UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE QUÍMICA
QUÍMICA ORGÂNICA EXPERIMENTAL 2 – QO622 Relatório 3: PROJETO DE SÍNTESE ORGÂNICA MULTIPASSO Preparação de Ácidos Cinâmicos e derivados através de uma reação de Knoevenagel
Alvi Alvino no Ro Roch chaa dos dos Sant Santos os Júni Júnior or Pedro edro Yoritom tomo So Souza Na Nakas kasu
0805 080572 72 082499 499
Resumo Nesta etapa da disciplina, estudou-se os processos de uma síntese orgânica envolvendo a preparação do ácido de Meldrum, do catalisador acetato de etano-1,2-diamonio, e depois, utilizando estes produtos, fez-se uma reação de Knoevenagel entre o Meldrum e salicilaldeído, a fim de se obter numa próxima etapa um ácido cinamico. As etapas envolvidas englobam condensação aldólica, preparação de cumarina e síntese de uma lactona. Todas as etapas foram seguidas, porém ao final não concluiu-se a preparação do ácido cinâmico, o último passo da síntese.
Introdução Em 1908, Meldrum observou que a reação entre ácido malônico e acetona em anidrido acético e ácido sulfúrico, formando um produto cristalino que se apresentava como um ácido monobásico, de fórmula C6H8O4. Após outros estudos, descobriram de que o composto (Ácido de Meldrum) apresentava a seguinte estrutura [1]:
Figura 1. Ácido de Meldrum Depois de determinar a estrutura do ácido de Meldrum, este passou a ser muito usado em síntese orgânica. Devido a presença do grupo metileno, o ácido de Meldrum apresenta uma acidez intermediária (pKa 5.1), assim sendo passível de síntese de ésteres malônicos [1]. A partir da reação entre o salicilaldeído e o ácido de Meldrum, pode-se obter o ácido cinâmico (Figura 2), um composto orgânico encontrado na canela e na babosa e também produzido em organismos vivos a partir da fenilalanina.
Figura 2: Ácido Cinâmico O ácido cinâmico é um composto largamente utilizado na indústria por ter ação germicida e fungicida, pode também ser usado em detergentes e em perfumes. Os produtos obtidos nesta síntese foram analisados por espectroscopia no infravermelho, ressonância magnética nuclear de H1 e por análise de ponto de fusão.
Procedimentos [2] Síntese do Ácido de Meldrum Em um balão de fundo redondo de 100 mL adicionou-se 0,10 mol (10,4 g) de ácido malônico e 0,13 mol (12 mL) de anidrido acético. Agitou-se a suspensão sob agitação e banho de gelo e adicionou-se, com cuidado, aproximadamente 0,3 mL de ácido sulfúrico concentrado. Manteve-se a mistura em um banho de gelo a 15°C e, gota a gota, adicionou-se 0,11 mol de acetona (8 mL) com um funil de adição. Agitou-se a mistura a 25°C por 20 minutos, armazenou-se o balão em um freezer durante uma semana. Passada uma semana, lavou-se os cristais formados com ácido sulfúrico e água gelada e depois fez-se a recristalização com acetona quente. Síntese do catalisador – Acetato de etano-1,2-diamônio Em um balão de fundo redondo de 50 mL adicionou-se 20 ml de éter anidro e 0,04 mol (2,6 mL) de etilenodiamina. Manteve-se a solução sob agitação e adicionou-se, gota a gota, uma mistura contendo 0,1 mol (4,8) de ácido acético e 4 mL de éter anidro. armazenou-se o balão em uma geladeira durante uma semana. Passado o tempo, lavou-se os cristais com éter e fez-se sua rescristalização com metano, quente. Reação de Knoevenagel – Síntese do Ácido-3-carboxicumarínico Em um balão de fundo redondo de 50 mL, adicionou-se 20 mmol (0,24 g) de salicilaldeído, 20 mmol (2,89 g) de ácido de Meldrum, 58 mg de catalisador e 10 ml de etanol. Agitou-se a mistura por 30 minutos a temperatura ambiente. Aqueceu-se o sistema em refluxo com agitação por 2 horas. Após resfriamento da solução, esta foi deixada em repouso durante 1 hora, em banho de gelo. Filtrou-se os cristais formados com um funil de Büchner, fez-se a lavagem com etanol gelado e a secagem a vácuo. Preparação dos Ácidos Cinâmicos [3] Em um balão de fundo redondo de 100 mL, adicionou-se 3 g do ácido-3carboxicumarínico e 40 ml de solução de bissulfito de sódio 25%. Aqueceu-se o sistema até que houvesse completa solubilização do sólido e agitou-se por 15 minutos. Levou-se a solução à ebulição e então adicionou-se, gota a gota, 40 mL de hidróxido de potássio 50%. Resfriou-se em banho de gelo e acidificou-se o meio a pH 3 com ácido clorídrico. Após longo tempo de repouso sem indício de precipitação extraiu-se a mistura com acetato de etila, visando obter o produto esperado na fase orgânica. Evaporou-se o solvente da fase orgânica obtendo-se um sólido branco. Lavou-se o sólido com água e este foi totalmente dissolvido.
Resultados e discussões Síntese do ácido de Meldrum Realizou-se o procedimento descrito na parte experimental e obteve-se um sólido branco cristalino, já na síntese do catalisador, foi obtido um sólido amarelado. Ambos foram recristalizados para purificação e a massa então foi pesada para posterior calculo do rendimento, apresentado na Tabela 1. Tabela 1: Calculo do rendimento para o Ácido de Meldrum Massa esperada (g) Massa obtida (g) Rendimento (%) 14,40 3,25 22,57
O rendimento obtido foi consideravelmente baixo devido a etapa de recristalização, na qual grande parte do produto foi perdido. O mecanismo da síntese do ácido de Meldrum é ilustrado na Figura 3, a seguir. H O
O
OH
O
O
O
4
H+
O
O
6
5
-H+,-HOAc H+ O
O
-H+
O
O
+ O
O
HO
OH
8
O
7
O
O
OH
9
- HOAc
O
OH
O
-H+
O
10
O
O
O
11
O
. Figura 3: Mecanismo de Formação do Ácido de Meldrum. O mecanismo consiste basicamente na ativação da acetona 4 pelo anidrido acético (protonado pelo ácido inorgânico do meio) 5 para gerar um cátion oxônio 7 que sofrerá ataque nucleofílico do ácido malônico 8, o intermediário 9 formado perde facilmente acetato para gerar
um carbocátion estabilizado pela ressonância com o oxigênio adjacente 10, esse carbocátion sofre ataque nucleofílico do oxigênio da hidroxila ocorrendo então uma ciclização intramolecular para gerar o ácido de Meldrum 11. O produto obtido na síntese do ácido de meldrum foi submetido a análises de espectroscopia no infra-vermelho, ressonância magnética nuclear de H1 e ponto de fusão. O valor obtido do ponto de fusão é apresentado na Tabela 2. As bandas obtidas no espectro de infra-vermelho são apresentadas na Tabela 3 e os sinais de H1 obtidos por RMN são apresentados na Tabela 4. Tabela 2: Análise por ponto de fusão [4] Pf Experimental 75-80°C
Pf Literatura 94°C
Tabela 3: Atribuição das bandas no infra-vermelho [5] Frequência Frequência Estiramento -1 Experimental (cm ) Literatura (cm-1) C=O 1754 1754 C-O 1168 1168 C-H 1378 e 1448 1378 e 1458 C-H 3004 e 2930 3004 e 2950 (estiramento) Tabela 4: Atribuições dos sinais de RMN de H 1[5] Deslocamento Deslocamento Sinal experimental (ppm) simulação (ChemDraw) A 1,79 1,79 B 3,62 3,21 Analisando-se o espectro de IV do ácido de Meldrum, anexo 1, procurou-se pelas bandas mais facilmente distinguíveis em regiões específicas do espectro, como o estiramento ν(C-H) que está na região ao redor de 3000 cm-1, o estiramento da carbonila ν(C=O) que está em 1754cm-1 e também por comparação com os dados das literatura, verificou-se que sintetizouse efetivamente o ácido de Meldrum. Com relação ao espectro de RMN-1H, anexo 2,a análise foi bem mais fácil, uma vez que o ácido de Meldrum apresenta apenas dois tipos de hidrogênios, os metilênicos e as metilas na proporção de 1:3 como verificado pela integração do espectro. Os prótons metilênicos estão mais desblindados devido às duas carbonilas vizinhas que retiram densidade eletrônica por efeito indutivo, as metilas estão levemente desblindadas devido ao efeito indutivo das carbonilas que, embora fraco, ainda manifesta-se sobre as metilas.
Síntese do catalisador O catalisador é importante na etapa seguinte, de formação da 3-carboxi-cumarina. Ele é preparado por uma simples reação de ácido-base, formando espécies iônicas.
Reação de Knoevenagel – formação do ácido-3-carboxicumarínico Reagiu-se o ácido de Meldrum com o salicilaldeído visando obter uma carboxicumarina. A reação foi realizada com sucesso e resultou em um sólido branco que foi pesado após secagem a vácuo para posterior cálculo do rendimento, que é apresentado na Tabela 5. Tabela 5: Cálculo do rendimento para o ácido-3-carboxicumarínico Massa esperada (g) Massa obtida (g) Rendimento (%) 3,80 2,99 79
A figura 4 abaixo mostra o mecanismo para a formação do ácido 3-carbóxicumarínico.O meio reacional estará levemente alcalino devido à presença do acetato de etanodiamônio. O ácido de Meldrum 12 está em equilíbrio com seu enolato 13. O enolato do ácido pode atacar a carbonila do salicilaldeído 15 que se encontra ativada pela hidroxila em orto por uma ligação de hidrogênio intramolecular que acaba por diminuir a energia do LUMO da carbonila por catálise de Bronsted. O resultado do ataque é o intermediário 16 que perde um próton para uma base do meio para gerar o ânion 17 que por eliminação Ecb1 perde um íon hidróxido para gerar o produto de condensação aldólica 18, a reação prossegue com o ataque intramolecular da hidroxila fenólica à carbonila para gerar o intermediário 19 que por sua vez sofre uma eliminação de acetona para gerar a 3-carbóxi cumarina 21 com 79% de rendimento.
O
O
+OH-, -H2O
O
O
O
O
O
12
13
O
HO HO O
O
H
O
O O
O
O
-H+
H
O
O
14
H
H+
+
B
O
15
16
-BH
HO
O
O
-OH O
O HO O
18
O HO
O
O
17
H+ O
O
O O
O
O
O
O
19
O
HO
O
O OH
20
O
O
H
21
79%
Figura 4: Mecanismo de Formação da 3-carbóxi-cumarina Submeteu-se o produto obtido nesta etapa a análises de ponto de fusão, espectroscopia no infra-vermelho e ressonância magnética nuclear de H1. A faixa de fusão obtida é apresentada na Tabela 6, a atribuição de bandas no espectro de infra-vermelho é apresentada na Tabela 7 e a atribuição dos sinais de hidrogênio são apresentados na Tabela 8. Tabela 6: Análise por ponto de fusão [4] Pf Experimental 183-186°C
Pf Literatura 189-192°C
Tabela 7: Atribuição das bandas no infra-vermelho [5]
Frequência Frequência -1 Experimental (cm ) Literatura (cm-1) O-C=O 1746 1746 C=O (ácido) 1684 1683 C=C 1613,1569,1489,1452 1609,1569,1463,1609 (aromático)
Estiramento
Sinal A B C,D,E e F ( hidrogênios aromáticos)
Tabela 8: Atribuições dos sinais de RMN de H 1[5] Deslocamento Deslocamento experimental (ppm) simulação (ChemDraw) 12,26 13 8,95 8,76 8-7,5
7,9-7,4
A análise do espectro de IV da 3-carbóxi-cumarina, anexo 3, mostra as bandas correspondentes às vibrações mais distinguíveis no espectro que são o estiramento das duas carbonilas, a da lactona e a do ácido carboxílico. Espera-se que a freqüência de estiramento da carbonila do ácido seja um pouco menor que a da lactônica devido ao efeito doador de elétrons do oxigênio do grupo OH da carboxila. O oxigênio da lactona também doa elétrons, mas essa doação está comprometida pela conjugação com o anel aromático. Quando maior a ordem da ligação, maior o fator k, a freqüência de estiramento é diretamente proporcional à raiz de k/µ em que µ é a massa reduzida. O espectro de RMN-1H, anexo 4, mostrou basicamente três sinais, o dos hidrogênios aromáticos (C, D, E e F) na região de 7,5 a 8,0 ppm, o hidrogênio ácido da carboxila, A,em 12,26 ppm. E o hidrogênio olefínico, B, em 8,95 ppm. Esse último hidrogênio está mais deslocado para a região de desblindagem do espectro devido à conjugação com a carbonila do grupo carboxílico que retira densidade eletrônica.
Preparação do ácido cinâmico O procedimento para a síntese do ácido cinâmico foi seguido corretamente, contudo não conseguiu-se descarboxilar o ácido-3-carboxílicocumarina para chegar à cumarina e prosseguir com sua hidrólise base e posterior isomerização. Conseguiu-se apenas isolar KCl oriundo da neutralização do hidróxido de potássio com ácido clorídrico concentrado. O mecanismo de formação do produto desejado é apresentado na Figura 5, a seguir.
-
HOSO2
O
O
O OH
OH
H+
S HO
O O
O
O 22
O 23
-
-
HOSO2
HOSO2
O
-CO2
O
OH
25
O
H O
O
24
-HSO3-
Não Isolado O
O 26
Figura 5: Mecanismo para a formação da cumarina. O mecanismo consiste na adição de Michael do bissulfito à carbóxicumarina 22 que leva ao aduto 23, este aduto pode então sofrer descarboxilação para gerar o enol 25 que ao tautomerizar para a forma cetônica perde o bissulfito para formar a cumarina 26. Contudo não conseguiu-se isolar a cumarina após a etapa de cristalização do produto. Os problemas podem ter sido devido à reação retroaldólica da carboxicumarina, devido ao excesso de base no meio (proporção molar 31/1 de base/substrato) que, sob aquecimento, facilitaria este tipo de reação, gerando ácido malônico (análogo funcional do ácido de Meldrum) e saliciladeído, conforme ilustrado no mecanismo da Figura 6.
OH
O
O
OH
OH
OH-
+
H+ O
O
O
27
O
28
-H+
O
O
OH
O
OH
OH
30 O
O
O
O
H+
O
O
29
OH
O
O
31
Hidrólise Alcalina
O
O
-
O 3S
OH
-
O
+HSO 3 H
O
OH
31 Solúvel em água
H
+ OH
32
OH
33
Solúvel em á gua
Figura 6: Mecanismo da reação retro-aldólica da 3-carbóxi-cumarina. O mecanismo inicia-se com a adição de Michael do íon hidróxido à carbóxi-cumarina 27, em virtude do meio alcalino, forma-se o aldolato 29 que então sofre a reação retro-aldólica gerando o monoéster do ácido malônico 31 que então hidrolisa-se no meio alcalino para gerar o ânion do ácido malônico 31 e salicilaldeído 32. Como ainda há excesso de bissulfito, o salicilaldeído reage com ele para gerar um aduto de adição 33 solúvel em meio aquoso. Isso explica por que não conseguiu-se extrair nenhum produto com acetato de etila, os subprodutos da reação são bastante solúveis em água.
OH
H+ OH-
+ O
O
O
34
O
35
-H+
O
O
O
OH
O
37
O
36
H+
O
O
O 38
Hidrólise Alcalina
O
-
O 3S
OH
-
O
+HSO3 H
H
+
O
OH
Solúvel em água
39
40
OH
Solúvel em á gua
41
Figura 7: Mecanismo da reação retro-aldólica da cumarina. Uma outra possibilidade seria que a cumarina de fato formou-se, mas devido às condições drásticas do meio, fortemente alcalino e alta temperatura, a reação de retro-aldol ocorreu de acordo com a Figura 7 com um mecanismo muito parecido ao da Figura 6, mas agora tendo como produtos acetato e salicilaldeído.
Conclusão A síntese de multipasso foi importante para estudar conceitos de reações de condensação, ciclização intramolecular, recristalização, refluxo, reações de retro-aldol, ponto de fusão, interpretação por espectroscopia de infravermelho e RMN-H1.
Os passos de síntese do acido de Meldrum, apesar do baixo rendimento, e da 3carboxicumarina foram seguidos com sucesso, apenas não se alcançando o produto final, que seria o ácido cinâmico. O ponto de fusão e as análises de infravermelho e RMN-H1 foram essenciais para confirmação das estruturas dos produtos obtidos. Na última etapa, o excesso de base pode ter ocasionado a reação de retro-aldol, levando ao fracasso dessa etapa. Porém a presença de erros nos obriga a um aprofundamento no assunto, a procura de justificativas e modelos que sejam coerentes com os procedimentos e reações realizadas.
Bibliografia [1] [2] [3] [4] [5]
D. Davison e S.A. Bernhard, “ The structure of Meldrum’s supposed beta-lactonic acid”. J. Am. Chem.Soc, 1948, 70, 3426-3428. Apostila de QO622 – Química Orgânica Experimental – UNICAMP, 2010. A.Song,X.Wang e K.S. Lan, “A convenient synthesis of coumarin-3-carboxylic acids via Knoevenagel condesation of Meldrum’s acid with ortho-hidroxyaryl aldehyde or ketones”. Tetrahedron. Lett.; 2003,44, 1755-1758 NIST Webbook: http:// webbook.nist.gov/chemistry Spectral Database for Organic Compounds SDBS: http://riodb01.ibase.aist.go.jp/sdbs/cgi-bin/direct_frame_top.cgi