprio devedor, na forma do disposto nos arts. 105 a 107
desta Lei; 257
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li - o cônjuge sobrevivente, qualquer herdeiro do devedor ou o inventariante; Ili - o cotista ou o acionista do devedor na forma da lei ou do ato constitutivo da sociedade; IV - qualquer credor.
Tal dispositivo é taxativo, ou seja, somente os que aqui estão citados poderão propor o pedido de falência. 9.2.1.2. Atos de falência
Para que os legitimados ativos possam requerer a falência de algum devedor, eles terão que basear o seu pedido, demonstrando o estado de falência do requerido e a Lei de Falências, no art. 94, busca especificar quais são os fatos que demonstrarão tal estado. Os dois primeiros incisos vão tratar de situações pontuais em que o ato do devedor significa que ele não está conseguindo cumprir com suas obrigações. O inciso 1afirma que será decretada a falência do devedor que: "I - sem relevante razão de direito, não paga, no vencimento,
obrigação líquida materializada em título, ou títulos executivos prestados, cuja soma ultrapasse o equivalente a 40 (quarenta) salários mínimos na data do pedido de falência." Perceba que o dispositivo em comento diz que a obrigação deve ser líquida, esta entendida como a representada por título executivo, judicial ou extrajudicial, protestado. Protesto esse que é realizado em cartório de protestos de títulos e documentos. Além disso, o montante da dívida de um único título ou de títulos somados deve superar 40 salários mínimos. Preceitua ainda o § 2° do art. 94 que poderão pleitear a falência do devedor; diversos credores que sozinhos não atingirem o mínimo legal exigido, mas que juntos ultrapassem esse valor, desde que atuem em litisconsórcio. Importante ressaltar que a impontualidade há de ser injustificada, pois se tiver razão que justifique o inadimplemento não caracterizará insolvência e, por conseguinte, não importará falência. Se o título foi protestado, mas há uma ação contestando o protesto, por exemplo, poderá também ser contestada a falência.
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O protesto do título é fundamental para que ele possa ser hábil de requerer a falência, sendo que deve ser observada a correta regularidade desse protesto. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
o tribunal vem entendendo que o protesto deve ser totalmente regular, sendo que tem que ser possível identificar quem recebeu a notificação deste. O assunto foi inclusive sumulado. "Súmula 361 - A notificação do protesto, para requerimento de falência da empresa devedora, exige a identificação da pessoa que a recebeu." A própria lei, em seu art. 96, elenca os casos em que a falência não será requerida com base na impontualidade, são eles: falsidade do título; prescrição; nulidade da obrigação; pagamento da dívida; qualquer motivo que extinga ou suspenda o cumprimento da obrigação ou não legitime a cobrança do título. Por óbvio, se uma dívida é inexigível, o devedor não pode incorrer em inadimplemento, quanto mais esse implicar em falência. O inciso li diz que a falência será decretada quando: "executado por qualquer quantia líquida, não paga, não deposita e não nomeia à penhora bens suficientes dentro do prazo legal." Aqui não há de se falar em título protestado, pois que o estado de insolvência patrimonial já se positivou com o não cumprimento da execução. Importante observar que não há valor mínimo nessa hipótese, ou seja, a execução pode ser de qualquer valor, porém, a falência não deve ser usada como meio de cobrança e somente deve ser requerida quando de fato se constatar que há o estado de falência. Por isso, se o valor for muito pequeno na execução, ela não será utilizada para embasar pedido de falência. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Neste contexto, tem decidido o STJ que o valor da execução para pedir a falência não pode ser mínimo, como se vê no REsp 920.140, publicado em 08o2/2011:
"O STJ rechaça o pedido de falência como substitutivo de ação de cobrança de quantia ínfima, devendo-se prestigiar a continuidade das atividades comerciais, uma vez não caracterizada situação de insolvência, diante do princípio da preservação da empresa."
259
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
Já
o inciso Ili vai tratar dos atos de falência propriamente ditos. Ili - pratica qualquer dos seguintes atos, exceto se fizer parte de plano de recuperação judicial: a) procede à liquidação precipitada de seus ativos ou lança mão de meio ruinoso ou fraudulento para realizar pagamentos; b) realiza ou, por atos inequívocos, tenta realizar, com o objetivo de retardar pagamentos ou fraudar credores, negócio simulado ou alienação de parte ou da totalidade de seu ativo a terceiro, credor ou não; c) transfere estabelecimento a terceiro, credor ou não, sem o consentimento de todos os credores e sem ficar com bens suficientes para solver seu passivo; d) simula a transferência de seu principal estabelecimento com o objetivo de burlar a legislação ou a fiscalização ou para prejudicar credor; e) dá ou reforça garantia a credor por dívida contraída anteriormente sem ficar com bens livres e desembaraçados suficientes para saldar seu passivo; f) ausenta-se sem deixar representante habilitado e com recursos suficientes para pagar os credores, abandona estabelecimento ou tenta ocultar-se de seu domicílio, do local de sua sede ou de seu principal estabelecimento; g) deixa de cumprir, no prazo estabelecido, obrigação assumida no plano de recuperação judicial.
Assim, ocorrendo qualquer uma dessas hipóteses, a lei considera o devedor em estado de insolvência e permite que lhe seja decretada a falência. ~ Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova da Magistratura/PB/2011, a afirmativa que foi considerada correta dizia que: "O credor cujo título não~teja vencido pode requerer a falência da sociedade empresária devedora, desde que fundamente o pedido em ato de falência, impontualidade injustificada ou execução frustrada em relação a título de outro devedor."
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FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
Atos de falência
Não pagamento de título ou títulos executivos protestados que somem 40 salários mínimos
Não pagar e não nomear bens a penhora em execução de qualquer valor.
Praticar atos que demonstrem a situação de crise irrecuperável da atividade.
Art. 94, 1
Art. 94. li
Art. 94, Ili
9.2.1.3. Procedimento Se o pedido foi feito pelo próprio devedor (art. 97, 1), estaremos diante de um procedimento de autofalência em que não haverá nessa primeira etapa a existência de contencioso. Será um procedimento de jurisdição voluntária. O juiz irá apenas analisar as formalidades legais (arts. 105 a 107) e irá decretar a falência do requerente. Entretanto, se a falência for requerida por qualquer dos outros legitimados, instalar-se-á um procedimento contencioso. De acordo com o art. 98, após ser citado, o devedor poderá apresentar contestação em um prazo de 10 dias. Durante esse prazo, o procedimento poderá tomar três caminhos diferentes. Primeiro, se no período de contestação o devedor requerer recuperação judicial, o procedimento seguirá para o que já foi estudado no item anterior. Segundo, se a falência tiver como base as hipóteses dos incisos 1e li do art. 94 e o devedor citado quiser, de qualquer maneira, evitar uma decretação de falência, neste caso, ele poderá realizar um depósito elisivo. Tal procedimento está previsto no parágrafo único do art. 98 que diz que: "Nos pedidos baseados nos incisos 1 e li do caput do art. 94 desta Lei, o devedor poderá, no prazo da contestação, depositar o valor correspondente ao total do crédito, acrescido de correção monetária, juros e honorários advocatícios, hipótese em que a falência não será decretada e, caso julgado procedente o pedido de falência, o juiz ordenará o levantamento do valor pelo autor."
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
~
Importante!
Observemos que se o depósito elisivo for realizado, passa-se a discussão tão somente para o plano da legitimidade e exigibilidade da dívida que embasou o pedido de falência. Já se conclui de plano que não haverá ato de falência. Fazendo o depósito e contestando o pedido, se a dívida for considerada legitima, o requerente da ação recebe o valor e extingue o processo. Se a dívida for considerada ilegítima, o devedor levanta de volta o depósito. Terceiro, em não havendo depósito, mesmo assim o devedor poderá contestar o motivo pelo qual foi baseado o pedido de falência e tentar comprovar que não está em estado de falência. Somente nesse caso que se terá uma decisão sobre a decretação ou não da falência. Se o juiz entender que não ficou comprovado os atos que baseiam o pedido de falência, irá denegar o pedido e como se trata de uma decisão terminativa estará sujeita à apelação. Já se o entendimento for de que há provas da procedência do pedido, o juiz decretará a falência, dando início a segunda fase do procedimento. Por se tratar de uma decisão que não encerra o processo, estará sujeita a agravo de instrumento. Resumo do que poderá ocorrer no prazo de contestação do pedido de falência
Pedido de recuperação judicial - não há falência Depósito Elisivo não há falência Contestação sem depósito
Julgado procedente o pedido - Requerente recebe o valor depositado Julgado improcedente o pedido - Requerido recebe de volta o valor depositado Julgado procedente o pedido - Decreta-se a falência Julgado improcedente o pedido - Denega-se a falência
Compete para conhecer o pedido de falência o juiz do local em que está situado o principal estabelecimento do devedor. (art. i09, 1 da CF c/c art. 3 da Lei de Falência). O Juízo da falência é indivisível e universal
262
FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
já que atrai todas as ações e interesses da sociedade falida e da massa falida - art. 7. 9.2.1.4. Participação do Ministério Público
Nos procedimentos de recuperação judicial e falência, há na lei diversos momentos em que se prevê a participação do representante no Ministério Público. Essa presença do parquet é importante, já que muitas vezes ele atuará como fiscal da lei, dado o interesse social envolvido em ambos os casos. Ocorre que não há na Lei nenhuma obrigatoriedade da participação do MP na fase pré-falimentar, sendo que sua atuação somente se iniciará quando da decretação da falência já que o art. 99, XIII determina que a sentença que determina a falência deverá ordenar a intimação do MP. A dúvida que esse assunto gera é porque o antigo Decreto 7661/45 previa a participação do MP na fase pré-falimentar e o projeto da lei atual também possuía um artigo que assim determinava. Porém, tal artigo não foi aprovado e então não se tem mais a participação do MP na fase pré-falimentar. Nossa jurisprudência é firme nesse entendimento. Assim, não há nenhuma necessidade de intimação do representante do MP quando do pedido de falência até a sua decretação. Por não participar da fase pré-falimentar, ele não terá legitimidade para recorrer da decisão que decreta ou denega o pedido de falência . Já nas fases falimentar e pós falimentar, o Ministério Público terá participações importantes de modo a garantir a efetividade do processo de falência. • Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Tem decidido o STJ que não há participação do MP na fase pré-falimentar, como se vê no REsp 996264/DF: HFALrNCIA. MINISTÉRIO PÚBLICO. FASE PRÉ-FALIMENTAR. DESNECESSIDADE DE INTERVENÇÃO. LEI N. 11.101/05. NULIDADE INEXISTENTE. 1 - A nova Lei de Falências e de Recuperação de Empresas (Lei n°11.101/05) não exige a atuação geral e obrigatória do Ministério Público na fase pré-falimentar, determinando a sua intervenção, apenas nas hipóteses que enumera, a partir da sentença que decreta a quebra (artigo 99, XIII). li - O veto ao artigo 4º daquele diploma, que previa a intervenção do Ministério Público no processo falimentar de forma genérica, indica o sentido legal de reservar a atuação da Instituição apenas para momento posterior
263
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
ao decreto de falência. Ili - Ressalva-se, porém, a incidência da regra geral de necessidade de intervenção do Ministério Público antes da decretação da quebra, mediante vista que o Juízo determinará, se porventura configurada alguma das hipóteses dos incisos do artigo 82 do Código de Processo Civil, não se inferindo, contudo, a necessidade de intervenção "pela natureza da lide ou qualidade da parte" (artigo 82, inciso Ili, parte final) do só fato de se tratar de pedido de falência. IV - Recurso Especial a que se nega provimento."
~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Este tema é frequente nas prova do Ministério Público. No certame para a Promotoria de Justiça AC/2014, sob a responsabilidade do CESPE, o enunciado pedia para marcar a alternativa correta que era a que dizia: "A lei falimentar não prevê a participação obrigatória do MP na fase pré-falimentar do processo." Na fase discursiva da prova do Ministério Público, organizada pela FMP para o MT/2oo8, tinha a seguinte pergunta: "Com a nova Lei de Recuperação de Empresas (Lei nº 11.101/2005) a intervenção do Ministério Público deverá ocorrer em todas as fases do processo (inclusive a fase pré-falimentar)? Justifique."
9.2.2.
Fase falimentar
Nessa fase já houve a decretação da falência e agora ocorrerão os efeitos de acordo com a lei. 9.2.2.1.
Sentença de falência
Na sentença declaratória de falência o juiz efetivamente irá decretar a falência. Possui natureza declaratória e constitutiva. Apesar de ser uma sentença, ela não encerra o procedimento da falência e sim dá início a outra fase ainda no mesmo processo de falência. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame da banca do CESPE para a Magistratura/ES/2011, a questão pedia que com base na teoria geral do processo falimentar fosse marcada a alternativa correta que era: "Para que se instaure o processo de execução concursai denominado falência, é imprescindível a sentença declaratória de falência."
264
FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
No caso da autofalência, não há contestação e o juiz só irá analisar se foram juntados os documentos previstos no art. 105 e a sentença será necessariamente declaratória de falência. Voltando à sentença que decreta a falência do empresário individual, da sociedade empresária ou da EIRELI, é importante analisar os efeitos de tal decisão. Quamo à pessoa do falido
Quamo aos direitos dos credores
Quamo aos bens do falido
• Restrições à capacidade processual • Restrições à liberdade de locomoção - art. 104, Ili • Deverá assinar termo de compromisso
• Antecipação do vencimento das dívidas - art. 77 da LF • Suspensão da fluêneia de juros - art. 124 da LF
• Perda da administração e disposição dos seus bens - art. 103 da LF
• Proibição para o exercício de atividade empresarial - art. 102 • Continuação do negócio - art. 99, XI
• Suspensão das ações e execuções movidas contra o falido
• Nulidade dos atos praticados pelo falido com relação aos seus bens
• Suspensão da prescrição
• Como esse assunto foi cobrado em concurso? No certame da Magistratura/PR/2010, organizado pela PUC/PR, o enunciado pedia para marcar a alternativa correta a respeito dos efeitos da sentença de falência e a alternativa correta era: "O administrador judicial, mediante autorização do Comitê, poderá dar cumprimento a contrato unilateral se esse fato reduzir ou evitar o aumento do passivo da massa falida ou for necessário à manutenção e preservação de seus ativos. realizando o pagamento da prestação pela qual está obrigada." Esta permissão está no art. 118 da lei. Duas determinações deverão constar na sentença que decreta a falência e são de extrema importância para o prosseguimento do processo. O juiz irá nomear o administrador judicial, de acordo com as previsões que já foram tratadas anteriormente e irá determinar o termo lega l. Termo legal, por alguns também chamada de período suspeito, é o tempo que será delimitado pelo juiz para que os atos daquele período sejam investigados e se possa definir
265
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se foram praticados ilegalmente, causando de maneira culposa a falência. Quando formos tratar da ação revocatória, iremos retomar esse tema. 9.2.2.2.
Levantamento do ativo
Após a sentença declaratória, terá início um novo procedimento na falência, cujo objetivo será realizar o ativo e pagar o passivo. Será nomeado pelo Juiz o administrador judicial de acordo com o que já foi analisado anteriormente. A arrecadação será o primeiro ato do administrador. Será feito logo após a assinatura do termo de compromisso. (art. 22, Ili, f e art. 1o8 da LF). A arrecadação dos bens será levada a termo através de um auto de arrecadação. Decretada a falência, o juiz marcará o prazo para que os credores habilitem seus créditos, que não poderá exceder a 15 dias. Não precisa habilitar por petição e nem com advogado. A realização do ativo será feita pela venda dos bens. A primeira alternativa é através de leilão, mas o administrador pode optar por proposta fechada ou pregão. Poderá ainda ser usada qualquer outra modalidade de venda, desde que seja autorizado pelo juiz e pela assembleia geral de credores, conforme previsão dos art. 142 e 145. Aqui é importante voltar a um assunto que já foi tratado no âmbito da recuperação judicial. Regra geral, a venda do estabelecimento gera sucessão do adquirente no débito legalmente contabilizado (contrato de trespasse), porém, assim como ocorre na recuperação, na falência essa regra será excetuada, vejamos: Art. 141. Na alienação conjunta ou separada de ativos, inclusive da empresa ou de suas filiais, promovida sob qualquer das modalidades de que trata este artigo:
(. ..) li - o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária, as derivadas da legislação do trabalho e as decorrentes de acidentes de trabalho.
266
FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
Como foi mencionado no item 7.4.2 deste capítulo, o PDT propôs Ação Direita de Inconstitucionalidade desse dispositivo, porém, o pedido foi julgado improcedente pelos fundamentos já relatados. Sendo assim, o adquirente do ativo do falido o receberá livre de qualquer ônus. Se assim não fosse, não haveria ninguém interessado em adquirir os bens, tendo em vista que se está num processo de fa lência é porque certamente o devedor tem dívidas que não conseguiu arcar.
9.2.2.3. Ação Revocatória O falido, não necessariamente, agiu culposamente para que a atividade tenha falido. Porém, haverá algumas situações que se consegue comprovar que alguns atos praticados por ele em período próximo à decretação de falência podem sim ter sido praticados de maneira intencional, com intuito de prejudicar aos credores
e tendo
relação com
a infelicidade da quebra. Na sentença que decreta a falência, preconiza o art. 99 da lei que o juiz deverá estipular o termo legal, "sem poder retrotrai-lo por mais de 90 (noventa) dias contados do pedido de falência". Esse termo é a data a partir da qual serão investigados os atos e, em se provando que são atos prejudiciais, poderão ser revogados. A revogação irá exigir uma investigação no contexto subjetivo das partes envolvidas no negócio que apresenta características fraudulentas. Assim, terá que ficar comprovado o requisito subjetivo que é o
concilium fraudis, a intenção de fraudar e o requisito objetivo que é o efetivo prejuízo para a massa falida, causando prejuízo consequente aos credores. Para se realizar tal investigação deverá ser proposta uma ação própria, que recebe o nome de ação revocatória, que terá como legitimados ativos o administrador judicial, qualquer credor ou o Ministério Público. A previsão de tais legitimados encontra-se no art. 132 da Lei 11.101/05 que também estipula um prazo de 3 anos a contar da decre-
tação da falência para que a ação seja proposta.
267
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~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame para o Ministério Público/SP/2008, organizado pela VUNESP, a questão pedia para assinalar a alternativa correta que era: "O Ministério Público tem legitimidade para a ação revocatória, que deve ser proposta no prazo de três anos da decretação da falência." Como legitimados passivos da ação revocatória, o art. 133 preconiza que a ação poderá ser proposta: 1- contra todos os que figuraram no ato ou que por efeito dele foram pagos, garantidos ou beneficiados;
li - contra os terceiros adquirentes, se tiveram conhecimento, ao se criar o direito, da intenção do devedor de prejudicar os credores;
Ili - contra os herdeiros ou legatários das pessoas indicadas nos incisos 1 e li do caput deste artigo. Tais legitimados passivos são aqueles que podem ter contribuído para o ato fraudulento e que irão sofrer os efeitos da sentença, por isso, deverão ter a oportunidade de se defenderem. A ação deverá ser proposta no juízo da falência e irá seguir o procedimento ordinário do Código de Processo Civil, de acordo com o art. 134 da lei de falência. Se o pedido da ação revocatória for julgado procedente, a sentença irá determinar o retorno do bem à massa falida em espécie, com todos os acessórios, acrescido de perdas e danos, que poderá ser provido pelo juiz inclusive de ofício. Tudo isso no interesse maior do procedimento de falência que é evitar no máximo possível o prejuízo dos credores. Ressalta-se que há que ser efetivamente comprovada a má-fé do ato e o prejuízo dos credores para se falar na revogação. A simples negociação que tenha ocorrido em momento prévio à falência não é suficiente para embasar a ação revocatória. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
No REsp i.079.78, de 14/09/2010 o tribunal demonstrou exatamente a necessidade de prova do ato intencional para falar em revogação, vejamos: (. ..)
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2. A venda regular de mercadoria integrante do estoque não constitui venda ou transferência do estabelecimento empresarial. na acepção do art. 52, V111, do DL 7.661/45 (atual art. 129, VI, da Lei 11.101/05). Trata-se, na realidade, de mero desenvolvimento da atividade econômica da empresa, ainda que realizada numa situação pré-falimentar. Esse raciocínio não se aplica às alienações realizadas de má-fé, em que há desvio de numerário e/ou a dilapidação do patrimônio da empresa com o fito de prejudicar credores.
3. A revogação do ato de alienação do bem, realizado no termo legal da falência e antes de decretada a quebra, depende da prova da fraude.
~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na fase abena da prova da Magistratura Estadual SP/2013, concurso organizado pelo TJ/SP, o canditado deveria reconhecer a possibilidade da propositura de ação revocatória já que a questão trazia o seguinte enunciado e as seguintes perguntas: uoecretada a falência da Companhia de Fenilizantes Brasil, por sentença de lº de outubro de 2012. OAdministrador Judicial constata que em lº de outubro de 2009 fora efetuado o reembolso de ex-acionistas à conta do capital social. Constata ainda que os acionistas que se retiraram da Companhia não foram substituídos, persistindo a redução do capital social. Constata também o Administrador Judicial que a massa não é suficiente para o pagamento de créditos mais antigos. Pergunta-se: a) Qual medida judicial poderá ser tomada pelo Administrador Judicial? Fundamente. b) Qual o prazo para o requerimento da medida judicial cabível? Fundamente. c) Contra quem a medida judicial cabível poderá ser promovida? Fundamente. d) o Juiz da falência poderá tomar; de ofício, alguma medida em relação ao caso concreto? Fundamente. e) Se o Administrador Judicial for omisso e não tomar a medida judicial cabível, poderá ser responsabilizado por eventual prejuízo causado à massa falida? Fundamente_
9.2.2.4. Atos Ineficazes
Também dentro do termo legal, serão investigados atos que contribuíram para que o falido chegasse nesse patamar financeiro, mas sem importar se houve qualquer intento fraudulento na sua prática.
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O que importa é que a adoção da medida tenha gerado diminuição no patrimônio do falido e isso gerou uma diminuição do montante da massa falida. Trata-se dos atos ineficazes, previstos no art. 129, quais sejam:
à massa falida, tenha ou não o contratante conhecimento do estado de crise econômico-financeira do devedor; seja ou não intenção deste fraudar credores: All. i29. São ineficazes em relação
1 - o pagamento de dívidas não vencidas realizado pelo devedor dentro do termo legal, por qualquer meio extintivo do direito de crédito, ainda que pelo desconto do próprio título; li - o pagamento de dívidas vencidas e exigíveis realizado dentro do termo legal, por qualquer forma que não seja a prevista pelo contrato;
Ili - a constituição de direito real de garantia, inclusive a retenção, dentro do termo legal, tratando-se de dívida contraída anteriormente; se os bens dados em hipoteca forem objeto de outras posteriores, a massa falida receberá a parte que devia caber ao credor da hipoteca revogada; IV - a prática de atos a título gratuito, desde 2 (dois) anos antes da decretação da falência; V - a renúncia à herança ou a legado, até 2 (dois) anos antes da decretação da falência; VI - a venda ou transferência de estabelecimento feita sem o consentimento expresso ou o pagamento de todos os credores, a esse tempo existentes, não tendo restado ao devedor bens suficientes para solver o seu passivo, salvo se, no prazo de 30 (trinta) dias, não houver oposição dos credores, após serem devidamente notificados, judicialmente ou pelo oficial do registro de títulos e documentos; VII - os registros de direitos reais e de transferência de propriedade entre vivos, por título oneroso ou gratuito, ou a averbação relativa a imóveis realizados após a decretação da falência, salvo se tiver havido prenotação anterior.
O caput deixa expresso que nos atos ineficazes não há nenhuma necessidade de se perquirir intenção e nem mesmo concluiu fraudulento, o que diferencia essa situação dos atos revogáveis trabalhados no item anterior.
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FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO OE EMPRESAS
Observa-se que no rol taxativo do art. 129 são elencadas situações que diminuíram a capacidade financeira do empresário ou da sociedade empresária, o que acabou por refletir no ativo da massa falida, vindo a gerar prejuízo aos credores. Como foram praticados os atos dentro do termo legal, eles serão considerados ineficazes. Chama-se a atenção para as hipóteses dos incisos IV e V que o tempo será diferente do termo legal da falência. Este não pode ser superior a 90 dias antes da decretação da falência, enquanto nessas duas situações específicas, os atos serão ineficazes se tiverem sido praticados em até dois anos antes da sentença que decreta a falência. Se são ineficazes significa que não produziram qualquer efeito e devem ser considerados como se nunca tivessem ocorrido. Não é necessário propositura de ação, sendo que o parágrafo único do art. 129 determina que a "ineficácia poderá ser declarada de ofício pelo juiz, alegada em defesa ou pleiteada mediante ação própria ou incidentalmente no curso do processo." Os atos são considerados ineficazes de pleno direito e os efeitos de tal ineficácia serão desde a sua realização. O juiz pode reconhecer de ofício, mas se for necessário, o interessado poderá propor ação para efetivar o desfazimento de qualquer situação que tenha se derivado do ato ineficaz. Por exemplo, imaginemos que um empresário, 40 dias antes de ter sua falência decretada, transfira estabelecimento sem o consentimento dos credores e sem ter permanecido com bens para solver o passivo, este ato é ineficaz, sendo considerado para todos os fins de direito como inexistente, o que significa dizer será considerado que o estabelecimento não deixou de pertencer ao empresário. Ocorre que o adquirente se recusa e entregar o complexo de bens e, nesse caso o terceiro interessado terá que propor ação para o juiz reconhecer a ineficácia o ordenar a entrega do patrimônio. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
No REsp 1119969 / RJ, de 15/10/2013 o tribunal demonstrou que o ato ineficaz não produz efeito, vejamos: •DIREITO EMPRESARIAL FAl.ÍNCIA. AÇÃO REVOCATÓRIA. CESSÃO DE QUOTAS. NEGÓCIO JURfDICO CELEBRADO ENTRE SÓCIOS RETIRANTES E REMANESCENTES. PAGAMENTO DO PREÇO DAS QUOTAS SOCIAIS COM BENS DA SOCIEDADE NO INTERREGNO COMPREENDIDO NOS DOIS ANOS ANTERIORES À FAIÍNCIA. INEFICÁCIA OBJETIVA EM RELAÇÃO À MASSA.
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1. "Os atos considerados ineficazes pela Lei de Falências não produzem qualquer efeito jurídico perante a massa. Não são atos nulos ou anuláveis, ressalte-se, mas ineficazes. Quer dizer, sua validade não se compromete pela lei falimentar - embora de alguns deles até se pudesse cogitar de invalidação por vício social, nos termos da lei civil. Por isso, os atos referidos pela Lei de Falências como ineficazes diante da massa falida produzem, amplamente, todos os efeitos para os quais estavam preordenados em relação aos demais sujeitos de direito" (COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à lei de falências e de recuperação de empresas. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 461)."
Quadro comparativo de atos ineficazes e atos revogáveis Atos Ineficazes
Atos Revogáveis
Não dependem de intenção e nem de conhecimento do estado de crise econômico-financeira.
Dependem da prova do intuito fraudulento e da tentativa de prejudicar credores.
Em regra são atos praticados dentro do termo legal, mas há duas exceções com prazo de dois anos.
Refere-se somente a atos praticados dentro do termo legal.
Possui rol taxativo de hipóteses de aplicação.
Pode ser qualquer ato desde que provado a intenção e o prejuízo.
Podem ser reconhecidos de ofício pelo juiz, alegada em defesa ou pieiteada mediante ação própria ou incidentalmente no curso do processo de falência.
Necessita de ação própria incidental que poderá ser proposta pelo administrador judicial, por qualquer credor ou pelo Ministério Público no prazo de 3 (três) anos contado da decretação da falência.
9.2.2.5. Pedidos de restituição Como na arrecadação de bens do devedor no processo de falência, serão arrecadados todos os bens que estiverem na posse do falido, inclusive bens que não lhe pertence, para definir o ativo, e deverá ser feita a restituição aos proprietários. São exemplos de bens que são restituíveis os bens dos quais o falido era locatário, depositário ou comodatário. Se o bem estiver na 272
FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
posse do falido por alienação fiduciária ou arrendamento mercantil, também caberá restituição, pois os credores têm a posse indireta do bem e a propriedade resolúvel, no primeiro caso, e a propriedade direta, no segundo caso . A lei irá tratar do pedido de restituição que os verdadeiros proprietários dos bens que foram arrecadados deverão fazer. O art. 85 preconiza que : "O proprietário de bem arrecadado no processo de falência ou que se encontre em poder do devedor na data da decretação da falência poderá pedir sua restituição." O art. 86 dispõe de situações em que a restituição deverá ser feita em dinheiro se a coisa não mais existir, se se tratar de adiantamento de contrato de câmbio ou se se referir a valores entregues ao devedor pelo contratante de boa-fé na hipótese de revogação ou ineficácia do contrato . ~
Qual o entendimento do STF sobre o assunto?
Muito se discutia sobre essas situações que envolvem os contratos realizados antes da decretação de falência e então o STF aprovou a súmula 495 que dispõe que: ua restituição em dinheiro da coisa vendida a crédito, entregue nos quinze dias anteriores ao pedido de falência ou de concordata, cabe, quando, ainda que consumida ou transformada, não faça o devedor prova de haver sido alienada a terceiro." Ainda sobre os pedidos de restituição há a súmula 417 que preconiza que: "pode ser objeto de restituição, na falência, dinheiro em poder do falido, recebido em nome de outrem, ou do qual, por lei ou contrato, não tivesse ele a disponibilidade." ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Também no STJ o assunto dos pedidos de restituição é muito frequente, existindo hoje três súmulas sobre o tema: Súmula 307 - A restituição de adiantamento de contrato de câmbio, na falência, deve ser atendida antes de qualquer crédito. súmula 233 - A restituição da importância adiantada, a conta de contrato de câmbio, independe de ter sido a antecipação efetuada nos quinze dias anteriores ao requerimento da concordata. súmula 36 -A correção monetária integra o valor da restituição, em caso de adiantamento de câmbio, requerida em concordata ou falência.
273
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No concurso para procurador da PGE/AM/2010, organizado pela FCC, o enunciado perguntava ·Podem ser objeto de pedido de restituição, nos termos da legislação falimentar". A resposta correta era a que afirmava: "o bem alienado fiduciariamente que esteja em posse do falido; o bem objeto de arrendamento mercantil em posse do falido; e os valores adiantados em razão de adiantamento de contrato de câmbio."
9.2.2.6. Pagamento do passivo: concurso de credores Depois de realizado o ativo, será feito o pagamento aos credores. Nesse ponto é importante diferenciar os credores da massa e os credores da falência. As despesas com a administração da falência, inclusive a remuneração do administrador judicial, são créditos extraconcursais no sentido que devem ser satisfeitos antes do pagamento dos credores da sociedade. Sendo assim, primeiro deve ocorrer o pagamento dos créditos extraconcursais, depois as restituições e depois a ordem do art. 83. Pode-se dizer que todos os débitos que surgem após a decretação da falência serão enquadrados como créditos extraconcursais e terão a preferência no pagamento. Credores extraconcursais credores da massa falida
Credores concursais credores do falido
Créditos que surgem em vinude do processo de falência, após a sua decretação.
Créditos anteriores à decretação da falência que foram devidamente habilitados em momento oponuno.
~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame Unificado da OAB/Julho 2011, organizado pela FGV, o enunciado contava o seguinte caso e perguntava: "A sociedade empresária XYZ Computação Gráfica S.A. teve sua falência decretada. Na correspondente sentença, foi autorizada a continuação provisória das atividades da falida com o administrador judicial, fato esse que perdurou por um período de 10 (dez) meses. Como são juridicamente qualificados os titulares dos créditos trabalhistas relativos a serviços prestados durante esse interregno posterior à decretação da falênciar A resposta correta era: •credores extraconcursais."
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FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
o tratamento paritário dos credores é o principal objetivo do processo falimentar. Para isso é estabelecida a ordem do art. 83. Art. 83. A classificação dos créditos na falência obedece guinte ordem:
à se-
1 - os créditos derivados da legislação do trabalho, limitados a 150 (cento e cinquenta) salários-mínimos por credor; e os decorrentes de acidentes de trabalho; li - créditos com garantia real até o limite do valor do bem gravado;
Ili - créditos tributários, independentemente da sua natureza e tempo de constituição, excetuadas as multas tributárias; IV - créditos com privilégio especial, a saber: A) os previstos no art. 964 da Lei nº l0.4o6, de 10 de janeiro de 2002;
B) os assim definidos em outras leis civis e comerciais, salvo disposição contrária desta Lei; C) aqueles a cujos titulares a lei confira o direito de retenção sobre a coisa dada em garantia; V - créditos com privilégio geral, a saber: A) os previstos no art. 965 da Lei nº 10.406, de lO de janeiro de 2002;
B) os previstos no parágrafo único do art. 67 desta Lei; C) os assim definidos em outras leis civis e comerciais, salvo disposição contrária desta Lei; VI - créditos quirografários, a saber: A) aqueles não previstos nos demais incisos deste artigo; B) os saldos dos créditos não cobertos pelo produto da alienação dos bens vinculados ao seu pagamento; C) os saldos dos créditos derivados da legislação do trabalho que excederem o limite estabelecido no inciso 1do caput deste artigo; VII - as multas contratuais e as penas pecuniárias por infração das leis penais ou administrativas, inclusive as multas tributárias; VIII - créditos subordinados, a saber:
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
A) os assim previstos em lei ou em contrato; B) os créditos dos sócios e dos administradores sem vínculo empregatício. Como se pode obser11ar, uma vez que a decretação da falência rompeu com a expectativa social dos credores de que teriam seus créditos adimplidos na forma e prazo estabelecidos, o Estado intervém para buscar o equilíbrio da situação. Estabeleceu-se através de critérios de importância, uma ordem para o pagamento dos créditos, tentando assim diminuir o impacto social e econômico da falência. Feito os pagamentos até o limite do ativo que foi realizado, o administrador judicial irá apresentar ao juiz o relatório final de até qual classe de credores conseguiram ter seu crédito satisfeito. Os pagamentos serão feitos por classes e, se ao chegar numa classe, o administrador perceber que o valor que existe não irá contemplar todos os credores da classe, ele deverá fazer o pagamento proporcional a cada um deles, de acordo com o saldo disponível e o quanto a dívida representa dentro da classe. ~
Como
esse assunto foi
cobrado em concurso?
No concurso para Procurador do Estado/PR, organizado pela banca COPS-UEL, foram apresentadas cinco assertivas para se analisar quais estavam corretas e quais estavam erradas. A primeira era incorreta e dizia: "a classificação dos créditos na falência obedece à seguinte ordem: i) os créditos derivados da legislação do trabalho, limitados a iso (cento e cinquenta) salários-mínimos por credor, e os decorrentes de acidentes de trabalho; ii) créditos com garantia real até o limite do valor do bem gravado; iii) créditos tributários, independentemente da sua natureza e tempo de constituição, incluindo-se as multas; iv) créditos com privilégio especial; v) créditos com privilégio geral; vi) créditos quirografários; vii) créditos subordinados." A segunda, terceira e quarta afirmativas eram verdadeiras e diziam: "os créditos trabalhistas cedidos a terceiros serão considerados quirografários," "serão considerados créditos extraconcursais e serão pagos com precedência sobre os concursais, os créditos relativos a obrigações resultantes de atos jurídicos válidos praticados após a decretação da falência, e tributos relativos a fatos geradores ocorridos após a decretação da falência, respeitada a mesma ordem estabelecida para os créditos concursais" e "a cobrança judicial do crédito tributário não é sujeita a concurso
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FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
de credores ou habilitação em falência, recuperação judicial, concordata, inventário ou arrolamento." E a quinta afirmativa estava incorreta pois afirmava: Nquanto ao pagamento dos créditos devidos às pessoas jurídicas de direito público, o concurso de preferência se verifica na seguinte ordem: i) Municípios, conjuntamente e pró rata; ii) Estados, Distrito Federal e Territórios, conjuntamente e pró rata; e, por fim, iii) União."
9.2.3. Fase pós-falimentar Após o pagamento dos credores, o procedimento entra na sua última etapa e a Lei 11.101/05 propõe em seu artigo 154 ao 160, como deve seguir o processo de encerramento da falência e a posterior extinção das obrigações do empresário falido. Segundo a Lei, no art. 101: "o falido fica inabilitado para exercer qualquer atividade empresarial a partir da decretação da falência e até a sentença que extinga suas obrigações, respeitado o disposto no § lº do art. 181 desta Lei". Esse artigo deixa claro que com a decretação da falência, não será possível que aquele que é considerado falido continue exercendo suas atividades, com o risco de sofrer uma série de sanções legais. Porém, prevê ainda o mesmo artigo que tal impossibilidade se estende até o momento da prolatação da sentença que extingue as obrigações do devedor. Percebe-se então nesse dispositivo que seu objetivo é proteger os credores do falido de possíveis atos de fraude, até que haja uma possível, mas não garantida forma de receberem seus créditos. Ao comentar esse dispositivo, não podemos deixar de lembrar do disposto no art. 81 de que nas sociedades de responsabilidade ilimitada, os sócios também serão decretados falidos, ou seja, também estarão sujeitos ao efeitos da sentença que encerra a falência.
o encerramento da falência é fase posterior à liquidação do ativo e pagamento do passivo. Inicialmente, o administrador judicial nomeado pelo juiz apresentará suas contas, que segundo a lei, deverão vir acompanhados de documentos comprobatórios, podendo o administrador ser responsabilizado e ter seu patrimônio sequestrado ou indisponibilizado caso venha algum credor, no prazo de 10 dias após a publicação do aviso de que
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
foram apresentadas, e impugne-as, havendo intervenção do Ministério Público, com o objetivo de se analisar a veracidade da impugnação. Posteriormente, se as contas forem aceitas. o artigo 155 da Lei de Falências prevê que No administrador apresentará o relatório final da falência no prazo de 10 (dez) dias (depois da sentença julgadora das contas), indicando o valor do ativo e o do produto de sua realização, o valor do passivo e o dos pagamentos feitos aos credores, e especificará justificadamente as responsabilidades com que continuará o falido." Apresentado o relatório final, o juiz encerrará a falência por sentença, que poderá ser atacada por recurso de apelação. A sentença que encerra o processo decorre do exaurimento patrimonial da massa falida ou da verificação de sua inexistência. O processo falimentar existe, portanto, na medida em que houver bens que integrem o acervo patrimonial, de caráter objetivo. que integre a massa falida. O encerramento põe fim ao processo falimentar, mas se difere da extinção das obrigações do falido, que ocorrerá de acordo com o que está previsto no art. 158. An. 158. Extingue as obrigações do falido:
1- o pagamento de todos os créditos; li - o pagamento, depois de realizado todo o ativo, de mais de 50°k (cinquenta por cento) dos créditos quirografários, sendo facultado ao falido o depósito da quantia necessária para atingir essa porcentagem se para tanto não bastou a integral liquidação do ativo;
Ili - o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contado do encer-
ramento da falência, se o falido não tiver sido condenado por prática de crime previsto nesta Lei; IV - o decurso do prazo de 10 (dez) anos. contado do encerramento da falência, se o falido tiver sido condenado por prática de crime previsto nesta Lei.
o inciso 1do art. supra aponta que um dos meios que o falido tem para extinguir suas obrigações é através do pagamento das dividas, sendo esse meio extintivo da obrigação por excelência. Como já foi mencionado anteriormente, a falência não significa necessariamente 278
FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
insolvência, portanto, poderá ser arrecadado patrimônio suficiente para pagar todos os credores. Se ocorrer o pagamento de pelo menos metade da classe dos quirografários, também serão extintas as obrigações, podendo o falido usar seus próprios recursos para chegar a esse pagamento. Lembre-se de que se chegou a pagar credores quirografários é porque todos os das classes anteriores receberam integralmente seus créditos. Se não chegou a esse pagamento, os efeitos somente irão se encerrar com o tempo que irá variar se tiver havido condenação ou não em crime falimentar. Isso significa dizer que se nos prazos estipulados pelo artigo citado, o falido vier a receber algum valor, tornar-se proprietário de algum bem, qualquer interessado poderá pedir a reabertura do processo e que seja usado o valor para dar prosseguimento ao pagamento dos credores, de onde estiver sido parado. Passados os prazos, acabam todas as obrigações e a sentença de falência não produzirá mais efeitos. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova Magistratura Estadual/DFT/2014, organizada pelo CESPE, foi solicitado que se marcasse a alternativa correta que era: #As obrigações do devedor empresário em regime de execução concursai serão extintas caso ocorra o rateio de mais de 50°~ do devido aos quirografários, após a realização de todo o ativo."
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Capítulo
s
Títulos de Crédito Sumário • i. Conceito - 2. Legislação aplicável - 3. Requisitos - 4. Caraáerísticas - 5. Princípios: 5.i. Princípio da Abstração; 5.2. Princípio da Autonomia; 5.3. Princípio da Incorporação ou cartularidade; 5.4. Princípio da Literalidade - 6. Classificação dos títulos: 6.1. Quanto ao conteúdo da declaração cartular; 6.2. Quanto à prova da causa de emissão; 6.3. Quanto à circulação; 6.4. Quanto à pessoa do emitente; 6.5. Quanto ao prazo - 7. Endosso: 7.2. Forma; 7.3. Espécies; 7.4. Responsabilidade do endossante; 7.5. Título não à ordem; 7.6. Endosso tardio ou póstumo - 8. Aval: 8.1. Conceito; 8.2. Forma; 8.3. Direitos e obrigações do avalista; 8.4. Espécies; 8.5. Aval x Fiança - 9. Protesto: 9.i. Conceito e caraáerísticas; 9.2. Espécies; 9.3. Procedimento; 9.4. Protestos necessários; 9.5. Cancelamento do protesto - lo. Ações Cambiais: l0.1. Ação de Execução de Título Extrajudicial: l0.1.1. Utilização para os títulos de crédito; l0.1.2. Requisitos; 10.1.3. Prazos; 10.2. Ação de Anulação da Cambial; 10.3. Ação contra o locupletamento; 10.4. Ação Monitória - 11. Títulos em espécie: 11.1. Letra de Câmbio; 11.2. Cheque; 1i.3. Nota promissória; 11.4. Duplicata; 1i.5. Cédulas de crédito
1.CONCEITO Para se falar em título de crédito, é preciso primeiro se falar sobre o conceito de crédito. Crédito é uma palavra que pode assumir diferentes acepções, mas a que nos interessa aqui está ligada a uma necessidade econômica. Num dado momento histórico o homem percebeu que poderia negociar de forma diferente seus bens, ao invés de se fazer a troca de um bem pelo outro momentaneamente, criou-se então a possibilidade de uma das partes negociantes cumprir sua obrigação instantaneamente, mas a outra só vir a adimplir a sua em um tempo futuro. Percebeu-se que para isso seria fundamental a confiança já que uma parte cumpre sua obrigação e fica na expectativa de que a outra também o fará no momento posterior. É aí que se fala em crédito. 281
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Crédito " Tempo + Confiança Esse tipo de negociação começou a ganhar força e uma enorme importância para o crescimento econômico dos povos. Isso porque, uma pessoa, por exemplo, que não tinha condições financeiras para criar um comércio, com a utilização do crédito junto a uma instituição financeira, passaria a ter essa possibilidade, o que aumentaria a circulação de riquezas, a criação de oportunidade de trabalho para outras pessoas e diversos outros benefícios. Com o crescimento da importância do crédito, a forma de ele ser utilizado também foi sofrendo alterações. Começou-se a ter operações de crédito com prazos mais longos, com a estipulação de garantias, com a utilização de diversas formas de representação do negócio. Nesse crescimento uma necessidade surgiu: fazer o crédito circular. Imaginemos a seguinte situação: um comerciante resolve dar crédito ao seu cliente, permitindo que ele faça a compra para pagamento em 6o dias. Nesse tempo, a princípio, o comerciante nada poderia fazer com o crédito e então a riqueza circulava de forma limitada. Começa-se então a pensar que ele poderia fazer esse crédito circular, passando a outro credor, por exemplo. Inicialmente fala-se nos instrumentos civis de cessão de crédito, mas estes se apresentam de forma um tanto quanto burocráticas. O crédito precisava ser trocado, servir de moeda de câmbio para que o fomento econômico fosse ainda mais forte.
É então que surgem os títulos de crédito, com o intuito principal de permitir com maior facilidade a circulação do crédito. Nos conceitos clássicos que são dados aos títulos de crédito, pode-se dizer que este é um documento abstrato e autônomo através do qual se representa um crédito líquido e certo, que será cobrado nas condições estipuladas no documento.
É desse conceito que decorrem características e consequências importantes nas relações cambiárias. Como se falou, os títulos de crédito surgiram da necessidade de se ter um documento que representasse o crédito com menos formalidade e permitisse a circulação desse crédito. É desta necessidade de circulação que surgem institutos importantes como o princípio da
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TÍTULOS DE CRÉDITO
abstração, da autonomia, o endosso, o aval e outros. É importante, assim, ter-se em mente que a explicação para a informalidade dos institutos jurídicos utilizados nos títulos de crédito é para facilitar tal circulação. Em virtude dessa característica de se ter um elemento de câmbio, fala-se que o estudo dos títulos de crédito recebe o nome de direito cambiário. Título de crédito
documento abstrato e canular que representa o crédito, permitindo maior circulação deste.
2. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
A primeira legislação que foi criada no Brasil e que tratou dos títulos de crédito foi o decreto 2044/1908. Ele regulamentou apenas a letra de câmbio e a nota promissória, mas servia de base para todo e qualquer título. Porém, desde os seus primórdios, os títulos de crédito passaram a ser utilizados em negócios que envolviam entes que estavam em diferentes países. Sempre foram muito utilizados no comércio internacional. Em virtude disso, em meados do século XX os países começaram a ser preocupar em uniformizar suas legislações a respeito dos títulos.
o Brasil participou de tais convenções e foi signatário da Convenção de Genebra que foi recepcionada no ordenamento brasileiro através da aprovação do decreto 57.663/66. Esta lei revogou quase por completo o decreto 2044/1908 e ficou conhecida como Lei Uniforme de Genebra (LUG). Ela também trata diretamente apenas da Letra de Câmbio e Nota Promissória, mas também serve de base para os demais títulos. Os outros dois títulos que tem lei própria são a duplicata que é tratada na Lei n° 5474/68 e o cheque que é regulado pela Lei n° 7357/85. Tais legislações são pequenas, o que fez com que a LUG permanecesse servindo de aplicação subsidiária para esses títulos. Em 2002 o legislador optou por criar uma teoria geral dos títulos de crédito no Código Civil, nos artigos 887 a 926. OCódigo Civil não revogou as legislações anteriores, sendo que cada título específico permanece com seu regulamento especial. 283
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~
Importante!
A principal legislação dos Títulos de Crédito continua sendo a Lei Unifonne de Genebra, decreto 57 .663/66, apesar de o Có<Íigo Civil de 2002 ter trazido uma Teoria Geral para os títulos.
3. REQUISITOS
o título de crédito representa sempre um negócio jurídico, é uma forma de se contrair uma obrigação. Sendo assim, os requisitos de validade dos negócios jurídicos, previstos no art. 104 do Código Civil, quais sejam: agente capaz; objeto lícito, possível, determinado ou determinável e forma prescrita ou não defesa em lei, também se aplicarão aos títulos de crédito. Porém, o mais importante aqui é apontarmos os requisitos específicos para que se tenha um título de crédito perfeito e devidamente válido. Neste momento nós iremos tratar apenas dos requisitos em geral dos títulos, pois cada título específico poderá ter seus requisitos próprios, o que será analisado quando cada um deles for estudado. Apesar de já ter sido alvo de alguma discussão jurídica, hoje se pode afirmar que a doutrina majoritária concorda que o título enquadra-se como um ato unilateral de vontade . Isso porque, para que se tenha a obrigação devidamente assumida só é necessária a manifestação de vontade do devedor. Ainda que materialmente falando existam duas vontades envolvidas, pois o título só será emitido se o credor quiser recebê -lo, formalmente só há a manifestação de vontade do devedor. Por isso, o primeiro requisito específico a ser observado é a assinatura do devedor. Não há nenhuma necessidade de se contar a qualificação do devedor, bastando apenas sua manifestação de vontade que é feita com a assinatura. Há que se ressaltar que o art. 219 do Código Civil presume como verdadeira as obrigações que são assumidas com a assinatura, sendo ela suficiente para a manifestação de vontade. Sendo o
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TÍTULOS DE CRÉDITO
emitente do título capaz a apondo sua assinatura estará cumprido tal requisito. De acordo com ao art. 889 do Código Civil, o título precisa ter data de emissão, precisa ter mencionado no seu documento qual foi o dia em que ele foi passado ao credor originalmente. Mesmo se no momento de ser passado não se preencher a data de emissão, no momento em que se buscar o cumprimento da obrigação constante do título, ele deverá conter a data de emissão. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
o tribunal segue a tendência de considerar como elemento essencial a data de emissão no título, como se pode observar na ementa do AgRg no REsp io48327/MG, publicado em 09/oS/2011: PROCESSO CML AGRAVO REGIMENTAL RECURSO ESPECIAL EXECUÇÃO. NOTA PROMISSÓRIA. AUS~NCIA DE DATA DE EMISSÃO. FORMALIDADE ESSENCIAL ART. 22, DO CPC. INAPLICABILIDADE. i. O entendimento do Tribunal de origem está em consonância com a jurisprudência desta Corte ao considerar a data de emissão da nota promissória como formalidade essencial para execução da nota promissória. Incidência da Súmula 83/STJ. Ausência de impugnação dos fundamentos da decisão agravada pela recorrente.
(...)
Caso não se queira considerar o título como um título à vista, também não pode lhe faltar a data de vencimento da obrigação. É o que preconiza o § i do art. 889 do Código Civil. 0
Quando há uma data de vencimento, a obrigação consubstanciada no título estará suspensa e somente obrigará o devedor após o advento da data estipulada. Se não está vencido o título não pode embasar um pedido de falência, por exemplo, e nem ser objeto de execução judicial. O caput do art. 889 do Código Civil determina ainda que o título deve conter "a indicação precisa dos direitos que confere". Deverão estar descritos no próprio título os direitos e obrigações que dele decorrerão. Está intrinsecamente relacionado ao princípio da literalidade que será analisado mais a frente.
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Outros dois requisitos que não são essenciais, mas que trazem algumas consequências ao título são os locais, de emissão e de pagamento. O Código Civil preceitua que: § 2° Considera-se lugar de emissão e de pagamento. quando
não indicado no título. o domicílio do emitente . Como se vê, o título não precisa indicar tais lugares, pois a lei dá a solução que é considerar o domicílio do devedor. Tem-se, portanto, requisitos que são essenciais e requisitos não essenciais, porém, é preciso ressaltar que se entende, majoritariamente, que no momento da emissão o título até pode não conter todos os requisitos essenciais que poderão ser preenchidos posteriormente, mas no momento da execução do título, não poderá faltar nenhum requisito. Agora esse preenchimento posterior deve ser feito de boa-fé, sendo que quem assume o ônus de comprovar que houve preenchimento de má-fé será o emitente que optou por passar um título sem o preenchimento completo. ~ Qual o entendimento do STF sobre o assunto?
O Supremo sumulou essa questão do título que é entregue ao credor sem o preenchimento completo, vejamos: Súmula n° 387 - UA cambial emitida ou aceita com omissões, ou em branco, pode ser completada pelo credor de boa-fé antes da cobrança ou do protesto.n Se houver preenchimento de má-fé e o título circular e parar nas mãos de terceiros de boa-fé que desconhecem o que foi acordado, o devedor vai ter que arcar com o pagamento do título e depois buscar os direitos frente a quem preencheu incorretamente. É o que preconiza o art. 10 da LUG. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No certame para Magistratura do Trabalho/23• Região/2011, concurso de banca do próprio TRT, o enunciado pedia para assinalar a alternativa correta sobre a letra de câmbio e a resposta correta era: nse for emitida ou aceita com omissões, ou em branco, pode ser completada pelo credor de boa-fé antes da cobrança ou do protesto."
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TÍTULOS DE CRÉDITO
• Partes capazes • Objeto lícito
Requisitos essenciais
• Forma prescrita • Assinatura do emitente • Data de emissão • Especificação das obrigações
• Data de vencimento Requisitos não • Local de emissão essenciais { • Local de pagamento
4. CARACTERÍSTICAS lmpo11ante traçarmos as características principais dos títulos de crédito, pois elas serão impo11antes para explicar e compreender melhor determinadas consequências. Trata-se de um documento de natureza comercial, tanto pela sua origem como pela sua utilização nos dias atuais. Apesar de ser permitida, muitas vezes, a utilização dos títulos nas relações meramente civis, é nas relações comerciais que está sua maior utilidade. Em vil1ude dos requisitos que foram analisados anteriormente, os títulos representam documentos formais. Claro que dependendo do título se terá mais ou menos formalidades, mas todos eles terão sua forma específica. A nota promissória, por exemplo, não tem grandes formalidades, bastando observar a forma escrita e os requisitos legais, já o cheque deve seguir diversas formalidades e só pode ser emitido se previamente confeccionado por instituição bancária. Em vi11ude de sua ca11ularidade (será melhor delineado no próximo item), o título é considerado um bem móvel. Isso traz consequências impo11antes, como o momento da transmissão da propriedade, por ser esta realizada pela tradição. A entrega do título que vai marcar a transferência de titularidade. Também em vi11ude da sua ca11ularidade, para que uma pessoa possa exercer seus direitos sobre o título ela deverá apresentá-lo.
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Somente com a apresentação da cártula é que a pessoa poderá comprovar quais são os direitos que possui em virtude do título e exercê-los. Além disso, quando se faz o pagamento do título de crédito, aquele que paga tem o direito de receber o título, resgatá-lo. Essa característica traz uma consequência importante. Estuda-se no direito civil que para o pagamento ser feito corretamente e o devedor não ser obrigado a pagar novamente, ele deve exigir a quitação que é a prova do pagamento. No caso do título de crédito, a quitação se dá com o resgate deste. Assim, o devedor do título só deve pagá-lo mediante resgate e se fizer de outra forma, mediante um recibo, por exemplo, poderá ficar sujeito a pagar de novo se aparecer alguém portando o título e reclamando o pagamento desse. A obrigação principal do título de crédito deve ser sempre o pagamento de uma quantia líquida e certa, o que faz com que se dê natureza processual abstrata, sendo, portanto, título executivo extrajudicial Regra geral, o pagamento do título deve ser realizado no domicílio do devedor, o que faz com que se classifique como obrigação quesível. Essa regra é de fácil explicação. Se o título é feito para circular e como será estudado, essa circulação ocorre de maneira simples, sem necessidade de autorização do devedor, mo momento do vencimento pode ocorrer do devedor não saber mais quem é o credor e assim não ser possível que ele o procure. No entanto essa regra comporta exceções, podendo se estipular o pagamento no domicílio do devedor ou até mesmo de um terceiro como é o caso do cheque. Para que seja emitido um título sempre existirá um negócio jurídico que o originou. Pode ser utilizado, por exemplo, para o pagamento de uma compra e venda, para representar o pagamento de aluguéis, uma doação e qualquer outro negócio jurídico. Regra geral, o título vai ter natureza pro solvendo, ou seja, não fará novação em relação ao negócio que deu origem. Imaginemos que uma pessoa estava devendo dois meses do aluguel do apartamento onde mora e para solucionar foi até a imobiliária e deu um cheque para pagar os dois meses em atraso. Esse cheque não vai extinguir a obrigação derivada do contrato, mas irá apenas confirmá-la. Isso quer dizer que se o cheque não for compensado, o credor
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passará a ter dois instrumentos para ser utilizado para a cobrança da obrigação; poderá executar o cheque ou então cobrar a dívida através do contrato de locação, podendo se valer do despejo. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
O tribunal vem de maneira recorrente reconhecendo a natureza pro solvendo dos títulos de crédito, como no REsp io23648/ES, publicado em i3/05/2oo8, cuja ementa é a seguinte: EMBARGOS DO DEVEDOR. EMISSÃO OE CHEQUES PARA PAGAMENTO OE DUPLICATAS VENCIDAS. DEVOLUÇÃO POR INSUFICIÊNCIA OE FUNDOS. AUTONOMIA. - Tanto os cheques quanto as duplicatas gozam de autonomia. o ora recorrente deveria ter adimplido com a obrigação originária; se emitiu cheques, títulos pro solvendo, para sua quitação, então o credor optará por executar tanto uns quanto outros. Poderá, ainda, executar ambos. em conjunto. - A execução - seja pelas duplicatas, seja pelos cheques - está aparelhada com título autônomo. O negócio jurídico precedente e a força executiva das duplicatas não retira, em absoluto, a dos cheques.
Por fim, mas não menos importante, temos a característica principal do titulo de crédito, a circulação. O grande mote da criação dos títulos foi a criação de uma maneira mais fácil e ágil de circular o crédito. Com isso foram criados mecanismos que facilitam a circulação, deixando o título de crédito com menos burocracias e formalidades que os instrumentos contratuais de cessão de crédito. Entretanto é importante lembrar que essa característica não é absoluta, como praticamente no mundo jurídico não é. As partes envolvidas nas relações cambiárias podem limitar e dificultar a circulação, até mesmo impedindo a utilização dos institutos específicos dos títulos e fazendo com que a circulação ocorra das maneiras tradicionais do direito civil. 5. PRINCÍPIOS Antes de começarmos o estudo dos institutos fundamentais para os títulos de crédito, é preciso analisarmos os princípios que os regem e que servirão de fundamento para muitos desses institutos.
5.1. Princípio da Abstração O primeiro princípio a ser analisado é o de maior relevância prática para os títulos de crédito.
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De acordo com o Princípio da Abstração, o título de crédito se desvincula do negócio jurídico que o originou a partir do momento em que for colocado em circulação, através de endosso. Assim, se um título é endossado, o negócio original não pode ser invocado para opor o pagamento a esse endossatário. Vamos usar de um exemplo para melhor compreender. Imaginemos que Maria comprou um aparelho de som em uma determinada loja e pagou com um cheque para ser descontado em 30 dias. Como foi explicado anteriormente, o título é feito para circular, então a loja pegou o cheque de Maria e o repassou para uma financeira que antecipou o pagamento dele. o aparelho de som apresentou defeito e a loja se recusou a mandar para o conserto. Em virtude disso Maria foi ao banco para tentar impedir o pagamento do cheque através da sustação deste. Porém, ela é procurada pela financeira para realizar o pagamento do valor do cheque. Como este circulou e quem o está cobrando é um terceiro, pelo princípio da abstração, Maria não poderá usar a causa de origem do cheque para se opor ao pagamento dele. Ela será obrigada a pagá-lo à financeira e depois, se for o caso, reivindicar seus direitos perante a loja. • Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Vários são os julgados que mencionam a abstração dos títulos, impossibilitando que após a circulação a causa de origem seja invocada. Porém, não tendo havido circulação, poderá ser buscada a acusa de origem como se pode ver no REsp i22818o/RS, publicado em 28/03/2011: (. .. ) 2. o cheque ostenta a natureza de título de crédito, portanto, é não-causal (CPC, art. 585, 1), ou seja, em decorrência de sua autonomia e abstração, não comporta discussão sobre o negócio jurídico originário. Entretanto, se o cheque não houver circulado, estando, pois, ainda atrelado à relação jurídica originária estabelecida entre seu emitente (sacador) e seu beneficiário (tomador), é possível que se discuta a causa debendi.
3. Na hipótese em exame, conforme consta do v. aresto hostilizado, não houve circulação do cheque emitido e, a seguir, sustado. É. portanto, devida a oposição de exceções pessoais ao cumprimento da ordem de pagamento contida no referido título de crédito. (. .. ) 8. Recurso especial a que se nega provimento.
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TÍTULOS DE CRtOITO
Houve situações, porém, que esse princípio começou a sofrer mitigações. A situação que implicou tal discussão tem origem nas práticas bancárias.Começou-se a tornar comum, na prática bancária, a exigência da assinatura de nota promissória como garantia acessória aos contratos de abertura de crédito. Seria a seguinte situação: a pessoa faz um contrato de cheque especial, mas não se sabe qual o valor desse crédito ela irá utilizar. Assim as instituições bancárias fazem com que o cliente assine uma nota promissória sem preencher o valor; que somente será preenchido se houver vencimento da dívida do cheque especial, sem que haja o correto pagamento. Esse procedimento pode trazer prejuízos ao cliente caso o banco execute o título. É que como foi tratado acima, em obediência aos princípios da autonomia e abstração, o valor firmado na nota promissória pode ser exigido independente de discussão acerca do contrato que, teoricamente deu causa à sua emissão. E é daí mesmo que surgem os riscos ao emitente do título que servirá de garantia a um contrato de empréstimo bancário, pois a instituição financeira terá a posse de um título executivo extrajudicial cuja discussão estará limitada apenas às exigências formais do documento, além de uma possível cobrança de crédito já extinto ou quitado. Sendo assim, nesses casos específicos, a doutrina e a jurisprudência começaram a reconhecer a falta de abstração dessa nota promissória, permanecendo vinculada ao contrato de abertura de crédito, ou seja, se ela for executada, o devedor poderá sim argumentar sobre a causa de origem para se opor ou questionar aspectos do pagamento. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
De tão recorrente o tema, o S1] sumulou o assunto: Súmula n• 258: ·A nota promissória vinculada a contrato de abertura de crédito não goza de autonomia em razão da iliquidez do título que a originou." Primeiro há que se ressaltar certa imprecisão técnica na súmula, pois o que é mitigado é a abstração e não a autonomia da nota promissória. Não se pode, porém, generalizar a situação. Observemos que a súmula se refere tão somente à nota promissória vinculada a contrato
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de abertura de crédito e não a toda e qualquer nota promissória que esteja sendo utilizada para o pagamento de um contrato.
5.2. Princípio da Autonomia O segundo princípio, apesar de guardar certa semelhança com o primeiro, não é idêntico a ele e possui consequências de extrema relevância. De acordo com o Princípio da Autonomia das relações cambiárias, cada relação jurídica existente no título é autônoma uma da outra. Isso quer dizer que o possível vício em uma relação não contamina as demais. Cada relação, portanto, será vista separadamente, como se formassem obrigações e direitos separados. Como se verá mais adiante, o título de crédito pode envolver diversas pessoas, como endossantes e avalistas. De acordo com a autonomia, cada participante só poderá opor exceções a outros que sejam de caráter pessoal e diretamente ligada à sua relação" Vamos novamente pensar em um caso prático para compreender melhor as consequências do princípio. Imaginemos que Antônio passou uma nota promissória para Pedro para pagar um serviço prestado por ele. Como só poderia resgatar a promissória em 30 dias, Pedro a repassou para Carolina que depois a repassou para Fabiana. No dia do vencimento não houve pagamento da nota promissória e Fabiana buscou o pagamento de todos os devedores: Antônio, Pedro e Carolina. Carolina recusou-se a pagar, pois Fabiana não havia cumprido com o compromisso que fez com que ela lhe passasse a promissória. Pedro, sabendo disso, também se recusa pelo mesmo motivo. Ocorre que pelo princípio da autonomia, cada relação é independente uma da outra e Pedro não pode se valer da exceção que pertence a Carolina contra Fabiana. Pedro vai ter que pagar o título, assim como Antônio que é o devedor principal. Como será melhor analisado mais a frente, uma situação que terá implicações práticas importantes é a autonomia no caso do avalista do título. Esse princípio faz com que o avalista seja obrigado a pagar a obrigação ainda que seu avalizado tenha motivos para se recusar a fazê-lo.
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TÍTULOS DE CRÉDITO
• Como esse assunto foi cobrado em concurso? No concurso de organização do CESPE para a Magistratura/PB/2011, o enunciado da questão afirmava: "Considerando a aplicabilidade, no direito cambiário, dos princípios da cartularidade, literalidade e autonomia, bem como de outros deles decorrentes, assinale a opção correta." A opção correta continha a seguinte afirmativa : "Consoante o princípio da inoponibilidade, o devedor de dívida representada por título de crédito só pode opor ao terceiro de boa-fé as exceções que tiver contra este e as fundadas nos aspectos formais do título."
5.3. Princípio da Incorporação ou cartularidade O terceiro princípio já foi mencionado quando tratamos das características dos títulos e tem uma relevância prática grande. De acordo com o princípio da incorporação ou carturalidade, para ser título de crédito, a obrigação deve estar representada por um documento cartular, ou seja, um papel em que se especifica a obrigação. Destarte, resume-se o crédito a termo. Tal cártula deve ser indepen dente de qualquer outro documento, não pode estar, por exemplo, escrita no meio de um contrato. Deve ter a mobilidade necessária para a circulação do crédito. Pelo princípio da cartularidade o credor do título de crédito deve provar que se encontra de posse do documento para exercer o direito nele mencionado, o que se conclui é que, no regime jurídico-cambial a presença do documento no aspecto físico é essencial para que se tenha direito à titularidade do crédito e que possa transferir o título exercendo a negociabilidade. A posse da cártula também garante a executividade, pois só com a existência de um título é que se pode entrar diretamente com o processo de execução. • Como esse assunto foi cobrado em concurso? No exame organizado pela CESGRANRIO para Advogado/INVEST RI0/2011, o enunciado pedia para identificar o princípio da cartularidade, afirmando que: "O principio segundo o qual o crédito constante de título de crédito deve vir representado através da respectiva cártula é o princípio da:"
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
Também não se trata de um princípio absoluto que está sendo transformado pela tecnologia. Trata-se das duplicatas virtuais. Em virtude da necessidade de celeridade nos tratos negociais que envolve a duplicata, ela começou a ser feita em computador, não se tendo mais o documento cartular. Essa utilização foi se tornando tão importante que o Código Civil em 2002 reconheceu a existência desse tipo de título preconizando no § 3° do art. 889 que: § 3° Otítulo poderá ser emitido a partir dos caracteres criados
em computador ou meio técnico equivalente e que constem da escrituração do emitente, observados os requisitos mínimos previstos neste artigo.
Essa situação da duplicata virtual será melhor detalhada quando formos estudar de maneira específica esse título. 5.4. Princípio da Literalidade Por fim, chega-se ao nosso último princípio norteador dos títulos de crédito. Trata-se do princípio da literalidade que preconiza que para qualquer obrigação ou direito ser válido tem que estar escrito na cártula. No que diz respeito a esse princípio, pode-se observar que as garantias e direitos serão exclusivamente as que estão presentes no conteúdo do título. O valor descrito não pode ser ultrapassado, e mesmo que o valor devido seja menor do que o do título, todo o montante registrado no mesmo deverá ser pago. A literalidade firma todas as obrigações das pessoas que assinaram a cambial, permitindo posteriormente, cobrar a totalidade do devedor. pelo fato do crédito poder ser transacionado. Esse princípio garante a facilidade da circulação do crédito incorporado ao título. Uma consequência prática que se pode destacar do princípio da literalidade é o caso de alguém fazer um pagamento parcial da obrigação do título. Imaginemos, por exemplo, uma nota promissória cujo valor total seja de RS io.000,00, mas no dia do vencimento o devedor só possui a quantia de RS 5.000,00 e solicita ao credor que aceite esse valor e dali a uma semana receber o restante. Caso o credor aceite 294
TÍTULOS DE CRÉDITO
fazer esse acordo com devedor deve se atentar para o fato de que o recibo do pagamento dos RS 5.000,00 deve ser feito no próprio título, ou seja, deve estar escrito em algum lugar que naquele dia foi feito o pagamento parcial daquele valor. Isso porque, mesmo já estando vencido, o título ainda pode circular e uma pessoa que venha a recebê-lo precisa ter conhecimento que o crédito não é mais de RS 10.000,00 e sim de RS 5.000,00. Esse princípio é fundamental para garantir a circulação do título de crédito . ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova organizada pelo CESPE para a Magistratura/ES/2ou, o enunciado pedia para assinalar a alternativa que contivesse a resposta correta sobre os títulos de crédito e a resposta era: "De acordo com a doutrina, o princípio da literalidade tem consequências favoráveis e contrárias tanto para o credor quanto para o devedor, o qual não será obrigado a mais do que estiver mencionado no documento." Resumo dos princípios dos títulos de crédito Abstração
Autonomia
Cartularidade
Literalidade
Título se desvincula da causa de origem quando posto em circulação
Cada relação estabelecida no título é independente da outra
Todo título deve ser representado por um documento formal e independente
Toda e qualquer obrigação só é válida se estiver escrita na cártula
6. CLASSIFICAÇÃO DOS TÍTULOS Várias consequências dos institutos específicos que iremos estudar adiante dependem da classificação dos títulos. Aqui nós iremos tratar das classificações mais importantes, sendo que é possível encontrar outras divisões de acordo com o foco de estudo.
6.1. Quanto ao conteúdo da declaração cartular Até a entrada em vigor do Código Civil de 2002, os títulos de crédito tinham suas leis específicas e somente poderiam ser criados de acordo com elas. Porém, como já foi tratado neste estudo, o Código Civil criou
295
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
uma teoria geral para os títulos de crédito, permitindo que se crie documentos que, desde que sigam as regras gerais de formalidade, poderão ser classificados como títulos de crédito. Porém, os títulos que têm lei específica continuam a existir e suas legislações não foram revogadas. havendo uma diferença marcante entre os títulos que possuem legislação específica e os que não têm. Sendo assim, se a declaração contida na cartular seguir uma lei específica, diz-se que o título será típico e se não tiver estaremos diante de um título atípico. São títulos típicos: letra de câmbio, nota promissória, duplicata e cheque. São exemplos títulos atípicos: cédula de crédito, conhecimento de transporte, debêntures. O principal momento em que essa classificação deverá ser observada é no caso do Código Civil ter trazido um regulamento que seja contrário ao que se tinha nas legislações específicas. Pelo princípio da especialidade das leis, trazido pela Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro, uma lei geral não revoga a lei especial, mesmo que posterior a ela. Assim, os títulos típicos continuarão a seguir seu regulamento próprio e os títulos atípicos irão seguir o que dispõe o Código Civil. 6.2. Quanto à prova da causa de emissão
Ponto pacífico é que os títulos derivam sempre de um negócio jurídico. Não há como o título surgir "do nada", então vai haver sempre algum negócio que foi responsável pela sua emissão. No entanto haverá títulos em que esse negócio precisa ser comprovado para que o título tenha existência válida. Isso quer dizer que não é qualquer negócio jurídico que pode embasar a criação de determinados títulos que somente podem estar ligados a uma causa específica. Já outros títulos podem ser criados com base em qualquer tipo de negócio, sendo totalmente desnecessário fazer prova de qualquer ato para o título ter validade. De acordo com essa classificação, os títulos serão divididos em abstratos e causais. O título causal mais conhecido é a duplicata. A duplicata somente pode ser emitida se tiver um negócio de compra e venda mercantil ou
196
TÍTULOS DE CRÉDITO
uma prestação de serviços que a origine. Não se pode, por exemplo, emitir uma duplicata a partir de uma doação. Também é titulo causal a cédula de crédito bancária. Para ser emitida ela precisa de uma operação de crédito realizada junto a uma instituição financeira. Nos dois casos, se ficar provado que não houve a causa de origem específica, os títulos poderão ser considerados nulos. Já o cheque a nota promissória são títulos abstratos. Podem ser emitidos por qualquer motivo, sem que se precise fazer prova de absolutamente nada. ~
Importante!
Não se pode confundir título abstrato com princípio da abstração. Mesmo os títulos causais serão regidos pelo princípio da abstração, ou seja, se uma duplicata, por exemplo, for colocada em circulação através do endosso, sua causa de origem não poderá ser invocada para opor o pagamento. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova organizada pela FCC para a Magistratura/MS/2010, o enunciado da questão pedia para marcar a alternativa correta, no que diz respeito às duplicatas e a resposta era: "só pode ser emitida, se o crédito por ela representado for oriundo de relação de compra e venda de mercadorias ou prestação de serviços."
6.3. Quanto
à
circulação
Que o título é feito para circular, isso já foi bastante citado aqui, mas a forma de circulação poderá variar de acordo com a forma como o título for classificado. Não necessariamente o título precisa indicar quem é o seu credor, o beneficiário do crédito. Nesse caso estaremos diante de um título ao portador, que tem como característica o fato de quem estiver portando a cártula e a apresentar ao devedor será o legítimo credor. Nesse caso o título poderá circular da maneira mais simples que existe, pela simples tradição da cártula. Assim, sendo um título ao portador, se o credor quiser ceder o crédito, basta entregar a quem quer que seja para ter a circulação do crédito. Além disso, no título ao portador, aquele que se apresenta, portanto, a cártula será o legitimo credor.
297
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~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame da Magistratura/PR/2010, organizada pela PUC/PR, foi pedido que se assinalasse a alternativa correta sobre os títulos de crédito e a resposta certa era: UEm se tratando de título ao portador, seu possuidor tem direito à prestação nele indicada mediante a sua simples apresentação ao devedor, sendo a prestação devida ainda que o título tenha entrado em circulação contra a vontade do emitente." Porém, haverá situações em que o título indica, nominalmente, quem é o seu beneficiário, o credor da obrigação cambiária. Trata-se do título nominal. Nesse caso será necessário um requisito um pouco mais formal para que o título possa circular. O título nominal ainda irá se subdividir em título nominal "à ordem" e título nominal "não à ordem". No primeiro caso, a circulação do crédito se dará através do endosso do título e no segundo o título somente poderá circular através da cessão comum de crédito, prevista no direito civil. Estudaremos melhor esse assunto quando formos tratar do endosso. 6.4. Quanto
à
pessoa do emitente
o emitente normalmente é o devedor principal do título, aquele que quando cumprir sua obrigação não existirá mais o título. Se esse emitente for uma pessoa física ou uma pessoa jurídica de direito privado, fala-se que o título será privado, mas se o emitente for um órgão público, público também será o título. Essa classificação traz consequências importantes quando se fala na sua execução. A competência será diferente, os meios de execução e a constrição de bens, dentre outros detalhes. 6.5. Quanto ao prazo O elemento tempo sempre vai estar presente no título de crédito, tendo em vista que sem ele não há crédito. Porém, esse tempo poderá ser variado. Se não houver diferença entre a data de emissão e a data de vencimento, o título será classificado como título à vista, mas se houver diferença entre as duas datas, o título será a prazo.
298
TÍTULOS OE CRÉDITO
No entanto, mesmo o título
à vista haverá um mínimo de tempo.
É o caso do cheque, por exemplo. No cheque há apenas uma data, que é a mesma para a emissão e para o vencimento. Porém, quando alguém recebe um cheque não há satisfação da obrigação até que o banco faça o desconto do mesmo. Dessa forma, haverá crédito, pois há o tempo entre o recebimento do cheque e seu desconto. Já títulos como a duplicata e a letra de câmbio são títulos a prazo, pois precisam de uma diferença entre a data de emissão e a data de vencimento. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No concurso para Advogado da Petrobrás/2010, da banca da CESGRANRIO, a questão pedia para identificar qual o tipo de vencimento de cada um dos títulos, sendo que a primeira afirmativa era verdadeira e dizia: "O título de crédito é o documento necessário para o exercício do direito literal e autônomo nele contido, somente produzindo efeitos quando se coaduna com os requisitos da lei." A segunda também era correta, pois afirmava: "A letra de câmbio é uma ordem de pagamento à vista ou a prazo." Já a terceira estava incorreta: "A nota promissória é uma ordem de pagamento a prazo." E as afirmativas quatro e cinco eram corretas: "A duplicata é uma ordem de pagamento à vista ou a prazo" e "cheque é uma ordem de pagamento à vista."
Quanto ao conteúdo de declaração cartular
Quanto à prova da causa de emissão
•Típico
•Abstrato
•Atípico
•Causal
1
Quanto à circulação
. .
Ao portador Nominal
Quanto à pessoa do emitente
Quanto ao prazo
•Privado
•À vista
• Público
•A prazo
7. ENDOSSO 7.1. Conceito Como já mencionado alhures, a principal característica do título de crédito é a sua cambiaridade, sua facilidade para fazer o crédito circular.
299
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Quando o título estiver ao portador essa facilidade é enorme, pois ocorre pela simples tradição, mas como já foi tratado no item anterior; haverá situações em que o título estará nominando o credor e a princípio somente ele poderia se apresentar como o beneficiário do título. Porém, exatamente para que esse título nominal também possa circular é que surgiu o endosso que será uma forma mais simples que a cessão de crédito, mas com o mesmo objetivo; alterar a figura do credor. Assim, pode-se conceituar o endosso como sendo um ato unilateral, solidário e autônomo, pelo qual se transfere um, alguns ou todos os direitos emergentes de um título. 7.2. Forma O endosso é prestado pela simples assinatura do endossante. Isso porque, o título de crédito é feito para circular; por isso tal circulação deve ocorrer de forma mais fácil possível. Vejamos o que diz a Lei Uniforme de Genebra - LUG (Decreto 57.663/66) e o Código Civil de 2002, respectivamente: Art. 13. o endosso deve ser escrito na letra ou numa folha ligada a esta (anexo). Deve ser assinado pelo endossante. O endosso pode não designar o benefício, ou consistir simplesmente na assinatura do endossante (endosso em branco). Neste último caso, o endosso para ser válido deve ser escrito no verso da letra ou na folha anexa. Art. 910. o endosso deve ser lançado pelo endossante no verso ou anverso do próprio título. 1° Pode o endossante designar o endossatário, e para validade do endosso, dado no verso do título, é suficiente a simples assinatura do endossante.
§
§ 2• A transferência por endosso completa-se com a tradição
do título. § 3° Considera-se não escrito o endosso cancelado, total ou
parcialmente.
Por isso que o endosso é ato unilateral de vontade, pois basta a assinatura do endossante, sua manifestação de vontade, para que o negócio tenha validade. 300
TÍTULOS DE CRÉDITO
Mais à frente iremos estudar o instituto do aval que também será formalizado pela simples assinatura, por isso, a doutrina acrescentou uma regra para a formalidade do endosso, para que não se confunda com o aval. Por se tratarem os títulos de créditos de bens móveis, é preciso que ocorra a tradição para que se complete a transferência do crédito. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No certame da banca CESPE para a Magistratura Federal/2• Região/2012, o enunciado afirmava: "Considerando que determinado título de crédito à ordem tenha sido endossado de acordo com o que estabelece o Código Civil, assinale a opção correta." A alternativa correta era a que tinha a seguinte afirmativa: "Sem a tradição do título, não se completará a transferência por endosso." Se o endossante for realizá-lo pela simples assinatura deverá fazê-lo no verso do título. Poderá endossar na parte da frente, mas nesse caso terá que colocar alguma expressão junto à assinatura para não deixar dúvidas de que se trata de endosso, como, por exemplo, escrever "por endosso" e assinar. ~
Importante!
O endosso pode ser presumido, pois uma vez que se caracteriza pela simples assinatura no verso do título, caso haja essa assinatura de um beneficiário do título poder-se-á presumir que ele endossou. Novamente pode-se observar que a lei não exigiu qualificação de quem realiza o endosso e nem que seja colocada data em que se realizou o endosso. Nada impede que tais informações sejam colocadas, pois podem até facilitar a busca de pagamento do título em caso de inadimplemento. Tanto o Código Civil quanto a LUG proíbem que o endosso seja parcial ou condicionado. Quem endossa, que é o beneficiário que está passando os direitos, fica sendo chamado de endossante e quem recebe o título por endosso fica conhecido como endossatário.
301
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Quem recebe o título por endosso poderá ter interesse em repassar o crédito a outrem e aí será necessário um novo endosso, se o título estava nominal a ele. Não há limites para o número de endossos e se houver mais de um passa-se a falar em cadeia de endosso . 7.3. Espécies De acordo com os direitos que transmite o endosso pode ser próprio ou impróprio. O endosso próprio é o comum, que transmite todos os direitos e deveres, transmite a propriedade do título. É o que é mais comum e o que originou a ideia de endosso. O endosso próprio ainda se subdivide. Ele pode ser em branco quando não indica o beneficiário (transforma um título nominal em título ao portador) ou em preto quando indicar para quem o título está sendo transmitido. Se o endossante apenas assinar ou escrever "por endosso" sem colocar mais nada, estaremos diante de um endosso em branco. Como não tem mais um beneficiário devidamente nominado, o título que era nominal se torna um título ao portador. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No certame da Procuradoria do TSE/SC/2010, organizado pela FEPESE, o enunciado da questão dizia que: "Sobre o endosso de título de crédito (cheque), assinale a alternativa correta, de acordo com a legislação pertinente (Lei F. n° 7.357/85)." E a resposta correta era a que afirmava: "Se o endosso é em branco, pode o portador transferir o cheque a um terceiro, sem completar o endosso e sem endossar." Porém, até por uma questão de segurança maior, o endossante poderá optar por indicar para quem ele está indicando o título. Seria o caso de antes da assinatura escrever "por endosso a Marcos de Almeida". Trata-se do endosso em preto e, nesse caso, o título continua sendo nominal. Caso o endossatário queira repassá-lo vai ter que se valer de um novo endosso.
302
TÍTULOS DE CRÉDITO
A segunda classificação do endosso é o impróprio que não transmite todos os direitos. Apenas os direitos de cobrar o título ou o direito de garantia. Divide-se em endosso mandato e endosso caução. O endosso mandato é aquele em que o endossatário atua em nome e por conta do endossante, não possuindo, entretanto, a disponibilidade do título, devendo agir no interesse do endossante - mandante. Qualquer endosso praticado por ele valerá como endosso mandato. O endossatário, mandatário pode endossar. É o que está previsto no art. 18 da LUG. Art. 18. Quando o endosso contém a menção "valor a cobrar" (valeur en recouvrement), "para cobrança" (pour encaissement), "por procuração" (par procuration), ou qualquer outra menção que implique um simples mandato, o portador pode exercer todos os direitos emergentes da letra, mas só pode endossá-la na qualidade de procurador.
O que acontece no caso é que o endossante não quer passar o crédito, mas apenas o direito de cobrar. Ele poderia fazer através de uma procuração comum, mas o intuito da LUG foi facilitar essa situação, permitindo que esse mandato que tem os mesmos efeitos de uma procuração, seja feito pelo endosso. A regra geral é que o endosso seja próprio, portanto, não há presunção de endosso mandato, tendo ele que estar expresso junto à assinatura. Aquele que recebe o título por endosso-mandato irá apenas agir na qualidade de procurador do credor e faz apenas os atos pertinentes à cobrança do título, dentro do mandato. Se o título era indevido e a cobrança realizada também, não responde o endossatário pelos danos que causar ao devedor, já que estava apenas agindo dentro dos limites de sua função. ~ Qual o entendimento do STJ sobre o assunto? Não deixa dúvidas o tribunal que se o endossatário está dentro dos seus poderes. não responde se cobrar título indevido, como se pode observar no AgRg no Ag 1415047/SC. publicado em 12/04/2012:
AGRAVO REGIMENTAL AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL ENDOSSO MANDATO. TfJULO SEM CAUSA. RESPONSABILIDADE DO ENDOSSATÁRIO. DANO MORAL QUANT\JM INDENIZATÓRIO FIXADO COM RAZOABILIDADE.
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i. -
No julgamento do REsp i.o63-474/RS, pela Segunda Seção, no dia
28.09.2011, DJe 17.11.2011, ficou pacificado que "só responde por danos
materiais e morais o endossatário que recebe título de crédito por endosso-mandato e o leva a protesto se extrapola os poderes de mandatário ou em razão de ato culposo próprio, como no caso de apontamento depois da ciência acerca do pagamento anterior ou da falta de higidez da cártula."
(. ..)
Já o endosso caução é utilizado quando o endossante deposita ou dá o título, perante o endossatário, como garantia de uma dívida. Nesse caso, o endossatário também não terá a propriedade do título e não poderá reendossá-lo. Está previsto no art. 19 da LUG. Art. i9. Quando o endosso contém a menção "valor em garantia", "valor em penhor" ou qualquer outra menção que implique uma caução, o portador pode exercer todos os direitos emergentes da letra, mas um endosso feito por ele só vale como endosso a título de procuração.
Caução como se sabe é garantia. Assim, o título passado nesse tipo de endosso ficará na posse do endossatário apenas para garantir que o endossante irá cumprir a obrigação. Isso acontecendo, o endossante recupera o título e invalida o endosso caução, mas se ele não puder cumprir a obrigação, aí o endossatário passará a ter a propriedade definitiva do título. Assim como acontece no endosso mandato, o endosso caução não é presumível, devendo estar designado expressamente junto da assinatura do endossante. • Em branco Endosso Próprio { • Em preto
• Endosso-mandato Endosso Impróprio { • Endosso-caução
7.4. Responsabilidade do endossante Questão importante é sobre a responsabilidade decorrente do endosso. A Lei Uniforme de Genebra, no seu art. 15, diz que o endossante,
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TÍTULOS DE CRtDITO
se não colocar uma cláusula em contrário, se torna garantidor do pagamento e do aceite do título. Sendo assim, quando o endossante não faz nenhuma ressalva, ele se torna co-obrigado pelo pagamento do título. Claro que ele não é devedor principal e se for demandado terá direito de regresso tanto em relação ao devedor principal, quanto em relação aos endossantes anteriores. Porém o Código Civil, no seu art. 914, diz que o endossante somente se tornará garantidor se colocar expressamente.
o tratamento trazido pelo Código Civil é, portanto, o oposto da LUG. De acordo com a lei Civil, somente se colocar expressamente é que o endossante se responsabiliza pelo pagamento do título. Essa questão será resolvida pelo princípio da especialidade das leis. A LUG trata especificamente da letra de câmbio e da nota promissória. Além disso, temos o art. 23 da Lei do cheque que traz tratamento igual ao da LUG, bem como o fato de as duplicatas serem regidas supletivamente por esta Lei. Sendo assim, para a letra de câmbio, nota promissória, cheque e duplicata (títulos chamado de típicos) vale o art. 15 da LUG. Para os demais (título atípicos) valerá o Código Civil. Vamos entender melhor o que é essa responsabilidade dos endossantes. Imaginemos que Carlos emitiu uma nota promissória em favor de Rafael e este endossou em preto a nota para Heloísa. Heloísa, porém, também precisou fazer o título circular e endossou em branco para Joaquim. Teremos, dessa forma, as seguintes figuras no título: Carlos que é o emitente, Rafael e Heloísa que são os endossantes. Caso o título vença e não haja pagamento, por ser uma nota promissória e aplicar-se o art. 15 da LUG, os três se tornam devedores solidários do valor do título. Em virtude do princípio da autonomia das relações cambiárias que foi tratado anteriormente, Joaquim poderá cobrar de todos três - os devedores (Carlos, Rafael ou Heloísa), sem nenhuma necessidade de se observar ordem ou algum requisito. Obviamente, os endossantes são devedores solidários. Como a obrigação é apenas de garantia, eles não são os devedores principais. Assim, se Rafael ou Heloísa pagarem, terão direito de regresso, mas somente em relação a quem estava antes na cadeia de endosso. 305
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
Desse modo, se Heloísa pagar o título terá direito de regresso contra Rafael ou Carlos, mas se Rafael pagar somente terá direito de regresso contra Carlos. Se o pagamento for feito por Carlos o título se extingue, pois foi cumprida a obrigação principal. Agora se essas mesmas figuras tivessem endossando uma cédula de crédito, por exemplo, que segue o Código Civil, só teriam essa responsabilidade pelo pagamento se tivessem escrito "por endosso com garantia de pagamento" quando do ato do endosso. Sem essa ressalva, o endossante não teria responsabilidade. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova organizada pela FCC da Promotoria/CE/2011, encontrou-se uma questão que pedia para analisar várias afirmativas a respeito do endosso. A primeira era correta e afirmava: "No endosso pignoratício, os co-obrigados não podem invocar contra o portador as exceções fundadas sobre as relações pessoais deles com o endossante, a menos que o portador, ao receber a letra. tenha procedido conscientemente em detrimento do devedor." A segunda era incorreta: "O endosso, que pode ser parcial, deve ser puro e simples. não se admitindo subordiná-lo a condição." O erro é dizer que o endosso pode ser parcial. A terceira afirmativa que dizia "o mandato que resulta de um endosso por procuração não se extingue por morte. ou sobrevinda incapacidade legal do mandatário" foi considerada correta. Já a quarta assertiva não era correta e afirmava: "o endossante, salvo cláusula em contrário, não é garante da aceitação ou do pagamento da letra." E a última afirmativa era "o endossante pode proibir novo endosso, e neste caso, não garante o pagamento às pessoas a quem a letra for posteriormente endossada" e também estava correta.
7.5. Título não
à
ordem
Para que o título seja transmitido através do endosso ele precisa ser um título que contenha a cláusula "à ordem" que caso nada esteja escrita, poderá ser presumida .
306
TÍTULOS DE CRÉDITO ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame para a Magistratura/DF/2011, organizado pelo TJ·DFT, o enunciado da questão juntamente com a resposta correta formavam a seguinte afirmativa: HA letra de câmbio, por expressa disposição legal:# "é transferível por endosso, mesmo não contendo explícita a dáusula à ordem#.
Porém, a fácil circulação não é uma característica absoluta dos títulos de crédito, podendo o emitente, ou até mesmo qualquer endossante não querer que o título circule por endosso e para tanto bastará incluir no título uma cláusula "não à ordem". O art. 11 da LUG trata da situação da seguinte maneira: Art. 11. Toda letra de câmbio, mesmo que não envolva expressamente a cláusula à ordem, é transmissível por via de endosso. Quando o sacador tiver inserido na letra as palavras "não à ordem", ou uma expressão equivalente, a letra só é transmissível pela forma e com os efeitos de uma cessão ordinária de créditos.
Observemos que a cláusula "não à ordem" não significa que o título não poderá mais circular. Poderá circular "pela forma e com os efeitos de uma cessão ordinária de crédito." Não irá se valer do endosso e as consequências práticas são enormes. Mesmo no caso do cheque, que já vem previamente com a cláusula " à ordem", o emitente poderá riscá-ta e colocar a cláusula "não à ordem" que não irá significar nenhuma rasura no título. Primeiramente no que diz respeito à forma, terá que haver um contrato de cessão de crédito, sem, portanto, a facilidade da simples assinatura do endossante. No entanto, a diferença principal, sem dúvidas, diz respeito às responsabilidades. Como a cessão comum de crédito não é um instituto do direito cambiário, não se aplicará, no caso, o princípio da abstração e uma obrigação estará totalmente relacionada com a outra. Além disso, na cessão comum de crédito deve-se observar o que dispõe o art. 294 do Código Civil que afirma que: "o devedor pode opor ao cessionário as exceções que lhe competirem, bem como as que, no momento em que veio a ter conhecimento da cessão, tinha
307
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contra o cedente." Dessa forma, se o emitente do título colocar uma cláusula "não a ordem", não se sujeitará mais aos efeitos do princípio da abstração. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova organizada pela EJEF para a Magistratura/MG/2007, o enunciado da questão pedia para assinalar a alternativa correta quanto às duplicatas e a resposta era a seguinte: "A duplicata que contenha a expressão "não à ordem# é válida, mas só circula com a forma e com os efeitos da cessão de crédito."
7.6. Endosso tardio ou póstumo Diz-se endosso tardio ou também conhecido como endosso póstumo, aquele que é realizado após o vencimento do título. Teoricamente, ele não deveria existir, pois se o título está vencido e não foi quitado, o crédito já está viciado e não há interesse econômico na circulação desse tipo de crédito, mas é comum tal endosso acontecer, até porque se tem muito comumente a prática da venda de crédito, mesmo que vencido. O Código Civil, no art. 920, não colocou nenhuma diferença entre o endosso feito antes ou depois do vencimento, apontando que: "o endosso posterior ao vencimento produz os mesmos efeitos do anterior." Não há nenhuma diferença.
Há situações que nem mesmo é possível saber se o endosso aconteceu antes ou após o vencimento, pois como já foi dito, a data não é requisito para a validade do endosso. Já a LUG irá separar a situação em dois casos diferentes. Preconiza o art. 20: Art. 20. O endosso posterior ao vencimento tem os mesmos efeitos que o endosso anterior. Todavia, o endosso posterior ao protesto por falta de pagamento, ou feito depois de expirado o prazo fixado para se fazer o protesto, produz apenas os efeitos de uma cessão ordinária de créditos. Observemos que a LUG fala em endosso após o vencimento, mas antes do protesto, e endosso após o vencimento e também após a realização de protesto.
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TÍTULOS DE CRÉDITO
Se o endosso for antes do protesto, a situação fica igual o tratamento do Código Civil e o endosso tardio não terá nenhuma diferença para o que foi feito antes do vencimento, mas se o endosso for datado após o protesto seguirá a mesma situação da cláusula "não à ordem" e o endosso terá os efeitos de uma cessão comum de crédito.
8. AVAL
8.1. Conceito Um dos elementos para se ter um título de crédito é a confiança. Isso porque o credor confia que irá receber o pagamento do crédito na data aprazada. Porém, com o crescimento da inadimplência e com a total patrimonialização do direito das obrigações, as relações de crédito começaram cada vez mais a necessitar de garantias. Se não se começasse a pensar em garantias para o caso do inadimplemento do crédito, este tenderia até mesmo a acabar, pois o prejuízo dos credores poderia ser tão grande que não iria mais compensar a concessão de crédito. A garantia de uma maneira geral representa um bem, um ato ou uma palavra com que se assegura o cumprimento de uma obrigação. No aspecto jurídico as garantias são de dois tipos: reais e pessoais.
As garantias reais recaem sobre coisas, ou seja, bens móveis ou bens imóveis. No direito brasileiro temos quatro tipos de garantias reais, quais sejam: Penhor; Anticrese; Hipoteca; Alienação fiduciária em garantia. As garantias pessoais também conhecidas como fidejussórias são representadas pela obrigação acessória em que uma pessoa assume perante o credor, se responsabilizando pelo pagamento da dívida, caso o devedor não pague ou não possa cumprir, total ou parcialmente com a sua obrigação.
As garantias pessoais, por não vincularem nenhum tipo de bem material, são respaldadas na confiança, probidade e caráter de quem está dando a garantia. No direito brasileiro temos basicamente dois tipos de garantias pessoais: fiança e aval.
309
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
O aval é a garantia pessoal de pagamento de um título de crédito dada por terceiro (avalista), pessoa física ou jurídica ao emitente devedor ou endossante (avalizado). ~
Importante!
Oaval é a garantia de uso exclusivo para as obrigações emanadas em título de crédito, não existindo avalista em contrato ou qualquer outra relação. Poderá ser garantida por aval, qualquer obrigação do título, ou seja, do devedor principal ou de qualquer devedor solidário, como os endossantes. 8.2. Forma Como se vê, o aval só pode ser prestado em título de crédito e, por isso, tem natureza jurídica de direito cambiário. Dessa maneira, de acordo com o já abordado princípio da literalidade, ele só pode ser dado no título, mas se configura pela simples assinatura do avalista na parte da frente do título. O avalista pode avalizar qualquer co-obrigado no título (devedor principal ou endossantes). Assim, ele deve indicar a pessoa que está avalizando, se não o fizer estará dando o aval em favor do devedor principal, vejamos o que diz a LUG e o Código Civil: Art. 31. Oaval é escrito na própria letra ou numa folha anexa.
Exprime-se pelas palavras "bom para aval" ou por qualquer fórmula equivalente; e assinado pelo dador do aval. O aval considera-se como resultante da simples assinatura do dador aposta na face anterior da letra, salvo se se trata das assinaturas do sacado ou do sacador. Oaval deve indicar a pessoa por quem se dá. Na falta de indicação, entender-se-á pelo sacador. Art. 898. Oaval deve ser dado no verso ou no anverso do próprio título. § i• Para a validade do aval, dado no anverso do título, é sufi-
ciente a simples assinatura do avalista. § 2° Considera-se não escrito o aval cancelado.
310
TÍTULOS OE CRÉDITO
Assim como ocorre no endosso, não há proibição para que o aval seja prestado no verso do título, mas nesse caso, para que não haja confusão, a assinatura vai ter que estar acompanhada da indicação de aval, por exemplo, com a expressão "por aval".
o avalista não precisa se qualificar; nem é preciso datar o aval, mas aqui também não há nenhum impedimento para se colocar tais informações. Situação dúbia é sobre a parcialidade do aval. O art. 30 da LUG afirma que a obrigação pode ser garantida "no todo ou em parte por aval." Já o parágrafo único do art. 897 do Código Civil é taxativo ao afirmar que: "é vedado o aval parcial." A solução para esse tratamento legislativo oposto é a mesma para o caso da responsabilidade dos endossantes. Os títulos típicos seguem com a sua legislação especial e os títulos atípicos serão regidos pelo Código Civil. Assim, a letra de câmbio, por exemplo, poderá contar com aval parcial, já um conhecimento de transporte somente poderá se valer do aval total da obrigação. A 1Jornada de Direito Comercial do Conselho da Justiça Federal firmou entendimento sobre o tema : Enunciado n• 39: Não se aplica a vedação do art. 897, parágrafo único, do Código Civil, aos títulos de crédito regulados por lei especial, nos termos do seu art. 903, sendo, portanto, admitido o aval pardal nos títulos de crédito regulados em lei especial. • Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova organizada pela FGV do Exame Unificado da OAB/Julho/2011, foi pedido para marcar a alternativa correta em relação ao Direito Cambiário. A resposta correta era Mo aval dado em uma nota promissória pode ser parcial, ainda que sucessivo".
8.3. Direitos e obrigações do avalista
o avalista
que paga o título adquire direito de regresso, já que ele não é o devedor principal, é só o garantidor. Esse direito será autônomo. Isso quer dizer que nenhuma exceção ao pagamento, que não lhe seja pessoal poderá ser oposta contra ele. Exemplo: caso um avalista
317
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
pague a obrigação e vá exercer seu direito de regresso contra o devedor principal, este não pode alegar que o título foi usado para pagar um negócio que não foi cumprido. Porém sua obrigação também é autônoma e persistirá ainda que existir um vício na relação que ele está garantindo, salvo se for um vício de forma. Assim, as exceções que são pessoais do avalizado não podem ser usadas pelo avalista para se opor ao pagamento. Essa é uma diferença importante do aval para a fiança que é obrigação acessória. Tais questões são encontradas no art. 32 da LUG e no art. 899 do Código Civil. Quando for exercer seu direito de regresso, para saber contra quem o avalista o terá, a lei fala que ele assume a mesma posição de seu avalizado na cadeia de endosso. Conclui-se, assim, que o avalista terá direito de regresso contra o seu próprio avalizado e contra todos que seu avalizado teria.
~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Várias são as situações em que o Tribunal reconhece a autonomia da obrigação do avalista como foi colocado em acórdão presente no Informativo de Jurisprudência n° 532/2013: DIREITO EMPRESARIAL. EXECUÇÃO DE AVALISTA DE NOTA PROMISSÓRIA DADA EM GARANTIA DE CRÉDITO CEDIDO POR UFACTORING". Para executar, em virtude da obrigação avalizada, o avalista de notas promissórias dadas pelo faturizado em garantia da existência do crédito cedido por contrato de factoring, o faturizador exequente não precisa demonstrar a inexistência do crédito cedido. Com efeito, ainda que as notas promissórias tenham sido emitidas para garantir a exigibilidade do crédito cedido, o avalista não integra a relação comercial que ensejou esse crédito, nem é parte no contrato de fomento mercantil. Na condição de avalista, questões atinentes à relação entre o devedor principal das notas promissórias e a sociedade de fomento mercantil lhe são estranhas. Isso decorre da natureza pessoal dessas questões e da autonomia característica do aval. Assim, na ação cambial somente é admissível defesa fundada em direito pessoal decorrente das relações diretas entre devedor e credor cambiários, em defeito de forma do título ou na falta de requisito necessário ao exercício da ação. REsp i.305.637-PR, Rei. Min. Nancy Andrighi, julgado em 24/9/2013.
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TÍTULOS DE CRÉDITO
• Qual o entendimento do STF sobre o assunto?
O tribunal superior também tem acórdãos que explanam esse entendimento. Apesar de antigo, publicado em o6/02/1981, a ementa do AR 815/ CE demonstra o entendimento que não sofreu alterações para os dias atuais, vejamos: (. ..)
iii. Oacórdão rescindendo ao entender que a obrigação do avalista e autônoma e independente, somente podendo alegar direito próprio, não contrariou a lei, nem ofendeu a coisa julgada invocada na petição inicial (cpc de 1939, art. 798, i, "b" e "c"). iv. Declaratória não conhecida e rescisória julgada improcedente.
8.4. Espécies O aval pode ser simples ou plural. No aval simples ter-se-á um avalista para cada obrigação. Pode até ter mais de um avalista no mesmo título, mas cada um estará garantindo uma obrigação diferente. Pensemos que em uma duplicata, Fernanda avalizou Márcia, que era a devedora principal e Mauro avalizou o comerciante Pablo, que endossou a duplicata para o banco. No caso temos dois avais simples no mesmo título. Já no aval plural será encontrado mais de um avalista para a mesma obrigação. O aval plural pode ser sucessivo ou simultâneo. No aval sucessivo, um avalista garante outro avalista. No exemplo dado acima, seria como se Mauro avalizasse Fernanda, ou seja, ele seria avalista do avalista. Formaríamos uma cadeia de avais, que seguirá situação semelhante da cadeia de endosso. Já no aval simultâneo teremos dois ou mais avalistas garantindo diretamente o mesmo avalizado. Também pegando o mesmo exemplo da duplicata, seria como se Mauro avalizasse Márcia, juntamente com Fernanda. Os dois avalistas estariam na mesma posição de devedores.
373
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
AVAL SIMPLES: Márcia
...
.
Fernanda
Pablo
Banco
...
Mauro
.
AVAL PLURAL - SUCESSIVO: Márcia
...
Pablo
Banco
Fernanda
...
Mauro
Aval Plural - Simultâneo Márcia
Fernanda
.
Pablo
Banco
Mauro
A principal diferença nos avais plurais é com relação ao direito de regresso entre os avalistas. No aval sucessivo forma-se uma cadeia de avais, sendo que o avalista que paga somente pode cobrar do avalista que estiver antes na cadeia. No exemplo acima se Mauro pagar poderá entrar com o regresso no valor total contra Fernanda, mas se for ela quem fizer o pagamento, não pode cobrar de Mauro. Já no aval simultâneo, os avalistas estão na mesma condição, possuindo exatamente a mesma obrigação, existindo entre eles a solidariedade comum do direito civil, ou seja, no caso de direito de regresso cada um somente pode cobrar a quota parte do outro. Voltando ao exemplo acima, se o aval for simultâneo e Mauro pagar, poderá cobrar a metade do valor de Fernanda e vice-versa. Ambos podem cobrar o valor total de Márcia que é a devedora principal. 314
TÍTULOS OE CRÉDITO
Se o título contiver duas assinaturas de avalistas no verso do título, será presumido o aval simultâneo, pois para que alguém possa avalizar um codevedor, tem que colocar expressamente. ~
Qual o entendimento do STF sobre o assunto?
Apesar de bastante antiga, permanece em vigor a súmula do STF que diz o seguinte: •súmula n• 189 - Avais em branco e superpostos consideram-se simultâneos e não sucessivos.•
8.5. Aval x Fiança Como foi explicado acima, têm-se hoje no direito brasileiro duas espécies de garantia pessoal, o aval e a fiança. Apesar de fazerem parte da mesma espécie de garantia, são institutos que possuem diferenças cruciais. O quadro abaixo apresenta essas principais diferenças. Aval
Fiança
Natureza Comercial
Natureza Civil ou Comercial
Só pode ser prestada no título
No próprio documento ou em separado
Declaração unilateral de vontade
Contrato
Somente obrigação líquida
Obrigação líquida ou ilíquida
Obriga-se perante pessoa indeterminada
Obriga-se perante pessoa determinada
Obrigação autônoma
Obrigação acessória
Não comporta benefício de ordem
Comporta benefício de ordem
Pode ser presumido
Não pode ser presumido
Puro e simples
Pode ser condicionado
Das diferenças acima, três merecem ser mais bem delimitadas. A primeira delas aponta uma vantagem do aval para a fiança. Como o aval somente pode garantir obrigações decorrentes de título
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ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
de crédito e a obrigação deste deve ser sempre líquida e certa, o avalista sempre se obrigará por valor líquido e certo, já sabendo desde o momento em que se obrigou, qual poderá ser sua responsabilidade. Já a fiança, como ela pode garantir qualquer relação contratual, poderemos ter uma obrigação totalmente ilíquida. Pensemos, por exemplo, em alguém que afiança um contrato com prestações periódicas. Esse fiador não tem como saber qual será sua responsabilidade, pois irá depender de quantas parcelas o devedor principal ficar inadimplente. Já a outra diferença que se quer apontar, mostra uma desvantagem do aval em relação à fiança, que é a questão da autonomia. Como já foi citado no momento da análise do princípio da autonomia, o avalista permanecerá obrigado ainda que a obrigação de seu avalizado contenha um vício, pois ele não pode invocar exceções que não de caráter pessoal. Já a fiança tem caráter acessório, o que faz com que qualquer vício na obrigação do devedor principal possa ser utilizado pelo fiador para também se opor ao pagamento. A terceira diferença que se aponta é que, também em virtude da autonomia das relações cambiárias, o aval não comporta benefício de ordem, isso é, o avalista pode ser demandando antes mesmo que seu avalizado o tenha sido. Já na fiança a regra é exatamente o contrário. O art. 827 do Código Civil preconiza que: "O fiador demandado pelo pagamento da dívida tem direito a exigir, até a contestação da lide, que sejam primeiro executados os bens do devedor." Importante lembrar que o art. 828 possibilita que o fiador poderá renunciar a esse benefício e normalmente é isso que nós vemos estipulados nos contratos de fiança, mas a regra legal é pela existência do benefício de ordem.
9. PROTESTO 9.1. Conceito e características Às vezes, para que se possam exercer os direitos inerentes ao título de crédito, será preciso que se comprove o descumprimento de certas e determinadas obrigações. O protesto é o ato através do qual o credor faz prova, através da fé pública do Cartório de Protesto de Títulos e Documentos da 316
TÍTULOS DE CRÉDITO
inadimplência de algum das obrigações cambiais, como, por exemplo, o pagamento do título e o aceite. Tal procedimento é tratado na Lei n° 9492/97 cujo art. 1° traz justamente a definição do que seja o protesto. Art. i 0 Protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida.
o protesto tem como características principais ser um ato formal e solene. Só pode ser feito por escrito e no local específico que é o Cartório de Protestos de Títulos e Documentos.
9.2. Espécies São dois os principais tipos de protesto que têm utilização no direi-
to brasileiro e cada um deles irá possuir efeitos diferentes.
o mais comum é o protesto por falta de pagamento que é realizado quando, após o vencimento, não há o cumprimento espontâneo da obrigação. Nesse caso todos os que tiverem obrigação de pagamento (devedor principal, endossantes e avalistas) serão apontados no protesto que irá justamente garantir o direito do credor executar os devedores indiretos. Para a maior parte da doutrina, os devedores indiretos são os endossantes e os avalistas dos endossantes. O avalista do devedor principal (a lei diz que o avalista se equipara à pessoa que garante) é considerado um devedor direto e para este não será necessária a realização do protesto para que ele possa ser executado. O outro tipo de protesto é o realizado por falta de aceite. Existem títulos que não é o próprio devedor quem o emite, sendo assim, não há manifestação de vontade dele na cártula. Essa manifestação de vontade vai ser buscada através da apresentação para aceite. Quando o devedor se recusa a dar o aceite, a prova dessa recusa deverá ser feita através do protesto. Esses títulos são a letra de câmbio e a duplicata. No caso da duplicata tem-se ainda uma terceira espécie de protesto que é por falta de devolução. No caso das duplicatas, o credor terá que apresentá-la ao devedor para que ele dê o aceite. Nesse momento poderá o devedor reter indevidamente a cártula e não fazer a devida
317
ESTEFÂNIA ROSSIGNOLI
devolução. Para comprovar tal fato é que o credor da duplicata poderá se valer do protesto por falta de devolução. Tem pouca aplicação prática nos dias atuais até pelo crescimento do uso das já mencionadas duplicatas virtuais. 9.3. Procedimento O protesto deve ser realizado no lugar indicado para aceite ou para pagamento. A LUG estabelece prazos para que o credor faça o apontamento do protesto, ou seja, apresente o título no cartório e requeira o processamento do protesto. Na alínea 2• do art. 44 tem-se o prazo para o protesto por falta de aceite que será até o dia do vencimento e a alínea 3• do mesmo artigo dispõe que o credor terá um prazo de dois dias úteis a partir do vencimento par~ realizar o protesto por falta de pagamento. Lembrando que esses prazos somente deverão ser observados se o protesto for necessário. O procedimento do protesto é encontrado na própria Lei n° 9492/97. Inicialmente será feito apenas o apontamento do protesto e os devedores receberão uma notificação para pagarem ou aceitarem o título. Nesse momento ainda não há protesto realizado, tanto que se for tirada uma certidão no cartório, ela aparecerá como negativa. Do recebimento da notificação do apontamento do protesto, três poderão ser as hipóteses a ocorrer. Caso o devedor queira evitar a efetivação do protesto pode, neste prazo de 3 dias úteis (contados a partir do recebimento da notificação) cumprir a obrigação, ou seja, pagar ou dar o aceite. Nesse caso não haverá o protesto. Caso o legitimado passivo do protesto não vislumbre que o protesto é indevido, não terá outra saída senão cumprir a obrigação e evitar o protesto. Se se tratava de protesto por falta de pagamento e o devedor cumpriu a obrigação, o legitimado ativo do protesto será chamado ao cartório para receber a quantia devida. Lembrando que o título terá 318
TÍTULOS OE CRÉDITO
sido entregue ao devedor que pagou. Como já foi explanado anteriormente, esta é a quitação do título. Agora, se o protesto foi por falta de aceite, o cumprimento da obrigação se dará pela assinatura do devedor, realizando o aceite. Neste caso o devedor irá até o cartório para apor a assinatura no título que será entregue ao credor. Entretanto, se o protesto for indevido, o devedor poderá mover uma ação cautelar de sustação do protesto. Nesta será feito um pedido de liminar para suspender o protesto e ser discutida a sua legalidade. Caso seja concedida a liminar o tabelião será notificado e não irá efetivar o protesto. A liminar de sustação faz com que qualquer ato referente a esse título somente possa ser realizado com autorização judicial. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No concurso para a Magistratura/AC/2012, organizado pelo CESPE, o enunciado afirmava: HEm relação ao protesto, ato formal e solene por meio do qual se provam a inadimplência e o descumprimento da obrigação, assinale a opção correta.# A alternativa correta era a que dizia: Ho título do documento de dívida cujo protesto tiver sido sustado judicialmente só poderá ser pago, protestado ou retirado mediante autorização judicial.# Somente então se não houver o cumprimento da obrigação ou a sustação do protesto é que ele será lavrado e efetivado pelo cartório. Nesse caso o credor irá receber o título de volta, juntamente com a certidão positiva de protesto para que possa exercer os seus direitos de cobrança . Importante ressaltar que a Lei 9294/97 diz que o tabelião do cartório só pode observar a forma do ato e nem mesmo a prescrição : Art. 9" Todos os títulos e documentos de dívida protocolizados serão examinados em seus caracteres formais e terão curso se não apresentarem vícios, não cabendo ao Tabelião de Protesto investigar a ocorrência de prescrição ou caducidade. Parágrafo único. Qualquer irregularidade formal observada pelo Tabelião obstará o registro do protesto.
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FLUXOGRAMA DO PROCEDIMENTO DO PROTESTO
APONTAMENTO
Atende aos requisitos fonnais
Não atende aos requisitos fonnais
"-"\
Devedor
rnm::J
obrigação
- 1 Fim do procedimento, processo não é lavrado
Devedor consegue sustar judicialmente o protesto
Devedor se mantém inerte
Protesto fica suspenso no cartório
Protesto é lavrado
Extinção do pedido
9.4. Protestos necessários A prova que é realizada pelo protesto pode ser apenas uma faculdade para exercer os direitos do título ou em alguns casos pode ser necessária. Primeiro vamos abordar a necessidade do protesto quando ele
é realizado por falta de pagamento. O devedor principal tem plena consciência quando um título não é quitado no vencimento, pois se a obrigação era sua, ele saberá, mas os devedores indiretos, aqui entendidos como endossantes e avalistas dos endossantes não têm esse conhecimento. Por isso caso se queira executar os devedores indiretos, o protesto prévio será necessário para que se possa fazer prova de que eles conheciam o inadimplemento do título. Já para executar o devedor principal não será necessário o protesto.
320
TÍTULOS DE CRÉDITO
~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova para Procurador Geral do Estado/AM/2011. de organização da FCC, o enunciado da questão pedia para marcar a alternativa correta quanto a disciplina jurídica da Letra de Câmbio e na Nota Promissória e a assertiva correta era a seguinte: "A cobrança judicial do crédito mencionado em nota promissória contra o devedor principal independe do prévio protesto do título." Um ponto que ainda gera cena polêmica é sobre o avalista do devedor principal. Se levarmos em conta apenas a letra da lei. ele é equiparado a quem avaliza e, portanto, não precisará ser protestado, mas há quem defenda que ele também não tem como conhecer que o título não foi quitado e, por isso, demandaria o protesto. O primeiro entendimento é o que vem prevalecendo, não precisando de protesto para executar o avalista do devedor principal. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Entende que o protesto não é necessário para executar o avalista do devedor principal como se vê no AgRg no Ag 1214858/MG, publicado em 12/05/2010: PROCESSUAL CIVIL. RECURSOS. INOVAÇÃO NÃO ADMmDA. DIREITO CAMBIÁRIO. TÍTULOS DE CRtDITO. NOTA PROMISSÓRIA. EXECUÇÃO PROPOSTA CONTRA AVALISTA. DESNECESSIDADE DE PROTESTO. 1- Não se admite, em sede de agravo regimental interposto contra decisão monocrática que negou seguimento a recurso especial a arguição de tema novo. que não tenha sido objeto do próprio recurso especial. li - Não é necessário o protesto para se promover a execução contra o aceitante da letra de câmbio ou contra o emitente da nota promissória, bem como contra seus respectivos avalistas. Isso porque. nesses casos. tem-se uma ação direta. e não de regresso.
Agravo Regimental improvido.
~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No concurso para Promotor de Justiça Estadual Ac/2014, de responsabilidade do CESPE, a alternativa correta, a ser marcada era a que dizia: "Em caso de cheque não pago pelo sacado, é desnecessário o protesto para cobrar de avalista do emitente do cheque."
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No caso do protesto por falta de aceite, devemos separar a duplicata da letra de câmbio. Na duplicata, o protesto por falta de aceite é de extrema relevância, pois com ele será possível vincular o devedor ao título, mesmo que não tenha nenhuma manifestação de vontade dele. Isso se dá pelo fato de a duplicata ser causal e somente poder ser emitida se de fato existir o negócio de compra e venda mercantil ou prestação de serviços a embasando. Já para a letra de câmbio, o protesto por falta de aceite é necessário para mudar a pessoa do devedor principal do sacado para o sacador, ou seja, quem recebeu a ordem de pagamento, mas não a aceitou, não se vinculará ao título, mas quem emitiu se tornará o devedor principal. Para ambos os títulos, o protesto por falta de aceite também será necessário para provocar o vencimento antecipado da obrigação, pois se não houve o aceite já se presume que o devedor está se recusando a reconhecer seu vínculo. Além disso, concatenando a legislação específica dos títulos de crédito com a questão de prescrição do Código Civil, o protesto será necessário para interromper a prescrição do título. De acordo com o art. 202: Art. 202. A interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, dar-se-á: (. ..) Ili - por protesto cambial;
Como se vê, caso o credor tenha o interesse em interromper a prescrição do título poderá se valer do protesto, mas é importante notar que a interrupção apenas ocorre uma vez e o prazo prescricional se reiniciará após a realização. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No certame da banca FCC para Advogado da Nossa Caixa Desenvolvimento/2011. o enunciado da questão afirmava que Mo protesto cambial é medida necessária paraw e a resposta correta era Minterrupção da prescrição da ação de cobrança do crédito mencionado no título.w
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TÍTULOS DE CRÉDITO
9.5. Cancelamento do protesto Após efetivado o protesto, algumas opções existirão para que ele seja cancelado. Mesmo depois que o protesto se efetivou, caberá discussão sobre a sua legalidade. Imaginemos, por exemplo, que o título já se encontra prescrito ou que o devedor, ao ser notificado não conseguiu tempo hábil para questionar o protesto através da sustação, ele poderá buscar os mecanismos judiciais para cancelar o protesto. Assim, a qualquer momento o protesto poderá ser cancelado por decisão judicial através de ação de cancelamento de protesto. Se ficar comprovado que se trata de protesto indevido haverá inclusive a presunção de danos morais, pois no caso de protesto por falta de pagamento, os legitimados passivos terão seu nome inscrito no rol de inadimplentes, causando restrições ao crédito. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
O tribunal tem entendido pela presunção do dano moral no caso de protesto indevido como demonstra a ementa do REsp 1059663/MS, publicado em 17/12/2oo8: MC"ivil e processual civil. Recurso especial. Omissão. Inexistência. Danos morais. Não renovação do cheque especial. Ausência de prova. Protesto indevido. Negativação. Pessoa jurídica. Dano in re ipsa. Presunção. Desnecessidade de prova. Quantum indenizatório. Exagero. Afastamento de um dos motivos de sua fixação. Redução. - Para o Tribunal de origem. o envio do título a protesto de fonna indevida gerou presunção de dano moral. o que tomou desnecessária a anâlise dos pontos questionados em embargos dedaratórios;
...
( )
- Nos casos de protesto indevido de título ou inscrição irregular em cadastros de inadimplentes. o dano moral se configura in re ipsa. isto é. prescinde de prova. ainda que a prejudicada seja pessoa jurídica. Precedentes;
..
(. )
Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte. parcialmente provido."
Pode ainda ser cancelado o protesto a pedido de quem o realizou a qualquer tempo. Nesse caso, o legitimado não precisará comprovar
323
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nenhum motivo, pois se foi ele quem pediu a realização do protesto, pode a qualquer tempo cancelá-lo. Se for quitado o título , também poderá ser cancelado o protesto, pois não haverá mais inadimplemento para ser comprovado. Como foi dito anteriormente, após a efetivação do protesto, o título é devolvido ao credor, juntamente com uma certidão positiva de protesto para que ele possa usar dos mecanismos legais para satisfazer seu crédito . Se o devedor desejar cumprir a obrigação, então, vai ter que fazê-lo procurando diretamente o credor que protestou o título. Às vezes esse pagamento pode acontecer, pois houve a cobrança judicial do título, mas em qualquer caso, ao pagar o título, o devedor terá o direito de resgatar a cártula e de posse dela deverá ir ao cartório para providenciar o cancelamento do protesto. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova da Magistratura/MG/2012, organizada pela banca da EJEF, o enunciado afirmava que: "É correto afirmar que o cancelamento do protesto, após quitação do débito". A resposta a ser marcada era a que completava "é ônus do devedor." ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
No informativo 5o6/2012 foi incluído o seguinte enunciado: "Direito civil. Protesto regular de título. Obrigação de cancelamento. Incumbência do devedor. Protestado o título pelo credor em exercício regular de direito, incumbe ao devedor; principal interessado, promover o cancelamento do protesto após a quitação da dívida. o art_26 da Lei 9.492/97 estabelece que o cancelamento do registro do protesto será solicitado, diretamente no tabelionato de protesto de títulos, por qualquer interessado mediante apresentação do documento protestado, cuja cópia ficará arquivada. Apesar de o dispositivo legal fazer referência a qualquer interessado, conforme a jurisprudência do STJ, a melhor interpretação é que o maior interessado é o devedor de modo a pesar sobre sua pessoa o ônus do cancelamento. Rfsp 1.015.152, rei. Min. Luis F. Salomão, j. 9.10.12. 4• T. (lnfo 5o6, 2012)"
10.
AÇÕES CAMBIAIS
Nem sempre os devedores dos títulos de crédito fazem o pagamento espontâneo da obrigação, levando a situação de inadimplemento.
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TÍTULOS DE CRÉDITO
Nessa situação surgirão os mecanismos processuais para o credor buscar a satisfação do seu crédito. Assim, faz-se importante analisarmos algumas questões relativas à cobrança dos títulos de crédito. Não se preocupará aqui com os aspectos processuais, pois não são nosso foco de estudo, mas apenas os aspectos específicos das relações cambiárias. 10.1.
Ação de Execução de Título Extrajudicial
10.1.1.
Utilização para os títulos de crédito
Uma vez que o Código de Processo Civil prevê em seu art. 585 que os títulos de crédito são títulos executivos extrajudiciais, eles podem basear ação de execução por título extrajudicial. A base jurídica para tanto está no art. 49 do Decreto n° 2044/o8; art. 47 da Lei do Cheque e art. 585 do CPC.
o art. 49 citado vai mencionar que a "ação cambial por excelência é a executiva." O que se vê com esse dispositivo é que a intenção do legislador foi facilitar ao máximo possível o recebimento do crédito consubstanciado no título. Sabe-se que o rito da execução é muito mais célere do que o de uma ação de conhecimento, já se partindo logo para a constrição de bens do devedor. Esse enquadramento dos títulos de crédito como títulos executivos extrajudiciais tenta atrair mais interesse na sua aceitação para que ele se preste ao seu objetivo maior que é a circulação do crédito. 10.1.2.
Requisitos
Para dar entrada na ação é necessária a exibição do título e que o mesmo fique guardado nos cofres da secretaria. Ações cambiárias executórias podem ser do credor primitivo contra qualquer co-obrigado ou quando um desses co-obrigados pagar o título, uma ação executiva de regresso. Em relação à necessidade de protesto prévio, observe o que foi explanado no item 9.4, anteriormente a esse. 325
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Na sua defesa, que será realizada através de Embargos à execução, o executado deverá observar os princípios norteadores dos títulos de crédito. 10.1.3.
Prazos
Os prazos para executar os títulos de crédito estão previstos na LUG e na Lei do Cheque (Lei n° 7357/85). De acordo com o art. 70 da LUG: Art. 70. Todas as ações contra o aceitante relativas a letras prescrevem em 3 (três) anos a contar do seu vencimento. As ações do portador contra os endossantes e contra o sacador
prescrevem num ano, a contar da data do protesto feito em tempo útil, ou da data do vencimento, se trata de letra que contenha cláusula "sem despesas". As ações dos endossantes uns contra os outros e contra o sacador prescrevem em 6 (seis) meses a contar do dia em que o endossante pagou a letra ou em que ele próprio foi acionado. Observemos que a LUG vai diferenciar três possíveis situações. Se a execução é contra o devedor principal e, consequentemente seu avalista, o prazo é de 3 anos no vencimento. Não nos esqueçamos que nesse caso não há necessidade de protesto. Se a execução é do credor inicial contra os endossantes e seus avalistas o prazo é de i ano, a contar do protesto, que nesse caso é necessário. Agora, se algum co-responsável pagou e tiver direito de regresso poderá fazê-lo pela execução, mas nesse caso o prazo é de 6 meses do dia em que pagou o título se o fez de maneira espontânea ou do dia em que foi demandado se houve ação. ~
Como esse a.unto foi cobrado em mncurso?
No concurso da Magistratura/DF/2011, de responsabilidade da banca 1)-DFT, perguntava-se sobre o prazo de execução da duplicata e a resposta correta era: "em três (3) anos, contados da data do vencimento do título, contra o sacado e respectivos avalistas". Somente o cheque terá prazos de execução específicos e estes são tratados na sua lei especial.
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TÍTULOS DE CR~DITO
Art. 59 Prescrevem em 6 (seis) meses, contados da expiração do prazo de apresentação, a ação que o art. 47 desta Lei assegura ao portador. Parágrafo único - A ação de regresso de um obrigado ao pagamento do cheque contra outro prescreve em 6 (seis) meses, contados do dia em que o obrigado pagou o cheque ou do dia em que foi demandado.
Os prazos de apresentação a que se refere o art. 59 da Lei do Cheque são de 30 dias se o cheque for de mesma praça (se o lugar de emissão e de desconto forem os mesmos) e 6o dias se de praças diferentes (se o lugar de emissão e de desconto forem diferentes). Questão importante no cheque é que esse prazo prescricional é sempre contado da data que estiver na linha reservada para a data de emissão, independente de qualquer "bom para" que tenha sido colocado na parte debaixo ou no verso do cheque. Além disso, para a contagem do prazo, não importa se o cheque foi ou não apresentado para pagamento ao banco dentro do prazo. Sobre o prazo prescricional do temos enunciado da 1Jornada de Direito Comercial aprovado: Enunciado n• 40: O prazo prescricional de 6 (seis) meses para o exercício da pretensão à execução do cheque pelo respectivo portador é contado do encerramento do prazo de apresentação, tenha ou não sido apresentado ao sacado dentro do referido prazo. No caso de cheque pós-datado apresentado antes da data de emissão ao sacado ou da data pactuada com o emitente, o termo inicial é contado da data da primeira apresentação.
Outro detalhe relevante é que não há diferença de prazo se o credor está executando o devedor principal ou os endossantes e avalistas. Somente há diferença no caso do direito de regresso. 10.2. Ação de Anulação da Cambial
Os títulos de crédito têm a característica de serem títulos de apresentação e de resgate. Assim, para que um credor possa exigir o pagamento do mesmo deve apresentá-lo, tanto quanto o devedor tem o direito de exigir que lhe seja entregue o título no ato do pagamento.
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Porém, por ser um documento cartular, muitas vezes ocorre de o título se perder, ser furtado, extraviado ou destruído. Nesses casos, para que o credor tenha como continuar exigindo o adimplemento do título pode se valer da ação de anulação da cambial para anular o título perdido e fazer com que a sentença o substitua. Tal ação está prevista no art. 36 do decreto 2044 de 1908. 10.3. Ação contra o locupletamento
Caso não seja possível entrar com a ação de execução por algum motivo, seja pela falta do protesto, seja pela expiração do prazo, a lei ainda vai resguardar a ação que busca evitar o locupletamento do devedor, ou seja, evitar que ele se enriqueça caso não pague o título. Esta será uma ação cambial, de natureza não executiva. o portador do título, através do processo de conhecimento, pede a condenação judicial de qualquer devedor cambiário no pagamento do valor do título, sob fundamento que se operou o enriquecimento indevido com o não pagamento deste. Tal ação tem previsão em dois ordenamentos diferentes. O art. 48 do Decreto 2044/1908 e art. 61 da Lei 7357/85, a Lei do Cheque vão mencionar essa ação. O prazo para a propositura dessa ação é de 2 anos após a expiração da execução, pois seu fundamento é a inexistência de possibilidade de ação de execução. 10.4. Ação Monitória
Há ainda uma ação a ser tratada aqui que não se classifica propriamente como uma ação cambial, mas que passou a ter larga utilização dos títulos de crédito. ~ a ação monitória. A ação monitória é a ação pela qual se busca obrigar o devedor a pagar o valor devido ou entregar bem em pagamento por meio de título executivo judicial (sentença), com base em um documento que não possui força executiva. Este instituto foi criado pela Lei 9079 de 1995, a fim de acelerar a prestação jurisdicional e permitir maior efetividade, uma vez que usubstitui" o processo de conhecimento na formação de um título executivo judicial, que é essencial para que se tenha ação de execução.
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TÍTULOS DE CR~DITO
Trata-se de um procedimento mais célere que visa facilitar a composição de litígios, na medida em que torna mais rápida a obtenção do título executivo, por não haver contraditório do devedor, abolindo, por conseguinte, o processo de conhecimento. Deve-se deixar claro que a ação monitória somente irá substituir o processo de conhecimento se assim desejar o credor, mesmo sendo mais célere. Poderá ser utilizada então quando se tem como objeto valor em dinheiro, coisa fungível ou determinado bem móvel (art. 1102, a, CPC) e o legitimado ativo é o credor e o passivo é o devedor da obrigação. A petição inicial tem que atender os requisitos do art. 282, CPC, juntamente com prova escrita do crédito. Após o recebimento da inicial, o Réu será citado para pagar a dívida e não para contestar, podendo ainda oferecer embargos. Se nada fizer, ocorre à revelia e o título executivo será prontamente constituído. Com a existência do título, o devedor será intimado a pagar a dívida ou oferecer bens à penhora em 15 dias, seguindo o procedimento conforme a fase de cumprimento de sentença. Assim, a revelia transforma a monitória em execução por título judicial, não cabendo mais embargos do devedor. Como na citação o devedor não é chamado para se defender, mas sim para pagar, a resposta correta são os embargos (art. 1102, c), o qual suspende o mandado de pagamento. Caso os embargos sejam acolhidos, o mandado será revogado e o processo será extinto. Caso não sejam, a execução terá inicio. Os embargos, diferentemente do que ocorre no processo de execução, são autuados em apartado da monitória e a coisa julgada é sempre material. A questão mais polêmica da ação monitória no campo dos títulos de crédito, principalmente após o Código Civil de 2002, é a questão do prazo prescricional. O entendimento que vem prevalecendo é que se aplica o art. 2o6, § 5°, 1do Código Civil ao caso, ou seja, o prazo prescricional da ação monitória seria de 5 anos a contar do vencimento do título. 329
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• Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Predominantemente a cone entende pelo prazo de 5 anos para a ação monitória como se vislumbra em dois acórdão presente no infonnativo de jurisprudência n° 533 de 2014, cujas ementas, que são idênticas, detennina: DIREITO EMPRESARIAL PRAZO PRESCRICIONAL PARA AJUIZAMENTO DE AÇÃO MONITÓRIA FUNDADA EM CHEQUE PRESCRITO. RECURSO REPfTTTIVO (AIU. 543-C DO CPC E RES. 8/2oo8-ST)).
Oprazo para ajuizamento de ação monitória em face do emitente de cheque sem força executiva é quinquenal. a contar do dia seguinte à data de emissão estampada na cánula. Com efeito, qualquer dívida resultante de documento público ou panicular, tenha ou não força executiva, submete-se ao prazo prescricional de cinco anos. que está previsto no an. 206, § 5°, 1, do CC. cabe registrar que o cheque é ordem de pagamento à vista que resulta na extinção da obrigação originária, devendo comer a data de emissão da cártula - requisito essencial para que produza efeito como cheque (art. 1°, V, da Lei 7.357/1985 - Lei do Cheque). O art. 132 do CC ainda esclarece que, salvo disposição legal ou convencional em contrário, computam-se os prazos, excluído o dia do começo e induído o do vencimento. Assim, o termo inicial para a fluência do prazo prescricional para a perda da pretensão relativa ao crédito concernente à obrigação originária corresponde ao dia seguinte àquele constante no cheque (ordem de pagamento à vista) como data de emissão - quando, então, se pode cogitar inércia por parte do credor. REsp 1.101412-SP. Rei. Min. Luís Felipe Salomão, julgado em 11/12/2013.
• Importante! De tão recorrente que é esse entendimento, o STJ agora no ano de 2014 aprovou duas súmulas a tratar do prazo da ação monitória, vejamos: súmula "" 503: O prazo para ajuizamento de ação monitória em face do emitente de cheque sem força executiva é quinquenal. a contar do dia seguinte à data de emissão estampada na cártula. súmula "" 504= O prazo para ajuizamento de ação monitória em face do emitente de nota promissória sem força exerutiva é quinquenal, a contar do dia seguinte ao vencimento do título.
• Como esse assunto foi cobrado em concurso? No concurso da banca do CESPE para Promotoria/ES/2010, o enunciado afirmava: "Consoante o entendimento do STJ, assinale a opção correta referente às nonnas que regem os títulos de crédito." E a alternativa correta era a que afirmava: "A ação monitoria fundada em cheque prescrito está subordinada ao prazo prescricional de cinco anos previsto no Código Civil."
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11. TÍTULOS EM ESPÉCIE 11.1. Letra de Câmbio
É o título de crédito por meio do qual uma pessoa (denominada sacador) declara que certa pessoa (denominada sacado) pagará a certa pessoa (denominada tomador ou beneficiário) uma quantia certa, num determinado local e data. Representa uma ordem de pagamento, ou seja, quem realiza o saque (emissão do título) a princípio não é quem se responsabiliza pelo pagamento. Vamos imaginar uma situação prática. Luciano tem uma dívida a quitar com Francisco no valor de RS10.ooo,oo e pede um prazo. Ocorre que Luciano tem um crédito a receber de Marina em valor superior ao que ele deve a Francisco. Tentando resolver as duas situações Luciano emite uma letra de câmbio para Francisco, dizendo que no dia do vencimento será Marina quem realizará o pagamento. Quem emite não é inicialmente quem está assumindo a obrigação.
É o título mais antigo da história, mas que hoje em dia tem pouca utilidade prática. Para ser letra de câmbio deve atender aos requisitos do art. 1° da LUG. Como quem recebe a ordem de pagamento não é quem emite o título este deve ser apresentado ao mesmo para dizer se concorda com a ordem. Esta concordância é dada através da aceite. É o que diz o art. 21 da LUG Art. 21. A letra pode ser apresentada, até o vencimento, ao aceite do sacado, no seu domicílio, pelo portador ou até por um simples detentor:
Se o sacado aceitar ele se toma o devedor principal do título, o sacador se toma co-responsável e não ocorrerá vencimento antecipado. No entanto, no caso da letra de câmbio, o sacado não é obrigado a dar o aceite, já que não existe nenhum vínculo anterior à emissão do título e se recusar a fazê-lo ele não assume a obrigação. As consequências principais dessa recusa é que ocorrerá o vencimento antecipado e sacador se toma devedor principal. Para que sejam observadas tais consequências será preciso realizar o protesto por falta de aceite. 337
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~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame da Magistratura Federal/2• Região/2011, da banca do CESPE, o enunciado da questão afirmava: "Com relação ao título de crédito, considerado, na doutrina, o documento necessário para o exercício do direito, literal e autônomo, nele mencionado, assinale a opção correta." A resposta correta era a que afirmava: HEstabelece a lei uniforme relativa às letras de câmbio e às notas promissórias que o sacador de letra de câmbio pagável à vista ou a certo termo de vista pode fazer constar a incidência de juros sobre o valor a ser pago."
11.2. Cheque
É título cambiário abstrato, formal, resultante de mera declaração unilateral de vontade, pelo qual uma pessoa, designada emitente ou sacador, com base em prévia e disponível provisão de fundos em poder de banco ou instituição financeira a ele assemelhada por lei, denominado sacado, dá contra o banco, em decorrência de convenção expressa ou tácita, uma ordem incondicional de pagamento à vista, nas condições estabelecidas no título. O cheque também representa uma ordem de pagamento. Deve preencher os requisitos do art. Cheque - LC). ~
lº
da Lei n° 7357/85 (Lei do
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova para a Magistratura Federal/3• Região/2011, de responsabilidade do CESPE, o enunciado afirmava: HDeterminado documento foi apresentado, como cheque, ao caixa de instituição financeira localizada no Brasil para recebimento, em espécie, do valor registrado. O caixa da instituição, todavia, devolveu o papel ao apresentante informando-o de que, legalmente, aquele documento não valia como cheque. Tendo como referência essa situação, assinale a opção correspondente a hipótese prevista para a devolução do referido documento." A opção que continha a afirmativa correta era a que dizia: "No documento está escrito a palavra check, em lugar da palavra cheque, por pertencer aos Estados Unidos da América o banco de origem do documento." A apresentação para pagamento do cheque ocorre na instituição financeira responsável pela compensação (banco sacado).
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TÍTULOS DE CRÉDITO
Não se pode, dessa forma, emitir um cheque que não esteja vinculado a uma instituição financeira devidamente autorizada para emitir cheques. É por isso que para o cheque ser válido ele é fornecido pela própria instituição, não podendo o emitente "criar" seu próprio talão de cheques.
• Como esse assunto foi cobrado em concurso? No exame organizado pela IESES para Titular do Serviço de Notas e Registros/MA/2011, o enunciado pedia para assinalar a afinnativa correta sobre o cheque quer era: ·o cheque é ordem de pagamento onde o sacado é sempre banco ou instituição a banco equiparada. O cheque é uma ordem de pagamento à vista. Isso, aliás, é o que diz a Lei do Cheque (Lei n° 7357/85) em seu art. 32, ordenando inclusive que qualquer menção em contrário deve ser considerada como não escrita.
Art. 32 o cheque é pagável à vista. Considera-se não-estrita qualquer menção em contrário. Parágrafo único - o cheque apresentado para pagamento antes do dia indicado como data de emissão é pagável no dia da apresentação. Porém, todos sabem da utilização no comércio do cheque conhecido popularmente como "pré-datado" que segundo os especialistas em português deveria ser chamado de pós-datado. Este é aquele em que se coloca uma data posterior de vencimento, sendo muito utilizada a expressão "bom para" demonstrando que o cheque não deve ser pago à vista. Sendo assim, a princípio, há certa incongruência entre o que diz a lei e o que é feito na prática. Para se explicar tal fato é importante que expliquemos que o direito é muito influenciado pelos costumes e vice-versa. Assim, uma prática que não possui amparo legal, poderá ganhar contornos jurídicos se for reiteradamente utilizada. Esse é o caso do cheque pós-datado. Apesar de não ser permitido seu uso pela lei, os tribunais aceitam tal costume como válido. Isso porque o que se entende é que ao se aceitar um cheque com data posterior está sendo realizado um contrato, que deve ser
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respeitado pelas partes. Dessa forma, aquele que recebe um cheque com data posterior deve se atentar para o seu depósito no banco, pois se antecipar o desconto do mesmo ficará responsável pelos prejuízos que causar ao emitente, seja de ordem material ou até mesmo moral. Por fim, é importante ressaltar que a data a ser colocada na emissão do cheque deve ser a posterior e não a do dia com o "bom para", já que o prazo prescricional da cobrança judicial do cheque será contado dessa data. O vencimento e o prazo para apresentação e execução também serão sempre contados a partir da data que estiver escrita na linha de data de emissão do cheque, não devendo ser observado nenhuma anotação fora disso. • Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Não se tem dúvidas da aceitação do cheque pós-datado, tanto que apresentação antecipada gera danos morais, o que se tomou objeto de súmula. Súmula n° 370 - caracteriza dano moral a apresentação antecipada de cheque pré-datado. • Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No concurso da banca do CESPE para Procuradoria/BACEN/2009, o enunciado da questão dizia: Mos cheques pré-datados são amplamente utilizados no comércio para a realização de pagamentos, mormente operações de compra e venda mercantis. A respeito desse costume. assinale a opção correta. A opção a ser marcada era: MÉ entendimento sumulado do STJ que a apresentação antecipada do cheque pré-datado causa dano moral por quebra do acordo entre partes e ofensa à boa-fé objetiva.# H
A Lei do Cheque cria diferentes tipos de cheques. Entre os principais tem-se o cheque cruzado. o administrativo e o visado. O mais utilizado é o cheque cruzado. Pelo art. 44: "o emitente ou o portador podem cruzar o cheque, mediante a aposição de dois traços paralelos no anverso do título." Tal cruzamento faz com que o credor, para receber o valor do título precise depositar o cheque em outra conta bancária. fazendo com que o mesmo passe pela câmara 334
TÍTULOS DE CRÉDITO
de compensação. Se o cheque não tiver o cruzamento, ele pode ser recebido diretamente na instituição responsável pelo recebimento da ordem de pagamento. O cheque administrativo é o que está previsto no art. 9, Ili, em que o sacado e o emitente são a mesma pessoa, ou seja, o próprio banco é quem será o devedor do cheque. Esse tipo de cheque garante ao credor uma certeza maior no adimplemento, causando segurança na relação obrigacional. O cheque administrativo somente pode ser emitido na forma nominal. Já o art. 7 determina que: Art. 7° Pode o sacado, a pedido do emitente ou do portador legitimado, lançar e assinar, no verso do cheque não ao portador e ainda não endossado, visto, certificação ou outra declaração equivalente, datada e por quantia igual à indicada no título. § 1° A aposição de visto, certificação ou outra declaração equivalente obriga o sacado a debitar à conta do emitente a quantia indicada no cheque e a reservá-la em benefício do portador legitimado, durante o prazo de apresentação, sem que fiquem exonerados o emitente, endossantes e demais coobrigados.
É a hipótese do cheque visado. Também serve para dar garantia de pagamento ao credor, pois o sacado irá reservar a quantia descrita na conta do emitente. Somente não terá a reserva se ultrapassar os prazos de apresentação do art. 33 Caso o credor apresente o cheque no prazo correto, terá a garantia do banco de que a quantia dos fundos do cheque estará reservada, sendo isso, inclusive, uma responsabilidade do banco sacado. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame da Magistratura Federal/2• Região/2009, organizado pelo CESPE o enunciado dizia: "Antônio emitiu, em i3/10/2009, cheque no valor nominal de RS 3.000,00 para pagar móveis encomendados ao seu marceneiro Luís, fabricados com a ajuda de Marcos. Considerando essa situação hipotética, assinale a opção correta." A alternativa correta era a que continha a seguinte resposta: "Luís pode apresentar o cheque ao sacado, pedindo que lance no verso do título declaração de que a quantia ali indicada está reservada em seu benefício durante o prazo de apresentação do título, qualificando-o como cheque visado."
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Como o banco recebe ordem para pagar o cheque, o emitente pode revogar tal ordem. Porém esta revogação só produz efeitos após o prazo de apresentação do art. 33, ou seja, a revogação somente ser· ve para limitar o tempo de compensação do cheque - art. 35. Art. 35. o emitente do cheque pagável no Brasil pode revogá-lo, mercê de contra-ordem dada por aviso epistolar, ou por via judicial ou extrajudicial, com as razões motivadoras do ato. Parágrafo único - A revogação ou contra-ordem só produz efeito depois de expirado o prazo de apresentação e, não sendo promovida, pode o sacado pagar o cheque até que decorra o prazo de prescrição, nos termos do art. 59 desta Lei.
Outra conclusão que se tira do art. 35, principalmente do seu parágrafo único, é que o cheque vai poder ser compensado pelo banco sacado até o prazo prescricional da ação de execução e não até o prazo de apresentação do art. 33, que servirá somente para o caso de ter havido contra-ordem. Outra forma de o emitente se opor ao pagamento é a através da sustação. Essa produz efeitos imediatos e o banco não tem que perquirir sobre os motivos da sustação - art. 36. Art. 36. Mesmo durante o prazo de apresentação, o emitente e o portador legitimado podem fazer sustar o pagamento, manifestando ao sacado, por escrito, oposição fundada em relevante razão de direito. § lº A oposição do emitente e a revogação ou contra-ordem se excluem reciprocamente. § 2° Não cabe ao sacado julgar da relevância da razão invocada
pelo oponente.
Questão relevante sobre o cheque é a necessidade de apresentação deste ao banco para que se comprove o inadimplemento e possa ser proposta a ação de execução. Há situações que o credor não chega a fazer a apresentação do cheque ao banco e depois o prazo para tanto expira e ele propõe a execução mesmo sem tal ato. Alguns diziam que a falta de apresentação do cheque no banco retirava o interesse de agir do credor, pois não havia comprovação de que a ação era necessária. Porém, outro entendimento crescia no sentido de que o devedor conhece a sua dívida e se não resgatou o título
336
TÍTULOS DE CRÉDITO
é porque não teve intenção de adimplir com sua obrigação. o segundo entendimento é o que prevalece. ~
Qual o entendimento do STF sobre o assunto?
OSupremo sumulou a questão, reforçando o entendimento de que a apresentação não é necessária. Súmula n° 6oo - Cabe ação executiva contra o emitente e seus avalistas, ainda que não apresentado o cheque ao sacado no prazo legal, desde que não prescrita a ação cambiária.
1L3.
Nota promissória
É título abstrato, pelo qual uma pessoa, denominada emitente, faz
a outra pessoa, denominada beneficiário, uma promessa pura e simples de pagamento em seu favor ou à sua ordem, nas condições constantes no título. Significa uma promessa de pagamento. É um dos títulos menos formais que se tem, já que para existir basta atender aos requisitos do art. 75 da LUG, sendo que pode ser confeccionada em qualquer tipo ou tamanho de papel.
Segundo a jurisprudência, quando a nota promissória estiver vinculada a contrato, ou seja, tiver sido emitida para o pagamento deste e contiver esta menção na cártula, ela pode perder a sua abstração. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No concurso para a Magistratura/ES/2011, organizado pelo CESPE, pedia-se para marcar a alternativa correta que era a que afirmava: "Quem concorda em se obrigar por uma nota promissória aceita a circulação do crédito correspondente. uma vez que a nota promissória corresponde a promessa de pagamento."
11.4.
Duplicata
É título formal, causal, à ordem, extraído por vendedor ou prestador de serviços, que visa documentar o saque fundado sobre o crédito decorrente de compra e venda mercantil ou prestação de ser...iços, que tem como pressuposto a emissão de fatura.
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Dentre os quatro títulos principais, é o único causal, ou seja, precisa de um negócio de compra e venda ou de prestação de serviços para ser emitido, sendo que a emissão de uma duplica sem esse negócio é considerado crime. É regida pela Lei 5474/68 (Lei de Duplicatas - LD).
Quem emite a duplicata é o credor, por isso, aqui nós também teremos a figura do aceite. Porém, o aceite na duplicata é diferente da letra de câmbio já que na duplicata, desde que as mercadorias tenham sido entregues ou os serviços prestados, o devedor não pode recusar a dar o aceite. Em uma situação prática, como ocorre a emissão da duplicata? Imaginemos que uma loja de materiais de construção tem um contrato de fornecimento com uma fabricante de cimentos. Eles estipulam que em toda semana haverá a entrega de um número de sacos de cimento, mas que o pagamento será feito sempre em 6o dias. A fabricante de cimentos (credora), com base na fatura da entrega dos cimentos é quem emite a duplicata que vai constar os dados da loja, mas não terá, pelo menos a princípio, a sua manifestação de vontade, concordando com sua vinculação ao título. Assim, a fábrica de cimentos deverá apresentar a duplicata para o representante da loja de materiais para que ele dê o aceite. 21
O aceite só pode ser recusado pelos motivos previstos nos art. 8° e da LD, quais sejam: Art. 8• O comprador só poderá deixar de aceitar a duplicata por motivo de:
r - avaria ou não recebimento das mercadorias, quando não expedidas ou não entregues por sua conta e risco; li - vícios, defeitos e diferenças na qualidade ou na quantidade das mercadorias, devidamente comprovados; Ili - divergência nos prazos ou nos preços ajustados.
Art. 21. o sacado poderá deixar de aceitar a duplicata de prestação de serviços por motivo de: r - não correspondência com os serviços efetivamente contratados;
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TÍTULOS DE CRÉDITO
li - vícios ou defeitos na qualidade dos serviços prestados, devidamente comprovados;
Ili - divergência nos prazos ou nos preços ajustados. Somente são nessas hipóteses taxativas em que o aceite poderá ser recusado pelo devedor da duplicata. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No certame organizado pelo TRT/SP para Magistratura do Trabalho/2• Região/2014, a questão pedia para analisar afirmativas e entre a verdadeira tínhamos: uo aceite da duplicata é obrigatório, mas não é irrecusável. u Dessa forma, na duplicata, se a recusa do aceite não estiver entre os motivos acima, o credor poderá ainda sim entrar com a execução realizando antes o protesto por falta de aceite. O efeito da recusa de aceite na duplicata é bem diferente da letra de câmbio, pois na primeira há uma relação jurídica anterior à emissão do título que vincula o aceitante, independente de ele confirmar ou não através da sua assinatura (aceite). Caso seja realizado o protesto por falta de aceite ocorrerá também o vencimento antecipado da duplicata. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova Notário/T)AP/2011, organizada pela FCC, a questão pedia para completar o enunciado que era: UNa duplicata mercantil, o aceite é". A resposta a ser assinalada era a que afirmava: #obrigatório e poderá ser suprido pelo protesto do título juntamente com a comprovação da entrega da mercadoria." Se o protesto por falta de aceite não foi contestado (através da já analisada ação de sustação de protesto) é porque não havia motivos válidos para o devedor se recusar a aceitar a duplicata, presumindo-se, portanto, que ele é devedor da mesma, mesmo sem ter qualquer manifestação de vontade expressa. A duplicata sem aceite, mas devidamente protestada, pode inclusive embasar o pedido de falência.
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~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Súmula n• 248 - Comprovada a prestação dos serviços, a duplicata não aceita, mas protestada, é título hábil para instruir pedido de falência.
Outro assunto importante dentro das duplicatas é o que já foi mencionado anteriormente quanto à possibilidade da criação de duplicata virtual. Trata-se de uma duplicata que não terá a cártula, pois ela será substituída pelo instrumento mecanizado. A utilização da duplicata virtual se dá da seguinte forma: o vendedor fornece uma mercadoria ao comprador ou lhe presta algum serviço e este se torna seu devedor. Tal vendedor ou o prestador de serviços, que se tornou o credor, saca uma duplicata virtual contra o devedor e registram isso no computador (mas também terá que lançar no livro de registro de duplicatas), assinando com sua chave privada, que é uma assinatura virtual previamente criada por aquele que quer se valer da duplicata virtual. Essa assinatura, então, é criptografada pela autoridade certificadora competente para o caso. O credor, então, envia a duplicata através da Internet para uma instituição financeira, que credita o valor da dívida na sua conta. Se o devedor também tiver seu computador interligado ao sistema, a informação é enviada para ele também pela Internet, o que valerá como a apresentação para o aceite, também podendo fazer o pagamento através de transferência bancária eletrônica. Se não tiver, a guia de compensação bancária é enviada para ele pelos correios e ele poderá pagar em qualquer agência de qualquer banco do país. Cumpre ressaltar que é possível, ainda, que o devedor endosse ou avalize a duplicata virtual, tudo através do mecanismo da assinatura eletrônica. Se não houver o pagamento da duplicata virtual ela poderá ser devidamente protestada e executada. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Já aceita a existência da duplicata virtual que será protestada "por indicação", já que não se tem a cártula. Vejamos o exemplo do REsp 1024691/PR, publicado em 12/04/2011:
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TÍTULOS OE CRÉDITO
EXECUÇÃO OE TÍ11JLO EXTRAJUDICIAL DUPLICATA VIRTUAL PROTESTO POR INDICAÇÃO. BOLETO BANCÁRIO ACOMPANHADO 00 COMPROVANTE OE RECEBIMENTO DAS MERCADORIAS. DESNECESSIDADE OE EXIBIÇÃO JUDICIAL DO TÍTULO OE CRÉDITO ORIGINAL. i. As duplicatas virtuais - emitidas e recebidas por meio magnético ou de gravação eletrônica - podem ser protestadas por mera indicação, de modo que a exibição do título não é imprescindível para o ajuizamento da execução judicial. Lei 9.492/97.
2. Os boletos de cobrança bancária vinculados ao título virtual, devidamente acompanhados dos instrumentos de protesto por indicação e dos comprovantes de entrega da mercadoria ou da prestação dos serviços, suprem a ausência física do título cambiário eletrônico e constituem, em princípio, títulos executivos extrajudiciais.
3. Recurso especial a que se nega provimento.
Por fim, cabe lembrar que como a duplicata é emitida pelo credor, acontece de esse, na necessidade de fazer troca de crédito junto a instituições financeiras, emitir uma duplicata sem que tenha havido o negócio de compra e venda ou prestação de serviços para embasá-la. Tal título fica conhecido como duplicata fria. O art. 172 do Código Penal configura como crime tal prática dizendo tipificando como: "emitir fatura. duplicata ou nota de venda que não corresponda a mercadoria vendida, em quantidade ou qualidade, ou a serviço prestado". ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova para a Magistratura/SP/2011, de responsabilidade da VUNESP, foram apresentadas várias afirmativas sobre a duplicata para se verificar quais eram verdadeiras e quais eram falsas. As afirmativas eram:
1. Poderão ser extraídas da fatura no ato de sua emissão para circulação como efeito comercial, não sendo admitida qualquer outra espécie de título de crédito para documentar o saque do vendedor pela importância faturada ao comprador. li. O foro competente para a cobrança judicial da duplicata ou da triplicata é o da praça de pagamento constante do título, ou outra de domicílio do comprador e, no caso de ação regressiva, a dos sacadores, dos endossantes e respectivos avalistas. Ili. Quando o comprador tiver direito a qualquer rebate, a duplicata indicará exclusivamente o valor líquido que o comprador deverá reconhecer como obrigação de pagar.
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IV. As empresas, individuais ou coletivas, fundações ou sociedades civis, que se dediquem à prestação de serviços, poderão, também, na fonna da lei, emitir fatura e duplicata. Apenas a afinnativa li era falsa.
n.5. Cédulas de crédito Mesmo antes do Código Civil de 2002, começaram as ser criadas outras espécies de títulos de crédito além dos que tinham leis específicas e os que ganharam força, sem dúvidas, foram as cédulas de crédito. Pode-se afirmar que as cédulas de crédito são promessas de pagamento emitidas pelo devedor em razão de financiamento dado pelo credor, caracterizadas pela descrição dos bens dados em garantia que se tornam impenhoráveis após a emissão da cédula. Essa garantia é constituída no próprio título, independentemente de qualquer outro instrumento jurídico. Tais títulos de financiamento são, também, importantes meios de incremento de atividades econômicas, sendo bastante utilizados para o financiamento, por exemplo, da aquisição da casa própria. São considerados títulos de crédito, pois atendem aos requisitos gerais trazidos hoje pelo Código Civil de 2002. sendo que cada tipo de cédula de crédito conta com algum regulamento específico. Eis algumas espécies de cédula de crédito: • Cédula de Crédito Rural, que tem regulamento no Decreto-lei n° 167, de 1967. e estão relacionados com o financiamento das atividades agrícolas e pecuárias. • Cédula de Crédito Industrial, criada pelo Decreto-lei n° 413, de 1969 e que refere-se ao financiamento da indústria. • Cédula de Crédito Comercial, tratada na Lei n° 6.840, de 1980, destinada ao financiamento de atividade comercial ou de prestação de serviços. • Cédula de Produto Rural - CPR, tratada da Lei n° 8.929, de i.994, que representa promessa de entrega de produtos rurais, com ou sem garantia cedularmente constituída. 342
TÍTULOS OE CRÉDITO
• Cédulas de Crédito Bancário, incluídas no ordenamento brasileiro em 1999 pela Medida Provisória n° i.925, cujo texto foi repetido mais tarde no Capítulo IV da Lei 10.931 de 2004, destinadas a representar operações de crédito junto a instituições financeiras, • Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No concurso da Magistratura/R0/2011, organizado pela PUC/PR, foram apresentadas quatro afirmativas sobre as cédulas de credito, sendo que somente uma era verdadeira que era: #admitem o pacto de capitalização dos juros remuneratórios." As outras afirmativas: "não são consideradas títulos de crédito", #são ordens de pagamento, e não promessas de pagamento", "não admitem aval nem garantia pignoratícia ou hipotecária" e "o credor endossatário fica coobrigado perante o devedor endossante", são falsas. Vamos especificar um pouco de duas cédulas de crédito que têm mais utilização prática e que costumam ser alvo de questões de prova. A primeira delas é a cédula de crédito rura l. O Decreto-lei n°. 167 regulou o financiamento rural mediante a emissão de tais cédulas. O art. 2° do Decreto previu que o emitente da cédula fica obrigado a aplicar o financiamento para os fins ajustados - a produção agropecuária - devendo comprovar essa utilização para a instituição financeira. Como se vê, trata-se, assim como as duplicatas, de um título casual, somente podendo ser emitido nessa situação específica.
As mencionadas cédulas de crédito rural, em sentido amplo, são nada mais do que promessas de pagamento, que podem se dar com ou sem garantia real. A promessa com garantia real de pagamento é a Cédula de Crédito Rural em sentido estrito; a sem garantia real será chamada de Nota de Crédito Rural. Para emitir cédula de crédito rural, o art. 1° do Decreto exige que o financiador faça parte do sistema nacional de crédito rural, podendo ser pessoa física ou jurídica, sendo que o parágrafo único do mesmo artigo permite que cooperativas rurais possam também se valer desse tipo de título de crédito. Importante observar os dispositivos:
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Art 1° Ofinanciamento rural concedido pelos órgãos integrantes do sistema nacional de crédito rural e pessoa física ou jurídica poderá efetivar-se por meio das células de crédito rural previstas neste Decreto-lei. Parágrafo único. Faculta-se a utilização das cédulas para os financiamentos da mesma natureza concedidos pelas cooperativas rurais a seus associados ou às suas filiadas. ~
Como esse assunto foi cobrado em conairso?
Na prova de Tabelião do Cartório do TJ/BA de responsabilidade do CESPE, solicitou-se que fosse assinalada a alternativa correta a respeito das cédulas de crédito rurais e a resposta correta era: NA instituição financeira que opere com cédulas de crédito rural deve ser parte do sistema nacional de crédito rural, podendo o beneficiário do título ser urna cooperativa, no caso dos financiamentos concedidos a seus associados ou a suas filiadas." No que diz respeito às garantias, de acordo com o art. 68, elas poderão ser ofertadas tanto pelo próprio financiado como por terceiros.
As cédulas de crédito rural, por si só se presumem válidas, porém, para que possuam eficácia perante terceiros, fica determinada a necessidade de registro no Cartório de Registro de Imóveis. Questão relevante é a que trata das taxas de juros. O art. 5°, § único do mencionado Decreto-lei prevê que, no caso de inadimplemento da obrigação consubstancia em cédula rural, opera-se a elevação da taxa de juros para 1°k ao ano. É aplicável também a correção monetária, por não haver nenhuma proibição legal. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Duas são as súmulas do STJ que tratam de juros e correção monetária em sede de cédula de crédito rural. Súmula no 93 - A legislação sobre cédulas de crédito rural, comercial e industrial admite o pacto de capitalização de juros. Súmula no 26 - A legislação ordinária sobre crédito rural não veda a incidência da correção monetária.
A outra cédula de crédito que merece destaque pela sua utilidade
é a bancária. 344
TÍTULOS DE CRÉDITO
A Cédula de Crédito Bancário pode ser classificada como "um título de crédito estrito senso, dotado de cartularidade, literalidade, autonomia, causalidade e dependência". É considerada como título de crédito e, portanto, pode circular e tem a efetividade processual de um título executivo extrajudicial, pois representa dívida em dinheiro certa líquida e exigível. Poderia haver dúvidas sobre o caráter de titulo executivo da cédula de crédito bancário, pois muitas vezes ela é emitida com base em um contrato de abertura de crédito e sobre este tipo de pacto o STJ possui a Súmula 233 que entende: "O contrato de abertura de crédito, ainda que acompanhado de extrato da conta-corrente, não é título executivo." Ocorre que por ser título de crédito, a cédula não pode ser tratada como um simples contrato de abertura de crédito e por isso ela terá sim força executiva. A 1Jornada de Direito Comercial se posicionou sobre o tema: Enunciado n• 41: A cédula de crédito bancário é título de crédito dotado de força executiva, mesmo quando representativa de dívida oriunda de contrato de abertura de crédito bancário em conta-corrente, não sendo a ela aplicável a orientação da Súmula 233 do STJ. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto? #Cédula de crédito bancário. Título executivo extrajudicial. Requisitos legais. A cédula de crédito bancário, de acordo com o novo diploma legal (Lei io.931/04), é título executivo extrajudicial, representativo de opera· ções de crédito de qualquer natureza, que autoriza sua emissão para documentar a abenura de crédito em conta corrente. nas modalidades crédito rotativo ou cheque especial. Para tanto. a cánula deve vir acom· panhada de claro demonstrativo acerca dos valores utilizados pelo cliente. consoante as exigências legais enumeradas nos incs. 1 e li do § 2° do an. 28 da lei mencionada - de modo a lhe conferir liquidez e exequibilidade. Rfsp 1.103.523, rei. Min. Luis f. Salomdo, j. 104.12. 4• T. (lnfo 495, 2012)•
A particularidade desse título é que ele comporta uma especificação maior dos direitos e obrigações. tanto que pode haver até a estipulação de taxas de juros, encargos específicos de mora. Há ainda a questão da dispensa do protesto para a propositura da execução contra qualquer devedor. seja o principal. endossante ou avalista. É o que dispõe o art. 44 da Lei 10.931/04:
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Art. 44. Aplica-se às Cédulas de Crédito Bancário, no que não contrariar o disposto nesta Lei, a legislação cambial, dispensado o protesto para garantir o direito de cobrança contra endossantes, seus avalistas e terceiros garantidores. • Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame da Promotoria/PB/2010 de banca do MPE·PB, a questão pedia par analisar as seguintes afinnativas sobre a cédula de crédito bancário: 1- Na cédula de crédito bancário, o protesto é dispensado para garantir direito de regresso contra endossantes, avalistas e terceiros garantidores.
li - A cédula de crédito bancário será transferível mediante endosso em preto, ao qual se aplicarão, no que couberem, as normas do direito cambiário, caso em que o endossatário, mesmo não sendo instituição financeira ou entidade a ela equiparada, poderá exercer todos os direitos por ela conferidos, inclusive, cobrar os juros e demais encargos na fonna pactuada na cédula.
Ili - Independentemente de ter agido com má-fé ou intuito fraudatório, o credor que em ação judicial, cobrar o valor do crédito exequendo em desacordo com o expresso na cédula de crédito bancário, fica obrigado a pagar ao devedor o dobro do cobrado a maior. As três afinnativas são verdadeiras.
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Capítulo
6
Contratos Empresariais Sumário• 1. Introdução - 2. Princípios: 2.i. Princípio da autonomia da vontade; 2.2. Princípio da relatividade dos pactos; 2.3. Princípio da função social; 2.4. Princípio da força obrigatória; 2.5. Princípio da boa-fé - 3. Contratos Bancários: 3.1. Conceito; p. Espécies: 3.2.1. Depósito; p.2. Abertura de crédito; p.3. Desconto bancário; 3.2.4. Contrato de financiamento; p.5. Custódia de valores; p.6. Aluguel de cofre; 3-2-7. Cartão de crédito - 4. Arrendamento Mercantil ou Mleasing": 4.1. Conceito; 4.2. Espécies; 4.3. Aspectos processuais - 5. Alienação Fiduciária em Garantia - 6. Franquia ou MFranchising": 6.1. Conceito; 6.2. Espécies - 7. Faturização ou MFacttoring": 7.i. Conceito; 7.2. Espécies - 8. Compra e Venda Mercantil: 8.1. Conceito; 8.2. Obrigações do comprador; 8.3. Obrigações do vendedor; 8.4. Contrato de fornecimento; 8.5. Contrato de compra e venda de empresas
1.
INTRODUÇÃO
O Código Civil de 2002 criou a unificação legislativa do Direito Civil e do Direito Empresarial, mas como foi já apresentado, as doutrinas continuam separadas e devem assim continuar, pois os campos de estudo são diferentes. Há, claro, pontos que se encontram, mas possuem as suas reservas. Na questão contratual a busca pela unificação nos parece até maior; tendo em vista que o legislador de 2002 não separou contratos que devem ser usados apenas no ramo empresarial, mas não se pode negar que determinadas relações contratuais estão intrinsecamente ligadas à atividade empresária, pois são contratos que visam a produção, a comercialização, a distribuição de produtos os serviços, ou seja, permitem a prática da atividade empresária. São esses contratos que iremos tratar aqui, mantendo a tradição de considerá-los como contratos empresariais. 347
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Muitas vezes os contratos empresariais envolvem a compra e venda de insumos, o fornecimento de produtos ou serviços, o que faz gerar certa confusão a repeito da aplicação do Código de Defesa do Consumidor a essas relações. Valendo-se dos conceitos extraídos da doutrina e do código consumerista, haverá relação de consumo quando estivermos diante de uma obrigação jurídica, ou seja, tivermos de um lado o consumidor e de outro o fornecedor. No fornecimento de insumos, há a presença de um fornecedor como determinado pelo art. 3° do CDC, conceito este que é completado pela doutrina, mas não há a figura do consumidor conceituada no art. 2° do mesmo diploma como "destinatária final" do produto ou serviço. Isso porque nos contratos que estamos nos referindo, neste capítulo, o produto ou serviço adquirido será utilizado para o exercício de uma outra atividade empresária não "parando" nas mãos do adquirente. Além disso, não fica caracterizado entre as partes a posição de vulnerabilidade do consumidor já que se trata de contrato com paridade entre as partes. Não fica configurando, portanto, a existência de relação de consumo. Vejamos o enunciado da 1 Jornada de Direito Comercial que tratou deste assunto: Enunciado n• 20: Não se aplica o Código de Defesa do Consumidor aos contratos celebrados entre empresários em que um dos contratantes tenha por objetivo suprir-se de insumos para sua atividade de produção, comércio ou prestação de serviços. 2. PRINCÍPIOS
Não existem princípios específicos para os contratos empresariais, mas cumpre ressaltar os princípios do direito contratual já que terão aplicação para as espécies contratuais que serão aqui analisadas. 2.1. Princípio da autonomia da vontade
Sempre foi visto como a base de sustentação do direito privado e assim, continua sendo, mas com contornos mais modernos. Permite que as pessoas tenham liberdade de contratar da maneira como melhor lhe aprouverem, tanto no aspecto de se querer o contrato, como quais serão os termos deste.
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Dividi-se assim a autonomia da vontade em liberdade de contratar e liberdade contratual. Essa segunda é a que mais sofre mitigação nos dias atuais com a presença cada vez mais constante dos contratos de adesão. Nesses, uma das partes apresenta os termos do contrato pronto para a outra que terá apenas a escolha de aceitar ou não os termos pré-definidos. A autonomia se desenvolveu com bases no liberalismo que deixava a cargo dos particulares estabelecerem como iriam encaminhar suas relações e se a vontade fosse livre, todos os pactos poderiam ser criados. Porém, o liberalismo exacerbado passou a trazer consequências maléficas para as relações privadas, demonstrando situações de desequilíbrio e injustiça. Vê-se, dessa forma, que a autonomia privada, antes entendida como garantia da liberdade dos cidadãos em face do Estado, é relativizada em prol da justiça substancial, deslocando-se o eixo da relação contratual da tutela subjetiva da vontade à tutela objetiva da confiança. A proteção da confiança envolve o vínculo contratual, a partir das normas cogentes que visam assegurar o equilíbrio das partes da relação jurídica, mediante a proibição das cláusulas abusivas e a adoção de novos paradigmas interpretativos, bem como, no que concerne ao objeto do contrato.
É nesse contexto que a vontade deixa de ser o elemento fundamental da força vinculativa dos contratos e passa a dar lugar a outros instrumentos que terão a obrigatoriedade de estabelecer o equilíbrio entre as partes e promover uma justiça contratual que ultrapassa a vontade manifestada. No caso dos contratos empresariais, por estarem as partes em posição de paridade, tanto econômica, quanto técnica, quanto informacional, a autonomia da vontade é ainda mais presente não se encontrando de forma tão presente a possibilidade de dirigismo contratual.
É possível que o estado interfira na relação contratual em situações extremas em que se nota de forma nítida alguma diferença de condição entre os contratantes, mas aqui essa atuação estatal é muito mais branda do que no Direito Civil em que há muitas situações de desequilíbrio entre as partes. 349
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Tal assunto também foi alvo de enunciado na 1Jornada de Direito Comercial organizda pelo Centro de Estudos do Conselho da justiça Federal. Enunciado n• 21: Nos contratos empresariais, o dirigismo contratual deve ser mitigado, tendo em vista a simetria natural das relações interempresariais. 2.2. Princípio da relatMdade dos pactos
Para ser uma relação contratual sabe-se que deverá haver sempre duas partes. Não necessariamente duas pessoas, pois em cada parte pode-se ter mais de uma pessoa, mas sempre duas partes. De acordo com o princípio da relatividade, o contrato irá produzir efeitos somente entre as partes que dele participam, nos termos do que foi pactuado. Há exceções pela própria natureza do contrato, como nos contratos em favor de terceiros e nas relações que envolvem promessa de fato de terceiro. Nesses casos, é da própria natureza do contrato, o envolvimento do terceiro e é uma exceção taxativa desse princípio. Entretanto, ele também pode ser excetuado quando colidir com outros princípios como o da função social. 2.3. Princípio da função social
Fruto das novas concepções contratuais, a função social dos contratos foi positivada no Código Civil de 2002, marcando a mudança de paradigma das relações privadas. Preconiza o art. 421 do Código Civil que: UA liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.H Quando a lei fala "em razão", pode-se entender que há que se buscar o interesse que aquele contrato desperta no meio social. No âmbito dos contratos empresariais esse reflexo é muito grande, pois movimentam a atividade empresária, que é fonte geradora de empregos, riquezas, etc. Assim, a função social dos contratos pode ser utilizada para se fomentar e regulamentar os contratos empresariais pelo importante papel social que desempenham.
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No entanto, como se percebe, há uma segunda conotação para a função social dos contratos que é o "limite". Nesse ponto que poderá haver conflito com o princípio da relatividade analisado no item anterior. A princípio o contrato produz efeitos apenas entre as partes, mas há momentos em que pode sim atingir terceiros que não fizeram parte do pacto. Imaginemos um contrato de franquia que está causando infração da concorrência e não permitindo que os empresários de menor porte possam competir com o grande franqueador. Ora, a função social pode ser utilizada para limitar o contrato de franquia e impedir determinadas situações que causam prejuízos sociais. Como se vê, a função social pode incentivar a realização do contrato ou limitá-la, de acordo com o que for melhor para a coletividade. A 1Jornada de Direito Comercial trouxe dois enunciados relativos a função social dos contratos empresariais. Enunciado n° 26: O contrato empresarial cumpre sua função social quando não acarreta prejuízo a direitos ou interesses, difusos ou coletivos, de titularidade de sujeitos não participantes da relação negocial. Enunciado n° 29: Aplicam-se aos negócios jurídicos entre empresários a função social do contrato e a boa-fé objetiva (arts. 421 e 422 do Código Civil), em conformidade com as especificidades dos contratos empresariais.
2.4. Princípio da força obrigatória Se as partes tiveram a liberdade, sabiam a qual negócio estava se vinculando, assumem uma obrigação que tem que ser cumprida. O princípio da força obrigatória, ou do pacto sund servanda, impõe que aquela que efetivou a relação contratual fique a ela vinculado até que se cumpra o que efetivamente pactuou. Salvo permissão estipulada na própria relação contratual, aquele que se vincula deve cumprir com o pactuado, não cabendo, em regra, possibilidade de arrependimento ou desfazimento da obrigação sem a concordância da outra parte. Também não se trata de um princípio absoluto, na medida em que o próprio Código Civil trata da teoria da imprevisão e da possibilidade
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de resolução por onerosidade excessiva, nos art. 317 e 478, respectivamente. Tais dispositivos permitem discutir o que foi pactuado por fatos supervenientes e imprevisíveis que retirem o equilíbrio da relação contratual.
2.5. Princípio da boa-fé O art. 422 do Código Civil pontuou que: "Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé." O critério da boa-fé deverá nortear toda e qualquer atividade negocial, exigindo que as partes se comportem de forma correta não só durante as tratativas, como também durante a formação do contrato e durante o seu cumprimento, e por que não dizer, também, quando de sua extinção? Trata-se da positivação da boa-fé objetiva, tratada como novo princípio do direito contratual, diferente daquela outra, consistente numa análise subjetiva do estado de consciência do agente, denominada subjetiva. No campo dos negócios jurídicos, lida-se com a dita boa-fé objetiva, compreendida como instrumento de imposição de deveres às partes de modo a não quebrar a confiança da outra, constituindo-se numa autêntica norma de conduta a ser seguida pelos contraentes. Não se cuida, portanto, de aferição do estado psicológico de uma das partes, mas sim numa atitude de cooperação, dirigida substancialmente ao cumprimento de modo positivo das expectativas da outra parte quanto ao programa contratual. É fundamental a atividade interpretativa segundo a boa-fé, no sentido de nortear todos os participantes da relação jurídica, com a finalidade de definir o efetivo significado da vontade comum atribuída pelos contraentes no negócio, além de impor diretamente um padrão de comportamento leal, correto e honesto entre eles.
Além do enunciado citado no item da função social dos contratos que também menciona a boa-fé objetiva, a 1Jornada de Direito Comercial aprovou o seguinte enunciado: Enunciado n• 27: Não se presume violação à boa-fé objetiva se o empresário, durante as negociações do contrato empresarial, preservar segredo de empresa ou administrar a prestação
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de informações reservadas, confidenciais ou estratégicas, com o objetivo de não colocar em risco a competitividade de sua atividade.
3. CONlRATOS BANCÁRIOS
3.1. Conceito É chamada de contrato bancário uma espécie de negócio jurídico que abrange grande número de contratos em que uma das partes é um banco ou uma instituição financeira e viabiliza a intermediação de serviços financeiros. É possível separar os contratos bancários em: a) típicos, que são aqueles que envolvem atividades exclusivas dos bancos b) atípicos, em que se tem uma operação que pode ser realizada por outras instituições.
3.2. Espécies Vários são os contratos que são realizados no âmbito bancário e que aqui serão analisados sob o aspecto geral, sem se entrar em questões relativas à relação de consumo, por exemplo.
3.2.1. Depósito É o contrato de maior utilização nas instituições financeira e é o contrato bancário típico por excelência. Nesse contrato o Banco recebe determinada quantia em dinheiro do cliente, tornado proprietário, com a obrigação de devolvê-lo ao cliente, na mesma quantia, quando solicitado ou na data fixada. O Banco ainda deve prestar informações sobre a movimentação da conta do cliente sempre que forem solicitadas por este. Trata-se de um contrato real, visto que se aperfeiçoa somente com a entrega da quantia; oneroso, por ambas as partes possuírem proveito sobre o valor e unilateral, porque a partir do momento em que é efetuado pelo cliente, somente o Banco possui obrigações. Não cabe depósito de bens distintos de dinheiro, se isso ocorrer tem-se contrato de guarda ou custódia.
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Vale observar que o contrato de depósito não exige forma especial e sua prova pode ocorrer de qualquer forma. Na maioria dos casos o cliente recebe um recibo comprovando o depósito. • Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova organizada pelo CESPE para a Magistratura Federal/5• Região/2011, o enunciado da questão pedia para identificar o contrato de depósito bancário através da seguinte afirmativa: uo contrato por meio do qual alguém entrega quantia de dinheiro ao banco para que este dela disponha livremente, com a obrigação de restituí-la ao depositante ou de entregá-la, em uma única vez ou em partes, à pessoa que este indicar, caracteriza-se como". O contrato de depósito ainda se subdivide em algumas espécies diferentes. As espécies mais comuns são o depósito em conta corrente ou o depósito em cadernetas de poupança. Quando em caderneta de poupança as aplicações são mais seguras, mas menos rentáveis, uma vez que os critérios de remuneração são fixados por autoridades monetárias e não pelas partes do contrato. Na conta corrente, o banco é responsável por registrar todas as movimentações realizadas pelo cliente na conta, podendo este, a qualquer momento, verificar o saldo e suas transações. Nesse caso temos o banco, o correntista e a remessa, a qual é o valor depositado. O correntista pode optar pelo depósito com efeito à vista, em que as movimentações são livres; com aviso prévio, em que os saques só serão admitidos após prévia notificação ao banco; a prazo fixo, em que os saques somente serão autorizados na data aprazada ou com permissão de saque a descoberto, também conhecido com cheque especial. Com relação aos valores a serem depositados, podem ser depósitos populares, cujo objetivo é estimular a poupança e o rendimento de juros; depósitos limitados, em que o teto é um pouco maior que nos populares ou depósito sem limite, sem qualquer estipulação de valores. A extinção da conta corrente pode acontecer pelo término do contrato ou pela vontade manifestada de uma das partes. No caso das contas correntes, estas podem ser individuais ou conjuntas, quando há mais de um titular. As movimentações nessa conta
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somente serão efetivadas quando houver a assinatura de todos os titulares, o que normalmente é representado pela expressão e/ou. Os titulares podem responder de forma simples ou solidária. Nas contas correntes solidárias a assinatura de qualquer dos titulares é suficiente para efetivar a transação, possuem liberdade de movimentação na conta, mas respondem apenas pela parte que lhes cabe. Essa responsabilidade se restringe com relação ao Banco, visto que com relação a terceiros, mesmo sendo uma conta corrente, o devedor responde pela divida sozinho. Por exemplo, se um correntista repassar um cheque a um terceiro e não o pagar ele, sozinho, fica obrigado, não afetando o outro correntista. Um ponto importante do contrato de depósito diz respeito à aplicação de juros e correção monetária. Como já afirmado, no depósito bancário o banco fica obrigado a restituir o valor depositado no mesmo montante a qualquer tempo, se não houver disposição contratual em contrário. Porém, pode haver casos em que fique convencionada a restituição do valor acrescido de juros e correção monetária. Quando essa convenção existe, os juros são pagos em dinheiro ou são convertidos em créditos na conta do cliente, o que ocorre na maioria dos casos, desde que não seja um depósito à vista, afinal nesta modalidade o cliente tem a liberalidade de efetuar movimentação quando bem desejar. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova da Magistratura Federal/4• Região/2010, organizada por banca do próprio TRF-4• Região, o enunciado fazia a seguinte afirmativa: "O contrato de conta-corrente é um dos mais usuais na área bancária, estabelecendo-se relação na qual o banco se compromete a receber os valores remetidos pelo cliente ou por terceiros, bem assim a cumprir as ordens de pagamentos emitidas até o limite do valor depositado ou, firmado também pacto de abertura de crédito, até o limite estabelecido. Muitas vezes ocorrem problemas na execução desses contratos, dando causa a inúmeras ações que tramitam no judiciário brasileiro. Dadas as assertivas abaixo sobre os contratos de conta-corrente e de abertura de crédito, assinale a alternativa correta."
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Todas as quatro afirmativas apresentadas eram corretas: 1. o contrato de abertura de crédito, ainda que acompanhado de extrato da conta - corrente, não é título executivo, mas, instruído com demonstrativo de débito, constitui documento hábil para o ajuizamento da ação monitória. li. o instrumento de confissão de dívida, ainda que originário de contrato de abertura de crédito, constitui título executivo extrajudicial. Ili. Nos contratos bancários é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas. IV. A renegociação de contrato bancário ou a confissão da dívida não impede a possibilidade de discussão sobre eventuais ilegalidades dos contratos anteriores. V. Não é potestativa a cláusula contratual que prevê a comissão de permanência, calculada pela taxa média de mercado apurada pelo Banco Central do Brasil, limitada à taxa do contrato.
3.2.2.
Abertura de crédito
No contrato de abertura de crédito o banco (creditador) se obriga a disponibilizar ao cliente (creditado ) determinado valor em dinheiro para que este, em certo espaço e tempo possa realizar saques. O que ocorre é a disponibilização do valor para o cliente e não a entrega desse como ocorre no depósito. É um contrato que difere ainda do contrato de empréstimo, uma vez que não há com este a tradição do valor no momento da celebração do contrato. Juntamente com o valor disponibilizado, o banco debita as despesas, os tributos e cobra juros, que incidem sobre o montante movimentado e muitas vezes são conjugados com o contrato de conta corrente. Quanto à classificação tem-se que o contrato de abertura de crédito é bilateral, por gerar obrigações para ambos os contratantes; oneroso, vez que traz vantagens para as duas partes; consensual, por depender apenas da vontade das partes para ser celebrado; de execução sucessiva, visto que sua execução perdura com o tempo e intuito personae, por serem pessoais e intransferíveis. Para a liberação do crédito, o creditador exige garantia, a qual pode ser uma garantia real ou fidejussória (hipoteca, penhor, fiança, por exemplo) ou o patrimônio geral do creditado, quando este for
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suficiente para responder por todo valor. Neste último caso temos o contrato a descoberto. 3.2.3. Desconto bancário O desconto bancário ocorre quando um comerciante transfere ao banco seus créditos a fim de obter capital de giro. É uma movimentação muito utilizada atualmente. Neste contrato o banco adquire a propriedade dos créditos do comerciante e repassa a este, como forma de adiantamento das duplicatas, o valor inferior ao título; entretanto recebe na data aprazada o valor total do devedor. A diferença de valores é considerada dedução de lucros advindos da transação .
É uma operação muito semelhante à cessão de crédito, mas o endosso realizado pelo cliente em favor do banco é sempre de natureza pro solvendo, logo, não recebendo do devedor, o banco pode regressar contra o cliente e seus avalistas. Questão importante é sobre a eficácia processual do contrato de desconto . Os credores tentam sempre defender que ele poderá ser considerado título executivo extrajudicial se vir acompanhado do documento conhecido como borderô, que é a especificação de quais e quantos títulos toram trocados. Porém, tal documento não é capaz de dar a devida liquidez e certeza necessária aos títulos executivos extrajudiciais. • Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
No informativo n° 506 de 2012 o STJ determinou o seguinte entendimento: "Direito processual civil. Contrato de desconto bancário (borderô). Não caracterização de título executivo extrajudicial. o contrato de desconto bancário (borderô) não constitui, por si só, título executivo extrajudicial, dependendo a execução de sua vinculação a um título de crédito dado em garantia ou à assinatura do devedor e de duas testemunhas, nos termos do art. 585 do CPC. REsp 986.972, rei. Min. Luis F. Salomão, j. 4.10.12. 4º T. (/nfo 5o6, 2012)w
3.2.4. Contrato de financiamento O contrato de financiamento é uma subespécie do contrato de abertura de crédito, na medida em que o banco adianta ao cliente
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valores que serão destinados a determinados fins e em contrapartida exige garantias como cessão de crédito ou caução.
É o chamado crédito direto ao consumidor e pode ser conjugado com outras obrigações, normalmente, com o mandato, em que o banco fica responsável por responder pelo cliente perante seus devedores. 3.2.5. Custódia de valores A custódia de valores consiste no contrato em que o banco pactua com o cliente o depósito de bens infungíveis, ou seja, insubstituíveis mediante remuneração, podendo o bem ser retirado pelo cliente a qualquer tempo.
O banco atua como um depositário do bem, tendo guarda e dever de entregar ao cliente o documento que contenha a descrição do bem e que comprove seu recebimento. Não se confunde com o contrato de depósito, uma vez que este tem por objeto bens fungíveis, mas pode ser conjugado com o mandato quando auferirem renda. Nesse caso o banco é responsável por receber e repassar os valores da renda ao cliente.
3.2.6. Aluguel de cofre Há casos em que os bancos cedem a seus clientes pequenos cofres para que aqueles guardem títulos e valores mediante remuneração. Cabe ao banco proteção e cuidado do cofre e, por conseguinte, dos valores nele depositados, o que só será excluído quando diante de caso fortuito ou força maior. Assim, como o contrato cumula a locação de um cofre com a obrigação de cuidado do banco, resultando, assim, em um contrato misto, atípico.
3.2.7. Canão de crédito Existem 3 tipos de cartão de crédito: a) o emitido por sociedades empresárias para uso de seus clientes; b) o emitido por bancos para uso de crédito bancário; c) o emitido por intermediários entre o consumidor e o vendedor.
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CONTRATOS EMPRESARIAIS
Os emitidos por sociedades empresárias para uso de seus clientes podem ser utilizados apenas nas lojas de quem emitiu, servindo, assim, apenas para fornecer crédito especial a clientes. Os emitidos por bancos para uso de crédito bancário são utilizados pelos clientes para saques em caixas, mesmo que o cliente não tenha fundos, fato que faz o saque ser considerado empréstimo. Já os emitidos por intermediários para uso entre o consumidor e o vendedor são os mais utilizados e disponibilizam créditos aos clientes. Possuem caráter universal e muitas vezes possuem apoio de bancos. O emitente do cartão responderá pelos danos gerados pelo cartão clonado, uma vez que possui dever de cuidado. Da mesma forma, o cliente tem a responsabilidade de informar a administradora do cartão em caso de furto ou roubo . A jurisprudência dominante dispõe que o consumidor é responsável pelo mau uso do cartão até o momento da comunicação, após esta, o responsável é a administradora. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
No REsp 970322/RJ, publicado em 19/03/2010, o STJ manifestou seu entendimento da responsabilidade da administradora quando o cliente comunica imediatamente furto do cartão: DIREITO DO CONSUMIDOR. FURTO DE CARTÃO DE CRÉDITO. COMPRAS REALIZADAS POR TERCEIROS NO MESMO DIA DA COMUNICAÇÃO. RESPONSABILIDADE DA ADMINISTRADORA DE CARTÕES. DEMORA DE MENOS DE DOIS ANOS PARA O AJUlZAMENTO DA AÇÃO. IRRELEVÂNCIA NA FIXAÇÃO DO QUANTUM. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. i . o consumidor que. no mesmo dia do furto de seu cartão de crédito, procede à comunicação à administradora acerca do fato. não pode ser responsabilizado por despesas realizadas mediante falsificação de sua assinatura. Deveras, cabe à administradora de ca rtões, em parceria com a rede credenciada, a verificação da idoneidade das compras realizadas, utilizando-se de meios que dificultem ou impossibilitem fraudes e transações realizadas por estranhos em nome de seus clientes, e isso independentemente de qualquer ato do consumidor, tenha ou não ocorrido furto.
(...) 3. Recurso especial conhecido e provido.
Neste sentido, temos três sujeitos na relação contratual de cartão de crédito, quais sejam, o titular ou usuário do cartão, o emissor e o fornecedor que se caracteriza como o empresário que realiza contrato
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com o emissor para que possa aceitar o uso do cartão como pagamento. Logo, o emissor receberá o montante do valor das vendas realizadas descontando a remuneração dada ao fornecedor pela utilização, remuneração essa prevista no contrato de filiação. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame da Magistratura/AC/2012, da banca do CESPE, o enunciado da questão pedia para marcar a alternativa correta no que diz respeito às operações de cartão de crédito e a alternativa a ser marcada era a que afirmava: ªSerá infrutífera a ação de cobrança que vise ao recebimento de despesas efetuadas com cartão de crédito, caso o devedor comprove ter o débito se originado de fato fraudulento que, perpetrado por terceiro, caracterize a existência de fato impeditivo ao direito do credor." 4. ARRENDAMENTO MERCANTIL OU "LEASING"
4.i. Conceito O contrato de arrendamento mercantil, também denominado " leasing", é um tipo de contrato em que uma instituição financeira adquire um determinado bem móvel ou imóvel para que uma sociedade ou até mesmo uma pessoa física o utilize pagando, em contrapartida, aluguel por prazo determinado. Após esse prazo determinado, o locatário, no caso, a sociedade que utiliza o bem adquirido pela instituição financeira poderá optar pela devolução, pela compra pelo valor restante já estipulado em contrato ou pela renovação da locação do bem. Observa-se que, mesmo possuindo muitas semelhanças com um contrato de locação, o contrato de leasing possui certas particularidades que devem ser observadas. Optando pela renovação da locação, o valor das prestações deverá ser reduzido, uma vez que não mais está em negociação um bem novo. As disposições legais dessa espécie de contrato estão na Lei 6.099 de 1974, a qual dispõe que devem existir dois sujeitos para que fique caracterizado o contrato, quais sejam: o arrendador e o arrendatário. O primeiro sempre será uma pessoa jurídica constituída como uma Sociedade Anônima e controlada pelo Banco Central, enquanto o segundo será pessoa física ou jurídica de direito público ou privado. Vale 360
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observar que, mesmo sendo o bem escolhido e utilizado pelo arrendatário, o proprietário do bem será o arrendador. O objeto do contrato poderá ser um bem móvel ou imóvel e o contrato poderá ser pactuado por meio de instrumento público ou privado, desde que conste a descrição do objeto, com suas especificações que permitam sua perfeita identificação, o valor das prestações e a forma de pagamento e o prazo de vencimento, que, por sua vez, deverá ser de, no mínimo, 3 anos. Quanto à classificação, pode-se afirmar que o contrato de arrendamento mercantil é um contrato consensual, por se aperfeiçoar com a vontade das partes e independente da entrega da coisa; bilateral, por terem as partes obrigações recíprocas; oneroso, pois há ônus para ambas a partes; solene, por exigir forma escrita; comutativo, vez que as prestações são certas e podem ser previstas pelas partes; de trato sucessivo, visto que a execução ocorre dentro do prazo previsto e de adesão, porque o arrendador é quem estabelece todas as cláusulas, não cabendo ao arrendatário discuti-las. Atualmente entende-se que. quando se trata de arrendamento mercantil de veículos, a parte arrendadora apenas caracteriza uma intermediária entre o arrendatário e o vendedor do bem. logo, não terá qualquer responsabilidade perante terceiros pelo uso indevido e pelos danos causados a aqueles. Assim, o enunciado da Súmula 492 do Supremo Tribunal Federal não mais surte efeitos. A nova Súmula 293 do Superior Tribunal de Justiça põe fim à discussão acerca do valor residual do contrato, o qual compreende no valor estipulado em contrato para aquisição do bem arrendado. Atualmente entende-se que o arrendatário pode antecipar esse pagamento, desde que não fique caracterizada a compra. mas sim adiantamento em garantia das obrigações contratuais assumidas. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Otexto da súmula informa que: Súmula n• 293 - A cobrança antecipada do valor residual garantido (VRG) não descaracteriza o contrato de arrendamento mercantil.
Nesse sentido, a antiga discussão relacionada à descaracterização do arrendamento para compra e venda, quando houver adiantamento
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do valor residual perdeu a força, revogando, por conseguinte, a Súmula 263 do mesmo Tribunal. A extinção do contrato de arrendamento mercantil pode ocorrer por diversas formas, dentre elas
• por falência da arrendadora; • por inadimplemento de qualquer das partes; por vontade das partes (distrato ou acordo bilateral); ou • por término do prazo estipulado, quando o arrendatário fará opção pela renovação, pela compra ou pela devolução do bem. Caso a extinção se dê por inadimplemento, é preciso a notificação prévia do devedor para constituí-lo em mora e para que o credor possa mover seus meios de reaver o bem. • Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Também há súmula sobre a necessidade de notificação prévia do devedor para constituí-lo em mora: Súmula n° 369 - No contrato de arrendamento mercantil (leasing), ainda que haja cláusula resolutiva expressa, é necessária a notificação prévia do arrendatário para constituí-lo em mora.
4.2. Espécies
Temos dois tipos de contrato de arrendamento mercantil, o financeiro e o operacional. O financeiro é o geral já especificado anteriormente, em que uma pessoa jurídica adquire um determinado bem para utilização de um terceiro, o arrendatário e o operacional ou rentingconsiste em uma modalidade em que o bem objeto do contrato já é de propriedade do arrendador, que o aluga a um arrendatário, assumindo todos os riscos da coisa. • Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No exame da AGU/2009, organizado pelo CESPE, foi considerada incorreta a seguinte afirmativa: "Caracteriza-se leasing operacional quando uma sociedade empresária aliena um bem de sua propriedade à companhia de leasing, que o arrenda à mesma pessoa jurídica que o vendeu." Também na prova da Magistratura/DF/2011, de banca do TJ-DFT, a questão dizia que "A espécie de leasing em que o bem arrendado já pertence à empresa arrendadora é:" "leasing operacional"
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4.3. Aspectos processuais O contrato de arrendamento mercantil, quando não cumprido pelo arrendatário, pode ser levado a juízo pelo arrendador, o qual pode requerer a resolução do contrato e a devolução do bem. No entanto, os Tribunais vêm aceitando a retomada do bem sem que haja a rescisão do contrato judicialmente. Essa retomada é exercida por meio da Ação de Reintegração de Posse, uma vez que, quando houver a falta de pagamento, fica caracterizado o esbulho e, quando verificados a mora e o esbulho, cabe a cumulação da ação possessória com a cobrança dos aluguéis em atraso. Há quem entenda ainda que se podem aplicar ao arrendamento mercantil as previsões do Código de Defesa do Consumidor, especificamente o artigo 6°, V, visto que o arrendador é uma instituição financeira fornecedora de serviços. Nesses termos, esta deve suportar a política cambial, o que permite a revisão do contrato. O Ministério Público, de acordo com o entendimento dominante, é parte legítima para propor ação civil pública para, defendendo direito homogêneo dos consumidores, discutir cláusula contratual que prevê o reajuste das prestações por meio da variação cambial. • Como esse assunto foi cobrado em concurso? Na prova para Advogado/EBC/2011, organizada pelo CESPE, foi considerada incorreta a seguinte afirmativa: "Ana, pretendendo adquirir um automóvel, firmou contrato de arrendamento mercantil com certa instituição financeira e, após alguns meses, deixou de efetuar o pagamento das prestações devidas. Nessa situação, é prescindível a notificação prévia de Ana, a fim de constituí-la em mora.#
5. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA
O contrato de alienação fiduciária consiste no meio pelo qual uma parte aliena à outra um determinado bem, com o dever de devolvê-lo quando da ocorrência de um determinado fato, que via de regra, é o pagamento. Nesse sentido, verifica-se que é um contrato instrumental, na medida em que constitui meio para que outro contrato principal se concretize. Observa-se também que há associação com o contrato de mútuo .
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O maior exemplo de contrato de alienação fiduciária é verificado nas aquisições de veículos. Quando alguém deseja adquirir um veículo, mas não possui valor suficiente para tanto, se vale de uma instituição como intermediária do negócio, que empresta o valor necessário para a aquisição (aqui temos o contrato de mútuo). O bem então é transferido para a propriedade do banco como garantia do empréstimo, mas o devedor terá a posse. Com o pagamento total do valor do empréstimo o bem passa a ser de propriedade do antigo devedor. Quando o objeto for bem imóvel, se o pagamento não for realizado, a propriedade antes resolúvel se consolida e o fiduciário (credor) realizará hasta pública ou leilão para a venda do bem e o levantamento do valor; que será utilizado para cobrir o montante ainda devido. Caso o valor seja superior à dívida, este será devolvido ao devedor (arts. 26 e 27, Lei 9514/97). Se móvel, o credor poderá realizar busca e apreensão do bem e repassar o crédito a um terceiro independentemente de leilão ou hasta pública. O valor que exceder à dívida será também devolvido ao devedor. Caso não encontre o bem, o credor poderá converter a busca e apreensão em depósito, como determina o Código de Processo Civil (Capítulo li do Título 1do Livro IV) Assim, conclui-se que o objeto pode ser bem móvel ou imóvel e as partes são o fiduciante (devedor que deseja adquirir o bem) e o fiduciário (credor; em regra a instituição financeira). A alienação pode ocorrer ainda sobre um bem que já pertence ao devedor; ou seja, há um refinanciamento do bem, em que o devedor pega o valor do empréstimo dando o bem que já possui como garantia. Essa situação ocorre muito quando estamos diante de crises financeiras, por exemplo. • Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
A súmula 28 demonstra que: Súmula n• 28 - o contrato de alienação flduàãria em garantia pode ter por objeto bem que jã integrava o patrimônio do devedor.•
A alienação, quando tem por objeto o bem imóvel, será disciplinada pela Lei 9.514 de 1997 e quando móvel, pela Lei 4.728/65, decreto-lei 9u/1969 e os artigos 1361 a 1368 do Código Civil.
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A alienação é anotada no registro do bem, pois, mesmo sendo este registrado em nome do devedor, há que se informar que a propriedade ainda é da instituição financeira. Caso a anotação não seja realizada, não há que se falar em prejuízo de terceiro de boa fé que adquiriu o bem. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Trata-se de tema sumulado devido as reiteradas decisões no sentido da necessidade do registro da alienação: Súmula 92 n• - A terceiro de boa-fé não é oponível a alienação fiduciária não anotada no Cenificado de Registro do veículo automotor.
~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
No certame da banca da CEPSE para a Magistratura do Trabalho/1• Re· gião/2010, o enunciado pedia para assinalar a alternativa correta a respeito dos contratos mercantis, que era: "É possível a alienação fiduciária de bens imóveis em que o devedor, com o escopo de ofertar garantia, contrata a transferência ao credor da propriedade resolúvel de coisa imóvel, transmi· tindo ao fiduciário a posse indireta do bem." O tratamento legislativo do contrato de alienação fiduciária de bens móveis, previsto no Decreto 911/6o foi bastante alterado pela Lei n° 12.043/2014 que reformulou a constituição em mora, a venda do bem a apreendido e principalmente a consequência principal da perda do bem alienado por parte do devedor. O art. 2° do Decreto passou a ter a seguinte redação: Art. 2° No caso de inadimplemento ou mora nas obrigações contratuais garantidas mediante alienação fiduciária, o proprie· tário fiduciário ou credor poderá vender a coisa a terceiros, independentemente de leilão, hasta pública, avaliação prévia ou qualquer outra medida judicial ou extrajudicial, salvo dis· posição expressa em contrário prevista no contrato, devendo aplicar o preço da venda no pagamento de seu crédito e das despesas decorrentes e entregar ao devedor o saldo apurado, se houver, com a devida prestação de contas. Aqui a mudança foi simples, apenas acrescentando a necessidade de prestação de contas por parte do credor quando fizer a venda do bem que deu garantia ao contrato.
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No que diz respeito a comprovação da mora, a mudança foi bastante significativa, já que o §2° do art. 2° passou a determinar que esta poderá ser feita por carta registrada com aviso de recebimento, não mais sendo necessária a notificação cartorária. Essa alteração facilita a cobrança do crédito por parte do credor. A respeito da ação de busca e apreensão do bem gravado com a alienação, devem ser ressaltadas algumas novidades importantes. A primeira delas é a que passou a constar do caput do art. 3° do Decreto que além de prever que o proprietário fiduciário ou credor poderá, desde que comprovada a mora ou o inadimplemento, requerer contra o devedor ou terceiro a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente, a qual será concedida liminarmente, passou a prever expressamente que a liminar poderá ser apreciada em plantão judiciário, possibilitando maior celeridade na decisão judicial e menor prejuízo do credor. A lei n° 12.043/2014 acabou com a possibilidade de purga da mora no contrato de alienação fiduciária, alterando a redação dos §§1° e 2° do art. 3°. Esses dispositivos possuíam a seguinte redação: § i 0 Despachada a inicial e executada a liminar, o réu será citado para, em três dias, apresentar contestação ou, se já tiver pago 4oºk (quarenta por cento) do preço financiado, requerer a purgação de mora.
§ 2° Na contestação só se poderá alegar o pagamento do débito vencido ou o cumprimento das obrigações contratuais.
Passaram a vigorar com a seguinte previsão: § iº Cinco dias após executada a liminar mencionada no caput, consolidar-se-ão a propriedade e a posse plena e exclusiva do bem no patrimônio do credor fiduciário, cabendo às repartições competentes, quando for o caso, expedir novo certificado de registro de propriedade em nome do credor, ou de terceiro por ele indicado, livre do ônus da propriedade fiduciária. § 2° No prazo do § iº, o devedor fiduciante poderá pagar a
integralidade da dívida pendente, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial, hipótese na qual o bem lhe será restituído livre do ônus.
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Observa-se que anteriormente, caso o devedor já tivesse cumprido pelo menos 4oºk do contrato, poderia pagar as parcelas em atraso, juntamente com os encargos de mora e requerer o prosseguimento do contrato, sendo o bem lhe devolvido. Esta possibilidade não mais existe. Para evitar a perda do bem, o devedor terá a única opção de pagar a integralidade do débito, já que se operou o vencimento antecipado das parcelas vincendas. Nesse caso terá não apenas a posse do bem devolvida como também a propriedade consolidada em suas mãos. ~
Qual o entendimento do STJ sobre o assunto?
Apesar de ser uma modificação recente, o STJ já tem julgado contemplando esta modificação conforme constou do Informativo 540/2014: Impossibilidade de purgação da mora em contratos de alienação fiduciária firmados após a vigência da Lei 10.931/04.
Nos contratos firmados na vigência da Lei 10.931/04, que alterou o art. 3°, §§ 1° e 2°, do Decreto-lei 911/69, compete ao devedor, no prazo de cinco
dias após a execução da liminar na ação de busca e apreensão, pagar a integralidade da dívida - entendida esta como os valores apresentados e comprovados pelo credor na inicial -, sob pena de consolidação da propriedade do bem móvel objeto de alienação fiduciária. Rfsp 1.418.593-MS, rei. Min. Luis Felipe Salomão, 14.5.14. za S.
Tais mudanças evidenciam claramente a busca pela diminuição do inadimplemento e os riscos do credor, já que visam acelerar e facilitar o procedimento de busca e apreensão do bem dado em alienação fiduciária. Como última alteração significativa mister se faz abordar a nova redação do art. 4° do Decreto 911/69 que trata da hipótese do bem dado em alienação não ser encontrado ou não estar na posse do devedor. Até a Lei de 2014 essa dispositivo permitia que a ação de busca e apreensão fosse convertida em ação de depósito. A intenção inicial do legislador era possibilitar que transformando em ação de depósito e ainda sim o bem não fosse entregue, o devedor seria considerado depositário infiel e poderia ter sua prisão decretada. A discussão sobre tal prisão sempre foi efervescida, mas perdeu lugar quando o Brasil se tornou signatário do Pacto de São José da Costa Rica que acabou com essa modalidade de prisão civil e assim, o objetivo da conversão em ação de depósito ficou totalmente sem razão de ser.
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A nova redação do dispositivo ficou da seguinte forma: Art. 4º Se o bem alienado fiduciariamente não for encontrado ou não se achar na posse do devedor, fica facultado ao credor requerer, nos mesmos autos, a conversão do pedido de busca e apreensão em ação executiva, na forma prevista no Capítulo li do Livro li da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de i973 - Código de Processo Civil.
Não há que se falar mais em ação de depósito e sim o prosseguimento com a ação executiva para buscar bens do devedor a fim de satisfazer os direitos do credor como deve ser toda relação obrigacional.
6. FRANQUIA OU "FRANCHISING" 6.1. Conceito Nesta espécie de contrato, o comerciante que possui uma marca ou um produto permite que outro a utilize, mediante remuneração e prestação de serviços. De acordo com as disposições da Lei 8.955 de i994, para que se tenha um contrato de franquia são necessários basicamente dois elementos, a licença de utilização da marca e a prestação de serviços conforme estabelecido, uma vez que se trata de um contrato em que se tem a autorização de utilização de um nome mediante prestação de serviços. Além disso, temos as figuras do franqueado, do franqueador e da marca objeto da franquia,
o franqueador é quem possui a marca ou o produto e ainda detém a exclusividade de exploração daquela determinada marca, fornecendo aos franqueados assistência, administração e gerenciamento. Já o franqueado é quem vai utilizar a marca ou o produto e que paga uma remuneração inicial. Essa remuneração é tida como inicial porque consiste apenas na filiação, cabendo ainda o repasse de um valor periódico sobre os lucros obtidos, de acordo com a estipulação contratual. O franqueado deve ainda adquirir os produtos ou os serviços do franqueador, seguir suas determinações e ainda atuar com exclusividade. Neste tipo de contrato o franqueado deve arcar com as despesas de instalação do estabelecimento, de acordo com as determinações
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do franqueador, o qual estabelecerá a forma como o estabelecimento será montado (engineering); o treinamento dos funcionários e a administração do estabelecimento (management) e como será feita a divulgação dos produtos e serviços (marketing). Essas são características que diferenciam o contrato de franquia do contrato de concessão de venda, cujo objetivo é apenas a distribuição dos produtos.
o franqueado ainda possui autonomia, com personalidade jurídica própria, mantendo seus empregados, suas responsabilidades independente do franqueador, não havendo, portanto, qualquer vínculo empregatício com este. Entretanto, esta autonomia é bastante relativa, na medida em que o franqueado depende da estrutura dada pelo franqueador, o que gera, muitas vezes, certo tipo de submissão, como a impossibilidade de fazer promoções, de criação, e estipulação de preço, por exemplo. Quanto à classificação, pode-se afirmar que é um o contrato consensual, por se aperfeiçoar apenas mediante a vontade das partes; bilateral. por ambas as partes possuírem obrigações; oneroso, pois há ônus para cada parte; de trato sucessivo, visto que a execução ocorre dentro do prazo previsto e atípico, porque a relação entre as partes rege-se apenas pelas cláusulas convencionadas. Nesse sentido, observa-se que muitas das cláusulas presentes nos contratos serão específicas da natureza da marca ou do produto, mas sempre estarão presentes disposições sobre prazo de duração do contrato e sua possibilidade de prorrogação, extinção do contrato, valor a ser repassado ao franqueador. Com relação à extinção do contrato de franquia verifica-se que poderá ocorrer como nos contratos em geral, mas ainda com o fim do prazo contratual, inadimplemento total ou parcial, conduta do franqueado que atinja diretamente a marca o produto ou pela vontade das partes. • Como esse assunto foi cobrado em concurso? No concurso para Advogado/Petrobras/2011, organizado pela CESGRANRIO, o enunciado da questão dizia: #Quando um empresário licencia o uso de sua marca a outro, prestando-lhe serviços de organização empresarial, com ou sem venda de produtos, mediante remuneração direta ou indireta, sem que fique caracterizado vínculo empregatício, tem-se um contrato de". o contrato que se queria identificar era justamente o de franquia.
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6.2. Espécies Temos basicamente 3 modalidades de contrato de franquia, quais sejam: franquia industrial, de comércio e de serviço. A franquia industrial ou lifreding consiste no contrato em que o franqueador é obrigado a auxiliar o franqueado na construção de uma unidade industrial, transmitindo sua tecnologia e sua marca e fornecendo a assistência técnica necessária. Nesse caso o franqueado fabrica e vende o produto por ele produzido com a marca do franqueador e em contrapartida, pode ter que manter segredo sobre determinados procedimentos.
É um contrato muito utilizado pelas indústrias automobilísticas e de alimentos, por exemplo. No contrato de franquia de comércio ou de distribuição há apenas a venda dos produtos do franqueador pelo franqueado e a manutenção da marca, enquanto o franqueador fica responsável pelo aprimoramento dos métodos de comercialização. Já a franquia de serviços pode ser propriamente dita, em que o franqueado produz e vende as prestações de serviço do franqueador ou hoteleira, que tem por objetivo atingir certo tipo de clientes. Essa última espécie é muito utilizada pelas escolas, restaurantes, lanchonetes.
7. FATURIZAÇÃO OU "FAffiORING"
p. Conceito
o contrato de faturização, também conhecido como factoring ou fomento mercantil é aquele em que um empresário cede a outro créditos advindos de vendas mercantis, mediante pagamento, ou seja, é a venda de um faturamento de uma sociedade a outra, quando realizadas vendas a prazo. o adquirente dessas faturas, o faturizador, assume os riscos de insolvência do consumidor, sem que tenha direito de regresso contra o faturizado, visto que o faturizador garante ao faturizado o recebimento do valor. Tem-se assim, 3 sujeitos na relação contratual, o faturizador, o faturizado e o comprador. O primeiro pode ser pessoa física ou jurídica,
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mas deve ser um comerciante, enquanto o segundo é o cedente, pessoa física ou jurídica titular dos créditos. Já o comprador da mercadoria ou adquirente do serviço é o devedor, o gerador do crédito, que deve ser notificado quando da realização do contrato de faturização. O comprador será cobrado diretamente pelo faturizador e o faturizado terá responsabilidade apenas em garantir a existência do crédito, não respondendo pela insolvência do comprador, o que consiste em risco para o faturizador. O faturizado tem o dever de pagar a comissão devida ao faturizador e de prestar todos os tipos de informações necessárias relativas ao crédito. Por outro lado, o faturizador irá desempenhar diferentes funções: garantir o crédito, visto que, mesmo diante da insolvência do consumidor fica obrigado ao pagamento; administrar os créditos do faturizado e financiar o faturizado, uma vez que adianta a este os valores advindos dos títulos. Nesse último caso, o faturizador se sub-rogará nos direitos de crédito do faturizado por meio de endosso ou de cessão de crédito. No entanto, pode recusar os títulos apresentados pelo faturizado em todo ou em parte, quando não considerar conveniente a transação e ainda acionar o Judiciário a fim de receber os valores em caso de inadimplência do devedor. ~
Importante!
A grande diferença entre o factoring e o desconto de títulos é que neste, o cliente que faz a troca continua responsável pela solvência do devedor principal. Já no factoring ele se desobriga e o risco do inadimplemento fica a cargo do faturizador. Quanto à classificação do contrato de faturização, ele é bilateral, uma vez que gera direitos e obrigações para as duas partes da relação contratual; consensual, por depender apenas da vontade das partes para se aperfeiçoar; de trato sucessivo, pois a execução é prolongada ao tempo, oneroso, por haver vantagens e ônus para ambos os contratantes e ainda atípico, por não haver lei específica que o regularmente. Nesse sentido, aplicam-se a esse contrato as disposições dos artigos 286 a 289 e 693 a 709 do Código Civil. 371
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A extinção da faturização se faz da mesma forma que nos contratos em geral e ainda pelo vencimento do prazo estipulado em contrato; inadimplemento total ou parcial de uma das partes; morte de uma das partes; resilição unilateral; vontade das partes ou pela mudança de estado de uma das partes que prejudique a continuidade do contrato. 7.2. Espécies Tem-se muitas espécies de contrato de faturização, entretanto, duas delas são mais utilizadas. O conventlonal factorÍllg é contrato em que o faturizador antecipa o pagamento dos valores ao faturizado, juntamente com a prestação de serviços de administração, de gestão e de notificação do devedor sobre a transação, isso é, há uma cessão de crédito. No maturity factorÍllg o pagamento se faz apenas na data do vencimento do crédito, logo, não temos o serviço de financiamento, somente o de administração e gestão.
8. COMPRA E VENDA MERCANTIL 8.1. Conceito Compra e venda mercantil é o contrato pelo qual uma pessoa se obriga a transferir a outra o domínio de uma coisa, tendo, em contrapartida, o valor antes estipulado, assim como a simples compra e venda, mas tem por objeto bens que estão envolvidos na circulação de mercadorias, assim, compra e venda realizada fora da cadeia ou no final dela não são consideradas mercantis. Para tanto, tem que ser celebrada entre dois empresários, sendo a coisa negociada e a finalidade da operação consequência dessa primeira característica. Em regra, todas as disposições utilizadas na compra e venda obrigacional serão também aplicadas na compra e venda mercantil, excetuando os casos de insolvência. No primeiro caso, a insolvência do devedor permite ao credor exigir caução e não entregar a coisa (art. 495, CC), enquanto na segunda utilizam-se os fundamentos da falência, uma vez que se trata de empresários. Observa-se que a compra e venda mercantil pode ter como objeto coisa futura, ou seja, no momento da celebração do contrato, o vendedor ainda não possui o bem, mas tem condições de adquiri-lo ou de
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produzi-lo no prazo estipulado. Se assim não fizer, teremos a inexecução do contrato, que obriga o vendedor a indenizar o comprador. Com relação ao preço do produto, este, normalmente, é estabelecido pelas partes, mesmo quando há atuação de árbitros, o que demonstra a prevalência da autonomia da vontade nos contratos. Porém, há casos em que o Estado controla direta ou indiretamente os preços. Quando atua diretamente, o Estado pode congelar os preços, impedindo sua elevação; tabelar os valores, fixando valor máximo para a negociação; autorizar ou homologar aumentos em setores específicos da economia ou ainda monitorar os preços, na medida em que estipula que a modificação dos valores seja informada à autoridade administrativa. Quando atua de forma indireta, o Estado dispõe, por exemplo, benefícios fiscais. Em ambos os casos, o pagamento pode ser efetuado à vista ou em parcelas, sempre conforme o acordado entre os contratantes. Trata-se de um contrato consensual, pois se realiza mediante acordo de vontades; bilateral, uma vez que as partes possuem obrigações recíprocas; oneroso, por haver ônus para ambas as partes; de execução diferida ou instantânea, a depender do acordado, vez que pode haver parcelamento na execução e comutativo, por serem as parcelas certas e previstas pelas partes. ~
Como esse assunto foi cobrado em concurso?
Na prova da Magistratura/T0/2007, organizada pelo CESPE, foi requerido que fosse assinalada a alternativa verdadeira no que diz respeito à compra e venda mercantil e a resposta correta que era a que dizia: "Considera-se perfeita a compra e venda pura quando as panes acordam quanto ao preço e ao objeto.#
8.2. Obrigações do comprador
A principal obrigação do comprador é o pagamento do valor estabelecido. Este pode ser realizado no momento da entrega da mercadoria ou em local e data estabelecidos em contrato, mas ainda tem o dever de receber a mercadoria no local e na data estabelecidos, o que, se não for realizado, permite ao vendedor exigir compensações pelo não cumprimento da obrigação conforme acordado. 373
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Se a transferência do domínio foi devidamente realizada pelo vendedor; mas não houve a contraprestação do comprador, aquele pode acionar o juízo a fim de receber o valor que lhe é de direito, por meio de execução, se possuir o título executivo. Após a transferência de domínio, se a coisa necessitar de registro, cabe ao comprador providenciá-lo, arcando com todas as despesas decorrentes da regularização.
8.3. Obrigações do vendedor O vendedor possui, basicamente, três obrigações, quais sejam: transferir o domínio da coisa, responder pelos vícios e responder pela
evicção. A primeira obrigação representa a execução do contrato, na medida em que o vendedor deve entregar ou colocar à disposição do comprador as mercadorias objeto da compra e venda. A tradição ocorre quando há a entrega da mercadoria do vendedor ao comprador, momento em que temos as seguintes consequências: a) o cumprimento da obrigação pelo devedor; podendo este exigir a do comprador; b) os riscos do bem alienado são suportados pelo comprador, ainda que se encontre no estabelecimento do vendedor, em trânsito ou aos cuidados de terceiros; c) as despesas incorridas com a mercadoria (guarda e conservação, tributos), são de responsabilidade do comprador, e a este pertencem as rendas e os frutos. A segunda obrigação do vendedor consiste em responder pelos vícios da coisa vendida, isto é, configura-se o vício quando a coisa vendida não se encontra apta aos fins esperados pelo comprador, por deficiência na qualidade ou quantidade. Nesse caso o comprador tem direito de optar entre o desfazimento do contrato (ação redibitória) ou redução proporcional do preço (ação quanri minoris ou estimatória). A norma estabelece um prazo prescricional de 30 (trinta) dias, para o comprador manifestar a sua opção junto ao vendedor, contados do recebimento da mercadoria, quando o vício é manifesto. Sendo o vício
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oculto, conta-se a partir da sua manifestação, limitando-se, porém, o prazo a i8o (cento e oitenta) dias da entrega efetiva;
Por fim, o vendedor responde pela evicção. Esta questão consiste na perda da mercadoria adquirida do vendedor, em razão de reconhecimento judicial de titularidade da mesma a terceiros. Ocorrendo a evicção o vendedor fica obrigado a indenizar as perdas ao comprador. Esta indenização não ocorrerá se esse tinha conhecimento da reivindicação de terceiros sobre a mercadoria, antes de concluir o contrato. 8.4. Contrato de fornecimento Para o Direito, independem os bens, a periodicidade com que os produtos devem ser repostos, por exemplo, o que sempre será considerado compra e venda mercantil; porém, quando se considera a vertente empresarial, essas constantes são imprescindíveis, pois não há como realizar diariamente a negociação de produtos, correndo, ainda, o risco de não haver disponibilidade do produto necessário para atender seus clientes. Assim, para tornar a administração da atividade mais racional, reduzindo os riscos, temos os contratos de compra e venda de execução periódica ou contínua, os chamados contratos de fornecimento . Nesse contrato, uma das partes fica obrigada a vender a outra o objeto do contrato de acordo com as particularidades do contrato, estipuladas pelas partes, estabilizando, assim, a relação negocial. Normalmente observa-se o fornecimento de certo produto específico ou de periodicidade em que o produto deve ser reposto. o descumprimento das condições estabelecidas permite, como em qualquer outro contrato, a rescisão e perdas e danos por parte do contratante.
8.5. Contrato de compra e venda de empresas É um contrato que tem por objetivo a alienação da participação societária, ou seja, participação em quotas de sociedades limitadas ou ações de companhias, para tanto, é necessária a transferência da quota suficiente para que o comprador se torne detentor do poder de controle da sociedade.
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Pode também ocorrer compra e venda do estabelecimento comercial como um todo, o que chamamos de trespasse, já estudado no item i do Capítulo 2. A negociação muitas vezes é muito difícil ocorrer, uma vez que para adquirir uma sociedade, o interessado deve ter acesso às informações necessárias, as quais, muitas vezes, são sigilosas, por dizerem respeito ao funcionamento e produção. Em muitos casos os concorrentes são os maiores interessados na negociação da sociedade, e a abertura dessas informações sigilosas pode representar o fim do poder de concorrência da empresa. Dessa forma, a compra e venda de empresas é muito delicada por envolver informações confidenciais. Para evitar qualquer fraude é que temos três fases na negociação, as quais veremos a seguir: Na fase preliminar as informações prestadas não são confidenciais, apenas relativas à contabilidade e atos constitutivos, o que, em momento algum, coloca em risco a integridade da empresa e sua produção. Nessa fase, analisadas as informações, as partes firmam um instrumento preliminar que traduz o interesse prévio na negociação. Este documento pode ainda conter cláusula de exclusividade por um determinado tempo, visto que as negociações envolvem altos custos. Além disso, pode ainda prever o preço inicial, que significa um valor estipulado pelas partes para o estabelecimento. Entretanto, nenhum desses elementos antes citados é essencial como a cláusula de não vinculação da parte, ou seja, a cláusula é que determina que o negócio que ainda está sendo realizado e que o possível comprador ainda não se vinculou a nada até ali firmado, não passando de uma fase preliminar de negociação que não possui eficácia vinculante. Na segunda fase, a da auditoria, o comprador consegue ter acesso a informações mais reservadas da sociedade, mesmo não sendo estas as sigilosas, para submetê-las a uma auditoria, cuja finalidade é analisar todo o andamento da empresa, no aspecto contábil, jurídico, de funcionários, fiscal, dentre outros. Realizada a auditoria, o comprador pode considerar que não há nada que impeça a compra e venda, e então apresenta o preço que se 376
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propõe a pagar a fim de efetivar a negociação; mas se os resultados da auditoria não forem favoráveis, manifesta seu desinteresse e põe fim à negociação. Vale observar que, quando o possível comprador faz parte do "corpo" da sociedade, a auditoria não deve ser realizada, vez que já possui conhecimento suficiente sobre a sociedade. Demonstrado o interesse na aquisição da sociedade, passamos para a terceira e última fase qual seja, a fase negocial. Essa fase ocorre ente a apresentação da proposta pelo comprador (artigos 427 e seguintes do Código Civil), e a aceitação por parte do vendedor (art. 430 e seguintes do Código Civil). Consiste na negociação propriamente dita do preço, da forma e condição de pagamento, o que resulta em uma minuta ou pré-contrato, o qual é assinado pelas partes, mas não desvirtua o objetivo da fase, que é a negociação. Neste sentido, podemos ter desistência de negociação por alguma das partes ou por ambas, o que põe fim a toda negociação, podemos ter o seguimento do negócio ou há uma contraproposta que inicia nova negociação, tudo com o objetivo de concluir a compra e venda iniciada na fase preliminar.
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