GESTÃO DA QUALIDADE Teoria e Casos
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Marly Monteiro de Carvalho Edson Pacheco Paladini (coordenadores)
GESTÃO DA QUALIDADE Teoria e Casos 2ª edição revista e ampliada
Edson Pacheco Paladini Gregório Bouer José Joaquim do Amaral Ferreira Marly Monteiro de Carvalho Paulo Augusto Cauchick Miguel Robert Wayne Samohyl Roberto Gilioli Rotondaro
COLEÇÃO
CAMPUS ABEPRO Engenharia de Produção
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Às nossas famílias e aos nossos alunos, fontes de inspiração e motivação.
Os Autores EQUIPE PRO/POLI/USP Marly Monteiro de Carvalho UÊ Ê«ÀviÃÃÀ>ÊÛÀi`ViÌiÊ`>Ê ÃV>Ê*ÌjVV>Ê`>Ê1-*]Ê>ÌÕ>`Ê>Ê}À>`Õ>XKÊiÊ «Ã}À>`Õ>XKÊ`Ê i«>ÀÌ>iÌÊ`iÊ }i
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VIII
Gestão da Qualidade
ELSEVIER
e de 2a Vice-Presidência. Foi vice-coordenadora de pesquisa da Escola Politécnica. Foi pesquisadora do Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo de 1992 a 2000. Roberto Gilioli Rotondaro UÊ É professor da Engenharia de Produção da Escola Politécnica da USP desde 1996, com mestrado e doutorado (EPUSP) em Engenharia Metalúrgica. Chefia o grupo de Qualidade e Engenharia do Produto (QEP), e é o Coordenador da Comissão de Extensão do Departamento de Engenharia de Produção. UÊ É o responsável pelo MBA Gestão de Operações do programa de Extensão do Departamento de Engenharia de Produção que é operacionalizado pela Fundação Vanzolini. UÊ É membro do conselho curador da Fundação Vanzolini. Foi gerente geral da Qualidade e Gerente de Produto na iniciativa privada de 1980 a 1996. Gregório Bouer UÊ É professor da Engenharia de Produção da Escola Politécnica da USP, com mestrado e doutorado (EPUSP) em Engenharia de Produção. Membro do grupo de Qualidade e Engenharia do Produto (QEP). UÊ Foi vicepresidente e presidente da Fundação Vanzolini. UÊ É coordenador dos cursos de Capacitação em Gestão de Projetos da Fundação Vanzolini. É membro do conselho curador da Fundação Vanzolini. É diretor da TQS Engenharia Ltda. José Joaquim do Amaral Ferreira UÊ É professor da Engenharia de Produção da Escola Politécnica da USP, com graduação em Engenharia Mecânica (EPUSP), opção Produção, mestre em Engenharia de Produção (EPUSP) e Master of Science in Industrial Engineering, Stanford University, USA, e doutor em Engenharia (EPUSP). UÊ É diretor de certificação da Fundação Carlos Alberto Vanzolini (FCAV) e lead assessor, pela International Register of Certificated Auditors, Inglaterra.
EQUIPE UFSC Edson Pacheco Paladini (Coordenador) UÊ Professor Titular do Departamento de Engenharia de Produção e Sistemas da Universidade Federal de Santa Catarina.
Os Autores
UÊ Doutorado em Engenharia de Produção (UFSC, 1992), Mestrado em Engenharia de Sistemas (UFPb - Campina Grande - 1979), Especialização em Administração da Produção (UFPb, 1981) e Graduação em Matemática (UFSC, 1975). UÊ Atua nas áreas de Engenharia, Gestão e Avaliação da Qualidade. UÊ É autor de vários livros sobre temas inseridos em suas áreas de atuação e de artigos técnicos publicados em periódicos qualificados no país e no exterior. UÊ Integrou o Comitê de Avaliação dos Programas de Pós-graduação da CAPES na área das Engenharias III. Coordenador do Programa de Pós-graduação em Engenharia de Produção da UFSC (2002-2006). Robert Wayne Samohyl UÊ Professor titular do Departamento de Engenharia de Produção e Sistemas da Universidade Federal de Santa Catarina. Doutor em Economia na área de Pesquisa Operacional pela Rice University (RU) com Pós-doutorado na Virginia Polytechnic Institute and State University e na University of Illinois, ambos nos Estados Unidos. UÊ Coordenador do Núcleo de Normalização e Qualimetria da Universidade Federal de Santa Catarina, autor do livro Controle Estatístico de Qualidade da Editora Campus/Elsevier, 2009. Paulo Augusto Cauchick Miguel UÊ Professor Adjunto do Departamento de Engenharia de Produção e Sistemas da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) desde 2010. UÊ Foi professor da Escola Politécnica da USP de 2004 a 2010 e atualmente atua como professor colaborador do Programa de Pós-graduação da Escola Politécnica da USP. Tem graduação em Engenharia de Produção Mecânica (UNIMEP), Mestrado em Engenharia Mecânica (UNICAMP), ph.D. em Manufacturing Engineering pela Universidade de Birmingham, Inglaterra, e Pós-Doutorado pelo Baldrige National Quality Program no National Institute of Standards and Technology - NIST, EUA. UÊ De 1985 a 1990 atuou como engenheiro de processos na Freios Varga, em Limeira, e Bendix do Brasil, em Campinas. UÊ Também foi diretor-técnico (2000-2001) e diretor administrativo (2002-2003) do Instituto de Desdobramento da Função Qualidade e Gestão de Desenvolvimento de Produto, membro do Conselho Fiscal da ABEPRO – Associação Brasileira de Engenharia de Produção (2000-2001) e foi editor do Brazilian Journal of Operations & Production Management da ABEPRO (2004-2008). Atua nos seguintes grupos de pesquisa: Qualidade e Engenharia do Produto do departamento de Engenharia de Produção da Escola Politécnica da USP, Grupo de Engenharia de Produtos, Processos e Serviços e Núcleo de Garantia da Qualidade, ambos da UFSC.
IX
Prefácio à segunda edição Esta segunda edição traz significativas alterações com relação à edição anterior. As mais significativas incluem preciosas contribuições que atentos leitores têm repassado aos autores, sempre visando à melhoria do texto. Somos muito agradecidos a todos eles. Dentre as inovações introduzidas nesta nova edição, a primeira e mais evidente refere-se ao alinhamento de seu conteúdo às novas versões das normas da série ISO 9000, publicadas em 2008, e às alterações processadas recentemente no Prêmio Nacional da Qualidade. Além disso, também por sugestão de nossos leitores, introduzimos dois novos capítulos, que incorporam as ferramentas da qualidade e a Gestão da Qualidade integrada à sustentabilidade. As ferramentas da qualidade foram incluídas no Capítulo 12. Nele são discutidas as características gerais das ferramentas, sua inserção no processo da Gestão da Qualidade e também sua lógica de operação. A partir de um modelo de classificação proposto, um conjunto de ferramentas notáveis é desc rito e analisado sob o ponto de vista prático de sua aplicação. As ferramentas aqui descritas incluem-se na análise das relações entre causas e efeitos; descrevem expressões simplificadas e representações da operação do processo; e estudam os mecanismos de organização, desenvolvimento e otimização de ações do processo. Também investem no envolvimento dos recursos humanos no processo produtivo. Já o Capítulo 13 traz a visão dos sistemas integrados de gestão. A meta, aqui, é mostrar como as empresas fundem o sistema de Gestão da Qualidade com outros sistemas gerenciais, sempre mantendo o foco na sustentabilidade. Em especial, integra-se a perspectiva ambiental, a da saúde e da segurança ocupacional (que as empresas têm denominado de SMS – saúde, meio ambiente e segurança), além da responsabilidade social.
XII
Finalmente, há varias alterações desenvolvidas ao longo dos demais capítulos, realizadas tanto com o intuito de atender pertinentes sugestões feitas, quanto de ampliar o público-alvo a que o livro pretende atender, além de atualizar e contextualizar o conteúdo discutido.
Marly Monteiro de Carvalho e Edson Pacheco Paladini
Capítulo
1
Histórico da Gestão da Qualidade
Marly Monteiro de Carvalho Sumário do capítulo 1.1. O histórico da Gestão da Qualidade; 1.2. As eras da qualidade; 1.3. Os Gurus da qualidade; 1.4. Os profissionais da GQ; 1.5. Estudo de caso; 1.6. Questões para análise; 1.7. Referências.
Figura 1.1 – Modelo geral da Gestão da Qualidade.
Neste capítulo introdutório, apresentamos os temas de Gestão da Qualidade abordados neste livro. A ideia é fornecer ao leitor uma visão histórica da trajetória desta área, apresentando os principais marcos teóricos neste campo. Além disso, discute-se o papel dos profissionais da área da qualidade nas organizações e as perspectivas futuras.
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Gestão da Qualidade
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1.1. O histórico da Gestão da Qualidade Para entendermos o conceito de Gestão da Qualidade, precisamos passear um pouco pela história, buscando interpretar esse conceito e sua evolução à luz do ambiente produtivo vigente na época. Se fizermos uma viagem no tempo e perguntarmos a um artesão o que significa qualidade e confrontarmos com trabalhadores de diversas épocas posteriores, receberemos respostas bastante diversas. O artesão era um especialista que tinha domínio completo de todo o ciclo de produção, desde a concepção do produto até o pós-venda. Nessa época, o cliente estava próximo do artesão, explicitando suas necessidades, as quais o artesão procurava atender, pois sabia que a comercialização de seus produtos dependia muito da reputação de qualidade, que, naquele tempo, era comunicada boca a boca pelos clientes satisfeitos. Nesse sentido, o artesão tinha em sua abordagem de qualidade alguns elementos bastante modernos, como o atendimento às necessidades do cliente, que veremos a seguir neste capítulo. Por outro lado, conceitos importantes para a área de qualidade moderna, como o de confiabilidade, conformidade, metrologia, tolerância e especificação, ainda eram embrionários. Além disso, o foco do controle da qualidade era o produto, não o processo, feito via inspeção de todos os produtos pelo artesão. Esse paradigma ainda encontrava eco no final do século XIX, quando a maior montadora de automóveis, a Panhard e Levassor (P&L), montava seus veículos atendendo às necessidades dos abastados clientes que a procuravam; não havia dois carros iguais. Um grupo de artesãos altamente qualificado era responsável pela fabricação de componentes e peças específicos e, posteriormente, pela montagem do veículo e pelos testes, ou seja, um processo semelhante à fabricação de um protótipo atualmente. Naquele tempo, era comum ocorrer o susto dimensional1, em que o tamanho de um veículo diferia bastante de outro produzido sob o mesmo projeto, devido à necessidade de ajuste nas peças feitas separadamente por diferentes artesãos, sem a utilização adequada dos conceitos de qualidade mencionados anteriormente. Nessa época, o carro era um produto para poucos, como ter um avião ou um helicóptero hoje, e, embora alguns fabricantes ainda produzissem carros dessa forma até a Primeira Guerra Mundial e alguns até hoje, como o Rolls Royce, esse paradigma de produção foi abandonado por essa indústria. Veio então a Revolução Industrial, que trouxe nova ordem produtiva, em que a customização foi substituída pela padronização e a produção em larga escala. A invenção de máquinas projetadas para obter grande volume de produção e uma nova forma de organização do trabalho permitiram alcançar a produção em massa. A produção em massa encontrou na linha de montagem seu modelo ideal. O trabalho foi fragmentado e, portanto, os trabalhadores tinham domínio apenas de uma 1
Para saber mais sobre a história do automóvel leia o livro Máquina que mudou o mundo, de Womack et al. (1993).
Capítulo 1
| Histórico da Gestão da Qualidade
pequena fração do trabalho, que era repetida várias vezes ao longo da jornada de trabalho. O modelo de administração taylorista, ou Administração Científica, também retirou do trabalhador as etapas de concepção e de planejamento. Nessa época surgiu a função do inspetor, responsável pela qualidade dos produtos. As necessidades dos clientes não eram direcionadoras da concepção do produto. Da linha de montagem da Ford, no período de 1908 a 1927, saía apenas um modelo, o Ford T – ou como conhecido: Ford Bigode – e em uma única cor, a preta. Todavia, isso não foi empecilho para que esse produto se tornasse o carro do século, chegando a 15 milhões de unidades vendidas. Pela primeira vez, o carro se tornará um produto acessível à classe trabalhadora, mudando o conceito dessa indústria, que investiu em capacidade, para atender à demanda, que, então, era maior que a oferta. Por outro lado, essa também foi uma época de grande evolução do conceito de controle da qualidade, e Ford também teve papel importante nessa disciplina. Imaginem o quão difícil era encaixar as peças na linha de montagem, sem que os conceitos de especificação, tolerância e conformidade estivessem desenvolvidos. Vocês se lembram do susto dimensional? Para viabilizar sua linha de montagem, Ford investiu muito na intercambialidade das peças e na facilidade de ajustes, adotando um sistema padronizado de medida para todas as peças. Como o modelo de linha de montagem se difundiu não só na indústria automobilística, mas também em outros setores industriais, tornou-se importante investir no desenvolvimento de áreas como a metrologia, sistema de medidas e especificações, para garantir a intercambialidade das peças. Embora nessa época o foco do controle da qualidade ainda fosse a inspeção, já se encontravam elementos importantes do que viria a ser o conceito de qualidade que priorizava uma abordagem voltada à produção e à conformidade. Contudo, nesse período, deixaram de ser priorizados alguns aspectos importantes da Gestão da Qualidade moderna, como o conhecimento das necessidades do cliente e a participação do trabalhador, que eram bastante enfatizados no período artesanal. Foi um pouco depois, em 1924, que o conceito de controle da qualidade deu um novo salto, quando Walter A. Shewhart criou os gráficos de controle (ver Capítulo 9), ao fundir conceitos de estatística à realidade produtiva da empresa de telefonia Bell Telephone Laboratories. Shewhart também propôs o ciclo PDCA (plan-do-check-act), que direcionaria as atividades de análise e solução de problema. Na década de 1930, o controle da qualidade evoluiu bastante, com o desenvolvimento do sistema de medidas, das ferramentas de controle estatístico do processo e do surgimento de normas específicas para essa área. Surgiram técnicas de amostragem, o que permitiu a introdução da inspeção por amostragem, que reduziu as inspeções a 100% (antes, geravam elevados custos indiretos). As normas britânicas e americanas de controle estatístico da qualidade são também desse período, British Standard BS 600 e American War Standarts Z1.1 – Z1.3, respectivamente.
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Gestão da Qualidade
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Foi também nessa época que os experimentos de Elton Mayo e a Escola das Relações Humanas começaram a questionar a alienação no trabalho e a importância da participação do trabalhador. Esse trabalho pioneiro, aliado aos estudos de Maslow, McGregor e Herzberg, nas décadas seguintes, sobre motivação humana, teve grande influência nos programas de qualidade no período pós-guerra, em especial na composição do modelo japonês. No período da Segunda Guerra Mundial, as conquistas do controle estatístico da qualidade se difundiram, mas foi no período pós-guerra que novos elementos surgiram na Gestão da Qualidade. Nos Estados Unidos, a área de qualidade se consolidou. Em 1945, surgiu a primeira associação de profissionais da área de qualidade – a Society of Quality Enginers. Posteriormente, foi fundada em 1946 a American Society for Quality Control (ASQC), atualmente American Society for Quality (ASQ), com a participação de importantes nomes da área de qualidade, como Joseph M. Juran, que é membro fundador. Pouco depois, em 1950, também seria criada a associação japonesa de cientistas e engenheiros, a JUSE (Japan Union of Scientists and Engineers), com papel importante na área de qualidade. Foi na década de 1950 que as primeiras associações da área de qualidade e seu impacto nos custos foram tecidas e foi proposta a primeira abordagem sistêmica. Em 1951, Juran lançou a publicação Plannning and Practices in Quality Control, que apresentava um modelo que envolvia planejamento e apuração dos custos da qualidade (ver Capítulo 10). Já Armand Feigenbaum foi o primeiro a tratar a qualidade de forma sistêmica nas organizações, formulando o sistema de Controle da Qualidade Total (TQC – Total Quality Control), que influenciaria fortemente o modelo proposto pela International Organization for Standardization (ISO), a série ISO 9000. No final dessa década, em 1957, Philip B. Crosby lançou os elementos que criaram o programa Zero Defeito, que foi muito popular na época, tanto em programas militares como em empresas. Enquanto isso, no outro lado do mundo, o Japão lutava pela reconstrução no período pós-guerra. Nesse período, dois importantes teóricos da área da qualidade estiveram no Japão, W. Edwards Deming e Juran. Esses teóricos influenciaram a criação do modelo japonês, mas também foram influenciados por esse mesmo modelo. Deming, que exerceu forte influência na criação do modelo japonês, tinha forte orientação estatística e foco no controle da qualidade, mas em sua estada no Japão incorporou aspectos relacionados à participação dos trabalhadores e da alta gerência como fundamentais para a boa Gestão da Qualidade, conforme veremos mais à frente neste capítulo. Foi criado em 1951, em homenagem a Deming, o Prêmio Deming, que seria atribuído à empresa que mais se destacasse na área da qualidade em cada ano. Só no final da década de 1980 surgiu um prêmio similar nos Estados Unidos, o Prêmio Malcom Baldrige (1987), e posteriormente, na Europa, o Prêmio Europeu da Qualidade (1991), e também no Brasil, Prêmio Nacional da Qualidade – PNQ (1992) (ver Capítulo 3).
Capítulo 1
| Histórico da Gestão da Qualidade
O modelo japonês, Company Wide Quality Control – CWQC, que foi traduzido no Brasil como Controle da Qualidade por toda a Empresa ou Controle da Qualidade Amplo Empresarial, traria vários elementos novos à Gestão da Qualidade, que seriam associados àqueles já presentes no modelo ocidental (TQC). Vários teóricos orientais tiveram também forte influência nesse novo modelo. Taiichi Ohno, um dos grandes idealizadores do modelo Toyota de produção, que ficaria conhecido como produção enxuta ou lean production, influenciou a qualidade, sobretudo pela aversão ao desperdício (ou muda, termo em japonês). Em sua luta contra o desperdício, um dos alvos foi a eliminação da inspeção e, para tal, precisou devolver aos trabalhadores a responsabilidade pela qualidade do que produziam, para que pudessem interromper a produção assim que uma não conformidade ocorresse no sistema, intervindo em tempo real e evitando a produção de peças defeituosas. Além disso, Ohno reservava um horário periodicamente para que os trabalhadores, em equipes, discutissem melhorias no processo. O conceito de melhoria contínua era fundamental no modelo japonês, ou melhor, na busca da perfeição (kaizen), conforme advogada por Maasaki Imai. Outro elemento importante no modelo japonês era o sistema de parcerias e alianças com fornecedores. A seleção e o desenvolvimento dos fornecedores já eram um fator crítico para o sucesso das empresas japonesas, em que as redes de fornecimento, conhecidas como keiretsu, apresentavam padrões de colaboração e parceria muito diferenciados, com o conceito de qualidade assegurada. Shigeo Shingo também colaborou para eliminação de desperdícios da qualidade com a proposição de dispositivos à prova de erros (ou poka yoke, termo em japonês), bem como desperdício de tempos de preparação, com seu modelo de troca rápida de ferramenta (SMED). Kaoru Ishikawa teve também importante papel no modelo japonês, contribuindo na formulação do CWCQ e na difusão das sete ferramentas da qualidade, que viriam a ser amplamente utilizadas pelos Círculos de Controles de Qualidade (CCQs), como ficaram conhecidos os grupos de melhoria, e atualmente ainda em uso em diversas organizações. Neste período foram estruturados conjuntos de ferramentas de qualidade largamente utilizadas pelas empresas até hoje, que serão apresentados no Capítulo 12. O sucesso do modelo japonês, que na década de 1970 já mencionava a aferição dos defeitos em partes por milhão, enquanto no Ocidente as métricas ainda eram calculadas em porcentagens, provocou forte interesse nas organizações pelos programas de qualidade. Nas décadas seguintes, os modelos TOC e CWQC foram implementados com entusiasmo pelas empresas e se difundiram rapidamente. Em 1987, em meio à expansão da globalização, surgiu o modelo normativo da ISO (International Organization for Standardization) para a área de Gestão da Qualidade, a série 9000, Sistemas de Garantia da Qualidade. Embora, em algumas situações, essa norma, que é de caráter voluntário, pudesse ter sido utilizada como barreira técnica às exportações, de maneira geral ela facilitou a relação de clientes e fornecedores ao longo da cadeia produtiva dispersa geograficamente. O processo de seleção de fornecedores,
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Gestão da Qualidade
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utilizando essa norma como critério qualificador, eliminou os enormes contingentes de auditores que as empresas mantinham, passando a utilizar as certificações e as auditorias de terceira parte, credenciadas para esse fim. A ISO 9000 difundiu-se rapidamente, tornando-se um requisito de ingresso em muitas cadeias produtivas, em especial a automobilística, que não tardou a criar diretrizes adicionais, como a QS 9000, que convergiram para uma especificação técnica ISO TS 16949, em 1999, para todo o setor (ver Capítulo 5). Em 2000, foi feita a terceira revisão da série, ISO 9000:2000 que trouxe novos elementos, passando a adotar uma visão de Gestão da Qualidade e não mais de garantia, introduzindo elementos da gestão por processos, gestão por diretrizes e foco no cliente (ver Capítulos 6 e 7). Vale ainda destacar a norma de Gestão Ambiental ISO 14000, publicada em 1996, que tem forte relacionamento com a série ISO 9000. Assim, chegamos a alguns elementos da Gestão da Qualidade moderna, que paradoxalmente recupera alguns atributos da época artesanal, como a busca da proximidade às demandas do cliente e maior customização, embora agora uma customização em massa, ou seja, também com escala. No final da década de 1960, Mizuno e Akao colaboraram para resgatar a proximidade com o cliente, propondo o método Desdobramento da Função Qualidade, QFD (Quality Function Deployment). Também Genichi Taguchi focou nas atividades de projeto, como fundamentais para a satisfação do cliente e para criação de uma qualidade robusta (robust quality). Esse resgate da importância dos clientes e a percepção da qualidade como um critério competitivo, passível de fornecer vantagem competitiva, trouxe alguns teóricos da área de estratégia e administração para a área da qualidade, como Garvin, que em seus trabalhos discutiu o impacto estratégico da qualidade. Também Akao tratou da importância do alinhamento estratégico da área de qualidade com as estratégias do negócio, o que chamou de desdobramento das diretrizes (Hoshin Kanri ou strategic policy deployment) (ver Capítulo 6). O programa mais recente de Gestão da Qualidade surgiu no final da década de 1980, na Motorola, chamado Seis Sigma. Contudo, essa ferramenta só se popularizou no final do século passado e início do século XXI. Esse programa apresenta várias características dos modelos anteriores, como o pensamento estatístico típico da época de maior ênfase no controle da qualidade e na análise e solução de problemas. No Seis Sigma existe uma preocupação com o uso sistemático das ferramentas estatísticas, seguindo um ciclo batizado de DMAIC (define-measure-analyse-improve-control), sigla que representa as etapas de definir, medir, analisar, melhorar e controlar, o que também remete ao ciclo PDCA. É importante ressaltar, contudo, que esse método vai além do pensamento estatístico, pois promove um alinhamento estratégico da qualidade, desdobrada em projetos prioritários. Além disso, existe forte ênfase na relação custo-benefício desses projetos, cujos ganhos, em algumas empresas, somam cifras expressivas (ver Capítulos 4 e 10).
Capítulo 1
| Histórico da Gestão da Qualidade
Outra tendência que desponta é a gestão integrada dos sistemas de qualidade e das normas de sustentabilidade, através da gestão integrada. Esse conjunto integrado de normas é composto das normas ISO 9000 e ISO 14000, já mencionadas e das normas ISO 26000 de responsabilidade social e da OHSAS 18000 de saúde e segurança ocupacional. Os Sistemas Integrados de Gestão (SIG) integram, portanto, a perspectiva ambiental, a da saúde e da segurança ocupacional (que as empresas têm denominado de SMS – saúde, meio ambiente e segurança), além da responsabilidade social à Gestão da Qualidade (ver Capítulo 13). Essa breve revisão histórica busca traçar uma trajetória da evolução da qualidade ao longo do último século, lembrando que vários elementos de todos esses anos estão presentes no dia a dia das empresas. Ver Figura 1.2.
Figura 1.2 – Ondas da Gestão da Qualidade.
1.2. As eras da qualidade Alguns autores fazem marcações temporais entre as principais tendências, embora a intersecção e a complementaridade entre os modelos predominantes em cada época sejam grandes. Uma das classificações temporais mais adotadas é a proposta por David Garvin, que classifica a evolução da qualidade em quatro eras, quais sejam: Inspeção; Controle Estatístico da Qualidade; Garantia da Qualidade e Gestão da Qualidade. As principais características dessas quatro eras estão descritas na Tabela 1.1.
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Gestão da Qualidade
ELSEVIER Tabela 1.1: Eras da qualidade
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Ênfase
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Fonte: Adaptado de Garvin, 1992.
1.2.1. Algumas definições de qualidade
Qualidade é um termo que utilizamos cotidianamente, mas, se perguntarmos a diversas pessoas o significado deste termo, dificilmente chegaremos a um consenso. Garvin (1987), após pesquisar várias definições de qualidade coletadas no ambiente corporativo e na literatura, classificou cinco abordagens distintas da qualidade, quais sejam: transcendental; baseada no produto; baseada no usuário; baseada na produção; baseada no valor. Cada uma dessas abordagens apresenta aspectos diferentes deste complexo conceito – Qualidade. A Tabela 1.2 sintetiza a definição da qualidade, sob o prisma de cada uma dessas abordagens.
Capítulo 1
| Histórico da Gestão da Qualidade
Tabela 1.2: Abordagens da qualidade Abordagem 7UDQVFHQGHQWDO
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Fonte: Elaborada apartir do texto de Garvin (1987).
1.3. Os gurus da qualidade Foram muitos os teóricos que ajudaram a construir a área de qualidade, conforme foi apresentado no histórico desta disciplina, mas alguns tiveram um papel especial e mereceram a denominação Gurus da Qualidade. O que eles têm em comum é que fizeram parte da história, tanto pela contribuição teórica como pela intervenção em empresas. A Figura 1.2 apresenta o painel dos Gurus da Qualidade mais citados na literatura acadêmica e profissional: Walter A. Shewhart, W. Edwards Deming, Joseph M. Juran, Armand Feigenbaum, Philip B. Crosby, Kaoru Ishikawa e Genichi Taguchi. Neste tópico apresentaremos as principais ideias e contribuições desses teóricos.
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Gestão da Qualidade
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1.3.1. Walter A. Shewhart
Walter A. Shewhart nasceu nos Estados Unidos em 1891 e formou-se em engenharia, com doutorado em física pela Universidade da Califórnia, em Berkeley. Apesar de ter lecionado em algumas universidades ao longo de sua vida, foi como engenheiro no ambiente empresarial, primeiro na Western Electric (1918 a 1924) e depois na Bell Telephone Laboratories, onde se aposentou, que sua contribuição à área da qualidade foi desenvolvida. Shewhart, que ficou conhecido como o pai do controle estatístico da qualidade, desenvolveu uma das ferramentas mais utilizadas no controle da qualidade até hoje – os gráficos de controle. Mas, afinal, o que tinha de revolucionário nessa ferramenta? Shewhart fundiu conceitos de estatística em um método gráfico de fácil utilização no chão-de-fábrica e os aplicou à realidade produtiva da empresa em que trabalhava, a Bell Telephone Laboratories, em memorando datado de 16 de maio de 1924. A ferramenta proposta analisava os resultados das inspeções, que até aquele momento eram utilizadas apenas para a segregação dos produtos com defeito, por meio de gráficos de controle, que permitiam facilmente distinguir entre as causas de variação comuns ao processo e aquelas causas especiais, que deveriam ser investigadas. Com a análise desses resultados à luz dos conceitos estatísticos era possível sair de uma postura reativa e entender e prever o comportamento do processo, o que permitiria uma ação proativa, evitando novas ocorrências. A facilidade de utilização do gráfico foi um dos aspectos que ajudou na sua difusão, pois era uma ferramenta visual, que podia ser preenchida no ambiente de trabalho, com os parâmetros estatísticos do processo já sintetizadas, conforme será apresentado no Capítulo 9. A Figura 1.3 apresenta um modelo de gráfico de controle.
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Capítulo 1
| Histórico da Gestão da Qualidade
Shewhart também propôs o ciclo PDCA (plan-do-check-act), que direcionaria a análise e solução de problema, percorrendo o ciclo de planejar, fazer, checar o resultado e depois agir, ou seja, implementar a melhoria, com enfoque de melhoria contínua (ver Capítulo 6). Estes conceitos depois foram lapidados e difundidos em conjunto por Shewhart e um discípulo, W. Edwards Deming. Seus livros Economic Control of Quality of Manufactured Product, publicado em 1931, e Statistical Method from the Viewpoint of Quality Control, em 1939, expõem os princípios do controle estatístico da qualidade. Segundo uma de suas definições de qualidade: “A qualidade é subjetiva e objetiva.” 1.3.2. W. Edwards Deming
William Edwards Deming nasceu nos Estados Unidos em 1900 e formou-se em engenharia elétrica, com doutorado em matemática e física pela Universidade de Yale. Deming era um pesquisador de muitas habilidades, e o que poucos sabem é que esse Guru da Qualidade também estudou música e tocava vários instrumentos, além de compor. Por sua longevidade (morreu em 1993, aos 93 anos), Deming percorreu várias eras da qualidade, tendo sido discípulo de Shewhart, com quem compartilhou o interesse pelas ferramentas estatísticas aplicadas ao controle do processo e pelo método de análise e solução de problemas por meio do ciclo PDCA. Contudo, foi como especialista enviado pelas Forças Aliadas no período de reconstrução do Japão, no pós-guerra (1947 e 1950), para ensinar técnicas de amostragem estatística, que Deming formulou suas principais contribuições. Foi consultor da JUSE em 1950, 1951, 1952, 1955, 1960, 1965. A convivência com os japoneses durou quase duas décadas, período em que as empresas japonesas fizeram uma verdadeira revolução, em termos de qualidade. Em agradecimento ao papel desempenhado, era tratado como pai do controle de qualidade no Japão e seu nome tornou-se o Prêmio Japonês da Qualidade – Deming Prize. Nesse período, Deming fundiu sua visão de estatístico, de ênfase nos dados, com a vivência nas empresas japonesas, em que a participação dos trabalhadores e da alta administração estava no dia a dia da busca pela qualidade e por sua melhoria de forma contínua, o que chamavam de kaizen. Deming percebeu que o ciclo PDCA trazia o conceito de melhoria contínua (kaizen) e o sistematizava de forma adequada. São muitas as contribuições de Deming para a área da qualidade, conforme veremos ao longo deste livro, mas seus 14 pontos têm sido diretrizes enfatizadas na Gestão da Qualidade em empresas de todo o mundo (veja Quadro 1.1). Sua atualidade é impressionante, dado que foi escrito há décadas. Nesses 14 pontos, Deming buscou sintetizar sua experiência no Japão, como preleção para a mudança organizacional necessária, com ênfase na liderança e na participação de todos na organização.
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Gestão da Qualidade
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Quadro 1.1 – Os 14 pontos de Deming 1. 2.
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11. 12. 13. 14.
Crie constância de propósitos em torno da melhoria de produtos e serviços, buscando tornar-se competitivo, manter-se no negócio e gerar empregos. Adote uma nova filosofia. Estamos em uma nova era econômica. Gerentes ocidentais precisam assumir o desafio, aprender suas responsabilidades e liderar o processo de mudança. Acabe com a dependência da inspeção como forma de atingir a qualidade. Elimine a necessidade de inspeção em massa, construindo a qualidade do produto em primeiro lugar. Elimine a prática de priorizar negócios com base no preço. Pense em minimizar o custo total. Caminhe no sentido de um único fornecedor para cada item e estabeleça um relacionamento de longo prazo, baseado na lealdade e na confiança. Melhore constantemente o sistema de produção e de serviços, aprimorando a qualidade e a produtividade, e assim sempre diminuindo os custos. Estabeleça o treinamento no trabalho (on the job). Estabeleça a liderança (veja ponto 12). O objetivo da supervisão deve ser ajudar trabalhadores e máquinas a fazer o trabalho melhor. Elimine o medo, assim todos podem trabalhar efetivamente para a organização. Quebre as barreiras entre os departamentos. Pessoal de pesquisa, projeto, vendas e produção devem trabalhar juntos, como uma equipe. Elimine os slogans, exortações e metas para a força de trabalho, tais como defeito zero (zero defects) e novos níveis de produtividade. Tais exortações apenas criam um ambiente de adversidade, pois as causas da baixa qualidade e produtividade pertencem ao sistema, indo além do poder da força de trabalho. UÊ Elimine as quotas de trabalho no chão-de-fábrica. Substitua por liderança. UÊ Elimine gerenciamentos por objetivos. Elimine por números e metas numéricas. Substitua por liderança. Remova barreiras que impedem os trabalhadores de sentirem orgulho de seu trabalho. Remova barreiras que impedem os gerentes e engenheiros de sentirem orgulho de seu trabalho. Isso significa abolir os índices anuais ou de mérito por objetivos. Institua um vigoroso programa de educação e automelhoria Envolva todos da organização na tarefa de alcançar a transformação. A transformação é tarefa de todos.
Fonte: Adaptado de Deming (1990).
Segundo uma de suas definições de qualidade: “Qualidade é a satisfação das necessidades do cliente em primeiro lugar.” 1.3.3. Joseph M. Juran
Joseph M. Juran nasceu na Romênia, em 1904. Já nos Estados Unidos, graduou-se em engenharia e direito. Assim como Shewhart, iniciou sua carreira no departamento de estatística da Western Eletric.
Capítulo 1
| Histórico da Gestão da Qualidade
À semelhança de Deming, participou de várias eras da qualidade, por sua longevidade, e também atuou no Japão no pós-guerra; por sua atuação, alcançou projeção mundial. Da experiência com empresas japonesas, ressaltava o grande envolvimento da alta administração e dos funcionários em vários aspectos da Gestão da Qualidade. Além disso, o sistema de puxar a produção demandava forte noção de cliente-fornecedor, não só ao longo da cadeia produtiva, mas também da noção de cliente interno, conceito que trabalhou em várias obras. Juran, em seus vários livros, Plannning and Practices in Quality Control (1951), Managerial Breakthrough (1964), Quality Planning and Analysis (1970), entre outros, ajudou a alçar a qualidade do âmbito operacional para o estratégico. Foi o primeiro a propor uma abordagem dos custos da qualidade, classificando-os em três categorias: falhas (externas e internas), prevenção e avaliação (ver Capítulo 10). Além disso, propôs a trilogia da qualidade: planejamento, controle e melhoria. O planejamento da qualidade estabelece os objetivos de desempenho e o plano de ações para atingi-los. O controle da qualidade consiste em avaliar o desempenho operacional, comparar com os objetivos e atuar no processo, quando os resultados se desviarem do desejado. Finalmente, a melhoria da qualidade busca aperfeiçoar o patamar de desempenho atual para novos níveis, tornando a empresa mais competitiva. A Figura 1.4 ilustra a trilogia de Juran.
Figura 1.4 – Trilogia da qualidade. Fonte: Adaptado de Juran, 1970.
Algumas definições de qualidade deste autor são: “Qualidade é uma barreira de proteção à vida” e “Qualidade é adequação ao uso.”
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1.3.4. Armand Feigenbaum
Armand Feigenbaum nasceu nos Estados Unidos, em 1922 e formou-se em engenharia, com doutorado em ciências, pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT). Feigenbaum tornou-se conhecido por ser o primeiro a tratar a qualidade de forma sistêmica nas organizações, formulando o sistema de Controle Total da Qualidade (TQC), em 1951, em seu livro de Total Quality Control. O Quadro 1.2 apresenta os principais aspectos do TQC. Quadro 1.2 – TQC segundo Feigenbaum “Um sistema eficaz para integração dos esforços dos diversos grupos em uma organização, no desenvolvimento da qualidade, na manutenção e na melhoria da qualidade.” (FEIGENBAUM, 1951) Para que esse sistema seja efetivo, é preciso observar todo o ciclo produtivo, que começa e termina no cliente (ver Figura 1.5), para obter produtos e serviços mais econômicos, mas que levem em conta a satisfação total do cliente. Destaca-se, contudo, que esse sistema consiste em uma estrutura e procedimentos, gerenciais e técnicos, devidamente documentados, que serviram de guia referencial para garantir a satisfação dos clientes, mas com custos da qualidade adequados. (FEIGENBAUM, 1987).
Figura 1.5 – Ciclo produtivo.
Segundo uma de suas definições: “Qualidade é a composição total das características de marketing, projeto, produção e manutenção dos bens e serviços, através dos quais os produtos atenderão às expectativas do cliente.”
Capítulo 1
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1.3.5. Philip B. Crosby
Crosby nasceu nos Estados Unidos, em 1926, e formou-se em engenharia. Sua carreira foi menos acadêmica que a dos demais gurus, com atuação profissional primeiro em empresas e depois, em 1979, como consultor, montando a Philip Crosby Associates. Em 1957, Crosby lançou o programa Zero Defeito, que foi muito popular na época, tanto em programas militares, em 1961, na construção de mísseis, como em empresas. Esse programa aproveitava as noções de custos da qualidade propostas por Juran, mas tinha forte apelo gerencial e motivacional, com ênfase no fazer certo na primeira. Porém, houve também muita crítica ao programa, que alguns trataram como apenas um conjunto de slogans de propaganda. Crosby publicou vários livros, entre os quais destacam-se Quality is Free (1979) e Quality Is Still Free (1996). Também como Deming, divulgava 14 pontos prioritários para a qualidade, conforme Quadro 1.3. Quadro 1.3 – Os 14 pontos de Crosby 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14.
Obter o compromisso da alta gestão com a qualidade. Instalar equipes de aperfeiçoamento da qualidade em todos os setores. Mensurar a qualidade na organização por meio de indicadores de qualidade, que devem indicar as necessidades de melhoria. Levantar os custos da não qualidade. Disseminar nos funcionários a importância da qualidade nos produtos ou serviços. Implantar o sistema de ação corretiva. Planejar o programa zero defeito. Treinar os inspetores e demais responsáveis. Instaurar o dia do zero defeito. Estabelecer os objetivos a serem alcançados. Eliminar as causas dos erros. Reconhecer publicamente os que atingem os objetivos e não realizar a premiação financeira. Instalar os círculos de qualidade para monitorar o processo. Realizar repetidamente os itens listados anteriormente.
Fonte: Adaptado de Crosby (1979).
Segundo uma de suas definições: “Qualidade é conformidade às especificações.”
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1.3.6. Kaoru Ishikawa
Kaoru Ishikawa nasceu no Japão, em 1915, graduou-se em química aplicada pela Universidade de Tóquio, doutorando-se só vários anos depois, em 1960. Foi professor e consultor de empresas. Ishikawa teve também importante papel no modelo japonês, contribuindo na formulação do Controle da Qualidade por toda a Empresa (Company Wide Quality Control – CWQC), que apresentava alguns elementos distintos ao TQC, conforme já discutido anteriormente neste capítulo. Ishikawa foi também importante na difusão de ferramentas e técnicas de análise e solução de problemas e gerenciamento da rotina (ver Capítulo 8); em especial as sete ferramentas da qualidade, que viriam a ser amplamente utilizadas pelos Círculos de Controles de Qualidade (CCQs), como ficaram conhecidos os grupos de melhoria, e atualmente ainda em uso em diversas organizações. As sete ferramentas da qualidade são: análise de Pareto; diagrama de causa-efeito (ou espinha de peixe, ou ainda diagrama de Ishikawa); histograma; folhas de controle; diagramas de escada; gráficos de controle e fluxos de controle. Segundo uma de suas definições de qualidade: “Qualidade é satisfazer radicalmente ao cliente, para ser agressivamente competitivo.” O Quadro 1.4 apresenta a utilização deste tipo de ferramenta na análise e solução de problemas. Quadro 1.4 – Qualidade em ação. Desvendando os atrasos dos fornecedores O gerente de produção estava preocupado com os atrasos na linha e resolveu estudar as principais causas relatadas pelos supervisores. Com base nos apontamentos de atraso, foi elaborado o diagrama de Pareto, para encontrar as principais causas. O diagrama de Pareto é um gráfico de frequências acumuladas em ordem decrescente, que ajuda a priorizar as causas de defeitos, conforme ilustra a Figura 1.6. O Pareto feito pelo gerente apontou para “falta de material” como a principal razão para atrasos na linha de produção, com 44% das ocorrências, seguida por problemas com a mão de obra, com 30%. Com base nesse diagrama, decidiu-se investigar em mais detalhes a principal causa de atrasos, que era falta de material.
Capítulo 1
| Histórico da Gestão da Qualidade
Quadro 1.4 – Qualidade em ação. Desvendando os atrasos dos fornecedores (cont.)
Figura 1.6 – Causas de atraso na obra. Nota: (ODERUDGRFRPRVRIWZDUH0LQLWDE
O gerente resolveu utilizar novamente o diagrama de Pareto, mas desta vez em seu formato estratificado por categoria. Para isso, ele resolveu analisar se a falta de material ocorria em função de atraso no prazo de entrega de determinado fornecedor, ou seja, se os fornecedores tinham confiabilidade de entrega diferente. Para isso, foram tabulados os atrasos na entrega classificados por tipo de fornecedor. Os resultados obtidos estão na Figura 1.7.
Figura 1.7 – Atrasos na entrega de material por fornecedor. Nota(ODERUDGRFRPRVRIWZDUH0LQLWDE
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Quadro 1.4 – Qualidade em ação. Desvendando os atrasos dos fornecedores (cont.) Com base na Figura 1.7, pode-se verificar que apenas a loja A tem uma confiabilidade de entrega aceitável, da ordem de 80%. A loja B deve ser descadastrada imediatamente, pois entrega o material atrasado sistematicamente, em cerca de 80% das vezes. Finalmente, a loja C, que atrasa em mais de 50% das vezes, também pode ser descadastrada, ou devem ser tomadas providências imediatas para a melhoria da confiabilidade de entrega. O engenheiro responsável ficou de tomar providências para melhorar a confiabilidade de entrega das lojas A e C e descadastrar a loja B. 1.3.7. Genichi Taguchi
Genichi Taguchi nasceu no Japão, em 1924, e formou-se em engenharia e estatística, doutorando-se em 1962. Taguchi, diferente dos outros gurus, focou as atividades de projeto e não de produção, área que batizou de controle de qualidade off-line, para diferenciar das técnicas on-line de controle estatístico do processo. Ele julgava que a única forma de satisfazer o cliente era criar produto de qualidade robusta (robust quality). Taguchi propôs técnicas de projeto de experimento (DoE – design of experiment) e a função perda da qualidade, conforme ilustra a Figura 1.8. No conceito da função perda da qualidade, Taguchi argumenta que, conforme a característica de qualidade se afasta do valor nominal (valor-alvo), aumenta a “perda para a sociedade”, mesmo que eventualmente esteja dentro dos limites de especificação, ou seja, a redução das perdas não está diretamente relacionada com a conformidade às especificações, mas com a redução da variabilidade em torno do valor-alvo.
Figura 1.8 – Função perda da qualidade (adaptado de Taguchi, 1990).
Segundo uma de suas definições de qualidade: “Qualidade é a diminuição das perdas geradas por um produto, desde a produção até seu uso pelos clientes.”
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1.4. Os profissionais da GQ O papel dos profissionais da área de qualidade se encontra bastante modificado em relação aos seus primórdios, quando inspetores e supervisores compunham departamentos massivos de qualidade, que eram responsáveis por inspecionar e controlar a qualidade de todos os produtos da empresa. Atualmente, ainda persiste a necessidade da existência de uma estrutura para a qualidade. Entretanto, essa estrutura é responsável pelo gerenciamento e pela operação do sistema de qualidade, seus procedimentos, documentos e métodos, que incluem padrões para os produtos, política da qualidade e procedimentos padrão de operação (ver Capítulo 5). Isso implica também uma estrutura eficiente para a elaboração de testes e ensaios para a análise da qualidade dos produtos. Além disso, uma estrutura para a auditoria interna de sistemas da qualidade, que visa a garantir e melhorar os sistemas implementados e elaborar relatórios de qualidade para a gerência das funções mais importantes do processo. Também implica prover capacitação e treinamento em métodos e ferramentas de planejamento e controle da qualidade para outras áreas (HOERL, 1998). Mas, afinal, qual é a diferença entre a antiga abordagem e a atual? A principal diferença consiste no fato de que cada departamento, seja ele de produção ou de operação, passa a ser responsável pelo controle e pela qualidade dos produtos fabricados, bem como dos produtos desenvolvidos. Nesse contexto, o departamento de qualidade é responsável por prover a habilidade e os procedimentos necessários para que o sistema funcione como um todo, ou seja, a qualidade passa a ter uma abordagem que vai além do conhecimento trivial. Por outro lado, cresce a importância do domínio de ferramentas e técnicas da área de qualidade por todos na organização, pois se incentiva que o controle da qualidade, bem como a análise e solução de problemas, fique a cargo dos donos do processo, ou seja, do próprio departamento, que precisa estar capacitado para tal tarefa. Com as novas abordagens da qualidade, como o programa Seis Sigma, que são fortemente direcionadas para a apuração dos ganhos de projetos de melhoria, surge a necessidade de maior integração entre a área de qualidade e os demais departamentos da empresa, para que os ganhos advindos do programa possam ser apurados com maior precisão. Como consequência, em lugar de especialistas, há a necessidade de profissionais da qualidade com uma visão mais geral da empresa, que entendam dos processos, para permitir tal integração dentro da empresa.
1.5. Estudo de caso Para o Grupo Gerdau, um dos maiores do setor de siderurgia, qualidade é um valor da organização.
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Sua política da qualidade é “satisfazer as necessidades dos nossos clientes, praticando qualidade em tudo o que fazemos e melhorando continuamente nossos processos”. Esta política é desdobrada nos seguintes objetivos específicos: Fornecer produtos e serviços adequados ao uso dos nossos clientes, através de procedimentos que apliquem, com objetividade, os conceitos e as práticas da Qualidade Total. Buscar padrões de produtividade e eficiência que nos permitam assegurar a solidez e a prosperidade do nosso negócio. Criar condições para que as pessoas, no exercício de suas funções, se realizem como profissionais e indivíduos. Manter consistente Política de Atendimento às exigências de preservação do meio ambiente. A implementação de programas de qualidade no grupo tem um longo histórico, que teve início em 1980, até a consagração em 2002, com o recebimento do Prêmio Nacional da Qualidade – PNQ, na categoria grandes empresas, pela Gerdau Aços Finos Piratini. Os principais marcos da implementação da Gestão da Qualidade no grupo são descritos na Tabela 1.3. Tabela 1.3: Histórico da qualidade no Grupo Gerdau
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Capítulo 1
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² &RQTXLVWD7URIpX3UDWDGR3UrPLR4XDOLGDGH56SHOD*HUGDX5LRJUDQGHQVHH*HUGDX $oRV)LQRV3LUDWLQL ² ,PSODQWDomRGR6LVWHPD5GD6$3 ² &ULDomRGR3UrPLR*HUGDXGD4XDOLGDGHEDVHDGRQRV&ULWpULRVGH([FHOrQFLDGR314 ² 3DUWLFLSDomRGD*HUGDX%DUmRGH&RFDLVQR314 ² &RQTXLVWDGD&HUWLÀFDomR46SHOD*HUGDX$oRV)LQRV3LUDWLQL ² &RQTXLVWDGR7URIpX2XURGR3UrPLR4XDOLGDGH56SHOD*HUGDX5LRJUDQGHQVHH*HUGDX $oRV)LQRV3LUDWLQL ² &RQTXLVWDGD&HUWLÀFDomR,62SHOD*HUGDX%DUmRGH&RFDLV ² ,QtFLRGRSURMHWR*HVWmRSRU3URFHVVRV ² 5HDOL]DomRGRR&LFORGR3UrPLR*HUGDXGD4XDOLGDGH ² ,QtFLRGRXVRGDPHWRGRORJLD6HLV6LJPD ² 3DUWLFLSDomRGD*HUGDX$oRV)LQRV3LUDWLQLQR314 ² *HUGDX$]DQR&KLOHFRQTXLVWDR3UrPLR1DFLRQDOGD4XDOLGDGH ² &RQTXLVWDGR7URIpX2XURGR3UrPLR4XDOLGDGHGD%DKLDSHOD*HUGDX8VLED ² &RQTXLVWDGD0HGDOKDGH3UDWDGR3UrPLR4XDOLGDGH5LRSHOD*HUGDX&RVLJXD ² ,QtFLRGDLPSODQWDomRGRPRGHORGH*47QDV8QLGDGHVGD$UJHQWLQD6,36$6,3$5 ² 5HDOL]DomRGRR&LFORGR3UrPLR*HUGDXGD4XDOLGDGH ² 3DUWLFLSDomRGD*HUGDX$oRV)LQRV3LUDWLQLQR314 ² ([SDQVmRGDPHWRGRORJLD6HLV6LJPD ² *HUGDX/DLVDUHFHEHFHUWLÀFDGR,62GD4XDOLGDGH ² *HUGDX/DLVDQR8UXJXDLFRQTXLVWDR3UrPLR1DFLRQDOGD4XDOLGDGH ² ,QtFLRGDLPSODQWDomRGRPRGHORGH*47QD*HUGDX$PHULVWHHO ² &RQTXLVWDGR'LSORPD3UDWDGR3UrPLR4XDOLGDGH5LRSHOD*HUGDX&RVLJXD ² &RQTXLVWDGR314SHOD*HUGDX$oRV)LQRV3LUDWLQL ² &RQTXLVWDGR3UrPLR,EHURDPHULFDQRGD4XDOLGDGHSHOD*HUGDX$]D ² &RQTXLVWDGD&HUWLÀFDomR,62SHOD*HUGDX$PHULVWHHO&DPEULGJH ² &RQTXLVWDGR3UrPLR3UDWDQR3UrPLRGH4XDOLGDGHH*HVWmRGH3HUQDPEXFRSHOD*HUGDX $oRQRUWH ² ,PSODQWDomRGD*RYHUQDQoD&RUSRUDWLYDLQFOXLQGRRSURFHVVRGH7HFQRORJLDGH*HVWmR ² &RQTXLVWDGR7URIpX'LDPDQWHGR3UrPLR4XDOLGDGH56SHOD*HUGDX$oRV)LQRV3LUDWLQL ² &RQTXLVWDGD,62SHOD*HUGDX5LRJUDQGHQVHH*HUGDX'LYLQySROLV ² &RQTXLVWDGR7URIpX'LDPDQWHGR3UrPLR4XDOLGDGH56SHOD*HUGDX5LRJUDQGHQVH ² &RQTXLVWDGD,62SHOD*HUGDX&RVLJXDH*HUGDX$oRPLQDV – ² ² ² – ² ² ² – ² ² ² ² ² ² ² –
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Fonte: Disponível em: http://www.gerdau.com.br/port/agerdau/qu_politica.asp (consultado em 5/2005). Atualizado em: http://www.gerdau.com.br/sobre-gerdau/sistema-de-gestao-premios-e-certificacoes.aspx (consultado em jan./2011).
1.6. Questões para análise 1.
Leia atentamente o Estudo de Caso do Grupo Gerdau e responda: a. Quais foram as diferentes eras da qualidade visitadas pela Gerdau ao longo do período descrito? b. Quais são as principais características do modelo de gestão da qualidade atual na Gerdau?
2.
Quais são as principais características das eras da qualidade? Escolha uma organização que você conhece bem e classifique em qual das eras ela melhor se caracteriza.
3.
Quais os aspectos da qualidade enfatizados por todos os Gurus da Qualidade?
4.
Em que aspectos os Gurus da Qualidade divergem?
5.
O que é TQC? Faça uma busca na Internet e identifique empresas que adotam este modelo.
6.
O que diferencia o CWQC do TQC?
7.
O que é ISO 9000? Cite nomes de empresas certificadas.
8.
O que é um Sistema Integrado de Gestão? Quais normas ele gere?
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1.7. Referências CARVALHO, M M. “Medindo o Sigma do Processo”. In: ROTONDARO, Roberto G. (Org.). Seis Sigma: estratégia gerencial para melhoria de processos, produtos e serviços. São Paulo: Atlas, 2002, p. 164-176. __________. “Qualidade em Projeto”. In: AMATO NETO, João, (Org.). Manufatura classe mundial: conceitos, estratégias e aplicações. São Paulo: Atlas, 2001, p. 131-145. __________. “Selecionando Projetos Seis Sigma”. In: ROTONDARO, Roberto G. (Org.). Seis Sigma: estratégia gerencial para melhoria de processos, produtos e serviços. São Paulo: Atlas, 2002, p. 49-79. CROSBY, Philip. B. Qualidade, falando sério. São Paulo: McGraw-Hill, 1990. DEMING, William Edward. Qualidade: a revolução da administração. Rio de Janeiro: Marques-Saraiva, 1990. FEIGENBAUM, A.V. Total Quality Control. Nova York: McGraw-Hill, 1954. GARVIN, David A. Managing quality: the strategic and competitive edge. EUA, Nova York: Harvard Business School, 1988. HOERL, R.W. “Six Sigma and the Future of Quality Profession”. Quality Progress, p. 3.542, jun. 1998. ISHIKAWA, K. Controle de qualidade total à maneira japonesa. 6. ed. Rio de Janeiro: Campus, 1997. __________. What is Total Quality Control? The Japanese Way. Englewood Cliffs: Prentice-Hall, 1985. JURAN, J. M.; GRYNA, Frank M. Controle da qualidade-handbook. 4. ed. São Paulo: Makron Books & McGraw-Hill, 1992, v. III. KONDO, Y. H. K. “A Participative Way of Quality Management in Japan”. The TQM Magazine, v. 10, no 6, p. 425-431, 1998. MASLOW, Abraham H. Maslow no Gerenciamento. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2000. McGREGOR, Douglas. O lado humano da empresa. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999. OZAWA, M. Total Quality Control and Management – The Japanese Approach. Tóquio: JUSE Press, 1988. SENGE, Peter. A quinta disciplina-arte, teoria e prática da organização de aprendizagem. 15. ed. São Paulo: Best Seller, 1990. SHIBA, S.; GRAHAN, A.; WALDEN, D. TQM: Quatro Revoluções na Gestão da Qualidade. São Paulo: Bookman, 1997. SHINGO, Shigeo. O sistema Toyota de produção: do ponto de vista da engenharia de produção. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996. WOMACK, J. P; JONES,D.; ROSS, D. A Máquina que Mudou o Mundo. Rio de Janeiro: Campus/Elsevier, 1993.
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Edson Pacheco Paladini Sumário do capítulo 2.1. O que significa perspectiva estratégica da qualidade?; 2.2. A qualidade como fator de liderança estratégica; 2.3. A visão estratégica da qualidade; 2.4. A componente operacional no conceito da qualidade; 2.5. Ações de controle; 2.6. Gerenciamento baseado em controle; 2.7. Desenvolvimento de ferramentas de melhoria do processo produtivo; 2.8. Gerenciamento operacional; 2.9. A gestão tática da qualidade; 2.10. Métodos quantitativos e modelos estatísticos; 2.11. Gestão da qualidade com base em indicadores; 2.12. Envolvimento das pessoas no esforço pela qualidade; 2.13. A transição para a dimensão estratégica da qualidade; 2.14. A concepção estratégica da qualidade; 2.15. O impacto do conceito estratégico da qualidade para as pessoas; 2.16. Algumas questões práticas; 2.17. Referências. Os conceitos da qualidade mudaram consideravelmente ao longo do tempo. De simples operações em processos de manufatura, direcionadas para produzir pequenas melhorias localizadas, a qualidade passou a ser considerada um dos elementos fundamentais da gestão das organizações, tornando-se fator crítico para a sobrevivência de organizações produtivas, pela consolidação de bens tangíveis, serviços e processos nos mercados; e de pessoas, pelos seus diferenciais de atuação. Esta nova perspectiva do conceito e da função básica da qualidade decorre, diretamente, da crescente concorrência que envolve os ambientes em que atuam pessoas e organizações. Como se percebe, a perspectiva estratégica da qualidade não apenas cria uma visão ampla da questão, mas, principalmente, atribui a ela um papel de extrema relevância no processo gerencial das organizações.
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2.1. O que significa perspectiva estratégica da qualidade? Inicialmente, uma análise individual dos termos que compõem a expressão “perspectiva estratégica da qualidade”. 2.1.1. Estratégico
Em sua visão mais simples, as ações estratégicas são aquelas que têm impacto direto na sobrevivência das organizações. Em regra, estas ações requerem uma “visão estratégica”, ou seja, são definidas a partir da análise de cenários amplos, que vão além da organização em si mesma, mas contemplam toda a área externa em que ela atua, que podem envolver fornecedores, clientes, mercados, concorrentes como também podem considerar aspectos relacionados a carências eventuais de matérias-primas, substituição de tecnologias, avanços sociais, preocupações ambientais etc. Dessa forma, considera-se que a visão estratégica sempre comporta duas dimensões básicas: (1) a dimensão espacial, que inclui a organização como um todo e o ambiente onde ela está inserida e (2) a dimensão temporal, em que são analisadas variáveis que vão se alterando ao longo do tempo, como o progresso tecnológico e o gosto ou os desejos de um grupo de consumidores, por exemplo. Essas características fazem com que decisões estratégicas tendam a considerar análises abrangentes e de longo prazo. Tanto pela natureza das variáveis que são requeridas para a tomada da decisão como, principalmente, pelo impacto que determinam na organização como um todo, tem-se, como regra geral, que essas decisões são tomadas pela alta administração. Isso, contudo, não exclui os níveis gerenciais táticos e operacionais de adotarem posturas estratégicas, até porque suas ações podem constituir-se em diferencial estratégico para a organização. Um exemplo simples: um pequeno avanço tecnológico desenvolvido no âmbito do processo produtivo pode determinar um ganho de produtividade acentuado que, por sua vez, pode ter influência direta no custo de produção. Redução de custos pode implicar redução de preços, o que, por sua vez, pode determinar um elemento de forte atratividade de um produto, diferenciando-o de forma significativa de seus concorrentes. Essa é a razão pela qual incentiva-se que todos na organização – independentemente do nível hierárquico a que estejam integrados – venham a adotar posturas estratégicas. Essas posturas criam o comportamento estratégico da organização e requerem, por sua vez, que sejam criados modelos de formação estratégica para as pessoas. Como se percebe, assim, a perspectiva estratégica das organizações pressupõe a perspectiva estratégica das pessoas. Decisões estratégicas são reunidas em um modelo de planejamento bem conhecido – o planejamento estratégico. Este, por sua vez, integra a gestão estratégica, que pode ser desdobrada em processos gerenciais específicos, como a gestão estratégica de custos ou a gestão estratégica da qualidade.
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2.1.2. Perspectiva
O termo “perspectiva” vem do latim (grafado da mesma forma) e significa uma forma de representação (por exemplo: representar, em um determinado plano, objetos no modo como eles se apresentam a quem os vê). A perspectiva leva em consideração a posição de cada objeto no conjunto analisado, bem como distâncias que separam os objetos entre si. Por tratar-se de uma visão de conjunto, a perspectiva mostra os objetos como vistos de longe, de cima, ou seja, no seu contexto como um todo. Podem ser considerados sinônimos de perspectiva vocábulos como panorama, aparência, horizonte ou espaço. Em uma visão temporal, pode-se entender a expressão “em perspectiva” como algo esperado no futuro (imediato ou não). 2.1.3. Perspectiva estratégica da qualidade
A expressão “perspectiva estratégica da qualidade”, assim, mostra um contexto bem definido. De fato, trata-se da colocação da qualidade em um contexto amplo, em geral de longo prazo, em que a qualidade não é vista de forma isolada, mas inserida em um modelo em que se consideram os aspectos essenciais da sobrevivência da organização e de como a qualidade os afeta e é por eles influenciada. Ao mesmo tempo, essa expressão chama a atenção para a visão de longo prazo, em que se analisam tanto os reflexos que uma gestão que prioriza a qualidade costuma trazer, como se definem as ações que podem garantir posições consolidadas da organização no mercado. Esta preocupação sempre existiu e, observe-se, tornou-se mais crucial em momentos de crise econômica, como a que o mundo atravessou entre 2008 e 2010 (KOLESAR, 2009). Juntando as duas coisas – “perspectiva” e “estratégica” – observa-se, assim, que há várias interpretações possíveis para a expressão “perspectiva estratégica da qualidade”. Ela significa, por exemplo: UÊ Considerar a qualidade como fator de sobrevivência para as organizações. UÊ Elevar a qualidade à categoria de diferencial competitivo das organizações – seja em termos de produtos, serviços, métodos de trabalho, processo produtivo etc. UÊ Tomar decisões acerca da qualidade, tendo em vista um cenário amplo de implicações, insumos e resultados. UÊ Adotar uma visão de futuro sobre a questão, considerando cenários prováveis para a organização, para o mercado e para a sociedade como um todo. Como se percebe, esse conceito amplia bastante o que tradicionalmente se entendia como qualidade. Além disso, aumenta sua importância e a responsabilidade pelas tomadas de decisão que dizem respeito às formas de planejar e desenvolver sua implementação conceitual e prática nas organizações.
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2.2. A qualidade como fator de liderança estratégica A mesma análise termo a termo, utilizada anteriormente, vai servir de suporte para que se entenda, exatamente, o que significa a qualidade vista com um fator de liderança estratégica das organizações. 2.2.1. Qualidade
No seu sentido primeiro, qualidade é uma relação da organização com o mercado. Neste contexto, a qualidade é definida como uma relação de consumo. Muitos autores contestam essa acepção do termo qualidade. De fato, sob a abordagem abrangente que o gênio de Taguchi desenvolveu, a qualidade é definida a partir das relações das organizações com a sociedade. É claro que esta definição (“qualidade é a minimização das perdas impostas à sociedade”) não tem sua consistência baseada apenas no seu lado, digamos assim, mais romântico, talvez utópico, ou mesmo idealista. Dessa sociedade de hoje saem nossos consumidores de amanhã. E mais: esses consumidores andam tendo ideias novas, andam falando de coisas que não se ouviam antigamente. Falam em respeito ao meio ambiente, em ações sociais da organização, em “clientes maravilhados”. Parece que hoje a qualidade assumiu, plenamente, um enfoque que David Garvin fixou 20 anos atrás: a visão transcendental, ou seja, a qualidade não está apenas no processo produtivo, no método de trabalho, no produto em si ou no serviço prestado; vai além de tudo isso. Ainda não se sabe ao certo se essa generalização conceitual é causa ou consequência da revolução pela qualidade que assolou o planeta, principalmente a partir do final dos anos 1980. Mas se sabe, com certeza, que esta reviravolta de conceitos, posturas, exigências e expectativas tem tudo a ver com um fenômeno que se propaga furiosamente: o crescente e avassalador aumento da concorrência. 2.2.2. Fator
Fator é uma palavrinha simples. Vem do latim, factore, e significa, em geral, aquele que faz alguma coisa, o agente do processo de fabricação ou de produção de alguma coisa. Outra acepção do termo é aquela que envolve o conceito de cada um dos termos de um produto a efetuar. Assim, fator parece ser uma palavra que define partes, meios, componentes, integrantes. Talvez o significado de fator que mais tem a ver com a frase “a qualidade como fator de liderança estratégica” seja o que associa fator ao que concorre para um resultado. Ou seja: o fator é alguma coisa a qual recorremos para obter um produto, um resultado, uma consequência, um efeito, uma decorrência, uma implicação, ou até mesmo, uma simples sequela. Ou seja: o fator é alguma coisa que “nos conduz a algum lugar”.
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2.2.3. Liderança
Liderança já é um termo complexo. Como regra geral, significa o conjunto de características de uma pessoa ou de uma organização que se diz líder, ou que tem capacidade de liderar. Liderar, aqui, parece ser o mesmo que governar, dirigir, chefiar ou conduzir. De fato, no mais das vezes, o líder é o chefe, o dirigente ou o guia de qualquer tipo de ação, de qualquer empresa ou, de uma forma mais ampla, o que conduz as pessoas em busca de um ideal. Mas líder também é o que fala por todos, isto é, o representante de um grupo, de uma sociedade, de um conjunto de pessoas que possui a mesma opinião em relação a algum assunto. No futebol, o líder é reverenciado – afinal, é o clube que ocupa a primeira posição em qualquer tipo de competição desportiva e que, por isso, merece mais destaque do que os outros. No mercado, o líder é o produto de consumo ou o serviço prestado que mais vende em sua faixa própria de atuação; é o serviço mais procurado; é a marca mais respeitada. É, enfim, o referencial de toda uma classe de bens tangíveis ou intangíveis. A liderança deve sempre oferecer um direcionamento. De fato, a liderança dá o exemplo. Ela gera coragem e destemor nas pessoas para que busquem novos e mais elevados padrões de desempenho. A liderança define caminhos a seguir e rumos a tomar. Estabelece objetivos. Determina prioridades. E, é claro, viabiliza as ações, alocando os recursos indispensáveis para tanto. Pessoas que são realmente líderes alteram a cultura das organizações
Isso quer dizer: criam novos valores; geram nova visão; incentivam novos comportamentos. Geram oportunidades para que as pessoas evoluam, inovem, arrisquem-se. Por isso, diz-se que os líderes são, antes de tudo, agentes de mudanças. Em primeiro lugar, nas pessoas; depois, nas organizações. Os líderes têm uma característica de ação interessante diante das crises: eles identificam os problemas e as dificuldades. Como todo mundo. Mas eles investem na busca de soluções com extremo empenho. Como quase todo mundo. E efetivamente eles encontram estas soluções. Como pouca gente. E mobilizam, motivam e comprometem as pessoas para produzirem resultados que eliminam os problemas. Como quase ninguém. O conceito de liderança, assim como o de qualidade, mudou muito nos últimos tempos. Na década de 1920, falava-se em líderes de modo formal, identificando-se os líderes burocráticos. Sua característica de liderança estava calcada em seu patrimônio (pessoal ou material) e em aspectos específicos de sua personalidade – como o carisma, por exemplo. Nos anos 30, a liderança caminhou junto com a motivação e considerava-se líder aquele que conseguia motivar seus subordinados.
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Na década de 1940, em função até da guerra, enfatizou-se muito a ideia de que o líder era aquele que conduzia as pessoas, levando-os a atingir os resultados que ele – o líder – desejava que fossem atingidos. A década de 1950 enfatiza as estratégias comportamentais, fazendo com que a liderança seja confundida um pouco com indução de novos comportamentos. A década de 1960, quando se cristaliza o conceito de gestão como forma de controle, torna o líder uma pessoa que consegue avaliar continuamente a ação dos seus subordinados e redirecioná-las. Na década seguinte, surge o conceito de liderança como uma atividade de gestão que, com o uso de recursos como envolvimento, motivação e comunicação, direciona a ação das pessoas de forma tal que as leva a atingir determinados resultados. Atualmente, a liderança está associada com cultura organizacional. Daí o conceito atual, que envolve alterações de hábitos, crenças e valores. 2.2.4. Estratégico
Por fim, pode-se rever o que se disse sobre “estratégico”. Estratégico significa um elemento que tem impacto na sobrevivência da organização. A visão estratégica, portanto, é a visão do futuro da organização, de como ela estará operando no futuro. Planejamento estratégico é a forma de planejamento que visa a garantir meios e fins para que a empresa cresça constantemente. Ação estratégica é uma ação que implica a evolução da organização. E assim vai. O modelo estratégico mais conhecido é o planejamento estratégico. Trata-se de um modelo de planejamento utilizado pelas organizações para envolver todos os seus recursos, de modo global, com ações de curto, médio e longo prazos. Em geral, ações específicas são definidas como sendo estratégias. As estratégias são métodos para implantar mecanismos destinados a produzirem resultados específicos ou gerais em qualquer atividade, processo, serviço ou produto da organização. Por envolver os elementos básicos de um sistema, a implantação de uma determinada estratégia pode introduzir uma estrutura sistêmica na organização ou em partes bem definidas dela. Assim, é comum mencionar o “sistema just-in-time” para referir-se à estrutura que suporta as ações básicas da estratégia just-in-time. É importante observar que se utiliza o termo “sistema” exatamente porque a estrutura em questão é um sistema. A noção de estratégia é mais ampla do que a noção de ferramenta, embora, às vezes, os termos sejam, equivocadamente, trocados. A estratégia envolve a utilização de várias ferramentas e tende a produzir resultados mais amplos. Além disso, dificilmente uma ferramenta gera uma estrutura própria de suporte – o que ocorre com as estratégias.
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O comportamento estratégico das organizações costuma ser revelado pela preocupação básica que ela tenha com questões fundamentais. As mais comuns são: UÊ Por que a organização existe? UÊ O que caracteriza sua ação na sociedade? UÊ Como ela desenvolve seu processo produtivo? UÊ Onde a organização pretende chegar? As ações estratégicas das organizações procuram trabalhar quatro elementos básicos, sendo dois internos e dois externos à organização. No primeiro caso, inserem-se dois tipos de características de cada organização: seus pontos fortes e seus pontos fracos. No segundo, consideram-se as oportunidades que a organização pode aproveitar no contexto onde ela se insere e as ameaças que podem comprometer suas ações no futuro. Em função destes aspectos, considera-se fundamental manter uma constante avaliação – e até mais do que isso – estabelecer um permanente monitoramento das ações da concorrência. 2.2.5. A qualidade como fator de liderança estratégica
Analisando os termos em conjunto, tem-se, agora, uma visão clara do que significa “a qualidade como fator de liderança estratégica”. A ideia é que a qualidade, na forma como está sendo aqui definida, será o fator, na forma como está sendo aqui definido, de liderança, na forma como está sendo aqui definida, estratégica, na forma como está sendo aqui definida. Em resumo: a correta definição de uma forma de relacionamento da organização com o mercado e, mais em geral, com a sociedade (qualidade) é um mecanismo que conduz a um dado resultado (fator), qual seja, uma postura inovadora (liderança) que garantirá a sobrevivência da organização (ação estratégica). Transformar organizações em líderes em suas áreas de atuação nem sempre é tarefa fácil. De fato, pode-se observar que há três tipos de organizações: UÊ Que nasceram para liderar e lideram. UÊ Que nasceram para liderar. UÊ Que nasceram. O que diferencia a primeira da segunda é o fator tempo. O que diferencia as duas primeiras da terceira é o fator concepção da organização. A qualidade é uma forma de conceber a atuação da organização no mercado e, por extensão, na sociedade. Esta forma de concepção pode ser o diferencial básico que não apenas garante a sobrevivência, mas a evolução da própria organização.
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2.3. A visão estratégica da qualidade A estruturação da visão estratégica da qualidade começa com algumas questões básicas. Como se constrói um conceito consistente para a qualidade? UÊ Como se constrói qualquer conceito consistente: transformando-o em um valor. Ou seja: fazendo com que as pessoas passem a acreditar que, efetivamente, a qualidade é fundamental para a sobrevivência da organização e delas próprias. Não se deseja, assim, uma simples mudança de posturas ou comportamentos, mas, sim, uma alteração na forma de pensar e crer. Criar uma nova forma de agir, portanto, seria simples consequência. No Brasil, o que significa qualidade? UÊ O termo tem mudado seguidamente de sentido. Ainda persiste a ideia de que a qualidade é o esforço para minimizar defeitos. Como também permanece a visão de que a qualidade está restrita às melhorias localizadas. Ou até mesmo a uma maior qualificação das pessoas. Mas hoje muita gente já vê a qualidade como um diferencial. Ou até mesmo como um item básico de manutenção da empresa viva. Principalmente nestes tempos de concorrência acirrada. Ao lado dessas questões mais amplas, surgem algumas outras questões práticas que contribuem de forma decisiva na construção do conceito prático da qualidade. Qual o desafio que a qualidade pretende enfrentar e vencer? UÊ Em termos simples e objetivos, estabelecer um diferencial competitivo. Ou seja: garantir um lugar ao sol para a organização, diferenciando-a das demais. Dito de outro modo: fixar raízes à frente dos concorrentes. Qual a contribuição que a qualidade pretende oferecer? UÊ Existem contribuições operacionais que não podem ser desprezadas: redução de defeitos, redução de custos, redução de retrabalho, aumento da produtividade, por exemplo. Existem, também, contribuições táticas relevantes: pessoas mais preparadas para tomar decisões gerenciais críticas para o funcionamento da empresa, por exemplo. Mas as contribuições mais relevantes são as de natureza estratégica: garantir não apenas a sobrevivência da organização, mas seu contínuo crescimento (evolução). Pode-se dizer que os resultados práticos da gestão da qualidade em nível operacional motivaram o desenvolvimento dos conceitos táticos da qualidade, cujos benefícios permitiram que se criasse a visão estratégica da qualidade. Há quem diga que a gestão operacional da qualidade é a visão “histórica” da qualidade nas empresas brasileiras. De fato, é possível que hoje a maioria das organizações veja a qualidade sob uma óptica mais ampla e relevante. Mas há, ainda, empresas brasileiras que restringem as ações e os resultados da qualidade ao plano operacional, buscando apenas reduzir custos de operação
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de equipamentos, avaliar fornecedores com base em planos de amostragem à porta da fábrica, minimizar defeitos no processo produtivo, eliminar condições de trabalho que possam induzir ao erro ou ao desperdício etc. Não se imagina que essas empresas estejam vendo a qualidade apenas com essa ótica, mas, sim, que estejam em estágios iniciais da concepção da qualidade. E que, em algum momento, começarão sua evolução em direção a novas visões. Na verdade, essa alteração gradual de visão foi a forma como a coisa toda começou. 2.3.1. A qualidade começou na indústria
E por quê? Parece haver uma razão básica inicial: a indústria possui processos produtivos bem estruturados e perfeitamente organizados – ao contrário, por exemplo, de empresas comerciais. Esse arranjo cria condições de que sejam implantadas técnicas de melhoria de forma mais simples, já que causas e efeitos são facilmente identificáveis. Além disso, os resultados são mais visíveis – e, por isso mesmo, mais estimulantes e motivadores. Há, contudo, outra razão mais relevante: as empresas industriais foram as que primeiro sentiram o peso da concorrência. Esta carga foi mais sentida nas empresas que se aventuraram em atividades de exportação, passando a competir com empresas locais em seus próprios países. Quem está na estrada há mais tempo deve lembrar que, no começo dos anos 80, os textos dos projetos de pesquisa e desenvolvimento (sobretudo aqueles financiados por agências oficiais de fomento) sempre começavam da mesma forma: ressaltavam a importância de priorizar o mercado externo, o desenvolvimento de produtos para a exportação, como forma de atrair a entrada de moedas fortes que, para um país em desenvolvimento como o Brasil, tinham importância fundamental. Durante um bom tempo, criou-se a impressão de que a qualidade era restrita às linhas de produção destinadas a esses produtos para exportação. E por que tanta ênfase no desenvolvimento de melhorias em linhas de exportação? Porque os produtos dela decorrentes entrariam em um mercado mais competitivo que o mercado interno. Hoje, esta diferenciação não faz mais sentido. O mercado interno também se transformou em um ambiente de grande concorrência. É até pecado falar em ênfase na qualidade exclusiva da exportação. Continua-se incentivando a exportação como sempre se fez e, no fundo, pela mesma razão de décadas atrás. Ocorre, contudo, que a concorrência interna criou a necessidade de que os produtos destinados ao consumo no Brasil sejam diferenciados dos concorrentes (inexistentes ou pouco expressivos até algum tempo atrás). Esta, assim, parece ser a razão principal: a qualidade começou na indústria porque foi esse setor da economia nacional que primeiro sentiu os efeitos da concorrência.
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2.3.2. A qualidade migrou, depois, para as organizações de serviços
E por quê? Produzir qualidade em ambientes produtivos um tanto confusos como organizações comerciais, hospitais, hotéis ou empresas transportadoras sempre foi um desafio considerável. Houve mesmo quem dissesse que isto não seria possível. Afinal, como organizar o processo produtivo de um restaurante, se não se sabe que prato pode pedir o próximo cliente que entrar? E no serviço público? Como construir um conceito de qualidade para governos e serviços públicos em geral? Como avaliar a qualidade destes serviços? Em um primeiro momento, as dificuldades na condução de um processo gerencial bem estruturado em organizações de serviços fizeram com que a gestão dessas empresas fosse feita de forma personalista, com base em intuição e talento pessoal de empresários e de gerentes. De fato, até hoje se considera que a influência da ação das pessoas no desenvolvimento (e no gerenciamento) de serviços é muito maior do que nas organizações industriais. Outro fator a considerar neste ambiente é a histórica falta de uma “barreira de entrada”. O nível de investimento mínimo para criar uma organização industrial sempre foi considerado um entrave à entrada de novos competidores na área. Não se podia dizer o mesmo até recentemente para o setor de serviços, visto que sempre se teve a ideia de que qualquer pessoa poderia, da noite para o dia, abrir um restaurante – o que não ocorreria com um fabricante de geladeiras. Essas noções que hoje são vistas como equivocadas talvez não o fossem no passado. Assim, elas criaram alguns mitos no processo de prestação de serviços, como, por exemplo: UÊ O serviço não requer tecnologia. UÊ O serviço dispensa aporte de capital. UÊ O serviço pode ser desenvolvido sob forma de uma ação de pequena escala. UÊ A prestação de serviços dispensa estudo, análise e pesquisa. UÊ Serviços não produzem empregos, riqueza ou renda. UÊ Toda avaliação em serviços é subjetiva. Todas essas suposições caíram por terra, abatidas pelo mesmo argumento: concorrência. De fato, em qualquer lugar no país, na cidade onde existia só um mísero hotelzinho, hoje existem dez; em um bairro onde há dez anos havia uma única farmácia, hoje existem dez; na avenida onde havia um único restaurante até bem pouco tempo, hoje existem dez. E com um detalhe importante: não se trata de alguns hotéis a mais; são hotéis com serviços diversificados (um deles opera também como apart-hotel; o outro possui serviços mais simples e diárias mais baratas; já há outro, ainda, que dispõe de pontos de Internet e laptops em todos os apartamentos etc.). O que parece ser uma farmácia a mais, na verdade, é um minimercado... Os restaurantes também diversificaram: há um de fast-food; outro de comida vegetariana; outro que serve comida tailandesa, e assim por diante. Ou seja, concorrência.
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Assim, as organizações prestadoras de serviços se viram diante do mesmo dilema das empresas industriais. E não tiveram opção: investir em qualidade ou desaparecer. Essa decisão, portanto, tem todas as características de uma ação estratégica. A noção de qualidade mais claramente assumida aqui foi a de diferenciação. E, por isso, organizações produtoras de serviços tiveram que investir em tecnologia (para automatizar várias atividades, por exemplo); passaram a requerer aporte de capital (para investir em produtos diferenciados, por exemplo); foram forçadas a ampliar a escala do atendimento (como a pequena banca de revista que hoje também vende sorvetes, cartões telefônicos e preservativos). A prestação de serviços, assim, hoje se torna uma atividade que precisa ser bem concebida. Não há lugar para improvisos. E, com tanta oferta, os consumidores aprenderam a ser mais objetivos ao avaliar a qualidade desses serviços. Esse cenário atual inclui os serviços públicos. Inicialmente, por questões estritamente operacionais: é muito elevado o custo de operação das ações de governo. Isto gera déficits em todos os níveis de governo e em todas as áreas, com evidente falta de dinheiro para ações básicas – como saúde, habitação, saneamento e educação. A velha tática de aumentar tributos já não funciona pela visão negativa da opinião pública acerca da questão – explorada à exaustão pela imprensa. Os cortes nas verbas prejudicam o atendimento ao contribuinte, que tem a seu dispor o direito de votar. Gastos excessivos já são cerceados por uma legislação em vigor há poucos anos no país. Resta a saída da economia e da gestão competente, apelando exatamente para qualidade e produtividade. Mas é provável que o investimento em qualidade no serviço público decorra de fatores igualmente estratégicos, relacionados à sobrevivência das pessoas que compõem os governos. De fato, a partir do retorno das eleições presidenciais, em função, sobretudo, da ação de movimentos populares de intensa e expressiva visibilidade, e, mais tarde, com a criação do instituto da reeleição, desenvolveu-se, no país, um sentimento de crítica à classe política – sobretudo aqueles que atuam no poder executivo. Hoje não se cobra apenas a moralidade no serviço público; vai-se mais além, requer-se competência dos governantes. Um prefeito deixa de ser reeleito porque o sistema de transporte público que ele criou não foi do agrado da população, por exemplo. Um governador que não cumpre um mandato de realizações sociais é apeado do poder na eleição seguinte. Um presidente não elege como sucessor o candidato por ele apoiado por conta de erros na condução da política econômica. O que se nota aqui? Reações bem caracterizadas do cliente (contribuinte em geral), hoje mais exigente em relação ao serviço que o Estado lhe presta. Isso evidencia que a qualidade ganha (ou perde) votos. E não existe nada que interesse mais aos gestores públicos do que votos. O que significa isso? Concorrência. Na verdade, a cada eleição, há um processo de comparação do governo que aí está (e que deseja continuar no poder) com os novos candidatos (concorrentes). Os dados das eleições recentes no Brasil mostram que se reelegem prefeitos que atuam menos como agentes políticos e mais como gerentes de uma organização chamada “cidade”. Se não mostram serviço, seus concorrentes o substituem.
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2.3.3. Mais tarde, descobriu-se que a qualidade se adapta perfeitamente às pessoas
Eis aí uma simples, porém, grande descoberta. O que vale para organizações, vale para as pessoas. E por quê? Porque as pessoas também estão inseridas em um ambiente competitivo. Da mesma forma que os produtos melhoraram e que os serviços tornaram-se mais sofisticados, as pessoas qualificaram-se muito nos últimos anos. Alguns simples exemplos: o domínio do inglês, que era privilégio de poucos, hoje é requisito mínimo de entrada em várias carreiras; concluir um curso de graduação é um feito que alcança um número crescente de pessoas; possuir cursos de pós-graduação também não mais se constitui em diferencial. Aliado à maior qualificação, outro fator surgiu simultaneamente: maiores exigências por resultados cada vez melhores. É possível que hoje o diferencial que caracteriza a ação das pessoas não seja mais a capacidade de fazer o que delas se espera mas, sim, a capacidade que elas tenham de superar expectativas. Ou seja: o diferencial não é fazer tudo o que for compatível com a função, mas o que for feito além disso. E de onde vem essa exigência? De um fato simples: se eu não fizer, tem quem faça; se eu não atender, tem quem atenda; se eu não superar uma meta, tem quem consiga superá-la. Ou seja, é uma questão de competitividade. Em resumo: qual o fator determinante para a qualidade? Concorrência – seja para organizações industriais, empresas prestadoras de serviços ou para pessoas. E qual o caminho para fazer frente a essa situação? Adotar uma postura estratégica no trato da qualidade, já que, dificilmente, ações táticas ou operacionais produzem diferenciais expressivos em ambientes de alta competitividade. A construção de uma visão estratégica para a qualidade, assim, parte de dois pressupostos básicos: (1) reconhecer que a qualidade é um valor e (2) utilizar a qualidade como diferencial estratégico para a sobrevivência da organização que – qualquer que seja ela – está inserida em ambientes altamente competitivos.
2.4. A componente operacional no conceito da qualidade A visão histórica mais consolidada da qualidade é a sua dimensão operacional. Esta concepção está centrada no fato de que a qualidade deve ser gerada a partir do processo produtivo. Este princípio básico fez com que convergissem para o processo produtivo todos os esforços da qualidade. E determinou, por consequência, que a maioria das ferramentas historicamente utilizadas para este fim fossem centradas em melhorias no processo produtivo. A visão estratégica da qualidade acabou por mudar este quadro, passando a contemplar a análise da ação de concorrentes, o atendimento de requisitos de clientes já no projeto do produto ou a análise do valor conferido pelo consumidor ao produto ou aos serviços. Mas isso só ocorreu há poucos anos.
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Antes que fosse cristalizada a percepção de que a qualidade precisava ser gerada no processo produtivo, o esforço dos especialistas na área estava centrado na qualidade do produto. Para tanto, foram desenvolvidos instrumentos de avaliação do produto acabado, por meio de inspeções e análises de amostras. A ineficiência desse procedimento foi percebida rapidamente: a inspeção do produto acabado não tem o poder de alterar a qualidade do próprio produto. Parece óbvio, contudo, que as informações desta inspeção podem ser valiosas para novas ações na fábrica. Ou seja: a inspeção do produto acabado torna-se útil na medida em que transmite as informações obtidas na avaliação feita para o processo. A avaliação do produto, assim, torna-se fonte de análises para melhorias do processo produtivo. Com efeito, como o produto é o resultado do processo, priorizam-se as ações voltadas para o processo produtivo, isto é, para as causas e não para os efeitos. A ênfase da qualidade no processo centra-se na eliminação de defeitos, que ocorre ao longo de fases bem definidas, que vão desde a percepção dos defeitos, passam pela sua correção e deságuam na eliminação de suas causas (ações preventivas). De certa forma, essa concepção nunca mudou. O que mudou, ao longo do tempo, foi a noção de defeito, hoje inteiramente substituída pelo conceito de perda, muito mais amplo. A concepção operacional da qualidade, em sua forma mais ampla, dá origem à gestão da qualidade no processo. A gestão da qualidade no processo pode ser definida, de forma sucinta, como o direcionamento de todas as ações do processo produtivo para o pleno atendimento do cliente. A estratégia básica para tanto consiste, exatamente, na melhor organização possível do processo, o que se viabiliza ao longo de três etapas: a eliminação de perdas; a eliminação das causas das perdas e a otimização do processo (PALADINI, 2010:17). Alguns conceitos básicos para a melhoria no processo produtivo foram definidos por Klyatis (2003), que ressalta a importância do esforço contínuo para a produção da qualidade. Kontoghiorghes e Gudgel (2004) analisam os conceitos da produtividade e da qualidade, mostrando como os conceitos se relacionam no âmbito do gerenciamento dos processos produtivos. Ainda que tenha feito parte de um estágio inicial da história da qualidade, seu viés operacional não perdeu importância e nem deixou de despertar interesse. Alguns textos recentes evidenciam esta preocupação e, em muitas organizações, prioridade de ação (ver, por exemplo, EVANS e LINDSAY, 2008; NUHFER e WALTERS, 2009; HAMILTON, 2010 ou BECKFORD, 2010). A concepção operacional da qualidade, assim, centra-se no empenho pela melhoria do processo produtivo. Dois conjuntos de procedimentos são típicos nesse esforço: as ações de controle e as melhorias do processo de produção. Cada um deles gerou formas específicas de gerenciamento.
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2.5. Ações de controle Há um conceito corrente em nossas organizações, segundo o qual a qualidade só pode ser obtida se for exercido rigoroso controle sobre todas as atividades produtivas. Em particular, se for exigido dos recursos humanos da empresa pleno atendimento a severas regras de comportamento e ação, ou seja, se o trabalho for desenvolvido sob disciplina orientada por rígidos padrões. Isto requer, da gerência, amplo domínio sobre tudo o que se faz na fábrica, acompanhamento minucioso de atividades e monitoramento constante dos operadores do processo. As ações de controle, assim, consideram que os bons resultados dependem da forma como se acompanha o processo destinado a obtê-los, ou seja, da forma como se trabalha. As ações de controle geraram a chamada “abordagem clássica de gerenciamento da qualidade”. Essa abordagem reflete posicionamentos tradicionais na gerência da produção, caracterizados por ações que envolvem o destaque ao prejuízo causado pela má qualidade e a atenção para o dano à atuação da empresa no mercado, determinado por deficiências dos produtos ou do processo de atendimento. A abordagem tende a debitar estas falhas diretamente aos operários que podem tê-las gerado. Confere-se muita atenção aos estragos que elas provocam na folha de serviços do empregado, responsáveis por suas próprias atividades. Decorre, daí, o comportamento usualmente aqui adotado, que utiliza medidas corretivas sempre que se detectam falhas. Essa postura exige o contato direto com a pessoa ou as pessoas responsáveis por defeitos, em que se busca evidenciar as causas que os determinaram e as formas de evitá-los. A reincidência exige o acompanhamento de perto dos responsáveis, até que voltem ao normal. Para não se ater apenas ao negativismo, recomenda-se, ainda, distinguir operários exemplares e divulgar o seu desempenho. Tanto a postura punitiva quanto a evidência dos bons empregados requer um acompanhamento de perto do desempenho das pessoas. Esta é a característica básica das ações de controle. Essa forma de produzir qualidade tem vantagens e restrições. Vantagens das ações de controle UÊ Obtenção de resultados rápidos. Esse benefício é particularmente observado quando ocorrem anormalidades que precisam ser rapidamente corrigidas, como o desvio de materiais da fábrica, por exemplo. UÊ Exigência da cultura local. Funcionários de fábricas localizadas em regiões de determinada ascendência (como a alemã, por exemplo) costumam se adaptar melhor ao trabalho sob disciplina, segundo métodos de atuação detalhadamente organizados. Nem sempre se sentem confortáveis em processos de gestão participativa ou muito “democrática”, preferindo atuar sob a hierarquia bem caracterizada. Alguns ambientes caracterizam-se, exatamente, pela disciplina – é o caso do exército, por exemplo.
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UÊ A formação da mão de obra pode exigir disciplina. É o caso da construção civil. Não se pode imaginar que um prédio fique pronto dentro de determinado prazo se deixarem de ser adotados rígidos esquemas de planejamento e execução das atividades, o que inclui, sobretudo, controle permanente das ações da mão de obra. Desvantagens das ações de controle UÊ Como regra geral, pode-se observar que o controle não agrega valor ao processo produtivo. Ou seja: o controle não produz, por si mesmo, mais qualidade em processos e produtos. Ou, ainda, melhorias no processo de controle não implicam, automaticamente, melhorias no processo produtivo ou no produto. UÊ Pode-se afirmar que o uso de ações de controle costuma ser compulsório – não chega a ser uma opção conscientemente assumida. Na verdade, trata-se de um expediente extremo para fazer funcionar um processo produtivo de forma adequada. UÊ Todo controle custa caro. O controle, na verdade, só existe se estiver associado a procedimentos que precisam estar acionados permanentemente – incorrendo em custos, em geral, elevados. Imagine-se, por exemplo, que o trânsito de uma cidade só é organizado porque existem 700 guardas na rua. Isso quer dizer que, se saem os guardas, o trânsito vira um caos. Mas manter 700 guardas na rua gera um custo elevado. Por isso, fala-se tanto em “conscientização dos motoristas” como o melhor remédio para se obter um trânsito mais “humano”.
2.6. Gerenciamento baseado em controle As ações de controle costumam ser vistas como posturas institucionais, típicas das organizações, ou seja, decorrentes de suas diretrizes e normas de funcionamento. Há, assim, um equivalente em termos de ações das pessoas, que se caracteriza pela figura do gerente centralizador e arrogante, que controla todo o processo produtivo com mão de ferro. Nem sempre a postura centralizadora dos gerentes decorre apenas de suas características pessoais, que impactam sobre sua forma de agir. No mais das vezes, são reflexos também da postura da alta administração, ou, dito de outra forma, da real política da organização. De todo modo, porém, são as peculiaridades intrínsecas de cada pessoa que determinam atitudes autoritárias no desenvolvimento das atividades de gestão. Se a política da organização for na mesma direção, este centralismo fica perigosamente reforçado.
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A ideia da gerência baseada em controle pressupõe a figura de um gestor onipresente. Algo do tipo “o primeiro a chegar, o último a sair”. Trata-se de um profissional que conhece todos os procedimentos funcionais da fábrica; conhece a forma de operar cada equipamento; acompanha o modo de agir de cada subordinado. Está sempre atento, sempre presente, sempre vigilante. Costuma passar por cima dos níveis hierárquicos intermediários (como os supervisores) para chamar a atenção de cada operário individualmente. Para ter controle sobre todas as ações, o gerente tenta conhecer cada dispositivo e cada atividade. Por isso, ele é considerado um “curinga” dentro da empresa. É considerado capaz de fazer qualquer coisa, em qualquer lugar e de substituir qualquer pessoa. Vantagens do gerenciamento baseado em controle UÊ Em empresas de pequeno porte, estes gerentes são chaves no processo produtivo. Podem atuar em vários postos e, assim, agilizar as operações. UÊ Por conhecer todos os procedimentos operacionais da empresa, o gerente pode transformar-se em um valioso instrutor. Ele pode formar muitos operadores se vencer seu centralismo, ou seja, se estiver disposto a compartilhar as informações que possui. Desvantagens do gerenciamento baseado em controle UÊ Falta de futuro para este tipo de profissional – afinal, a figura do gerente dominador está em extinção. Por uma razão muito simples: cada vez é menos possível controlar toda a organização. Ainda há gerentes que permanecem várias horas na empresa, após o expediente, lendo e-mails remetidos ou recebidos por seus subordinados. É uma postura que não tem cabimento – tanto pela disponibilidade de meios simples e eficazes de controlar o fluxo de mensagens eletrônicas, quanto pela falta de utilidade prática da ação em si. UÊ No passado, este tipo de gerente chegou a ser referenciado como o grande profissional da empresa, aspirante certo ao cargo de superintendente. Hoje, é considerado um profissional estressado, exausto, esgotado, extenuado, exaurido pelas suas atividades intensas e sem interrupção. Em uma palavra: um profissional com péssima qualidade de vida. E com níveis de produtividade, por consequência, muito baixos. Cabe perguntar se é mesmo útil à organização. UÊ Em tempos de trabalho em equipe e responsabilidades coletivas, a postura profissional deste gerente está ultrapassada, obsoleta, fora de uso. Soa como um anacronismo. Ainda que as desvantagens desta postura gerencial superem possíveis benefícios, ainda persiste essa figura em nossas empresas. Mas, certamente, com os dias contados.
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2.7. Desenvolvimento de ferramentas de melhoria do processo produtivo Em meados dos anos 1980, o modelo de qualidade baseado em controle já evidenciava sinais de esgotamento. Predominava a ideia de “valor” e ia ficando mais claro a cada dia que o controle, em si, não agregava valor à produção. Simultaneamente, o conceito de melhoria ganhava força, influenciado pela introdução crescente de técnicas industriais japonesas nas fábricas brasileiras. Foi o auge do impacto nipônico na indústria nacional, impulsionado por visita de técnicos brasileiros ao Japão em missões especiais e, é claro, pelo sucesso das ferramentas japonesas de administração da qualidade. O desenvolvimento de novas técnicas de produção e a adaptação de procedimentos, criados, sobretudo, no Japão, foram experiências marcantes no período, caracterizado também pelo advento da norma ISO 9000, então vista como nova forma de avaliar o processo produtivo. As técnicas mais comuns e simples de produção da qualidade ficaram conhecidas como “ferramentas”. Trata-se de dispositivos, procedimentos gráficos, numéricos ou analíticos, formulações práticas, esquemas de funcionamento, mecanismos de operação, enfim, métodos estruturados para viabilizar a implantação de melhorias no processo produtivo. Em geral, a ferramenta não tem grande alcance, fixando-se mais em um setor produtivo, enfatizando a operação de um equipamento, a forma de executar uma atividade ou um método específico de avaliação do produto ou do processo. As ferramentas costumam ter características próprias, em função das pessoas que a utilizarão ou da finalidade a que se destina. Mesmo tratando-se de melhorias em termos de processo produtivo, podem envolver variáveis externas a ele, como a análise da ação de concorrentes que atuam em uma mesma faixa de mercado ou a determinação da melhor forma de atender a requisitos particulares de consumidores. As ferramentas mais conhecidas podem ser agrupadas em três classes, representativas da evolução histórica do esforço para aplicar efetivamente a qualidade nas empresas: (1) as ferramentas tradicionais; (2) aquelas derivadas das estruturas dos sistemas produtivos propostas na época e (3) as ferramentas da qualidade direcionadas para o atendimento ao consumidor via melhorias de processo. No primeiro grupo, incluem-se ferramentas desenvolvidas há mais tempo ou aquelas importadas de outras ciências. No primeiro caso, estão os gráficos de controle, criados na década de 1920; no segundo, estruturas de representação de dados, como os histogramas, que compõem o instrumental comum da estatística. Nota-se, nestas ferramentas, a forte ênfase para o controle da qualidade, com ações mais voltadas para a avaliação da qualidade em processos e produtos. Outras ferramentas usuais desse grupo são os diagramas de causa-efeito, os histogramas, as folhas de checagem (check-lists), os gráficos de Pareto e os fluxogramas. Já as ferramentas derivadas das estruturas dos sistemas de produção (e das estratégias a elas associadas) vieram, basicamente, do modelo just-in-time, de origem japonesa. Elas incluem a “perda zero”, as estruturas de células de produção,
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além da conhecida técnica do kanban, os processos de Manutenção Produtiva Total (TPM), o envolvimento dos funcionários em círculos da qualidade e o auto-gerenciamento do trabalho. Essas ferramentas foram desenvolvidas com ênfase um tanto diversa daquelas do primeiro grupo. Sua prioridade é organizar o processo produtivo e seu objetivo é produzir qualidade de forma contínua e organizada. As ferramentas do primeiro grupo destinam-se mais a conhecer o processo produtivo. O desenvolvimento das ferramentas centradas no consumidor buscou o direcionamento da organização para atender ao mercado por meio de melhorias implementadas no processo produtivo – com evidente impacto no produto. Essas ferramentas partem do princípio de que a otimização do processo não é um fim em si mesma, mas um meio de ampliar o pleno atendimento ao consumidor – este, sim, objetivo básico da organização. A estrutura das ferramentas centradas no consumidor é um pouco mais sofisticada que as anteriores, utilizando as bem conhecidas matrizes e os modelos específicos de diagramas. As ferramentas mais conhecidas desse grupo apresentadas sob forma de diagramas são: (1) o diagrama Árvore (desdobramento de um objetivo em metas intermediárias para definir a melhor forma de atingi-las); (2) o diagrama Seta (programação da execução de atividades); (3) diagrama de Programação da Decisão (gráfico que esquematiza possíveis decorrências de seleção de opções para que possam conduzir à solução de um problema); (4) o diagrama de Dependência (determinam o grau de dependência de certos elementos em relação à execução de uma atividade básica) e (5) o diagrama de Similaridade (definição dos níveis de similaridade entre informações relativas a um processo ou a um produto). Já as ferramentas apresentadas sob forma de matrizes mais conhecidas são a Matriz de Análise de Dados (arranjo de dados que facilita a análise das variáveis que intervêm em um processo) e o diagrama-matriz (organização lógica de informações que representam ações, responsabilidades, propriedades ou atributos interrelacionados). Em todos os grupos de ferramentas, o que fica claramente enfatizado, aqui, são as melhorias no processo produtivo. Os reflexos destas melhorias nos produtos podem tanto ser consequência delas quanto podem ser, ao contrário, motivação para sua implementação. Vantagens do desenvolvimento de melhorias no processo produtivo UÊ O conjunto de vantagens do desenvolvimento e implementação de melhorias no processo produtivo parte da minimização dos efeitos negativos das ações de controle – trata-se de atividades que agregam valor ao processo. Aqui, não se atém ao controle ou à fiscalização do que está ocorrendo, mas se produz, se faz, se desenvolve alguma coisa. Trata-se, portanto, de uma postura “positiva, afirmativa, atuante”.
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UÊ Ainda que com a finalidade de produzir melhorias de processo, essas ferramentas (especialmente as do terceiro grupo) começam a trazer a figura do consumidor para dentro da empresa. Não deixa de ser uma forma de evoluir para o conceito correto da qualidade. Desvantagens do desenvolvimento de melhorias no processo produtivo UÊ Uma imagem do futebol cria uma analogia perfeita para evidenciar as desvantagens desta postura gerencial: juntando o melhor goleiro do mundo, os melhores zagueiros do mundo, os melhores meias, os melhores atacantes, o melhor treinador, não se consegue o melhor time do mundo. O que falta? Integração. Dito de outra forma: a otimização das partes não implica a otimização do todo. De fato, o desenvolvimento e a implementação de ferramentas específicas criam melhorias localizadas no processo produtivo. Pode-se, com elas, aumentar a eficiência dos equipamentos, organizar melhor o lay-out de um setor produtivo ou atender uma dada exigência do consumidor. Estas melhorias pontuais, contudo, não garantem a melhoria do processo produtivo como um todo. Um exemplo típico: a melhoria da operação de um equipamento de uma fase do processo não garante, necessariamente, a melhoria de todo o processo – pode, ao contrário, gerar gargalos e estoques indesejados nas fases seguintes do próprio processo. Dessa forma, as melhorias apenas serão efetivamente “melhorias” se tiverem impacto sobre o processo como um todo e não apenas sobre partes dele.
2.8. Gerenciamento operacional O gerenciamento operacional seria, naturalmente, o passo seguinte da evolução do conceito de qualidade. Se o problema é que as melhorias localizadas podem não contribuir para a melhoria do processo como um todo, o gerenciamento operacional pode minimizar este problema, possibilitando que as melhorias sejam implementadas menos com a ênfase de produzir benefícios pontuais e mais com o objetivo de otimizar todo o processo. A primeira diferença prática dessa postura consiste na utilização de estratégias para implementar melhorias ao invés de ferramentas. E qual a diferença entre ambas? Enquanto as ferramentas são dispositivos simples, que têm ação localizada e geram resultados pontuais, as estratégias são processos racionais, bem definidos, cujas fases e etapas são seguidas para se atingir um determinado fim. As estratégias definem modos ordenados de proceder determinadas alterações no processo produtivo. Assim, ao invés de pequenos dispositivos de melhoria, as estratégias utilizam métodos bem-estruturados, que incluem a implementação de procedimentos técnicos e até científicos. Percebe-se, assim, que, do ponto de vista técnico, a noção de estratégia é mais ampla do que a de ferramenta. Uma estratégia pode incluir a utilização de várias ferramentas e tende a pro-
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duzir resultados mais abrangentes, com impacto sobre várias fases e setores do processo produtivo. O que caracteriza o uso das estratégias no processo do gerenciamento operacional é que, ao contrário das ferramentas, requer-se uma estrutura própria de suporte, que envolve métodos, pessoas, recursos etc. Além disso, por trabalhar com elementos básicos de um sistema, a implantação de uma determinada estratégia pode introduzir uma estrutura sistêmica na organização ou em partes bem definidas dela (PALADINI, 2010). Assim, é comum mencionar o sistema just-in-time para referir-se à estrutura que suporta as ações básicas da estratégia just-in-time. As estratégias operacionais da qualidade operam no ambiente in-line, que enfatiza o processo produtivo em si. Esse ambiente enfatiza ações de melhorias voltadas para a eliminação de defeitos, para o acréscimo da capacidade de produção em bases adequadas de custos e investimentos, a implementação de ações destinadas a gerar maiores níveis de produtividade, a busca constante da otimização de processos e o crescente atendimento às especificações dos consumidores. De forma sucinta, pode-se dizer que as estratégias do gerenciamento operacional visam sempre o aumento da eficiência de operação da organização. Aqui, entende-se por eficiência o esforço destinado a definir a melhor forma de utilizar os recursos disponíveis. Dito de outro modo, a eficiência investe na otimização das atividades-meio das organizações. De forma mais restrita, a produtividade prioriza a otimização das operações. O gerenciamento integrado destas operações implica a otimização do processo como um todo. E é exatamente esta a meta de gerência operacional, até como forma de minimizar as desvantagens da postura gerencial que se atém à implementação de melhorias localizadas no processo produtivo. Observando-se a experiência prática de nossas empresas, observa-se que, no mais das vezes, as estratégias operacionais visam à minimização de custos ou à otimização de atividades. As ações no primeiro caso envolvem eliminar perdas, em geral com o uso de procedimentos corretivos. Estas ações têm um horizonte de planejamento de curto prazo e costumam estar centradas na avaliação dos desvios da produção, buscando-se detectar possíveis falhas e erros. A minimização de custos tem um limite definido e pode exaurir-se em um dado período, quando se observa que não pode mais ser melhorada sob pena de comprometer todo o projeto do processo. Para melhor acompanhamento de resultados, estas ações estão restritas a poucos elementos do processo. Teoricamente, estão destinadas a reduzir “pesos” extras que acabaram sendo agregados a produtos e processos. Por sua vez, a otimização do processo enfatiza a geração de benefícios, como, por exemplo, a melhoria dos métodos de trabalho. Para garantir resultados mais consistentes, a otimização do processo investe em atividades essencialmente preventivas, inseridas em um cenário de médio e longo prazos. As estratégias operacionais deste grupo buscam ampliar potencialidades da produção, procurando definir a melhor forma de utilização dos recursos disponíveis na organização. Aqui, as melhorias têm um perfil indefinido, já que se pretende que sejam contínuas, envolvendo todos os elementos do processo.
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Como regra geral, espera-se que a ação da gestão operacional esteja voltada para a otimização do processo, sendo a minimização de custos uma fase preliminar a ser ultrapassada. Alguns exemplos de estratégias muito utilizadas pelo gerenciamento operacional são as seguintes:
1. Estratégias de organização do processo para a qualidade: estas estratégias referem-se ao esforço de organizar, da forma mais adequada possível, as ações usuais de produção com vistas à produção da qualidade. São exemplos destas estratégias: (a) a ordenação do processo produtivo, como o Kanban e o justin-time; (b) as estratégias que visam criar uma nova estrutura para o processo produtivo, como a reprodução nos setores do modelo de relações externas da empresa, o estabelecimento de uma corrente única do fornecedor ao cliente e a adoção de fluxos contínuos de produção; (c) o desenvolvimento de novas estruturas internas nos setores; (d) a própria reorganização do espaço físico e (e) o acesso e a utilização de equipamentos, contexto em que se desenvolveu o programa de Manutenção Produtiva Total. 2. Estratégias de envolvimento dos recursos humanos: estas estratégias incluem as técnicas de motivação à qualidade bem como os modelos de formação e qualificação da mão de obra, que envolvem os mais diferentes modelos de treinamento. 3. Estratégias de planejamento do processo para a qualidade: como princípio geral de planejamento, estas estratégias visam puxar o processo a partir da demanda. Esse princípio introduziu uma nova sistemática de produção à qual estratégias como o kanban adequaram-se com perfeição. Esta sistemática, por sua vez, criou instrumentos próprios, como a redução do tamanho dos lotes, os chamados processos contínuos de produção e a redução de estoques. 4. Estratégias de produção da qualidade no processo: estas estratégias buscavam inserir a qualidade nas atividades de processo e em todos os elementos que o compõem. O programa zero defeito e os programas de eliminação de erros são exemplos destas estratégias. O modelo de gerenciamento operacional como forma de produzir qualidade também possui vantagens e restrições de uso. Vantagens do gerenciamento operacional UÊ O processo de gerenciamento operacional cria uma visão de conjunto, o que facilita a obtenção de melhorias globais no processo. Ainda que voltadas para o processo produtivo, o gerenciamento operacional produz resultados que têm
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impacto sobre os produtos e tendem a atender requisitos de qualidade dos consumidores. UÊ As estratégias do gerenciamento operacional geram resultados que rapidamente aparecem. A visibilidade das decorrências das ações e o pequeno intervalo de tempo em que requerem para tanto são fatores de forte conteúdo motivacional, muito úteis para consolidar as melhorias obtidas e obter resultados mais duradouros. Desvantagens do desenvolvimento de melhorias no processo produtivo UÊ Todos os mecanismos aqui descritos dependem da pessoa do gerente, ou seja, de suas características usuais de atuação (ou, mais precisamente, de suas características pessoais), que têm forte influência sobre o processo gerencial como um todo. UÊ As ações têm prioridade na empresa em si, enfatizando a redução de custos, o aumento da produtividade e a ampliação da capacidade produtiva. Estes aspectos não contribuem, necessariamente, para maior atendimento ao consumidor ou mesmo para a ampliação da faixa de mercado coberta pela organização. UÊ De modo mais amplo, as desvantagens da gerência operacional restrita ao processo produtivo são as mesmas que caracterizam o ambiente da qualidade in-line: se a empresa prioriza apenas seu processo produtivo, deixará de considerar seus consumidores, com suas necessidades, suas preferências e suas conveniências. O envolvimento dos gerentes no processo de produção da qualidade criou as bases para o desenvolvimento de uma nova componente no conceito da qualidade – a tática.
2.9. A gestão tática da qualidade O nível tático sempre foi entendido como um modelo intermediário de gerenciamento – algo que ficasse no meio do caminho entre o ambiente operacional e o contexto estratégico. Na sua forma mais simples, a gestão tática é a que trata de decisões que viabilizam o direcionamento estratégico da organização. Ghemawat (2000:16), cita outro autor, Carl Von Clauswitz, que, na primeira metade do século XIX criou um exemplo didático: a gestão tática, segundo este autor, cuida do uso das forças armadas em uma batalha; já a gestão estratégica utiliza-se das batalhas com o objetivo de ganhar a guerra. O processo produtivo e as ações a ele associadas compõem, em geral, a gestão operacional. As decisões relativas ao lançamento de um novo produto constituem um exemplo da gestão estratégica. Já a gestão tática é mais difícil de ser definida. A Tabela 2.1 faz essa distinção em áreas típicas das organizações, com alguns exemplos.
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Tabela 2.1: Exemplos Áreas $GPLQLVWUDWLYD &RPHUFLDO 3URFHVVR3URGXWLYR
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Visão Operacional 'LVWULEXLomRGHHVSDoR ItVLFR $JHQGDGHYLVLWDVDRV FOLHQWHV 'HVHPSHQKRGRV HTXLSDPHQWRVHPIDFH GDVHVSHFLÀFDo}HVGR IDEULFDQWH /DQoDPHQWRGH LQIRUPDo}HVFRQWiEHLV
Visão Tática $o}HVGH WHUFHLUL]DomR 1tYHLVGHYHQGDVSRU UHJLmR 1tYHLVGHFXVWRGH RSHUDo}HV
Visão Estratégica 3ROtWLFDGHTXDOLÀFDomR GHSHVVRDO 3DUWLFLSDomRGD HPSUHVDQRPHUFDGR 3ROtWLFDGHDTXLVLomRH VXEVWLWXLomRGH HTXLSDPHQWRV
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Dois fatos parecem ter sido particularmente relevantes para a transição do modelo operacional da qualidade para o cenário tático: a generalização dos modelos de controle, com a substituição de mecanismos estatísticos por processos de avaliação baseados em indicadores, e os métodos de envolvimento de pessoas no esforço pela qualidade.
2.10. Métodos quantitativos e modelos estatísticos O uso da estatística como instrumento básico da avaliação da qualidade em nível de processos foi introduzido no começo do século XX, a partir, principalmente do desenvolvimento dos chamados gráficos de controle, modelo concebido por Walter A. Shewhart, conhecido como o pai do Controle Estatístico da Qualidade. Durante a Segunda Guerra Mundial, o Controle Estatístico da Qualidade teve grandes avanços, sobretudo em termos da consolidação das inspeções por amostragem, atividade fundamental em um momento em que os exércitos aliados faziam grandes aquisições de produtos que, por serem usados nas frentes de batalha, precisavam ter elevados índices de confiabilidade. Estes dois conjuntos de mecanismos – o Controle Estatístico de Processos e a chamada Avaliação da Qualidade por Inspeção e Amostragem – sempre foram considerados os instrumentos mais importantes do Controle Estatístico da Qualidade. 2.10.1. Controle estatístico de processos
Um dos conceitos mais consistentemente fixados pelos modelos de avaliação estatística foi o de “processo”, definido como “qualquer conjunto de condições, ou causas que, agindo juntas, geram um dado resultado” (PALADINI, 2009). Trata-se, como se vê, de um conceito muito amplo, que tenta expandir a ação da avaliação estatística para além do ambiente estritamente fabril. Já o controle de processos, nesta abordagem, trata
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das atividades planejadas e desenvolvidas com a finalidade de conhecer o processo em estudo. Este, aliás, é o objetivo básico do Controle Estatístico da Qualidade aplicado aos processos produtivos: conhecer como opera o processo. Este objetivo e as diretrizes gerais do Controle Estatístico da Qualidade (e do Controle Estatístico de Processos) nunca mudaram. Novas abordagens foram adotadas, novas ferramentas foram desenvolvidas, novos suportes teóricos foram agregados ao que já se conhecia, enfim, nunca se perdeu o interesse pela área e nem definhou o senso de importância a ela atribuído. Algumas referências bibliográficas mais recentes atestam esta constatação (ver, por exemplo, os artigos de VINNING, 2009; TRIP e DOES, 2010; ANDERSON-COOK et. al., 2010; BROWNE, 2010; SANIGA et. al., 2009 ou a releitura de clássicos como MONTGOMERY, 2010 e BOX e NARASIMHAN, 2010). Os mecanismos do Controle Estatístico de Processos (CEP) envolvem técnicas que analisam as alterações no processo produtivo, de modo a determinar sua natureza e a frequência com que ocorrem. A análise dessas alterações é feita por mensuração de variáveis fundamentais do processo ou do número de defeitos por peças ou grupo de peças, ou, ainda, do número de peças defeituosas por amostra, expresso em termos absolutos ou relativos. O CEP introduziu o conceito de capabilidade, que vem a ser o comportamento normal de um processo, quando operando em estado de controle estatístico. Esta seria uma situação operacional ideal, já que aqui o processo atua com efeitos previsíveis. Esta situação só ocorre se forem eliminadas quaisquer influências, sobre o processo, de causas relevantes externas a ele. A capabilidade fornece as tolerâncias naturais do processo, que são os valores por ele assumidos, quando em estado de controle estatístico. O Controle de Processo possui uma metodologia própria para determinar as tolerâncias naturais do processo. Os mecanismos mais conhecidos do CEP são: UÊ Os gráficos de controle por variáveis, dos quais os mais usados são o da média, para avaliar a tendência central do processo, e os gráficos da amplitude e do desvio, que avaliam a dispersão dos dados obtidos em torno desta média. UÊ Os gráficos de controle por atributos, dos quais os mais empregados são gráfico p (frações defeituosas), np (quantidades de peças defeituosas em amostras), u (quantidades de defeitos por unidade do produto) e c (número de defeitos por amostra). O CEP, assim como os demais procedimentos do Controle Estatístico da Qualidade, tem algumas características relevantes que precisam ser levadas em conta durante sua implantação e efetiva utilização. 1. A determinação da capabilidade de um processo e a avaliação das situações sob controle ou fora de controle do processo utilizam métodos científicos que não comportam procedimentos baseados em improvisações, método de ensaio-erro ou mera intuição. Isso requer um nível adequado de conhecimento técnico de todos os que lidam com estes instrumentos – especialmente em termos de estatística. 2. Em sua essência, o CEP trabalha com as variações de um processo. Por mais que esta abordagem seja crítica para uma avaliação precisa do processo e por mais
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utilidade que tenha esta informação, o CEP está restrito a áreas bem determinadas do processo produtivo. 3. Há muitas decisões técnicas que envolvem a implantação do CEP. Por exemplo: que tipo de controle deve ser utilizado, como determinar o gráfico de controle mais adequado para cada situação, como desenvolver projetos de experimentos que envolvem controles feitos por atributos ou por variáveis, que procedimentos adotar diante das amostras que fornecem dados para a execução do Controle Estatístico de Processo, como interpretar os modelos que compõem o Controle de Processos, como desenvolver estudos de capabilidade de processos ou que ações compõem a estruturação do controle de processos. Cada uma destas questões deve ser considerada com cuidado, pois decisões equivocadas podem comprometer irremediavelmente todo o processo de avaliação. 4. A implantação do CEP segue um roteiro bem definido, que envolve as atividades como definições quanto ao Projeto do Sistema de Controle, a listagem dos padrões da qualidade e de desvios e defeitos a eles associados, a organização dos dados, o cálculo dos parâmetros do modelo escolhido, a identificação da condição de controle (ou falta dele), a forma e natureza dos gráficos, a obtenção do diagnóstico do processo, a identificação de ações sugeridas pelos gráficos (se for o caso), a análise de casos críticos, a correção dos limites, a análise do gráfico com os limites corrigidos, a definição dos experimentos, a análise dos resultados em processos corrigidos, a análise da consistência do processo e toda a sistematização do controle. Conclui-se, assim, que o Controle Estatístico do Processo é um instrumento valioso, mas de utilização algo complexa e restrita aos níveis operacionais do processo produtivo. 2.10.2. Inspeção e amostragem
A Avaliação da Qualidade por Inspeção e Amostragem sempre foi considerada um conjunto de modelos, que, se corretamente implementados, são capazes de gerar uma análise precisa da qualidade dos produtos e, por extensão, dos processos que os geram. Além disso, sempre foi, também, um conjunto de procedimentos cujos resultados servem de base para decisões que afetam diretamente a atividade produtiva, como, por exemplo, quanto à determinação de quais ações corretivas e preventivas devem ser implementadas para garantir níveis aceitáveis da qualidade. Da mesma forma que o CEP, a Avaliação da Qualidade por Inspeção e Amostragem possui técnicas eficientes, desenvolvidas com bases teóricas consistentes e com grande emprego prático. Pelo interesse que despertou nos estudiosos do Controle Estatístico da Qualidade no século passado, dispõe-se, hoje, de vários mecanismos de avaliação que podem ser aplicados em diferentes situações. Essa variedade tanto amplia o conjunto de opções para quem deseja avaliar processos e produtos quanto cria restrições para seu uso, já que a maioria das técnicas de inspeção e amostragem tem características próprias de utilização e apresenta resultados úteis apenas em determinadas situações.
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Um conceito bem aceito de inspeção da qualidade é o que a define como o conjunto de dispositivos que busca identificar se uma peça, amostra ou lote atende determinadas especificações da qualidade. Assim, o resultado da inspeção determina o nível da qualidade de uma peça, sempre comparando-o com um padrão preestabelecido. Ao avaliar a qualidade de um produto, a inspeção desempenha sua função essencial: detectar defeitos. E, na verdade, cessa aí sua ação; o que se faz posteriormente (correção ou prevenção, por exemplo) já não integra o processo de inspeção. Por isso, é possível afirmar que a inspeção tem um papel único e bem definido: avaliar a qualidade de produtos. A partir do resultado desta inspeção, diversas ações podem ser acionadas, visando garantir a melhoria da qualidade do processo que originou o produto em questão. Uma grande preocupação que sempre tiveram os estudiosos da qualidade foi a de distinguir inspeção e controle da qualidade. De fato, se a inspeção se atém a um diagnóstico do produto, o controle da qualidade vai além, definindo também o que fazer a partir dos resultados da inspeção. Por isso, o controle da qualidade envolve maior quantidade de recursos, gera resultados mais amplos e significativos, além de possuir maior abrangência, já que envolve o processo de correção e, principalmente, prevenção de defeitos. A aplicação da inspeção a uma determinada peça conduz a dois resultados: rejeição ou retificação. No primeiro caso, a peça é descartada da linha de produção; no segundo, a inspeção determina que o defeito encontrado na peça seja corrigido. Para aplicar a inspeção a um lote de peças, recorre-se, no mais das vezes, aos procedimentos da amostragem. A ideia é simples: avalia-se a qualidade da amostra. Se for aceitável, o lote todo é aceito. Se a qualidade da amostra estiver em níveis inaceitáveis, o lote todo é rejeitado. O mesmo processo de retificação pode igualmente ser aplicado aqui: avalia-se a qualidade da amostra; se for aceitável, o lote todo é aceito; já se a qualidade da amostra estiver em níveis inaceitáveis, o lote todo é inspecionado, substituindo-se as peças defeituosas encontradas por peças perfeitas. Torna-se importante observar que amostra não significa simplesmente uma parte do lote. Amostra significa uma parte do lote, estruturada a partir de determinados critérios. Assim, a amostra é o resultado da aplicação destes critérios ao lote. Amostras assim obtidas são chamadas aleatórias e servem de base para a avaliação da qualidade baseada em mecanismos de inspeção. O objetivo da inspeção por amostragem é bem claro: reduzir custos de inspeção por avaliar uma quantidade menor de peças. Mas é fundamental garantir a segurança de seus resultados, já que o que se decide para a amostra vale para todo o lote. Por isso, a inspeção por amostragem requer cuidados e atenção que a tornam de realização mais difícil (é o caso, por exemplo, do problema da representatividade da amostra). Embora estes sejam os resultados essenciais de uma inspeção, cabe notar que ela possui variadas utilidades – é o caso da classificação de peças, por exemplo. O processo de inspeção desenvolve-se em etapas bem definidas, que envolvem a interpretação das especificações, a execução da avaliação e o registro das informações. A realização da inspeção depende de razões bem definidas. Por exemplo: o custo de
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execução da inspeção deve ser compatível com a importância da peça e com o próprio custo do produto insatisfatório – quanto maior esse custo, mais se justifica a execução da inspeção. Pode-se, também, deixar de realizar as inspeções se o histórico das peças foi considerado suficientemente confiável para tanto. Os modelos estatísticos de inspeção da qualidade aplicam-se, essencialmente, à construção e à avaliação de planos de amostragem. Um plano de amostragem é um esquema que relaciona os níveis de qualidade desejados para um determinado lote e os riscos de erro na decisão (aceitar lotes ruins e rejeitar lotes bons) com o tamanho das amostras a avaliar e os critérios de aceitação ou rejeição que serão aplicados às peças que compõem esta amostra. Um plano de amostragem classificado como bom plano é aquele que toma a decisão a respeito do lote a partir da amostra, de forma tal que o nível de qualidade observado nas amostras é aproximadamente o nível real de qualidade do lote. Para facilitar o uso de planos de amostragem, pode-se utilizar tabelas prontas, em sistemas de amostragem desenvolvidos como norma básica para utilização prática. No Brasil, por exemplo, estão definidas várias normas relativas ao desenvolvimento e à aplicação dos planos de amostragem por atributos e variáveis. A própria norma ISO 9000 é um exemplo deste tipo de procedimento. A base teórica sofisticada, a variedade de modelos e a diversidade de situações para aplicação prática mostram que, da mesma forma que o Controle Estatístico do Processo, a Avaliação da Qualidade por Inspeção e Amostragem é um instrumento que gera resultados úteis, possui praticidade de uso, é conveniente e valiosa, mas cria algumas dificuldades técnicas para quem vai usá-lo. Essas dificuldades ocorrem porque nem todos os usuários têm conhecimento adequado do suporte teórico dos modelos e nem sempre sabem selecionar critérios para escolher a ferramenta mais adequada a cada caso prático considerado. Em certo sentido, também a Avaliação da Qualidade por Inspeção e Amostragem está direcionada para produtos e para os níveis operacionais do processo produtivo que o geram. Vantagens dos métodos quantitativos e modelos estatísticos aplicados à qualidade UÊ A aplicação de métodos quantitativos, sobretudo aqueles com base estatística, criou o que se pode chamar de efetiva avaliação da qualidade. Com efeito, o uso de mecanismos subjetivos ou de práticas intuitivas não pode, de modo algum, ser considerado parte de uma avaliação séria da qualidade. Nunca se vai deixar de considerar o peso de certas avaliações feitas por pessoas com inegável qualificação técnica ou notável experiência prática como base, por exemplo, para a tomada de decisões gerenciais; mas, também, nunca se vai considerar que essas avaliações sejam suficientes para determinar o nível da qualidade de processos, produtos e mesmo serviços. Dessa forma, foi o uso dos métodos quantitativos que assegurou a existência de processos consistentes de avaliação da qualidade. UÊ Além de ter criado as formas básicas com as quais se desenvolve a avaliação da qualidade, o uso de métodos quantitativos teve reflexos em outras
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áreas da organização e da própria gestão da qualidade. E alterou até mesmo conceitos. É o caso, por exemplo, da visão que se tem hoje do controle da qualidade. Considera-se que controle da qualidade é a confrontação entre resultados obtidos (como decorrência da implementação de ações organizadas) com padrões predefinidos (objetivos a atingir). Essa confrontação requer que seja viabilizado um modelo de planejamento da qualidade, no qual estejam determinados os padrões que servem de referencial para o desempenho da organização, e também um modelo que avalie, em termos quantitativos, os resultados alcançados. Medir resultados é a única forma de confrontar o que foi planejado com o que foi produzido – para verificar, por exemplo, o alcance dos objetivos propostos. UÊ O uso de métodos quantitativos criou, também, uma nova concepção gerencial para o processo produtivo. Com efeito, em sua essência, o Controle Estatístico de Processos e os modelos de Avaliação da Qualidade por Inspeção e Amostragem não se limitam a criar um diagnóstico do passado, um levantamento do histórico ou uma simples massa de dados que gera uma fotografia detalhada do processo produtivo. Eles podem ser utilizados para avaliar a tendência do processo, ou seja, para onde se direciona toda a operação produtiva. A análise desta tendência cria as bases para ações preventivas, que se antecipam à ocorrência de problemas, danos, defeitos, erros etc. A análise da tendência do processo é, sem dúvida, o elemento de maior importância na avaliação da qualidade com o uso de instrumentos do Controle Estatístico da Qualidade. Em última análise, este estudo informa se o processo tende a permanecer sob controle ou se pode sair dele. UÊ Inúmeras outras vantagens poderiam ser listadas. Quase todas estão relacionadas com a forma relevante, conveniente, eficiente e prática de avaliar a qualidade introduzida por estes métodos. E de gerenciar o processo a partir deles. Desvantagens dos métodos quantitativos e modelos estatísticos aplicados à qualidade UÊ A rigor, não podem ser listadas desvantagens da aplicação de métodos quantitativos à avaliação da qualidade. Há, sim, talvez, duas armadilhas a evitar. A primeira diz respeito, curiosamente, a um dos pontos mais positivos dos métodos em questão, que é o rigor teórico que os caracteriza. De fato, os modelos estatísticos do Controle Estatístico de Processos e da Avaliação da Qualidade por Inspeção e Amostragem apresentam conteúdos teóricos sofisticados que lhes dão suporte, inacessíveis para a maioria dos operadores de processo, o que parece compreensível pela natureza relativamente complexa dos conceitos e das técnicas da estatística descritiva ou da inferência estatística. Para contornar esta dificuldade, foram criados dispositivos simples de aplicação, uma prática comum nas organizações. De fato, observa-se que a operação rotineira das empresas não dispensa (nem nunca dispensou) a exatidão teórica dos instrumentos que possuem algum grau de importância na gestão do processo produtivo – seja a forma como se extrai
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carvão do subsolo ou da superfície, o modo como se produz uma porta de madeira, ou ainda como se define a melhor forma de organizar o layout do ambiente de trabalho. Em todas estas situações, porém, sempre se busca tornar este rigor teórico transparente ao usuário, de forma que a implementação das ações técnicas envolvidas seja fácil, singela tanto quanto possível e operacionalmente interessante. E é nesta simplificação que reside o perigo: por não entender exatamente por que se deve coletar dados de tais ou tais formas; por que se deve organizar as informações desta maneira e não daquela; porque se deve respeitar os intervalos regulares para retirar amostras do processo e outras tantas normas e orientações, os operadores alteram as diretrizes de implementação das ações básicas dos modelos, adequando-os à sua conveniência. E, com isso, corrompem inteiramente os instrumentos de avaliação da qualidade, falsificando, deformando ou inutilizando seus resultados. Somente um monitoramento intenso no processo evita o surgimento deste problema – mas esse monitoramento faz com os mecanismos do gerenciamento do processo percam um pouco seu sentido, que é o de conferir, ao operador, responsabilidade por suas próprias ações. UÊ Decorrência desta armadilha: inúmeros erros cometidos ao longo da implementação de modelos estatísticos de avaliação da qualidade. Alguns exemplos são mostrados a seguir. 7DEHOD6LPSOLÀFDo}HV´IRUoDGDVµ Equívoco $FDSDELOLGDGHSRGHVHUREWLGDGHIRUPDLQWXLWLYD
Decorrência 2VYDORUHVGDFDSDELOLGDGHREWLGRVQmRUHÁHWHPD UHDOLGDGHGRSURFHVVR 3HTXHQDVDGDSWDo}HVSDUDVLPSOLÀFDUIyUPXODVRX )DOWDGHJDUDQWLDGHTXHRVUHVXOWDGRVREWLGRVVmR FiOFXORV YiOLGRV ,PSURYLVDo}HVSDUDDGHTXDUDDSOLFDomRGRPRGHOR )DOWDGHJDUDQWLDGHTXHRVUHVXOWDGRVREWLGRVVmR jVFRQYHQLrQFLDVGDHPSUHVDXVRGHDPRVWUDV YHUGDGHLURV VHPSUHGRPHVPRWDPDQKRSDUDVHUYLUHPHPXP UHFLSLHQWHGLVSRQtYHOSRUH[HPSOR )DOWDGHSURFHGLPHQWRVRUJDQL]DGRVFRQWtQXRV )DOWDGHJDUDQWLDGHTXHRVUHVXOWDGRVREWLGRVVmR FRUUHWDPHQWHSODQHMDGRVSDUDDXWLOL]DomRGRV VLJQLÀFDWLYRV PRGHORV 5HGXomRGHDPRVWUDVSDUDDXPHQWDUDYHORFLGDGH )DOWDGHJDUDQWLDGHTXHRVUHVXOWDGRVREWLGRVVmR GDDQiOLVH FRUUHWRV 8VRGRVPRGHORVSDUDVHWHUXPGHPRQVWUDWLYRGR 2VPRGHORVJHUDPDSHQDVDo}HVGHFRUUHomR KLVWyULFRGRSURFHVVRVHPFRQVLGHUDUDDQiOLVHGH UHDJLQGRDVLWXDo}HVMiRFRUULGDV WHQGrQFLDV 5HXWLOL]DomRGHGDGRVHGHUHVXOWDGRVSDUDDPSOLDU )DOWDGHJDUDQWLDGHTXHRVUHVXOWDGRVREWLGRV DVLQIRUPDo}HVGLVSRQtYHLV WHQKDPHIHWLYDXWLOLGDGH 7RPDGDGHGHFLVmRVREUHXPDDPRVWUDTXDQGRVH 5HVXOWDGRVIDOVRV LQVSHFLRQRXDSHQDVPHWDGHGRWDPDQKRGDDPRVWUD SUHVFULWRQRPRGHOR 3URFHGLPHQWRVLQFRUUHWRVSDUDDUHWLUDGDGDV 5HVXOWDGRVLQFRUUHWRV DPRVWUDV6XEVWLWXLVHRPRGHORIRUPDOSURSRVWRSRU RXWURPDLV´VLPSOHVLQKRµ
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UÊ Uma segunda armadilha consiste na excessiva generalização dos resultados obtidos com a aplicação de gráficos de controle ou com planos de amostragem. Os modelos de Controle Estatístico de Processos, por exemplo, não podem mais ser acusados de possuir um isolamento evidente em relação ao contexto de todo o processo produtivo ou mesmo do gerenciamento da organização. Também não podem ser apontados como agentes de melhorias apenas pontuais. Mas deve-se observar, por exemplo, que são modelos que se esgotam. Veja-se o caso do CEP: é ilimitada a duração dos estudos baseados nestes modelos, ou seja, o estudo da capabilidade de processos é um procedimento finito. Se o processo estiver sob controle, não há mais o que fazer. Talvez substituir o modelo de controle por um sistema de auditoria. Se o processo não consegue ser posto sob controle ou se manter sob controle, a análise com o uso do CEP está encerrada, porque esses dispositivos não são capazes de por si mesmos alterar as operações do processo produtivo, e também não conseguem definir as melhores ações para corrigir os defeitos e erros que tornam o processo sem controle. Por fim, cabe observar que os resultados dos gráficos já começam a ser dissimulados, pelos níveis elevados de dispersão do processo. Deve-se observar também que as avaliações de processos e de lotes não podem ser usadas para avaliar todo o comportamento da organização. UÊ Decorrência desta armadilha: tomada de decisões (sobretudo táticas e estratégicas) equivocadas, já que tiveram por base informações locais que se pretendiam globais, ou seja, informações válidas para setores bem delimitados da organização foram consideradas como reais para toda a organização. Alguns exemplos são mostrados a seguir. 7DEHOD*HQHUDOL]Do}HV´IRUoDGDVµ Equívoco $QiOLVHGHHOHPHQWRVGHGHVHPSHQKRTXHRV PRGHORVQmRSRGHPDYDOLDUFRPRDVSHFWRV SHVVRDLVDVVRFLDGRVDRGHVHPSHQKRGRV RSHUDGRUHV 8WLOL]DomRGRVPRGHORVHPFRQWH[WRVHPTXH QmRSRGHPVHU~WHLVSRXFRVGDGRVGLVSRQtYHLV SRUH[HPSOR 6XEVWLWXLomRGHYDORUHVGHWHUPLQDGRVSHORV PRGHORVSRUYDORUHVLPSRVWRVDRSURFHVVR XVRGDVOLQKDVGRVJUiÀFRVGHFRQWUROHFRPR HVSHFLÀFDo}HVGHSURMHWRSRUH[HPSOR 8VRGHLQIRUPDo}HVDQWLJDVSDUDHYLWDURFXVWR GHFROHWDULQIRUPDo}HVUHFHQWHV $YDOLDomRVREUHSURFHVVRVFRPEDVHHP DPRVWUDVQmRUHSUHVHQWDWLYDVHVWUXWXUDGDVGH PRGRLQFRUUHWR
Decorrência 5HVXOWDGRVQmRUHOHYDQWHVRXQmRVLJQLÀFDWLYRV
5HVXOWDGRVQmRFRQÀiYHLVRXQmRVLJQLÀFDWLYRV
9LVmRWRWDOPHQWHHTXLYRFDGDGRSURFHVVR
5HVXOWDGRVIDOVRV 5HVXOWDGRVIDOVRVRX FRPSOHWDPHQWHVHPVHQWLGR
Capítulo 2 Equívoco 6XEVWLWXLomRGHXPWLSRGHWHVWHPDWHULDO RXGLVSRVLWLYRGHDQiOLVHQmRGLVSRQtYHOQR PRPHQWR SRURXWURTXHHVWi &RPRRSURFHVVRpPXLWRFRQKHFLGRVXDDQiOLVH pIHLWDDSHQDV´LQIRUPDOPHQWHµ 6XEVWLWXLomRGDDYDOLDomRTXDQWLWDWLYDGRORWH SHODVHQVLELOLGDGHGRRSHUDGRU 2EWHQomRGHJUDQGHTXDQWLGDGHGHLQIRUPDo}HV VHPTXHVHFODVVLÀTXHDLPSRUWkQFLDGHFDGD XPD$OJXPDVVmRHQWmRDOHDWRULDPHQWH HVFROKLGDVSDUDDQiOLVH ([FHVVRGHUHOHYkQFLDDWULEXtGDDFDXVDVH VLWXDo}HVTXHQmRVmRDVPDLVUHOHYDQWHVSDUDR SUREOHPD(PJHUDOLVWRVHGHYHDSUHIHUrQFLDV SHVVRDLVGHGHWHUPLQDGRVJHUHQWHV )DOWDGHFRQKHFLPHQWRHVWDWtVWLFR 7URFDGHGDGRVSDUDDREWHQomRGHQRYRV UHVXOWDGRVMiTXHRVDQWHULRUHVQmRDJUDGDUDP GHWHUPLQDGDVSHVVRDVHQYROYLGDVQRSURFHVVR
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5HVXOWDGRVIDOVRV
5HVXOWDGRVGXYLGRVRVQmRFRQÀiYHLV 5HVXOWDGRVGXYLGRVRVQmRFRQÀiYHLV $YDOLDo}HVLPSURYLVDGDVVRESUHVVmR2VUHVXOWDGRV WHQGHPDVHUFRQIXVRVRXQmRFRQÀiYHLV
5HVXOWDGRVIDOVRV
,QWHUSUHWDo}HVHTXLYRFDGDVFRQIXVDVRXLQFRPSOHWDV 5HVXOWDGRVIDOVRV
A rigor, os modelos quantitativos do Controle Estatístico de Processos e da Avaliação da Qualidade por Inspeção e Amostragem não possuem desvantagens. Possuem mais algumas restrições de uso. Estas duas restrições básicas – um contexto mais específico e o uso de suporte teórico sofisticado – motivaram o desenvolvimento de uma nova abordagem para a avaliação da qualidade, a que utiliza os Indicadores da Qualidade e da Produtividade.
2.11. Gestão da qualidade com base em indicadores De modo bastante amplo, pode-se definir um indicador da qualidade como uma informação bem-estruturada que avalia componentes importantes de produtos, serviços, métodos ou processos de produção. Note-se: informação bem-estruturada. Isso quer dizer que os indicadores não são definidos de qualquer maneira, mas, sim, são montados conforme uma composição lógica bem definida. Na definição dos indicadores há dois conjuntos de informações que devem ser observados: suas características básicas – duas são consideradas essenciais, sem as quais a definição de indicador perde o sentido – e os componentes que integram sua estrutura. Características essenciais de um indicador 1 Todo indicador é definido em bases quantitativas. Essa característica é tão relevante que praticamente fornece uma outra definição de indicador: indicador da qualidade é um mecanismo mensurável. Os indicadores, assim, são sempre expressos por números, ou seja, em valores expressos em uma escala contínua. O percentual de defeitos de uma máquina ao longo de um período, por exemplo,
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é um indicador. Já o nível de concentração de um treinando ao longo das aulas de um curso prático, não. 2
Todo indicador avalia, de forma direta ou não, o impacto do produto final sobre o consumidor. Pode, por exemplo, avaliar a satisfação que o uso de um produto gera no consumidor (medido pelo grau de fidelidade do consumidor diante de outras opções, por exemplo); ou o nível de interesse que o produto desperta (medido, por exemplo, pelo aumento de vendas); ou, ainda, o atendimento a desejos, gostos ou preferências (medido, por exemplo, pelo nível de vendas por regiões geográficas, faixas de idade, condição de renda etc.). E pode também avaliar o quanto as melhorias no processo produtivo são relevantes – sob o ponto de vista do consumidor – para a qualidade do produto final. É o caso – típico – de pequenas reduções de custo que implicam redução do preço final, ou de pequenos detalhes acrescidos na montagem do produto que facilitam seu uso.
Decorrências 1 Há sempre a necessidade de definir formas de medir a qualidade. Não se atribuem indicadores a visões subjetivas, posturas intuitivas ou referenciais vagos. 2
Todo indicador mede a avaliação da qualidade feita por quem consome o produto e não por quem o produz. As melhorias no processo produtivo tornam-se relevantes pelo impacto que puderem determinar no produto acabado, segundo a percepção de quem for usá-lo.
Características básicas de um indicador As características essenciais de um indicador, listadas anteriormente, podem ser vistas como pré-requisitos ou condições indispensáveis à estruturação de um indicador. Sem elas, não há como definir um indicador. Já as características básicas são propriedades desejáveis que um indicador deveria portar. O ideal é que se consiga reproduzir todas as dez características abaixo em um indicador. Isto, contudo, é pouco provável. Daí o esforço para que indicador contenha o maior número possível de características desejáveis. São características básicas de um indicador: Os indicadores devem ser precisamente definidos. 1. Os indicadores devem expressar a avaliação feita de forma simples. 2. Os indicadores expressam uma avaliação direta. 3. Os indicadores expressam uma avaliação atual. 4. Os indicadores devem ser bem compreendidos por todos. 5. Deve-se garantir a perfeita adequação do indicador à situação, ao contexto e à organização onde ele está sendo usado.
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6. A avaliação da qualidade com o uso de indicadores utiliza informações já disponíveis. 7. Os indicadores devem ser representativos. 8. Os indicadores devem ser representados por dispositivos de rápida visualização e compreensão quase instantânea, como imagens de histogramas ou outros gráficos de barras. 9. Embora avaliem produtos ou partes deles, os indicadores priorizam o processo que os gerou. Decorrências 1. Os indicadores não comportam mais de uma interpretação, sendo compreendidos de uma mesma maneira por todos. 2. Os indicadores devem expressar situações que são rapidamente entendidas. 3. Ainda que abrangentes em seu conjunto, os diversos indicadores, individualmente, expressam realidades pontuais bem delimitadas. 4. Os indicadores são avaliados em função do momento por que passa a organização. 5. Evita-se, a qualquer custo, sofisticação desnecessária na estruturação de um indicador. A linguagem empregada para defini-los deve ser a mais “universal” possível. 6. Os indicadores respeitam características específicas da situação sob estudo, não sendo possível aplicar à organização indicadores que não lhe são compatíveis. 7. Os indicadores mostram o que se tem na organização e não o que se gostaria de ter. Não são cartas de intenções, mas, sim, reflexos de uma situação real. 8. Ainda que determinados por amostras ou por partes de uma operação, os indicadores devem permitir que se entenda, exatamente, como se desenvolve o processo sob avaliação. Tanto as informações que servem de base para a determinação dos indicadores quanto seus resultados devem representar, da forma mais precisa possível, o contexto a que se refere o indicador. 9. Para garantir rapidez, eficiência e facilidade de análise, os indicadores usam imagens e dispositivos gráficos que permitam imediata visualização do que está sendo avaliado. 10. Os indicadores avaliam o processo produtivo pelos reflexos de suas ações no produto acabado. Componentes de um indicador A estrutura de um indicador compõe-se de três elementos: elemento, fator e medida.
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1. Elemento: Refere-se à grande área ao qual o indicador se aplica. Por área entenda-se setor físico da organização, operação, processo, atividade etc. Exemplo: desempenho de um equipamento sob certas condições de uso. 2. Fator: Definido o elemento, o fator avalia como se combinam componentes dentro dele. É usual que o fator contenha a palavra “por” no sentido de “em relação à”. Um elemento pode determinar vários fatores. Exemplo: valores médios de consumo de energia por equipamento por área da fábrica. 3. Medida: Refere-se à unidade mais adequada para medir cada fator. Ainda que originárias do sistema internacional de medidas, há variadas opções de unidades em função da natureza do fato. Exemplo: a distância entre corpos celestes é medida em anos-luz; a distância entre cidade, em quilômetros; a largura de um fio, em milímetros etc. Ou seja: as unidades são compatíveis com o objeto da medida. Note-se que a medida detalha o fator, assim como o fator desmembra o elemento. Aplicação do indicador A utilização prática de um indicador da qualidade depende de que sejam definidos quatro aspectos básicos: (1) objetivo; (2) justificativa; (3) ambiente e (4) padrão. O objetivo determina a finalidade do indicador, ou seja, o que o indicador está expressando em termos de avaliação da qualidade. Exemplo: avaliar os níveis de desempenho de um equipamento. Já a justificativa refere-se à relevância do indicador, ou seja, a razão pela qual o indicador deve ser considerado. Exemplo: verificar se os níveis atuais de desempenho de um equipamento justificam mantê-lo operando ou se é melhor adquirir um novo. Quanto aos ambientes, os indicadores podem se referir ao processo produtivo em si (indicadores de desempenho), reportando-se à avaliação da qualidade in-line. Podem, ainda, referir-se às atividades de suporte ao processo (indicadores de apoio), direcionando-se para a avaliação da qualidade off-line. Por fim, os indicadores podem enfatizar as relações da organização com o mercado (indicadores da qualidade propriamente ditos), investindo na avaliação da qualidade on-line. Note-se que cada ambiente tem características próprias e ferramentas específicas. Cada modelo de avaliação gera resultados com aplicabilidade restrita a determinados contextos e requer informações (insumos) bem caracterizadas. Isso enfatiza a importância de definir corretamente o tipo de ambiente ao qual o indicador será aplicado. Por fim, o padrão determina o resultado da avaliação dos valores expressos pelos indicadores. Esse resultado informa, por exemplo, se houve avanços no processo de redução de custos; progressos na eliminação de erros e se foi obtida melhoria efetiva no processo como um todo. O padrão reflete uma meta a ser alcançada; espera-se, assim, que os indicadores evidenciem se o processo sob avaliação está mais próximo da meta ou se a superou.
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O uso de indicadores criou uma nova concepção para a avaliação da qualidade, com reflexos notáveis no próprio processo de Gestão da Qualidade. De fato, observe-se que a avaliação é um processo que só é aplicável a funções, estruturas, mecanismos ou situações que sejam dinâmicas – já que a avaliação determina se houve progresso no desenvolvimento de suas ações. E exatamente porque busca detectar se ocorreram progressos – ou seja, melhorias segundo um determinado critério ou um certo referencial –, a avaliação só faz sentido se for aplicada para acompanhar a evolução desses elementos. Todas essas características são aplicáveis à Gestão da Qualidade. Afinal, se a Gestão da Qualidade investe tanto em melhoria, fica evidente a necessidade da execução da avaliação, tanto porque enfatiza a própria melhoria contínua quanto porque mostra como atingir tais melhorias: mediante um planejamento da qualidade, no qual o desenvolvimento e a aplicação só podem ser analisados num processo de avaliação. Fica claro, assim, que a concepção e a utilização prática dos indicadores permitiram tratar a avaliação da qualidade de modo amplo, ou seja, no contexto da Gestão da Qualidade e, por consequência, no da gestão da organização como um todo. Além disso, os indicadores determinaram um novo escopo para a própria avaliação da qualidade, mostrando que esta pode ser desenvolvida por meio de métodos objetivos, isto é, que possuam bases quantitativas. Os indicadores introduziram na Gestão da Qualidade outros conceitos interessantes e úteis. Um deles é o de “distância entre perfis”. De fato, a utilização prática dos indicadores mostra que eles propõem, desenvolvem, aplicam e determinam métodos de avaliação que apresentam uma característica bem definida, qual seja, a de comparar situações reais com os padrões a elas associados. O processo de comparação é feito pela análise da “distância entre perfis”, ou seja, da avaliação quantitativa de quanto uma dada situação está “próxima” ou “distante” de um dado referencial. O uso dos indicadores é particularmente útil para proceder a utilização do modelo da distância entre perfis em cinco elementos fundamentais da organização, quais sejam, (1) a avaliação da qualidade institucional, por meio da análise de políticas gerenciais, (2) a avaliação da qualidade do processo produtivo, (3) a avaliação da qualidade de produto e de serviços, (4) a avaliação das expectativas do mercado e dos níveis de atendimento obtidos e (5) a avaliação dos modelos de formação e qualificação da mão de obra. Para cada um destes elementos existem ações bem definidas. Por fim, projetos de avaliação da qualidade envolvendo indicadores costumam prever a estruturação de um programa integrado de melhorias, que garante que a interação das melhorias operadas em cada um dos cinco elementos citados seja responsável pela melhoria da organização como um todo. Vantagens dos métodos de gestão da qualidade baseada em indicadores UÊ A definição dos indicadores é um passo relevante na implantação de processos participativos de gestão. De fato, definir os indicadores relevantes implica levar em conta uma considerável gama de elementos, que dificilmente uma única pes-
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soa ou mesmo um grupo pequeno de pessoas poderia determinar com precisão. Usualmente, os indicadores tendem a mostrar prioridades que pessoas, setores ou áreas da organização possuem em relação a determinadas questões e, sobretudo, em termos de sua forma de atuação. Tem-se, assim, ao mesmo tempo, um processo gerencial da qualidade que reflete uma visão abrangente e busca contemplar os diferentes valores importantes na organização. UÊ Pela necessidade de que sejam definidos em bases quantitativas, os indicadores forçam as pessoas a pensar e agir de forma objetiva. Elementos subjetivos não são suficientes para definir um indicador. UÊ A utilização de indicadores, mais do que qualquer outra corrente da administração, agregou à gestão da qualidade a noção de melhoria, introduzindo a ideia de que alterações consistentes nos níveis da qualidade fornecem mecanismos sólidos para a consolidação da qualidade. A rigor, é simples a ideia de melhoria: trata-se de uma ação cujos resultados atendem de forma mais adequada a um dado objetivo. A melhoria, assim, é definida como sendo uma ação (ou um conjunto de ações) cujo resultado conduz à efetiva aproximação de um objetivo a atingir. Como é necessário “medir” esta aproximação, deve-se, antes, avaliar quantitativamente o resultado da alteração e o objetivo. Os indicadores, assim, são essenciais neste processo. UÊ Os indicadores também criaram um processo participativo no exercício da avaliação da qualidade. Com efeito, a determinação de quais indicadores devem ser utilizados para determinados processos de avaliação pressupõe que eles sejam definidos por todos os envolvidos no processo. Espera-se, assim, que ocorram variadas contribuições neste esforço de definir-se o que deve ser considerado e como deve ser avaliado. Este aspecto reforça a amplitude de alcance da avaliação da qualidade com o uso de indicadores e compromete os envolvidos no empenho pelas melhorias. Desvantagens dos métodos de gestão da qualidade baseada em indicadores UÊ Há quem veja no próprio processo participativo de definição dos indicadores uma restrição ao seu uso. Argumenta-se que como a definição dos indicadores depende de variadas pessoas e que nem todas têm o mesmo grau de conhecimento, compreensão e experiência de processo, algumas propostas de indicadores não fazem muito sentido ou não têm significativa relevância. Mas não são descartadas para não gerar “desmotivação”. Na melhor das hipóteses, este procedimento eleva custos; na pior, descaracteriza a avaliação da qualidade. UÊ Fica difícil definir um processo de avaliação da qualidade com base em indicadores se a organização não dispuser de uma política da qualidade bem definida e bem conhecida. Afinal, são as diretrizes contidas nessa política que direcio-
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narão a ênfase na avaliação da qualidade e, assim, na seleção dos indicadores a adotar. Isso em si não chega a ser um complicador: a exigência de uma política da qualidade bem definida tem inegáveis vantagens para a organização. Ocorre, contudo, que, se ela não for bem definida, influenciará de forma negativa na determinação dos indicadores – dando prioridade, por exemplo, a questões (e, consequentemente, a indicadores) que não possuem tanto impacto na Gestão da Qualidade. Talvez porque o uso de indicadores criou a necessidade do envolvimento das pessoas no processo de avaliação da qualidade e, por decorrência, na Gestão da Qualidade, quase ao mesmo tempo foram ainda mais enfatizados os mecanismos de envolvimento das pessoas no esforço pela qualidade.
2.12. Envolvimento das pessoas no esforço pela qualidade O esforço para criar e consolidar um efetivo envolvimento das pessoas no esforço de desenvolvimento e operação das organizações sempre existiu e sempre existirá. De fato, sempre se considerou que “o ser humano é um componente fundamental nas organizações. Sempre foi assim. Sempre será. O ser humano é o único recurso capaz de transformar as organizações. Sempre foi assim. Sempre será” (PALADINI, 2010). Se a importância da ação do chamado potencial humano das organizações nunca foi questionada ou posta em dúvida, o mesmo não se pode dizer em relação às formas de envolver as pessoas no esforço de melhoria. Essa preocupação em selecionar técnicas adequadas para tanto acabou gerando enorme diversidade de métodos, ferramentas e estratégias, e criando um novo problema para a gestão das organizações: como selecionar o procedimento mais adequado a cada caso. É compreensível que seja assim. Afinal, sempre se considerou que os recursos humanos têm características muito particulares. É sempre muito difícil avaliá-los; é sempre complicado compreendê-los; é sempre um notável desafio envolvê-los. É o recurso que exige mais investimentos, mais esforços e mais tempo para gerar resultados consistentes. É, enfim, o mais complexo dos recursos da organização. Caberia até mesmo a pergunta: e vale a pena tanto empenho? O ponto crucial é que, ao lado da complexidade que o cerca, os recursos humanos são aqueles que oferecem maiores e melhores retornos. Isso ocorre porque são capazes de gerar soluções criativas, de propor formas mais eficientes de desenvolver as atividades, de sugerir métodos de trabalho mais rápidos, baratos e eficazes, de prever situações particulares em processos e produtos, de interpretar tendências e criar ações preventivas, de se lançar em busca de novos objetivos e buscar superar novos desafios. Há quem diga que os recursos humanos são complicados e que envolvê-los em um processo de motivação ao trabalho, por exemplo, é uma tarefa quase impossível. Há quem diga o contrário: é sempre muito simples mover pessoas em uma determinada
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direção. É possível que ambos os comportamentos estejam equivocados: o ser humano é apenas um recurso com características próprias e que deve ser visto como tal. Mas uma coisa é certa: “Lidar com recursos humanos é o maior desafio gerencial, inclusive da Gestão da Qualidade.” O reconhecimento dessa complexidade determinou que o tratamento do processo de envolvimento das pessoas na busca da qualidade tivesse dimensões táticas e não operacionais. Ou seja: no nível da média gerência, com ferramentas e dispositivos de alcance amplo. Essa postura gerou novas estratégias, com uma visão ampliada desse envolvimento. Na prática, a essência dos processos de envolvimento de pessoas refere-se à determinação de dois conjuntos de interações: (1) as interações entre a organização e as pessoas e (2) as interações entre as pessoas. A estrutura que rege essas interações é construída na forma de relações estabelecidas entre a organização – via os níveis e as estruturas que a representam – e as pessoas e, simultaneamente, entre as próprias pessoas – via setores, áreas, departamentos, equipes; enfim, quaisquer agrupamentos (formais ou não) que compõem os diversos ambientes de trabalho. A concepção, o desenvolvimento, o gerenciamento e a avaliação desse conjunto de relações são, por excelência, formatados a partir de decisões táticas. Vários autores, aliás, quando tratam desta questão, ressaltam aspectos como o desempenho das equipes e seu impacto na qualidade (ASKINS, 2001; BOLTON, 2004) ou mesmo novas formas de estruturar tais equipes (GUTTMAN, 2004; HAYES et. al, 2010) e a importância delas para a Gestão da Qualidade (NORTON e SUSSMAN, 2009). Fica evidente, assim, que o processo de envolvimento – concebido sob forma de interações e relações – integra a dimensão tática da qualidade, ou seja, uma maneira específica de lidar com recursos humanos. Ainda que específica, trata-se de um conjunto de mecanismos que compõem uma visão ampla da questão. Para migrar da visão operacional para esta nova visão, ou seja, para construir a “transição tática”, pode-se definir algumas etapas bem caracterizadas, das quais decorrem um conjunto específico de ações, como se descreve a seguir. Etapa 1: direcionando as interações Todo o processo de envolvimento de pessoas começa com a definição do que se quer fazer. É a fase de fixação de objetivos, em que se busca direcionar todas as ações. Em certo sentido, é uma fase simples, que só depende de decisões (o que fazer). A prática tem ensinado que o sucesso desta fase depende dos objetivos fixados pelas organizações com os objetivos que as pessoas já possuem. Definido o que fazer, deve-se viabilizar as ações propostas. Atinge-se a fase dos meios, em que se determina com o que fazer. Em geral, essa fase também só depende de decisões, mas seu alcance está restrito por variáveis de peso considerável, como a limitação dos níveis de investimentos e as restrições próprias do avanço tecnológico. Quase simultaneamente, é necessário configurar os ambientes de trabalho, ou seja, decidir onde
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fazer. Uma preocupação inicial diz respeito ao ambiente físico em si. Também aqui só depende de decisões, que precisam respeitar as condicionantes naturais do processo – como a disponibilidade de área construída, por exemplo. Etapa 2: construindo as interações A primeira fase desta etapa diz respeito à definição das relações entre as pessoas e as organizações. Existem as relações formais, bem conhecidas, estruturadas em bases contratuais e legais. Ao mesmo tempo, existem exigências de parte a parte, como se pode prever nestes casos. As organizações exigem de seus funcionários o adequado desempenho de suas funções, que envolve características técnicas – como capacidade e competência – e pessoais – como determinação, entusiasmo e motivação. Requer, ainda, entendimento pleno e total adesão aos objetivos fixados, bem como adaptação efetiva às regras, diretrizes e políticas e normas de funcionamento da organização. Desta forma, consegue-se o resultado básico esperado: a contribuição eficiente, eficaz e ajustada à organização. As pessoas requerem que as organizações lhes viabilizem condições atuais de trabalho adequadas, retribuição condizente e boas perspectivas de crescimento pessoal e profissional. Isto inclui oportunidades e meios de formação, qualificação e atualização; meios e ambientes adequados ao desenvolvimento das atividades previstas; processos gerenciais favoráveis à motivação pessoal; objetivos claros, bem definidos, conhecidos e reconhecidamente legítimos; reconhecimento e retribuição compatíveis com as ações técnicas e com as responsabilidades confiadas a cada pessoa e uma visão de médio e longo prazos de desenvolvimento pessoal e profissional. Até por força da crescente ênfase ao trabalho em equipe, a gestão da qualidade privilegia a interação entre pessoas. Essa interação depende da estruturação das atividades dos setores, das áreas e dos grupos de trabalho. Definir de forma clara a organização dos grupos é função fundamental aqui, até para que sejam definidos os resultados esperados. O conjunto dessas interações determina o clima organizacional, resultado da consolidação das relações das organizações com as pessoas e das pessoas entre si. Essa fase já não depende apenas de decisões, pois envolve características intrínsecas às pessoas. Só para ficar em um exemplo: desavenças pessoais, geradas ou consolidadas fora do ambiente de trabalho podem ter crucial impacto no desenvolvimento de ações dentro da empresa. Nem sempre os gerentes têm como administrá-las – até porque podem não ter conhecimento delas. Mas deve-se observar que sempre existem mecanismos para amenizar estas disputas e desentendimentos. Ou, infelizmente, para acirrá-los. Etapa 3: formalizando as interações Os mecanismos que formalizam as interações compõem-se, em geral, de processos bem definidos e organizados de transmissão de informações. Esses mecanismos envolvem treinamentos, palestras, seminários, Encontros, mesas-redondas, enfim, to-
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dos os métodos formais de transmissão, divulgação, compartilhamento, discussão e até mesmo construção, elaboração e melhoria das informações, desenvolvidos de forma organizada, contínua, sistemática e adequados ao público-alvo a que se destinam as informações. Os resultados destes mecanismos devem garantir que as ações desenvolvidas pelas pessoas ocorram na forma mais adequada possível. Por isso, deseja-se aqui informar às pessoas como fazer. O que se espera, assim, é que as pessoas saibam fazer suas atividades. Como decorrência natural desta etapa, os investimentos nas pessoas devem determinar a contínua melhoria dos processos. Desde que a transferência de informações seja feita de forma organizada, fica claro que os resultados podem ser avaliados de forma objetiva. Esta avaliação deve mostrar que a formalização das interações determina o aumento da eficiência das operações desenvolvidas pelas pessoas. O crescimento dos níveis de eficiência é a forma visível pelas quais se manifestam as melhorias desta etapa. Etapa 4: consolidando interações As interações entre pessoas tornam-se mais sólidas se forem construídas em bases que ultrapassem meras trocas de informações, sobretudo as formais. Por mais bem definidos e organizados que se constituírem os intercâmbios deste tipo, existem mecanismos (às vezes, informais) que apresentam resultados mais eficientes e eficazes, com maior impacto sobre as ações das pessoas. Logo, os resultados desses mecanismos acabam por ser muito mais consolidados. Estes métodos invariavelmente envolvem a fixação de modelos práticos de conduta. A meta é definir os referenciais que norteiam as ações de pessoas, grupos e áreas. Dois modelos são particularmente notáveis. O primeiro envolve o exemplo institucional. Trata-se, aqui, das alterações estruturais. O exemplo fornecido pela instituição evidencia o grau de relevância que a administração associa às ações das pessoas. Esse exemplo, contudo, só pode ser viabilizado de um modo: com ações práticas, visíveis, concretas. A concessão de benefícios para os funcionários é um indício que sinaliza como a organização pretende reconhecer o trabalho prático. De forma concreta, quanto mais a visão de benefício viabilizado se aproxima daquilo que o próprio empregado considera um benefício real, mais a organização consolida o exemplo de que tem prioridade na relação com seus funcionários. O segundo modelo envolve o exemplo das pessoas. Principalmente daqueles que ostentam cargos de chefia – em especial, os gerentes. Trata-se, aqui, das chamadas posturas gerenciais. Esta é uma ação crítica de todo o processo, porque envolve alterações de comportamentos muitas vezes profundamente arraigados. O trabalho com a resistência à mudança, aqui, é crucial, de fundamental importância. Se alterar hábitos de operadores das linhas de produção já é difícil, calcule-se mudar padrões de posturas já consolidados por anos de experiência. Mas o exemplo do gerente pode ter impacto maior ainda do que exemplos institucionais. Até porque o gerente está mais próximo das pessoas. Um bom
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exemplo dessa nova postura gerencial é a criação, por parte dos gerentes, do hábito saudável de ouvir os outros. Uma coisa simples de fazer, mas difícil de aceitar para muitos dos nossos gerentes. Etapa 5: ampliando interações O aumento da abrangência das interações visa a direcionar o processo de envolvimento para além do processo produtivo. Em um primeiro momento, busca-se a integração de toda a organização. Ou seja: criam-se interações entre setores, áreas, departamentos etc. O objetivo aqui é minimizar o efeito de um teorema bem conhecido: a otimização das partes não implica a otimização do todo. A análise dos fornecedores é o primeiro ambiente fora da organização contemplado. Embora se tenha claro que todo processo produtivo começa na “casa do fornecedor”, interações criadas com os agentes produtores de matérias-primas mostram novas realidades e contextos diferentes daqueles aos quais as pessoas estão acostumadas. Esta nova visão costuma dar considerável contribuição à concepção que as pessoas têm de processos, dos métodos de trabalho e de produtos. Esta ação também se insere no aumento da eficiência do processo produtivo. A seguir, busca-se ampliar o horizonte das interações para integrar o mercado consumidor. A ideia fundamental aqui é de colocar as pessoas da organização em contato com aqueles que compram e usam os produtos – em última análise, feitos por “nós mesmos”. O comprometimento dos funcionários com os clientes da organização é um dos elementos mais fundamentais de todo o processo de envolvimento das pessoas no esforço pela qualidade. Com frequência, estas relações adquirem características estratégicas. De peso usualmente mais expressivo que as relações com o consumidor, a interação com concorrentes é o elemento fundamental da qualidade. Todo o conceito de qualidade é determinado, essencialmente, pela ação da concorrência. Sem dúvida, na prática, esta é a maior motivação para produzir qualidade. Nossa organização se guia por eles: as ações deles determinam nossas reações; a expectativa do que vão fazer impõe alterações de nosso planejamento; os preços que eles praticam requerem reduções dos nossos custos; o tempo para lançar novos produtos implica alterações de nossos prazos e compactação de nossos cronogramas. Enfim, é impossível gerenciar nossa organização sem considerar, monitorar, prever, avaliar o que fazem nossos concorrentes. Estes dois aspectos – consumidores e concorrentes – vão criar a transição do ambiente tático da gestão da qualidade para o ambiente estratégico. Etapa 6: internalizando interações Alterações nas organizações só se consolidam se estiverem inseridas na cultura das pessoas. Por cultura, entenda-se os valores e as crenças de uma sociedade. A produção da qualidade, em uma visão tática, assim, só se consolida se as pessoas que integram a organização transformarem a qualidade em um valor. Isso significa que elas entendem, aceitam
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e se comprometem com o esforço pela qualidade porque consideram que esse empenho vale a pena. Em outros termos: “internalizam” o conceito da qualidade. O mecanismo mais usual para a transformação da qualidade em valor é a motivação. A motivação significa mostrar às pessoas por que fazer e determina nelas o querer fazer. Ou seja, busca-se gerar motivos. É um processo essencialmente intrínseco às pessoas. Em geral, a motivação é conceituada como uma energia interna, ou seja, a razão pessoal que cada um tem para realizar uma ação. A característica gerencial crítica da motivação é que ela é intransferível, ou seja, não depende de decisões de quem quer motivar, sendo mais uma disposição intrínseca daquele a quem se dirige a estratégia motivacional. Por isso se diz que o verbo deve ser sempre reflexivo: ninguém motiva ninguém; a pessoas motivam-se. Evidentemente, há posturas gerenciais que favorecem a motivação; e há outras que dificultam esse processo. De forma geral, assim, motivar-se é conferir nova prioridade às ações usuais. A motivação é um dos mais antigos instrumentos de envolvimento das pessoas nas ações das organizações. Sua importância, na verdade, nunca foi contestada; o que mudou, ao longo do tempo, foi a forma de fazer as pessoas desenvolverem motivação para a qualidade. Parte como decorrência de e parte como ação paralela à motivação, observam-se na mão de obra posturas conscientes. Isso significa: ações concretas, visíveis, associadas a resultados bem caracterizados. O primeiro desses movimentos diz respeito à busca por maior qualificação. Por exemplo: o treinamento gerado por demanda (resposta a interesses manifestados) e não por oferta (decisão da organização), ou seja, criado para atender solicitações dos próprios operadores, e não por imposição das gerências. Outro movimento relevante neste contexto são ações coletivas geradas na base da organização. Por exemplo: a formação natural de equipes empenhadas na busca de soluções para os problemas da organização. Um outro sinal provém de ações espontâneas, não associadas a determinações ou busca de recompensas. Por exemplo: sugestões de melhorias já testadas e comprovadamente viáveis. Há muitas formas de se criar um ambiente adequado ao desenvolvimento destas etapas. A experiência prática tem mostrado, contudo, que o processo tático mais relevante para tanto é (e tem sido) o da reciprocidade. A aplicação do princípio da reciprocidade consiste no estabelecimento, com toda a clareza possível, do que cada parte (organização e pessoas) deve fazer e do que receberá em troca se forem atendidas as exigências estabelecidas. Ou seja: quais benefícios decorrem das decisões tomadas e das ações executadas. Trata-se de um método gerencial centrado essencialmente na negociação, em que organizações e pessoas definem o que esperam de cada parte em termos de ações, de resultados e de retribuição. Um aspecto crítico da reciprocidade está associado ao conceito de melhoria: para conferir benefícios e vantagens, a avaliação da qualidade considera os resultados alcançados a cada momento; contudo, atribui-se maior prioridade à evolução desses resultados, ou seja, de como se desenvolve o esforço pela busca contínua da melhoria. Para viabilizar o processo de reciprocidade, há alguns elementos críticos que devem ser estruturados na organização. Os principais deles são os seguintes:
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UÊ Construir, manter e ampliar adequados canais de comunicação entre a organização e as pessoas, e entre as próprias pessoas. UÊ Viabilizar a todos o amplo acesso à informação. UÊ Investir continuamente no desenvolvimento profissional das pessoas. UÊ Conferir retribuição justa. UÊ Transferir responsabilidades. UÊ Garantir a contínua geração de oportunidades iguais para todos. UÊ Manter sempre perspectivas de longo prazo. A reciprocidade é um processo gerencial recente e, por isso, enfrenta algumas dificuldades em sua operacionalização. De fato, temos dificuldades históricas em desenvolver negociações; há quem ache que negociar implica perda de autoridade; muitos vêem o emprego como um benefício e que, por isso mesmo, dispensa outras concessões; há quem entenda que a negociação aumenta custos, dificulta o processo gerencial, cria um fortalecimento exagerado do empregado mais forte ou mais fraco. Na prática, o que se nota é a falta de criatividade para propor benefícios, bem como a definição de meios para avaliar quantitativamente resultados para relacionar o benefício aos esforços para obtê-lo. Vantagens dos métodos de envolvimento das pessoas no esforço pela qualidade UÊ Os resultados históricos que o investimento nas pessoas geraram em termos de produção e consolidação da qualidade são bem conhecidos e dispensam maiores comentários. Diferentemente de resultados de outra natureza (como aqueles decorrentes de meras mudanças de rotina de trabalho ou da substituição de equipamentos), os que decorrem da ação das pessoas são consistentes, amplos, criativos e costumam gerar notáveis efeitos multiplicadores. Assim, embora o investimento seja elevado, o retorno é também muito significativo. Esse aspecto, por si só, tanto justifica o empenho em envolver pessoas no esforço pela qualidade quanto a necessidade de fazê-lo. Desvantagens dos métodos de envolvimento das pessoas no esforço pela qualidade UÊ Não há desvantagens neste esforço: há dificuldades. A principal delas, paradoxalmente, talvez seja o excesso de mecanismos, estratégias, métodos e forma de gerenciar pessoas. Se a falta de opções em uma decisão é um problema, o excesso de opções também o é, se não existir uma forma de classificá-las quantitativamente. E, em se tratando de pessoas, isso raramente é possível. UÊ Estratégias bem-sucedidas em um contexto podem falhar em outro ambiente. Métodos que geraram resultados atraentes em um momento podem se tornar inadequados rapidamente. Isto mostra que os processos gerenciais envolvendo pessoas dependem do ambiente e do momento. Ou seja: o sucesso do envolvimento das pessoas no esforço pela qualidade depende da cultura atual da organização. Entendê-la corretamente nem sempre é fácil.
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A abrangência dos conceitos de indicadores; a crescente complexidade das estratégias de envolvimento da mão de obra e, acima de tudo, o crescente nível de competitividade em que as organizações inseriram-se nos últimos anos criaram as condições adequadas para a concepção e a consolidação da dimensão estratégica da qualidade. Pode-se mesmo afirmar que esta dimensão é a consequência natural de todo este processo evolutivo.
2.13. A transição para a dimensão estratégica da qualidade A visão estratégica da qualidade pode ser conceituada, de forma um tanto simples – mas que não deixa de ser correta –, como a constatação de que a qualidade tem impacto decisivo na sobrevivência da organização. É evidente que esta sobrevivência depende de fatores externos à própria organização. Por isso, a dimensão estratégica da qualidade implica a priorização dos esforços de pessoas e setores para o pleno atendimento do ambiente onde a empresa se insere. Este ambiente vai além do mercado consumidor que hoje a organização alcança, incluindo a sociedade como um todo – de onde, em última análise, sairão potenciais consumidores que garantirão a sobrevivência da organização no futuro. A transição dos conceitos operacionais e táticos da qualidade para uma dimensão estratégica ocorreu ao longo de três momentos bem caracterizados. Em um primeiro momento, houve uma alteração na concepção do que deveria ser marketing e de como a qualidade estaria a ele relacionada. A rigor, esta etapa foi mais uma decisão de conveniência das organizações, que perceberam que tinham disponíveis novos instrumentos de relacionamento com o mercado. Já as duas etapas seguintes, que envolvem o conceito de marketing, não dependeram de decisões, mas foram, antes, decorrências dos ambientes de concorrência em que as organizações de uma hora para outra (pelo menos, no Brasil) se viram inseridas. Pode-se fazer uma rápida análise das características de cada etapa. 2.13.1. Momento 1: A alteração de visões e concepções
A década de 1990 deve ter sido no Brasil a década do marketing. De fato, foi nesse período que os investimentos em marketing e seus derivativos naturais – publicidade, por exemplo – receberam grande atenção por parte das empresas. A motivação para o uso do marketing era de simples compreensão: a consolidação da concorrência. O marketing, então, seria uma resposta natural à questão: como diferenciar-se dos demais? Em termos da visão estratégica da qualidade, assim, duas características marcaram essa fase: Característica 1: a utilização das estratégias de marketing Definido inicialmente a obter respostas para a pergunta “como desenvolver a arte de vender o que fabricamos?”, o marketing passou a ser visto como um conjunto de dispositivos que deveriam responder a outra pergunta, muito mais complexa: “o que fabricar para vender?” Em certo sentido, ambas as posturas são coerentes com o sentido
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original de marketing. De fato, originado na palavra market (mercado), marketing sempre foi entendido como o direcionamento das ações de produção para o consumo. Às vezes, contudo, a visão tradicional parecia dar mais ênfase ao produtor, que se empenhava para vender aquilo que – na sua concepção, para a sua conveniência e dentro de suas estratégias particulares – era disponibilizado ao mercado. Assim, encontrando compradores para seus produtos, a empresa considerava viabilizados seus esforços de marketing. O sucesso deste modelo de marketing era medido pelo nível das vendas. O mecanismo mais usualmente empregado aqui é o da publicidade. Não foi difícil constatar que produtos mais bem adequados ao consumidor tendem a vender mais. Daí que o marketing passou a lançar mão de outro mecanismo igualmente muito conhecido: a pesquisa de mercado. Em sua essência, a pesquisa de mercado visa a saber o que querem os consumidores, e passa a ser tão mais relevante quanto mais se deseja atingir um número maior deles. A pesquisa de mercado conferiu uma análise objetiva à ação da organização no mercado. Porque definiu tanto o porte dessa ação (por exemplo: quantos produtos do tipo 78 fabricar?) quanto seu direcionamento (por exemplo: quais regiões têm maiores índices de preferência por certo produto?) e suas características (por exemplo: quais cores utilizar no produto?). Além disso, tornou possível a avaliação de variáveis externas à própria organização, mas fundamentais para o planejamento da qualidade, como, por exemplo, dados do poder aquisitivo de consumidores em potencial, tendências de consumo para os próximos anos e, talvez a mais importante de todas, a ação da concorrência. De modo geral, assim, pode-se observar que o uso de estratégias de marketing foi a concretização de um claro redirecionamento das ações das organizações – movimento que já se vinha notando há algum tempo. Essa nova direção passa a considerar o mercado consumidor como elemento prioritário na definição das políticas gerenciais da organização. Assim, passa-se a considerar o ambiente externo à organização como elemento de decisão básico. Ele passa a ter maior importância na definição das grandes linhas de atuação da empresa – mais do que elementos típicos, como a história, a tradição, os hábitos ou a forma clássica de atuação da própria organização. Não mais interessa o que sabemos fazer, o que gostaríamos de fazer ou mesmo o que sempre fizemos. O que conta é o que o mercado deseja. Característica 2: a qualidade como estratégia de marketing Definida a direção das ações, parte-se para o passo seguinte: conferir a elas uma marca própria. Ou seja: quais estratégias devem ser usadas para atrair o consumidor? Surgem variadas propostas, todas baseadas no firme propósito de dar ao produto uma vida própria, específica, bem definida. As opções envolvem diferentes níveis de preço, apresentação e embalagem, canais de distribuição, detalhes de apresentação do produto, variedade de modelos, número de itens em cada peça etc. E o que segue determinando as escolhas a fazer? A busca permanente da crescente adequação do produto ao uso, a preocupação em adaptar cada produto a faixas bem caracterizadas de mercado. Ou seja: qualidade.
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A qualidade, assim, transforma-se em estratégia de marketing. Sob qualquer ângulo que se observe, todos os esforços se voltam para priorizar a figura do consumidor, para atender suas preferências, desejos, gostos, expectativas. Um maior ajuste do produto a determinada faixa de mercado passa a ser visto como um diferencial extremamente competitivo, que pode alterar o quadro de disputa pelos consumidores. Ambas as características parecem ter sido criadas por força de algumas constatações que a organização fez ao longo do tempo. O sucesso de ações que priorizam o consumidor reforça as decisões da organização. Até aqui, contudo, o processo todo se baseia neste aspecto: decisões. É quase como se a organização entendesse que investe em qualidade porque vê vantagens nesta postura. Mas poderia não fazê-lo. Sobreviveria do mesmo modo – embora, talvez, em outra situação e em outro contexto. Mas surgem alguns indícios de que investir em qualidade não seria apenas uma questão de decisão. 2.13.2. Momento 2: A qualidade sob pressão
As organizações brasileiras começaram a experimentar, no início dos anos 90, um processo relativamente novo: a tomada de decisão sob pressão do mercado. A maioria das empresas que já haviam vivenciado este processo eram aquelas envolvidas com exportação. Para estas, inclusive, durante muito tempo se dividiu o processo produtivo em duas áreas: a área de exportação e a área do mercado interno. Tudo o que de “primeira” havia na organização era direcionado para o mercado externo. A justificativa, dizia-se na época, é a grande necessidade de que países emergentes como o Brasil forrassem sua economia nacional com “moeda forte”. Visto de outro ângulo, o consumidor brasileiro era considerado um consumidor de “segunda classe”. É possível que a reserva de mercado, no plano interno, tenha sido uma das grandes razões para a consolidação desta divisão dos consumidores em duas classes – a de “cima” e a de “baixo”. Sem entrar muito em detalhes, isso foi observado com clareza na indústria da informática e na indústria automotiva. Os ventos que sopraram por aqui no início da década de 1990, contudo, mudaram o panorama: se em um primeiro momento apenas desalinharam os cabelos das pessoas, logo em seguida causaram uma revolução em suas cabeças. Pode-se listar quatro fatores fundamentais da transição para a fase da qualidade “sob pressão”: 1. O mundo experimentou, nessa época, o advento do chamado processo de “globalização”. Ao lado de maior inter-relacionamento entre culturas, povos e expressões, as atividades comerciais adquiriram novos contornos e novos contextos. Foi o fenômeno da abertura dos mercados, consolidado por alianças entre parceiros internacionais de grande porte. 2. No âmbito interno, o final dos anos 80 mostrou o recrudescimento da restrição ao poder de compra pela queda do poder aquisitivo das pessoas.
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3. Ampliou-se, com as redes eletrônicas, de forma fantástica, a facilidade de acesso à informação. 4. A abertura de mercados e as novas práticas comerciais determinaram considerável aumento da concorrência. Algumas decorrências desses fatores ficaram bem visíveis: 1. Pode-se ser contra ou a favor da globalização. Mas não há como deixar de admitir que ela é irreversível. Não se trata, assim, de discutir seus aspectos ideológicos – mas de adaptar-se ao ambiente por ela criado. Esta não chega a ser uma “decisão estratégica”. É, antes, uma “imposição estratégica”. 2. A diversificação de mercados ampliou a importância da adequação ao uso. E este conceito da qualidade ficou muito mais consistente. 3. Os mercados regionais também passaram a ter papel de destaque. E também passaram a evidenciar a necessidade de que sejam respeitadas peculiaridades locais como forma de marcar presença nos diversos ambientes que passaram a compor um mercado integrado. 4. A queda do poder de compra, ao mesmo tempo em que inibe compras em economia de escala, torna cada aquisição, individualmente, um investimento de grande porte. Com pouco dinheiro, as pessoas não deixam necessariamente de comprar. Passam a comprar menos, escolherem com muito mais critério e atenção. Enfim, transformam cada aquisição em um investimento. Nesse contexto, a qualidade adquire contornos estratégicos nítidos. 5. Tanto quanto a redução do poder aquisitivo, o acesso fácil à informação incrementa, de forma exponencial, o nível de exigência dos consumidores. Se o primeiro fator obriga cada consumidor a analisar o que está adquirindo com extremo cuidado, o segundo gera amplo poder de comparação, confronto e análise entre itens similares. E a Internet cria facilidades ainda maiores para essa checagem item a item, produto a produto, característica a característica. 6. E, por fim, a concorrência amplia opções. E transforma a busca pelo consumidor em uma guerra feroz. Nesse contexto, não há opção, não há decisão a tomar: ou a organização produz com qualidade ou a organização fecha. 2.13.3. Momento 3: Qualidade, a transição crítica
Não há nenhum elemento que tenha maior impacto sobre a decisão de produzir qualidade do que a concorrência. Essa constatação é histórica. De fato, considere-se um exemplo bem representativo do movimento pela qualidade na América Latina, qual seja, o conjunto de projetos desenvolvidos pela Organização dos Estados Americanos entre
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1988 e 1998 em 11 países de dois dos continentes americanos – central e sul. Em quais atores o movimento foi centrado? Cronologicamente, tem-se: 1. Governos 1.1. Proposta: conscientizar os governos dos diversos países a investir em qualidade em suas próprias ações e incentivar os setores industriais e de produção de serviços a fazer o mesmo. 1.2. Métodos: programas de treinamento e conscientização nos diversos níveis da máquina pública e nas empresas privadas. 1.3. Resultados: pouco significativos. 1.4. Razões principais: falta de envolvimento das pessoas envolvidas na alta administração destas organizações. 2. Empresários 2.1. Proposta: conscientizar os empresários e altos executivos das empresas a investir em qualidade em suas próprias ações e incentivar seus subordinados a fazer o mesmo. 2.2. Métodos: programas de treinamento e conscientização empresarial. 2.3. Resultados: pouco significativos. 2.4. Razões principais: falta de comprometimento da alta administração das empresas com a questão. falta de exemplo prático a ser repassado aos subordinados. 3. Funcionários 3.1. Proposta: conscientizar os empregados a introduzir qualidade em suas ações do dia a dia, e treiná-los para tal. 3.2. Métodos: programas de treinamento e conscientização dos níveis intermediários de administração e operadores em geral. 3.3. Resultados: pouco significativos. 3.4. Razões principais: falta de comprometimento do funcionário para com a qualidade. falta de compreensão da importância do programa. Falta de exemplo prático a ser repassado aos subordinados. 4. Consumidores em geral 4.1. Proposta: conscientizar os consumidores para exigir qualidade sempre que adquirirem um bem tangível ou serviço. 4.2. Métodos: programas de conscientização em larga escala, com intensa publicidade nos meios de comunicação mais acessíveis e diretos. 4.3. Resultados: alguns foram significativos.
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4.4. Razões principais: poucas empresas atuando em determinadas áreas, com consequente falta de oferta de produtos similares (ou seja, falta competitividade). O consumidor, embora exigente, fica sem meios de ver suas reivindicações atendidas. Nos três primeiros movimentos ficou claro que a qualidade não surge espontaneamente. No último, ficou claro que os consumidores não tinham muitas alternativas e acabavam se conformando (e acomodando-se) com a triste realidade de seus países. Ao mesmo tempo, fazendo-se uma análise do ambiente econômico (nacional ou regional), os diagnósticos evidenciavam que certos setores de alguns países tinham níveis de qualidade situados muito além da média nacional. Uma avaliação intrasetorial evidenciou que, nestes casos, algumas empresas apresentavam processos produtivos com baixos níveis de defeitos, métodos de trabalho com elevados índices de eficiência, além de produtos e de serviços associados a faixas de mercado consistentes e em proporções maiores que seus similares. Observou-se, então, que a maior parte destas organizações estava envolvida com ambientes de exportação (o que caracteriza sua presença em ambientes competitivos). Além disso, situações pontuais também apontavam na mesma direção. De fato, observou-se que as empresas que se destacavam em qualidade tinham algumas particularidades em comum, como, por exemplo: UÊ Tratava-se de organizações novas que estavam entrando em mercados dominados por empresas tradicionais, que historicamente dominavam o setor. UÊ Tratava-se de organizações que estavam iniciando sua atuação em uma área geográfica distante de sua sede, enfrentando, portanto, empresas locais, igualmente tradicionais. UÊ Tratava-se de organizações que lançavam produtos novos, que buscavam faixas próprias de mercado, dominadas, até então, por produtos clássicos. UÊ Tratava-se de organizações que investiam em novos ambientes tecnológicos, tentando diferenciar sua atuação pela capacidade de inovação. Em todos esses casos, ficou evidente, desde logo, que as organizações que lideravam seus mercados em termos de qualidade – dentro e fora de seus países – eram aquelas que estavam mergulhadas em ambientes competitivos. E a concorrência fazia a diferença. Ela era a fonte de motivação, o desafio a superar. Esta constatação seria confirmada mais tarde, sobejamente, com o processo de abertura dos mercados que quase todos os países emergentes se viram envolvidos (mais do que opção, esta situação acabou quase compulsoriamente consolidada). Ficam, então, evidenciadas as duas características dessa fase crítica: 1. A presença da concorrência não é opção da empresa. Ela existe, e pronto. Deve ser encarada e vencida, por uma questão de sobrevivência da própria organiza-
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ção. Tem-se, então, o reconhecimento da importância das ações estratégicas, entre as quais a qualidade se afigura como a mais relevante nesse contexto. 2. Como meio para viabilizar a visão estratégica da organização, ganha enorme ênfase o conjunto de conceitos e de métodos do Planejamento Estratégico. Entre a segunda metade dos anos 80 e o início da década seguinte, todas as grandes organizações brasileiras passaram por esse processo. O modelo de Planejamento Estratégico que ganhou solidez entre nós foi aquele que parte de um processo de formulação da identidade da própria organização (definindo-se, por exemplo, a missão da organização). A partir dessa análise ampla, o modelo passava a investir, simultaneamente, em uma avaliação interna (determinação de fragilidades e potencialidades da empresa, por exemplo) e em uma análise do ambiente externo onde a organização está inserida (identificação de ameaças, como a entrada de novos concorrentes, e de oportunidades, como a possibilidade de a empresa atender demandas específicas não supridas). Essas análises definem políticas e diretrizes; metas globais e setoriais; planos de ação e resultados esperados. Em última análise, esse modelo era fortemente ancorado nas concepções de “estratégia competitiva” de Porter (PORTER, 1986). Como se sabe, Porter propôs uma metodologia que viabiliza a análise da organização e de sua área de atuação, focando, principalmente, na concorrência (identificada ou não). Essa metodologia visa caracterizar com clareza a organização e, ao mesmo tempo, identificar as grandes forças estruturais básicas que determinam o ambiente competitivo onde a organização se insere (ameaça dos novos entrantes; o poder de barganha dos fornecedores; ameaça de produtos ou serviços substitutos; o poder de barganha dos compradores e a rivalidade entre os competidores já estabelecidos). Esta dupla análise permite identificar as estratégias a serem adotadas pela organização e os riscos a elas associados. Além de formular a concepção estratégica da organização, Porter desenvolveu propostas para viabilizá-la. Criou, assim, métodos para situações específicas (caso de empresas emergentes, maduras ou em processo de transição) e gerais (caso de companhias de atuação em vários ambientes). Desenvolveu indicações de posturas para momentos cruciais na vida das organizações – como no caso da expansão de capacidade ou na entrada em novos negócios. Considerou ambientes de integração vertical, excessiva concentração na oferta de insumos ou de disponibilidade de determinados produtos. Seu foco, contudo, sempre foi o mesmo: a análise estratégica aplicada à organização e a seus concorrentes. Daí a natural aplicação dos conceitos de Porter à concepção estratégica da qualidade, que se consolidou exatamente quando se solidificava o emprego do planejamento estratégico das organizações. Esta talvez tenha sido, por excelência, a transição crítica para a dimensão estratégica da qualidade: a compreensão de que obter meios para enfrentar a concorrência é atividade-chave para a sobrevivência da organização. E, é claro, definir que meios são esses.
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2.14. A concepção estratégica da qualidade A noção da qualidade, em termos estratégicos, é definida a partir de alguns pressupostos básicos, que podem ser resumidos como segue: UÊ Um novo conceito: A gestão estratégica da organização é a gestão que trata dos meios de garantir a sua sobrevivência. UÊ Uma nova visão: A qualidade desempenha um papel fundamental na sobrevivência das organizações, possuindo, assim, uma dimensão estratégica bem caracterizada. UÊ Um novo conjunto de diretrizes: A dimensão estratégica da qualidade criou novas formas de atuação das organizações que, por sua vez, alteraram suas normas usuais de operação. UÊ Um novo conjunto de métodos: A dimensão estratégica da qualidade requer métodos próprios, muito diversos daqueles com os quais a organização estava acostumada a utilizar. O conceito estratégico, assim, dá origem a três novos componentes. E são estes três aspectos – visão, princípios e métodos – que determinam a dimensão estratégica da qualidade. Eles serão discutidos a seguir. 2.14.1. A visão abrangente da qualidade
A abordagem básica para a definição da qualidade enfatiza o pleno atendimento às necessidades, aos desejos, às expectativas e às preferências do consumidor. Este direcionamento tem sido constante nas diversas definições da qualidade. Ocorre, contudo, que este conceito abrange múltiplos itens, que incluem preço, características de operação, padrões de eficiência, processo de fabricação, logística de distribuição e acesso ao produto, marca etc. Dependendo do produto e da natureza do consumo, alguns itens serão mais e outros menos relevantes; alguns itens são chaves e de importância crítica para o produto; alguns itens, ainda que não sejam essenciais, são decisivos na hora da compra. Esta avaliação já cria as bases para uma visão abrangente da qualidade no que se poderia chamar de componente “espacial” do conceito: a qualidade envolve muitos aspectos simultaneamente, ou seja, uma multiplicidade de itens. A multiplicidade, ou seja, a qualidade baseada em múltiplos atributos de bens e serviços, tem características estratégicas para os produtos que já estão no mercado, diferenciando-os entre si. A meta da multiplicidade é simples: garantir a fidelidade hoje, ou seja, garantir a fidelidade de quem já é consumidor do produto. Os modelos de gestão associados à multiplicidade de itens visam a direcionar os esforços de produção para o atendimento “total” do consumidor, considerando os variados (múltiplos) itens que ele considera relevantes.
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Ao mesmo tempo, deve-se observar que a qualidade sofre alterações conceituais ao longo do tempo, até porque variam as posturas, as necessidades, os gostos, as preferências e as expectativas do consumidor. A qualidade, assim, passa por um processo evolutivo. Esta seria a componente “temporal” do conceito. Definida como evolução, o potencial estratégico da qualidade passa ser outro: ele visa a transformar em consumidores pessoas que hoje ainda não o são. Essa visão estratégica, portanto, determina que a organização se coloque sempre à frente do mercado, criando produtos inovadores. Este conceito determina, ainda, uma postura estratégica bem caracterizada: investir em um processo de monitoramento constante do ambiente externo da organização (consumidores, concorrentes e sociedade como um todo), visando a detectar possíveis alterações de valores, comportamentos e hábitos, de forma a definir meios de atendê-las continuamente e melhor. O conceito de evolução migra, de imediato, para o de melhoria contínua, que compromete a organização a envolver-se em um processo de busca por níveis crescentes de eficiência e de eficácia. A multiplicidade e a evolução são os desdobramentos naturais de conceitos fundamentais da qualidade, como os seguintes: UÊ “Qualidade é a condição necessária de aptidão para o fim a que se destina” (European Organization for Quality Control, 1972). UÊ “Qualidade é adequação ao uso” (Juran & Gryna, 1991). UÊ “Qualidade é o grau de ajuste do produto à demanda que pretende satisfazer” (Jenkins, 1971). Nesses conceitos, há várias indicações de ações estratégicas da qualidade: 1. Direcionamento das ações da organização para atender e até superar as expectativas do mercado consumidor. 2. Determinação do que sejam as condições de uso de um produto para que o consumidor o considere adequado para tal. 3. Ênfase na análise ampla do produto, pois tudo o que puder contribuir para o aumento da adequação ao uso é relevante. 4. Diversidade de itens em produtos e processos conforme os múltiplos usos do produto. 5. Juízo de valor para o produto: é relevante para o produto o que for relevante para o consumidor. 6. Utilização de bases quantitativas (“grau”) para avaliar o produto. Analisada em sua forma mais ampla, a qualidade como adequação ao uso atende a ambos os aspectos – evolução e multiplicidade. Assim, enquanto esse conceito define um objetivo básico da Gestão Estratégica da Qualidade, determina também um conjunto de métodos para alcançá-lo. O desdobramento natural da visão estratégica da qualidade como adequação ao uso é estender seu raio de atuação para além do ambiente de consu-
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mo, envolvendo a sociedade como um todo. Afinal, é de lá que sairão os consumidores do futuro. 2.14.2. Os princípios da dimensão estratégica da qualidade
A dimensão estratégica da qualidade parte do princípio básico de que a qualidade é um elemento crítico para a sobrevivência das organizações, sobretudo se considerarmos que esta sobrevivência depende de nossa postura diante da concorrência. Para defini-la de forma adequada, portanto, torna-se fundamental observar o ambiente externo à organização e as características intrínsecas à própria organização que garantam meios para que ela atue de modo seguro no ambiente competitivo em que se encontra. Esse ambiente tem características importantes: 1. Rápida mudança dos cenários. Com frequência, percebem-se mudanças somente quando já foram detectadas novas ações da concorrência ou alterações de postura dos consumidores. 2. Crescimento contínuo da concorrência. Sempre haverá a chance de que nossos concorrentes atuais ampliem suas ações ou de que entrem novos concorrentes na área. 3. Necessidade de planejamento para ambientes mais amplos. Dificilmente se conseguirá obter resultados satisfatórios em termos estratégicos se as ações forem restritas a partes bem definidas da organização. 4. Necessidade de planejamento com prazos mais longos. Mesmo aquelas empresas que atuam com bens não duráveis precisam projetar ações de mais longo prazo, já prevendo possíveis alterações nos seus cenários de atuação. 5. Envolvimento de maior número de pessoas, áreas e setores. Não há como garantir resultados abrangentes de outra forma. Como princípio geral, pode-se afirmar que a qualidade responde de forma adequada quando ela é encarada como uma estratégia básica para enfrentar estas situações – tanto em termos das mudanças quanto em termos do desenvolvimento de novas formas para incluir a todos no esforço para obter resultados melhores. É preciso, contudo, defini-la corretamente. Os princípios a seguir podem ser usados para tanto: 1. A qualidade se produz por um processo de evolução (alteração de valores de pessoas e organizações), e não por simples mecanismos de implantação prática. 2. O conceito da qualidade muda com o tempo. É fundamental não apenas monitorar essa mudança, mas colocar-se à frente dela. 3. A qualidade é gerada a partir de conceitos e filosofias, ou seja, da compreensão de que ela é um valor estratégico. Somente depois de esses valores serem definidos é que se selecionam as ferramentas, as técnicas e os métodos para produzi-la. 4. A qualidade depende de um processo planejado. Raramente ela surge naturalmente.
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5. A avaliação da qualidade é feita continuamente. 6. A qualidade deve ser gerenciada no dia a dia, sempre tendo em vista o planejamento global da organização. 7. A qualidade deve ter objetivos de longo prazo, ancorados em metas de médio prazo e em resultados práticos constantes de curto prazo. 8. A qualidade deve gerar benefícios de curto prazo. São eles que garantem a motivação para que sejam obtidos os resultados de longo prazo. 9. A qualidade gera benefícios estratégicos. Eles são obtidos a partir de ganhos operacionais e de recompensas táticas. 10. A qualidade deve proporcionar ganhos pessoais, de forma que possam se transformar em ganhos organizacionais. 11. A qualidade costuma custar caro. Mas seu retorno é altamente vantajoso. 12. A qualidade requer uma visão ampla em termos de tempo e de espaço. 13. A qualidade requer contribuições de todas as partes da organização, sejam elas críticas ou não. A qualidade requer uma visão técnica. Não é assunto para amadores. 14. A qualidade exige uma visão de conjunto. 15. A qualidade se baseia mais na experiência prática do que na teoria. 16. A qualidade dispensa abordagens indutivas e se ampara na descrição de experiências – sejam elas bem ou malsucedidas. 17. Qualidade é uma questão de cultura. Ou seja: será alcançada se as pessoas entenderem que ela é um valor estratégico. Interessante como a questão da cultura tem sido evidenciada nos programas de produção e avaliação da qualidade e como deve se manter como prioridade (ver, por exemplo, KEMENADE, 2010; KUKOR, 2010; e PIETENPOL, 2010, só para ficar em alguns exemplos recentes). Talvez seja possível resumir esses princípios de uma forma mais simples: a qualidade é o exercício do óbvio. Pena que esse óbvio anda um tanto esquecido. 2.14.3. Os métodos da dimensão estratégica da qualidade
São muitos os métodos que podem ser utilizados para viabilizar a concepção estratégica da qualidade. É possível que o mais relevante deles seja o da diferenciabilidade. A ideia aqui é simples: criar um processo de caracterização de bens e serviços que os tornem diferenciados em relação aos seus concorrentes, individualizando a organização. O objetivo da estratégia é bem claro: isolar a organização e seus produtos do grupo de concorrentes, separando-os do conjunto de produtos que compõem a oferta como um todo.
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Produtos que se distinguem têm um perfil de fidelidade claramente consolidado e, por isso, a diferenciação é, sem dúvida, um mecanismo de notáveis atributos estratégicos. A diferenciação, como método da gestão estratégica da qualidade, pode incluir uma diversidade de ações que dependem, fundamentalmente, do modelo de caracterização que a organização pretende conquistar. Alguns desses modelos são listados a seguir. Cada um deles permite que se visualize uma estratégia de atuação da organização bem definida. 1. Adequação ao uso. O modelo mais clássico de diferenciação é o que visa caracterizar a organização como produtora de bens e de serviços que determinam o máximo ajuste à demanda que pretendem satisfazer. A avaliação constante dessa adequação faz parte dessa estratégia, que se consolida com a contínua melhoria de bens e serviços oferecidos. Aqui, parte-se do pressuposto de que aquilo que realmente faz com o que consumidor adquira um produto é o fato de esse produto atender a suas necessidades, satisfazer a suas expectativas ou parecer de uso conveniente. Em sua essência, esse modelo focaliza o consumidor como fonte de toda a avaliação sobre a qualidade de um produto, que depende, estritamente, do grau com que bens e serviços atendem o consumidor. 2. Relação direta entre as áreas produtivas da organização e os setores consumidores. Aqui, a meta é criar um processo de comunicação direta que possa determinar rápidas realimentações dos produtos disponibilizados, em termos de sua aceitação por faixas específicas de mercado. 3. Diferenciação entre clientes e consumidores. Tecnicamente, consumidores são todos aqueles que consomem nossos produtos (os passageiros que viajam de um trem, por exemplo). Já clientes são todos aqueles que sofrem o impacto do uso de nossos produtos (as pessoas que moram próximas à linha férrea, por exemplo). Os consumidores, assim, são os que utilizam nosso produto hoje; os clientes poderão vir a consumi-los amanhã. Para se manter hoje, a organização depende dos consumidores; para crescer e consolidar-se, precisa dos clientes, que garantirão o seu futuro. O impacto estratégico do conceito de cliente refere-se, assim, ao futuro da organização. De fato, a organização hoje depende de seus consumidores para viver, mas depende de clientes para sobreviver. Os consumidores formam a faixa de mercado que a organização atende; os clientes compõem o restante da sociedade. Torna-se fácil, a partir deste raciocínio, generalizar a ideia de que a qualidade tem impacto na sociedade como um todo. 4. Atenção ao ambiente global. Como o grupo de consumidores constitui apenas parte da sociedade, e a meta de toda organização é ampliar seu mercado, a estratégia aqui é passar a considerar o ambiente global onde se inserem ambos – produtores e consumidores.
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5. Qualidade globalizada. Definido o modelo de adequação ao uso e ampliando-o para além do mercado consumidor, passa-se a observar o impacto de bens e serviços da organização na sociedade como um todo. Como não se sabe ao certo quais os “limites” desta sociedade, cria-se a noção de “qualidade globalizada”, onde se busca atingir os chamados mercados sem fronteiras. É uma estratégia complexa, que requer consideráveis noções de cultura local, já que não se pode pensar na possibilidade de lançar produtos em escala mundial com frequência. 6. Multiplicidade de itens. Esta estratégia refere-se a produtos que já estão no mercado e visa a garantir a fidelidade de consumidores a bens e serviços. Como se tratam de produtos já disponíveis no mercado, a meta é garantir competitividade neste momento, nas condições atuais. Esse modelo busca atender ao maior número de variáveis que um consumidor tende a considerar quando decide adquirir um produto ou utilizar um serviço. 7. Evolução. Aqui, a meta é o crescimento da organização, buscando ampliar mercados ao longo do tempo. A estratégia baseia-se no desenvolvimento de bens e serviços que superem as atuais expectativas do mercado. Em sua forma mais ”estratégica”, este modelo busca fazer com que a organização “imponha” novos padrões de consumo, criando novos hábitos, novas necessidades e novos desejos nos consumidores. 8. Antecipação das mudanças. Como desdobramento natural da definição da qualidade enquanto evolução, esta estratégia visa a garantir que a organização tome suas decisões à frente das alterações que, porventura, o mercado possa vir a sofrer. É evidente que a velocidade das alterações de cenários só tende a aumentar. Além disso, terão alcance cada vez maior, já que todas as organizações sofrem os reflexos de grandes (ou pequenas) revoluções que hoje ocorrem em qualquer canto do planeta. Esta estratégia obriga as organizações a disporem de meios para agilizar sua compreensão de mundo: as que perceberem primeiro, e com maior clareza, os impactos que o tempo e o espaço produzem em seus próprios negócios e que souberem selecionar e implantar ações para atuar nos novos cenários (antecipação de mudanças) verão aumentadas as suas probabilidades de sobrevivência. 9. Aceitação crescente de bens e serviços. Esta estratégia privilegia a forma costumeira pela qual os consumidores selecionam o que desejam adquirir: as características que ele vê no produto em si ou o que ele observa na prestação do serviço. Estas características são chaves na avaliação que o consumidor faz do produto. A estratégia aqui associada contempla, ainda, a determinação de meios para quantificar as características de bens e serviços, criando um modelo de avaliação da qualidade baseado em padrões objetivos. 10. Confiança no processo de produção. O processo produtivo pode transformar-se em variável estratégica da organização se o consumidor deposita total confiança
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na forma como ele é desenvolvido. Este modelo pode determinar notáveis reduções de custo, já que não são inspecionados, nem controlados, os produtos que são entregues por fornecedores em quem confiamos, ou seja, fornecedores que tecnicamente são considerados credenciados ou certificados. Esta estratégia fixa-se no esforço para que o processo de produção tenha meios para que bens e serviços atendam as especificações básicas fixadas em projeto ou no próprio planejamento da produção. Dito de outra forma: a qualidade só não ficará comprometida se o processo de produção puder desenvolver um produto conforme suas especificações. Outras estratégias associadas a este modelo incluem a produção de itens isentos de defeitos, de erros, de falhas ou de defeitos; a adoção de mecanismos de normalização modelos e os investimentos em qualidade de conformação. 11. Atribuição de elevados níveis de valor ao produto. De forma mais simples, esta estratégia busca a diferenciação de bens e serviços pela atribuição do valor que o consumidor atribui a eles, ou seja, pelo grau de relevância que o consumidor entende que o produto possui. Claro que há diferentes tipos de valores, todos associados a diferentes estratégias: valor financeiro, valor em termos de praticidade, valor em termos de atender necessidades urgentes, valor afetivo ou sentimental, valor moral, valor intelectual etc. A viabilização prática desta estratégia pode ocorrer via redução de custos de produção (que implica impacto em preços), via publicidade, via definição de novas formas de conveniência do uso do produto, e assim por diante. 12. Confiança na imagem ou na marca. Esta é uma das mais relevantes estratégias de diferenciação e consiste em garantir a identificação do consumidor com a marca ou com a imagem da organização. Em última análise, trata-se de um modelo que busca associar o consumidor não apenas com este ou aquele produto, mas com a organização como um todo. O que se busca é um conceito de diferenciação que faz com que a qualidade percebida esteja na experiência anterior do consumidor com esta organização e não com um determinado produto em si. Ou seja: investe-se na estratégia de tornar a qualidade de bens e serviços inequivocamente reconhecida em função da marca, e não por características específicas deste bem ou daquele serviço. 13. Atenção ao meio ambiente. Agressões ao meio ambiente têm reflexos amplos e de grave repercussão no mercado, inviabilizando, por exemplo, a entrada de determinados produtos em certos mercados. Por outro lado, bens e serviços desenvolvidos em condições de preservação dos recursos naturais (insumos) possuem elevada aceitação em qualquer parte do mundo. A estratégia de atenção ao meio ambiente transcende ao processo produtivo, ampliando-se para a obtenção de matérias-primas e para o produto após seu uso, ao final de sua vida útil. Para
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determinadas faixas de mercado (como as pessoas mais jovens), a exigência da preservação ambiental é tida como variável crítica de consumo. 14. Ação social da organização. Usualmente, a ação social da organização é uma estratégia que visa a criar relações mais estreitas da organização com a comunidade na qual está inserida. Mas é claro que é uma ação que possui reflexos nas relações da empresa com o mercado consumidor e com clientes. A ação social, por exemplo, pode transformar clientes em consumidores, já que se sabe (via pesquisa de mercado) que muitos consumidores priorizam produtos de empresas que têm comprometimento social, e esses consumidores fazem questão de propagar tais ações quando adquirem produtos dessas organizações (influência sobre clientes). Note-se que ações sociais são investimentos diretos tanto na imagem da organização como na marca de seus produtos. 15. Minimização de perdas à sociedade. Este conceito de qualidade possui enorme impacto estratégico, sendo devido a Taguchi (Taguchi, 1990; Taguchi et al., 1990). A estratégia, aqui, é investir para que a organização tenha como objetivo básico o de minimizar quaisquer custos que possam advir da utilização do produto. As implicações desta postura começam quando se repassa, ao setor produtivo da organização, a mesma visão, os mesmos valores e a mesma percepção que a sociedade tem de bens e serviços – tanto em termos dos benefícios que eles trazem à sociedade, quanto dos transtornos que podem gerar. Como se nota, Taguchi opera uma visão de longo prazo, consistente e ampla. Sua análise considera como ambiente de atuação da organização todo o tecido social. Dela sairão tanto nossos consumidores mais imediatos quanto nossos consumidores no futuro. Ter compromisso com ela, assim, é uma forma de assegurar nosso futuro. A diferenciação, portanto, cria um espectro de atuação específica para cada organização. Quando considerada em termos do conjunto das organizações, este conceito evolui para outro igualmente relevante: o de equilíbrio. Essa noção parte do pressuposto segundo o qual a qualidade depende, essencialmente, do equilíbrio entre oferta e demanda. Ou seja: (1) o excesso de demanda faz com as organizações produzam qualquer coisa para vender – preste o que foi feito ou não; (2) o excesso de oferta pode levar as organizações a diferenciar-se por preço. No esforço para reduzir preços, podem minimizar qualquer tipo de custo e, assim, comprometer irremediavelmente a qualidade. Adequar a oferta à demanda é ação típica dos marcos regulatórios macroeconômicos. Claro que a oferta e a demanda são componentes de mercado e nem sempre se pode ter controle sobre elas. Mas tentar ajustá-las é um esforço de grande repercussão estratégica sobre o conjunto das organizações de um país, pelo impacto que este equilíbrio de forças (setor produtivo e mercado consumidor) possui na forma como as empresas atuam e, principalmente, na concepção que elas podem ter do que seja “qualidade”.
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Em última análise, este processo é determinado diretamente pelo nível de concorrência que existe no cenário de atuação das empresas. E mostra como, também no ambiente macroeconômico, a concorrência determina o padrão da qualidade de bens e serviços disponíveis em um país.
2.15. O impacto do conceito estratégico da qualidade para as pessoas O conceito estratégico da qualidade – até aqui discutido quase sempre em termos de organizações – pode perfeitamente ser aplicado às pessoas. Há pelo menos duas razões para tanto: 1. As pessoas podem facilmente ser vistas como organizações. Quando desenvolvem atividades autônomas, como prestadoras de serviços, por exemplo, esta identidade é facilmente percebida. Mas também quando realizam atividades sob algum vínculo empregatício, as pessoas muito se assemelham às organizações, já que também estão incluídas em um ambiente que relaciona produtores e consumidores de algum serviço. Aqui, como quando atuam autonomamente, desenvolvem diversas ações, criam variados produtos, atuam em diferentes frentes, interagem com muitas outras pessoas (físicas ou jurídicas), tomam decisões em diferentes cenários – enfim, produzem múltiplos resultados utilizados por distintos consumidores e clientes. 2. Os conceitos da qualidade aplicados às organizações podem – também facilmente – ser aplicados às pessoas. Parte porque há muita similaridade entre a ação institucional das organizações e a ação profissional das pessoas; parte porque os objetivos da qualidade que são definidos para as organizações podem também ser considerados objetivos da qualidade para as pessoas. Uma constatação básica que pode ser feita é a de que pessoas, como ocorre com as organizações, estão atuando hoje sob o fogo cerrado da concorrência. Isso é visível, por exemplo, na crescente qualificação dos profissionais de todas as áreas; nos constantes intercâmbios que eles mantêm com colegas do país e do exterior; na facilidade com que obtêm informações técnicas, de qualquer área; na agilidade para obter dados básicos que lhes permitam tomar decisões etc. Em um ambiente de extrema concorrência, a qualidade da ação profissional passa a ser um diferencial considerável. Nem sempre a competência técnica pode ser esse diferencial, já que uma multiplicidade de meios pode viabilizar o acesso a níveis de capacitação elevados. Fica, então, a questão: como garantir nosso espaço na área – e em lugar de destaque? Ou, em palavras mais simples: como sobreviver? A visão estratégica da qualidade fornece boas dicas para a resposta a esta complexa questão. Analisando o que foi discutido para as organizações, pode-se listar algumas destas dicas: 1. Ação multifuncional. Dica de sobrevivência: Garantir seu lugar na orquestra: Quem toca violão tem apenas um lugar na orquestra. Quem toca violão e flauta tem
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dois lugares na orquestra; quem toca violão, flauta e teclados tem três lugares na orquestra. Mas, cuidado: quem toca dez instrumentos pode não ter nenhum lugar na orquestra; o maestro pode achar que o sujeito não toca nada que preste... 2. Visão de marketing. Dica de sobrevivência: garantir sua imagem estratégica. Conquistar respeito do mercado depende muito do sucesso de decisões e ações. Consolidar esta posição implica fixar uma imagem de credibilidade. Em geral, ela advém da determinação de soluções práticas, simples, eficientes e eficazes. 3. Domínio de cena. Dica de sobrevivência: garantir o controle do cenário. Obter informações é fácil. Organizá-las de forma a compreender a mensagem que trazem já é algo mais complexo. Transformá-las em conhecimento é um desafio que poucos conseguem encarar com sucesso. Note-se, porém, que é este conhecimento que permite o domínio do cenário, vital para a sobrevivência de quem precisa impor posições. 4. Ação equilibrada. Dica de sobrevivência: garantir mercado para as ações. O equilíbrio entre a oferta e a demanda por ações profissionais qualificadas pode ser uma variável de difícil controle. Atuar em áreas de excessiva oferta é sempre um risco à sobrevivência de qualquer pessoa. Descobrir demandas não atendidas pode ser uma postura estratégica, se elas forem consistentes (e não apenas passageiras). 5. Criar demanda. Dica de sobrevivência: garantir posturas inovadoras que sejam capazes de criar demanda. Quem se adianta no plantio, colhe frutos primeiro. Se os frutos tiverem demanda, estará garantida a sobrevivência no mercado. A questão, assim, não é apenas sair na frente, mas propor mecanismos práticos de interesse do mercado. Embora o mercado ainda nem tenha percebido que terá interesse neles. 6. Ação particularizada. Dica de sobrevivência: garantir sua própria importância no processo. A ação particularizada se opõe à ação coletivizada. Essa última qualquer um desempenha, já que faz parte do conhecimento coletivo. Já a primeira revela ações individualizadas, bem caracterizadas, com a marca e o selo de quem as realizou bem visíveis. Em resumo: Visão estratégica da ação profissional. E aqui, não há uma dica mas, sim, uma regra de sobrevivência: não basta ser bom. Precisa ser o melhor. Porque, afinal, o que se busca não é apenas a sobrevivência hoje, mas também amanhã, depois de amanhã e sempre... E para isso, a fórmula é simples, derivada do conceito da qualidade como evolução: melhorar sempre. A melhoria contínua é a única forma de manter ações de longo prazo, de grande alcance e que gerem resultados consistentes. São estes os elementos básicos da ação profissional estratégica. É possível que se imponham alguns pré-requisitos e algumas características para que se possa construir uma visão estratégica da ação profissional. A listagem a seguir tanto pode ser vista como elementos de identificação da ação profissional estratégica como precondições para tal:
Capítulo 2
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1. Ênfase na qualidade de vida. 2. Prioridade às ações executadas segundo planejamentos bem definidos. 3. Desenvolvimento de uma postura organizada nas atividades pessoais e técnicas. 4. Relacionamento humano aberto à interatividade e ao trabalho em equipe. 5. Comprometimento social efetivo, com o desenvolvimento de ações pessoais relevantes para a comunidade onde está inserido o profissional. 6. Busca contínua pela informação e interesse pelos métodos de aprendizagem prática, como aqueles propostos por Munro e Rice-Munro (2004). 7. Capacidade de organização e compreensão das informações obtidas. 8. Agilidade para transformar as informações em conhecimento. 9. Tomada de decisões com base em conhecimento. 10. Construção de um modelo de intuição fortemente ancorado na experiência prática. 11. Melhoria contínua do nível de competência técnica. 12. Desenvolvimento de aptidões específicas como fator de diferenciação. 13. Substituição da excessiva especialização pela visão generalista de processos, métodos e resultados. 14. Prioridade à visão horizontal da organização em relação à visão meramente vertical. Uma última constatação: o que confere o grau de “estratégico” à produção e à avaliação da qualidade nas organizações é, em primeiro lugar, a visão que as próprias pessoas que as compõem têm da questão. Por isso, pode-se observar que o desenvolvimento da visão estratégica da qualidade nas pessoas é o primeiro passo para o desenvolvimento e a consolidação da visão estratégica da qualidade das próprias organizações.
2.16. Algumas questões práticas 1. Em termos práticos, qual a maior motivação para as organizações produzirem qualidade hoje? E para as pessoas? 2. Em termos práticos, qual a maior motivação para as pessoas produzirem qualidade hoje? 3. Como a qualidade pode transformar-se em um fator de liderança estratégica para as organizações? E para as pessoas? 4. Por que se confere hoje à qualidade importância mais estratégica do que tática ou operacional? E por que não foi assim no passado? 5. Em termos práticos, qual a maior contribuição da qualidade hoje para as organizações? E para as pessoas?
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6. Em termos práticos, o que determina o interesse pela qualidade hoje? 7. Qual a contribuição estratégica da componente “multiplicidade” no conceito da qualidade? 8. Qual a contribuição estratégica da componente “evolução” no conceito da qualidade? 9. Que estratégia utilizar para fidelizar o consumidor? 10. Que estratégia utilizar para agregar novos consumidores aos nossos produtos? 11. Quais as vantagens e quais as restrições de definir-se qualidade enquanto “controle”? 12. Quais as vantagens e quais as restrições de definir-se qualidade como o “desenvolvimento de estratégias e ferramentas de melhoria do processo produtivo”? 13. Qual a contribuição que os métodos quantitativos e os modelos estatísticos agregaram ao conceito atual da qualidade? 14. Por que a avaliação da qualidade baseada em indicadores criou um mecanismo de gestão interativa na produção da qualidade? 15. Que ação pode ser considerada efetivamente fundamental no esforço de envolvimento dos recursos humanos no esforço pela qualidade? Dê um exemplo prático de como ela opera. Por que este esforço se insere na perspectiva tática da qualidade? 16. Dê um exemplo em que fique evidente a utilidade prática de diferenciar clientes e consumidores. 17. É correto afirmar-se que a qualidade depende apenas de um movimento natural, ou seja, é suficiente a intuição para gerar qualidade? 18. Por que, em geral, a visão pontual (melhorias localizadas) não gera qualidade nas organizações? 19. Define-se, muitas vezes, qualidade como sendo o “equilíbrio” entre dois elementos. Quais são eles? Exemplifique a sua resposta. 20. O que significa, na prática, a chamada “cultura da qualidade”? Qual a sua importância estratégica deste conceito para a organização? 21. Quais as principais características da transição da dimensão operacional para a dimensão tática da qualidade? 22. Quais as principais características da transição da dimensão tática para a dimensão estratégica da qualidade? 23. Quais as principais características da transição da dimensão tática para a dimensão estratégica da qualidade? 24. Como o conceito da qualidade como dimensão estratégica migrou das organizações para as pessoas?
Capítulo 2
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25. De forma geral, por que a qualidade tem impacto sobre a ação das pessoas, chegando a provocar alteração em conceitos tão antigos como o de emprego? 26. Por que a visão estratégica da qualidade está associada a ações de longo prazo e amplo alcance?
2.17. Referências ANDERSON-COOK, Christine M.; LU, Lu; MORZINSKI, Jerome. Mixed Signals. Quality Progress, November, 2010. ASKINS, Nancy P. High Performance Teams: The Name of the Game Is Quality! Service Quality Conference, New Orleans, LA, v. 10, n. 0, September, 2001, p. 121-141. BECKFORD, John. Quality. A Critical Introduction. Third Edition. New York: Routledge Editions, 2010. BOLTON, Mike. Process Improvement: Get staff involved in quality initiatives. Quality Progress. February, 2004. p. 62-67. BOX, George; NARASIMHAN, Surendar. Rethinking Statistics for Quality Control. Quality Engineering. v. 22, n. 2. April/June, 2010. BROWNE, Ryan P. Assessment of a Measurement System Using Repeat Measurements of Failing Units. Quality Engineering. v. 22, n. 1. January/March, 2010. EUROPEAN ORGANIZATION FOR QUALITY CONTROL. Glossary of Terms Used in Quality Control. Rotterdam: EOQC, 1972. EVANS. J. R.; LINDSAY, W. M. Management for Quality and Performance Excellence. 7th Edition. Sidney: Thomson South-Western Publishing, 2008. GHEMAWAT, Pankaj. A estratégia e o cenário dos negócios. Textos e Casos. Bookman. Porto Alegre: Editora Bookman, 2000. GUTTMAN, H. Effective White-collar teams: the new quality imperative. Quality progress. June, 2004. HAMILTON, Marc; CARUSO, Bob. High Priority. Quality Progress. ASQ. Feb., 2010. HAYES, Bob E.; GOODDEN, Randall; ATKINSON, Ron; MURDOCK, Frank; SMITH, Don. Where to start. Quality Progress. April, 2010. JENKINS, G. M. Quality Control. Lancaster: UK. University of Lancaster, 1971. JURAN, J.; GRYNA, F. Controle da Qualidade Handbook. São Paulo: Makron Books. McGraw-Hill, 1991. v. 1 – Conceitos, Políticas e Filosofia da Qualidade. KEMENADE, Everard. Past is prologue (A history lesson on quality management’s evolution can lay a strong foundation for your current quality program). Quality Progress. ASQ. August, 2010. KLYATIS, Eugene. The Basic Concepts of Quality Improvement during Manufacture. Annual Quality Congress, Kansas City, MI, v. 57, n. 0, June, 2003, p. 163-167.
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Capítulo
3
Gestão da Qualidade Total e Modelos de Excelência em Desempenho Organizacional Paulo Augusto Cauchick Miguel
Sumário do capítulo 3.1. Conceito de gestão da qualidade e a evolução para a qualidade total; 3.2. O controle da qualidade total (TQC – Total Quality Control); 3.3. A variante voltada para a gestão: TQM – Gestão da Qualidade Total ou Total Quality Management; 3.4. Modelos de TQM; 3.5. A Transição da Qualidade Total para a excelência em desempenho; 3.6. Evolução dos modelos de excelência: o prêmio Deming e o Malcolm Baldrige; 3.7. O modelo de excelência brasileiro: o Prêmio Nacional da Qualidade (PNQ); 3.8. Modelos de excelência no mundo; 3.9. Estudo de caso; 3.10. Exercícios e questões para análise; 3.11. Referências.
Figura 3.1 – Modelo geral de gestão da qualidade.
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Este capítulo objetiva retomar as definições relativas à qualidade e ao seu gerenciamento na organização (apresentadas no Capítulo 1), para discutir o conceito e a evolução da qualidade total, iniciando com a Controle da Qualidade Total (TQC – Total Quality Control), passando pela Gestão da Qualidade Total (TQM – Total Quality Management), chegando nos modelos de excelência em desempenho organizacional estabelecidos pelos prêmios nacionais da qualidade.
3.1. Conceito de gestão da qualidade e a evolução para a qualidade total Embora seja possível ter vários enfoques relacionados à qualidade (ver Tabela 1.2), seu conceito necessita ser trazido para o âmbito organizacional, ou seja, precisa ser “operacionalizado” na organização, seja esta de cunho industrial ou de prestação de serviços. A partir das definições da Tabela 1.2, surge a necessidade de gerenciar o conjunto de atividades relativas à qualidade, de modo que atenda qualquer que seja o enfoque, utilizando-se então do conceito de Gestão da Qualidade, definido no Capítulo. Retomando essa definição, cabe acrescentar que, desde o desenvolvimento da norma ABNT NBR ISO 8402:1994,1 a Gestão da Qualidade consiste no conjunto de atividades coordenadas para dirigir e controlar uma organização com relação à qualidade, englobando o planejamento, o controle, a garantia e a melhoria da qualidade. A Figura 3.2 ilustra a relação entre a definição da qualidade estabelecida pela ISO 9000:2008, seguido pela necessidade de trazer essa definição para a operação organizacional, por meio da gestão da qualidade, que, por sua vez, se subdivide em planejamento, controle, garantia, e melhoria da qualidade, cujas definições são também apresentadas na referida figura. Cabe mencionar que, na verdade, esses quatro últimos conceitos correspondem a um conjunto de atividades presentes na organização, ou seja, correspondem à função qualidade e, não necessariamente, são estabelecidos como áreas funcionais da empresa. É importante também notar que as atividades de melhoria da qualidade podem estar presentes nas outras três, ou seja, pode-se ter melhoria da qualidade no planejamento, no controle e na garantia da qualidade. Por essa razão, abrange as outras (ilustrado pela linha pontilhada na figura).
1
Uma das normas do conjunto da série ISO 9000, na versão de 1994.
Capítulo 3
| Gestão da Qualidade Total e Modelos de Excelência em Desempenho Organizacional
Figura 3.2 – Interrelação entre o conceito de qualidade, Gestão da Qualidade e os elementos que a compõem.2
A partir desse conceito da gestão da qualidade, e das interrelações mostradas na Figura 3.2, a questão que surge é o que vem a ser então a “qualidade total”. De acordo com a ISO 8402: 1994, significa o “modo de gestão de uma organização, centrado na qualidade, baseado na participação de todos os seus membros, visando ao sucesso a longo prazo, por meio da satisfação do cliente e dos benefícios para todos os membros da organização e sociedade”. Porém, para se chegar a esse conceito, estabelecido em uma norma internacional, foram necessários muitos anos e a proposição de diversos modelos por vários autores. Mesmo hoje, não existe um conceito que seja universal. A origem da qualidade total remonta à década de 1950, desencadeando o conceito do que viria a tornar-se duas correntes similares, porém diferenciadas, do TQC: a visão japonesa, conhecida como CWQC (Company-wide Quality Control – controle da Qualidade por Toda a Empresa ou Controle da Qualidade Amplo Empresarial) e a visão norte-americana do TQC, estabelecida principalmente por Armand Feigenbaum.3 Essas duas correntes de pensamento do TQC são discutidas a seguir.
3.2. O controle da qualidade total (TQC – Total Quality Control) Na visão japonesa do CWQC, as atividades relacionadas ao controle da qualidade no Japão podem ser divididas em quatro períodos distintos: de 1945 a 1955, de 1955 a 1965, de 1965 a 1975, e de 1975 a 1988. Pode-se ainda ser incluído um período a partir do final da década de 1980 até os dias de hoje. A Tabela 3.1 apresenta uma síntese desses períodos. 2 3
Elaborado pelo autor com base nas definições da NBR ISO 8402:1994 e NBR ISO 9000:2000. Sobre esse autor, ver Capítulo 1.
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Tabela 3.1: Evolução do controle da qualidade no Japão4 Período
DWpRVGLDVGHKRMH
Cenário Práticas de controle de qualidade -DSmRSyVJXHUUDUHYLWDOL]DomRGD %XVFDGHXPDLQVSHomRPDLV LQG~VWULDSURGXomRGHGRQtYHO HÀFLHQWHVHOHomRGHSURGXWRV DQWHVGDJXHUUD DFHLWiYHLVGRUHVWDQWHLQWURGXomR GRVSULQFtSLRVGRFRQWUROHGD TXDOLGDGHHDSUHQGL]DGRVREUHRV PpWRGRVHVWDWtVWLFRVGLVVHPLQDGRV SRU'HPLQJ (VIRUoRVGHUHFRQVWUXomRGD ,QVHULUTXDOLGDGHQRVSURFHVVRV LQG~VWULD SUHYHQomR LQWURGXomRGRV FtUFXORVGHFRQWUROHGDTXDOLGDGH &&4 HGHSURFHGLPHQWRVSDUD HVSHFLÀFDomRGDSURGXomRHSDGU}HV RSHUDFLRQDLVDOpPGHFDSDFLWDomR GRVIXQFLRQiULRV &UHVFLPHQWRLQGXVWULDOPRGHUDGR 0HOKRUDUDTXDOLGDGHHSURPRYHU GHVDFHOHUDGRSHODFULVHGRSHWUyOHR FRQVFLHQWL]DomRDPELHQWDOH QDGpFDGDGH FRQWULEXLUFRPUHVSRQVDELOLGDGH VRFLDOGHVHQYROYLPHQWRGHPpWRGRV SDUDUHGXomRGHFXVWRVVXUJLPHQWR GR&:4&SDUWHYLWDOGR74&H LQWURGXomRGRJHUHQFLDPHQWRSHODV GLUHWUL]HV &UHVFLPHQWRLQGXVWULDODFHQWXDGR 'LVVHPLQDomRGRVSULQFtSLRV FRPRDPHDoDSDUDDLQG~VWULD GR74&DGYLQGRVGDLQG~VWULD DPHULFDQDHHXURSHLDHPYiULRV PDQXIDWXUHLUDSDUDRXWURVVHWRUHV VHWRUHV LQGXVWULDLVGLVVHPLQDomRQRPXQGR SRUPHLRGHFRQIHUrQFLDVLQWURGXomR GHGLYHUVRVFXUVRVGHFDSDFLWDomR SHOD-86( GHVWDFDQGRVHFXUVRV EiVLFRVHDYDQoDGRVVREUH74&H RXWURVPpWRGRVHWpFQLFDV %XVFDGHPDLRUFRPSHWLWLYLGDGHHP $VQRUPDVLQWHUQDFLRQDLVGH IDFHGDVUHVSRVWDVGHRXWUDVQDo}HV JDUDQWLDGDTXDOLGDGHVpULH,62 SDUWLFXODUPHQWHRV(VWDGRV8QLGRV HQRUPDVVHWRULDLV7/ GRVHWRUGHWHOHFRPXQLFDo}HV46 H,6276GRVHJPHQWR DXWRPRWLYR LQWURGXomRGRSUrPLR MDSRQrVGDTXDOLGDGH-DSDQ4XDOLW\ $ZDUG HP
Um dos marcos no final da década de 1960 foi a introdução do CWQC no Japão, em 1968, tratado em algumas ocasiões como sinônimo do TQC. Isso pode ser considerado dessa forma se a comparação entre CWQC e TQC estiver no contexto japonês. Nesse contexto, um importante autor, Kaoru Ishikawa,5 considera o controle da qualidade 4
Os quatro primeiros períodos são baseados em Ozawa, M. Total Quality Control and Management – The Japanese Approach. Tóquio: JUSE Press, 1988. 5 Sobre esse autor ver Capítulo 1.
Capítulo 3
| Gestão da Qualidade Total e Modelos de Excelência em Desempenho Organizacional
como o desenvolvimento, o projeto, a produção, o marketing e os serviços com o melhor custo-benefício para que os clientes venham a adquirir os produtos com satisfação. O autor acrescenta que, para atingir esses objetivos, todas as partes de uma organização necessitam funcionar de forma conjunta. Em essência o TQC tem como requisitos o envolvimento de todas as áreas funcionais nas atividades direcionadas à obtenção da qualidade, além da melhoria da qualidade e utilização de métodos estatísticos. Alguns autores traduzem o TQC japonês como o compromisso para a qualidade total, enaltecendo o envolvimento e comprometimento dos funcionários com essa prática, aliado ao apoio da alta direção da empresa. Nesse sentido, um dos principais fatores por trás do sucesso do CWQA no Japão é a liderança do processo, conduzida pela alta direção da empresa.6 Já na visão americana do TQC há uma outra ênfase. Como citado anteriormente, Armand Feigenbaum7 foi o primeiro autor nos Estados Unidos a utilizar o termo TQC, definindo-o como um sistema eficaz para integrar a manutenção da qualidade e os esforços de melhoria da qualidade dos vários grupos na organização, de modo a possibilitar a produção em níveis mais econômicos, permitindo alcançar a completa satisfação dos clientes. Nesse sentido, Armand Feigenbaum reconhece que todos os departamentos em uma empresa têm alguma responsabilidade para alcançar a qualidade. Kaoru Ishikawa argumenta ainda que a diferença entre o CWQC e a visão de Armand Feigenbaun é que, enquanto esse último advoga que o TQC deve ser conduzido por especialistas, a visão japonesa não dá exclusividade a esses especialistas. De qualquer modo, existem algumas diferenças entre a linha de pensamento japonesa e a americana sobre o que vem a ser o TQC, embora, em essência, o conceito seja muito similar. No Japão é notório um maior envolvimento e comprometimento dos funcionários nas atividades de gestão da qualidade (ver Quadro “Qualidade em Ação”). Por outro lado, nos Estados Unidos existe muita ênfase à aplicação de métodos e técnicas associadas à qualidade. Enquanto que nos Estados Unidos a maior preocupação é com a detecção dos problemas e segregação dos produtos com defeitos, no Japão, as empresas desenvolvem processos capazes de detectar e evitar os problemas. Alguns autores defendem, inclusive, que essa diferença pode ser explicada por fatores políticos e culturais diferenciados entre esses dois povos.
6
Essa argumentação é baseada em vários autores tais como Ozawa (1988), Kondo (1998) e Lasceles e Dale (1993).
Outro ponto central do TQC japonês é o gerenciamento pelas diretrizes (também conhecido como Hoshin Kanri), que direciona o foco organizacional às metas da organização por meio do desdobramento dessas metas e do envolvimento e autonomia dos funcionários na gestão das atividades diárias da organização. O gerenciamento pelas diretrizes é baseado no ciclo PDCA (Plan-Do-Check-Act), utilizando um sistema integrado de procedimentos que encorajam os funcionários a analisar as situações, estabelecer planos de melhoria, conduzir auditorias de desempenho e tomar as ações apropriadas, sejam para correção ou progresso mais acentuado. Os princípios do gerenciamento das diretrizes são apresentados no Capítulo 6. 7 Na obra: Feigenbaum, A.V. Total Quality Control. Nova York: McGraw-Hill, 1954.
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Qualidade em ação Diferença entre os Estados Unidos e o Japão no envolvimento dos funcionários Estudos comparativos conduzidos em meados da década de 1990 mostram a diferença entre estatísticas no Japão e nos Estados Unidos com relação às sugestões feitas pelos funcionários visando à melhoria contínua. Como pode ser visto na Tabela 3.2, em um país onde a recompensa é de US$461 por sugestão, imagina-se que os funcionários escreveriam todas as sugestões possíveis. Nesse caso, busca-se somente a redução de custos, representada pela economia por sugestão (US$6.680). Assim, premia-se mais as pessoas para obter maiores reduções. No entanto, em um país em que o foco é o envolvimento dos funcionários e que, apesar de premiar menos, tem mais participantes no sistema (68%) obtém-se uma maior economia por funcionário (US$3.640), contra os US$430 nos Estados Unidos. Nesse caso, busca-se atacar o maior número possível de pequenas coisas que vão mal no dia a dia e que todos notam, resultando em benefícios diretos para a empresa, como mostrado na Tabela 3.2, e também indiretos, decorrentes do maior comprometimento dos funcionários. Tabela 3.2: diferença entre os Estados Unidos e o Japão em sugestões de melhoria 1~PHURGHVXJHVW}HVSRUIXQFLRQiULRSRUDQR 6XJHVW}HVDSURYHLWDGDV 3DUWLFLSDQWHVFRPSHORPHQRVXPDVXJHVWmRSRUDQR 5HFRPSHQVDSRUVXJHVWmR86 (FRQRPLDSRUIXQFLRQiULR86 (FRQRPLDSRUVXJHVWmR86
Estados Unidos
Japão
Fonte: ROBINSON, 1995.
3.3. A variante voltada para a gestão: TQM – Gestão da Qualidade Total ou Total Quality Management A evolução do TQC resultou no TQM, termo que surgiu a partir da metade da década de 1980. A ideia central do TQM é que a qualidade esteja presente na função de gerenciamento organizacional, em uma tentativa de ampliar seu foco, não se limitando às atividades inerentes ao controle. Comparativamente ao TQM, o TQC não inclui alguns elementos que são parte dos princípios do TQM, como, por exemplo, o relacionamento com os fornecedores. Do final da década de 1980 até meados da década de 1990, diversos estudos indicaram elementos, considerados como fatores críticos que devem estar presentes no TQM. Os elementos mais comuns nos estudos e sua respectiva descrição são mostrados na Tabela 3.3.
Capítulo 3
| Gestão da Qualidade Total e Modelos de Excelência em Desempenho Organizacional
Tabela 3.3: Elementos de TQM8 Elemento /LGHUDQoDHDSRLR GDDOWDGLUHomR
Descrição 3URYHUOLGHUDQoDQRSURFHVVRGHPXGDQoDH[HPSODULGDGHHPRWLYDomRGDIRUoD GHWUDEDOKRGDRUJDQL]DomR'HYHWDPEpPSURPRYHUHHVWLPXODUDVSUiWLFDVH DERUGDJHQVGLUHFLRQDGDVDR740YHU&DStWXOR 5HODFLRQDPHQWR &RQFHQWUDUDVDWLYLGDGHVFRPIRFRQRVFOLHQWHVHHVWDEHOHFHUFDQDLVGHFRPXQLFDomR FRPRVFOLHQWHV YLVDQGRDOHYDQWDUVXDVQHFHVVLGDGHVHQtYHLVGHVDWLVIDomRSURPRYHQGRXP HQWHQGLPHQWRVREUHRVFOLHQWHVYHU&DStWXOR *HVWmRGDIRUoDGH $SOLFDURVSULQFtSLRVGDJHVWmRGHUHFXUVRVKXPDQRVFRPEDVHHPXPVLVWHPDGH WUDEDOKR WUDEDOKRHPHTXLSHHFRPHPSRZHUPHQWSURFHVVRVGHUHFUXWDPHQWRHVHOHomRH FDSDFLWDomRHWUHLQDPHQWR 5HODomRFRPRV 8WLOL]DUSUiWLFDVGHVHOHomRHTXDOLÀFDomRGHIRUQHFHGRUHVEHPFRPRPHLRVGH IRUQHFHGRUHV PHGLomRGHGHVHPSHQKR(VWDEHOHFHUUHODomRGHORQJRSUD]RFRPRVIRUQHFHGRUHV YLVDQGRjFRODERUDomRP~WXDDOpPGHEXVFDUPHOKRULDGDTXDOLGDGHGRVSURGXWRV YHU&DStWXOR *HVWmRSRU 'HÀQLURVSURFHVVRVFKDYHGDRUJDQL]DomRSURPRYHUSUiWLFDVSUHYHQWLYDV SURFHVVRV DXWRLQVSHomRXWLOL]DQGRSODQRVGHFRQWUROHHXWLOL]DomRGHPpWRGRVHVWDWtVWLFRVQD SURGXomRYHU&DStWXOR 3URMHWRGHSURGXWR (QYROYHUWRGDVDViUHDVIXQFLRQDLVQRSURFHVVRGHGHVHQYROYLPHQWRGHSURGXWR YLVDQGRDGHVHQYROYHUXPSURGXWRTXHYHQKDDVDWLVID]HUDRVUHTXLVLWRVGRVFOLHQWHV )DWRVHGDGRVGD 'LVSRQLELOL]DURVGDGRVHLQIRUPDo}HVUHODWLYDVjTXDOLGDGHFRPRSDUWHGHXP TXDOLGDGH VLVWHPDGHJHVWmRWUDQVSDUHQWHHGHIiFLOYLVXDOL]DomR5HJLVWURVVREUHLQGLFDGRUHV GDTXDOLGDGHLQFOXLQGRtQGLFHVGHUHIXJRUHWUDEDOKRGDGRVGHJDUDQWLDFXVWRVGD TXDOLGDGHYHU&DStWXORVH
3.4. Modelos de TQM A literatura aponta alguns modelos na tentativa de representar o que constitui o TQM. Esses modelos apresentam, em parte, os elementos mostrados na Tabela 3.4. Alguns desses modelos são apresentados a seguir. 3.4.1. A visão de Lascelles e Dale9
Esses autores consideram o TQM como uma evolução da qualidade ao longo do tempo. Essa evolução é ilustrada na Figura 3.3, que apresenta as fases de inspeção, controle (estatístico) da qualidade e garantia da qualidade. A intenção é mostrar que a qualidade vem evoluindo de forma mais intensiva ao longo das últimas décadas, desde o final do século XVIII, com o advento da Revolução Industrial. As fases evolutivas compreendem uma maior ênfase em: inspeção, controle estatístico da qualidade e garantia da qualidade, chegando, finalmente, à gestão da qualidade. É importante notar que essas fases não são excludentes, e sua delimitação temporal é aproximada.
8 Diversas fontes foram utilizadas para a construção dessa tabela, tais como: SARAPH et al. (1989); DALE et al. (1994); FLYNN et al. (1994); AHIRE et al. (1996); ZEITZ et al. (1997); BLACK e PORTER (1996); POWELL (1995); MARTÍNEZ-LORENTE et al. (1998); e MOTWANI (2001). 9
Proposto por Lascelles, D.M. e Dale, B.G. The Road to Quality. Bedford: IFS Ltd., 1993.
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Figura 3.3 – Fases na evolução da qualidade (atualizado a partir de MIGUEL, 2001).
Complementando as fases evolutivas da qualidade (Figura 3.3), a Figura 3.4 ilustra a visão do TQM de Lascelles e Dale. A ideia da Figura 3.4 é ilustrar que as atividades inerentes à inspeção estão presentes no controle da qualidade, que, por sua vez, está inserido na garantia da qualidade, e todos eles fazem parte da gestão da qualidade total.
Figura 3.4 – Visão evolutiva para o TQM.
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3.4.2. O modelo de Shiba10
Shiba e outros autores defendem que o TQM é um sistema em evolução, por meio da melhoria contínua de produtos e serviços, na busca do aumento da satisfação dos clientes. O autor considera quatro elementos fundamentais para a qualidade: foco nos clientes, melhoria contínua, participação total, entrelaçamento social e atividade com foco na qualidade (TQM). A representação desses quatro elementos principais (denominados pelo autor de revoluções), por meio de um modelo denominado WV, é ilustrada na Figura 3.5.
Figura 3.5 – O Modelo WV para o TQM segundo Shiba.
O primeiro elemento é relacionado ao foco no cliente e ao atendimento de suas necessidades. Nesse sentido, as organizações devem ser capazes de ter agilidade para atender às mudanças das necessidades e expectativas dos clientes, concentrando seus recursos em atividades que venham a atender essas necessidades. O segundo elemento é associado ao conceito de melhoria contínua dos processos, por meio da gestão eficaz e eficiente desses processos (ver “Gestão por processos” no Capítulo 7). O gerenciamento eficaz dos processos organizacionais gera resultados positivos no sentido de aumentar a qualidade dos produtos e também de melhorar o desempenho organizacional. Assim, o conceito de melhoria contínua é aplicado tanto na busca de solução para os problemas quanto na melhoria sistemática e contínua, de modo a alcançar níveis mais altos de qualidade e performance organizacional, utilizando o ciclo PDCA. O terceiro elemento é relativo à participação total, ou seja, todos os funcionários devem estar envolvidos nos princípios do TQM, nas atividades de melhoria contínua e na busca da satisfação dos clientes. O quarto elemento referese ao entrelaçamento social, isto é, à troca de experiên10
Ver: Shiba, S. Grahan, A. e Walden, D. TQM: Quatro Revoluções na Gestão da Qualidade. São Paulo: Bookman, 1997.
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cias entre as organizações. A comunicação entre as empresas visa ao compartilhamento de informações e de práticas organizacionais, tendo em vista o aprendizado contínuo. Para que o TQM seja implantado com sucesso, é necessária uma estratégia de mobilização, baseada no envolvimento e comprometimento da alta direção, um programa de sensibilização quanto ao TQM, e provimento de uma infra estrutura organizacional. 3.4.3. O modelo de Zaire11
O modelo de “blocos de construção”, proposto por Zaire, estabelece que o TQM depende de fases construtivas, estabelecidas por uma estrutura similar a uma construção civil. Assim, estabelece-se como fases a fundação, os pilares de sustentação e o topo, sendo que para cada uma destas fases são definidas as ações e os elementos necessários para sua construção. A Figura 3.6 ilustra esquematicamente o modelo de “blocos de construção”.
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Como pode ser observado na Figura 3.6, o modelo proposto por Zaire contempla vários dos elementos do TQM mostrados na Tabela 3.4. O autor defende ainda que a existência desses blocos e a ligação entre eles determinam a rigidez e a segurança da organização. Uma fraqueza em uma determinada parte do modelo pode ocasionar um efeito desastroso no progresso do TQM na organização como um todo. Assim, propõe que a organização necessita concentrar sua estratégia de implementação em todos os elementos mostrados na Figura 3.6. Para encerrar esse item sobre a qualidade total, é necessário comentar que existem níveis diferenciados em termos da adoção dos princípios do TQM entre as diferentes organizações. Nesse sentido, Dale e Lascelles propõem seis diferentes 11 12
Zaire, M. TQM for Engineers. Londres: Woodhead Publishing, 1991. Desenho gentilmente cedido por Calarge (2001).
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níveis de adoção do TQM, a partir dos quais uma organização pode ser categorizada. Esses níveis variam de uma “organização sem comprometimento com a qualidade” até uma “organização de classe mundial”.13 Entre esses dois extremos, podem existir organizações: “nômades”, “empurradas pelo uso de ferramentas”, “engajadas nos processos de melhoria” e “vencedoras de prêmios da qualidade”. É necessário mencionar, entretanto, que nessa última categoria pode haver organizações de classe mundial. Os modelos utilizados nos processos de premiação da qualidade, chegando a ser utilizados por quase 80 países no mundo, refletem a busca da excelência no desempenho organizacional. Esses modelos são apresentados a seguir. Qualidade em ação Qualidade Total: Ênfase na Comunicação Interna – O Caso da VW – Unidade Resende Um dos aspectos altamente relevantes são as práticas de aprimoramento das técnicas de comunicação, sobretudo, a comunicação interna na organização. Essas práticas são particularmente relevantes para empresas que adotam o TQM como modelo de gestão da qualidade, uma vez que o TQM é baseado no envolvimento da força de trabalho, nas mudanças comportamentais e na maior integração entre as áreas funcionais. O estudo de Cardia (2004) parte da proposição que “a gestão da qualidade total requer profissionais interagindo integralmente para a promoção dos fluxos de comunicação interna e integrados para a gestão dos novos processos”. Assim, uma série de questões relacionadas à comunicação norteou a pesquisa de Cardia, realizada na Unidade da VW de Resende, que produz chassis para ônibus e caminhões. A Unidade da VW de Resende é hoje uma das plantas industriais mais modernas do mundo, resultado de um investimento de US$250 milhões, batendo recordes de produção nos últimos sete anos, com uma capacidade de produção de 30 mil veículos/ano em dois turnos de trabalho. A produção diária é de 85 veículos em um turno de nove horas, com aproximadamente 1.800 funcionários. A inovação no sistema produtivo ocorre por meio do Consórcio Modular, um projeto que reuniu sete de seus principais fornecedores instalados dentro da fábrica.14 O Consórcio Modular busca a redução dos custos de produção, estoques e tempos de produção, ao mesmo tempo conferindo maior qualidade ao produto final. A empresa oferece uma linha de produtos com 15 modelos de caminhões, de 7 a 40 toneladas e dois chassis para ônibus, exportados para mais de 20 países. 13
Uma organização de classe mundial pode ser definida como uma empresa líder na sua categoria, não somente no sentido do desempenho financeiro e de mercado, mas na excelência em desempenho. Essas organizações têm condições de competir em quaisquer mercados e, geralmente, são benchmarks (referenciais de desempenho), ou seja, modelos para outras organizações do mesmo setor industrial ou fora dele. 14 A VW selecionou sete parceiros para a produção modular, nos seguintes componentes e processos: chassis (Maxion), eixos e suspensão (Arvin Meritor), rodas e pneus (Remom), motores (Powertrains), armação da cabina (Delga), pintura (Carese) e tapeçaria (VDO).
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Entre as práticas de comunicação, destacam-se a “gestão à vista” e o trabalho em equipe a partir da existência dos módulos de produção. As equipes são compostas por times de trabalho que discutem com os gerentes dos módulos os problemas de produção todas as manhãs. Essa estrutura de trabalho permite que todos os funcionários da fábrica participem do processo de produção, com atenção especial àqueles diretamente ligados ao produto final. A unidade conta ainda com a transmissão rápida de dados interligados mundialmente por ramais de vibra óptica. Cinquenta e dois sistemas de informação são utilizados na unidade, incluindo o chão-de-fábrica, onde os montadores acessam terminais instalados nos módulos de produção para controlar a montagem dos caminhões e ônibus. A área responsável pelo gerenciamento e controle da qualidade conta com vários indicadores de desempenho internos (por exemplo, defeitos por veículos, auditorias de produto, avaliação e classificação dos fornecedores, entre outros) e externos (por exemplo, índice de satisfação dos clientes, reclamações de garantia por veículo e custos de garantia, falhas detectadas pelo cliente, entre outros). Uma das ideias principais do consórcio modular foi o repasse para o fornecedor da responsabilidade pela qualidade dos produtos por ele fabricados, eliminando-se assim o trabalho de inspeção na empresa cliente, bem como os problemas constantes. Assim, a unidade da VW de Resende apresenta as características de uma organização voltada para a qualidade assegurada, e pelo envolvimento e comprometimento do fornecedor na busca da qualidade total, em um processo de melhoria contínua. Nesse sentido, as práticas de comunicação ágeis, eficientes, dinâmicas e com barreiras reduzidas na gestão dos processos organizacionais contribuem de forma significativa para a eficácia na Gestão da Qualidade e para uma maior aproximação das áreas funcionais da organização na busca da qualidade total. Fonte: Adaptado de Cardia, A.N. Comunicação Interna e Gestão da Qualidade Total: O Caso Volkswagen – Unidade Resende. Produção, v. 14, n. 2, 2004.
3.5. A Transição da Qualidade Total para a excelência em desempenho Como pôde ser visto anteriormente, a qualidade total é bastante ampla, envolvendo não somente diversas áreas funcionais das organizações, mas também diferentes conceitos, que vão desde a liderança até os meios de controle nos processos produtivos, sejam estes de manufatura ou de serviços. Uma evolução no conceito da qualidade total veio com a necessidade de incorporar os diversos interesses dos stakeholders (partes interessadas) de uma organização na busca da excelência em desempenho. Em um passado não muito distante, o acionista ou proprietário da organização era a maior parte interessada em seu desempenho, para o qual era dada a maior atenção e importância. Isso não significa que, atualmente, ele não seja mais importante, uma vez que o equilíbrio financeiro de uma organização é um fator que assegura a continuidade
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de sua existência. A alteração nesse enfoque, ocorrida há alguns anos, considera hoje outros indivíduos, grupos de indivíduos, ou seja, agentes interessados no desempenho de uma organização. Isso ocorreu pelo fato de não ser suficiente que uma organização concentre seus esforços somente no desempenho financeiro. Na verdade, o enfoque atual deve considerar que uma organização é constituída, basicamente, por pessoas e processos e deve ser estruturada em função das demandas e dos atendimento das necessidades desses seus diversos agentes internos e externos. Esses agentes internos e externos são, geralmente, representados pelos próprios acionistas ou proprietários, citados anteriormente, pelos clientes da organização, pela força de trabalho,15 pelos fornecedores e pela comunidade e sociedade. A comunidade pode ser entendida como a parcela que recebe as ações da organização localmente, enquanto a sociedade tem um sentido mais amplo, ou seja, amplia a abrangência das ações da organização ou dos efeitos decorrentes dessas ações. Esse conceito de agentes internos e externos ou, em outras palavras, das partes interessadas no desempenho de uma organização é sintetizado no termo em inglês stakeholder. Os modelos de excelência em gestão organizacional que compõem um prêmio da qualidade de nível nacional visam a avaliar a gestão de uma organização com relação às práticas de gestão utilizadas e os resultados organizacionais, de forma direcionada para atender as necessidades de seus stakeholders. Esses modelos estabelecem um conjunto de critérios e itens que a organização deve cumprir por meio de suas práticas que conduzem a resultados de excelência. Assim, organizações provenientes de quaisquer setores econômicos, industriais ou de serviços, públicas ou privadas, descrevem, por meio de um relatório de gestão, as práticas organizacionais que são empregadas de modo a atender aos critérios e itens dos modelos de excelência. Esse relatório de gestão é avaliado por especialistas que trabalham voluntariamente no processo de avaliação, por meio de uma atribuição de pontuação dos critérios e itens individualmente (numa escala total de 0 a 1.000 pontos), além da redação de comentários que descrevem os pontos fortes e as oportunidades de melhoria para a organização. As organizações têm, posteriormente, um retorno na forma de um relatório de avaliação, podendo ou não ser premiadas. A premiação funciona como um reconhecimento das práticas de gestão utilizadas pelas organizações que atingem determinada pontuação (geralmente entre 700 a 800 pontos) destacando-se pela excelência e alto desempenho. A seguir, são fornecidos mais detalhes sobre os critérios e itens que compõem o processo de avaliação, iniciando pela descrição do prêmios japonês e americano. 15
A força de trabalho compreende as pessoas que compõem uma organização e que contribuem para a consecução de suas estratégias, dos seus objetivos e das suas metas. Entende-se como força de trabalho não somente os funcionários da organização, em tempo parcial ou integral, mas também todos os indivíduos que contribuem diretamente com o trabalho e resultados da organização, tais como temporários, autônomos e funcionários de terceiros que estejam sendo supervisionados pela organização, e também estagiários que, geralmente, não têm vínculo empregatício.
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3.6. Evolução dos modelos de excelência: o prêmio Deming e o Malcolm Baldrige O primeiro prêmio da qualidade lançado no mundo, visando a avaliar o desempenho das organizações, foi o prêmio Deming, criado no Japão na década de 1950. Entretanto, como é descrito a seguir, esse prêmio é diferenciado em relação aos existentes na atualidade, pois determina quais as práticas organizacionais que devem ser utilizadas nas organizações. Em outras palavras, é um modelo prescritivo. Quase 40 anos depois, os Estados Unidos lançaram, em 1988, o Malcolm Baldrige National Quality Award, em uma das tentativas de resposta para aumentar a competitividade nas empresas americanas e também para responder à invasão de produtos japoneses naquele país. O Malcolm Baldrige National Quality Award tornou-se, então, um dos precursores desse tipo de iniciativa, além de tornar-se um modelo de referência para diversas outras nações que adotaram tal modelo de excelência. Tendo em vista a contribuição do prêmio americano desde a sua criação, 12 anos mais tarde, o Japão lança um modelo similar denominado Japan Quality Award, voltandose para um modelo de excelência não prescritivo, na linha do Malcolm Baldrige National Quality Award. O Malcolm Baldrige National Quality Award, o prêmio nacional da qualidade americano foi estabelecido pelo Congresso Americano em 1987, sendo os primeiros prêmios entregues em 1988. Como apontado antes, seu objetivo principal é melhorar a competitividade das empresas americanas por meio da conscientização para a qualidade, do reconhecimento dos resultados de excelência em desempenho nas empresas americanas e da publicação desses resultados de sucesso das empresas premiadas, como fator de troca de informações e experiência. O processo é administrado pelo Baldrige National Quality Program, localizado no NIST (National Institute of Sytandards and Technology), que é um órgão do Department of Commerce dos Estados Unidos da América – EUA. Hoje o prêmio é denominado de Baldridge Performance Excellence Program. Diferentemente do prêmio brasileiro (descrito mais adiante), existem três categorias: negócios (business/non-profit), saúde (health care) e educação (education; incluindo instituições de ensino fundamental, básico e superior). Os critérios e itens para o ciclo de 2011-2012 (business/non-profit, ou seja, voltado para empresas privadas e organizações sem fins lucrativos) são mostrados na Tabela 3.4.
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Tabela 3.4: Critérios, Itens e Pontuação para o Prêmio Americano (empresas privadas e RUJDQL]Do}HVVHPÀQVOXFUDWLYRV Critérios e itens 2011–2012 /LGHUDQoD $OWDOLGHUDQoD *RYHUQDQoDHUHVSRQVDELOLGDGHVRFLDO 3ODQHMDPHQWRHVWUDWpJLFR 'HVHQYROYLPHQWRHVWUDWpJLFR ,PSOHPHQWDomRGDVHVWUDWpJLDV )RFRQRFOLHQWH 9R]GRFOLHQWH (QJDMDPHQWRGRFOLHQWH 0HGLomRDQiOLVHHJHVWmRGRFRQKHFLPHQWR 0HGLomRDQiOLVHHPHOKRULDGDSHUIRUPDQFHRUJDQL]DFLRQDO *HVWmRGDLQIRUPDomRGRFRQKHFLPHQWRHGDWHFQRORJLDGDLQIRUPDomR )RFRQDIRUoDGHWUDEDOKR $PELHQWHGHWUDEDOKR (QJDMDPHQWRGDIRUoDGHWUDEDOKR )RFRQDRSHUDomR 6LVWHPDVGHWUDEDOKR 3URFHVVRVGHWUDEDOKR 5HVXOWDGRV 5HVXOWDGRVGRVSURGXWRVHSURFHVVRV 5HVXOWDGRVGRVFOLHQWHV 5HVXOWDGRVGDIRUoDGHWUDEDOKR 5HVXOWDGRVGDOLGHUDQoDHJRYHUQDQoD 5HVXOWDGRVÀQDQFHLURVHGHPHUFDGR
Pontuação
3.6.1. O Prêmio da Qualidade no Japão (Deming Prize)
O Prêmio da Qualidade no Japão, denominado Deming Prize, foi instituído logo após as palestras proferidas por Deming na década de 1950. Durante os primeiros anos, os prêmios foram concedidos mediante recursos advindos da venda de materiais elaborados por Deming e de direitos de tradução de seus livros. Atualmente, os prêmios são patrocinados pela JUSE – Japanese Union of Scientists and Engineers, concedidos em quatro categorias: Indivíduos (concedido para uma pessoa que tenha feito notável contribuição para a teoria, as aplicações e os métodos de controle da qualidade, normalmente por meio de trabalhos publicados); Prêmio de Aplicação Deming (Deming Application Prize; prêmio que recebe maior parte da publicidade), destinado a empresas que aplicaram com sucesso o Controle da Qualidade por Toda Empresa (CWQC – Company-wide Quality Control); Prêmio Japonês de Controle da Qualidade (aberto somente para empresas já detentoras do Prêmio Deming), instituído em 1970, que contempla as empresas que apresentam práticas e padrões elevados de qualidade durante pelo menos cinco anos; e o Prêmio Deming Estrangeiro, concedido a empresas não japonesas interessadas no processo de exame na implantação do Controle da Qualidade Total. O prêmio foi aberto para organizações não japonesas em 1984, sendo a empresa Florida Power and Light,
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uma das maiores companhias de eletricidade dos Estados Unidos, ganhadora do prêmio em 1989. O julgamento é baseado em dez critérios principais: Política 1. Organização e sua Operação 2. Informação 3. Padronização 4. Recursos Humanos 5. Garantia da Qualidade 6. Manutenção 7. Melhoria 8. Efeitos (Resultados) 9. Planos Futuros A Tabela 3.5 mostra os critérios e itens apresentados na forma de pontos de verificação (check list). Tabela 3.5: Critérios e itens do Prêmio Deming Critérios 3ROtWLFD
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Capítulo 3 Critérios 5HFXUVRV +XPDQRV
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Diferentemente do prêmio americano e do brasileiro, descrito a seguir, pode-se observar na Tabela 3.5 que os itens de verificação do prêmio japonês são de natureza prescritiva, ou seja, eles indicam em grande parte deles quais as práticas que devem ser utilizadas, tais como métodos estatísticos, revisão de projeto (design review), PDCA, círculos de controle da qualidade, entre outros. É importante destacar que hoje o Japão conta com um outro modelo de excelência, tendo adotado o prêmio americano em seu primeiro ciclo em 1996. Atualmente, apesar de ter algumas diferenças em relação ao Malcolm Baldridge National Quality Award, esse modelo (Japan Quality Award) apresenta algumas particularidades. Diferentemente do prêmio americano, é dividido em oito critérios e apresenta um critério especificamente direcionado à responsabilidade social, considerando resposta aos requisitos sociais e contribuição para a sociedade.
3.7. O modelo de excelência brasileiro: o Prêmio Nacional da Qualidade (PNQ) O Prêmio Nacional da Qualidade (PNQ) no Brasil é hoje um instrumento importante para incentivo à competitividade, na forma de avaliação de empresas que buscam alcançar reconhecimento em excelência daquilo que produzem e/ou comercializam, sejam produtos ou serviços. Alcançar excelência na gestão organizacional significa atender plenamente as necessidades das partes interessadas no desempenho da organização, por meio de práticas modernas de gestão, e alcançar os resultados positivos que essas práticas objetivam. O prêmio é concedido em reconhecimento a empresas com operação no Brasil que, após avaliação de suas práticas de gestão, destaquem-se como referenciais de excelência. O prêmio é administrado pela Fundação Nacional da Qualidade (FNQ) – antigamente denominada de Fundação para o Prêmio Nacional da Qualidade (FPNQ) – com sede em São Paulo. A FNQ é uma entidade privada, sem fins lucrativos, criada em 1991 por 39 organizações públicas e privadas, tais como American Express, GM, IBM, Kodak, Motorola, Petrobras, Xerox, entre outras,16 para administrar o PNQ. O prêmio é entregue anualmente pela Presidência da República todo mês de novembro. A avaliação baseia-se em critérios de excelência adotados mundialmente e similares ao prêmio norte-americano (Malcolm Baldrige National Quality Award, hoje Baldridge Performance Excellence Program), aos quais foram incorporados conceitos dos prêmios europeu (European Quality Award) e japonês (Deming Prize) e também, embora de forma limitada, tópicos específicos brasileiros. Em 1989, um grupo de estudos formado por profissionais da indústria de manufatura, de serviços, de consultoria e do meio acadêmico e pelas empresas anteriormente citadas iniciou um estudo sobre o desenvolvimento de um prêmio brasileiro 16
Outras organizações foram: Anfavea, Brastemp, Câmara Americana de Comércio para o Brasil, Citibank, Companhia Brasileira de Alumínio, Coopers & Lybrand Consultores, Cumnins, Dow Química, Editora Abril, Ericson, Ernst & Young, Fiat, Freios Varga, Gradiente, Indústrias Villares, L.A. Falcão Bauer, Laboratórios B. Braun, Mangels, Matel, Metal Leve, Monsanto, Oracle, Phillips, Rhodia, São Paulo Alpargatas, S/A Moinhos Santista, Shell, Siemens, T.L. Publicações Industriais, Varig, Weg.
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nos moldes dos existentes no mundo. Diversas modalidades de premiações brasileiras e estrangeiras foram estudadas, com destaque para o Deming Prize e o Malcolm Baldrige National Quality Award, ambos descritos anteriormente. Em paralelo, em 1990, o Comitê Nacional de Qualidade e Produtividade – Subprograma I do PBQP (Conscientização) considerou o estabelecimento de um prêmio nacional, com participação no processo. Como resultado, em 11 de outubro de 1991 foi instituída a FPNQ,17 fundação de Direito Privado e sem fins lucrativos, pelas 39 organizações públicas e privadas aqui citadas. As empresas candidatas devem fornecer dados e informações sobre a melhoria obtida em seus processos e os resultados organizacionais decorrentes destas melhorias. O sistema adotado para pontuação das empresas candidatas baseia-se em duas dimensões de avaliação: enfoque & aplicação, e resultados. Essas dimensões são descritas no tópico referente ao processo de avaliação. A estrutura dos critérios segue um enfoque sistêmico, que deve ser trabalhado na forma de estratégias e planos de ação da empresa. A Figura 3.7 apresenta a estrutura dos critérios para o ciclo de 2010. A ideia da figura é que, a partir dos clientes e da sociedade, razão de ser da organização, a liderança estabelece os valores e as diretrizes da organização, define e conduz estratégias e planos, que são implementados pelas pessoas e por meio dos processos organizacionais. As necessidades dos clientes devem ser levantadas para que os produtos possam ser desenvolvidos de tal forma que conquistem os clientes e retenha-os para a organização. As estratégias e os planos devem refletir esse e outros aspectos da gestão relacionados a outras partes interessadas, estabelecendo a atuação da organização a curto e longo prazos, que servem como referência para a tomada de decisão e para aplicação dos recursos humanos e materiais da organização. A informação e o conhecimento possibilitam conduzir a gestão em direção aos resultados organizacionais, dando suporte para todo o sistema, seja por meio da provisão de informações e indicadores, referenciais comparativos ou pela gestão do conhecimento. A experiência acumulada e o aprendizado adquirido constituem o capital intelectual da organização, sendo uma das principais fontes para melhoria e inovação. Os espaços em branco na figura, que delimitam cada um dos critérios, atuam como condutores, representando a relação e a comunicação entre todos eles, num modelo de gestão sistêmico. Na realidade, o modelo também representa um grande ciclo PDCA (Plan, Do, Check e Act, ou planejar, executar, verificar e agir).18 Os critérios 1 e 2, liderança e estratégias e planos, representam o planejamento, enquanto os critérios 6 e 7, pessoas e processos, são a execução, suportados pelo critério 5, informações e conhecimento. A verificação é feita pelo critério 8 (resultados), que poderá gerar alterações ou correções de rumo nas estratégias e nos planos. As ações são então geradas pela avaliação dos resultados do critério 8, tendo como base os critérios 2 e 3, clientes e sociedade, visando a atender as necessidades das partes interessadas, buscando sua satisfação.
17 18
A partir de junho de 2005, o nome foi alterado para Fundação Nacional da Qualidade. Para mais detalhes ver Campos, V.F. TQC – Controle da Qualidade Total. Belo Horizonte: Ed. QFCO, 1992.
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Figura 3.7 – Critérios do PNQ. Fonte: FNQ, 2010.
Estados Unidos na ocasião da criação do prêmio americano. Em meados dos anos 80, um grupo de pesquisadores da iniciativa privada, do governo e das universidades e centros de pesquisa nos Estados Unidos estudou um conjunto de empresas que reconhecidamente eram bem-sucedidas e com desempenho acima da média. O trabalho visava à identificação de características comuns que as diferenciassem das demais. Ao realizar esse estudo, identificaram-se valores organizacionais e aspectos que essas empresas tinham em comum, entendidos como sendo o diferencial em relação às outras organizações. Esses valores eram parte da cultura dessas organizações, sendo praticados por toda a força de trabalho, dos líderes até as pessoas no nível de operação. Os valores identificados nas organizações de sucesso foram então considerados os fundamentos para o estabelecimento de uma cultura de gestão voltada para a excelência e para os resultados, e deram origem aos critérios de excelência do prêmio americano, o Malcolm Baldrige National Quality Award. Esses fundamentos também são a base do prêmio brasileiro, uma vez que este foi baseado no prêmio dos Estados Unidos. Atualmente, esses fundamentos para o PNQ são: Aprendizado organizacional UÊ Conhecimento sobre o cliente e o mercado UÊ Cultura da inovação UÊ Desenvolvimento de parcerias
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UÊ Geração de valor UÊ Liderança e constância de propósito UÊ Orientação por processos e informações UÊ Pensamento sistêrmico UÊ Responsabilidade social UÊ Valorização das pessoas UÊ Visão de futuro Cada um desses fundamentos possui identidade própria e razão de sua existência. Apesar dessa identidade, eles são inter-relacionados. A Tabela 3.6 mostra uma descrição resumida de cada um deles, segundo a FNQ. Tabela 3.6: Síntese dos fundamentos da excelência Fundamento $SUHQGL]DGR RUJDQL]DFLRQDO &RQKHFLPHQWR VREUHRFOLHQWHHR PHUFDGR &XOWXUDGH LQRYDomR 'HVHQYROYLPHQWR GHSDUFHULDV *HUDomR GHYDORU /LGHUDQoDH FRQVWkQFLDGH SURSyVLWRV 2ULHQWDomRSRU SURFHVVRVH LQIRUPDo}HV
3HQVDPHQWR VLVWrPLFR 5HVSRQVDELOLGDGH VRFLDO
9DORUL]DomR GDVSHVVRDV 9LVmR GHIXWXUR
Descrição %XVFDHDOFDQFHGHXPQRYRSDWDPDUGHFRQKHFLPHQWRSDUDDRUJDQL]DomRSRUPHLR GDSHUFHSomRUHÁH[mRDYDOLDomRHFRPSDUWLOKDPHQWRGHH[SHULrQFLDV &RQKHFLPHQWRHHQWHQGLPHQWRGRFOLHQWHHGRPHUFDGRYLVDQGRjFULDomRGHYDORUGH IRUPDVXVWHQWDGDSDUDRFOLHQWHHFRQVHTXHQWHPHQWHJHUDQGRPDLRUFRPSHWLWLYLGDGH QRVPHUFDGRV 3URPRomRGHXPDPELHQWHIDYRUiYHOjFULDWLYLGDGHH[SHULPHQWDomRHLPSOHPHQWDomR GHQRYDVLGHLDVTXHSRVVDPJHUDUXPGLIHUHQFLDOFRPSHWLWLYRSDUDDRUJDQL]DomR 'HVHQYROYLPHQWRGHDWLYLGDGHVHPFRQMXQWRFRPRXWUDVRUJDQL]Do}HVDSDUWLUGD SOHQDXWLOL]DomRGDVFRPSHWrQFLDVHVVHQFLDLVGHFDGDXPDREMHWLYDQGREHQHItFLRV SDUDDVSDUWHV $OFDQFHGHUHVXOWDGRVFRQVLVWHQWHVDVVHJXUDQGRDSHUHQLGDGHGDRUJDQL]DomRSHOR DXPHQWRGHYDORUWDQJtYHOHLQWDQJtYHOGHIRUPDVXVWHQWDGDSDUDWRGDVDVSDUWHV LQWHJUDQWHV $WXDomRGHIRUPDDEHUWDGHPRFUiWLFDLQVSLUDGRUDHPRWLYDGRUDGDVSHVVRDV YLVDQGRDRGHVHQYROYLPHQWRGDFXOWXUDGHH[FHOrQFLDjSURPRomRGHUHODo}HVGH TXDOLGDGHHjSURWHomRGRVLQWHUHVVHVGDVSDUWHV &RPSUHHQVmRHVHJPHQWDomRGRFRQMXQWRGHDWLYLGDGHVHSURFHVVRVGDRUJDQL]DomR TXHDJUHJXHPYDORUSDUDDVSDUWHVLQWHUHVVDGDVVHQGRTXHDWRPDGDGHGHFLVmR HH[HFXomRGHDo}HVGHYH7HUFRPREDVHDPHGLomRHDQiOLVHGRGHVHPSHQKR OHYDQGRVHHPFRQVLGHUDomRDVLQIRUPDo}HVGLVSRQtYHLVDOpPGHLQFOXLURVULVFRV LGHQWLÀFDGRV (QWHQGLPHQWRGDVUHODo}HVGHLQWHUGHSHQGrQFLDHQWUHRVGLYHUVRVFRPSRQHQWHVGH XPDRUJDQL]DomREHPFRPRHQWUHDRUJDQL]DomRHRDPELHQWHH[WHUQR $WXDomRTXHVHGHÀQHSHODUHODomRpWLFDHWUDQVSDUHQWHGDRUJDQL]DomRFRPWRGRV RVS~EOLFRVFRPRVTXDLVVHUHODFLRQDHVWDQGRYROWDGDSDUDRGHVHQYROYLPHQWR VXVWHQWiYHOGDVRFLHGDGHSUHVHUYDQGRUHFXUVRVDPELHQWDLVHFXOWXUDLVSDUDJHUDo}HV IXWXUDVUHVSHLWDQGRDGLYHUVLGDGHHSURPRYHQGRDUHGXomRGDVGHVLJXDOGDGHVVRFLDLV FRPRSDUWHGDHVWUDWpJLDGDRUJDQL]DomR (VWDEHOHFLPHQWRGHUHODo}HVFRPDVSHVVRDVFULDQGRFRQGLo}HVSDUDTXHHODVVH UHDOL]HPSURÀVVLRQDOPHQWHHKXPDQDPHQWHPD[LPL]DQGRVHXGHVHPSHQKRSRUPHLR GRFRPSURPHWLPHQWRGHVHQYROYLPHQWRGHFRPSHWrQFLDVHHVSDoRSDUDHPSUHHQGHU &RPSUHHQVmRGRVIDWRUHVTXHDIHWDPDRUJDQL]DomRVHXHFRVVLVWHPDHRDPELHQWH H[WHUQRQRFXUWRHQRORQJRSUD]RYLVDQGRDVXDSHUHQL]DomR
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Gestão da Qualidade
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Resumidamente, os critérios de excelência são (FNQ, 2011): 1. Liderança: aborda os processos gerenciais relativos à orientação filosófica da organização e controle externo sobre sua direção; ao engajamento, pelas lideranças, das pessoas e partes interessadas na sua causa; e ao controle de resultados pela direção. 2. Estratégias e Planos: examina os processos gerenciais relativos à concepção e à execução das estratégias, inclusive aqueles referentes ao estabelecimento de metas e à definição e ao acompanhamento de planos necessários para o êxito das estratégias. 3. Clientes: aborda os processos gerenciais relativos ao tratamento de informações de clientes e mercado e à comunicação com o mercado e clientes atuais e potenciais. 4. Sociedade: examina os processos gerenciais relativos ao respeito e tratamento das demandas da sociedade e do meio ambiente e ao desenvolvimento social das comunidades mais influenciadas pela organização. 5. Informação e Conhecimento: aborda os processos gerenciais relativos ao tratamento organizado da demanda por informações na organização e ao desenvolvimento controlado dos ativos intangíveis geradores de diferenciais competitivos, especialmente os de conhecimento. 6. Pessoas: aborda os processos gerenciais relativos à configuração de equipes de alto desempenho, ao desenvolvimento de competências das pessoas e à manutenção do seu bem-estar. 7. Processos: examina os processos gerenciais relativos aos processos principais do negócio e aos de apoio, tratando separadamente os relativos a fornecedores e os econômico-financeiros. 8. Resultados: aborda os resultados da organização na forma de séries históricas e acompanhados de referenciais comparativos pertinentes, para avaliar o nível alcançado, e de níveis de desempenho associados aos principais requisitos de partes interessadas, para verificar o atendimento. Cada critério apresenta um detalhamento, na forma de uma quantidade de itens, podendo chegar até seis (no caso do ciclo de 2010) para o Critério 8 – Resultados. A Tabela 3.7 apresenta os 8 critérios e 23 itens, bem como a pontuação para cada um deles para o ciclo de 2010 do PNQ. Geralmente, os critérios sofrem alterações a cada ciclo de premiação. As mudanças mais drásticas ocorrem a cada dois ou três anos, enquanto melhorias incrementais são introduzidas anualmente. Essas mudanças são necessárias para que o modelo evolua e se atualize e considere também as tendências bem-sucedidas de gestão das organizações, ou seja, o estado da arte na busca da excelência do desempenho.
Capítulo 3
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A ideia é que uma organização estabeleça práticas que venham a ser adequadas, atendendo assim aos itens e, consequentemente, aos critérios. Na verdade, esses itens também são subdivididos em tópicos que consideram o planejamento, as práticas de gestão e os padrões de trabalho utilizados, o controle dessas práticas e o aprendizado. As práticas e padrões de trabalho variam de acordo com o tema que cada item trata. Por exemplo, as práticas relativas à capacitação e ao desenvolvimento das pessoas são diferenciadas daquelas estabelecidas para o relacionamento com os clientes. O ciclo de controle considera como é realizada a medição do desempenho das práticas de gestão do item e de que forma é feita a comparação com os padrões de trabalho estabelecidos. De acordo com a FNQ, um padrão de trabalho pode ser uma rotina de trabalho, um procedimento, normas administrativas ou qualquer meio que permita orientar a gestão, podendo ser definido em função de normas internacionais, estudos de benchmarking, nível de desempenho dos concorrentes ou metas organizacionais. Apesar de não ser uma regra geral, espera-se que esses padrões de trabalho sejam associados a uma meta, ou seja, onde pretende-se chegar, de tal forma que se possa verificar se as práticas são eficazes. Por exemplo, supondo que existam diversas práticas relacionadas à construção da imagem da organização junto ao mercado, uma pesquisa top of mind, realizada com os clientes, pode verificar se essas práticas de divulgação da empresa estão efetivamente resultando no esperado, ou seja, se os clientes indicam uma marca, um produto ou a própria organização. Poderia também ter sido estabelecida uma meta (ou um padrão) de 70% de clientes que citariam a organização. Os resultados da pesquisa seriam então comparados com essa meta para saber se esta foi alcançada ou mesmo superada. Periodicamente, essas práticas devem ser revistas visando à sua melhoria contínua, ou mesmo, caso os resultados tenham sido inferiores às metas, ao aperfeiçoamento dos padrões, como, por exemplo, o questionário usado na pesquisa, o tamanho da amostra, em casos que esta não seja estatisticamente suficiente para obter resultados com baixo grau de incerteza etc. A partir dessas necessidades de mudanças visando a melhorias, tem-se, então, estabelecido o ciclo de aprendizado. Obviamente, qualquer organização está sempre aprendendo, mas a ênfase dessa avaliação é verificar se existem ciclos de aprendizado estabelecidos e sistemáticos, considerando, geralmente, fóruns em que isso é verificado, indicadores e/ou informações qualitativas, periodicidade, bem como responsáveis por essa avaliação. Espera-se também que ocorram melhorias introduzidas nos padrões de trabalho, decorrentes desse processo de avaliação. O modelo de gestão, mostrado na Figura 3.7, cujo detalhamento dos critérios, itens e respectiva pontuação é mostrado na Tabela 3.7, é dividido em dois grupos principais: enfoque & aplicação e resultados. Os critérios de enfoque e aplicação correspondem aos critérios de 1 a 7, e o de resultados corresponde ao critério 8. Essa diferença é desenvolvida em mais detalhes no tópico “Processo de Avaliação”.
111
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Gestão da Qualidade
ELSEVIER Tabela 3.7: Critérios de excelência 2010 Critérios e Itens (Pontuação)
1.
Liderança (110)
*RYHUQDQoDFRUSRUDWLYD
([HUFtFLRGDOLGHUDQoDHSURPRomRGDFXOWXUDGHH[FHOrQFLD
$QiOLVHGRGHVHPSHQKRGDRUJDQL]DomR
2.
Estratégias e Planos (60)
)RUPXODomRGDVHVWUDWpJLDV
,PSOHPHQWDomRGDVHVWUDWpJLDV
3.
Clientes (60)
,PDJHPHFRQKHFLPHQWRGRPHUFDGR
5HODFLRQDPHQWRFRPFOLHQWHV
4.
Sociedade (60)
5HVSRQVDELOLGDGHVRFLRDPELHQWDO
'HVHQYROYLPHQWRVRFLDO
5.
Informações e Conhecimento (60)
,QIRUPDo}HVGDRUJDQL]DomR
$WLYRVLQWDQJtYHLVHFRQKHFLPHQWRRUJDQL]DFLRQDO
6.
Pessoas (90)
6LVWHPDVGHWUDEDOKR
&DSDFLWDomRHGHVHQYROYLPHQWR
4XDOLGDGHGHYLGD
7.
Processos (110)
3URFHVVRVSULQFLSDLVGRQHJyFLRHSURFHVVRVGHDSRLR
3URFHVVRVUHODWLYRVDIRUQHFHGRUHV
3URFHVVRVHFRQ{PLFRÀQDQFHLURV
8.
Resultados (450)
5HVXOWDGRVHFRQ{PLFRÀQDQFHLURV
5HVXOWDGRVUHODWLYRVDRVFOLHQWHVHDRPHUFDGR
5HVXOWDGRVUHODWLYRVjVRFLHGDGH
5HVXOWDGRVUHODWLYRVjVSHVVRDV
5HVXOWDGRVUHODWLYRVDSURFHVVRV
5HVXOWDGRVUHODWLYRVDIRUQHFHGRUHV Total de pontos possíveis
1000
Fonte: FNQ (2011).
Desde sua criação, em 1992, o Prêmio Nacional da Qualidade foi concedido às empresas apresentadas na Tabela 3.8. É importante observar que o número de vencedoras pode variar de ano para ano, ou seja, pode haver mais de uma organização que recebe o prêmio. Outro aspecto importante é que, desde o ciclo 2000, não existem mais limites de número de prêmios por categoria (porte e faturamento) da organização. As categorias de empresas que podem concorrer são: grandes empresas (mais de 500 funcionários); médias empresas (de 51 a 500 funcionários), pequenas e microempresas (até 50 funcionários); órgãos da administração pública federal; organizações de Direito Privado sem
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fins lucrativos (as categorias das empresas vencedoras são mostradas entre parênteses na Tabela 3.8). Essa alteração foi importante, pois eliminou uma interpretação equivocada de competição entre as organizações, uma vez que o limite era de dois prêmios por categoria. Nota-se pela Tabela 3.8 que três empresas foram vencedoras em 1997, duas em 1999, três em 2002, e duas em 2003. À medida que as organizações vão se aprimorando nas suas práticas de gestão e nos processos de avaliação, a tendência é que mais e mais empresas sejam detentoras do prêmio. É também necessário lembrar que o prêmio é destacado para um ano específico, ou seja, para o ano que a empresa se candidatou e recebeu a premiação. Com o passar do tempo, tanto a organização que recebeu o prêmio naquele ano, quanto os concorrentes sofreram as influências naturais do mercado. Sendo assim, não necessariamente as práticas de gestão e resultados de desempenho são perenes, e também devem ser aprimorados e adequados para a provável nova realidade competitiva. Tabela 3.8: Vencedoras do PNQ no Brasil de 1992 a 2010 Ano
Empresa (Categoria) ,%06XPDUp0DQXIDWXUDV ;HUR[GR%UDVLO0DQXIDWXUDV &LWLEDQN²6HJPHQWRGH3HVVRD)tVLFD3UHVWDGRUDGH6HUYLoRV 6HUDVD3UHVWDGRUDGH6HUYLoRV $OFRD²3RoRVGH&DOGDV0DQXIDWXUDV :HJ0RWRUHV0DQXIDWXUDV &RSHVXO0DQXIDWXUDV &LWLEDQN&RUSRUDWH%DQNLQJ3UHVWDGRUD GH6HUYLoRV 6LHPHQV0DQXIDWXUDV &HWUHO6$²(PSUHVDGH3URWHomR$PELHQWDO0pGLDV(PSUHVDV &DWHUSLOODU0DQXIDWXUDV 6HUDVD*UDQGHV(PSUHVDV %DKLD6XO&HOXORVH6$*UDQGHV(PSUHVDV ,UPDQGDGH6DQWD&DVDGH0LVHULFyUGLDGH3RUWR$OHJUH2UJDQL]Do}HVVHP)LQV/XFUDWLYRV 3ROLWHQR,QG~VWULDH&RPpUFLR6$0pGLDV(PSUHVDV *HUGDX$oRV)LQRV3LUDWLQL*UDQGHV (PSUHVDV (VFULWyULRGH(QJHQKDULD-RDO7HLWHOEDXP0pGLDV(PSUHVDV 'DQD$OEDUXV²'LYLVmRGH &DUGDQV²*UDYDWDt*UDQGHV(PSUHVDV %HOJR-XL]GH)RUD*UDQGHV(PSUHVDV 6X]DQR3HWURTXtPLFD6$0pGLDV(PSUHVDV 6HUDVD6$*UDQGHV(PSUHVDV &RPSDQKLD 3DXOLVWDGH)RUoDH/X]*UDQGHV(PSUHVDV %HOJR6LGHUXUJLD6$*UDQGHV(PSUHVDV 3URPRQ6$*UDQGHV(PSUHVDV *HUGDX$oRV/RQJRV6$²8QLGDGH*HUGDX5LRJUDQGHQVH *UDQGHV(PSUHVDV )UDVOH6$*UDQGHV(PSUHVDV $OEUDV$OXPtQLR%UDVLOHLUR*UDQGHV (PSUHVDV &3)/3DXOLVWD*UDQGHV(PSUHVDV 6X]DQR3DSHOH&HOXORVH*UDQGHV(PSUHVDV $(6(OHWURSDXOR*UDQGHV(PSUHVDV %UDVDO5HIULJHUDQWHV*UDQGHV(PSUHVDV &3)/ 3LUDWLQLQJD*UDQGHV(PSUHVDV 9ROYR&DPLQK}HV*UDQGHV(PSUHVDV $(66XO(OHNWUR
Fonte: FNQ (2011).
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Gestão da Qualidade
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A Figura 3.8 mostra a evolução no número de empresas finalistas (as empresas vencedoras estão na quantidade mostrada) desde a primeira premiação (ciclo de 1992).
Figura 3.8 – Finalistas do PNQ de 1992 a 2010 (incluindo-se as vencedoras; esta é uma HVWLPDWLYDFRPEDVHQRVGDGRVGD)14SRLVDRUJDQL]DomRÀQDOLVWDSRGHRSWDUSHOD não divulgação).
Quando observa-se a Figura 3.8, nota-se um período de redução nas finalistas, após o primeiro ciclo. No momento que o PNQ surgiu, em 1992, ele veio como algo novo que talvez projetasse as empresas vencedoras. Houve então, no início, um grande número de participantes para uma primeira vez, totalizando 29 candidatas no ciclo de 1992. Diferente dos anos seguintes, nesse primeiro ciclo houve dez organizações finalistas,19 apesar de ser um processo ainda em fase inicial. Provavelmente, considerou-se que vencer o prêmio seria uma tarefa fácil, havendo um recuo, tanto na quantidade de candidaturas (não mostrada no gráfico) quanto no número de finalistas. A partir de 1997, pode-se afirmar que o PNQ iniciou uma fase de maturidade, conquistando espaço no mercado, passando a ter maior credibilidade como instrumento para melhorar a gestão das organizações. Em suma, de um período em que as organizações tinham pouco conhecimento e candidataram-se para serem as primeiras a vencer, seguido por um recúo, passa-se para um período com maior conscientização e preocupação na estruturação organizacional, sendo o prêmio como uma consequência dessa estruturação e busca pela excelência organizacional, com certa estabilização nos últimos 5 anos.
19
ADP System, Alcoa, Credicard, Delco Remy, Ford Elétrica, IBM, Lord Industrial, Metal Leve, Promon Engenharia, Siderúrgica Tubarão.
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3.7.1. Processo de avaliação
No processo de avaliação, primeiramente a organização deve enviar um formulário de elegibilidade com recolhimento de uma pequena taxa para processamento dessa fase. A elegibilidade consiste em prover informações relativas à organização como dados básicos, porte da empresa, receita anual, principais clientes, fornecedores e concorrentes, e a FPNQ verifica se a empresa é elegível para a categoria indicada. Posteriormente, a organização é então convidada para o processo de avaliação. A Figura 3.9 mostra o cronograma do processo de avaliação completo, desde a emissão dos critérios no ano anterior até a cerimônia de premiação para o ciclo de 2010.
Figura 3.9 – Ciclo de premiação 2010.
O processo de avaliação dos relatórios de gestão (indicados pelo período de junho a outubro de 2010 na Figura 3.9), consiste basicamente em três etapas de avaliação, feita pelos examinadores, e no julgamento entre cada uma dessas etapas, para definir se a candidata segue para a etapa seguinte. A etapa I compreende a redação de um relatório de avaliação (RA) por volta de 6 a 8 examinadores, sendo coordenado por um examinador sênior, auxiliado na redação por um relator. Essa etapa compreende uma análise crítica individual do relatório de gestão da organização candidata, feita pelos examinadores designados para ela. Caso a candidata passe para a etapa II, em função da pontuação média obtida na etapa I, esta consiste numa reunião de consenso, ou seja, uma análise crítica de consenso para alcançar uma pontuação concordante por todos os examinadores. Nessa etapa, o grupo de examinadores é reduzido para até 6, sendo um sênior e um relator (geralmente os mesmos da etapa I). Novamente, os juízes analisam se a organização segue para a etapa III, que é a etapa de visita às instalações da candidata, com duração de dois a quatro dias, dependendo do porte da organização. Essa visita tem por objetivo esclarecer alguns pontos do relatório de gestão da organização e também, ainda de forma restrita, verificar as práticas que não correspondam à realidade. Também são utilizados seis examinadores, mantendo-se o sênior, o relator e os mesmos examinadores que participaram da etapa de consenso. Caso a candidata não siga para qualquer uma
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das etapas subsequentes, receberá um relatório de avaliação respectivo a essa etapa. No total, são despendidas aproximadamente 800 horas, em média, pelo grupo de examinadores. Os examinadores são selecionados com base na sua experiência e na capacidade para participar do processo de avaliação. Geralmente são profissionais provenientes de empresas da iniciativa privada e de órgãos governamentais, consultores e, embora de forma restrita, incluem especialistas de universidades e centros de pesquisa. Outro ponto importante é que os examinadores devem considerar se têm conflito de interesse com a candidata que avaliarão, seguindo um código de ética emitido pela Fundação Nacional da Qualidade. Por outro lado, as organizações que recebem o prêmio devem divulgar informações e práticas organizacionais que não afetem o sigilo dessas organizações, desde as estratégias, os processos e as práticas de gestão até seus resultados. Essa divulgação é, geralmente, feita por meio das apresentações dos seminários anuais promovidos pela FNQ e por relatórios impressos e disponibilizados para aquisição pela FNQ. 3.7.2. Sistema de pontuação
A premiação considera três dimensões para determinação da pontuação dos itens: enfoque, aplicação e resultados. A atribuição de pontuação considera os pontos fortes da gestão organizacional e os pontos fracos, denominados oportunidades de melhoria. Como descrito anteriormente, as organizações devem relatar as práticas que utilizam para cumprir os itens e critérios explicitados no prêmio. O enfoque considera como os requisitos de determinado item são cumpridos. A ênfase é mais dirigida à prevenção do que à correção. Os fatores utilizados para avaliar o enfoque são: UÊ Adequação dos métodos, das ferramentas e técnicas. UÊ Eficácia dos métodos, das ferramentas e técnicas. UÊ Quanto sistemático é o enfoque e quão é consistente e sistemáticamente aplicado. UÊ Grau de integração entre as práticas. UÊ Extensão pela qual o enfoque é baseado na prevenção. UÊ Exemplaridade ou inovação do enfoque, incluindo adaptações de ferramentas e técnicas utilizadas em outras aplicações ou em outras áreas de atuação. UÊ Extensão pela qual o enfoque considera ciclos de avaliação e melhoria. A aplicação refere-se à extensão pela qual os métodos e procedimentos são considerados vertical e horizontalmente na organização. A aplicação vertical é uma medição da extensão que os objetivos-chave descem da alta direção para os níveis de operação da organização. A aplicação horizontal é uma medição da extensão em que as práticas organizacionais, os métodos de gestão e as ferramentas estão permeadas pelas áreas funcionais da organização. Também são verificados pelos examinadores a aplicação eficaz dos enfoques por todas as unidades, os processos e as atividades e os produtos e serviços
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da organização, bem como todas as transações relacionadas com clientes, fornecedores e com o público em geral. Na verdade, a aplicação é um teste da maturidade do programa de excelência na organização. Também é requerido para os examinadores verificarem se o enfoque é exemplar, ou seja, se pode ser considerado como uma espécie de modelo, considerando o setor industrial ao qual a organização pertence. Com relação aos resultados organizacionais, o modelo tenta identificar fatores que influenciam nos resultados finais alcançados pela organização. Os resultados referem-se aos outputs da organização, seus efeitos e impactos. Os fatores utilizados para avaliar os resultados incluem: UÊ Níveis de desempenho comparados com os referenciais. UÊ Demonstração de melhorias sustentadas (tendências positivas). UÊ Taxa de melhoria de desempenho. UÊ Importância da melhoria no desempenho relativa às dimensões de enfoque e aplicação. Os examinadores consideram se existe uma relação consistente entre os resultados coletados e os requisitos dos itens a serem examinados. Adequação, melhorias excelentes e sustentadas nas áreas-chave também são consideradas, sendo seu desempenho comparado com os referenciais (benchmarks). Em qualquer que seja a dimensão, também é considerado pelos examinadores se as práticas e resultados finais são cobertos, considerando cada item em cada critério de avaliação. Como visto anteriormente, o modelo utiliza um sistema de escala de 0 a 1.000 pontos. Para cada item é atribuída uma pontuação de 0 a 100%, em incrementos de 10%, dependendo do mérito do que está relatado no relatório de gestão da organização. O percentual atribuído é então multiplicado pela pontuação de cada item (apresentado na Tabela 3.6). A pontuação final é um somatório das pontuações individuais dos itens. Tanto para a atribuição da pontuação quanto para o relato dos pontos fortes e das oportunidades de melhoria, utiliza-se um software especialmente projetado para a condução do processo de avaliação. Esse processo de avaliação tem conduzido as organizações instaladas no Brasil, sejam nacionais ou de origem estrangeiras, a uma melhoria no desempenho de seus processos de gestão e de seus resultados. O processo está direcionado para alcançar diversos benefícios para as organizações e também para o país. Entre esses benefícios, cabe citar os seguintes: UÊ Submeter o sistema de gestão da empresa a uma avaliação independente, que utiliza critérios reconhecidos internacionalmente, executada por profissionais competentes, com investimento mínimo (para o processo de avaliação), viabilizando ações objetivas de melhoria de gestão. UÊ Deflagrar processos de melhoria do sistema de gestão, aumentando a sinergia e o envolvimento das pessoas, já no preparo do relatório de gestão.
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UÊ Propiciar o reconhecimento de sua força de trabalho e aumentar a integração e o espírito de equipe ao ser selecionado para as etapas sucessivas. UÊ Destacar-se como organização de classe mundial, caso seja premiada. UÊ Além desses benefícios, todas as organizações participantes recebem um relatório de avaliação detalhado, diagnosticando os pontos fortes e oportunidades de melhoria. O conteúdo desse relatório de avaliação constitui uma rica fonte de informações e dados para a organização, a partir do qual ela poderá definir um plano de ação para realizar as melhorias necessárias e voltar a se candidatar ao PNQ. Qualidade em ação Premiada PNQ 2003 (médias empresas): Escritório de Engenharia Joal Teitelbaum O Escritório de Engenharia Joal Teitelbaum (EEJT) de Porto Alegre, após ter conquistado todos os níveis do Prêmio Qualidade RS do Programa Gaúcho da Qualidade e Produtividade, foi a primeira organização do setor de construção civil a receber o Prêmio Nacional da Qualidade na categoria de Médias Empresas em 2003. O escritório, que há 42 anos projeta e executa exclusivamente construções em sistema de preço de custo, caracteriza-se pela exigência de que seus parceiros estratégicos estejam participando do Programa Gaúcho de Qualidade e Produtividade, com isso difundindo os fundamentos de gestão dos processos de qualidade, produtividade, competitividade, preservação ambiental e de responsabilidade social e ética, direcionados sempre para a medição e aferição de resultados. O EEJT foi fundado em 1961 e dedica-se desde então a construções residenciais e comerciais, tendo como seus principais processos: análise de mercado; concepção inicial do produto; análise de viabilidade financeira; compra de terreno pelo investidor, pelo EEJT ou permuta por área construída; coordenação de projetos e formulação do projeto de prefeitura e projeto executivo; construção do empreendimento; e venda do empreendimento. O EEJT tem 15 funcionários diretos, além do diretor presidente; e todos os colaboradores dos canteiros de obra (134) são funcionários de empreiteiras terceirizadas. Entre as práticas de gestão destacam-se uma forte Política da Qualidade e Meio Ambiente, Saúde e Segurança (PQMASS), com um planejamento estratégico desenvolvido com base na PQMASS, uma análise crítica do desempenho global estruturada com base nas diretrizes do planejamento estratégico e gerenciada por meio da metodologia do Balanced Scorecard, utilização de programas, técnicas e ferramentas tais como: análise SWOT (Strengthens – Weakness – Opportunities – Threats, ou Pontos Fortes – Pontos Fracos – Oportunidades – Ameaças) da empresa, programa 5S, matriz de importância e desempenho no planejamento global de marketing, seleção e classificação de fornecedores e gestão de riscos.
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Como resultados de excelência, a empresa apresenta taxa de inadimplência igual a zero desde 1994, taxa de frequência de acidentes de trabalho com afastamento igual a zero há mais de quatro anos, desde 2003, com diminuição de retrabalho, chegando a zero, e contínuo crescimento da satisfação dos colaboradores e das empreiteiras de mão de obra desde 1998. Salienta-se ainda que, em 42 anos, a empresa nunca sofreu penalizações de qualquer natureza e, da mesma forma, nunca teve ação judicial movida contra si. O EEJT é reconhecido como um benchmark (referencial de excelência) por diversas organizações, principalmente por seu sistema de gestão da qualidade e ambiental, o qual já recebeu inúmeras premiações, sendo a construtora mais premiada no Brasil nestas áreas. O relatório de gestão da empresa, publicado pela FPNQ, traz as práticas organizacionais e os resultados alcançados por essa empresa de classe mundial. Fonte: Classe Mundial (2003).
Qualidade em ação Finalista PNQ 2004, premiada PNQ 2005 e 2008 (grandes empresas): CPFL Paulista A CPFL paulista é reconhecida por excelência na gestão, tendo sido finalista do PNQ na categoria Grandes Empresas em 2004 e premiada em 2005 e 2008. A empresa atua em 234 cidades do interior de São Paulo, cobrindo uma área geográfica de 90,4 mil km2, o que corresponde a 37% do território estadual, com aproximadamente 8,3 milhões de habitantes e 3,4 milhões de domicílios sob sua responsabilidade. Seu mercado de atuação abrange uma economia baseada na indústria, principalmente nos segmentos químico, têxtil, calçadista, de alimentos e de papel e celulose. Os centros comerciais, juntamente com a agroindústria também são fortes clientes da CPFL paulista, destacando-se shoppings, frigoríficos e usinas sucroalcooleiras. A CPFL paulista destaca-se como a quarta empresa distribuidora de energia elétrica do país, responsável por 20% de toda a eletricidade consumida no Estado de São Paulo e cerca de 6% da utilizada no Brasil. Seu faturamento anual é de R$ 6,8 bilhões com uma força de trabalho de 3.028 pessoas. Entre as práticas organizacionais destacam-se a implementação de práticas avançadas de governança corporativa, motivadas pela preocupação de aprofundar e ampliar a transparência dos processos de decisão e comando, programa de sustentabilidade e responsabilidade corporativa, programa e valorização da diversidade, e estreitamento do relacionamento com as comunidades por meio de programas de saúde, arte, cultura e educação e apoio às Santas Casas de Misericórdia. A empresa conta com um programa de Qualidade Total desde 1991, sendo a primeira empresa de distribuição de energia no mundo a possuir certificação nos padrões normativos ISO
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9001 e ISO 14001, OHSAS 18001 e SA 8000, consolidando um Sistema de Gestão Integrado de Qualidade, Meio Ambiente, Segurança e Responsa bilidade Social, abrangendo todos os principais processos de negócios relativos à distribuição e comercialização de energia elétrica. A empresa adotou os critérios de excelência do PNQ em 2002, incorporando-os à sua gestão organizacional. A CPFL paulista é o referencial (benchmark) nacional, com o menor tempo médio que o cliente fica sem energia durante o ano. Desde 2001, não foram constatadas na CPFL paulista não conformidades em auditorias externas do Sistema Integrado de Gestão. A empresa apresenta desempenho superior aos referenciais comparativos no tempo médio de atendimento urbano, isto é, o tempo médio que o cliente é atendido quando solicita serviços de emergência, demonstrando a eficiência operacional das equipes de eletricistas no atendimento da área urbana, bem como no tempo médio de atendimento rural. A idade média da frota também é favoravelmente inferior ao referencial de comparação (5,6 contra 7 anos), indicador utilizado para gerenciar a manutenção da frota, resultando em menores custos de manutenção quanto menor a idade dos veículos. Entre os diversos prêmios recebidos pela CPFL paulista, destacam-se o de melhor distribuidora de energia elétrica da Região Sudeste, com o prêmio IASC (Índice Aneel de Satisfação do Consumidor); inclusão na lista das “100 Melhores Empresas para Você Trabalhar” e na lista das “11 Melhores Empresas com Melhores Práticas de Cidadania Empresarial” da revista Exame, por dois anos consecutivos, Prêmio Banas Ouro de Qualidade – melhor desempenho na gestão integrada de resultados e finalista do 17th Annual Corporate Conscience Awards 2003 – SA 8000 Responsible Workplace, conduzido pela Social Accountability International, organismo americano gestor da Norma SA 8000. Todo esse histórico de desempenho demonstra uma evolução nas práticas organizacionais de gestão e o comprometimento com a busca da excelência do desempenho e a melhoria da competitividade. A empresa segue o modelo de gestão do PNQ desde o ano 2000 e considera o tripple-botton line da sustentabilidade em seu planejamento estratégico. O conceito de liderança está ligado às melhores práticas de governança corporativa. É por meio do respeito aos acionistas minoritários, da adesão à lei Sarbanes-Oxley (responsabilidade fiscal), e principalmente do cumprimento do Código de Ética e de Conduta Empresarial que a companhia valoriza seus princípios e cuida para que eles pautem todos os níveis de gestão. Fonte: Classe Mundial (2004; 2008).
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Qualidade em ação Premiada PNQ 2004 (grande empresa): Belgo Juiz de Fora Em menos de dez anos, a empresa saiu de uma situação extremamente delicada, com diversos problemas operacionais e administrativos; e, graças a uma gestão competente e moderna, obteve uma série de vitórias – até alcançar, em 2004, o Prêmio Nacional da Qualidade. Essa é a trajetória da Belgo Juiz de Fora, nascida a partir de um contrato de arrendamento, pelo Grupo Belgo, da antiga Siderúrgica Mendes Júnior, que, no ano de 1995, operava com apenas 20% de sua capacidade instalada. Sob a gestão Belgo, já no ano seguinte, a Usina de Juiz de Fora batia recordes históricos de produção de aço, como resultado dos primeiros esforços de uma filosofia que priorizava a qualidade na gestão. Os passos seguintes incluíram as certificações IS0 14001, OHSAS 18001 e a recertificação na norma IS0 9001 que, unificadas, constituíram o Sistema de Gestão Integrada e outras importantes conquistas em todas as áreas da empresa – segurança, desenvolvimento de novos produtos, posicionamento de mercado, valorização do empregado e reconhecimento pela comunidade. Em 1999, um novo patamar de segurança era estabelecido com a marca de 425 dias sem acidentes com afastamento do empregado. No ano 2000, a Belgo Juiz de Fora adotou os Critérios de Excelência da FPNQ como forma de exercer a filosofia da “qualidade da gestão” e, assim, visualizar a empresa sob uma óptica sistêmica. Hoje, a Belgo Juiz de Fora é uma das mais atuantes usinas siderúrgicas do Brasil, com uma linha de aços essenciais à indústria e à construção civil. Sua unidade está produzindo 1 milhão de toneladas/ano e é modelo sob vários aspectos operacionais. A Usina emprega sucata metálica como matéria-prima e recircula 99% da água que utiliza em seus processos. Além disso, novos equipamentos de redução de emissões e o uso progressivo de fontes alternativas de energia colocam a Belgo Juiz de Fora na vanguarda do desenvolvimento sustentável. Com uma gestão que dá ênfase às pessoas, a empresa foi a primeira siderúrgica do mundo certificada na norma internacional da Responsabilidade Social – AS 8000, que também reconheceu o extenso trabalho da Belgo Juiz de Fora Siderurgia junto às comunidades de sua área de influência, por meio de programas pioneiros e vitoriosos. Fonte: FPNQ, Press Release, 28/2004 – 5/11/2004.
3.8. Modelos de excelência no mundo A partir do lançamento do Malcolm Baldrige National Quality Award, inúmeros outros modelos de excelência foram propostos por diversas nações em todo o mundo. Outros precursores desses modelos de excelência foram o Prêmio Australiano (Australian Business Excellence Award) e o Prêmio Canadense (Canadian Quality Award), ambos
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lançados na mesma época do Malcolm Baldrige National Quality Award. A introdução de prêmios por outros países tem ocorrido em uma média superior a dois por ano, desde 1988. Desde a introdução de inúmeros prêmios, vários estudos20 vêm sendo conduzidos no sentido de comparar esses prêmios principais. Em anterior estudo21 levantou-se um total de 76 nações com modelos de excelência, presentes em todas as regiões do globo, com 5% na África, 20% nas Américas, 29% na Ásia, 42% na Europa e 4% na Oceania. Além desses prêmios em nível nacional, existem hoje três modelos de excelência “regionais”: Asia Pacific Quality Award, Prêmio Ibero-americano da Qualidade e o European Quality Award. O estudo comparativo entre mais de 30 desses prêmios revelou os seguintes resultados principais:22 UÊ A mais frequente missão e os objetivos dos prêmios nacionais, são o “reconhecimento da excelência no desempenho” e das melhores práticas, e a “comunicação e o compartilhamento da excelência e das melhores práticas”. Essas duas missões estão presentes em quase a metade de 33 prêmios estudados. UÊ Sessenta e oito por cento de 25 prêmios estudados utilizaram o prêmio americano como o modelo inicial. Alguns países utilizam até hoje o Malcolm Baldrige National Quality Award na íntegra, como, por exemplo, o Equador, Hong Kong, a Nova Zelândia, o Sri Lanka e outros. UÊ Os fundamentos de excelência mais comuns são: foco no cliente, liderança, valorização das pessoas e responsabilidade social. Esses fundamentos estão presentes em 24 prêmios estudados. UÊ O número de categorias de empresas elegíveis (para 33 prêmios estudados) é cinco, aberto a quaisquer tipos de empresas. UÊ Mais da metade de 33 prêmios estudados consideram uma separação entre as categorias de organizações privadas e públicas. É importante notar que nem todos os prêmios consideram órgãos públicos, bem como quase 60% consideram organizações sem fins lucrativos. UÊ A quantidade de critérios e itens para um “prêmio médio” seria, respectivamente, 8 e 25, sendo a quantidade de 7 critérios e 19 itens os mais frequentes. UÊ Dez de cada 15 prêmios estudados atribuem pelo menos 400 pontos para o critério de resultados.
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Alguns desses estudos são: BOHORIS (1995); GHOBADIAN e WOO (1996); VOKURKA et al. (2000); e MIGUEL (2001). 21 Miguel, P.A.C. A Report on Comparing Worldwide Quality and Business Excellence Awards – Part 1: Systems of Operations, Core Values and Assessment Criteria. Baldrige National Quality Program, National Institute of Standards and Technology, julho, 2004. 22 Para mais detalhes ver Miguel, P.A.C. An Overview of Quality and Business Excellence Awards. CD ROM do International World Quality and Improvement Conference, ASQ, Seattle, 2005.
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UÊ A grande maioria dos prêmios (15 de 16 prêmios estudados) consideram as seguintes dimensões para a pontuação de resultados: clientes, produto, processos organizacionais, fornecedores, econômico-financeiros, mercado, pessoas, e sociedade. Como pode ser visto neste capítulo, os modelos de excelência, traduzidos na forma de um prêmio de nível nacional, vêm como um importante mecanismo de incentivo às empresas, para estruturarem sua gestão na busca da excelência em qualidade, produtividade e competitividade. Para ilustrar a relevância desses modelos, a Figura 3.10 mostra depoimento de um executivo da Belgo Juiz de Fora e da AeS Sul, premiadas, respectivamente em 2004 e 2010. Pode-se notar nesses depoimentos a busca da melhoria contínua e da excelência organizacional. Foram notáveis os progressos em as práticas de gestão com base no PNQ, nos processos e na identificação e correção de falhas na empresa, trazendo mudanças objetivas, tangíveis, perceptíveis e mensuráveis. Luiz Ernesto Gemignani, diretor-presidente da PROMON, premiada pelo PNQ em 2007. Para nós, o PNQ é a consolidação de um trabalho consistente e maduro. O entendimento das pessoas em relação ao MeG (Modelo de Excelência em Gestão) vai se consolidando e este reconhecimento é uma constatação dessa disposição. Antonio Carlos de Oliveira, diretor-geral da AeS Sul, premiada pelo PNQ em 2010. Figura 3.10 – Relatos sobre a adoção do PNQ e seus resultados.
3.9. Estudo de caso A Gerdau Aços Finos Piratini – AFP é uma empresa que faz parte do Grupo Gerdau S.A. Reproduz e comercializa aços especiais normatizados para usinagem, forjamento a frio e a quente, além de trefilação. A AFP está situada na cidade de Charqueadas, RS, a cerca de 60km a sudoeste de Porto Alegre, ocupando uma área de 100 hectares, sendo 15 hectares de área construída, e com uma capacidade produtiva anual de 310 mil toneladas. Seus produtos, aços para construção mecânica – CM (aços carbono ligados) e alta liga – AL (inoxidáveis e aços ferramenta para trabalho a frio, a quente e para moldes plásticos) são, na sua maioria, destinados, direta ou indiretamente, à cadeia de produção automotiva. O aço de CM é utilizado em diversos setores, em especial na indústria automotiva e seus fornecedores, como, por exemplo, para a manufatura de sistemas de direção e suspensão, eixos de transmissão, engrenagens de caixa de câmbio, motores etc. O aço inoxidável é usado para a indústria em geral, destacando-se os fabricantes de cutelarias, válvulas e conexões. Também o aço-ferramenta é adotado pela indústria em geral, especialmente na fabricação de ferramentas de corte, matrizes para injeção de plásticos e de metais leves e matrizes para forjamento.
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A força de trabalho da empresa é formada por 1.148 colaboradores (funcionários e trainees operacionais e estagiários de nível técnico e superior), com diferentes graus de escolaridade, sendo 1.099 funcionários e 49 estagiários (base março/2002). Em torno de 68% das pessoas têm mais de cinco anos de tempo de casa, e 4,5% em funções de liderança. O pessoal de prestadores de serviços (328 profissionais dos serviços de alimentação, limpeza da aciaria e recuperação de escória, serviços de manutenção, consultoria e outros) não faz parte da força de trabalho da AFP, pois é supervisionado pelas respectivas empresas contratadas. Em 2000, a AFP migrou de um processo make-to-stock para make-to-order, a fim de possibilitar a gestão de preferências dos clientes e reduzir custos de estoques. Para isso, os processos de comercialização foram reconfigurados. O processo de comercialização da AFP, sob responsabilidade da área comercial, abrange o levantamento das necessidades dos clientes-alvo, o planejamento de vendas e a captação de pedidos dos produtos de linha e de demandas de novos produtos. Os processos relativos ao produto abrangem o projeto de produtos e processos, a cargo da área de desenvolvimento de produtos e processos, e a produção de aços, a cargo das áreas de produção: aciaria, laminação, forjaria e transformação mecânica. Os produtos finais podem originar-se da forjaria (barras e forjados), da laminação (barras e fio-máquina laminados) e de transformação mecânica (barras e fio-máquina laminados, tratados e/ ou acabados). As matérias-primas (sucata, ferro-gusa, ligas e cal) são fundidas, produzindo o aço líquido de acordo com especificações de composição química, passando então ao lingotamento, forjamento, preparo de tarugos, laminação, tratamento térmico, acabamento mecânico e, finalmente, expedição para o cliente. Durante todas as fases de produção são realizadas inspeções e testes para garantir a qualidade do produto. Os principais processos de apoio são: informática, almoxarifado, planejamento e controle da produção – PCP, entregas, garantia da qualidade (engloba os laboratórios químico, mecânico, metalográfico e tecnológico), engenharia/manutenção (inclui utilidades), recursos humanos – RH, segurança, sistemas de gestão, serviços de apoio à operação, custos, desenvolvimento de produtos e processos – DPP e comercial (vendas e marketing). Em 1992 a empresa iniciou a implantação do TQC, sendo certificada pela ISO 9002 em 1992. Mais tarde, em 1994, iniciou a aplicação do Gerenciamento pelas Diretrizes, também implantando um piloto do programa 5S e de pesquisa de satisfação dos clientes. No ano seguinte, o 5S foi estendido para toda a empresa e, em 1996, ocorreu a primeira recertificação da ISO 9002. Também nesse ano, foi introduzido o Gerenciamento da Rotina. Em 1997 e 1998, recebeu, respectivamente, o Troféu Bronze e Prata do Prêmio Qualidade – RS (Rio Grande do Sul). Ainda em 1998, iniciou a implantação da norma QS 9000, sendo certificada no ano seguinte, quando também ocorreu a segunda recertificação pela norma ISO 9002, e premiação com o Troféu Ouro do Prêmio Qualidade – RS. Também em 1999, iniciou a introdução do Sistema SAP R/3. Em 2000, começou a introduzir a metodologia Seis Sigma nos projetos, bem como a estruturação da gestão
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por processos, e implantação do sistema make-to-order, além de ser escolhida para representar o Grupo Gerdau como candidata ao PNQ 2000. Em 2001, ampliou a aplicação da metodologia Seis Sigma, e a unidade AFP é escolhida novamente para representar o Grupo Gerdau como candidata ao PNQ 2001. A empresa vem aplicando um plano de aprimoramento da linha de produção, com investimento da ordem de R$60 milhões nas áreas de laminação, meio ambiente e acabamento. Nos últimos dez anos, os recursos aplicados na usina somaram US$170 milhões. A AFP também investe permanentemente no treinamento. Fazem parte do seu processo de gestão o programa 5S, Grupos para Solução de Problemas, Gerenciamento de Rotina, Programa de Sugestões e Manutenção Autônoma. Em cinco anos, o total de horas de capacitação e formação técnica evoluiu de 84 para 339 horas-homem/ano. Na área de pesquisa, a siderúrgica tem projetos em conjunto com universidades e escolas técnicas, além de contratos de transferência de know-how com diversas empresas do mundo. Com base na descrição anterior, defina em quais dos itens do Prêmio Nacional da Qualidade as seguintes práticas organizacionais relacionadas à qualidade da Gerdau – Aços Finos Piratini deveriam ser relatadas. Justifique sua resposta. 1. Gerenciamento pelas diretrizes e gerenciamento da rotina 2. Certificação pela QS 9000 e ISO 9002 3. Grupos para solução de problemas 4. Gráfico das marcas mais lembradas pelos gaúchos 5. Metodologia Seis Sigma 6. Programa de sugestões dos colaboradores 7. Programa 5S (técnica japonesa visando à organização, limpeza, ordenação e arrumação do ambiente de trabalho, seja no setor produtivo ou administrativo) 8. FMEA (Análise do Modo de Falha e seus Efeitos; técnica que visa à identificação de falhas em potencial para eliminá-las ou reduzir sua probabilidade de ocorrência) 9. Mapeamento de processo 10. Gráfico de emissões atmosféricas 11. Percentual de aceitação (respostas “boa” e “muito boa”) para a marca e imagen da Gerdau AFP 12. Pesquisa de satisfação de clientes 13. Pesquisa de opinião com a força de trabalho 14. Qualidade em 1 Ponto (capacitação de funcionários de produção e manutenção usando fotos, desenhos, fluxos etc.) 15. Troféu Ouro do Prêmio Qualidade – RS 16. Gráfico de reclamações de clientes 17. Pontuação do relatório de avaliação do PNQ
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3.10. Exercícios e questões para análise 1. Estabelecer uma comparação entre a abordagem to TQC nas correntes de pensamento americana e japonesa. 2. A partir dos dados da Tabela 3.1, calcular a economia total gerada pelas sugestões em duas empresas do mesmo grupo: uma instalada nos Estados Unidos, e outra no Japão. Considerar a quantidade de 342 sugestões por ano, em média, para ambas as empresas, e calcular a economia total nas empresas (ambas com aproximadamente 400 funcionários). 3. Fazer uma comparação entre os modelos de TQM, estabelecendo os pontos concordantes e as diferenças entre eles. 4. Escolha três critérios do Prêmio Deming e faça uma relação entre cada um dos critérios com os itens do Baldrige Performance Excellence Program. 5. Quais as diferenças principais entre o Baldrige Performance Excellence Program e o PNQ? Indique essas diferenças nos critérios e itens. 6. Utilizando os fundamentos de excelência do PNQ (Tabela 3.6), estabeleça uma relação entre eles e os critérios do modelo de excelência, representado numa matriz. Na interseção de cada fundamento com cada critério, atribua uma relação de intensidade, em branco (relação zero), fraca (relação 1), moderada (relação 3) e forte (relação 9). Faça o somatório dos valores na vertical e na horizontal, visando a identificar os fundamentos de maior intensidade no modelo, bem como os critérios que mais abrangem os fundamentos. 7. Aponte as razões pelas quais vários países no mundo vêm lançando seus modelos de excelência nas últimas décadas.
3.11. Referências AHIRE, S.; GOLHAR, D.; WALLER, M. “Development and Validation of TQM Constructs”. Decision Science, v. 27, n. 1, p. 23-56, 1996. BLACK, S.; PORTER, L. “Identification of the Critical Factors of TQM”. Decision Science, v. 27, n. 1, p. 1-21, 1996. BOHORIS, G.A. “A Comparative Assessment of Some Major Quality Awards”. International Journal of Quality and Reliability Management, v. 12, n. 9, p. 30-43, 1995. CALARGE, F. A. Gestão Sistêmica da Qualidade. São Paulo: Artliber, 2001. CAMPOS, V. F. TQC – Controle da Qualidade Total. Belo Horizonte: Ed. QFCO, 1992. CARDIA, A. N. “Comunicação Interna e Gestão da Qualidade Total: O Caso Volkswagen – Unidade Resende”. Produção, v. 14, n. 2, 2004.
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Capítulo
Modelo Seis Sigma
4 Marly Monteiro de Carvalho & Roberto Gilioli Rotondaro Sumário do capítulo 4.1. O que é Seis Sigma; 4.2. Perspectiva estratégica do Seis Sigma; 4.3. Caracterização dos projetos Seis Sigma; 4.4. A equipe Seis Sigma; 4.5. O modelo DMAIC; 4.6. Calculando a capacidade Sigma; 4.7. Calculando a capacidade Sigma e a taxa de defeitos; 4.8. Índices de capacidade para atributos; 4.9. Cálculo de capacidade e o DMAIC. 4.10. O modelo DFSS; 4.11. Estudo de casos; 4.12. Questões para análise; 4.13. Referências.
Figura 4.1 – Modelo Geral de Gestão da Qualidade.
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Neste capítulo, é apresentado o modelo de Gestão da Qualidade Seis Sigma, um modelo emergente, que tem se difundido rapidamente no Brasil e no mundo. Este modelo tem sido chamado como a qualidade para o século XXI. O objetivo deste capítulo é apresentar o modelo de Gestão da Qualidade Seis Sigma, partindo da definição de Seis Sigma, segundo diversas perspectivas. Em seguida discute-se a metodologia de implementação denominada DMAIC (Definir, Medir, Analisar, Melhorar, Controlar), apresentando-se as diversas ferramentas utilizadas de maneira integrada às fases do DMAIC. Especial atenção é dada ao índice de capacidade sigma, que funciona como um indicador de desempenho dos projetos Seis Sigma.
4.1. O que é Seis Sigma O conceito de Seis Sigma foi introduzido e popularizado pela Motorola, seguida pela General Electric (GE) e por outras empresas de classe mundial. Rapidamente os programas Seis Sigma se difundiram, não só em ambientes de manufatura, mas também no setor de serviços. Diferentemente de outros programas de qualidade, as empresas que utilizam o Seis Sigma divulgam cifras milionárias de ganhos obtidos com sua implementação. O sucesso dos programas Seis Sigma não pode ser explicado apenas pela utilização exaustiva de ferramentas estatísticas, mas também pela harmoniosa integração do gerenciamento por processo e por diretrizes, mantendo o foco nos clientes, nos processos críticos e nos resultados da empresa. Um dos idealizadores deste programa, Michel Harry, define o Seis Sigma como uma estratégia que não deve estar encapsulada na área de qualidade, devendo espalhar seus tentáculos por toda a organização, da manufatura e engenharia à área de serviço. O programa Seis Sigma traz vários elementos de diversas eras da qualidade (ver Capítulo 1). Um dos elementos mais marcantes deste programa é a adoção estruturada do pensamento estatístico. O uso intensivo de ferramentas estatísticas e a sistemática análise da variabilidade são as marcas registradas deste programa, que lhe conferiu o nome Seis Sigma, significando, em linguagem estatística, seis desvios padrão. Veremos que essa é uma métrica de capacidade que implica um processo praticamente isento de erros, ou seja, com 3,4 defeitos por milhão de oportunidades. No mercado globalizado, parece haver uma correlação da competitividade com os níveis de defeito praticados pelas organizações. Dessa forma, as empresas líderes de mercado ganham competitividade ao reduzir suas taxas de defeitos drasticamente recorrendo ao modelo Seis Sigma. Contudo, não é somente o pensamento estatístico e a redução da variabilidade que caracterizam este programa. O programa Seis Sigma promove um alinhamento estratégico, utilizando indicadores de desempenho alinhados aos resultados da organização e prioridades estratégicas como alvos dos projetos de melhoria.
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Em síntese, o modelo de Gestão da Qualidade Seis Sigma é uma estratégia gerencial disciplinada, caracterizada por uma abordagem sistêmica e pela utilização intensiva do pensamento estatístico, que tem como objetivo reduzir drasticamente a variabilidade dos processos críticos e aumentar a lucratividade das empresas, por meio da otimização de produtos e processos, buscando satisfação de clientes e consumidores.
4.2. Perspectiva estratégica do Seis Sigma Conforme comentado, o programa Seis Sigma promove um alinhamento da área de qualidade com as estratégias de negócio da organização. Esse desdobramento é feito por meio de uma estrutura hierárquica que alinha as estratégias e objetivos de negócio com o portfolio de programa e projetos, os quais estão na base da pirâmide, conforme ilustra a Figura 4.2.
Figura 4.2 – Alinhamento estratégico dos projetos Seis Sigma. Fonte: Adaptado de Carvalho, 2005.
Uma questão central nos programas Seis Sigma é a definição dos projetos que receberão aporte de recursos da organização. O processo de seleção deve assegurar a alocação ideal dos recursos em projetos prioritários, alinhados à estratégia da empresa, com impacto não só na melhoria da eficiência, mas sobretudo na eficácia da empresa, garantindo-lhe a obtenção de vantagem competitiva. A organização deve, portanto, analisar os projetos Seis Sigma sob alguns critérios individuais e alguns critérios gerais de formação da carteira ou portfolio. A gestão da carteira de projetos é fundamental para garantir o balanceamento segundo as principais dimensões estratégicas. Por outro lado, a adoção de critérios individuais para a análise dos projetos permite garantir a viabilidade técnica e financeira do projeto, que os habilita a ingressar na carteira.
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A gestão de portfolio é um processo dinâmico, que administra uma lista de projetos ativos, a qual deve ser constantemente atualizada e revisada. Neste processo, os projetos novos são avaliados, selecionados, e priorizados; os projetos existentes podem ser acelerados, abortados ou despriorizados. Além disto, os projetos competem por recursos escassos (pessoal, recursos financeiros, tempo), que são alocados e realocados aos projetos ativos periodicamente, para não exceder os recursos disponíveis ou violar outras restrições. Outro aspecto da gestão do portfolio de projetos é obter o balanceamento em vários aspectos tais como: balanceamento dos recursos disponíveis entre os vários projetos – candidatos e correntes; balanceamento entre projetos em diferentes fases do ciclo DMAIC; balanceamento entre o risco e a recompensa; e balanceamento entre o longo prazo e o curto prazo. Existem diversas técnicas para a gestão de portfolio, das quais uma das mais utilizadas é o diagrama de bolhas. Qualidade em ação Portfolio de Projeto Seis Sigma – Diagrama de Bolhas Uma grande empresa do setor financeiro implementou o programa Seis Sigma em 1998. No início eram poucos os projetos conduzidos e a empresa não tinha sentido necessidade de estruturar a carteira de projetos Seis Sigma. Contudo, no início de 2004, a empresa possuía mais de 41 projetos em andamento nas diversas áreas funcionais. O diretor de qualidade decidiu então aplicar a técnica de diagrama de bolhas em uma das unidades, com 19 projetos ativos em diferentes fases do ciclo DMAIC. O diagrama de bolhas adotado possuía o ganho financeiro estimado do projeto Seis Sigma no eixo X (horizontal), enquanto os valores de prioridade estratégica eram lançados no eixo Y (vertical). O diâmetro da bolha representa o montante de recursos alocados ao projeto. Finalmente, a cor das bolhas representa cada fase no ciclo DMAIC em que o projeto está, da seguinte forma: verde – D; amarelo – M; azul – A; vermelho – I; preto – C. A Figura 4.3 apresenta o diagrama de bolhas dos projetos da área de TI desta organização. Os valores de prioridade estratégica foram atribuídos pelos diretores da organização em uma escala de 0 a 5. Observa-se que, na Figura 4.3, existem quatro classificações dos projetos Seis Sigma, quais sejam: I – Projetos Prioritários; II – Projetos Estratégicos, III – Projetos Lucrativos; e IV – Projetos Sujeitos a Desativação.
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Figura 4.3 – Diagrama de bolhas para projetos Seis Sigma. Fonte: Adaptado de Carvalho (2005).
4.3. Caracterização dos projetos Seis Sigma Os estímulos para o início de um projeto podem ser tanto oportunidades de mercado como exigências do negócio, geralmente deflagradas por uma das seguintes situações: • Uma demanda de mercado • Uma necessidade do negócio • Um pedido (uma exigência) de cliente • Um avanço tecnológico • Uma exigência legal • O que é crítico para o mercado? • Quais são os processos críticos? Com o intuito de diferenciar as características críticas para a qualidade oriundas das demandas do mercado, portanto externas, daquelas que vêm de uma análise dos processos críticos da empresa (internas), será utilizada a seguinte convenção: características críticas para a qualidade externa (CTQex) e interna (CTQin), conforme ilustra a Figura 4.4.
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Figura 4.4 – Alvo dos projetos Seis Sigma. Fonte: Carvalho, 2002a.
Uma vez que a empresa conhece o que é crítico para a qualidade, deve promover projetos Seis Sigma para garantir que seu desempenho nesses quesitos seja classe mundial, reduzindo sistematicamente a variabilidade desses processos. É importante destacar que esse processo de seleção dos projetos Seis Sigma é permanente e que um tema específico dentro da organização (CTQex ou CTQin) pode vir a ser alvo de projeto mais de uma vez. As informações históricas devem ser consideradas sempre que estiverem disponíveis, tornando importante a manutenção de banco de dados que contenha os resultados dos projetos Seis Sigma já realizados e do monitoramento do desempenho das CTQex e CTQin ao longo do tempo. O mapeamento dos processos críticos e, por conseguinte, das CTQin é uma demanda da nova versão da ISO 9000 que vigora desde 2000. Portanto, as empresas certificadas já incorporaram o gerenciamento por processos à Gestão da Qualidade. Os critérios de seleção do projeto podem contemplar uma vasta gama de possíveis metas das organizações, tais como: retorno financeiro, fatia de mercado, percepções públicas etc. Não obstante, nem sempre é possível conduzir vários projetos Seis Sigma simultaneamente para todas as CTQ, pois em geral existem limitações de recursos. Deve¬se, portanto, estabelecer alguns crivos para a seleção dos projetos, seguindo estas etapas: • Identificar as CTQ internas e externas • Identificar lacunas de desempenho (gaps) • Determinar se o escopo e a amplitude do projeto são gerenciáveis • Determinar a viabilidade do projeto A Tabela 4.1 mostra quais são as questões críticas para reflexão em cada uma dessas etapas, de forma a selecionar o alvo dos projetos Seis Sigma.
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Tabela 4.1: Tópicos para seleção de projetos Etapas Identificar as CTQs internas e externas
Identificar lacunas de desempenho (gaps)
Determinar se o escopo e a amplitude do projeto são gerenciáveis
Determinar a viabilidade do projeto
Questões • Quais são os critérios ganhadores de pedido? • A análise dos critérios competitivos está focada nos clientes preferenciais? • Os processos críticos da organização foram mapeados? • As CTQs têm um defeito identificável, sendo possível mensurar o impacto do projeto? • Existe risco de perda de competitividade com os atuais níveis de desempenho? • O desempenho atual apresenta uma lacuna significativa (gap) em relação aos concorrentes? • Nosso desempenho é pior que o dos concorrentes nas CTQs? • O projeto tem apoio e recursos adequados proporcionados pelas partes interessadas (stakeholders)? • Os recursos disponíveis são suficientes para concluir com sucesso o projeto? • Qual o horizonte de tempo necessário para a conclusão do projeto? • Existem muitas áreas envolvidas no projeto? • Os “donos” dos processos envolvidos participam do projeto? • Existe duplicidade ou conflito com outros projetos da organização? • Qual o risco do projeto não obter a melhoria de desempenho planejada (viabilidade técnica)? • Os benefícios obtidos com o projeto são maiores que os custos (viabilidade econômica)? • Existem recursos suficientes para financiar o projeto (viabilidade financeira)?
Em algumas organizações, um projeto Seis Sigma só é formalmente iniciado depois da conclusão de um estudo de viabilidade, embora nem sempre seja obrigatório. Em outros casos, uma avaliação especializada pode ser requerida, utilizando outras unidades dentro da organização. Uma vez selecionado o projeto Seis Sigma, é importante que toda a equipe conheça as restrições a que o projeto está sujeito, pois elas limitarão as opções da equipe com relação a escopo, pessoal e prazos. Em algumas empresas, como a GE, o projeto Seis Sigma é desenvolvido sob “contrato interno” (project chart) que explicita todas essas informações. Este “contrato interno” é de fundamental importância para o bom gerenciamento de tempo, custo e escopo, garantindo o uso eficiente dos recursos disponíveis e mantendo o monitoramento dos marcos importantes do projeto para controlar os possíveis desvios de rota (escopo). Portanto, os projetos Seis Sigma são avaliados não só quanto aos resultados “técnicos” obtidos, mas também quanto ao gerenciamento do tempo, do custo e da utilização dos recursos alocados para o projeto, critérios estes relacionados à gestão do projeto propriamente dita.
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4.4. A equipe Seis Sigma Os papéis da equipe Seis Sigma têm alguns de seus títulos baseados nas artes marciais, pois seus idealizadores acham que ambos têm certas habilidades em comum. 4.4.1. O executivo líder
É o responsável pela implantação do Seis Sigma. Seu comprometimento é indispensável para o sucesso da implantação da estratégia de melhoria, pois cabe a ele conduzir, incentivar e supervisionar as iniciativas do programa Seis Sigma em toda a empresa. Cabe ao líder analisar os resultados do programa Seis Sigma, verificando os benefícios financeiros alcançados com os projetos Seis Sigma. Além disto, seleciona os executivos (diretores e gerentes) que desempenharão o papel de campeões. 4.4.2. O Campeão
O campeão deve liderar os executivos-chave da organização rumo ao programa Seis Sigma. Cabe a ele organizar e guiar o começo, o desdobramento e a implementação do Seis Sigma em toda a organização. O campeão deve compreender as teorias, os princípios e as práticas do Seis Sigma, sendo capaz de pavimentar o caminho para as mudanças organizacionais necessárias. Finalmente, é atribuição do campeão definir as pessoas que irão disseminar os conhecimentos sobre o Seis Sigma por toda a empresa. 4.4.3. Master Black Belts
Ajuda o campeão na tarefa de implantar o Seis Sigma na organização, tendo papel fundamental no processo de mudanças na organização. Suas atribuições incluem ajudar o campeão na escolha e no treinamento de novos projetos de melhoria, oferecendo liderança técnica no preparo dos profissionais de Seis Sigma, treinando e instruindo os Black Belts e os Green Belts. Estes profissionais dedicam 100% do seu tempo às atividades relacionadas ao programa Seis Sigma. Para tal, recebem treinamento intensivo e são preparados para a solução de problemas utilizando o pensamento estatístico. Além disso, os Master Black Belts devem possuir habilidades de comunicação e didáticas. 4.4.4. Black Belts
Estes profissionais, assim como os Master Black Belts, também dedicam 100% do seu tempo a trabalhar em projetos Seis Sigma, recebendo treinamento intensivo em técnicas estatísticas e de solução de problemas. Os Black Belts respondem aos Master Black Belts e lideram equipes na condução dos projetos Seis Sigma master. Em algumas empresas, estes profissionais são capazes de treinar até 100 Green Belts ao ano.
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Algumas habilidades necessárias para os Black Belts são: • Iniciativa, entusiasmo e habilidades de relacionamento interpessoal e comunicação. • Motivação para alcançar resultados e efetuar mudanças. • Influência no setor funcional em que atuam. • Habilidade para trabalhar em equipe. • Excelentes conhecimentos técnicos da sua área de trabalho. • Domínio das ferramentas estatísticas e conhecimento da metodologia Seis Sigma aplicada a projetos específicos. 4.4.5. Green Belts
Os Green Belts são profissionais parcialmente envolvidos com as atividades Seis Sigma, compartilhando-as como parte da suas tarefas do dia a dia. No que concerne ao Seis Sigma, os Green Belts possuem duas tarefas principais: • Auxiliar aos Black Belts na coleta de dados e no desenvolvimento de experimentos • Liderar pequenos projetos de melhoria nas suas respectivas áreas de atuação. Seu treinamento é mais simplificado do que os Black Belts. No entanto, existem muitas variações na estrutura de papéis e responsabilidade encontradas nas empresas. Há empresas que desdobram em mais níveis criando, por exemplo, categorias mais baixas como os Yellow belts e os White belts. A Figura 4.5 ilustra o contínuo de estruturas possíveis de acordo com os papéis e responsabilidades. Cada tipo de estrutura tem implicações no número de horas de treinamento e no investimento total no programa. O Tipo de configuração mais comum é a Configuração 2.
Figura 4.5 – Diferentes configurações de estruturas. Fonte: Carvalho (2010).
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Qualidade em ação Seis Sigma na GE Capital Services A GE é mundialmente conhecida pela implementação do Seis Sigma, com efetiva difusão da cultura da qualidade, que atinge praticamente todos os níveis da empresa. É possível perceber a grande influência do ex-CEO Jack Welch, que foi o principal fomentador da implementação e adoção dos programas Seis Sigma na empresa. Existem muitos projetos Seis Sigma em toda a corporação, que participam do Six Sigma Rally, que constitui uma competição entre os diversos projetos implementados, tanto no âmbito da divisão como de toda a organização. Além disso, a empresa utiliza a intranet interna para disponibilizar dados sobre projetos já realizados. Em uma das unidades de negócio da General Electric, a Capital Services no Brasil, que possuía em 2002 cerca de 150 funcionários, há um setor específico de qualidade, com um especialista em qualidade, denominado quality leader, que é responsável pelas reuniões com os outros especialistas das outras divisões da GE, além de auxiliar na coordenação dos projetos internos. Além disso, há um Master Black Belt responsável diretamente pela coordenação dos projetos da empresa. No entanto, esta formação não é rigidamente seguida por todas as unidades da GE. Se a divisão é muito pequena, não há ambos os cargos, além de, em alguns casos, a área da qualidade não representar uma unidade organizacional definida e isolada das demais. Na GE Capital Services no Brasil, existem também vários funcionários com o título de black belt ou green belt, ou seja, existem especialistas em qualidade por toda a estrutura da organização. Além disso, existe um grande incentivo para que os funcionários obtenham o título de green belt pelo menos, aliado ao fato de a participação nos projetos de melhoria fazer parte da avaliação de desempenho individual dos funcionários. O treinamento dos funcionários em qualidade é de responsabilidade de outra empresa; porém, alguns especialistas da GE auxiliam no desenvolvimento e na implementação dos cursos. Fonte: Adaptado de Kasahara e Carvalho, 2003.
4.5. O modelo DMAIC O programa visa ao aperfeiçoamento do processo por meio da seleção correta dos processos que possam ser melhorados e das pessoas a serem treinadas para obter os resultados. O aperfeiçoamento do processo, denominado DMAIC, passa por cinco fases: definir (define), medição (measure), análise (analyze), aperfeiçoamento (improve) e controle (control). Diversas ferramentas são utilizadas de maneira integrada às fases do DMAIC, constituindo um método sistemático, disciplinado, baseado em dados e no uso de ferramentas estatísticas para se atingir os resultados almejados pela organização.
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a) Fase 1: “D” define (definir) – definir as prioridades A primeira etapa consiste em definir quais são os requisitos do cliente (voz do cliente) e traduzir essas necessidades em Características Críticas para a Qualidade (CTQ) Esta etapa é fundamental para a metodologia, pois parte da visão do cliente, levando-a para dentro da organização. Os objetivos dos projetos Seis Sigma de melhoria têm de estar relacionados a um CTQ. A equipe preparada para aplicar as ferramentas Seis Sigma deve então desenhar os processos críticos, procurando identificar aqueles que têm relação com os CTQs do cliente e que estão gerando resultados ruins, como reclamações de clientes, problemas funcionais, problemas trabalhistas, altos custos de mão de obra, baixa qualidade de suprimentos, erros de forma, ajuste e funcionamento etc. Em seguida, a equipe realiza uma análise custo-benefício do projeto, de modo a ter uma visão clara do retorno que a atividade deverá trazer para a empresa. b) Fase 2: “M” measure (medir) – como o processo é medido e como é executado? A equipe assessorada pelo Black Belt vai agora desenhar o processo e os subprocessos que se relacionam com as Características Críticas para a Qualidade (CTQs), definindo as entradas e as saídas. É muito importante nesta fase que as relações Y= f(X) sejam estabelecidas. O sistema de medição utilizado para realizar as medições deve ser adequado para atender às necessidades do processo. Em seguida, a equipe coleta os dados do processo por meio de um sistema que produza amostras representativas e aleatórias. Os índices de capacidade do processo a curto e longo prazos são determinados. c) Fase 3: “A” analyze (analisar) – identificação das principais causas Agora a equipe Seis Sigma realiza uma fase muito importante da metodologia, a análise dos dados coletados. Para isso, utiliza, além das ferramentas tradicionais da qualidade, as ferramentas estatísticas de modo a identificar as (Xs) causas óbvias e as causas (Xs) não óbvias. A utilização de ferramentas estatísticas de forma competente e prática é uma das forças da metodologia. Quando evoluímos para uma visão de que os processos devem ser analisados levando em conta sua variabilidade, a estatística passa a ser a principal ferramenta a ser utilizada pela equipe. Para esta fase, a utilização de software estatístico é quase imprescindível, pois facilita tremendamente a equipe nos cálculos e desenha os gráficos necessários. As equipes descobrem as causas (X vitais) geradoras dos defeitos e as fontes de variações nos processos. d) Fase 4: “I” improve (melhorar) – eliminação das causas dos defeitos Esta é a fase em que a equipe deve fazer as melhorias no processo existente. Os dados estatísticos devem ser transformados em dados do processo, e a equipe deve estudar
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tecnicamente quais transformações deve executar. Nesta fase, existe a oportunidade de utilizarmos os conceitos de produção lean, agregando ao sistema Seis Sigma uma grande possibilidade de melhoria. É claro que seguramente podem ocorrer modificações técnicas do processo e, então, a equipe tem que pôr a mão na massa, modificando os elementos das atividades de transformação, atuando sobre as causas-raiz. É nesta fase que as melhorias se materializam no processo, quando a equipe interage com as pessoas que executam as atividades, sendo, portanto, uma fase crítica. As equipes promovem melhorias nas variáveis vitais do processo e realizam a quantificação dos efeitos nas Características Críticas para a Qualidade (CTQs – Critical to Quality), ou seja, nas metas financeiras e de desempenho. Teste as soluções, pois a equipe começa a passar para o pessoal operacional a responsabilidade de executar o processo modificado. e) Fase 5: “C” control (controlar) – manutenção das melhorias Nesta fase, a equipe pode perguntar: por que ir além da fase de melhoria, já que os objetivos do projeto foram atingidos? Qualquer sistema fechado tende da ordem para a desordem, e para uma condição de mínima energia; ou seja, se nosso processo não estiver sob controle, tende a ficar mais “bagunçado” no futuro (lembre-se: a variação de entropia do universo é sempre positiva) e, portanto, a capabilidade tende a voltar para os níveis do início do projeto Seis Sigma. Portanto, esta é a fase em que a equipe deve definir como serão feitos esses controles e passar essa informação para os “donos do processo”, isto é, aqueles que trabalham no processo normalmente no dia a dia. Nesta fase, deve ser estabelecido e validado um sistema de medição e controle para medir continuamente o processo de modo a garantir que a capacidade do processo seja mantida. O monitoramento dos Xs críticos é fundamental não só para manter a capacidade do processo estabelecida, mas para indicar melhorias futuras. O Y (saída do processo deve ser controlado para garantir que os resultados sejam conforme o planejado). Nesta fase, é elaborada a documentação, além do monitoramento das novas condições do processo por meio de métodos estatísticos de controle de processo. A capacidade do processo é reavaliada para garantir que os ganhos sejam mantidos. Dependendo dos resultados desta reavaliação, pode ser necessário rever uma ou mais fases precedentes do processo. A implementação correta do programa Seis Sigma permite criar uma linguagem comum entre as diversas áreas de uma empresa, compartilhando sucessos e fracassos, fazendo com que uma unidade aprenda com a experiência de outra. A Figura 4.6 ilustra as fases do Seis Sigma.
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Figura 4.6 – As fases do programa Seis Sigma. Fonte: Adaptado de Harry, 2000.
4.6. Calculando a capacidade Sigma O programa Seis Sigma foi batizado com o nome da letra grega sigma (σ), que representa o desvio-padrão em notação estatística, já evidenciando a grande ênfase na utilização destas ferramentas. O uso sistemático de ferramentas estatísticas nos projetos tem como objetivo reduzir a variabilidade, até a obtenção da difícil meta de 3,4 defeitos por milhão. Para gerir a qualidade segundo uma perspectiva de redução da variabilidade dos processos, exige-se das empresas a adoção sistemática de técnicas de controle estatístico e estudo dos índices de capacidade (capability).1 O controle estatístico tem por objetivo conhecer a estabilidade do processo estudado, monitorando seus parâmetros ao longo do tempo (ver Capítulo 9). Por analogia, 1
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Alguns autores traduzem capability por capabilidade.
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é como se o processo fosse um velho amigo, daqueles que se pode prever o compor tamento. Já no estudo de capacidade do processo, o objetivo é determinar se um processo estável, ou seja, cujo comportamento seja conhecido, é capaz de produzir itens ou prestar o serviço segundo as especificações predeterminadas pelo cliente. Portanto, para estudar a capacidade do processo é preciso conhecer as suas especificações. Geralmente, quando se trata de uma empresa de manufatura, boa parte das especificações é fornecida pelo pessoal de engenharia para as áreas de produção e essas especificações são alteradas somente quando há um novo projeto. Já nas empresas prestadoras de serviços e nas áreas de operações, nem sempre as especificações são definidas a priori. Nesses casos, é de fundamental importância fazer pesquisa com os clientes e o benchmarking com os concorrentes para uma adequada definição das especificações. Vale destacar que as especificações se tornam obsoletas, ou seja, alterações significativas nos padrões tecnológicos e/ou de comportamento dos mercados, seguidas de melhoria do desempenho dos concorrentes, têm impacto direto nos padrões de exigência do consumidor e, portanto, alteram as especificações. Imaginem o que ocorreu com algumas empresas de logística/entrega locais, que trabalhavam com prazos de entrega mais elásticos e foram obrigadas a alcançar o padrão classe mundial imposto por empresas globais, como a Federal Express, que entraram no mercado brasileiro. Nesses casos, o que era aceitável pelo cliente, pois não havia desempenho melhor, passa rapidamente a ser inaceitável, demandando ações drásticas das concorrentes para se manterem competitivas. Dessa forma, percebe-se que orientar o negócio para a meta de capacidade Seis Sigma é um esforço de melhoria contínua, que exige o monitoramento das mudanças do mercado e agilidade para mudanças. Qualidade em ação Estudo da capacidade e especificação: um restaurante fast-food Um restaurante do tipo fast food tem como um dos principais critérios competitivos o parâmetro tempo de atendimento. Portanto, a rede monitora o tempo de atendimento utilizando os gráficos de controle (ver Capítulo 9) e sabe que seu processo é estável (sob controle) e apresenta média de 15 minutos e desvio-padrão de 3 minutos. O gerente do restaurante trabalha com um limite de especificação de 20 minutos, de acordo com sua “percepção” da tolerância à espera de seus clientes, sem fazer um estudo detalhado da obtenção da especificação desse parâmetro. Com base em suas análises, o gerente conclui que seu processo é capaz de satisfazer às especificações de seus clientes, conforme ilustra a Figura 4.7.
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Figura 4.7 – Tempo de atendimento com o limite de especificação atribuído pelo gerente.
Contudo, o gerente verificou que sua clientela não estava satisfeita. Sem entender em que ponto de suas análises havia errado, o gerente resolveu fazer uma pesquisa com os clientes e estudar o tempo de atendimento de outros restaurantes da região na mesma categoria (benchmarking). O gerente percebeu pela pesquisa que o cliente tolera esperar no máximo dez minutos (limite superior de especificação – LSE) para ser atendido. Esse resultado altera totalmente a análise de capacidade do processo, conforme ilustra a Figura 4.8. O gerente descobriu que, embora o processo estivesse sob controle (estável), ele era incapaz de prestar o serviço conforme as especificações do cliente.
Figura 4.8 – Tempo de atendimento com o limite de especificação obtido por pesquisa junto ao cliente e benchmarking com os concorrentes.
Portanto, o índice de capacidade está associado às especificações atribuídas. Erros na definição da especificação podem levar a conclusões errôneas quanto à capacidade do processo. Fonte: Adaptado de Carvalho (2002b).
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4.7. Calculando a capacidade Sigma e a taxa de defeitos Embora o estudo da capacidade do processo não seja novo (ver Capítulo 9), as métricas tradicionais mais utilizadas pelas empresas são o Cp, Cpk, Pp e Ppk. Dessas métricas, as que mais se assemelham ao índice de capacidade Seis Sigma são o Cpk e o Ppk. Relembrando, as fórmulas desses dois índices estão nas equações 4.1a e 4.1b. Para fazer o cálculo desses índices de capacidade, é preciso que a hipótese de normalidade da distribuição seja válida para os dados e que o processo esteja sob controle estatístico (estável). Tabela 4.2: Análise dos índices de capacidade Seis Sigma Cpk min
– LIE LSE – ; 3 3
Equação 4.1a – Índices de Capacidade Cpk Em que: • µ é a média do processo • σ é o desvio-padrão do processo • LSE é o limite superior de especificação • LIE é o limite inferior de especificação
Ppk min
LSE – x x – LIE ; 3s 3s
Equação 4.1b – Índices de Capacidade Ppk Em que: • x é a estimativa da média • s é a estimativa do desvio-padrão • LSE é o limite superior de especificação • LIE é o limite inferior de especificação
As Figuras 4.9a e 4.9b ilustram a análise feita por estes índices, quando a média do processo é equidistante dos limites de especificação. Neste caso, se o índice de capacidade resultar em 1, podemos afirmar que os limites de especificação distam três desvios-padrão da média. Caso a média não esteja equidistante dos limites de especificação, adota-se a pior capacidade, ou seja, aquela calculada utilizando-se o limite de especificação mais próximo. No entanto, o índice de capacidade Seis Sigma apresenta algumas diferenças em relação às métricas tradicionais. A questão feita após este estudo é: com este resultado pode-se concluir que o processo é capaz? Nos padrões Seis Sigma, a resposta seria “não”, pois o índice Cpk precisaria ser igual a 2, conforme ilustra a Figura 4.9b. Verifica-se, então, que no padrão Seis Sigma, um processo considerado capaz é aquele cuja média esteja à distância de 6 desvios-padrão dos limites de especificação.
Figura 4.9a – Índice Cpk = 1.
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Figura 4.9b – Índice Cpk = 1.
O índice utilizado para determinar a capacidade Seis Sigma é bastante simples, pois mede a distância da média à especificação mais próxima (LIE ou LSE) em quantidade de desvios-padrão (sigmas), utilizando a normal reduzida (z). A Fórmula a seguir apresenta o índice de capacidade Seis Sigma.
z
zi
LIE – µ (µ – 6σ) – µ –6 σ σ
zs
LSE – µ (µ 6σ ) – µ 6 σ σ
x –µ ⇒ mim σ
Em que: P(xLSE) = P(z>+6) = 1,25 parte por bilhão.
Comparando este índice de capacidade com o Cpk e Ppk verifica-se que: 3Cpks
LSE – µ LSE – µ Cpks σ 3σ
Ou seja, 3 Cpks = Zs e, de forma análoga, Zi = 3 Cpki.
Portanto, um processo Seis Sigma é aquele que gera 1,25 parte defeituosa por bilhão. Mas agora precisamos refletir um momento. Seis Sigma representa 1,25 parte defeituosa ou 3,4 partes por milhão? Para responder esta pergunta, faça os seguintes exercícios: 1. Entre na tabela normal (Anexo 1) com z = 6,0, qual é a probabilidade correspondente? 2. Entre na tabela normal com a probabilidade 3,4 partes por milhão, qual é o z correspondente? Esses exercícios devem conduzir a probabilidade de 1,25 parte por bilhão para o item 1 e um z de 4,5 para o item 2. Como explicar então estes resultados?
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Segundo Harry (1998), é difícil manter um processo sempre centralizado, já que no longo prazo vários fatores provocam seu deslocamento (shift), para cima ou para baixo do valor-alvo da especificação, geralmente, não superior a 1,5 desvio-padrão, conforme ilustra a Figura 4.10. Portanto, a capacidade que se obtém, analisando os dados do processo, é a de longo prazo (ZLP).
Figura 4.10 – Capacidade de longo prazo (adaptada de Harry, 1998).
Para chegarmos à capacidade potencial do processo, denominada de curto prazo (ZCP), deve-se descontar o deslocamento (ZD=1,5), ou seja, o índice de capacidade é obtido da seguinte forma: ZCP = ZLP + 1,5 Assim, se um processo tem capacidade Seis Sigma, quer dizer que sua capacidade potencial (Z ) é 6 sigma. Mas como esse processo se deslocou no decorrer do tempo, ele gera 3,4 partes por milhão de defeitos que correspondem à capacidade de longo prazo (ZLP = 4,5), como mostra a Tabela 4.3. CP
Tabela 4.3: Capacidade e ppm para longo e curto prazos Z 6 5 4 3 2
CP
Z
LP
4,5 3,5 2,5 1,5 0,5
PPM 3,4 233 6.210 66.807 308.537
Classe Mundial Média da indústria Não competitiva
Quanto maior o valor de sigma, menor a probabilidade do processo gerar defeitos. Consequentemente, quanto maior o sigma, maior a confiança dos clientes e menores os custos de não conformidades. Outro aspecto que merece destaque é que, embora a restrição da distribuição seja normal para os dados (variáveis), não existe referência nos trabalhos dos principais autores quanto à necessidade de o processo estar sob controle para que o estudo de capacidade possa ser feito. O que se tem verificado na prática, sobretudo na área de operações e
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serviços, é que o controle estatístico do processo não é tido como um pré-requisito para o cálculo da capacidade.
4.8. Índices de capacidade para atributos Os exemplos vistos até o momento tratavam de “tempo”, que sabemos ser uma variável contínua. Mas como calcular a capacidade Seis Sigma quando o dado disponível é do tipo atributo, defeitos ou defeituosos? Nesse caso, não seria possível aplicar a fórmula da Tabela 4.3, pois não temos a média e o desvio-padrão para esses dados. Por outro lado, quando se dispõe de dados atributos, sabe-se a fração defeituosa, sendo possível percorrer o caminho inverso ao utilizado nos dados variáveis. Tomando-se como partida a terceira coluna da Tabela 4.5, é possível descobrir a capacidade de curto e longo prazo. Vamos voltar ao exemplo da empresa de entregas, que mudou sua forma de tratar os dados, substituindo a informação do tempo de entrega pela informação do número de pedidos entregues fora do prazo especificado. Para cada pedido, era informado se ele havia sido entregue antes das 72 horas especificadas (LSE). A empresa tinha disponíveis as seguintes informações: • A fração de pedidos entregues fora do prazo no ano representava a taxa de 233ppm • LSE = 72 horas Calculando os índices de capacidade temos: • 233ppm corresponde a um ZLP = 3,5 (consultar Tabela) • ZCP = ZLP + Z D = 3,5 +1,5 = 5,0 Utilizar o índice para dados atributos permite ampliar o leque de utilização do método, uma vez que nas áreas de serviços e operações é bastante comum o uso deste tipo de dado. Para detalhar a capacidade para atributos, é preciso definir alguns conceitos básicos, quais sejam: defeito, defeituoso, unidade, oportunidade, defeito por unidade e defeitos por milhão de oportunidades (ver Tabela 4.4). Tabela 4.4: Dados atributos (adaptado de Carvalho, 2002b) Defeito Defeituoso Unidade Oportunidade Defeitos por unidade – DPU Defeitos por oportunidade – DPO Defeitos por milhão de oportunidade – DPMO
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Qualquer não conformidade às especificações. Unidade que apresenta um ou mais defeitos. Saída do processo que será avaliada segundo a presença de defeitos. Formas que o processo tem de se desviar do que é especifi cado para cada unidade, gerando não conformidade. Número de defeito/ Número de unidades. Número defeito/ (Número oportunidades* Número unidades). (Número defeito/ (Número oportunidades* Número unidades))*106
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No exemplo anterior foi fornecida a fração de pedidos entregues fora do prazo. Que foi calculado da seguinte forma: No último ano, a empresa executou 100.000 entregas (unidades) • A única oportunidade de errar é com relação ao prazo de entrega, maior que LSE = 72 horas considerados não conforme, ou seja, uma oportunidade • No último ano apenas 23 dos 100.000 pedidos foram entregues com atraso • DPMO = (23/(1*100.000))*1.000.000 = 230
4.9. Cálculo de capacidade e o DMAIC A Figura 4.11 apresenta o fluxo esquemático para o cálculo do índice de capacidade Seis Sigma.
Figura 4.11 – Fluxograma do estudo de capacidade Seis Sigma (adaptado de Carvalho, 2002b).
O cálculo do índice de capacidade deve ser feito em duas oportunidades durante o projeto. O primeiro cálculo do índice de capacidade é feito na fase de Medição do DMAIC. Nessa fase, o Black Belt seleciona uma ou mais características CTQ (Control to Quality), mapeia o respectivo processo, realiza as medidas necessárias e a capacidade do processo a curto e longo prazos. O objetivo aqui é aferir a capacidade antes de intervir no processo. Na fase de Controle do DMAIC é refeito o cálculo da capacidade. O objetivo de reavaliar a capacidade do processo é verificar os ganhos obtidos com as melhorias implementadas pela equipe do projeto Seis Sigma, conforme ilustra a Figura 4.12. Dependendo dos resultados dessa reavaliação, pode ser necessário rever uma ou mais fases precedentes do processo. Alguns autores tratam a medida de capacidade como z de benchmarking, pois ela funciona como um referencial comparativo da situação do processo antes e depois do projeto Seis Sigma, bem como entre processos em uma organização.
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Figura 4.12 – Fluxograma do estudo de capacidade Seis Sigma (adaptado de Carvalho, 2002b).
4.10. O modelo DFSS A metodologia DFSS (Design for Six Sigma) lida com a qualidade no projeto de novos produtos e pode ser aplicada a processos produtivos e de serviços que precisam ser constituídos de forma que, ao estarem em funcionamento, já atinjam o nível Seis Sigma. O DFSS também pode ser aplicado a processos nos quais seu nível de desempenho esteja tão baixo, e o próprio processo esteja tão ruim, que quaisquer esforços aplicados para se realizar um projeto DMAIC não resultarão em um processo de nível Seis Sigma. Ou seja, pode-se projetar um novo produto ou serviço, ou reprojetar um produto ou serviço já existente. O DFSS traz ferramentas que podem reduzir custos e melhorar a qualidade, mas principalmente adicionar valor ao produto por meio de inovações e do atendimento das reais necessidades dos clientes. Esse programa é apontado como a única forma de atingir o nível Seis Sigma na qualidade, pois a qualidade do produto/ processo é projetada, e não melhorada. Para isso, é adotada a metodologia DMADV (definição, medição, análise, projeto e verificação) que também possui cinco fases bem definidas: • Definição: identifica-se o que será projetado e os objetivos a serem alcançados. • Medição: entendimento das necessidades e expectativas dos clientes relativas ao produto ou serviço que está sendo criado. São definidas as características críticas para a qualidade (CTQ – Critical to Quality) do projeto, que serão os objetivos do novo processo. • Análise: escolher a melhor solução entre as possíveis alternativas de desenho. Utilizam-se a Matriz de Pugh (para a seleção do melhor conceito de design entre as várias alternativas possíveis) e o benchmarking (para o desenvolvimento de conceitos de design).
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• Projeto (design): será desenvolvido o design de alto nível (descrição do conceito de produto/serviço escolhido, mapas do processo e arranjo das instalações) para todos os elementos apropriados, como: produto/serviço, processo, informação, instalações, equipamentos e materiais/suprimentos. • Verificação: testar e validar o projeto. A equipe irá monitorar o desempenho das CTQs do produto ou serviço por meio das cartas de controle. Além das ferramentas estatísticas, são utilizadas algumas ferramentas analíticas. Essas podem ser utilizadas antes de os problemas ocorrerem pela primeira vez, permitindo, assim, uma revisão mais apurada do projeto. Algumas dessas ferramentas são as seguintes: VOC (voz do cliente), VA (análise de valor/trimming), QFD (quality function deployment), Matriz de Pugh (seleção de conceitos), FMEA (análise do modo e efeito de falha), RE (engenharia robusta – método Taguchi) e TD (projeto de tolerâncias – método Taguchi).
4.11. Estudo de casos Uma empresa de logística está adotando o modelo Seis Sigma, e um dos seus projetos prioritários é aquele que estuda a melhoria do tempo de entrega das encomendas. Depois de estudar o processo de entregas na região metropolitana da cidade de São Paulo, a equipe do projeto Seis Sigma chegou à conclusão de que o tempo médio das entregas era de aproximadamente 54 horas (m = 54,5 horas), com desvio-padrão de 5 horas (s = 5 horas). Uma vez analisado o processo de entregas, a equipe se dedicou a entrevistar os clientes e a analisar as principais empresas concorrentes para obter a especificação para este processo. Ao final do estudo, a equipe concluiu que o limite superior de especificação era de até 72 horas (LSE = 72 horas), conforme ilustra a Figura 4.13.
Figura 4.13 – Cálculo do índice de capacidade.
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Os valores da Figura 4.13 foram obtidos com as seguintes fórmulas: • Z LP = (LSE-m )/s = (72-54,5)/5 = 3,5 • Z CP = Z LP + Z D = 3,5 +1,5 = 5,0 • Entrando na tabela normal com o valor de Z obtém-se a taxa de defeitos de 233 ppm. Portanto, ao terminar o estudo de capacidade, a equipe do projeto conclui que esse processo é 5s e gera 233 partes defeituosas por milhão. SEIS SIGMA NO CITIBANK DO BRASIL Em uma entrevista realizada com um dos funcionários da área de qualidade e inovação do Citibank, localizado na cidade de São Paulo, em 2002, foi possível descobrir um pouco do processo de implementação do Seis Sigma na empresa. Primeiramente, foi possível perceber que o peso atribuído ao setor de qualidade no Citibank é tão grande que, no organograma, se reporta diretamente à presidência. Dessa forma, a qualidade e seus conceitos possuem um elevado nível de difusão na organização. Existem diversos prêmios oferecidos aos funcionários, tais como: Instant Recognition e Quality Dividends, com o objetivo de premiar os que fornecem ideias ou participam de projetos de melhoria. O Citibank também foi vencedor do Prêmio Nacional da Qualidade (PNQ) por duas vezes, 1994 e 1997 (ver Capítulo 3), além de ter o certificado ISO 9000. A implementação do Seis Sigma foi iniciada durante os anos de 1997 e 1998 e rapidamente se difundiu por toda a empresa, sendo que existem projetos de melhoria desenvolvidos nas diferentes áreas da empresa, com comprometimento dos funcionários no uso das ferramentas, o que foi obtido por meio do uso de facilitadores, cuja função é a difusão da qualidade na empresa. Os principais treinamentos ministrados aos funcionários são: o CQO (Citigroup Quality Overview), relativo às ferramentas básicas da qualidade, com duração de um dia; e o DMASIC, relativo à metodologia DMAIC (Define, Measure, Analyse, Improve, Control), com a adição da etapa denominada S (Success transfer), ligada à realização do benchmarking. Os softwares de apoio utilizados são: SPSS, Minitab, além do pacote Office. Verifica-se que o principal foco do Citibank é o cliente, de modo que são realizadas pesquisas de satisfação dos clientes (por exemplo, pesquisa anual de concorrência), cujos resultados servem para direcionar a metodologia de gerenciamento por processos, de modo a obter melhores resultados nos processos considerados prioritários. Por fim, verifica-se que há uma troca de experiências entre a filial brasileira do Citibank e as outras filiais no mundo. Fonte: Adaptado de Kasahara e Carvalho, 2003.
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4.12. Questões para análise 1. Leia atentamente o Estudo de Caso do Citibank e pesquise informações adicionais na Internet. Agora responda: a)
Como é a integração do Seis Sigma com os outros modelos de Gestão da Qualidade (ISO, PNQ)?
b)
Quais aspectos diferenciam o ciclo DMAIC no Citibank?
c)
A premiação dos funcionários é um aspecto importante para promover os conceitos de qualidade na organização?
2. Como são selecionados os projetos Seis Sigma? 3. O que são as CTQint? O que são as CTQext? 4. Quais categorias de riscos estão presentes num projeto Seis Sigma? 5. O que significa o índice de capacidade Seis Sigma? 6. Qual a relação entre o Cpk/Ppk e o índice Seis Sigma? 7. Como se calcula o índice de capacidade Seis Sigma para dados atributos? 8. Como se calcula o índice de capacidade Seis Sigma para dados variáveis?
4.13. Referências BLAKESLEE JR, J. A. Achieving quantum leaps in quality and competitiveness: Implementingthe Six Sigma solution in your company. ASQ,s 53rd Annual Quality Congress Proceedings,2000. BOARIN PINTO, S.H.; CARVALHO, M.M. “Critical issues about Six Sigma implementation in Brazilian Companies”. Proceedings 1st International Conference on Six Sigma. Inglaterra, Londres, 2004a. BOARIN PINTO, S.H.; CARVALHO, M.M. “The implementation of Six Sigma Methodology in Brazilian Companies”. Proceedings 6th European Six Sigma Forum, Portugal, Lisboa, 2004b. BOARIN PINTO, S. H.; CARVALHO, M.M. “O Seis Sigma no Brasil: estudo de múltiplos casos”. In: Simpósio de Engenharia de Produção, 9, 2002, Bauru. SIMPEP IX. Bauru: Unesp. p. 1-10, 2002. CARVALHO, M. M. “Selecionando Projetos Seis Sigma”. In: ROTONDARO, R. G.(Org.). Seis Sigma: estratégia gerencial para melhoria de processos, produtos e serviços. São Paulo: p. 49-70, 2002. CARVALHO, M. M.; LAURINDO, F. J. B. “Linking strategy with a network of performance indicators: a Brazilian Research Centre case study”. International Journal of Business Performance Management, v. 5, n. 4, p. 285-301, 2003.
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Modelos Normalizados de Sistemas de Gestão. Conceitos e Certificação: ISO 9001; ISO 14001 e TS 16949 José Joaquim do Amaral Ferreira
Sumário do capítulo 5.1. Introdução à teoria dos sistemas; 5.2. Sistema internacional de normalização; 5.3. Histórico da evolução dos sistemas normalizados de gestão; 5.4. A série ISO 9000; 5.5. A série ISO 14000; 5.6. A ISO TS 16949; 5.7. Sistemas de certificação e acreditação no mundo; 5.8. Estudo de caso; 5.9. Questões para discussão; 5.10. Referências.
Figura 5.1 – Modelo geral da gestão da qualidade.
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5.1. Introdução à teoria dos sistemas O conceito de sistema está sempre presente em nosso dia a dia, mesmo que nós não nos demos conta disso. Todos já ouvimos falar de sistema circulatório, sistema viário, sistema de processamento de dados dentre outros exemplos. O que está por trás dessa palavra sistema, aplicada a tantos temas distintos? Todos os estudiosos de teoria dos sistemas estão de acordo em definir um sistema como um conjunto de partes coordenadas para realizar um conjunto de finalidades. Um ser humano, por exemplo, pode ser encarado como um sistema fantástico, constituído de diversas partes distintas visando à sua subsistência, reprodução e todas as suas outras atividades. Um sistema é definido quando caracterizamos: UÊ Seus objetivos globais e seus indicadores de desempenho. UÊ Seu ambiente ou restrições externas. UÊ Seus componentes ou subsistemas, com suas atividades, finalidades e indicadores de rendimento. UÊ Seus recursos. UÊ Sua administração. Utilizar esses conceitos em nossos processos mentais é o denominado “pensamento sistêmico”. 5.1.1. Objetivos
O conceito de objetivos de um sistema está ligado às suas finalidades. É usual encontrarmos sistemas com mais de uma finalidade. No entanto é importante caracterizar a principal ou as poucas principais de forma a podermos administrá-lo de forma coerente. Nem sempre o objetivo declarado de um sistema é o seu objetivo real. Muitas organizações declaram como objetivos o bem-estar da comunidade onde estão inseridas e a total satisfação de seus clientes. No entanto agem conforme os cânones do capitalismo selvagem buscando o lucro a qualquer preço mesmo contrariando o objetivo declarado. Outro exemplo são gestores de órgãos públicos que declaram como objetivo melhorar o serviço oferecido ao público e aumentam de forma incontrolável o número de servidores para aumentar o seu poder e influência. Também é importante não confundir a finalidade de componentes ou subsistemas como sendo o objetivo global do sistema. É fato que o ótimo de um subsistema em geral não coincide com o ótimo do sistema. Não adianta uma empresa ter um setor de compras otimizado e funcionando como um relógio e o cliente sendo mal atendido por conta de ineficiências nos demais subsistemas da organização. Um atleta que otimiza seu sistema muscular à custa de substâncias químicas pode estar comprometendo de forma irreparável o funcionamento do organismo como um todo. Numa universidade muitas
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vezes o aluno declara como seu objetivo aprender e formar-se um profissional competente, mas às vezes age como se seu objetivo fosse somente conseguir o diploma a qualquer custo. Então seu objetivo real é obter o diploma e não aprender. Não devemos confundir objetivos reais com objetivos legítimos do sistema, para os quais colocamos juízos de valor e moral. Um laboratório de análises clínicas que declara como objetivo realizar o exame mais exato possível pode estar otimizando o indicador incorreto se seu objetivo for apoiar os médicos para realizarem rapidamente o melhor diagnóstico. Uma vez identificados os objetivos reais do sistema devem ser procurados os indicadores de desempenho mais adequados para verificar se esses objetivos estão sendo atingidos. Como exemplos de indicadores de desempenho utilizados, temos indicadores de lucro, parcela de mercado detida pela empresa, proporção de pacientes salvos no atendimento de emergência etc... 5.1.2. Ambiente do sistema
Quando estamos caracterizando um sistema, necessitamos definir suas fronteiras. O ambiente de um sistema é tudo o que não pertence ao sistema, ou seja, fica fora de suas fronteiras e tem importância com relação aos objetivos do mesmo. Uma montadora automobilística pode considerar como a fronteira de seu sistema os muros de sua fábrica. Mas se analisarmos a cadeia produtiva envolvendo desde seus fornecedores até as revendas autorizadas, fica difícil considerar a fronteira do sistema somente os muros da fábrica. Quando pensamos no conceito de “fora” das fronteiras estamos considerando que o sistema tem pouca ou nenhuma condição de influenciar os elementos “externos”. Mas os elementos externos influenciam o sistema. Os elementos que influenciam o sistema e são externos ao mesmo são tratados como restrições que limitam ou direcionam o desempenho do sistema. É simples considerarmos, por exemplo, o clima como pertencente ao ambiente do sistema de uma fábrica de sorvetes. Para uma prefeitura, o orçamento aprovado pelo poder legislativo pertence ao seu ambiente. 5.1.3. Componentes ou subsistemas
O desdobramento dos objetivos globais do sistema leva a um conjunto de tarefas, missões, a serem executadas por parte do sistema, seus componentes ou subsistemas. Uma cidade precisa cuidar de seus cidadãos e pode desdobrar esse objetivo em: cuidar da saúde, educação e segurança. É evidente que cuidar da saúde vai envolver também ações na área de educação básica buscando prevenir o surgimento de doenças. A avaliação global da atividade saúde não pode ser feita somente dentro dos limites clássicos da divisão em secretarias da educação e da saúde. Numa empresa, as missões são executadas
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através de conjuntos de atividades denominados processos. Os processos atravessam o organograma clássico da empresa na horizontal não se restringindo à divisão departamental clássica. Cumpre observar que um processo não faz sentido sem termos antes desdobrado os objetivos globais, para cada componente. Esse desdobramento é fundamental para que todos os subsistemas trabalhem direcionados para atingir os objetivos globais. Da mesma forma os objetivos locais e seus indicadores de desempenho devem estar alinhados com o objetivo global. A busca do ótimo local sem o alinhamento com o objetivo global leva a subotimizações perigosas para o desempenho global. Um banco preocupado com o controle de custos instituiu um programa de incentivo à redução dos custos de telefonia. Cada funcionário recebia uma quota mensal de ligações telefônicas e se a excedesse receberia um demérito que acabaria influenciando na parte variável de seu salário. Como resultado os clientes acabaram sendo prejudicados, pois os funcionários deixavam de comunicar-se com eles depois de esgotada a quota de ligações. 5.1.4. Recursos
Os recursos do sistema são os meios que estão disponíveis para a realização de seus processos com a finalidade de atingir os seus objetivos. Os recursos encontram-se dentro do sistema. São usualmente medidos em homens-horas, dinheiro, equipamentos e edifícios. Não se pode deixar de considerar como recursos a tecnologia, cultura de inovação, competência dos colaboradores e capacidade empreendedora de seus dirigentes. Uma consideração importante com relação aos recursos é que em geral analisa-se a eficiência com que os mesmos são usados. Mais importante do que isso é avaliar os custos de oportunidade, incorridos porque os recursos foram utilizados em outros lugares e não nas aplicações corretas. 5.1.5. Administração do sistema
A administração de um sistema é a parte do sistema que faz o planejamento e a gestão do sistema, considerando os objetivos globais, o ambiente, os recursos e os componentes. A administração determina as missões e atividades de cada componente do sistema e procede à alocação dos recursos e mede o desempenho do sistema. Uma função importantíssima da administração do sistema é o controle. Ela deve verificar se os planos estão sendo executados conforme o planejado. Se não estão quais as causas e o consequente replanejamento. O ciclo da informação nesse processo de controle, muitas vezes é chamado de realimentação. A velocidade do ciclo de realimentação é vital para permitir a mudança de rumo do sistema antes que os desvios causem prejuízos irreparáveis.
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5.2. Sistema internacional de normalização A evolução dos conceitos de qualidade trouxe consigo a necessidade e utilização de um tipo especial de documentos: os documentos normativos. É um termo genérico que denomina documentos tais como regulamentos, especificações, relatórios e normas técnicas. São amplamente utilizados e os arranjos modernos de produção tais como a produção seriada com o uso de partes intercambiáveis e consórcios modulares, só são possíveis com a existência de documentos normativos. Norma é um documento estabelecido por consenso e aprovado por um organismo reconhecido, que fornece, para uso comum e repetitivo, regras, diretrizes ou características para atividades ou seus resultados, visando à obtenção de um grau ótimo de ordenação em um dado contexto conforme define o guia ISO/IEC Guia 2. As normas em geral são baseadas em conhecimentos consolidados da ciência, tecnologia e experiências anteriores. Abrangem todos os ramos do conhecimento humano desde tópicos eminentemente técnicos como concreto até complexos modelos administrativos como os sistemas de gestão da qualidade e meio ambiente. As normas podem ser internacionais (normas ISO), regionais (p. ex. Mercosul), nacionais (p. ex. ABNT, DIN) etc... Além das normas existem outros documentos normativos utilizados, como os relatórios técnicos (TR na ISO) e as especificações técnicas (TS na ISO). Como as normas nacionais refletem o consenso em um determinado país e baseiam-se na experiência acumulada por aquela sociedade, nem sempre o que é ótimo para uma nação é adequado a outra. Por isso estabeleceu-se em 1947 um fórum internacional de normalização. Lá os organismos de normalização dos países interessados na normalização internacional estabelecem normas de comum acordo para facilitar o diálogo entre os povos, o comércio internacional e o avanço da ciência e da tecnologia. Esse organismo internacional de normalização, com sede em Genebra, Suíça, constituído por 162 países (em 31/12/2009), é uma organização não governamental e seu nome é International Organization for Standardization. O prefixo ISO utiizado em todas as suas normas deriva do prefixo grego isos, que significa mesmo, igual. Os princípios da normalização internacional são: UÊ Igualdade de direitos dos membros, qualquer membro da ISO tem direito a participar de quaisquer comitê técnico que desenvolva normas que julgar de interesse para seu país. Cada país tem direito a um voto independentemente do tamanho e riqueza de sua economia. UÊ Normas voluntárias, todas as normas desenvolvidas pela ISO são de caráter voluntário e são adotadas pelas empresas e nações apenas se o desejarem. UÊ Direcionamento ao mercado, a ISO só desenvolve normas quando há interesse do mercado. São reunidos especialistas e representantes de agências governamentais e da academia, dos consumidores e de laboratórios para a elaboração das mesmas.
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UÊ As normas ISO são desenvolvidas à partir do consenso das partes envolvidas, o que lhes dá, apesar do caráter voluntário, uma enorme penetração no mercado mundial. UÊ As normas ISO constituem-se em um acordo técnico que dá a base para uma tecnologia compatível internacionalmente. Dentro da ISO as normas são desenvolvidas em comitês técnicos constituídos pelos organismos de normalização interessados, especialistas, representantes dos consumidores e governos e academia. Os mais conhecidos são o TC 176 que trabalha com gestão da qualidade e garantia da qualidade, responsável pelo desenvolvimento e atualização da série ISO 9000 Sistemas de Gestão da Qualidade e o TC 207 que trabalha com gestão ambiental e é responsável pela série ISO 14000 Sistemas de Gestão Ambiental.
5.3. Histórico da evolução dos sistemas normalizados de gestão A evolução histórica dos sistemas normalizados de gestão nos mostra que eles tiveram sua origem ligada principalmente aos fornecimentos a governos e organizações militares. Dentre as primeiras normas relacionadas com sistemas de gestão podemos citar: Tabela 5.1: Primeiras normas relacionadas com sistemas de gestão ANO
NORMA 0,/4$ AQAP $3,$ &6$= $6 %6
ORIGEM ([pUFLWRGRV(8$ 27$1 $PHULFDQ3HWUROHXP,QVWLWXWH 1RUPD&DQDGHQVH 1RUPD$XVWUDOLDQD 1RUPD%ULWkQLFD
Duas normas se destacam: a CSA Z299, norma canadense com quatro níveis destinada prioritariamente à garantia da qualidade em instalações nucleares; e a BS 5750, norma inglesa utilizada para a avaliação do sistema de gestão da qualidade de fornecedores. A norma canadense, apesar de sua intenção ser a garantia da qualidade em instalações nucleares, foi utilizada extensivamente na América do Norte como modelo para implantação e operação de sistemas de garantia da qualidade. Um característica dessa norma é que o sistema resultante de sua implantação baseava-se extensivamente em documentação resultando num sistema de gestão burocrático e difícil de operar. A norma BS 5750 Quality Systems publicada em 1979 pela British Standards Institution serviu de base para a elaboração pela ISO da série ISO 9000.
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A rápida aceitação desse modelo de gestão no mundo, tornou a série ISO 9000 o maior sucesso internacional em termos de adoção pelas empresas, contando em 2009 com aproximadamente 1.064.000 certificados válidos (Fonte ISO survey 2009). O gráfico seguinte mostra a evolução do número de certificados de sistema de gestão da qualidade no período de 1993 a 2009.
)LJXUD²(YROXomRGRQ~PHURGHFHUWLÀFDGRV,62QRPXQGR
Deve-se observar que em dezembro de 2000 houve uma revisão da norma, sendo editada a ISO 9001:2000 o que levou as empresas a migrarem do modelo anterior para a nova versão. O prazo de transição terminou em dezembro de 2003.
5.4. A série ISO 9000 A série ISO 9000 é composta por quatro normas principais: UÊ ISO 9000:2005, Sistemas de Gestão da Qualidade – Fundamentos e Vocabulário. Estabelece um ponto de partida para o entendimento das normas e define os termos fundamentais usados na Família ISO 9000. UÊ ISO 9001:2008, Sistemas de Gestão da Qualidade – Requisitos. Contém requisitos a serem utilizados para atender eficazmente os requisitos de clientes e regulamentares aplicáveis e para aumentar a satisfação do cliente.
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UÊ ISO 9004:2009, Gestão para o sucesso sustentado de uma organização – Uma abordagem da gestão da qualidade. Fornece diretrizes às organizações para atingir o sucesso sustentado por meio de um enfoque de gestão da qualidade. É aplicável a qualquer organização independentemente de tamanho, tipo ou ramo de atividade. As práticas descritas na ISO 9004, se implantadas, permitem que o sistema da qualidade de organização seja mais eficiente e eficaz para o atingimento dos objetivos da organização. UÊ ISO 19011:2002, Diretrizes sobre auditorias em sistemas de gestão da qualidade e/ou ambiental. Fornece diretrizes para verificação da capacidade do sistema em alcançar os objetivos da qualidade. Pode ser usada para auditoria interna ou para auditar fornecedores. Existem diversas normas e documentos normativos que complementam as quatro normas principais da série ISO 9000. Podemos citar dentre eles: UÊ ISO 10005, Diretrizes para Planos da Qualidade. UÊ ISO 10006, Diretrizes para qualidade em gerenciamento de projetos. UÊ ISO 10007, Gestão da Qualidade – Diretrizes para gerenciamento da configuração. UÊ ISO 10012 – Partes 1 e 2, Garantia da Qualidade para equipamentos de medição – requisitos, controle, confirmação metrológica UÊ ISO/TR 10013, Diretrizes para documentação do sistema de gestão da qualidade. UÊ ISO 10014, Gestão da qualidade – Diretrizes para a percepção de benefícios financeiros e econômicos. UÊ ISO 10015, Gestão da Qualidade – Diretrizes para treinamento. UÊ ISO/TS 16949:2009, Sistemas de gestão da qualidade – Requisitos particulares para aplicação da ISO 9001:2008 para organizações de produção automotiva e peças de reposição pertinentes.
5.4.1. As normas ISO 9001:2008 e ISO 9004:2009
A norma ISO 9001:2008 pode ser encarada como um modelo para construir sistemas de gestão da qualidade. Esses modelos têm como finalidades principais a garantia da qualidade externa e a garantia da qualidade interna. A garantia da qualidade externa diz respeito à garantia a ser fornecida aos clientes de que a empresa que tem o sistema implantado e operacional possui condições de fornecer os produtos e serviços solicitados na qualidade, quantidade e prazos acorda-
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dos. O sistema de gestão deve então dar essa tranquilidade aos clientes com relação aos aspectos citados. Quando o relacionamento entre cliente e fornecedor é de longo prazo, essas características tornam-se mais importantes, pois um mau fornecedor poderá trazer prejuízos enormes ao cliente pelo não cumprimento de prazos, quantidade e qualidade. Já a garantia da qualidade interna visa dar à alta administração do fornecedor a certeza de que as operações e processos internos estão sendo realizados conforme o planejado e que um processo de melhoria contínua está em andamento. Dessa forma a alta administração pode concentrar-se em assuntos estratégicos evitando gastar tempo resolvendo as possíveis crises do dia a dia. A ISO 9001:2008 é voltada para a aplicação interna, certificação e fins contratuais, focada na eficácia do sistema de gestão da qualidade. Já a ISO 9004:2009 não tem propósitos de certificação ou finalidade contratual. É focada no sucesso sustentável da organização e sua capacidade de alcançar seus objetivos e metas de forma contínua ao longo do tempo com um enfoque de gestão da qualidade e na eficácia e eficiência do sistema de gestão da qualidade. Podemos entender eficiência como o uso adequado e racional dos recursos disponíveis e eficácia como o atendimento dos objetivos globais do sistema. O uso das normas ISO 9001:2008 e ISO 9004:2009 como par coerente, permite obter um modelo que atende aos conceitos de garantia interna e externa da qualidade Segundo a norma ISO/IEC 17000:2004, que contém as definições adotadas para as atividades de certificação e avaliação da conformidade, o termo produto quando citado nas normas de gestão deve ser entendido como resultado de um processo. Na ISO 9000:2005 são citadas quatro categorias de produtos: serviços (p. ex. transporte), software (p. ex. programas de computador, dicionário), hardware (p. ex. motores, componentes mecânicos), materiais processados (p. ex. lubrificantes). Muitos produtos contêm elementos ou subconjuntos que atendem a mais de uma categoria. Então ele será classificado segundo o elemento dominante. 5.4.2. Os princípios gestão da qualidade para a série ISO 9000
A revisão da série ISO 9000 terminada em dezembro de 2000 e mantida nas revisões seguintes foi baseada nos seguintes princípios: UÊ Organização focada no cliente UÊ Liderança UÊ Envolvimento das pessoas UÊ Enfoque no processo UÊ Abordagem sistêmica para gerenciamento UÊ Melhoria contínua UÊ Tomada de decisões baseada em fatos UÊ Relacionamento com fornecedor mutuamente benéfico
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Esses princípios são consenso dos modelos de maturidade empresarial que se desenvolveram nos últimos anos com o advento dos prêmios de qualidade, tais como o prêmio Malcolm Baldrige nos Estados Unidos da América e o prêmio de qualidade, European Quality Award da EFQM, European Foundation for Quality Management. Dessa forma a norma ISO 9001:2008 continuou alinhada com a tendência mundial na área da Gestão da Qualidade. 5.4.3. Estrutura da norma ISO 9001:2008
A norma ISO 9001:2008 está estruturada em oito capítulos conforme se segue: 0. Introdução 1. Escopo 2. Referências Normativas 3. Termos e Definições 4. Sistema de Gestão da Qualidade 5. Responsabilidade da Administração 6. Gestão de Recursos 7. Realização do Produto 8. Medição, Análise e Melhoria Anexo A: Correspondência entre a ABNT NBR ISO 9001:2008 e a ABNT NBR ISO 14001:2004. Anexo B: Alterações entre a ABNT NBR ISO 9001:2000 e a ABNT NBR ISO 9001:2008. A Figura 5.3 resume a estrutura da norma:
Figura 5.3 – Estrutura baseada na ABNT/ISO 9001:2008.
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O conteúdo dos tópicos citados a seguir deve ser consultado na própria norma, mas os seguintes comentários são relevantes na interpretação dos mesmos: (os números entre parênteses referem-se à numeração da norma). UÊ (0) Introdução O item introdução traz ao leitor para a motivação da elaboração da mesma e cita que a mesma pode ser utilizada para finalidade de certificação por partes internas ou externas à empresa. Encontramos ainda conceitos da “abordagem de processo” para o desenvolvimento implementação e melhoria da eficácia de um sistema de Gestão da Qualidade. O conceito de melhoria contínua é abordado dentro do ciclo PDCA (Plan, Do, Check, Action). Esclarece-se a relação com as normas ISO 9004 e ISO 14001. UÊ (1) Objetivo Deixa claro que é uma norma de requisitos e, portanto, certificável, enfatizando os itens de atendimento aos requisitos do cliente e requisitos regulamentares (requisitos obrigatórios impostos por uma autoridade, em geral por regulamentos, portarias ou leis). Fala ainda da melhoria contínua. UÊ (2) Referências Normativas Refere-se à norma que tem relação com a ISO 9001:2008. No caso cita-se a ISO 9000:2005. UÊ (3) Termos e Definições Remete o leitor à norma ISO 9000:2005 para os termos e definições. UÊ (4) Sistema de Gestão da Qualidade UÊ (4.1) Requisitos gerais Deve-se observar que os conceitos neste item têm como objetivo estruturar administração do sistema conforme definido no tópico 5.1.5 deste capítulo. O item 4 da norma, Sistema de Gestão da Qualidade, estabelece quais são os requisitos aplicáveis ao mesmo. Dentro do conceito de teoria dos sistemas este tópico requer a caracterização do sistema. Deve-se identificar os processos, que são os componentes do sistema, sua interação, recursos necessários e controles. Quais são as fronteiras do sistema definidas pelo seu escopo, com considerações e justificativas sobre exclusões, ou seja o que está dentro do sistema e o que está fora. Deve-se observar que não é explorado o conceito de ambiente do sistema conforme citado no item 5.1.2 deste livro onde se recomenda identificar não só o que está ou não incluído no sistema, mas também quais as variáveis externas que o influenciam e têm importância para o mesmo.
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O requisito fundamental é que o sistema deve ser estabelecido, documentado, implementado, mantido controlado e melhorado continuamente. Então deve-se estabelecer o sistema de gestão, o que só pode ser feito à luz da teoria dos sistemas e tendo em vista que se está projetando um sistema de gestão para o sistema maior, empresa. Para projetá-lo corretamente os objetivos reais do sistema empresa, sua interação com os objetivos para a qualidade, seus recursos, componentes e interação entre eles e o seu ambiente devem estar claramente entendidos pelos analistas. Com o sistema de gestão da qualidade projetado e estabelecido, é requisito documentá-lo para que a gestão possa ser feita baseada em procedimentos e regras declaradas e rastreáveis. É evidente que a quantidade de documentação deve ser a mínima necessária para manter a coerência do sistema ao longo do tempo, para que seja possível operá-lo e que as alterações e melhorias possam ser realizadas de maneira controlada e conhecida. Para que o sistema de gestão seja eficaz é necessário então implementá-lo. A implementação deve ser feita de forma a que se consiga com que todos os subsistemas da empresa contribuam para o objetivo global declarado. Isso implica em que devemos ter todos os processos e subsistemas mapeados e sob controle, medindo seu desempenho através de indicadores relacionados com os objetivos globais. Os recursos do sistema global devem ser disponibilizados por meio de uma sistemática de gestão de recursos que permita serem alcançados os objetivos locais dos processos e subsistemas. O sistema de gestão da qualidade deve permitir então monitorizar, medir onde aplicável e analisar os processos tomando as necessárias ações corretivas e preventivas para atingir os resultados planejados e privilegiando a melhoria contínua de todos os processos e subsistemas. Esse controle inclui os processos terceirizados. UÊ (4.2) Requisitos de documentação A norma requer como documentação mínima: UÊ Declarações da política da qualidade e dos objetivos da qualidade. UÊ Manual da qualidade. UÊ Alguns procedimentos documentados específicos. UÊ A documentação mínima necessária para o planejamento, operação e controle do sistema global. UÊ Alguns registros especificados na norma. Os procedimentos que devem ser obrigatoriamente documentados são citados na norma como “procedimentos documentados” e os registros obrigatórios são seguidos da observação” (ver 4.2.4)”. A complexidade da documentação está correlacionada com a complexidade do sistema gerido e também com a competência do pessoal envolvido nos processos e na organização.
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(4.2.1) Manual da qualidade O manual da qualidade é um documento que contém a especificação do sistema sendo gerido. Isso abrange o escopo, os processos e suas interações e a definição da documentação estabelecida para o sistema. Essa documentação pode ou não estar anexada ao manual, mas deve ser referenciada no mesmo. (4.2.2) Controle de documentos Como o sistema de gestão da qualidade está descrito e consolidado em seus procedimentos documentados é fundamental que esses documentos sejam mantidos em boa ordem e atualizados. A norma requer um procedimento documentado para gerir e controlar os documentos de forma a preservá-los e mantê-los sempre atualizados. É necessário identificar e controlar os documentos de origem externa necessários para o planejamento e operação do sistema de gestão da qualidade. A linguagem escrita é uma forma eficiente de comunicação é perene e permite a rastreabilidade. Também carrega consigo autoridade e as pessoas tendem a respeitar mais os códigos escritos. É importante notar que a documentação pode estar em qualquer tipo de forma ou meio de comunicação. UÊ (4.2.3) Controle de registros Registros são um tipo particular de documentos. Enquanto os procedimentos descrevem como devem ser realizadas as operações e executados os processos, os registros contêm os dados históricos de como os procedimentos foram executados. Os procedimentos nos mostram como fazer, e os registros nos mostram o que foi feito. Os registros devem ser mantidos íntegros e disponíveis para consultas durante um período determinado. A norma requer controles para identificação, armazenamento, proteção, recuperação, retenção e disposição dos registros. UÊ (5) Responsabilidade da direção Este tópico da norma detalha os requisitos ligados ao gerenciamento do sistema do sistema de gestão da qualidade. Envolve a declaração dos objetivos globais, o planejamento e o controle no nível estratégico. UÊ (5.1) Comprometimento da direção O sistema de gestão da qualidade só poderá ser eficaz se no seu comando estiver uma liderança comprometida com seu desenvolvimento, implementação e melhoria contínua. A norma pede evidências disso por ações efetivas tais como: UÊ Disseminação da cultura da qualidade ressaltando a importância de atender aos requisitos dos clientes. Neste ponto colocam-se também como clientes os acionistas e a sociedade com o atendimento aos requisitos estatutários e regulamentares. UÊ Fazendo a declaração do objetivo global por meio de uma política da qualidade.
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UÊ Definindo objetivos para a qualidade e desdobrando-os nos diversos níveis hierárquicos, UÊ Fazendo o controle do sistema através das análises críticas, UÊ Fornecendo os recursos necessários para que os componentes e subsistemas possam cumprir suas missões. UÊ (5.2) Foco no cliente Neste ponto a norma pede garantias de que os requisitos do cliente são determinados e atendidos. O ponto principal aqui é que, com a aplicação do sistema de gestão da qualidade para todos os tipos de organização, nem sempre o cliente é facilmente identificável. Existem casos, como o de agências governamentais em que o cliente é genericamente definido como sendo a sociedade. Fica então difícil determinar precisamente seus requisitos e é necessário um esforço adicional para atender a este item. UÊ (5.3) Política da qualidade Já houve uma tendência de elaboração de políticas genéricas do tipo: “buscar a satisfação do cliente e dos colaboradores e procurar tornar a nossa organização a melhor em seu setor....”. Hoje são necessárias políticas que sejam adequadas ao propósito da organização (coerentes com os objetivos globais) e que possibilitem o estabelecimento de objetivos locais e seu acompanhamento. UÊ (5.4) Planejamento Ainda como parte da atividade de administração do sistema de gestão da qualidade são requisitos que os objetivos da qualidade sejam desdobrados nos diversos níveis da organização e que eles sejam ser mensuráveis e possam ser relacionados com a política da qualidade. A concepção do sistema deve ser feita levando em consideração os requisitos do item (4.1). Neste tópico a norma está pedindo que o sistema de gestão tenha sido planejado e que todos os componentes e subsistemas estejam em sintonia com o objetivo global. Outro aspecto importante é que o sistema seja robusto e que quando forem feitas mudanças não se perca a coerência global planejada e implementada inicialmente. UÊ (5.5) Responsabilidade, autoridade e comunicação É requisito da norma que sejam definidas e que todos saibam suas responsabilidades e autoridades dentro da organização. Isso faz parte do processo de comunicação buscando direcionar todos os processos na direção dos objetivos desdobrados da política. Para uma boa governança do sistema define-se um administrador, o representante da direção, que tem por responsabilidade cuidar do dia a dia do sistema assegurando que os processos estejam alinhados com os objetivos e política. Esse representante da direção é ainda responsável por fornecer a realimentação à alta administração para que possa ser feita a análise crítica do desempenho do sistema. A norma pede ainda que seja estabelecido um sistema de realimentação à organização sobre o atingimento das metas e objetivos estabelecidos de modo que o ciclo PDCA possa ser praticado por todos.
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UÊ (5.6) Análise crítica pela direção A função controle deve ser exercida pela alta administração. A norma lista uma série de informações que devem ser consideradas na análise e relaciona as saídas da análise crítica. Pode-se observar uma ênfase na melhoria contínua nessas listas de informações requeridas. Como considerações adicionais deve-se notar que o mais importante nessa análise crítica pela administração não é o acompanhamento do dia a dia, que já é realizado pelo representante da direção. A alta administração deve fazer as seguintes perguntas: UÊ O sistema de gestão da qualidade está sendo operado de forma eficiente conforme foi planejado? UÊ Se estiver sendo eficiente, está sendo eficaz? UÊ Os clientes estão mais satisfeitos com a organização? O número de reclamações diminuiu? UÊ Se tudo estiver bem, os custos de operação do sistema estão num patamar razoável? UÊ A melhoria contínua existe realmente? UÊ Os recursos estão sendo alocados de maneira inteligente, com baixos custos de oportunidade?
UÊ (6) Gestão de recursos Os recursos do sistema são os meios que estão disponíveis para a realização de seus processos com a finalidade de atingir os seus objetivos. Os recursos encontram-se dentro do sistema. A norma prescreve que um sistema de gestão da qualidade deve possuir um subsistema destinado à gestão de recursos. UÊ (6.1) Provisão de recursos A norma pede que as sejam determinadas necessidades de recursos para que os objetivos do sistema de gestão da qualidade sejam atingidos. Isso faz parte do processo de planejamento do sistema. É importante lembrar que essa determinação de necessidades deve ser feita continuamente à medida que o sistema evolui por meio do replanejamento. Essa consideração nos leva à conclusão de que o processo de planejamento é uma atividade contínua e que não cessa com a finalização do primeiro plano, mas que deve ser exercida continuamente. UÊ (6.2) Recursos humanos Deve-se ressaltar o conceito de que o pessoal que executa atividades que afetam a qualidade deve ser competente com base em educação, treinamento, habilidade e experiência apropriados. Isso permite uma flexibilidade ao determinar-se a competência apropriada a cada função, mas ao mesmo tempo coloca a questão da complexidade das múltiplas combinações possíveis das dimensões da competência. O fato mais relevante
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é a necessidade da determinação e obtenção das competências, para as atividades que afetam a qualidade do produto, comparada com o conceito antigo do levantamento das necessidades de treinamento. Para reforçar a importância desse ponto, há uma nota no item 6.2.1 para explicar que a conformidade com os requisitos do produto pode ser afetada direta ou indiretamente pelas pessoas que desempenham qualquer tarefa dentro do sistema de gestão da qualidade. As ações para a obtenção das competências identificadas devem ser tomadas se houver discrepância entre a situação real e a necessidade determinada. UÊ (6.3) Infraestrutura A norma requer que as necessidades de infraestrutura para alcançar a conformidade do produto sejam determinadas e que essa infra-estrutura seja provida e mantida. Aqui encontramos os conceitos de planejamento e de manutenção da infraestrutura a longo do tempo. Na realidade é um detalhamento do item (6.1). UÊ (6.4) Ambiente de trabalho Encontramos uma frase sobre as condições do ambiente de trabalho onde a norma de maneira genérica fala sobre as condições necessárias para alcançar a conformidade com os requisitos do produto. A intenção não é, neste caso, de estabelecer requisitos sobre saúde e segurança ocupacional, tratados na norma OHSAS 18001. Entenda-se que quando as condições do ambiente de trabalho puderem prejudicar a conformidade com os requisitos do produto, p.ex. contaminações cruzadas, a organização deva tomar providências. É evidente que se as condições de trabalho são demasiadamente adversas, impactando os trabalhadores, poderá haver impactos negaivos na conformidade com os requisitos do produto, mas neste tópico a norma foi concisa. Há uma nota explicativa indicando que o termo ambiente de trabalho se refere às condições sob as quais o trabalho é executado, incluindo fatores físicos, ambientais e outros, tais como ruído, temperatura, umidade, iluminação e condições meteorológicas. UÊ (7) Realização do produto É o tópico da norma mais extenso, onde encontramos os requisitos ligados mais intimamente à conformidade com os requisitos do produto. Na teoria dos sistemas corresponde à administração dos componentes ou subsistemas de forma a que seus processos contribuam para os objetivos globais do sistema maior. UÊ (7.1) Planejamento da realização do produto É a fase de elaboração do denominado plano da qualidade. Pedem-se os objetivos da qualidade e requisitos para o produto. Processos, documentos e recursos. Verificação, validação, monitoramento, inspeção e ensaios. Registros. Ferramentas úteis para a elaboração dos planos da qualidade podem ser o FMEA e o QFD, tratados em outros capítulos deste livro.
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UÊ (7.2) Processos relacionados a clientes A norma coloca requisitos relacionados com a determinação dos requisitos relacionados o produto (7.2.1), análise crítica dos requisitos relacionados ao produto (7.2.2), comunicação com o cliente (7.2.3). A determinação dos requisitos relacionados ao produto é destacada pela sua importância, pois um erro nessa fase implicaria num produto não conforme ao final de todos os processos. Deve ser dado destaque à determinação dos requisitos não declarados pelo cliente, mas necessários ao uso especificado ou intencional. Outros pontos importantes são os requisitos regulamentares (legais), que mesmo não sendo especificados pelo cliente devem ser atendidos pelo fornecedor. A organização deve ainda analisar criticamente esses requisitos para verificar se tem capacidade para atendê-los e se os mesmos não diferem do pedido original, sem acordo posterior. Como último processo, mas não menos importante o de comunicação com o cliente, fonte de tantos problemas no mundo real. UÊ (7.3) Projeto e desenvolvimento Muitas organizações procuram excluir este processo de seus sistemas de gestão da qualidade. Mas se quaisquer atividades realizadas na definição do produto impactam o cliente de alguma forma, o item (7.3) ou partes dele devem ser incluídas no sistema de gestão da qualidade. Por exemplo, se uma organização não recebe do cliente todos os dados necessários para planejar os processos de realização do produto e tem de definir esses dados com base em requisitos do cliente e/ou regulamentos, isto por definição é projeto e desenvolvimento. O sistema de gestão da qualidade deve então conter esse processo como uma de suas partes. Quando citamos produto estamos incluindo também serviços, informação e materiais processados. Mesmo quando um dos itens da norma é sub-contratado, a responsabilidade pelos resultados e o impacto na conformidade aos requisitos do cliente é da organização o item deve ser incluído no sistema de gestão da qualidade. UÊ (7.3.1) Planejamento do projeto e desenvolvimento A norma pede um planejamento e controle de todo o projeto e desenvolvimento. Além do detalhamento das fases do projeto e desenvolvimento, deve ser planejado o controle da evolução do projeto. As interfaces entre grupos que participem do desenvolvimento devem ser gerenciadas, com a designação das responsabilidades e autoridades de cada um. UÊ (7.3.2) Entradas e saídas de projeto e desenvolvimento Nesse item o projeto é encarado como uma caixa preta com entradas e saídas. É requisito que as entradas necessárias devem ser determinadas e analisadas criticamente. É dada importância, além dos requisitos dos clientes, a requisitos legais. Como é de boa prática em projetos as informações de projetos anteriores também devem ser consideradas.
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UÊ (7.3.3) Saídas de projeto e desenvolvimento Neste ponto ressalta-se a importância das saídas serem coerentes com as especificações de entrada. Além disso devem conter as informações necessárias para as fase posteriores, de aquisição, produção, inspeção, uso e serviços. É usual encontramos projetos que ao longo de seu desenvolvimento afastam-se das especificações iniciais e resultam num produto que não se adequa ao uso pretendido pelo cliente. UÊ (7.3.4) Análise crítica de projeto e desenvolvimento A análise crítica do projeto e desenvolvimento é uma atividade destinada a obter uma visão global sobre os rumos do projeto e desenvolvimento. É realizada por todas as funções envolvidas com os estágios do projeto e desenvolvimento que estão sendo analisados criticamente. Não tem por objetivo verificar cálculos ou detalhes de cronogramas, mas sim identificar se a direção tomada pelo projeto e desenvolvimento e as soluções identificadas ou propostas serão adequadas para atender aos requisitos do cliente e regulamentares. A análise crítica é feita em pontos singulares do projeto e desenvolvimento, para possibilitar, se necessária, uma mudança de rumo em tempo hábil. UÊ (7.3.5) Verificação do projeto e desenvolvimento A verificação do projeto e desenvolvimento é uma atividade de controle destinada a assegurar que as saídas estejam atendendo aos requisitos de entrada do projeto e desenvolvimento. Diferente da análise crítica é uma atividade mais voltada ao dia a dia e busca garantir que o projeto e desenvolvimento estejam caminhando na direção planejada. UÊ (7.3.6) Validação do projeto e desenvolvimento Após a conclusão do projeto e desenvolvimento é necessário assegurar que o resultado atende aos requisitos de entrada. A validação pode ser feita com ensaios em protótipos, análise de projetos semelhantes já implementados, simulações ou testes de campo, entre outras possibilidades. UÊ (7.3.7) Controle de alterações de projeto e desenvolvimento É uma atividade importantíssima que envolve não só o registro das alterações, mas também análise crítica, verificação e sua validação. A análise crítica dos efeitos dessas alterações deve incluir as partes componentes e o produto já entregue. Quando frequente, ou quando afeta a segurança do usuário, pode necessitar da gestão da configuração para possibilitar serviços ou “recalls” (situação onde um fabricante é obrigado a recolher e/ou reparar todos os produtos já entregues por conta de um defeito detectado após a colocação do produto no mercado). UÊ (7.4) Aquisição O princípio básico colocado na norma é de que a organização deve assegurar que o produto adquirido está conforme as especificações de aquisição. Deve então fornecer
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todas as informações necessárias para descrever adequadamente o produto a ser adquirido. Isso inclui o produto propriamente dito,os processos de produção, o pessoal,os equipamentos e o sistema de gestão da qualidade do fornecedor. Os fornecedores devem ser selecionados com base em suas capacidades de atenderem aos requisitos especificados. Deve ser estabelecido e implementado um sistema de avaliação que permita avaliar os fornecedores e o produto adquirido. É evidente que as especificações de aquisição devem ser derivadas das especificações do produto final. Nesse ponto o QFD e o FMEA são ferramentas muito úteis. UÊ (7.5) Produção e fornecimento do serviço Este item trata da gestão dos processos de realização do produto. A base da gestão é ter os processos sob controle. Isso implica em que os objetivos globais devem ter sido desdobrados e que os processos têm seus objetivos locais alinhados com os objetivos da organização. A técnica do desdobramento de políticas, “policy deployment” é bastante útil nessa gestão. UÊ (7.5.1) Controle de produção e fornecimento de serviço O controle de produção e fornecimento de serviço pressupõe que toda a base de recursos necessária já esteja disponível tanto em hardware ( máquinas, edifícios, equipamentos de medição,...), como software (especificações, procedimentos, programas de computador, rotinas...). Além da disponibilidade da base de recursos, os processos de inspeção, medição e monitorização, liberação devem estar implementados e operacionais. UÊ (7.5.2) Validação dos processos de produção e fornecimento de serviços Alguns processos têm a característica de que suas saídas não podem ter suas conformidades às especificações asseguradas por inspeções subsequentes. Dessa forma a conformidade só pode ser assegurada por um processo capaz. Isso é um falto comum em processos de soldagem, pintura e elaboração de software entre outros. A norma pede que a organização identifique esses processos e faça sua validação demonstrando a capacidade dos mesmos alcançarem os resultados planejados. UÊ (7.5.3) Identificação e rastreabilidade A identificação do produto ao longo dos processos de sua realização pode ser necessária para evitar a possibilidade de troca de componentes ou aplicação indevida de procedimentos. As formas de identificação são variadas mas é essencial que a situação de monitorização e medição com relação aos requisitos esteja clara. Em outras palavras, produtos aprovados, reprovados, não inspecionados ou aguardando liberação devem estar claramente identificados. A rastreabilidade que é a capacidade de identificar as matérias primas, produtos intermediários e etapas do processo produtivo que deram origem ao produto e/ou as etapas da cadeia de distribuição e uso do produto depois de sua saída da organização.
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UÊ (7.5.4) Propriedade do cliente Muitas vezes o cliente fornece materiais para serem processados, equipamentos ou componentes a serem agregados ao produto. Nesse item a norma recomenda os cuidados com a propriedade do cliente e define requisitos para comunicação com o mesmo. Note-se que a propriedade do cliente inclui propriedade intelectual e dados pessoais. UÊ (7.5.5) Preservação do produto São estabelecidos requisitos para a preservação da conformidade do produto durante o processo interno e entrega. É usual haver danos e perda da conformidade durante o manuseio interno, armazenamento e entrega do produto. A norma coloca esse item para obrigar os gestores do sistema da qualidade a focarem também esse tópico. UÊ (7.5.6) Controle de dispositivos de medição e monitoramento A metrologia sempre foi uma grande preocupação na gestão da qualidade. Não deixa de ser diferente na versão da ISO 9001:2008. Esse item é detalhado nos cuidados com os dispositivos de medição e monitoramento, a serem utilizados conforme determinado pelo plano da qualidade. Dentre os pontos mais importantes destacam-se a rastreabilidade metrológica onde se procura ligar os padrões utilizados na calibração e verificação aos padrões de medição internacionais e nacionais, a identificação adequada inclusive da situação de calibração, ajustes quando necessário e proteção contra danos e ajustes indevidos. Outro aspecto essencial é que o dispositivo seja adequado para a medição que está sendo realizada. UÊ (8) Medição, análise e melhoria UÊ (8.1) Generalidades Quando conceituamos na teoria dos sistemas a componente administração do sistema, destacamos a atividade de controle. Para isso é necessária a realimentação da informação sobre o desempenho dos subsistemas e processos e sobre o ambiente, o que permite a tomada de ações para a correção de rumo, prevenção e/ou melhoria contínua. Outra função deste item é a garantia da qualidade externa, quando deve ser demonstrado aos clientes que o produto está em conformidade com as especificações. UÊ (8.2) Medição e monitoramento A norma requer a monitorização da satisfação dos clientes. Não basta a gestão das reclamações dos clientes, o que configura a medição da insatisfação dos mesmos. Deve-se procurar de alguma forma medir a satisfação dos clientes. Existem vários tentativas de metodologia em uso no mercado, a maioria através de pesquisas com questionários estruturados, mas há dúvidas sobre a eficácia desses métodos. A medição da aderência e manutenção do sistema de gestão da qualidade ao seu desenho inicial é feita por meio de auditorias internas.A própria organização procura fazer uma auto avaliação, segundo regras que garantem a imparcialidade, objetividade e
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abrangência da auditoria, como forma de evitar que o sistema desvie-se dos propósitos originais. Devem ser mantidos registros das auditorias internas e seus resultados. Não se deve confundir a auditoria interna com a análise crítica pela administração. A auditoria interna fornece subsídios para a análise crítica. A análise crítica é que vai avaliar se o sistema, na forma em que está implementado e mantido, atende aos objetivos globais da organização. Os processos devem ser monitorizados e medidos para demonstrar que têm condições de alcançar os resultados para que foram planejados. Devem ser tomadas ações corretivas quando for necessário. A medição e monitorização do produto são item de destaque, uma vez que falhas nesse processo atingem diretamente o cliente. Novamente o plano da qualidade é fundamental para determinar os pontos apropriados de monitorização da conformidade do produto. A matriz 4 do QFD pode ser muito útil nessa atividade. A liberação do produto para entrega ao cliente somente pode ser feita por pessoas autorizadas e após todas as ações planejadas no plano da qualidade terem sido executadas. UÊ (8.3) Controle do produto não conforme O produto não conforme requer providências especiais para que não seja indevidamente entregue ou utilizado. A norma estabelece as disposições para o produto não conforme, que vão desde o uso sob concessão até a execução de ações para evitar o uso indevido. Um exemplo de uso indevido é a venda como sucata de autopeças que depois são desviadas para o comércio por um preço mais baixo. UÊ (8.4) Analise de dados Recomendação importante de que os dados coletados devem ser analisados e não somente armazenados. O objetivo da analise de dados é avaliar o desempenho geral do sistema com relação ao seu objetivo global. UÊ (8.5) Melhorias UÊ (8.5.1) Melhoria contínua A grande novidade da versão anterior (ISO 9001:2000) foi mantida na ISO 9001:2008. È a obrigatoriedade da prática da melhoria contínua. Isso pode ser verificado através da evolução dos indicadores do sistema e processos em relação às metas estabelecidas. Nas versões anteriores à do ano 2000 da norma uma organização poderia definir um patamar de qualidade e permanecer no mesmo indefinidamente. Hoje ela tem de melhorar continuamente sob pena de não estar conforme à norma. UÊ (8.5.2) Ação corretiva O grande diferencial do sistema de gestão da qualidade proposto pela ISO 9001:2000 e mantido na ISO 9001:2008 é o ciclo fechado de informação. As não conformidades são analisadas e propõem-se ações corretivas para determinar suas causas e evitar sua repetição. O importante é diferenciar ação corretiva de disposição da não con-
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formidade. Poe exemplo, se um produto está com problemas devido a um componente não conforme, a substituição do componente com problema é disposição da não conformidade. A ação corretiva seria investigar a causa da não conformidade no componente. Se a causa foi matéria-prima não conforme, a investigação da causa raiz pode chegar até a propor a mudança do sistema de inspeção de recebimento e do sistema de avaliação de fornecedores. UÊ (8.5.3) Ação preventiva As ações preventivas dizem respeito a problemas potenciais. São problemas que ainda não aconteceram, mas que poderão ocorrer se ações não forem tomadas. É fácil entender o conceito observando a medicina moderna, onde recomendações de dieta saudável e exercícios físicos sistemáticos ajudam a prevenir moléstias cardiovasculares em indivíduos sadios. Essa cultura deve ser implementada e exercitada nas organizações. Todos esses comentários são complementares à leitura atenta e compreensiva do texto da norma.
5.5. A série ISO 14000 A preocupação com o meio ambiente sempre foi uma constante para os que vivem próximos à natureza. Basta ver o cuidado que os camponeses têm com a proteção dos mananciais evitando retirar a cobertura vegetal desses lugares. No entanto com o advento do capitalismo selvagem, movido pelo lucro a qualquer preço, assistimos com pesar a degradação do meio ambiente em proporções assustadoras. A consciência de que a degradação ambiental traria impactos para a humanidade foi pela primeira vez relatada de forma sistêmica no relatório Limts to Growth publicado em 1972 pelo Clube de Roma, organização formada por um grupo de cientistas que se reuniram para debater o futuro do planeta. Uma das principais conclusões foi a de que não é possível para nossa civilização crescer indefinidamente, dado que os recursos naturais são limitados. Além disso, o planeta Terra tem uma capacidade limitada de absorver os resíduos produzidos por nossa civilização. Um dos resíduos mais amplamente liberado na atmosfera é o dióxido de carbono. A concentração de CO2 na atmosfera vem crescendo em ritmo exponencial nos últimos 200 anos, agravando o chamado efeito estufa que causa o aquecimento global do planeta. Um tratado internacional entrou em vigor em 16 de fevereiro de 2005, o Protocolo de Kyoto, tentando limitar as emissões de dióxido de carbono para a atmosfera. Todas essas tentativas buscam o chamado desenvolvimento sustentável que foi definido pela WCED (World Commission on Environment and Development) das Nações Unidas em 1967 no relatório Our Common Future também chamado relatório Brundtland.
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A definição do WCDE diz que “desenvolvimento sustentável é aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de atenderem às suas próprias necessidades”. É evidente que a sociedade passou a organizar-se em torno desse ideal. Começou a crescer a pressão dos denominados partidos verdes e ONG organizações não governamentais sobre os poluidores. Grandes acidentes como Bhopal na Índia, Exxon Valdez no Alasca, Chernobil na Rússia e o buraco na camada de ozônio criaram comoção em todo o mundo. Os governos reagiram com legislação, normas e regulamentos relativos ao meio ambiente cada vez mais rígidos. Os consumidores em todo o mundo passaram a preferir produtos ambientalmente corretos. Em consequência passou a ser uma necessidade e uma vantagem comparativa demonstrar aos clientes que os produtos eram produzidos em uma empresa com preocupações ambientais alinhadas com o restante da sociedade. A série de normas ISO 14000, lançada em 1996, veio disponibilizar para as empresas, que compartilhassem com a preocupação de preservação do meio ambiente, uma ferramenta gerencial adequada e moderna que tanto serve para gestão ambiental como para demonstrar ao público esterno que a empresa que o utiliza é comprometida com o futuro de nosso planeta. A série foi baseada na filosofia da série ISO 9000, incorporando na época inovações importantes como o conceito de melhoria contínua. Seu desenvolvimento foi feito pelo comitê técnico da ISO TC 207. As normas constituintes da série ISO 14000:2004 são: UÊ NBR ISO 14001:2004 – Sistemas de Gestão Ambiental – Requisitos com orientações para uso. UÊ ISO 14004:2004 – Sistemas de Gestão Ambiental – Diretrizes gerais sobre princípios, sistemas e técnicas de apoio. UÊ NBR ISO 19011:2002 – Diretrizes para Auditoria de Sistema de Gestão da Qualidade e/ou Ambiental. UÊ OBS: existem outras normas e documentos normativos, mas as citadas são as mais relevantes para o tema deste capítulo. A norma NBR ISO 14001:2004 é versão brasileira da norma internacional equivalente ISO 14001:2004. Contém apenas os requisitos que podem ser efetivamente auditados. A norma ISO 14004:2004 contêm diretrizes gerais sobre princípios, sistemas e técnicas de apoio ao desenvolvimento e implantação de sistemas de gestão ambiental. A norma ISO 19011:2002 é resultado da unificação das normas de auditoria de sistemas de gestão da qualidade e de gestão ambiental.
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5.5.1. A norma ISO 14001:2004
A ISO 14001 determina os elementos para um Sistema de Gestão Ambiental eficaz. É aplicável a todos os tipos e tamanhos de organização. Tem a sua origem na norma inglesa BS 7750, da mesma forma que a ISO 9001 foi criada a partir da também norma inglesa BS 5750. É objetivo desta norma é equilibrar a proteção ambiental e a prevenção da poluição com as necessidades sócio-econômicas da população. Não é intenção que ela seja utilizada como barreira comercial não tarifária. A lógica adotada na norma é o PDCA, Plan, Do, Check, Action ou seja planejar, executar, verificar e agir.
Figura 5.4
Os pilares do sistema de gestão ambiental, segundo a ISO 14001 são: UÊ Prevenção no lugar da correção UÊ Planejamento de todas as atividades, produtos e processos UÊ Estabelecimento de critérios UÊ Coordenação e integração entre as partes (subsistemas) UÊ Monitoração contínua UÊ Melhoria contínua O sistema de gestão ambiental desenvolve-se em relação aos aspectos ambientais significativos. Esses aspectos ambientais significativos são elementos das atividades ou produtos ou serviços de uma organização que podem interagir com o meio ambiente e que pode ter um impacto ambiental significativo. Por impacto ambiental entende-se qualquer modificação no meio ambiente, adversa ou benéfica resultante dos aspectos ambientais da organização. A proposta é maximizar os efeitos benéficos e minimizar os efeitos adversos. O sistema de gestão ambiental deve ainda evoluir em função de mudanças circunstanciais. Outro aspecto importante é que a norma não estabelece critérios específicos de desempenho ambiental. Isso fica a critério do legislador ou da própria organização.
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Mas a organização deve comprometer-se em atender aos requisitos legais aplicáveis que se relacionem com seus aspectos ambientais. O fato de não serem estabelecidos critérios específicos de desempenho ambiental permite que a organização estabeleça critérios mais rígidos do que os definidos na legislação. 5.5.2. A estrutura da norma ISO 14001:2004
A ISO 14001 está dividida da seguinte maneira: as primeiras partes são introdutórias e visam apresentar a norma e seus objetivos e citar referências normativas. UÊ Os demais itens são: Item 3 – Termos e definições UÊ Item 4 – Requisitos do sistema de gestão ambiental. São os itens da norma que serão auditados na empresa; UÊ Anexo A – Traz orientações adicionais sobre o uso da norma. UÊ Anexo B – Traz a relação entre a NBR ISO 14001:2004 e a NBR ISO 9001:2008 e vice-versa. O detalhamento do item 4 é o seguinte: UÊ 4.1 Requisitos Gerais UÊ 4.2 Política ambiental UÊ 4.3 Planejamento UÊ 4.3.1 Aspectos Ambientais UÊ 4.3.2 Requisitos legais e outros UÊ 4.3.3 Objetivos, metas e programas UÊ 4.3.4 Programa(s) de Gestão Ambiental UÊ 4.4 Implementação e operação UÊ 4.4.1 Recursos, funções, responsabilidades e autoridades UÊ 4.4.2 Competência,Treinamento e Conscientização UÊ 4.4.3 Comunicação UÊ 4.4.4 Documentação UÊ 4.4.5 Controle de Documentos UÊ 4.4.6 Controle Operacional UÊ 4.4.7 Preparação e resposta a emergências UÊ 4.5 Verificação UÊ 4.5.1 Monitoramento e medição UÊ 4.5.2 Avaliação do atendimento a requisitos legais e outros UÊ 4.5.3 Não conformidade, ação corretiva e ação preventiva UÊ 4.5.4 Controle de registros UÊ 4.5.5 Auditoria interna
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UÊ 4.6 Análise pela administração Os detalhes devem ser vistos na própria norma disponível na Associação Brasileira de Normas Técnicas ABNT. O quadro seguinte dá uma ideia da gestão segundo a norma ISO 14001:2000 em uma empresa genérica.
Figura 5.5 – Fluxo do controle na norma ISO14001:2000.
5.6. A ISO TS 16949 A ISO TS 16949:2009 Sistemas de gestão da qualidade – Requisitos particulares para aplicação da ISO 9001:2008 para organizações de produção automotiva e peças de reposição pertinentes, como o próprio nome diz é um documento normativo denominado especificação técnica (Techincal Specification) destinado a uso na indústria automotiva, que coloca requisitos adicionais à ISO 9001:2008 para as empresas que atuam nesse setor. As montadoras automotivas depois de alguns anos de experiência com fornecedores certificados por normas da série ISO 9000 julgaram que a garantia da qualidade oferecida por esses sistemas de gestão não eram suficientes para as suas necessidades. Surgiram então diversos documentos normativos, que especificavam requisitos específicos de determinados clientes para seus fornecedores. Dentre esses podemos citar: UÊ QS 9000 EUA (em desuso) UÊ VDA 6
Alemanha
UÊ EAQF
França (em desuso)
UÊ AVSQ
Itália (em desuso)
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Essa profusão de modelos obrigava os fornecedores de mais de uma montadora a certificarem-se por diversos modelos diferentes acarretando custos e dificuldades crescentes. Houve um esforço da ISO para que as montadoras chegassem a um modelo único de requisitos para fornecedores. Esse processo foi iniciado dentro do TC 176 onde juntaram esforços técnicos da ISO e do IATF (International Automotive Task Force) representando as montadoras. O quadro seguinte mostra a evolução da ISO TS 16949. Tabela 5.2: Evolução da ISO TS 16949 1997
IATF (QS9000; VDA6, AVSQ, EAQF)
ISO TC 176 1RYRJUXSRGHWUDEDOKRQR7& 'HVHQYROYHVHXPPRGHOREDVHDGRQD,62 ,627&YRWDRUHODWyULRWpFQLFR 3XEOLFDGDD,6276 2,$7)GHÀQHRHVTXHPDGHFHUWLÀFDomR UHJLVWUR $GHVmRFUHVFHQWHGDVPRQWDGRUDV 3URMHWRGHDGDSWDomRj,62 3XEOLFDGDDDHGLomR,6276 3XEOLFDGDDDHGLomR,6276
A aceitação da ISO/TS 16949 é bastante grande no mundo. A tabela seguinte mostra a situação atual: Tabela 5.3: Situação em dezembro de 2010 da ISO TS 16949 Lançamento (GLomRFRUUHQWH 1~PHURGHFHUWLÀFDGRVHPLWLGRV 1~PHURGHHQWLGDGHVFHUWLÀFDGRUDVDFUHGLWDGDV 1~PHURGHDXGLWRUHVFHUWLÀFDGRV 1~PHURGHHVFULWyULRVGHVXSHUYLVmR
1999 DHGLomR²MXQKRGHEDVHDGDHLQFOXLQGRD ,62 IRQWH,$7) HVFULWyULRVJOREDLV
A norma ISO/TS 16949 não é aplicável sozinha. Deve ser aplicada em conjunto com os requisitos específicos de cada cliente. Cada montadora tem suas exigências particulares que devem então ser atendidas por seus fornecedores. O esquema de certificação funciona da seguinte maneira. Os fornecedores são obrigados a se certificarem em um modelo automotivo. A decisão de qual modelo deve ser adotado é da montadora. O IATF contrata as entidades certificadoras que fazem a certificação em seu nome. O mesmo IATF certifica os auditores que podem fazer as auditorias da ISO/TS 16949. O controle do esquema de certificação é feito pelos escritórios de supervisão que se reportam ao órgão central, o IATF.
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As montadoras têm cronogramas de aplicação dos modelos automotivos conforme a tabela seguinte: Tabela 5.4: Cronogramas de aplicação dos modelos automotivos Montadora %0: 'DLPOHU&KU\VOHU )LDW$XWR IRUQHFHGRUHVDWXDLV )RUG0RWRU *HQHUDO0RWRUV&RUSRUDWLRQ 36$3HXJHRW&LWURHQ 5HQDXOW 9RONVZDJHQ
Aplicação da ISO/TS 16949 2EULJDWyULD 2EULJDWyULDDSDUWLUGH 2SFLRQDODWp 2SFLRQDODWp 2SFLRQDODWp 2EULJDWyULRDSDUWLUGH 2EULJDWyULRDSDUWLUGH 2SFLRQDO
O IATF, international automotive task force é um grupo ad hoc de montadoras e associações de montadoras formado para melhorar a qualidade dos produtos automotivos no mundo. Ë formado pelas montadoras BMW, DaimlerChrysler, Fiat, Ford Motor Company, General Motors (incluindo Opel Vauxhall), PSA Peugeot-Citroen, Renault SA, Volkswagen e pelas respectivas associações – AIAG (U.S.), ANFIA (Itália, FIEV (França), SMMT (Reino Unido) e VDA (Alemanha). A ISO/TS 16949:2009 apresenta requisitos adicionais à ISO 9001:2008, a qual é obrigatória para a organização que pretende atender à essa especificação técnica. A relação seguinte mostra os itens adicionais solicitados. Para bom entendimento os itens originais da ISO 9001:2008 estão em negrito e os números entre parêntesis referem-se à numeração original na norma: UÊ (1) Objetivo UÊ (2) Referências normativas UÊ (3) Termos e Definições UÊ (3.1) Termos e definições para a indústria automobilística UÊ (4) Sistema de Gestão da Qualidade UÊ (4.1) Requisitos gerais UÊ (4.1.1) Requisitos gerais – suplemento UÊ (4.2) Requisitos de documentação UÊ (4.2.3.1) Especificações de engenharia UÊ (4.2.4.1) Retenção de registros UÊ (5) Responsabilidade da Direção UÊ (5.1) Comprometimento da direção UÊ (5.1.1) Eficiência do processo UÊ (5.2) Foco no cliente
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UÊ (5.3) Política da qualidade UÊ (5.4) Planejamento UÊ (5.4.1) Objetivos da qualidade UÊ (5.4.1.1) Objetivos da qualidade – suplemento UÊ (5.5) Responsabilidade, autoridade e comunicação UÊ (5.5.1) Responsabilidade e autoridade UÊ (5.5.1.1) Responsabilidade pela qualidade UÊ (5.5.2) Representante da direção UÊ (5.5.2.1) Representante do cliente UÊ (5.6) Análise pela direção UÊ (5.6.1) Generalidades UÊ (5.6.1.1) Desempenho do sistema de gestão da qualidade UÊ (5.6.2) Entradas para a análise crítica UÊ (5.6.2.1) Entradas para análise crítica – suplemento UÊ (6) Gestão de Recursos UÊ (6.1) Provisão de recursos UÊ (6.2) Recursos humanos UÊ (6.2.2.1) Habilidades para o projeto do produto UÊ (6.2.2.2) Treinamento UÊ (6.2.2.3) Treinamento no posto de trabalho UÊ (6.2.2.4) Motivação e atribuição de poder ao funcionário UÊ (6.3) Infraestrutura UÊ (6.3.1) Planejamento da planta, instalações e equipamentos UÊ (6.3.2) Planos de contingência UÊ (6.4) Ambiente de trabalho UÊ (6.4.1) Segurança do pessoal para obter a qualidade do produto UÊ (6.4.2) Limpeza do local UÊ (7) Realização do produto UÊ (7.1) Realização do produto UÊ (7.1.1) Planejamento da realização do produto – suplemento UÊ (7.1.2) Critérios de aceitação UÊ (7.1.3) Confidencialidade UÊ (7.1.4) Controle de alteração
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UÊ (7.2) Processos relacionados a clientes UÊ (7.2.1.1) Características definidas pelo cliente UÊ (7.2.2.1) Análise crítica dos requisitos relacionados ao produto – suplemento UÊ (7.2.2.2) Viabilidade de manufatura pela organização UÊ (7.2.3.1) Comunicação com o cliente – suplemento UÊ (7.3) Projeto e desenvolvimento UÊ (7.3.1.1) Abordagem multidisciplinar UÊ (7.3.2.1) Entradas de projeto do produto UÊ (7.3.2.2) Entradas de projeto do processo de manufatura UÊ (7.3.2.3) Características especiais UÊ (7.3.3.1) Saídas de projeto do produto – suplemento UÊ (7.3.3.2) Saídas de projeto de manufatura UÊ (7.3.4.1) Monitoramento UÊ (7.3.6.1) Validação de projeto e desenvolvimento – suplemento UÊ (7.3.6.2) programa de protótipo UÊ (7.3.6.3) Processo de aprovação de produto UÊ (7.4) Aquisição UÊ (7.4.1.1) Conformidade à regulamentação UÊ (7.4.1.2) Desenvolvimento do sistema de gestão da qualidade do fornecedor UÊ (7.4.1.3) Fontes aprovadas pelo cliente UÊ (7.4.3.1) Qualidade do produto recebido UÊ (7.4.3.2) Monitoramento do fornecedor UÊ (7.5) Produção e fornecimento do serviço UÊ (7.5.1.1) Plano de controle UÊ (7.5.1.2) Instruções de trabalho UÊ (7.5.1.3) Verificação da preparação para a produção (set-up) UÊ (7.5.1.4) Manutenção preventiva e preditiva UÊ (7.5.1.5) Gestão do ferramental da produção UÊ (7.5.1.6) Programação da produção UÊ (7.5.1.7) Realimentação da informação do serviço UÊ (7.5.1.8) Acordo de serviço com o cliente
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UÊ (7.5.2.1) Validação dos processos de produção e fornecimento de serviço – suplemento UÊ (7.5.3.1) Identificação e rastreabilidade – suplemento UÊ (7.5.4.1) Ferramental de produção de propriedade do cliente UÊ (7.5.5.1) Armazenamento e inventário UÊ (7.6) Controle de dispositivos de medição e monitoramento UÊ (7.6.1) Análise do sistema de medição UÊ (7.6.2) Registros de calibração/verificação UÊ (7.6.3) Requisitos de laboratório UÊ (8) Medição Análise e Melhoria UÊ (8.1) Generalidades UÊ (8.1.1) Identificação de ferramentas estatísticas UÊ (8.1.2) Conhecimento de conceitos estatísticos básicos UÊ (8.2) Medição e monitoramento UÊ (8.2.1.1) Satisfação dos clientes – suplemento UÊ (8.2.2.1) Auditoria do sistema de gestão da qualidade UÊ (8.2.2.2) Auditoria do processo de manufatura UÊ (8.2.2.3) Auditoria do produto UÊ (8.2.2.4) Plano de auditoria interna UÊ (8.2.2.5) Qualificação do auditor interno UÊ (8.2.3) Medição e monitoramento dos processos UÊ (8.2.3.1) Medição e monitoramento dos processos de manufatura UÊ (8.2.4) Medição e monitoramento de produto UÊ (8.2.4.1) Inspeção de layout e ensaio funcional UÊ (8.2.4.2) Itens de aparência UÊ (8.3) Controle de produto não conforme UÊ (8.3.1) Controle de produto não conforme – suplemento UÊ (8.3.2) Controle de produto retrabalhado UÊ (8.3.3) Informação ao cliente UÊ (8.3.4) Derroga do cliente UÊ (8.4) Análise de dados UÊ (8.4.1) Análise e uso de dados
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UÊ (8.5) Melhorias UÊ (8.5.1.1) Melhoria contínua da organização UÊ (8.5.1.2) Melhoria do processo de manufatura UÊ (8.5.2.1) Solução de problemas UÊ (8.5.2.2) A prova de erros UÊ (8.5.2.3) Impacto da ação corretiva UÊ (8.5.2.4) Ensaio/análise do produto rejeitado
5.6.1. Anexo A – Plano de controle
Da relação de itens incluídos pode-se perceber que a ISO/TS 16949 é bem mais prescritiva do que a ISO 9001:2008. O número de detalhes exigidos é grande e se ainda adicionarmos os requisitos específicos de cada cliente, percebe-se que o sistema fica com muito menos graus de liberdade. Todavia a implantação é mais objetiva e a recomendação do uso de ferramentas da qualidade ajuda no projeto do sistema. O uso extensivo do FMEA e ferramentas estatísticas são um requisito importante. Recomendamos a leitura cuidadosa do original da ISO/TS 16949 para que se possa obter um valioso aprendizado das técnicas de engenharia de produção aplicadas à manufatura.
5.7. Sistemas de certificação e acreditação no mundo Alguns fatores levaram os sistemas de gestão a assumirem um papel importante no contexto internacional. Podemos citar alguns importantes: UÊ O fenômeno da globalização, facilitando o comércio internacional e o tráfego de produtos pelo planeta. UÊ O fortalecimento da OMC, Organização Mundial do Comércio, que dificultou a utilização de barreiras tarifárias no comércio internacional. UÊ O surgimento do conceito do fornecedor classe mundial, onde um fornecedor passa a fornecer para seu cliente em todos os países onde ele tem subsidiárias. UÊ A necessidade de coerência na gestão de múltiplas filiais de uma mesma empresa ao redor do mundo. UÊ O conceito de parceria de longo prazo entre cliente e fornecedor demandando uma confiança na qualidade do fornecimento em termos de qualidade, prazo de entrega, quantidade e preço por muitos anos. UÊ O aumento da concorrência entre os fornecedores potenciais tornando mais difíceis e arriscadas as decisões de compra com base apenas no preço.
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O fato de existir um sistema de gestão da qualidade implantado com base em uma norma internacional aceita dá aos clientes uma confiança maior de que o fornecedor atenderá aos requisitos estabelecidos. A pergunta natural é como se pode assegurar que um sistema de gestão da qualidade implantado realmente está aderente aos requisitos da norma? A figura que segue demonstra os mecanismos utilizados para fornecer essa garantia:
)LJXUD²$VRSo}HVGRSURFHVVRGHFHUWLÀFDomRGHVLVWHPDVGHJHVWmR
Podemos observar na figura que quando o próprio fornecedor autodeclara o atendimento à norma temos a situação da “declaração do fornecedor” que é objeto da norma ISO/IEC 17050:2004. Quando o comprador avalia o fornecedor, diretamente ou por meio de prepostos configura-se uma qualificação ou avaliação de segunda parte. Essa avaliação, apesar de em grande parte das vezes, atender aos objetivos do comprador tem alguns inconvenientes graves, como a falta de imparcialidade e o custo de manter uma estrutura para fazer a referida avaliação. A avaliação da terceira parte é a mais difundida e aceita internacionalmente, onde uma entidade independente e competente, realiza a avaliação e fornece em caso de conformidade um certificado indicando a aderência do sistema auditado à norma de referência. As entidades independentes que realizam essas avaliações são denominadas organismos certificadores de terceira parte e têm sua organização e atividades definidas pelo guia ISO/IEC 62:1996. Quem garante a competência do organismo certificador de terceira parte é o denominado organismo acreditador que verifica se a entidade de terceira parte cumpre com os requisitos especificados no guia ISO/IEC 62:1996. As entidades acreditadoras têm sua
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organização e atividades definidas pela norma ISO/IEC 17011:2004. Em geral cada país tem sua entidade acreditadora. No Brasil o Inmetro – Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial exerce o papel de acreditador. Na Inglaterra temos a UKAS – United Kingdom Accreditation Service e nos Estados Unidos encontramos o ANSI-ASQ – National Accreditation Board (ANAB). Cada entidade acreditadora atua em seu país, sendo que algumas atuam além das fronteiras nacionais. No comércio internacional, muitas vezes o comprador exige que o sistema de gestão do fornecedor seja certificado por uma entidade certificadora acreditada por uma entidade em que ele, comprador confie. Nesses casos aparece a necessidade de reconhecimento dos certificados de sistema de gestão internacionalmente. Como não existe uma entidade acreditadora que seja aceita em todos os países, foi criada uma associação denominada IAF – International Accreditation Fórum, que reúne boa parte das entidades acreditadoras do mundo. Lá são discutidos temas relacionados com a harmonização dos critérios de acreditação e o mútuo reconhecimento entre elas. Já houve um avanço grande mas ainda não podemos dizer que existem certificados de sistema de gestão com reconhecimento internacional. Uma alternativa em uso no mercado é a múltipla acreditação onde uma entidade certificadora submete-se à acreditação em diversos países. Essa prática tem caído em desuso, pois com os progressos obtidos no IAF a múltipla acreditação agraga muito pouco valor aos certificados. Outra alternativa encontrada pelo mercado foi o mútuo reconhecimento entre entidades certificadoras, através de esquema de avaliação entre pares. Uma vez ganha a confiança de práticas de certificação harmonizadas uma entidade certificadora pode aceitar os serviços de avaliação de outra para basear sua decisão de conceder ou não um certificado próprio. UM bom exemplo dessa sistemática é a IQNet associação de certificadoras com sede na Suíça que hoje congrega 38 membros no mundo todo (www.iqnet. ch). Empresa certificada por um membro da IQNet tem seu certificado reconhecido automaticamente pelos outros 37 membros, garantindo dessa forma cobertura internacional.
5.8. Estudo de caso A empresa Lajende apresentou para um auditor da qualidade a seguinte política: “A política da qualidade da empresa Lajende na busca da satisfação no relacionamento com seus clientes é: UÊ Assegurar a satisfação de nossos clientes. UÊ Formalizar e aperfeiçoar e manter nossos processos de forma integrada para manter a empresa alinhada a seus objetivos.
Capítulo 5
| Modelos Normalizados de Sistemas de Gestão. Conceitos e Certificação...
UÊ Incentivar os colaboradores da empresa a respaldar o poder de decisão onde ocorrem as ações. UÊ Capacitar nossos profissionais a exercerem suas funções com competência.” O auditor havia visto no dia anterior a política da qualidade de empresa Cometa que é a seguinte: “Para que nossa organização seja perene ao mesmo tempo em que contribuímos para o desenvolvimento sustentável nossos compromissos são: UÊ A melhoria contínua de nossos produtos e processos. UÊ Manter um relacionamento justo com nossos fornecedores tratando-os como parceiros e procurando o seu aperfeiçoamento em nossa cadeia de valor. UÊ Atender nosso cliente nas suas necessidade explícitas e implícitas, buscando sempre inovar com o objetivo de obter a sua satisfação e reconhecimento. UÊ Incentivar nossos colaboradores para que obtenham o desenvolvimento pessoal, conscientizando-os e fornecendo o treinamento necessário para atingirem as competências requeridas. UÊ Preservar o meio ambiente com ações que previnam a poluição e incentivem o uso racional de recursos e o desenvolvimento sustentável.” O auditor questionou a Lajende afirmando que a política da Cometa era mais completa. A resposta da direção foi que a política é uma decisão interna da empresa, que reflete sua estratégia e valores. O auditor focou em dúvida se aceitava os argumentos ou não. Qual sua opinião?
5.9. Questões para discussão 1. Discuta um navio como um sistema dentro dos conceitos apresentados no item 5.1. 2. Qual a importância das normas para a sociedade? 3. Uma empresa que possui um sistema de gestão implantado e certificado é uma empresa que atingiu a excelência empresarial? 4. Por que as montadoras automotivas tiveram necessidade de desenvolver a ISO/ TS16949? 5. Com o surgimento de diversos modelos normalizados, como uma empresa deve selecionar aquele a ser implantado? 6. Qual a diferença entre um modelo normalizado e os tradicionais modelos da qualidade preconizados pelos “gurus” como Deming e Juran?
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5.10. Referências ABNT NBR ISO 9000:2005. Sistemas de gestão da qualidade. Fundamentos e vocabulário. ABNT NBR ISO 9001:2008. Sistemas de gestão da qualidade. Requisitos. ABNT NBR ISO 9004:2009. Gestão para o sucesso sustentado de uma organização – Uma abordagem da gestão da qualidade. ABNT NBR ISO 14001:2004. Sistemas da gestão ambiental – Requisitos com orientações para uso. ABNT NBR ISO/TS 16949:2009. Sistemas da gestão da qualidade – Requisitos particulares para aplicação da ABNT NBR ISO 9001:2008 para organizações de produção automotiva e peças de reposição pertinentes.
Capítulo
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Gerenciamento das Diretrizes
Gregório Bouer Sumário do capítulo 6.1. Introdução; 6.2. O gerenciamento das diretrizes; 6.3. Aplicação do gerenciamento das diretrizes; 6.4. Etapas preliminares; 6.5. Explicitação da diretriz; 6.6. Áreas de melhoria operacional e projetos; 6.7. Sistema de controle e informações para gerenciamento; 6.8. Tipos de desdobramento das diretrizes; 6.9. Desdobramento e articulação em série; 6.10. Desdobramento e articulação em paralelo; 6.11. Desdobramento das metas e dos meios; 6.12. Desdobramento das Prioridades da Organização – DEPRO; 6.13. Estudo de caso; 6.14. Questões para análise; 6.15. Referências.
Figura 6.1 – Modelo geral de Gestão da Qualidade.
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6.1. Introdução Por meio do Gerenciamento das Diretrizes, procura-se criar condições para o gerenciamento das prioridades da organização no dia a dia. Neste capítulo, apresenta-se, em primeiro lugar, o conceito de diretriz e os passos para sua formulação. A seguir, dá-se ênfase ao desdobramento das diretrizes e dos processos de comunicação que formam a dinâmica do gerenciamento das diretrizes. Trata-se de uma sistemática para alinhar a organização em torno de seus objetivos estratégicos, mostrando a contribuição que se deve esperar de cada uma de suas partes; ou seja, graças a esse processo de gerenciamento desdobram-se objetivos gerais em objetivos específicos, de modo participativo. Trata-se de um desdobramento simultâneo de metas e meios. Esse processo torna possível conferir autonomia às diferentes partes da organização, permitindo estabelecer que contribuição se espera de cada uma delas e como devem proceder, orientadas por indicadores de desempenho apropriados e guiadas por planos de ação consistentes. Segundo King, as organizações também têm uma hierarquia de necessidades. Basicamente, conforme se vê na Figura 6.2, essa hierarquia retrata as fases do gerenciamento das diretrizes.
Figura 6.2 – Hierarquia das necessidades de uma organização.
Antes de apresentar o processo de desdobramento dos objetivos e a articulação das ações, é oportuno destacar quais são os componentes de uma diretriz, a saber:
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a) Direção (o que se deseja conquistar, para onde se deseja caminhar). b) Objetivo (tanto quantitativo como ao longo do tempo). c) Condições de Contorno. d) Linhas Mestras (indicação das estratégias de ação). A Figura 6.3 ilustra esse conjunto de componentes de uma diretriz:
Figura 6.3 – Componentes de uma diretriz.
Como ponto de partida, uma representação formal de uma diretriz debe apresentar, de referência em uma única tabela, a diretriz que explicita os quatro componentes, como se indica no exemplo que se segue: Tabela 6.1: Exemplo de diretriz Direção Objetivo Condições de retorno 5HGXomRGRFXVWRGH 'H<UHDLV 0DQWHUDTXDOLGDGHGR FRPSUDGRVPDWHULDLV 3DUDu<UHDLV SURGXWRHQWUHJXHSHOD RUJDQL]DomR 1mRDXPHQWDURHVWRTXH GHPDWpULDVSULPDV
Linhas mestras $YDOLDUFRPSUDVDFXVWRJOREDO 3DUFHULDVFRPPHOKRUHV IRUQHFHGRUHV 5HGX]LURQ~PHURGH IRUQHFHGRUHV &RPSUDUDPHOKRUTXDOLGDGH SHORPHQRUSUHoR
6.2. O gerenciamento das diretrizes Conforme Merli, o gerenciamento das diretrizes pode ser definido como um processo de gerenciamento cuja finalidade é articular (ver Figura 6.4) uma diretriz e os objetivos associados em: a) Áreas de ação. b) Modos de atuação. c) Responsabilidades e recursos. d) Tempos.
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Figura 6.4 – Estrutura analítica da articulação.
Descrição do gerenciamento das diretrizes Desdobrar até chegar ao ponto de entender, passando do geral para o particular, com a finalidade de articular ações para o alcance de objetivos. Passa-se a ter a direção superior e os níveis hierárquicos mais elevados exercendo o papel de maior responsabilidade no sistema da qualidade. Os níveis hierárquicos superiores passam a ser os grandes promotores das mudanças da organização. Por outro lado, o método ao promover a participação de todos, torna possível agilizar o processo de veiculação das informações e de tomada de decisão. Finalidades do gerenciamento das diretrizes. Em essência, o que se busca é dar um direcionamento para a organização e estabelecer consenso entre suas diferentes partes. A sigla IDEIA serve para indicar o conjunto de etapas que devem constar no gerenciamento das diretrizes. As etapas do IDEIA são: UÊ Incentivar a geração de ideias. UÊ Desenvolver iniciativas de melhoria que apresentem resultados significativos, mesmo a curto prazo. UÊ Estabelecer o consenso da organização em relação aos objetivos de melhoria UÊ Intensificar contatos. UÊ Assegurar a coerência entre diretrizes e ações por meio da cadeia de comando, com ações e objetivos claramente definidos em cada nível ou a cada microprocesso, tornando possível controlar as atividades de melhoria no dia a dia.
6.3. Aplicação do gerenciamento das diretrizes O gerenciamento das diretrizes pode ser aplicado a qualquer tipo de objetivo, seja ele relacionado a custo, produtividade, qualidade, tempo de ciclo, retorno sobre investimento, a fim de ser colocado em prática, contando com uma sólida base de desdobramento de indicadores, linhas mestras e condições de contorno. São condições necessárias (ver Figura 6.5), para sua aplicação (os seis Cs): 1. Comprometimento por parte dos responsáveis pelo gerenciamento da função ou da área que deve contribuir para o atendimento/cumprimento da diretriz. 2. Completa assimilação da dinâmica e dos objetivos do ciclo PDCA. 3. Conhecimento dos processos de gerenciamento voltados às atividades de melhoria.
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4. Conhecimento e prática na utilização das ferramentas para diagnóstico e solução de problemas. 5. Comprovação da existência de recursos para revisar/mudar o processo 6. Clara disposição e determinação para definir objetivos.
Figura 6.5 – Condições necessárias.
6.4. Etapas preliminares Conti relata que as primeiras iniciativas devem ser da direção superior, a fim de especificar as diretrizes a desdobrar. Para isso, como se observa na Figura 6.6, são utilizadas medições, auditorias e pesquisas, que facilitam o desenvolvimento de um pré-estudo por parte da direção superior para, a seguir, especificar as diretrizes.
)LJXUD²3UpHVWXGRSDUDHVSHFLÀFDomRGHGLUHWUL]HV
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Com o pré-estudo realizado (ver Figura 6.7), determina-se onde atuar, o que, quanto e quando fazer (plano estratégico e o plano de gestão) e o como fazer (linhas mestras).
)LJXUD²(VSHFLÀFDomRGDVSRWHQFLDLVGLUHWUL]HV
Neste estágio preliminar, a direção superior percorre mais três etapas (ver Figura 6.8), até chegar à explicitação das diretrizes: 1. A partir do Plano Estratégico e do Plano de Gestão da Organização, elabora uma lista de macroindicadores potenciais para a diretriz. 2. Analisa a importância dos macroindicadores potenciais, mediante critérios devidamente consensados, e elabora uma lista de macroindicadores selecionados. 3. Examina cuidadosamente os macroindicadores selecionados e determina o ponto de partida e as condições de partida, para, a seguir, explicitar a diretriz.
Figura 6.8 – Processo de explicitação da diretriz e ferramentas utilizadas.
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São importantes as recomendações que se seguem: UÊ Quando se decide utilizar como macroindicador um algoritmo, é preciso verificar, com rigor, a sensibilidade e a credibilidade do mesmo. UÊ É sempre oportuno buscar referências para fazer uma análise preliminar dos dados históricos. É importante destacar que é possível ter, por diretriz, um ou mais macroindicadores.
6.5. Explicitação da diretriz A partir dos macroindicadores selecionados e da utilização das ferramentas, como por exemplo, diagrama de causa e efeito, diagrama de relações, diagrama de Pareto, diagrama de correlação e diagrama em árvore, determina-se o ponto de partida para a diretriz (a partir de que momento e valor) e formula-se a diretriz, explicitandoa (ver Figura 6.9). É de vital importância definir a natureza do objetivo, na medida em que ela pode orientar as escolhas sucessivas. Para isso, é oportuno saber se o objetivo é: UÊ Imposto pelo mercado. UÊ Vital à sobrevivência. UÊ Passível de transformação ou discutível. UÊ Deve-se alcançar o consenso de todas as áreas envolvidas em relação aos componentes da diretriz.
Figura 6.9 – Ferramentas para a explicitação da diretriz.
Desdobramento dos objetivos e articulação das ações A partir da explicitação da diretriz busca-se indicar as áreas de melhoria operacional. Na busca dessas áreas, cuida-se da articulação da diretriz em níveis sucessivos de detalhe até encontrar as referidas áreas (ver Figura 6.10). Nesse ponto, vamos definir três conceitos fundamentais: 1. Área de melhoria: é um microprocesso de importância ou mesmo uma área de atividade que contém um microprocesso importante, com indicadores passíveis de quantificação.
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2. Área de melhoria operacional: é uma área de melhoria, de dimensões e características tais que permitem definir projetos de melhoria específicos. 3. Projeto: conjunto de atividades para resolver um problema especificado, com um objetivo a alcançar, um horizonte de tempo para seu desenvolvimento, com recursos alocados e responsabilidades definidas. Na sequência são destacadas algumas recomendações para essa etapa: UÊ Deve-se avaliar a conveniência de desenvolver o desdobramento segundo um dos modelos (série ou paralelo), levando em consideração os critérios de complexidade da diretriz, a dimensão da organização, o grau de conhecimento sobre o problema e o clima predominante. UÊ Não se deve perder de vista o significado de diretriz. Para tanto é importante fazer, contínua e sistematicamente, referência a dados, fatos e linhas mestras. UÊ Acompanhar as passagens de nível por meio de visualização gráfica. UÊ Assegurar o pleno compartilhamento dos objetivos. UÊ Verificar a coerência no estabelecimento dos pontos e dos itens que devem ser controlados. A partir da explicitação da diretriz e utilizando ferramentas gerenciais da qualidade (ver Figura 6.11), selecionam-se as áreas de melhoria.
Figura 6.10 – Desdobramento da diretriz.
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Figura 6.11 – Ferramentas para a seleção das áreas de melhoria operacional.
6.6. Áreas de melhoria operacional e projetos A partir das áreas de melhoria selecionadas (ver Figura 6.12), segue-se até alcançar as áreas de melhoria operacional e, consequentemente, os projetos a serem desenvolvidos. A seguir, destacam-se algumas recomendações para essa etapa: UÊ Rigor na descrição completa e clara do projeto. UÊ Sistemática e continuamente lembrar e fazer referência a dados, fatos e linhas mestras. UÊ Apresentar sempre a visualização gráfica, utilizando a “gestão à vista”. UÊ Assegurar o compartilhamento dos objetivos. UÊ Explicitar, claramente, os vínculos entre os objetivos dos projetos e a diretriz selecionada. UÊ Selecionar a forma de organização de melhoria, de acordo com as condições encontradas em cada projeto.
)LJXUD²)HUUDPHQWDVSDUDDGHÀQLomRGRVSURMHWRV
Formalização e comunicação do plano de melhorias Definidos os projetos (ver Figura 6.13), é necessário formalizar o plano e comunicá-lo a toda a organização.
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A seguir, destacam-se algumas recomendações para essa etapa: UÊ Assegurar a compreensão das lógicas do desdobramento, por parte das áreas e das pessoas diretamente envolvidas. UÊ Assegurar que o esforço para a melhoria que se deseja realizar seja claramente conhecido e entendido por todos. UÊ Utilizar formas de comunicação alinhadas com a cultura e as práticas empresariais. UÊ Priorizar a disseminação em cascata do desdobramento.
Figura 6.13 – Ferramentas para a formalização e comunicação do plano.
6.7. Sistema de controle e informações para gerenciamento Após a oficialização e comunicação do plano (ver Figura 6.14), busca-se sistematicamente prover informações a todo o pessoal sobre os projetos em andamento e os resultados obtidos. Algumas recomendações para essa etapa são: UÊ O sistema de informações definido deverá contemplar a aplicação dos 5W e 1H. UÊ É oportuno, ao projetar este sistema, envolver desde o início os envolvidos no fornecimento dos dados e os que irão gerenciar com o sistema.
Figura 6.14 – Ferramentas para o gerenciamento por meio do sistema de informação.
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6.8. Tipos de desdobramento das diretrizes Conti apresenta dois casos extremos para o conceito de desdobramento dos objetivos. O primeiro deles é o de uma empresa autoritária, em que a melhoria da qualidade é o domínio exclusivo da direção superior. Nessa empresa, os objetivos e as estratégias são desdobrados num processo de direção única, de cima para baixo. Esse é o gerenciamento de objetivos feito de modo autoritário. Nesse caso, todos sabem quais são os objetivos e podem também entender sua conexão com os objetivos da empresa, mas não há garantias de que esses objetivos venham a ser alcançados ou que eles virão a otimizar o resultado global. Mais ainda, a conexão nos vários níveis entre esses objetivos e as necessidades dos clientes não ficam claras. O segundo caso é o da empresa que não possui um plano estratégico definido pela alta direção. Nesse caso, cada nível hierárquico, ou mesmo função, é instado a especificar seu plano de melhorias e pode começar a identificar corretamente as lacunas existentes entre as expectativas dos clientes e os resultados e desenvolver objetivos de melhoria dos processos. Como consequência, a função adota o processo de desdobramento horizontal, começando com as necessidades dos clientes e retornando pelos processos que atravessam a empresa até o seu ponto de partida. Em nenhum dos casos, a abordagem do processo de desdobramento de objetivos é correta. Conti afirma que o planejamento correto de objetivos deve combiner tanto o desdobramento horizontal como o vertical. Quando se fala em sentido de desdobramento da diretriz, diz-se que um desdobramento é vertical quando é feito ao longo da cadeia de comando da organização, seguindo-se a representação do organograma. Ainda referindo-se ao sentido de desdobramento, diz-se que o desdobramento é horizontal quando é feito ao longo dos processos que atravessam a organização. Quanto à dinâmica do desdobramento, no entanto, a classificação mais conhecida é a que apresenta os desdobramentos em série e em paralelo.
6.9. Desdobramento e articulação em série A diretriz é articulada individualmente em cada uma das passagens de nível (ver Figura 6.15), verificando-se a coerência com linhas mestras e condições de contorno. A definição dos objetivos individuais em cada nível resulta do somatório dos objetivos do nível inferior subsequente.
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Figura 6.15 – Desdobramento e articulação em série.
6.10. Desdobramento e articulação em paralelo A diretriz e o objetivo são articulados, simultaneamente, em cada uma das passagens de nível. A verificação da coerência, seja da política ou do objetivo (ver Figura 6.16), também é efetuada em cada passagem de nível.
Figura 6.16 – Desdobramento e articulação em paralelo.
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6.11. Desdobramento das metas e dos meios Segundo Akao, quando o desdobramento das metas e o desdobramento dos meios são realizados separadamente, sem a consideração simultânea dos mesmos, o processo de desdobramento traz o risco de se estabelecer e propagar metas inviáveis. As metas devem ser associadas a expressões técnicas que passaremos a designar como itens de controle. Os meios consideram os recursos a serem empregados para que as metas sejam alcançadas. Uma matriz “L” (ver Figura 6.17) pode ser usada para evidenciar a relação entre metas e meios. Ainda conforme Akao, pode-se entender como item de controle, no sentido amplo, um item de controle de causas (ligado aos meios) e um ponto de controle como item de controle de resultados (ligado às metas). O número 3, no interior da matriz, indica item da meta que exerce forte impacto sobre a melhoria, o 2 tem algum efeito, e o 1 tem efeito limitado.
Meios Desdobrados
Metas Desdobradas
3
1
2
)LJXUD²0DWUL]´/µGHGHVGREUDPHQWRGHPHWDVHPHLRV
6.12. Desdobramento das Prioridades da Organização – DEPRO Quando o desdobramento das diretrizes é realizado, diversos objetivos e subobjetivos são definidos. Para que o trabalho atinja os objetivos propostos é recomendável que os resultados sejam monitorados continuamente. O DEPRO é o sistema que deve ser utilizado para esta monitoração. O DEPRO utiliza vários conjuntos de diagramas de causa e efeito, sendo que cada um desses conjuntos está associado a uma etapa do desdobramento das diretrizes. Existe uma classificação (ver Tabela 6.2), que permite hierarquizar os diagramas do DEPRO da seguinte forma:
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Tabela 6.2: Tipo de diagrama DEPRO e sua aplicação TIPO DE DIAGRAMA DEPRO '(3520(675( 68%'(352 '(352'($d®2
QUANDO SE APLICA 3DUDPRQLWRUDURSULPHLURGHVGREUDPHQWRGRGHVGREUDPHQWRGDV GLUHWUL]HV 3DUDPRQLWRUDURVGHVGREUDPHQWRVVXEVHTXHQWHVGRGHVGREUDPHQWRGDV GLUHWUL]HV 3DUDPRQLWRUDURVSURMHWRVGHPHOKRULDGHÀQLGRVQRGHVGREUDPHQWRGDV GLUHWUL]HVTXHFRUUHVSRQGHDR&('$&GH)XNXGD
A Figura 6.18, mostrada a seguir, permite uma melhor visualização da relação existente entre o DEPRO e o desdobramento dos objetivos e a articulação das ações.
Figura 6.18 – Relações entre o DEPRO e o desdobramento das diretrizes.
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O DEPRO apresenta uma estrutura semelhante à de um conjunto de relações de causa e efeito. Do lado direito do painel, coloca-se o gráfico para o acompanhamento do objetivo relativo àquele DEPRO que está sendo desenvolvido (ver Figura 6.19).
Figura 6.19 – A estrutura básica do DEPRO.
Do lado esquerdo do quadro, elabora-se um diagrama tipo espinha de peixe em que os ramos representam os desdobramentos do objetivo, ou seja, os subobjetivos. Cada um desses ramos tem, na extremidade, um gráfico para acompanhamento do respectivo subobjetivo (consultar Figura 6.20).
Figura 6.20 – Desdobramento dos objetivos em subobjetivos.
A dinâmica do DEPRO se caracteriza pela sistemática de adição de cartões de problemas (colocados no lado esquerdo do ramo) que impedem e dificultam o alcance dos resultados preestabelecidos para os objetivos, bem como pela adição de cartões de sugestões (colocados no lado direito do ramo) que propiciem a eliminação das causas dos problemas explicitados pelos cartões afixados à esquerda do ramo. Cada diagrama DEPRO deve ser afixado na sala do responsável pela obtenção do objetivo definido para o DEPRO em questão. Dessa forma, coloca-se em prática a chamada gestão à vista.
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6.12.1. O DEPRO MESTRE
Este é o DEPRO que será utilizado para monitorar os objetivos do primeiro desdobramento do desdobramento das diretrizes. Os elementos necessários à construção desse primeiro DEPRO são extraídos da primeira árvore derivada da aplicação do desdobramento das diretrizes. 6.12.2. O SUBDEPRO
Cada um dos subobjetivos do DEPRO MESTRE deve ser monitorado por um SUBDEPRO específico. Neste caso, cada um dos subobjetivos dará origem a um diagrama espinha de peixe. Para cada um dos diagramas espinha de peixe, destacase o subobjetivo e seu respectivo gráfico de acompanhamento, à direita do quadro, e os desdobramentos relativos a esses subobjetivos, com seus respectivos gráficos de controle, à esquerda do quadro. Existirão tantos “níveis de SUBDEPRO” quantos forem os níveis de desdobramento do desdobramento das diretrizes. Para cada SUBDEPRO indica-se um responsável pelo controle do subobjetivo e pela verificação da contribuição dos diversos desdobramentos pertinentes ao SUBDEPRO em questão. No esquema de adição de cartões, são mecanismos para estimular a participação: 1. Cartões de Problemas O responsável por um SUBDEPRO, ao notar que os problemas que o impedem de atingir os resultados predeterminados para o nível de desdobramento pelo qual responde ultrapassam sua área de atuação e decisão, deve escrever um cartão relatando a dificuldade ou o problema diagnosticado e, em seguida, afixá-lo no SUBDEPRO do nível imediatamente superior, no ramo que corresponde ao subobjetivo que lhe fora delegado. Assim, fica mais fácil identificar quais são os principais obstáculos à consecução dos subobjetivos e objetivos pertinentes ao DEPRO e, consequentemente, associados ao desdobramento das diretrizes. 2. Cartões de Sugestões A gestão à vista proporcionada pela implantação do DEPRO não almeja apenas tornar as informações mais claras e transparentes, mas também estimular a participação de todos aqueles que desejam contribuir para que as dificuldades e os problemas sejam removidos de forma eficaz e eficiente. Dessa forma, qualquer pessoa tem a liberdade de elaborar e afixar cartões de sugestão que sejam coerentes, consistentes e exequíveis para solucionar os problemas elencados nos cartões de problemas. Para manter a organização e a facilidade de leitura e interpretação dos diagramas do DEPRO, deve-se afixar o cartão de sugestão à direita do cartão de problema a que se refere (ver Figura 6.21). Note que pode haver mais de uma sugestão para o mesmo problema.
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Cada painel do DEPRO é afixado na sala da pessoa responsável por ele. Olhando para o quadro, o responsável tem condições de verificar se o desempenho está caminhando em direção aos resultados de maneira adequada, ou se existem gargalos. Observando os gráficos existentes nos ramos que compõem os diagramas, é possível verificar qual o ramo do desdobramento que apresenta maior criticidade. Essa criticidade pode estar associada a duas situações distintas: 1. O responsável por este ramo do diagrama DEPRO está enfrentado problemas que estão ao seu alcance e sob sua área de ação e decisão, mas que até o momento não foram efetivamente eliminados. 2. O responsável pelo diagrama não possui a autoridade ou os recursos necessários para superar seus problemas e, portanto, deve ter indicado tais obstáculos em um cartão de problemas afixado no diagrama DEPRO do nível imediatamente superior.
Figura 6.21 – Adição de cartões de problemas e sugestões no diagrama DEPRO.
Esses desdobramentos sugerem que se deve dedicar especial atenção aos pontos de controle e pontos de verificação. Na figura anterior, o nível superior controla o seu indicador relacionado ao objetivo que deve alcançar (é o seu ponto de controle) e verifica os subobjetivos do nível subsequente do desdobramento (é o seu ponto de verificação), que, por sua vez, é o ponto de controle do responsável por alcançar o subobjetivo. O percurso completo do gerenciamento das diretrizes permite transformar o modo de atuação da organização, conferindo a todos os níveis da organização a oportunidade de se alinhar com suas prioridades no dia a dia (ver Figura 6.22).
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Figura 6.22 – Mudando a forma de trabalhar para conferir poder a todos os níveis hierárquicos.
6.13. Estudo de caso 6.13.1. Aumentando a produtividade
No ano de 2001, uma indústria estabelecida no interior do Estado de São Paulo, do setor de papel e celulose, produtora de autoadesivos, etiquetas e rótulos, aplicou o gerenciamento das diretrizes em sua unidade convertedora. Yokoi registrou esta aplicação em trabalho apresentado na EPUSP, sob a orientação do autor deste capítulo. A diretriz oriunda da alta direção era de aumentar a capacidade produtiva em pelo menos 40% no intervalo de um ano, com a linha mestra de utilizar o sistema TQM e tendo como condições de contorno a não realização de investimentos em novos equipamentos e a manutenção da operação em apenas um turno de trabalho. O desdobramento dessa diretriz indicou a área de melhoria de aumento da eficiência de utilização dos equipamentos, e o macroindicador de desempenho escolhido foi o OEE (eficiência global dos equipamentos), como proposto por Nakajima. O desdobramento da área de melhoria indicou duas famílias de equipamentos como áreas de melhoria operacional. A apuração dos resultados indicava um OEE de 45 para uma das famílias, e de 62 para a outra.
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O projeto para a família com o OEE de 45 teve como objetivo levantar o valor desse indicador para um valor acima de 75. Nesse projeto, a ação concentrou-se sobre a redução do tempo de set-up de 2 horas por lote de produção para um máximo de 40 minutos. Com a utilização do CEDAC, logrou-se atingir esse objetivo no intervalo de oito meses. O projeto para a família com o OEE de 62 teve como objetivo levantar o valor do OEE para 80. Nesse projeto, a ação concentrou-se sobre a velocidade de transformação e sobre os tempos gastos em manutenção corretiva. Com a utilização do CEDAC, logrou-se atingir esse objetivo no intervalo de seis meses. Com essas intervenções, a empresa conseguiu alcançar os objetivos da diretriz estabelecida, eliminando a necessidade de aumentar o número de turnos de trabalho para satisfazer a demanda de seus produtos. Reduziu também, consideravelmente, o custo da mercadoria vendida e a necessidade de manter estoques para atender a demanda, logrando melhorar sua lucratividade. 6.13.2. Redução de custos
No ano de 1999, a alta direção de uma empresa do setor de tecelagem e confecção, devido à intensa competição nos mercados nacional e internacional, decidiu reduzir seus custos. Indicou como linha mestra a utilização do TQM e do Sistema da Qualidade e colocou como condição de contorno alcançar este objetivo com recursos humanos próprios. Ao aplicar o gerenciamento das diretrizes, localizou como área de melhoria o custo da não qualidade em uma de suas unidades fabris. Nessa unidade, vislumbrou-se a oportunidade de reduzir esse custo para dois terços do valor apurado ao final do ano fiscal anterior. O prazo para alcance do resultado foi fixado em um ano. Novos desdobramentos indicaram como área de melhoria operacional o custo das falhas externas, que compreendiam, entre outros itens, o rebaixamento da classificação do produto com consequente perda de faturamento, a reposição de material fornecido e a consequente necessidade de voltar a produzir o produto. Na discussão sobre objetivos e meios para alcançá-los, foram identificados dois projetos para desenvolvimento. Um deles dizia respeito à melhoria da qualidade no setor de tecelagem, reduzindo a incidência de alguns tipos de defeitos mediante a intervenção sobre os equipamentos, ação essa indicada por meio do uso do CEDAC (ver Capítulo 8). O segundo projeto teve como foco a melhoria da qualidade no setor de tingimento, reduzindo a incidência de problemas de coloração com a intervenção sobre a formulação das tintas aplicadas, ação essa indicada também por meio da utilização do CEDAC. Após o desenvolvimento dos projetos, logrou-se reduzir o custo das falhas externas a um décimo do valor apurado no ano fiscal anterior.
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Gestão da Qualidade
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6.14. Questões para análise 1. O gerenciamento das diretrizes é uma das principais formas que a direção das empresas pode usar para alcançar objetivos estratégicos e gerenciar suas prioridades no dia a dia. É aplicável à ruptura com padrões de desempenho e visa a atingir um novo patamar para resultados. Qual a importância de se tratar simultaneamente desdobramento de resultados e de meios? 2. O fato de o gerenciamento das diretrizes tratar de processos de ciclo longo pode dificultar a aplicação do ciclo PDCA pelo fato de não se ter um retorno rápido e frequente de resultados de aplicação de ações para melhoria dos resultados? Como esta dificuldade pode ser superada? 3. O gerenciamento das diretrizes pode ser considerado uma prática necessária para dar a todos os integrantes da organização uma visão sistêmica? Explique. 4. O processo de desdobramento das diretrizes que busca estabelecer “o que” e “como” fazer acaba por promover um desdobramento tanto entre níveis hierárquicos como também entre processos que atravessam as diferentes funções da organização? Explique como. 5. O processo de comunicação com a utilização da “gestão à vista” aplicado intensivamente no DEPRO torna o gerenciamento menos formalizado? Isso é vantajoso? Explique.
6.15. Referências AKAO, Y. Desdobramento das Diretrizes para o sucesso do TQM. Bookman: [s.n.], 1997. CONTI, T. Building Total Quality: a guide for management. Londres: Chapman & Hall, 1993. FUKUDA, R. CEDAC: a Tool for Continuous Systematic Improvement. Productivity Press, [s.n.], 1990. KING, B. Hoshin Planning: the developmental approach. [s.l.]: Goal/QPC, 1989. NAKAJIMA, S. Introdução ao TPM: Total Productive Maintenance. São Paulo: IMC Internacional Sistemas Educativos, 1989. YOKOI, R. T. “Metodologia para análise e solução de problemas e sistema de gestão à vista”. Trabalho de Formatura – Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, 2001. MERLI, G. Eurochallenge: the TQM approach to capturing global markets. Inglaterra: IFS, 1993.